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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: EDUCAÇÃO
HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO RURAL DE ASTORGA: PRÁTICAS
EDUCATIVAS E ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL DA ESCOLA
RURAL ÁGUA ASTORGA (1957-1980)
ELENA PERICIN GOMES CORNICELLI
MARINGÁ
2015
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: EDUCAÇÃO
HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO RURAL DE ASTORGA: PRÁTICAS EDUCATIVAS E
ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL DA ESCOLA RURAL ÁGUA ASTORGA
(1957-1980)
Dissertação apresentada por ELENA PERICIN
GOMES CORNICELLI, ao Programa de PósGraduação em Educação da Universidade
Estadual de Maringá, como um dos requisitos
para a obtenção do título de Mestre em
Educação.
Área de Concentração: EDUCAÇÃO.
Orientadora:
Prof(a). Drª.: EDNÉIA REGINA ROSSI.
MARINGÁ
2015
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ELENA PERICIN GOMES CORNICELLI
HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO RURAL DE ASTORGA: PRÁTICAS EDUCATIVAS E
ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL DA ESCOLA RURAL ÁGUA ASTORGA
(1957-1980)
BANCA EXAMINADORA
Profª. Dra. EDNÉIA REGINA ROSSI – UEM
Profª. Dra. SANDRA APARECIDA PIRES FRANCO – UEL
Profª. Dra. MARIA CRISTINA GOMES MACHADO – UEM
Maringá/Pr, 14/04/2015
Dedico meus esforços aos meus pais Antonia e
Sebastião (in memorian) e ao meu irmão
Miramar (in memorian). A caminhada foi difícil,
mas não impossível.
AGRADECIMENTOS
A DEUS, meu pastor em todos os momentos. Desfalecimento, incerteza e fraqueza
de corpo e de alma me atingiram. Agraciada por Ele ofereceu-me coragem, fé e
determinação. Fortaleceu-me a prosseguir nas trilhas e rumos que a vida traçou, Ele
próprio carregou-me nos braços. Ao meu Senhor e meu Deus, louvor e glória.
À Maria, Senhora de todas as Senhoras, Senhora Aparecida, que me cobriu com
Seu manto Sagrado, aliviando-me, acalmando-me e permanecendo junto a mim nos
momentos de aflição.
A minha alma gêmea, Luiz Cornicelli, meu companheiro fiel de todas as horas.
Obrigada, meu amor, por sua compreensão mesmo incompreendida, por seu
incentivo quando percebia meu esmorecimento. Essencial foi sua presença e
contribuição, ouvindo atento a produção que pouco a pouco ia se constituindo. Amo
você!
Aos meus filhos, Kamilla, Luigi e Isabella, por me entenderem e me amarem. As
batalhas enfrentadas valeram à pena, por ver em seus olhos e em seus corações o
orgulho desta mãe. Amor incondicional...
Aos meus netos de hoje, Arthur e Sofia, que me sustentaram com seu amor e
meiguice. Ser avó é muito gratificante. Na voz de Rachel de Queiroz “Netos são
como heranças: você os ganha sem merecer. Sem ter feito nada para isso, de
repente lhe caem do céu. É, como dizem os ingleses, um ato de Deus. ...”. À medida
que o cansaço e o sofrimento me abateram, vocês foram a energia que se encrustou
em mim para que depois dos doces encontros, voltasse à jornada. Vovó ama muito
vocês.
As minhas irmãs Nair, Ida e Sonia, por não me permitirem sentir sozinha. Vocês são
meu porto seguro.
Ao Jonathan Felizari por me auxiliar com a localização das Escolas rurais no mapa e
tratar as imagens deste trabalho e a Kamilla Cornicelli por me ajudar com a
digitalização das fotos e documentos.
A Neuza Maria Julião Fortunato, Diretora do Departamento de Educação, pela
amizade e apoio constante na jornada profissional. Por abrir o acervo documental e
histórico das escolas do município de Astorga para que essa pesquisa fosse
concretizada. Agradecida eternamente.
Aos colegas de trabalho do Departamento de Educação de Astorga, principalmente
à Vilma
Maria Spinella de Almeida e Daíse de Oliveira Campos Barduzzi, por
compreenderem minha justa ausência e se desdobrarem no setor do Ensino
Fundamental na rotina diária. À Aparecida Garcia pela empenho na separação das
fontes e documentos relacionados a Educação Rural de Astorga. À Sueli Ferrari que
com sua memória e experiência auxiliou na busca das fontes vivas e documentais e
na exata demarcação da localização das 35 escolas rurais de Astorga. Aos demais
colegas pelo essencial apoio e incentivo.
À sempre amiga Roseli Gall do Amaral Silva pelo apoio incondicional. Se não fosse
seu incentivo e sabedoria, com certeza, os rumos seriam outros. Mesmo traçando
outro caminho se fez presente no momento que mais precisei. Obrigada, irmã.
Aos colegas da Faculdade Astorga por abrirem possibilidades de estudo. Todos
vocês contribuíram com meu crescimento profissional e humano.
A Ex Inspetora de Ensino, Maria José Lopes, aos ex professores e alunos da escola
Rural Água Astorga, Orendina Carolina de Deus, Maria Zélia Cardoso dos Santos,
Sebastião Simão dos Santos, Jandira Malta, Maria José Malta e Sueli Malta Perugini
pela contribuição dada à História da educação de Astorga, por meio deste mergulhar
no tempo.
À secretaria do PPE, nas pessoas do Hugo e da Márcia pela solicitude e ao Jeferson
e a Margareth pelo bom atendimento na PEN.
À profª Drª Sandra Aparecida Pires Franco, pelas orientações na qualificação, por
aceitar e continuar participando da minha caminhada acadêmica. Meu orgulho
eterno.
Às professoras Drª Maria Cristina Gomes Machado e Drª Fátima Maria Neves pela
valiosa contribuição no momento de qualificação e a profª Drª Elaine Rodrigues.
Levarei comigo, nas trilhas por onde passar, o conhecimento adquirido nas aulas de
mestrado.
A minha orientadora, profª Drª Ednéia Regina Rossi, pela competência,
profissionalismo e humanidade que me fez parar e pensar diversas vezes sobre os
trilhos por onde passei. Você, além de orientadora, foi minha amiga! Deus não dá a
cruz maior do que se possa carregar, pois Ele coloca intercessores, verdadeiros
anjos na caminhada para aliviar as dores, amenizar o peso, ajudar a carregar a cruz.
O medo, as incertezas e o desânimo me abateram durante o trajeto e você confiou
em mim. Abraçou-me, deu-me seu apoio em todos os momentos de dor. Você bem
sabe que não foi fácil, mas, teria sido impossível sem você ao meu lado.
Eternamente agradecida.
Muito obrigada a todos!
"Mas tudo está sempre por fazer, e em primeiro
lugar nós mesmos" (Gaston Bachelard).
CORNICELLI, Elena Pericin Gomes. HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO RURAL DE
ASTORGA: PRÁTICAS EDUCATIVAS E ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL DA
ESCOLA RURAL ÁGUA ASTORGA (1957-1980) 121 f. Dissertação (Mestrado em
Educação) – Universidade Estadual de Maringá. Orientadora: Ednéia Regina Rossi.
Maringá, 2015.
RESUMO
Esta investigação se insere no campo da História e Historiografia da Educação, de
caráter documental e descritivo, tem como objetivo investigar a história da Educação
Rural do município de Astorga, contada por meio das práticas educativas da Escola
Rural Água Astorga no período de 1957 a 1980. A delimitação temporal se fez a
partir de 1957, ano do início das atividades da Escola Rural Água Astorga e 1980
período de mudanças nas práticas educativas, tendo em vista a implantação das
novas orientações da LDB nº. 5.692/71. A cultura escolar é tomada como categoria
de análise buscando discutir componentes como o tempo e espaço escolar; a
materialidade; as relações interpessoais; os métodos de ensino e de avaliação; o
disciplinamento dos atores; a profissão docente. Autores como Michel de Certeau
(1982) e Dominique Julia (2001) contribuíram com o diálogo. Os aportes
metodológicos estão vinculados aos estudos de Marcus Levy Bencostta (2011) e
Marieta Moraes Ferreira (2002). Para o debate específico da Educação Rural,
buscaram-se autores mais recentes da historiografia como Faria Filho e Vidal (2000),
Leite (2002), Bezerra Neto (2003), Passador (2006), Marinho (2008), Schelbauer e
Gonçalves Neto (2013), Schelbauer (2014). Como fontes deste trabalho foram
utilizadas: Decreto nº. 001/80, Plano de Implantação da Lei nº. 5.692/71, livro-ata de
reuniões mensais de 1961 a 1970, livro ata de reunião de Associação Pais e
Mestres (1972 – 1980); livros de frequência da Escola Municipal Rural Água Astorga,
livros de frequência da Escola Isolada de Ossórida dos anos de 1949, 1960, 1965 e
1968, rotas do transporte escolar, Catálogo intitulado: “Astorga 1979” e o Livro: Os
municípios sua História & sua Gente – Astorga (1980). Ainda foram realizadas
análises de dados qualitativos por meio de entrevistas semiestrutradas no intuito de
perceber a mudança de mentalidade dos profissionais da educação tendo em vista a
troca da legislação e as diversas relações que a Inspetoria de Educação construiu
com os professores das escolas rurais do município de Astorga. Com esse estudo
pode-se compreender as diversas relações ocorridas no âmbito escolar,
especialmente as sucedidas na Escola Rural Água Astorga, sendo que, a mudança
na legislação exigindo uma melhor formação não foi acompanhada de mudanças na
estrutura das escolas rurais, o professor continuou atuando nos mesmos locais
afastados e precários realizando múltiplas funções.
Palavras-chave: História e Historiografia da Educação. Educação Rural. Educação
Rural do município de Astorga. Escola Rural Água Astorga. Práticas Educativas.
CORNICELLI, Elena Pericin Gomes. HISTORY OF RURAL ASTORGA
EDUCATION:
EDUCATIONAL
PRACTICES
AND
INSTITUTIONAL
ORGANIZATION FROM OF THE RURAL SCHOOL ÁGUA ASTORGA (1957-1980)
121 f. Dissertation (Master of Education) – State University of Maringá. Advisor:
Ednéia Regina Rossi. Maringá, 2015.
ABSTRACT
This research is within the field of History and Historiography of Education, document
and descriptive character, aims to investigate the history of Rural Education in the
city of Astorga, was told through the educational practices of the Rural School Água
Astorga, in the period from 1957 to 1980. The temporal delimitation was made from
1957 year of the beginning of the activities of the Rural School Água Astorga and
1980s period of change in educational practices, with a view to implementation of the
new guidelines of the LDB no. 5,692 / 71. The school culture is taken as a category
of analysis, attempt to discuss components such as time and space school;
materiality; interpersonal relations; the teaching and assessment methods; the
discipline of the actors; the teaching profession. Authors such as Michel de Certeau
(1982) and Dominique Julia (2001) contributed to the dialogue. The methodological
contributions are tied to studies Marcus Levy Bencostta (2011) and Marieta de
Moraes Ferreira (2002). For the specific discussion of Rural Education, we searched
for recent authors of historiography as Faria Filho and Vidal (2000), Faria Filho
(2000), Leite (2002), Bezerra Neto (2003), Passador (2006), Marinho (2008),
Schelbauer and Gonçalves Neto (2013), Schelbauer (2014). As sources of this work
were used: the Decree no. 001/80, Implementation Plan of Law. 5692/71, minutes
book of monthly meetings from 1961 to 1970, the minutes book of meeting Parent
and Teacher Association (1972-1980); books frequency of the Rural School Água
Astorga, frequency books Ossórida Isolated School in the years 1949, 1960, 1965
and 1968, the school transport routes, entitled Catalog "Astorga 1979" and the Book:
The municipalities its history and its people – Astorga (1980). They were still carried
out analyzes of qualitative data through organized interviews in order to realize the
change in the mindset of education professionals with a view to exchange of the
legislation and the various relationships that the Inspectorate of Education has built
up with teachers in rural schools of the city Astorga. With this study, we can
understand the different relationships occurring within the school, especially the
successful in Rural School Água Astorga, being that, the change in the legislation
requiring a better training was not accompanied by changes in the structure of rural
schools, the teacher continued acting in the same distant locations and precarious
performing multiple functions.
Keywords: History and Historiography of Education. Rural Education. Rural
Education in the city of Astorga. School of Rural Água Astorga. Educational
Practices.
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1: Propaganda usada para divulgar o empreendimento ofertado pela
Empresa Colonizadora São Paulo/Paraná em 1920 ................................................. 34
FIGURA 2: Instalações da Serraria Santa Terezinha, propriedade de José Pinto e
filhos, 1949 ................................................................................................................ 39
FIGURA 3: Década de 1940, início do desenvolvimento de Astorga ........................ 40
FIGURA 4: Igreja Matriz de Astorga em 16 de abril de 1949. ................................... 41
FIGURA 5: Primeiro posto de combustível da cidade construído em alvenaria
demonstra o início do desenvolvimento da cidade na década de 1950. ................... 42
FIGURA 6: Primeira Escola de Astorga em 16 de abril de 1949. .............................. 45
FIGURA 7: Escola Estadual Rural Sória São Bento em 1972. .................................. 50
FIGURA 8: Escolas Rurais instadas na década de 1950. ......................................... 51
FIGURA 9: Planta baixa da escola indicando suas dependências e respectivas
metragens ................................................................................................................. 70
FIGURA 10: Fachada da Escola Municipal Água Astorga. ....................................... 71
FIGURA 11: Escola Municipal Rural Água Astorga. .................................................. 72
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1: Dados proporcionais do analfabetismo no Brasil na década de 1950.. 28
GRÁFICO 2: Taxa de alfabetização e de analfabetismo para pessoas com 15 anos
ou mais no Brasil, entre as décadas de 1950, 1960, 1970 e 1980 ............................ 30
GRÁFICO 3: Variação de alunos da primeira escola rural de Astorga ...................... 49
GRÁFICO 4: População recenceada e situação de domicílio. .................................. 55
GRÁFICO 5: Índice das instalações de escolas rurais no município de Astorga nas
décadas de 1950, 1960 e 1970; ................................................................................ 56
GRÁFICO 6: Comparação da porcentagem referente a instalação das escolas rurais
na década de 1960. ................................................................................................... 57
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 14
2. A EDUCAÇÃO RURAL: DISCUSSÕES EM TORNO DO TEMA ......................... 21
2.1 Mais uma pausa para o debate: História da Educação Rural no Brasil e no
Paraná ....................................................................................................................... 25
3. VIAJANDO PELAS TRILHAS DA HISTÓRIA DO MUNICÍPIO DE ASTORGA ... 33
3.1 Primeiros Investimentos ...................................................................................... 39
4. PRIMEIROS OLHARES PARA A EDUCAÇÃO DO MUNICÍPIO DE
ASTORGA ................................................................................................................ 44
4.1 As Escolas Municipais Rurais do Município de Astorga ...................................... 48
5. TRAÇOS E TRILHAS DA ESCOLA RURAL ÁGUA ASTORGA ......................... 59
5.1 Início de suas Atividades ..................................................................................... 60
5.2 Traços da Materialidade ..................................................................................... 66
5.3 Rotina Escolar .................................................................................................... 74
5.4 Traços do Relacionamento.................................................................................. 80
5.5 Traços da Avaliação ............................................................................................ 83
5.6 Percursos da Profissão Docente ......................................................................... 90
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 97
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 101
ANEXOS ................................................................................................................... 106
APÊNDICE ................................................................................................................ 117
1. INTRODUÇÃO
O presente estudo tem como objetivo investigar a história da educação rural
paranaense, em particular, com a do município de Astorga, contada por meio das
práticas educativas da Escola Rural Água Astorga no período de 1957 a 1980.
A delimitação temporal se fez a partir de 1957, ano do início das atividades da
Escola Rural Água Astorga, sendo que em 1961 ocorrera sua implantação oficial. As
trinta e cinco escolas rurais existentes1, sendo trinta municipais e cinco estaduais,
tiveram suas atividades reguladas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDBEN) nº. 4.024/61. Por outro lado, a década de 1980 seria um período
de mudanças nas práticas educativas, tendo em vista o final do período em que a lei
prescrevia a obrigatoriedade de implantação das novas orientações da LDB nº.
5.692/712.
O interesse pelo tema surgiu a partir dos estudos e reflexões realizadas no
grupo de pesquisa História da Educação Brasileira, Instituições e Cultura Escolar HEDUCULTES3, da Universidade Estadual de Maringá, cujas pesquisas estão
relacionadas às Instituições e à Cultura Escolar4.
Os debates realizados no grupo de pesquisa foram a mola propulsora para
buscar nos arquivos do Departamento de Educação de Astorga fontes para
pesquisa. Compondo a equipe de Assessoria Pedagógica do Ensino Fundamental
FASE I, na função de coordenar a organização do ensino e encaminhamentos
pedagógicos, uma grande proximidade com as escolas do município e com a prática
educativa do cotidiano foi possível estabelecer.
1
Devido ao recorte temporal a Escola Rural José Franco Baeza instalada no ano de 1989, após as
mudanças legais, não foi contabilizada nos dados deste trabalho.
2
A Lei prescreve 10 anos como prazo de adaptação às novas orientações.
3
História da Educação Brasileira, Instituições e Cultura Escolar - HEDUCULTES. O objetivo central
do grupo é inserir-se no campo das discussões acerca da pesquisa e do ensino de história da
educação no Brasil, com ênfase nas abordagens, conceitos, fontes, objetos e métodos. Aprofundando
conhecimentos acerca da cultura escolar, da imprensa periódica de grande circulação e também da
pedagógica, do campo disciplinar da História da Educação, das instituições educativas e da infância.
4
Pesquisas tendo como categoria de análise as instituições e cultura escolar foram desenvolvidas
pelo grupo de pesquisa HEDUCULTES - UEM, sendo “A institucionalização da Educação pré-escolar
municipal de Maringá: do “parqpuinho infantil” à Unidade Polo de Ação da Pré-Escola – UPAPE (1969
- 1974) de Priscila Viviane Souza (2014); “Cultura escolar: Colégio Paroquial Santo Inácio, suas
festas e comemorações (1957 – 1965)” de Geslaine Cristina Tamião Piola (2013); “Campo disciplinar
e cultura escolar: a trajetória do ensino da arte no curso Normal/Magistério, no Colégio Estadual São
Vicente de Paula (Nova Esperança. PR, 1971 – 1997)” de Rosimara Albuquerque Mello.(2013)
15
Na vivência diária e experiências pedagógicas com todos os profissionais da
educação das escolas municipais de Astorga, percebeu-se, ao manusear os
documentos históricos, que outras experiências foram vivenciadas por sujeitos, em
tempos e espaços distintos. Essas vivências estavam adormecidas e esquecidas na
memória ou nos documentos.
Assim, ao verificar que não foi encontrada nenhuma pesquisa sobre a história
da educação Rural de Astorga, suscitou tal interesse e por meio da permissão da
Diretora do Departamento Municipal de Educação deste município, tive acesso aos
arquivos existentes e iniciei o reconhecimento das fontes. Os documentos continham
dados e informações, sendo materialidades importantes que preservavam parte da
história da Educação Rural de Astorga.
No reconhecimento das fontes, algumas lacunas dificultavam entender as
vivências da educação rural. As relações que permearam o período demarcado
fizeram surgir os seguintes questionamentos: Quais as motivações que levaram os
professores a realizarem uma formação específica para continuarem lecionando nos
mesmos locais distantes e precários? Quais as modificações alcançadas, após a
mudança da legislação? As funções do professor das escolas rurais mudaram? O
método de ensino era outro? Houve modelos diferenciados de avaliação? As
relações entre a inspetoria de educação e professores sofreram alterações? Esses
são alguns dos questionamentos que deram um norte à pesquisa.
Diante das indagações e das possibilidades do objeto, pesquisar sobre a
educação rural seria desafiador. Como mapear as informações de todos os
professores que atuaram nas escolas rurais? Alguns poderiam ter se mudado para
outra cidade, outros falecidos, há quem não seria identificado, desprovida de
registros, pois parte dos documentos foram perdidos e/ou esquecidos pelo tempo.
No princípio da investigação as fontes que possuíamos, para construir uma narrativa
sobre a história da educação rural de Astorga, resumiam-se nos livros atas de
aprovação, atas de reuniões da Associação de País e Professores (APP) e livros de
registro de frequência com informações fragmentadas. Os poucos dados de que
dispunha impulsionaram-me à busca de outras fontes de pesquisa.
Com este primeiro reconhecimento, sentiu-se a necessidade de verticalizar a
investigação, delimitando o objeto de pesquisa para uma vivência, um caso em
particular. Assim, decidiu-se tomar a Escola Municipal Rural Água Astorga como
lócus de investigação. A escolha se justifica pelo fato dessa escola ser uma das
16
primeiras criadas e, acrescenta-se o fato de seu ex-professor ser um atual morador
na cidade de Astorga, o que facilitaria a coleta das fontes orais.
Feitas as primeiras definições, iniciou-se a investigação das produções sobre
a educação rural nos Programas de pós-graduação de quatro Universidades do
Paraná, sendo elas: Universidade Estadual de Londrina; Universidade Estadual de
Maringá; Universidade Estadual de Ponta Grossa e Universidade Federal do Paraná.
Ao adentrar nas discussões propostas sobre a educação rural no estado do
Paraná, observou-se que o objeto escolhido mostra-se como um problema
pertinente, uma vez que alguns estudos realizados revelam dados a respeito da
história da Educação Rural no Brasil de forma mais geral. Em relação ao Estado do
Paraná, poucos estudos foram realizados, havendo muitas lacunas no que diz
respeito à história regional e local.
Mesmo tendo a dificuldade de encontrar estudos sobre a educação rural, a
construção da dissertação foi ganhando envolvimento e interesse a cada dia e,
várias vezes foram necessárias voltar às mesmas fontes, direcionando o olhar a elas
e descobrindo outras possibilidades, outros caminhos e outras direções. Vale
ressaltar que esse movimento ora se apresenta como motivação, ora como
desespero, porém, essas desestabilizações impulsionaram a continuidade da
pesquisa.
O processo de localização das fontes escritas e oficiais foi demorado e, ao
final dele, foram selecionados os seguintes documentos: decreto de criação das
escolas rurais; processos de autorização, de renovação e cessação das escolas
rurais de Astorga; livros de registros de matrícula e frequência, livros-atas, livros de
avisos, livro de reuniões, livros-pontos, processos de implantação de leis, e rotas do
transporte escolar. Todos estes documentos estão conservados no Departamento de
Educação de Astorga e organizados em caixas-arquivos por ordem cronológica.
As práticas educacionais tiveram os registros feitos em livros específicos, mas
muitos deles se perderam com o tempo, sobretudo os da década de 1950 e 1960.
Contudo, um livro de frequência foi entregue no início de 2013 ao Departamento de
Educação, por uma professora aposentada que lecionou em uma escola rural do
município, sendo disponibilizados para a pesquisa mais três que estavam sob sua
guarda, esses dos anos de 1949, 1960, 1965 e 1968. Neles há registros do nome e
quantidade de alunos, frequência, nome da escola, da professora, mês e ano.
17
Trezentos e noventa e sete livros de chamada de todas as escolas rurais estão
guardados no Departamento de Educação.
Os documentos localizados nos arquivos do Departamento de Educação
tratam de períodos e assuntos diferentes, por isso a primeira providência foi a de
separar, dentre os documentos, as fontes da pesquisa. Destarte, como fontes deste
trabalho serão utilizadas: o Decreto nº. 001/80, o Plano de Implantação da Lei nº.
5.692/71do Município de Astorga, Plano de Implantação da Lei nº. 5.692/71 do
Estado do Paraná, livro ata de reuniões mensais de 1961 a 1970, livro ata de
reunião de Associação Pais e Mestres (1972 – 1980); livros de frequência da Escola
Municipal Rural Água Astorga, livros de frequência da Escola Isolada de Ossórida
dos anos de 1949, 1960, 1965 e 1968, além das rotas do transporte escolar.
No rastreamento das fontes, outros documentos foram localizados no Arquivo
da Biblioteca Municipal de Astorga: três catálogos impressos elaborados pela
administração do município dos anos de 19795, 19886 e 19927. Tais catálogos
tinham como objetivo divulgar as realizações das respectivas administrações, sendo
abordadas questões educacionais em que foram referenciados os empreendimentos
realizados nas escolas rurais de Astorga. Para a presente pesquisa foi utilizada
como fonte a revista “ASTORGA 1979”.
O livro “Os municípios sua História & sua Gente – Astorga”8, conta a história
da cidade de Astorga por meio de depoimentos de moradores e pioneiros da cidade,
no final da década de 1970. Sua narrativa tem o objetivo de registrar a colonização e
desenvolvimento do município nos diversos aspectos econômico, político, cultural,
educacional, histórico, entre outros.
Além da pesquisa em fontes escritas e iconográficas, optou-se, também, pelo
desenvolvimento da pesquisa oral, de caráter qualitativo. Foram entrevistados uma
ex-inspetora de ensino do município, três ex-professores da Escola Rural Água
Astorga e três ex-alunas que estiveram presentes, em seu cotidiano, durante o
5
Contendo 38 páginas, a revista intitulada “ASTORGA 1979” foi organizada pelo prefeito Sr. Egídio
Prete e acompanhado por sua equipe.
6
Intitulada “Astorga: olhos voltados para o futuro, 5 anos da administração João Zampieri”, edição
especial da Revista Paranaense em setembro de 1988, faz um balanço dos 5 anos da
administração.
7
Com o objetivo de promover e divulgar os feitos pela a administração do Sr. Francisco Carlos
Londero Benetti, a revista produzida em 1992 teve como responsável o jornalista o Dr. José de
Arimatéia. A impressão ficou a cargo da empresa Art & Cia de Londrina-PR.
8
Publicado em agosto de 1980 pela Cendí Editora S/C LTDA. O livro foi distribuído gratuitamente
pela Prefeitura, para todas as escolas do município, biblioteca municipal e Secretarias da Prefeitura.
18
período de 1957 a 1980. Em relação à História Oral, metodologia de pesquisa
caracterizada pelos testemunhos orais, foi necessário que:
Os instrumentos para se atingir tais objetivos seriam a formulação,
no caso dos estudos acadêmicos, de roteiros de entrevistas
consistentes, de maneira a controlar o depoimento, bem como o
trabalho com outras fontes, de forma a reunir elementos para realizar
a contraprova e excluir as distorções (FERREIRA, 2002, p.327).
Os depoimentos orais são reconhecidos como meio eficaz de compor os
espaços não preenchidos pelas fontes escritas. Nesse sentido, é possível incorporar
outros elementos de investigação reintegrando o papel do indivíduo no processo
social e enfraquecendo as “[...] desconfianças quanto à utilização da história oral”
(FERREIRA, 2002, p.328).
Como aporte teórico da pesquisa, optou-se pelos estudos de Certeau (1982)
e Julia (2001). O primeiro sinaliza que a composição da narrativa historiográfica não
consiste apenas em descrever simplesmente o fato vivido, pois, o vivido não existe a
não ser quando relatado. Nesta perspectiva, o fato vivido se torna história à medida
que é contada a outras pessoas, sendo este o trabalho do historiador. Por outro
lado, as reflexões em torno da cultura escolar como objeto de pesquisa, possibilita
observar as mutações e permanências resultantes do entrelaçar dos diferentes
modos de pensar e agir ao longo do tempo. Para Julia (2001):
[...] no momento em que uma nova diretriz redefine as finalidades
atribuídas ao esforço coletivo, os antigos valores não são, no
entanto, eliminados como por um milagre, as antigas divisões não
são apagadas, novas restrições somam-se simplesmente às antigas
(JULIA, 2001, p. 23).
Por essa óptica, adentrar no campo da história permite investigar as
particularidades levando em consideração as estruturas e mecanismos que regulam
suas práticas de sentidos e sua forma de fazer história.
O estudo se desenvolveu por meio das metodologias de pesquisa
bibliográfica, documental, iconográfica e oral. A análise das imagens iconográficas
se apoiou na perspectiva exposta por Bencostta (2011, p. 401) que se refere à
utilização de iconografia como fonte de pesquisa, sendo ela “[...] suporte material da
memória e testemunho da informação histórica [...]”. Por outro lado:
19
A fotografia ou um conjunto de fotografias não reconstituem os fatos
passados. A fotografia ou um conjunto de fotografias apenas
congelam, nos limites do plano da imagem, fragmentos
desconectados de um instante de vida das pessoas, coisas,
natureza, paisagens urbana e rural. Cabe ao intérprete compreender
a imagem fotográfica enquanto informação descontínua da vida
passada, na qual se pretende mergulhar (KOSSOY, 2001, p.114115).
Assim, o diálogo com outras fontes é salutar, implicando na ação de conferir a
memória, checar as fontes e as representações históricas, nas palavras de Le
Goff:“[...] confrontar as representações históricas com as realidades que elas
representam é que o historiador apreende mediante outros documentos e métodos
[...]” (LE GOFF, 2003, p. 12).
Para apresentação dos resultados optou-se pela estruturação do texto em 5
seções, distribuídos da seguinte forma: a introdução, como primeira seção,
preocupa-se em apresentar a finalidade da pesquisa, a sua periodização, o percurso
de localização dos documentais que compõem o acervo público do município de
Astorga, as fontes de pesquisa, os interlocutores de pesquisa, bem como os autores
do campo teórico e metodológico que deram forma a esta pesquisa.
Na segunda seção é organizado o levantamento das discussões dos últimos
10 anos relacionadas à Educação Rural no Brasil e no Paraná em quatro programas
de Pós-Graduação do Estado do Paraná e também em estudos de historiadores
nacionais. A revisão de literatura se apoiou, portanto, nas produções mais recentes
sobre o tema e em autores como Faria Filho e Vidal (2000), Faria Filho (2000), Leite
(2002), Bezerra Neto (2003), Passador (2006), Marinho (2008), Schelbauer e
Gonçalves Neto (2013), Schelbauer (2014), que ajudaram a compor o debate em
torno da educação rural do Brasil e do Paraná. O levantamento permitiu visualizar a
ínfima produção do cenário paranaense.
Iniciando as discussões de minha pesquisa, considerações históricas sobre o
município de Astorga foi o debate proposto na terceira seção, sendo traçado um
panorama desde o início da colonização até o desenvolvimento da cidade,
apontando aspectos sociais, econômicos, políticos e culturais daquele período.
As primeiras iniciativas educacionais no município de Astorga foi o tema
proposto na quarta seção, sobretudo no movimento das ações presentes na
Educação Rural do município de Astorga.
20
Na quinta e última seção afunilamos a investigação “fitando os olhos” para a
rotina dos sujeitos que pertenceram a comunidade da Escola Municipal Rural Água
Astorga, no final da década de 1950 e nas décadas de 1960, 1970 e 1980. A seção
foi composta fundamentalmente de entrevistas, que revelaram aspectos importantes
para a construção da memória da Educação Rural de Astorga. Carregadas de
significações, as lembranças e as recordações, dos sujeitos que vivenciaram a
trajetória da escola, foram confrontadas com outras fontes permitindo desvendar
aspectos importantes da história da educação local.
Revisitar o tema da história da educação rural paranaense, por meio de uma
escola rural do Município de Astorga, significou adentrar no terreno propriamente
escolar, nos seus costumes e tradições, observando o movimento de suas rupturas
e continuidades. Cabe ao historiador no processo de desvendamento utilizar a
imprecisão buscando à “[...] dúvida, talvez da suspeita, por certo, na qual tudo é
posto em interrogação, pondo em causa a coerência do mundo. Tudo o que foi dito,
um dia contado de uma forma, pode vir a ser contado de outra” (PESAVENTO, 2004,
p. 15 -16). Assim, a motivação para a pesquisa não foi somente atrelada à busca por
preencher espaços e lacunas percebidas no início da pesquisa, sobretudo, para
compreender as relações educacionais estabelecidas entre alunos, professores e
Inspetoria de Ensino.
21
2. A EDUCAÇÃO RURAL: DISCUSSÕES EM TORNO DO TEMA
Para o reconhecimento do debate mais recente acerca da história da
educação rural do Paraná optou-se por mapear a produção existente em torno do
tema, circunscrito ao período de 1950 a 1980, dos últimos 10 anos nas produções
dos Programas de Pós-Graduação em Educação do Paraná9, sendo eles o da
Universidade Estadual de Maringá (UEM); da Universidade Federal do Paraná
(UFPR); da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e da Universidade
Estadual de Londrina (UEL).
A produção de teses e dissertações dos quatro programas foi levantada com
o objetivo de conhecer a produção historiográfica em torno da temática da Educação
Rural no Estado do Paraná, sendo possível perceber que há pouca investigação
sobre a periodização. Constatou-se que as produções existentes concentram sua
temática a partir da década de 1990, quando se vê surgir outra nomenclatura, a
saber, a educação do campo.
De acordo com as Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná, na história da
educação rural, os povos campesinos eram reconhecidos como indivíduos
indefesos, vivendo em um local de atraso. “Trata-se do rural pensado a partir de uma
lógica economista, e não como um lugar de vida, de trabalho, de construção de
significados, saberes e cultura” (SEED-PR, 2006, p. 24). Por outro lado, a nova
terminologia, segundo as mesmas diretrizes, surgiu do entendimento de Educação
do Campo que se consolidou a partir dos movimentos sociais ocorridos no final do
século XX, expondo que a Educação do Campo tem como referência “[...] a
identidade e cultura dos povos do campo, valorizando-os como sujeitos que
possuem laços culturais e valores relacionados à vida na terra” (SEED-PR, 2006, p.
24).
A mudança na nomenclatura revela uma diferenciação que exprime
mentalidades distintas para o mesmo espaço, demonstrando que o campo deve ser
considerado um local de produção de trabalho, de cultura e de conhecimento,
relacionando-os com o próprio modo de ser e viver.
9
Pesquisas da educação rural/campo de outros estados brasileiros foram desenvolvidas nos Programas de Pós
Graduação pesquisados, mas o mapeamento pautou-se somente nos números das produções que caracterizavam a
Educação Rural/Campo do Paraná, tendo o recorte temporal os últimos dez anos.
22
Segundo Vendramini (2007), o termo Educação Rural foi utilizado até o ano
de 1998, quando vários educadores, integrantes do MST e representantes de
Universidades se reuniram para a primeira Conferência Nacional “Por uma
Educação Básica do Campo”. Nesse momento foi inaugurada a expressão
Educação do Campo e não mais Educação Rural, por “[...] reafirmar a legitimidade
da luta por políticas públicas específicas e por um projeto educativo próprio para os
sujeitos que vivem e trabalham no campo” (VENDRAMINI, 2007, p. 123).
As discussões envoltas a essa temática resultaram, em 2006, nas
preliminares das Diretrizes Curriculares da Educação do Campo para o Estado do
Paraná, fomentando o seguinte argumento:
Caracterizada como o resgate de uma dívida histórica do Estado aos
sujeitos do campo, que tiveram negado o direito a uma educação de
qualidade, uma vez que os modelos pedagógicos ora
marginalizavam os sujeitos do campo, ora vinculavam-se ao mundo
urbano, ignorando a diversidade sociocultural do povo brasileiro [...]
(PARANÁ, 2006, p. 9).
O I Seminário Estadual da Educação do Campo, ocorrido entre 09 e 11 de
março de 2005, teve como um de seus objetivos “[...] fortalecer e difundir a
identidade do campo” (PARANÁ, 2008, p. 65). Em debate realizado após palestra
proferida por Arroyo nesta mesma conferência, o autor fez o seguinte
questionamento:
A Educação do Campo tem de ser outra porque o campo hoje é
outro, não porque há outro modelo de escola para o campo diferente
da cidade, ou mesmo um modelo da cidade igual para o campo. Não
se trata de modelos de escolas, trata-se de como os seres humanos
vivem, humanizam-se ou se desumanizam-se, formam-se sujeitos
mentais, sociais, éticos, de cultura, de identidade, em cada tempo da
vida, em cada momento histórico. Esse deve ser nosso horizonte
(PARANÁ, 2008, p. 50).
É possível observar que a alteração de expressão traz uma mudança de
mentalidade, em que serão valorizadas as minorias e suas identidades. Esclarecida
a mudança de nomenclatura, sinalizo para a complexidade que envolve o estudo da
educação destinada aos sujeitos do campo e esclareço que neste trabalho, por
possuir seu recorte temporal nas décadas de 1960 a 1980, utilizarei a expressão
educação rural.
23
No levantamento de dados destacamos que nos arquivos eletrônicos do
Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual de Maringá
não foi encontrada nenhuma referência em relação à história da educação rural em
particular, mas foram localizadas duas produções que trabalham com a temática da
Educação do Campo, produções que se somam aos estudos mais recentes do tema
e da luta pela educação do Movimento Sem Terra (MST).
Os dois trabalhos abrem um debate sobre a Educação do Campo: um, na
modalidade de Jovens e Adultos e o outro, em políticas especificas para o campo.
As duas pesquisas trazem aspectos em torno da história da educação rural, aspecto
que acabei por me ater em função de interesse particular na pesquisa.
A próxima investida direcionou-se ao Programa de Pós-graduação em
Educação da Universidade Estadual de Londrina, onde não há nenhum estudo sobre
a história da Educação Rural do Paraná.
No Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do
Paraná foi encontrado um trabalho que se aproxima da temática de interesse da
Educação Rural ou Campo do Estado do Paraná. A dissertação intitulada “A escola
do campo e seu significado: o ponto de vista de professores e professoras da rede
estadual de educação do Paraná”, de Marciane Maria Mendes (2009), propõe uma
reflexão em relação às políticas para a educação rural, historicizando a Educação do
Campo por meio das políticas estabelecidas às escolas e ao “povo” do meio rural. A
partir das análises das políticas públicas para o ensino na zona rural, a autora
considera que houve um abandono dessa educação no decorrer do tempo.
A autora, ao direcionar a atenção para a legislação brasileira, assinala que a
partir da aprovação da Constituição Federal de 1934 iniciou-se um olhar tímido para
essa modalidade. Ao fazer essa afirmação faz referência ao parágrafo único do
artigo 156 da referida lei: “Para a realização do ensino nas zonas rurais, a União
reservará no mínimo, vinte por cento das cotas destinadas à educação no respectivo
orçamento anual” (BRASIL, 1934).
Da mesma maneira, destaca que foram incluídas regras gerais para a
educação, sem especificações diretas ao ensino rural na Constituição de 1937, em
seu artigo 132. Vejamos:
O Estado fundará instituições ou dará o seu auxílio e proteção às
fundadas por associações civis, tendo umas; e outras por fim
24
organizar para a juventude períodos de trabalho anual nos campos e
oficinas, assim como promover-lhe a disciplina moral e o
adestramento físico, de maneira a prepará-la ao cumprimento, dos
seus deveres para com a economia e a defesa da Nação (BRASIL,
1937).
Em consonância com a Constituição de 1937, a de 1946 também não faz
menção específica à Educação Rural, contudo estabelece regras gerais para o
ensino, enunciando em seu art. 172 que “Cada sistema de ensino terá
obrigatoriamente serviços de assistência educacional que assegurem aos alunos
necessitados condições de eficiência escolar” (BRASIL, 1946a).
Dessa forma, a autora expõe que nas primeiras décadas do século XX,
poucas referências foram dadas à Educação Rural nas especificações da legislação
da educação brasileira, inferindo que a Educação Rural estava em consonância às
determinações dadas ao meio urbano.
A história desta educação não é recente, mas só foi percebida,
jurídica e educacionalmente falando, nas primeiras décadas do
século XX, quando os movimentos migratórios entre campo e cidade
se intensificaram e começaram a provocar o aumento da população
das cidades. Isso fez com que se iniciassem discussões mais intensas
em torno da Educação Rural do Brasil (MENDES, 2009, p. 2).
É destacada a pouca atenção dada à educação rural na história da educação
no Brasil, da mesma maneira são evidenciadas as manifestações de grupos
específicos ligados ao campo para que mudanças fossem ocorrendo com o passar
do tempo. A autora observa que o debate em torno da Educação do Campo foi se
intensificando à medida que o campo e a cidade foram se distanciando. Mendes
(2009) sinaliza, também, a mudança conceitual que a educação do campesino
alcançou. Para ela,
O sentido da educação rural aparece quando há referência à política
educacional no início e decorrer do século XX, cuja preocupação era
com ações que pudessem superar o “atraso” presente entre os
trabalhadores e moradores do espaço rural. Já o sentido da
Educação do Campo aparecerá quando estiver em destaque a ação
dos movimentos sociais e as parcerias em desenvolvimento neste
início do século XXI, oriundas da dinâmica social do campo no final
do século XX (MENDES, 2009, p. 4).
25
A diferença conceitual entre os termos rural e campo foi destacada pela
autora, explicando que isso ocorreu por conta das lutas em torno de uma melhor
educação para o campo.
Não se trata, obviamente, apenas de uma mudança de nome; uma
série de transformações aconteceu durante o último século, em
decorrência dos processos de luta por escolarização para as
populações que vivem no campo e essa nova denominação pretende
ser indicativa de uma nova posição diante dessa Escola (MENDES,
2009, p. 3 - 4).
As discussões sobre esta modalidade de ensino não são recentes, porém se
tornaram mais presentes nas primeiras décadas do século XX, à medida que a
migração entre campo e cidade se energizou e provocou o aumento da população
nos centros urbanos. Isto fez com que se iniciassem discussões mais intensas em
torno da Educação Rural no Brasil.
2.1 Mais uma pausa para o debate: História da Educação Rural no Brasil e no
Paraná
Na aproximação com o debate acerca da história da educação rural
paranaense optou-se por recuperar estudos historiográficos também da educação
rural do Brasil, tendo selecionado publicações dos últimos quinze anos. O diálogo foi
estabelecido com autores como Faria Filho e Vidal (2000), Leite (2002), Bezerra
Neto (2003), Passador (2006) e Marinho (2008).
Segundo Marinho (2008), a educação no meio rural teve, durante muito
tempo, os mesmos moldes da educação da cidade, sem respeitar as peculiaridades
da comunidade campesina, assim:
Autores como Fernando de Azevedo, Maria José G. Werebe e
Vanilda Paiva, falam do fracasso que a proposta educacional
aplicada na zona rural teve, pois levou-se para essa área o mesmo
projeto pedagógico feito e executado na zona urbana e tratou-se o
educando rural como se tratava o urbano, sem dar a ele condições
de viver como o da zona urbana (MARINHO, 2008, p. 12).
É nítido que o referido autor considera que não houve alteração no projeto
pedagógico da escola da zona rural para a escola da zona urbana, fazendo um
26
balanço das políticas educacionais do Brasil. Destaca, ainda, a submissão da
educação rural à educação urbana. Desse modo, a Educação Rural, para Marinho
(2008), teria se configurado de forma anacrônica, retrógrada e antiquada, pois não
fazia emergir mudanças neste meio.
Tomando como princípio o processo de urbanização, Marinho (2008),
retomando as reflexões de Fernando de Azevedo, argumenta que:
Fernando de Azevedo (1953) nos diz que a educação na zona rural,
para levar o homem a despertar-se a desenvolver-se, precisa ser
acompanhada da infra-estrutura necessária para a vida humana, e
não querer que o homem da zona rural viva contemplando o que tem
na zona urbana e vivendo a carência de sua realidade, mesmo que
ele tenha condições intelectuais para transformar o seu meio
(MARINHO, 2008, p. 93).
Marinho (2008) esclarece que para tentar amenizar os problemas advindos do
movimento migratório da zona rural para a urbana, se desencadeou um intenso
movimento denominado ruralismo pedagógico10. Intencionava-se formar o camponês
por meio da escola, fixando-o no campo. Relata, também, que na década de 1930
foi realizada a IV Conferência Nacional da Educação, caracterizada pelo intenso
entusiasmo dos educadores e pela oposição da Igreja Católica que insistia na
educação tradicional.
A meta era acabar com o analfabetismo, considerado o anacronismo frente
aos ideais desenvolvimentistas, apresentando-se como “[...] uma doença e uma
marginalização dentro da sociedade” (MARINHO, 2008, p. 75). Essa iniciativa de
acabar com o analfabetismo no país, teve como finalidade propagar a educação em
todo o espaço rural, disseminar o folclore do povo do campo por meio da ação da
Sociedade Brasileira de Educação Rural, demonstrando a importância dessa
população e abrindo as discussões em torno da educação do povo campesino.
Marinho (2008, p. 69) reporta-se às ideias de Fernando de Azevedo sobre a
“[...] necessidade de pensar na Educação Rural em função do homem que habita a
zona rural.” Essa preocupação estaria atrelada ao movimento ruralista, que tinha
como objetivo lançar formas diferenciadas para a ação educativa do campo.
“Intelectuais e educadores em geral da escola pública aderem ao movimento
10
O termo ruralismo pedagógico foi dado a uma corrente de pensamento surgida no final do
século XIX e início do século XX e tinha como ideal ampliar nacionalmente a formação do homem
do meio rural, fixando-o ao campo por meio do sistema educacional.
27
ruralista com o intuito de determinar formas de ação pedagógicas no campo,
buscando sanar, por intermédio da educação, o êxodo rural” (BEZERRA NETO,
2003, p. 11).
Políticas voltadas à Educação Rural foram pensadas e diversas campanhas
foram realizadas no intuito de problematizar as condições básicas de vida das
populações carentes, especialmente as da zona rural, tentando atingir o mal que o
analfabetismo causava ao país, sendo considerado “fator de segurança nacional”
(LEITE, 2002, p. 32).
Para
Leite
(2002),
as
campanhas
contra
o
analfabetismo
foram
consequências das descontinuidades dos projetos pensados para transformar as
condições de vida do homem ruralista. Distantes dos centros urbanos, falta de
infraestrutura, estradas precárias e sem condições de ir e vir, as comunidades sem
perspectiva foram alvo da bandeira levantada em favor da educação. Em 1950,
campanhas em prol de uma educação de qualidade foram pensadas, propondo
iniciativas voltadas à educação da zona rural. A Campanha Nacional de Educação
Rural (CNER) e do Serviço Social Rural (SSR) foram projetados com o objetivo de
“[...] desenvolverem projetos para a preparação de técnicos destinados à educação
de base rural” (LEITE, 2002, p. 36). A partir desses primeiros programas, CNER e
SSR, o dilatamento de outros foi preciso para atender as expectativas do meio rural,
surgindo, posteriormente, a Campanha de Educação de Adultos e as Missões Rurais
de Educação.
Essas campanhas se fizerem num contexto em que as taxas de
analfabetismo no país eram enormes. O Censo demográfico de 1950 revela os
índices de analfabetismo em relação ao campo e a cidade. Observemos o gráfico:
28
Gráfico 1: Dados proporcionais do analfabetismo no Brasil na década de 1950
Fonte: Censo demográfico de 1950, adaptado de Marinho (2008).
Os dados do Censo apontam que na década de 1950 o agrupamento da
maioria da população no Brasil era na zona rural, já que nesse período, e anterior a
ele, a economia era basicamente agrária. Por esse motivo, o índice de analfabetismo
se concentrou no meio campesino. Após essa data, a especulação em torno de uma
vida próspera rondou os centros urbanos, modificando a distribuição do
analfabetismo.
Na interpretação de Leite (2002), a Educação Rural e a sua expansão se
fizeram à medida que, nas décadas de 1930 a 1950, os setores agrário exportador e
urbano industrial se ampliaram e a política interna do país se amparou nas
expectativas de “inserção do Brasil na modernidade do século XX” (LEITE, 2002, p.
27). Tal iniciativa incidiu, sobretudo, no processo educativo com vistas ao país obter
melhores resultados em nível quantitativo, alavancando o “progresso”.
Leite (2002) retrata que esse processo de expansão era considerado como
“utopia” pelo fato de almejarem democratizar e universalizar a educação, fato que foi
acelerado diante das transformações sociais e econômicas do período.
29
Para Passador (2006, p. 89), “[...] a explicação básica desse processo se
baseia nas profundas modificações11 por que passou a economia brasileira [...]”. A
autora apregoa que,
[...] projetos de educação rural capaz de “fixar o homem a terra” são
ilusórios, pois os trabalhadores rurais abandonam seu trabalho e seu
local de vida e moradia porque não há mais condições políticas e
econômicas de reprodução da vida familiar (PASSADOR, 2006, p.
115).
Para Passador (2006, p.117), a educação do meio rural foi direcionada para
formação de técnicos e que nela se apresentara as “[...] maiores percentagens de
reprovação, ausências às aulas, número de professores leigos e distorções idadesérie”. Para a autora “não existe educação rural, mas fragmentos da educação
escolar urbana introduzida no meio rural” (PASSADOR, 2006, p. 115).
É importante observar que o Censo Demográfico da educação brasileira,
entre as décadas de 1950, 1960, 1970 e 1980, trouxe um significativo aumento na
taxa de alfabetização do país. Vejamos:
11
A autora faz referência às profundas modificações relacionando com a economia brasileira que a
partir da metade do século XX se desestabilizou em decorrência de questões políticas, econômicas
e sociais.
30
Gráfico 2: Taxa de alfabetização e de analfabetismo para pessoas com 15 anos ou mais no
Brasil, entre as décadas de 1950, 1960, 1970 e 1980.
80
70
60
50
40
30
20
10
0
74,5
66,2
60,6
49,4 50,6
39,4
33,8
25,5
1950
1960
Taxa de Alfabetismo
1970
1980
Taxa de Analfabetismo
Fonte: IBGE, Censo Demográfico1950/2000.
Percebe-se que houve um aumento na taxa de alfabetização da população
brasileira acima de 15 anos entre 1950 e 1980, demonstrando que as políticas de
erradicação do analfabetismo no país, resultaram de alguma forma, em mudanças
positivas na estatística nacional. De 51% de analfabetos em 1950 passou-se para
25% em 1980. E de 49% de alfabetizados em 1950, passou-se para
aproximadamente 75% em 1980. Contudo, esse processo se fez em meio a uma
diversidade de ideias e posições.
Em relação ao Estado do Paraná, poucos estudos abordam a história da
educação rural das décadas de 1950 a 1980. Destaco os estudos de Schelbauer e
Gonçalves Neto (2013) que discutem as necessidades regionais e suas
especificidades, enfatizando a importância de criar condições para a manutenção do
brasileiro ruralista. Assim escrevem:
Manter o homem no campo, atender à diversidade das necessidades
regionais, formar professores para educar a população na escola
primária rural, institucionalizar e criar políticas de expansão da escola
primária na zona rural que fosse capaz de preparar homens e
mulheres a resolverem seus problemas regionais e integrarem-se ao
seu mundo rural (SCHELBAUER; GONÇALVES NETO, 2013, p. 87).
31
Os autores destacam a diversidade regional e enfatizam a necessidade de
formação de profissionais que atendessem a essas diferenças integradas ao mundo
rural. A desestabilização do espaço rural e urbano foi percebida no Estado do
Paraná e debatida por Erasmo Pilotto (1954), segundo Schelbauer e Gonçalves Neto:
O debate entre os defensores de uma educação geral, de uma
escola única para o campo e para a cidade versus escola
diferenciada para a zona rural também ocupou a cena no território
paranaense na voz de Erasmo Pilotto ao questionar as finalidades de
tais instituições e a necessidade de aproximá-las do quadro da
educação geral do estado (SCHELBAUER; GONÇALVES NETO,
2014, p. 103).
A polêmica nacional entre uma escola única versus uma escola para o campo
e outra para cidade esteve presente no cenário paranaense e, remonta às primeiras
décadas do século XX.
Antes de adentrar no cenário educacional paranaense, é preciso expor
mesmo que de maneira sucinta, sobre o processo de colonização do Estado do
Paraná. Schelbauer (2014) comenta que a região se desenvolveu em passo
acelerado. O Paraná foi constituído a partir do século XIX pela migração,
primeiramente por paulistas e mineiros e, em seguida, por imigrantes japoneses e
italianos, deslumbrados pelas férteis terras.
No Paraná, o contexto analisado foi marcado pela ocupação do
território, aumento populacional, surgimento dos novos centros
urbanos e colonização das áreas rurais, movimento que não sem
conflitos, foi vislumbrado pelas pessoas da época como um período
de progresso e modernização, no qual a educação foi enfatizada
como um dos fatores desta modernidade (SCHELBAUER, 2014, p.
71).
Os estudos da autora revelam que a inquietação tomada pelo governador
Bento Munhoz da Rocha Neto, na década de 1950, faz menção à necessidade de
assistência ao trabalhador rural, uma problemática apresentada no cenário nacional
que “[...] reside no desamparo e no esquecimento das populações rurais” (PARANÁ,
1951, p. 6).
Ocupado de forma diversa por diferentes grupos étnicos, por
imigrantes europeus e asiáticos e processos de migrações internas,
o Paraná manteve uma forte relação com o mundo rural durante a
fase de ocupação de seu território (SCHELBAUER, 2014, p. 78).
32
A autora aponta dados populacionais demonstrando o rápido crescimento. Em
1940, o Paraná possuía 1.235.849 habitantes, dez anos depois, o número de
habitantes dobrou e na próxima década triplicou. A modificação do espaço tornando
colonizado e urbanizado suscitou um planejamento tanto urbano quanto rural,
estratégias foram pensadas para suprir as necessidades dos habitantes, por isso os
lotes foram demarcados levando em consideração o acesso à água e às vias de
transporte.
Tomadas medidas estruturais, o Estado garantiu acesso à educação tendo
como objetivos “garantir a riqueza do estado”, por meio da formação dos filhos dos
proprietários de lotes e “civilizar” os moradores da área rural, ensinando-lhes além
do convencional, leitura, escrita e cálculos, o cuidado diário com o corpo tendo
hábitos de higiene e “valorização da vida no campo” (SCHELBAUER, 2014, p. 79).
Atrelado às bases federais, políticas educacionais foram criadas pelo governo
paranaense com o objetivo de difundir o ensino primário rural, os recursos
financeiros investidos delegava
ao
estado
a mantença das escolas em
funcionamento, assistência técnica e de materiais. A categoria de Escolas Isoladas
primárias do Paraná monitoradas por um único professor se fazia presente no meio
rural, já que dados apontados anteriormente mostram a concentração da maioria da
população nessa área.
A década de 1950 transcorreu com investimentos na
construção de casas escolares devido à importância que o estado obteve,
assumindo lugar de destaque na economia cafeeira.
Por apresentar característica peculiar de desenvolvimento, o Estado do
Paraná se torna foco de investigação e a educação passa a ser vista como parte
integrante do progresso, alvo de debates e lutas. Schelbauer (2014) pontua que
investigar a educação rural regional é contribuir para compor espaços vazios na
historiografia do Estado do Paraná.
Após apresentadas discussões em torno da Educação Rural no cenário
paranaense e nacional, os debates serão aproximados ao cenário educacional e
histórico do município de Astorga, buscando refletir sobre aspectos políticos,
culturais, sociais e econômicos da região e, em particular o seu desenvolvimento
educacional.
33
3. VIAJANDO PELAS TRILHAS DA HISTÓRIA DO MUNICÍPIO DE ASTORGA
Desde o início da década de 1930, o norte do Paraná, região de terra roxa,
começou a ser colonizado por meio da Companhia de Terras Norte do Paraná
(CTNP) constituída em meados da década de 1920, quando comprou do governo do
estado 515.000 alqueires paulistas de terras na região com o objetivo de cultivar
algodão. Mas, os planos da cultura branca não prosperaram e surgiu a ideia de
lotear a grande expansão de terras adquiridas.
Os primeiros funcionários da Companhia chegaram ao local em 21 de agosto
de 1929, onde mais tarde seria a cidade de Londrina. O trabalho dos homens
pioneiros era de dar início ao processo de demarcação e venda de terras, bem como
montar a infraestrutura mínima necessária para as atividades da companhia.
Assim, destaca-se que essa região passou a ser organizadamente colonizada
no início da década de 1930, por meio da CTNP que tinha como meta estruturar o
processo de povoamento das terras presentes no Estado. A companhia colonizadora
estabeleceu rapidamente um meio eficaz de povoamento em terras paranaenses,
por meio da divulgação dos lotes. Muitas famílias se deslocaram, migrando para o
chamado norte pioneiro do estado, atraídos pela divulgação realizada por meio de
propagandas e utilização de panfletos. Quanto ao contexto desenvolvimentista vivido
pelo país nos anos 30, em que o progresso e a modernização eram ansiados pelos
sujeitos, Schelbauer (2014, p. 77) lembra que:
[...] foi marcado pela ocupação do território, aumento populacional,
surgimento dos novos centros urbanos e colonização das áreas
rurais; movimento que, não sem conflitos, foi vislumbrado pelas
pessoas da época como um período de progresso e modernização,
no qual a educação foi enfatizada como um dos fatores desta
modernidade.
Para a autora, tais características, advindas do progresso e da modernização,
estiveram presentes no período de 1930-1960 no contexto rural do Estado do
Paraná, destacando o encantamento pela garantia de prosperidade.
Uma das formas encontradas para divulgar o empreendimento foi por meio de
propaganda impressa.
34
Figura 1: Propaganda usada para divulgar o empreendimento
ofertado pela Empresa Colonizadora São Paulo/Paraná em 1920
Fonte: Astorga (1980c, p. 9).
A propaganda apresentada anteriormente utilizada para divulgação de vendas
das terras teve papel importante à medida que promovia o interesse sobre o
empreendimento. Foi claramente utilizada para aumentar a procura e o desejo de
prosperidade, promovendo uma rápida invasão do norte paranaense por
compradores que foram formando a cidade, tornando-se pioneiros na região.
Ferreira (2006), explica que a região do Rio Tibagi obteve um crescimento
surpreendente na década de 1920, contudo, devido a fatores econômicos, políticos e
climáticos, muitas pessoas abandonaram o local e, consequentemente, os preços
35
baixaram (FERREIRA, 2006). Na propaganda destaca-se a menção em relação à
disponibilidade de documentos que comprovem a origem do lote, demonstrando
confiabilidade e transparência na negociação. O incentivo oferecido pela empresa é
uma forma de estimular a visita e a compra do imóvel.
A crença na ascensão econômica fez com que essa área fosse rapidamente
povoada por agricultores e comerciantes, sobretudo, vindos dos Estados de São
Paulo e Minas Gerais e, assim como em outros municípios, a história da colonização
da cidade de Astorga foi semelhante aos outros espaços do norte paranaense.
Apesar de não ser possível precisar com exatidão o ano em que se iniciou o
povoamento efetivo de civilizados nessa região, assinala-se que, conforme destaca
Schelbauer (2014, p. 79) “[...] o território não era inóspito e nem desabitado, havia a
presença de caboclos e índios [...]”.
Contar a história da cidade de Astorga não é tarefa fácil, pela inexistência de
pesquisas sobre o assunto. O único material encontrado foi o livro “Os municípios,
minha história, minha gente, Astorga”12, em que se conta a história da cidade e dos
seus primeiros colonizadores. Nele é narrado, por pioneiros, Lcomo se organizaram
as primeiras iniciativas de colonização do município e como foi seu desenvolvimento.
Segundo os pioneiros, Astorga tem seus primeiros povoados nas terras de
Santa Zélia13 e na colônia Içara14, locais que foram povoados antes mesmo da
colonização do município de Astorga, em 1925 e 1939, respectivamente. Santa Zélia
foi colonizada pelas famílias Balarotti e Storti que compraram terras da Colonizadora
Nova Bahia, sendo que a formação da Vila ocorreu a partir de 1944. Os primeiros
lotes de terras da Colônia Içara foram adquiridos por lavradores que ali residiam
desde 1935 (ASTORGA 1980C).
Na data de 8 de maio de 1945, foi organizado o projeto do patrimônio de
Astorga pelo engenheiro chefe do Departamento de Topografia e Procurador da
Companhia de Melhoramentos Norte do Paraná, Vladimir Babkov 15. O projeto
12
O livro editado em 1980, foi impresso e distribuído para vários departamentos do município.
Santa Zélia é atualmente um dos distritos de Astorga.
14
A Colônia Içara tem o mesmo nome de uma variedade de palmito existente no local, na atualidade
constitui distrito de Astorga. O livro editado em 1980, foi impresso e distribuído para vários
departamentos do município.
15
Vladmir Babkov chegou a Brasil na década de 1930, era engenheiro e agrimensor na Companhia
Melhoramentos Norte do Paraná, responsável pela demarcação do espaço resultando na colonização
do município de Astorga.
13
36
representado em forma de triângulo possui a simbologia que homenageia a vitória
dos aliados16. O projeto foi simbolizado pela letra V.
Legalmente, o Distrito de Astorga foi criado pela Lei Estadual nº 2 17, sendo
subordinado ao município de Rolândia18. Após essa medida, foi realizada nova
divisão territorial em 01 de dezembro de 1950, ficando o Distrito de Astorga sob a
responsabilidade do município de Arapongas19.
Em dezembro de 1951, a cidade de Astorga foi elevada à categoria de
município pela lei estadual nº 79020. Sua sede passou a ser composta por quatro
distritos: Astorga, Içara, Santa Fé e Santa Zélia. Mais tarde, o Distrito de Tupinambá
foi integrado a Sede21.
Em divisão territorial datada de 01 de dezembro de 1955, o município de
Astorga é constituído de cinco distritos22: Por fim, foi desmembrado do município de
Astorga o distrito de Santa Fé23, sendo elevado à categoria de município. A última
divisão territorial do município que permanece até hoje é composta por quatro
distritos24: Astorga, Içara, Santa Zélia e Tupinambá. A seguir o mapa do município
de Astorga demarcando os limites e apresentando os três distritos e o distrito sede.
16
17
18
19
20
21
22
23
24
A vitória dos aliados corresponde ao triunfo da aliança dos Estados Unidos e União Soviética
contra a Alemanha nazista no dia oito de maio de 1945 ( FERRON, 2008, p. 18).
A Lei Estadual nº 2 foi sancionada no dia 10 de outubro de 1947.
Rolândia, município do Norte Pioneiro distante de Astorga aproximadamente 46 km.
Arapongas foi declarado município em 1947, sua distância do distrito de Astorga é de 35 km .
Lei Estadual sancionada em 14 de dezembro de 1951.
Fato que ocorreu em 14 de dezembro de 1954 pela Lei nº. 253.
Os cinco distritos que compunham o município eram: Astorga, Içara, Santa Fé, Santa Zélia e
Tupinambá.
Lei estadual nº 2486, 14 de novembro de 1955.
Em 01 de julho de 1960.
37
Mapa 1: Divisão Territorial do Município de Astorga.
MUNICÍPIO DE ASTORGA
SEDE MUNICÍPIO
DISTRITO DE IÇARA
DISTRITO DE STA ZÉLIA
DISTRITO DE TUPINAMBÁ
Fonte: Arquivo do Departamento de Educação.
38
Em relação à escolha do nome, tanto nos documentos históricos quanto nos
dados do IBGE foram encontradas duas explicações. Uma delas se fundamenta na
ideia de que o nome “Astorga”25 foi tomado pelo russo, Wladimir Babkov, que
utilizava mapas de outros países26 para dar nomes às águas que banhavam as
regiões desbravadas. Ao buscar um nome para o rio de maior extensão que
banhava o local, apontou no mapa para a cidade de Astorga, batizando-o com esse
nome, que mais tarde seria o nome do patrimônio. Assim, a versão de que o lugar foi
batizado em homenagem a um dos diretores da Companhia de Terras Norte do
Paraná, é desconsiderada pelo depoimento em carta do engenheiro.
Levantamento topográfico da área, abrangendo a atual Cidade
Astorga, foram executados quase totalmente por agrimensor
Spatarco Príncipe Bambi, já falecido, e os nomes dos córregos e
ribeirões foram batizados por nós. Como o dicionário da língua
Guarani foi esgotado, dando os nomes de todas águas, levantadas
anteriormente nas Terras da Cia, eu fui obrigado procurar outras
fontes das nomenclaturas, até usando os mapas da Espanha e
Portugal e também de Itália. O Ribeirão com sua Bacia,
relativamente grande, recebendo diversos afluentes, foi por nós
batizado com o nome Astorga, nome de procedência espanhola
(ASTORGA, 1980d).
Nesse depoimento, temos a suposta ideia do grande número de distritos que
foram colonizados pela Companhia Norte do Paraná, tendo em vista que o chefe da
operação já havia utilizado todos os nomes contidos no dicionário da língua Guarani.
No mapa do Plano diretor Municipal de Astorga é possível identificar nomes
de águas, córregos, Ribeirões e rios como: Rio Pirapó, Ribeirão Paranaguá, Córrego
Pimpinela, Córrego Noitimbó, Água da Sória, Ribeirão Sória, Córrego Xingu,
Ribeirão Aurora, Ribeirão Guarujá, Córrego Mirandeira, Córrego Jaboticabal,
Ribeirão Astorga, entre outros utilizados para batizarem as águas que contornam o
município e, posteriormente, nomes dados às escolas rurais do local.
Astorga é o nome de uma cidade na Espanha. O termo vem do latim “Asturica” (Augusta), cidade
romana no país dos Ástures, dedicada a Augusto.
26
Mapas da Itália, Portugal e Espanha.
25
39
3.1 Primeiros Investimentos
Após as primeiras investidas no desbravamento em que os primeiros
colonizadores chegaram ao local, o engenheiro Vladmir Babkov alude a este fato em
sua carta:
Visitando a turma de engenharia, acampada na mais próxima
cabeceira no futuro Patrimônio de Astorga, qual demarcava no
terreno eixos de ruas, datas, encontrei o primeiro morador da cidade.
Sr. Antenor, serrando madeira com o primitivo sistema, para
construção de sua casa (ASTORGA, 1980d).
A madeira foi a matéria prima mais utilizada pela região na construção de
suas edificações. Na figura seguinte, uma das empresas responsáveis pelo rápido
desenvolvimento do município de Astorga foi a Serraria instalada na área. A
empresa era responsável pelo beneficiamento da matéria prima utilizada na
construção dos primeiros imóveis.
Figura 2: Instalações da Serraria Santa Terezinha, propriedade de José Pinto e filhos, 1949.
Fonte: Arquivos do Departamento de Educação de Astorga.
40
Na história do desenvolvimento dos municípios da região, o desmatamento e
o uso das madeiras das árvores era o primeiro passo para que a cidade pudesse ser
construída. Na foto, observa-se a madeira bruta no pátio da serraria para o
beneficiamento da construção de casas residenciais e comerciais. Além disso, pelo
tamanho do empreendimento supõe-se que a empresa estava preparada para
atender a uma grande demanda.
Os pequenos comércios foram se estabelecendo na cidade e a população,
consequentemente, crescendo. A década de 40 do século XX foi marcada pela
abertura de ruas, construções de casas e de comércios. Como mostra a foto
seguinte.
Figura 3: Década de 1940, início do desenvolvimento de Astorga.
Fonte: Arquivos do Departamento de Educação.
Na imagem anterior, observa-se que à esquerda da foto há um campo de
futebol, uma atividade de lazer possível para os primeiros habitantes do local. O
domingo, tido como “Dia do Senhor27” e dia de descanso, era vivenciado pelos
moradores como uma atividade que a família toda participava. Depois de irem à
missa dominical poderiam se divertir com as peladas realizadas no campo de futebol
27
Devido a tradição apostólica que tem origem no próprio dia da ressurreição de Cristo, a Igreja celebra o
mistério pascal a cada oitavo dia, no dia chamado com razão o dia do Senhor ou Domingo. (Ver Aquino, Felipe.
O catecismo da Igreja responde de A a Z, 2003, p.96)
41
adaptado, esquecendo-se por ora da lida do dia a dia. Percebe-se, portanto, que
esses dois elementos, o campo de futebol e a Igreja eram espaços essenciais nas
primeiras comunidades.
A Igreja de tábuas, construída no final da década de 1940, demonstra sua
importância e imponência. Importância na medida em que reunia as pessoas da
cidade aos domingos, não só para a celebração Eucarística, mas também para
buscar a convivência na comunidade que se formava. Imponente porque mesmo
sendo uma construção simples, não deixava de representar a instituição religiosa.
Seguindo o exemplo de seus pais, garantiam a manutenção da cultura às demais
gerações.
Fonte: Arquivos do Departamento de Educação de Astorga.
Figura 4: Igreja Matriz de Astorga em 16 de abril de 1949.
A cidade foi crescendo, a população aumentando, os serviços e comércios
foram se estabelecendo de acordo com a necessidade e com os investimentos
realizados por empresários que chegavam à cidade. Na lista dos primeiros
empreendimentos estão:
[...] o armazém de cereais de Antonio Húngaro, o de ferragens e
armarinhos de Ermelindo Lopes Barroso, o bar e hotel progresso de
42
Antonio e Ladia Augustaites. Vieram também a pequena farmácia do
prático Cândido Coutinho, seguida da do farmacêutico Leonidas
Macaroff, Zdenek Chiad instala sua padaria, que só fazia pão de
centeio devido a economia da guerra, e ao seu lado, um açougue
construído com o pau de palmito. Destaca-se a chapelaria
propriedade de João Zanin, comércio importante da época, pois era
raro um homem andar sem chapéu. O posto de gasolina (Gulf28) de
José Francisco Guapo e seu cunhado Abílio Pinto, além da quitanda
do Sr, Eugenio Grano. Sebastião Luiz Rosa vendia secos e
molhados, montando depois a primeira sorveteria de Astorga
(ASTORGA, 1980c, p. 28).
Figura 5: Primeiro posto de combustível da cidade construído em alvenaria demonstra o
início do desenvolvimento da cidade na década de 1950.
Fonte: Arquivos do Departamento de Educação de Astorga.
Embora não se apresente como um prédio imponente, a construção em
alvenaria, representada na imagem anterior, abre possibilidade de abastecimento de
caminhões, automóveis, tratores e motosserras, solidificando as diversas iniciativas
para o desenvolvimento.
Ao mesmo tempo em que aspectos econômicos, políticos e sociais foram se
alargando, outras iniciativas seriam necessárias com o intuito de amparar as
necessidades
28
da
população.
A
educação
era
fator
importante
para
o
Presente no mercado brasileiro entre 1936 e 1959, o posto Gulf tinha função de resgatar e
consolidar sua atuação inovadora no mercado de combustíveis e lubrificantes. A empresa chegou
a ter 400 postos de bandeirantes no país. Ver <http://gulfdobrasil.com.br/?page=gulf>.
43
desenvolvimento do município e os registros das primeiras iniciativas marcam a
segunda metade de 1940.
44
4. PRIMEIROS OLHARES PARA A EDUCAÇÃO DO MUNICÍPIO DE ASTORGA
Como explicitado na seção anterior, o crescimento do novo empreendimento
deu abertura para outras iniciativas necessárias para manter o desenvolvimento.
Assim, à medida que o município se formava, além da Igreja Católica e do comércio,
a escola se tornou também um foco de interesse. “Não há, pois, política de
educação que não esteja ligada à situação social, e, portanto, às necessidades e às
aspirações fundamentais de um grupo determinado” (AZEVEDO, 1953, p.139).
Neste contexto, a professora Maria Celestina Machado foi convidada a iniciar
o projeto educacional da cidade e ensinar as crianças do local, tomando frente das
primeiras iniciativas da educação escolar de Astorga.
Após termos tomado às primeiras providências (local, bancos, mesa
rústicas), iniciamos as aulas, eu e minha filha Edna, a 17 de fevereiro
de 1946, em uma casa de madeira, cujas paredes internas foram
removidas e que ficava no terreno ao lado do Cartório D. Constancia,
à Rua Joaquim Nabuco. Após dois meses de aula estávamos com 60
alunos (ASTORGA, 1980c, p. 84).
A primeira escola do município iniciou suas atividades no ano de 1946, sendo
que durante três anos a professora Maria Celestina lecionou na casa de madeira
adaptada. Tal característica também marcou as escolas da zona rural, sem ter um
local apropriado, donos de propriedades rurais, desocupavam locais e cediam
espaços adaptados para a educação das crianças.
Em consequência dos esforços de D. Maria Celestina, o Prefeito de
Arapongas Júlio Junqueira (1948-1951)29, construiu a primeira casa escolar, de
tábuas, possuindo 2 salas de aula. O terreno foi doado pela Companhia de Terras,
em que atualmente está instalada a Faculdade Astorga.
29
Informação retirada do portal do município de Arapongas. Disponível em: <http:// www.arapongas.
pr.gov.br>.
45
Figura 5: Primeira Escola de Astorga em 16 de abril de 1949.
Fonte: Arquivos do Departamento de Educação.
A imagem permite observar que o número de crianças que frequentavam a
escola, em 1949, era significativo. Dezenas de crianças, meninos e meninas,
dividiam o espaço escolar. Das três mulheres adultas que aparecem na fotografia,
duas eram professoras, a D. Celestina e sua filha Edna, porém, a terceira delas não
foi possível identificar. A imagem nos possibilita materializar uma cultura escolar dos
anos 40. A organização em filas de meninos e meninas, por ordem crescente,
lembra uma estratégia da cultura escolar em busca do ordenamento e da disciplina
no seu cotidiano. A utilização de uniformes, padronizando trajes, mesmo para uma
cidade em início de criação, já se faz presente e diferencia os seus utilizadores das
demais crianças.
A valorização e o ensino do respeito aos símbolos da nação
brasileira e do Estado do Paraná podem ser percebidos pelas Bandeiras do Brasil e
do Paraná hasteadas na frente da escola de madeira nativa - elementos
caracterizadores do espaço escolar dos anos 40.
Essa mesma Casa Escolar passou a ser chamada de Grupo Escolar em 1950
pelo decreto 11.333 de julho. Com o depoimento da professora Maria Celestina
Machado. “E a minha escolinha, tão pequenina, com bancos de madeira tosca,
transformar-se em Grupo Escolar” (ASTORGA, 1980c, p. 84).
46
O modelo das escolas públicas republicanas foi formulado e disseminado num
panorama de variações sócio-político-econômicas e, consequentemente, de
modificações na estrutura física dos prédios, adequando-os a fim de acomodar este
novo processo educativo. A euforia decorrente da novidade implantada em Astorga,
demonstrada pela professora, segundo Faria Filho e Vidal (2000), reporta às
iniciativas deste novo modelo de escola, repensado e esboçado para atender os
ideais que propunham construir uma nação baseada em pressupostos contidos na
civilização europeia e que tinham como objetivo a escolarização da população
iletrada, sendo que o município de Astorga apresentava as mesmas particularidades
do cenário nacional.
Características específicas circundavam os grupos escolares, já que esse tipo
de instituição previa uma organização em âmbito administrativo, didático e
pedagógico, além da alteração no currículo e da distribuição dos espaços da nova
arquitetura. As iniciativas do grupo escolar vistas para o progresso foi uma conquista
para um município do interior do Paraná, mesmo sendo em uma menor dimensão.
Dentre as particularidades desse novo modelo educacional, Rossi (2003)
sinaliza sobre a racionalização do tempo. “Tendo por modelo ou referência os
grupos escolares, sugerem que essas escolas dividam seu horário de funcionamento
em dois turnos” (ROSSI, 2003, p. 118). Tal questão é debatida por Faria Filho e
Vidal (2000) uma vez que a racionalização do tempo tornaria o processo mais eficaz
e menos dispendioso.
Para fazer cumprir um horário assim determinado, no qual se
contavam os minutos e se distribuíam as disciplinas pelos
respectivos horários todos os dias da semana, em todos os anos do
curso, pretendeu-se dotar os grupos escolares de normas e
instrumentos de controle do tempo e dos horários escolares (FARIA
FILHO; VIDAL, 2000, p. 25-26).
O tempo se tornou aliado na consolidação dos ideais republicanos, os
procedimentos modernos da divisão dos espaços e do tempo previam o ensino no
modo de seriação e da uniformização dos conteúdos, tornando-se um modelo de
escola graduada.
Sinalizo que essa novidade ocorreu nas cidades, pois na zona rural as
escolas mantinham o modelo de organização das chamadas escolas isoladas. Estas
escolas
possuíam
um
único
professor
que
ensinava
as
quatro
séries
47
simultaneamente, as classes multisseriadas. A organização do ensino primário e os
tipos de estabelecimentos existentes eram regulados pela Lei Orgânica do Ensino
Primário, Decreto-Lei nº 8.529, de 02 de janeiro de 1946, que estabelecia:
Art. 28. Serão assim designados os estabelecimentos de ensino
primário mantidos pelos poderes públicos:
I. Escola isolada (E.I.), quando possua uma só turma de alunos,
entregue a um só docente.
II. Escolas reunidas (E.R.), quando houver de duas a quatro
turmas de alunos, e número correspondente de professores.
III. Grupo escolar (G.E.), quando possua cinco ou mais turmas de
alunos, e número igual ou superior de docentes.
IV. Escola supletiva (E.S.), quando ministre ensino supletivo,
qualquer que seja o número de turmas de alunos e de
professores (BRASIL, 1946b).
Pelo que estabelecia a lei, para ser transformada em grupo escolar, a escola
deveria ter cinco ou mais turmas e professores. Dessa forma, é possível interpretar
que a primeira casa escolar de Astorga cresceu consideravelmente em quatro anos,
uma vez que se transformara em grupo escolar. Aos grupos escolares estava
assegurado o direito de ministrar o curso elementar e o curso complementar. O
capítulo II, da citada lei nº 8.529, trata da educação primária e seus cursos. A
escolarização primária era composta de fundamental e supletiva. A primeira
destinada às crianças de 7 a 12 anos, tendo duração de 4 anos para o curso
elementar e um ano para o curso complementar. Este seria um preparatório para o
exame de admissão ao ginásio (BRASIL, 1946b).
A diversidade de tipos de instituições revela a realidade do país, naquele
momento, um país rural com altas taxas de analfabetismo. Para regiões diferentes
organizaram-se tipos de instituições mais próximas à realidade e as condições
locais.
48
4.1 As Escolas Municipais Rurais do Município de Astorga
Com aproximadamente 20.709 habitantes30 residindo na zona rural, um
porcentual de 89% de sua população total, o município de Astorga, a partir da
década de 1950, fundou 35 escolas em uma área de 434 mil Km 2. . Apesar da
distância que variava de 3 a 20 km da sede e da precariedade do momento, a
população rural foi favorecida educacionalmente.
Foram criadas diversas escolas rurais, sendo que a primeira delas, de acordo
com os livros de registro de frequência, foi a Escola Isolada de Ossórida31,
localizada na estrada da Sória, situada na bacia do rio da Sória.
O livro de registro desta primeira escola rural data do ano de 1949, mais
precisamente do mês de abril, antes mesmo da emancipação política do município.
No primeiro ano, a responsável pela escola era a professora Maria Aparecida
Castro32 que fez o registro das informações educacionais entre o mês de abril a
dezembro desse mesmo ano. No início do ano letivo, foram matriculados vinte e seis
alunos do sexo masculino e vinte e três alunas do sexo feminino, totalizando
quarenta e nove alunos registrados.
Nesse escrito escolar consta o nome do professor José Joaquim Lima,
morador do local, inicialmente um profissional sem habilitação exigida, o qual
trabalhou desde a criação do estabelecimento até sua aposentadoria como
professor normalista. Nesse primeiro registro constam a escritura dos anos
escolares de 1949, 1950 e 195333, como demonstra o gráfico:
30
31
32
33
Os dados foram retirados da seção de aspectos humanos do livro “Os Municípios: sua história &
sua gente – Astorga”, fornecidos por dados do IBGE-Censo 1950.
A primeira escola rural de Astorga passou por variações em seu nome. No primeiro livro de registro
está inscrito Escola Isolada de Ossórida, no decorrer dos anos outros registros escolares trazem
essa variação, Escola Rural da Sória, Escola Rural Sória São Bento, Escola Estadual Rural Sória
São Bento até a sua cessação.
A professora Maria Aparecida de Castro foi a primeira professora da escola rural Sória São Bento.
Os anos de 1951 e 1952 não constam registros, não podendo averiguar a quantidade de alunos
matriculados.
49
Gráfico 3: Variação de alunos da primeira escola rural de Astorga
Fonte: Livros de Registro e frequência da Escola Isolada de Ossórida, acervo do Departamento de
Educação doação da professora Ione Cardoso Grilo.
O gráfico permite observar que do ano de 1949 para 1950 houve uma
redução no número de alunos que frequentavam a escola, de aproximadamente 48
para 39 alunos. Contudo, no ano de 1953 o número de alunos tinha se elevado para
aproximadamente 62 alunos.
Na imagem a seguir, é possível visualizar a materialidade da primeira escola
rural do município de Astorga, a Escola Estadual Rural Sória São Bento, localizada
na comunidade da Sória. Esta escola rural seguia o mesmo padrão de construção
do período de outras escolas rurais. Nos arquivos do Departamento de Educação de
Astorga existem fotos de outras escolas rurais, sendo que a arquitetura de todas se
assemelhava: uma construção em madeira, com uma varanda na mesma extensão
da construção, algumas varandas com proteção outras não, dependendo da altura
da construção. A simplicidade de suas edificações as caracterizava. Observemos:
50
Figura 6: Escola Estadual Rural Sória São Bento em 1972.
Fonte: Arquivos de Departamento de Educação de Astorga.
Embora a escola fosse construída em 1949, a imagem foi registrada em 1972,
ou seja, 23 anos após a sua fundação. A deterioração provocada pelo tempo e a
falta de conservação do espaço escolar saltam aos olhos. Destaco a simplicidade e
falta de estrutura do espaço, sem ao menos uma identificação, contava apenas com
uma cerca de proteção, delimitando o ambiente a ser explorado pelos alunos e,
facilitando o monitoramento do professor.
Outras três escolas foram criadas na década de 50 do século XX: Escola
Rural Km 88 (1952), Escola Rural Gleba Paranaguá (1952) e Escola Rural D. Pedro I
(1957). As escolas rurais Km 88 e D. Pedro I configuravam-se nos mesmos moldes
da maioria das escolas; já a escola Gleba Paranaguá possuía uma diferenciação na
construção - duas salas de aula e uma cantina. As escolas eram edificadas em
madeira, a cobertura com telhas de barro. As que ofereciam risco de queda e
acidentes eram cercadas com ripas de madeira, todas com pintura para uma melhor
conservação. Vejamos:
51
Figura 7: Escolas Rurais instadas na década de 1950.
Fonte: Arquivos do Departamento de Educação.
A primeira escola municipal foi instalada na década de 1950, a Escola
Municipal Rural Km 88. Seu nome origina da designação do nome de uma fazenda
que se localizava no Km 88 da antiga estrada que ligava a cidade de Astorga à
cidade de Maringá. Já a Escola Rural Gleba Paranaguá34 pertencia à rede estadual
de ensino, localizada à beira da principal estrada do Paranaguá, saída para a cidade
de Pitangueiras. A imagem apresenta um prédio diferente das demais, de madeira,
possui sala de aula e cantina separadamente, além de um abrigo entre os dois
ambientes. Ao fundo, há um muro que separa as divisas da escola das outras áreas
do espaço rural.
A Escola Rural D. Pedro I, criada em 1957, também pertencia à rede Estadual
e era localizada na região nomeada Água da Mirandeira. Extinta em 1980.
34
Haviam cinco Escolas Estaduais Rurais de Astorga, as quais são: Escola Rural Estadual Sória São
Bento, Escola Estadual Rural Gleba Paranaguá, Escola Estadual Rural Placa Paranaguá, Escola
Estadual Rural Barro Preto, Escola Estadual Rural D. Pedro I. Todas elas não constam Decreto Lei
nº. 1/80 que decreta a criação das escolas rurais do município de Astorga.
52
Não se conhece os trâmites legais das instalações das escolas rurais. Em
depoimento, a ex-inspetora auxiliar de ensino do município relatou que à medida que
as regiões foram sendo habitadas, grupos de proprietários rurais solicitavam à
Prefeitura a instalação de uma escola. O terreno era cedido por um sitiante ou
fazendeiro, bastava a Prefeitura ou ao Estado construir as instalações da escola e
garantir um professor ou professora.
[...] os fazendeiros foi assim, eles pediam escola, porque as vezes
era longe pra uma criança transportar de um lugar para outro, então
eles solicitavam pra prefeitura e era construída ali a escola (
Ao Considerar a cultura do local, agricultores se reuniam, doavam um espaço
em suas propriedades para a construção de uma escola e permitiam a socialização
do saber com os filhos de outros sitiantes da redondeza. No mapa, a seguir, foram
localizadas as 35 escolas fundadas na zona rural do município de Astorga, nas
décadas de 1950, 1960 e 1970, sendo que cinco delas eram estaduais. Vejamos:
53
Mapa 2: Mapeamento das 35 escolas rurais no município de Astorga
LEGENDA
Escolas Municipais
Escolas Estaduais
Fonte: Mapa do Município de Astorga, arquivos da Prefeitura Municipal de Astorga.
54
Tabela 1: Legenda das escolas Municipais e Estaduais rurais instaladas no município de
Astorga
Nº
Nome da Escola
Ano de instalação
1
Esc. Munic. Rural Km 88
1952
Distância da
sede
18 Km
2
Esc. Munic. Rural Guarujá
1960
9 Km
1983
3
Esc. Munic. Rural 7 de Setembro
1961
15 Km
1991
14 Km
1994
35
1961
Data de
extinção
1994
4
Esc. Munic. Rural Água Astorga
5
Esc. Munic. Rural Duque de Caxias
1962
15 Km
1991
6
Esc. Munic. Rural Bairro Itaipu
1963
18 Km
1997
7
Esc. Munic. Rural São José
1963
3 Km
1990
8
Esc. Munic. Rural D. João VI
1963
7 Km
1998
9
Esc. Munic. Rural Guarani
1963
4 Km
1986
10
Esc. Munic. Rural Água Noitimbó
1963
6 Km
1994
11
Esc. Munic. Rural Olavo Bilac
1963
8 Km
1994
12
Esc. Munic. Rural Dríades
1964
14 Km
1988
13
Esc. Munic. Rural Sória Medina
1965
4 Km
1994
14
Esc. Munic. Rural Fortaleza
1965
6 Km
1994
15
Esc. Munic. Rural Fazenda Xingu
1965
11 Km
1989
16
Esc. Munic. Rural Serrinha
1966
20 Km
1997
17
Esc. Munic. Rural Sória Xingu
1966
13 Km
1992
18
Esc. Munic. Rural Água Butia
1966
5 Km
1983
19
Esc. Munic. Rural Tocina
1966
3 Km
1984
20
Esc. Munic. Rural Mirandeira
1966
20 Km
1990
21
Esc. Munic. Rural Sta Izabel
1966
16 Km
1980
22
Esc. Munic. Rural Água Mirandeira
1966
13 Km
1983
23
Esc. Munic. Rural Santa Josefina
1966
14 Km
1988
24
Esc. Munic. Rural Santa Terezinha
1966
7 Km
1998
25
Esc. Munic. Rural D. Pedro II
1967
9 Km
1991
26
Esc. Munic. Rural Boiadeira
1967
6 Km
1981
27
Esc. Munic. Rural Sítio Spinelli
1967
14 Km
1982
28
Esc. Munic. Rural Santa Clara
1968
20 Km
1992
29
Esc. Munic. Rural Sítio Bolzon
1971
14 Km
1998
30
Esc. Munic. Rural Ermelindo L. Barroso
1971
17 Km
1988
31
Esc. Estadual Rural Gleba Paranaguá
1952
10 Km
1998
32
Esc. Estadual Rural D. Pedro I
1957
9 Km
1980
33
Escola Estadual Rural Placa Paranaguá
1961
6 Km
1995
34
Escola Estadual Rural Sória São Bento
1962
7 Km
1996
35
Escola Estadual Rural Barro Preto
1966
17 Km
1990
36
Fonte: Municípios: sua história & sua gente (ASTORGA, 1980c), Decreto Lei nº. 1/80 (ASTORGA,
1980a) e Processos de cessação: arquivos de Departamento de Educação.
35
Em depoimento a professora Orendina Carolina de Deus relatou que iniciou as atividades educativas na Escola
Rural Água Astorga em 1957, em uma sala adaptada de uma casa em um sítio da vizinhança. Em virtude das
fontes orais utilizadas no trabalho assumirei como ano de instalação, 1957.
36
Apesar da tabela apontar para o ano de instalação da Escola Rural Sória São Bento ser 1962, as fontes
documentais sinalizam que a data de instalação é de 1949. (Fonte: Livro de Registro de Frequência, Astorga,
1949).
55
O mapeamento geral das escolas rurais de Astorga, apresentado em forma
de tabela, traz informações das trinta e cinco escolas existentes, no qual é
identificado o ano de fundação, a distância de cada uma em relação à cidade, as
escolas da rede municipal, as escolas da rede estadual, bem como o ano de
extinção. Observando os dados, principalmente ao ano de extinção e a distância
entre a escola e a cidade, percebe-se que a partir da década de 1980 houve um
agrupamento de escolas. Agregando a esses dados, o Censo Demográfico de 2010
que apresenta a sinopse dos dados dos anos de 1960, 1970 e 1980, sobre a
população recenseadas residente na zona urbana e na zona rural no Estado do
Paraná, aponta que na década de 1960 a população se concentrava na zona rural,
sendo aproximadamente o dobro da população urbana. Na década de 1970, a
população diminui, mas ainda a concentração na zona rural é dominante, no decênio
de 1980 a população rural cai para 1/3 da população urbana. Essa movimentação é
caracterizada pelo processo de êxodo rural mostrado no gráfico a seguir.
Gráfico 4: População recenceada e situação de domicílio.
Fonte: IBGE, Sinopse do Censo Demográfico 2010.
56
Ao Recorrer as informações do mapa e tabela anteriores apresentados, é
possível observar, por exemplo, que a Escola D. Pedro I, extinta em 1980, fica
próxima a três outras escolas, Escola Sítio Spinelli (1982), Escola Tocina (1984) e
Escola D. João VI cuja data de extinção é o ano de 1998, uma das últimas escolas a
ser extinta. A escola D. João VI possuía duas salas de aula e cantina, comportando
o agrupamento de outras escolas, já que a demanda populacional do meio rural
declinava. Para além desta observação, interessa verificar o grande número de
escolas rurais instaladas no município da década de 1960 que demonstra o
crescimento demográfico.
No gráfico é apresentada a quantidade de escolas rurais criadas em cada
década, visando atender às necessidades da comunidade local.
Gráfico 5: Índice das instalações de escolas rurais no município de Astorga nas décadas de
1950, 1960 e 1970.
Fonte: Astorga (1980c).
Fazendo a leitura das informações, o decênio com maior incidência de criação
de escolas rurais, como mostra o gráfico anterior foi o de 1960, com a criação de 30
escolas, sendo que o ano de 1966 teve o maior número, com 10 escolas rurais
criadas. Os dados analisados demonstram um crescimento educacional na década
57
de 1960 e evidencia que houve um avanço quantitativo para a educação do
município.
Gráfico 6: Comparação da porcentagem referente a instalação das escolas rurais na
década de 1960.
1960
3% 3%
10%
1961
10%
1962
7%
1963
1964
1965
20%
34%
1966
1967
3%
10%
1968
Fonte: Astorga (1980c).
A década de 1960, como exposto, foi o período em que mais se instalou
escolas rurais. Ao observar mais atentamente esta década e investigando outros
investimentos, percebeu-se que de 1965 a 1968, efetuou-se a construção de 17
escolas rurais, mais da metade do total dentro do período analisado. Além das novas
instalações, outros investimentos foram concretizados, nesse período, pelo
administrador.
Com o dinamismo que lhe é peculiar, Ricieri Resquetti realiza no seu
mandato inúmeras benfeitorias para o município, das quais
destacam-se: [...] Construção de escolas e cantinas: Fazenda Santa
Clara, venda do Miro, Fazenda Xingu, Noitimbó, Fazenda Nogueira,
Água Taquari, Fazenda Maitá, Água Içara, Barro Preto, Serrinha,
Água Mirandeira, usina dos Alemães, lugar denominado Igrejinha na
58
Sória, Água Tocina. [...] cantina e residência do professor em Itaipu37
(ASTORGA, 1980c, p. 47).
Em termos quantitativos pode-se interpretar que a administração do
município buscou atender a demanda pela construção de escolas em várias
localidades. Com as escolas instaladas, o município acumulava uma série de
obrigações: contratar professores, manter as construções, estradas e pontes,
oferecer apoio financeiro e pedagógico, entre outros.
Com a implantação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação 5692/71, foi
necessário legalizar as escolas rurais criadas, documentando-as. Para tanto, foi
criado o Plano de Implantação da Lei 5692/71 nas Escolas Municipais Rurais de
Astorga. A primeira medida seria criar um decreto lei que amparasse e legalizasse
todas as escolas municipais rurais. O Decreto 001/1980, expõe que pelo fato do
município ser responsável por todas as escolas rurais, sendo que o mesmo realizou
as construções e as mantém em funcionamento, e pelas mesmas não possuírem
nenhum decreto de instalação, houve a necessidade de regularizar a situação
decretando que a partir da data de 7 de janeiro de 1980, ficavam oficialmente
criadas as trinta escolas municipais rurais, nomeando-as uma a uma no decreto.
Da data de fundação da primeira escola rural municipal, 1949, ao decreto de
sua criação oficial transcorreram 31 anos de atividades. A regularização, a partir da
LDB de 1971, da criação destas escolas, sem dúvida, as colocavam em condições
de funcionamento legal. Contudo, interessa-me desvendar o funcionamento destas
escolas desde a sua criação. Compreender até que ponto as mudanças na
legislação educacional mudou a mentalidade e a prática dos profissionais da
educação rural de Astorga, além de identificar as relações da Inspetoria de
Educação do Município com o funcionamento destas escolas, neste percurso de
pouco mais de 30 anos. A verticalização do estudo impôs um recorte preciso, neste
sentido optei por observar a cultura escolar da Escola Rural Água Astorga (1961),
narrada por seus utilizadores.
37
Tendo em vista que as escolas rurais foram instaladas em propriedades rurais, era comum referirse as escolas considerando o nome do local de instalação ou identificá-las tendo como ponto de
referência, como por exemplo “Venda do Miro”.
59
5. TRAÇOS E TRILHAS DA ESCOLA RURAL ÁGUA ASTORGA
[...] recordar é viver né, então eu vivi agora.
Orendina Carolina de Deus
A narrativa que será apresentada foi elaborada por meio de entrevistas
semiestruturadas de três professores, três alunos e uma Inspetora municipal que
viveram, embora em momentos diferentes, o período que vai da fundação, em 1957
(ver tabela 1, p. 55) da Escola Rural Água Astorga até o decreto de 1980 que
regulariza a sua criação de acordo com o exigido pela LDB de 1971.
As narrativas, carregadas de significações, recordações e sentimentos foram
compartilhadas e evidenciaram traços gerais da cultura das escolas rurais de
Astorga, e em particular Escola Rural Água Astorga, deixando ver como “[...] fatos
pinçados aqui e ali nas histórias de vida dão ensejo a percepções de como um modo
de entender o passado é construído, processado e integrado à vida de uma pessoa”
(CRUIKSHANK, 2005, p.156).
A procura de personagens que atuaram no cenário escolhido foi
demasiadamente inusitada. Não havendo registro e documentos suficientes, a
expectativa de conhecer a prática educativa na Escola Rural Água Astorga se
depositara na informação da existência de um professor que exerceu sua profissão
nesta escola até sua cessação. Com posse dessa primeira informação, foi marcada
uma conversa informal. No primeiro encontro, o professor revelou que sua esposa
também lecionou na mesma escola, e, então, como se encontrava no local foi
convidada a participar do diálogo. A professora contou como foi o início de sua
carreira relembrando fatos de sua experiência, guardados em sua memória. Após
esse primeiro contato, foi marcado o dia para a entrevista.
Durante a entrevista, outras informações foram trazidas, dentre elas, que essa
instituição educativa teve três professores e, que se tornaram os meus personagens
principais. Assim diz dona Zélia,
[...] na água Astorga eu casei e, nesse ano (1963), daí já estava lá,
era a Orendina, que tinha uma professora. Tinha muitos alunos,
60
então, foi dividido. Eu fiquei com a 1ª e a 2ª série e ela ficou com a 3ª
e a 4ª. Eram duas professoras na mesma escola, ela ia de manhã e
eu ia à tarde.
Esse depoimento corrobora às reflexões de Almeida (2005, p. 278) quando
diz: “Estamos diante de uma história que envolve personagens anônimos, alunos e
professores, que constituíram identidades particulares nas escolas afastadas da
cidade”. Adentrar no universo interno da Escola Rural Água Astorga é mergulhar
num terreno desconhecido. Buscar os pontos de encontro entre a realidade local e a
dinâmica nacional será um desafio, que traçarei seus primeiros passos.
5.1 Início de suas Atividades
[...] os arquivos escritos são insuficientes para descrever e,
sobretudo, se compreender uma realidade tão complexa quanto a
história da educação, e de que precisam ser complementados por
grandes pesquisas orais que teremos a oportunidade de realizar
(JOUTARD, 2000, p.34)
Instalada em uma área longe, a 14 km do centro urbano, a Escola Rural
Água Astorga (1957-1994) destinava-se à escolarização de crianças daquele local.
Os trinta e sete (37) anos de sua existência foram palco de vários atores, mais
especificamente as professoras Orendina Carolina de Deus38, Maria Zélia Cardoso
dos Santos39 e o professor Sebastião Simão dos Santos40 que estiveram presentes,
em momentos diferentes, no desenvolvimento de sua prática escolar.
As primeiras iniciativas de educação formal no perímetro da Escola Rural
Água Astorga foram relatadas em entrevista pela profª Orendina. Segundo ela, as
atividades da escola foram iniciadas no final do ano de 1956, e, foi ela quem
conduziu inicialmente, naquele espaço e período, o trabalho burocrático com a
realização da pré-matrícula dos alunos. A professora buscava o tempo como aliado,
38
A professora Orendina Carolina de Deus foi a primeira professora da escola rural Água Astorga exerceu seu
trabalho durante 20 anos, de 1957 à 1977.
39
Maria Zélia Cardoso dos Santos iniciou as atividades educativas em 1963 na Escola Rural Água Astorga,
trabalhou no local durante 10 anos, encerrando sua gestão nesta escola em 1973.
40
Permanecendo até a cessação da Escola Municipal Rural Água Astorga, o Prof. Sebastião Simão dos Santos
trabalhou entre os anos de 1975 à 1994, totalizando 19 anos.
61
pois além de dividi-lo entre os afazeres domésticos e os da roça; o papel de mãe e
de esposa; se empenhava para matricular todos os alunos da redondeza.
Ela relata que ao ter conhecimento da existência de uma família recémchegada na região com filhos em idade escolar, deslocava-se de sua casa até lá.
Visitava cada sítio, cada casa, motivando as famílias para a prática escolar. Nas
escolas rurais as matrículas eram efetivadas pelos professores responsáveis pela
instituição. O fato também foi exposto pela ex Inspetora41 de Ensino do município em
entrevista, embora em diferentes períodos, corrobora com o depoimento da
professora Orendina. Vejamos:
Eram as professoras mesmo quem fazia as matrículas, na escola. A
gente anunciava no rádio, ia lá avisava. Porque assim o professor
antes de começar ele ia pra escola, fazia tudo. Ele quem limpava,
porque não tinha servente. Professor lavava, limpava a escola, fazia
a merenda, tudo era ele. Então eles iam antes, já limpava e já
avisava o dia de matrículas. E tinha escola que tinha as vezes dois
professores, outros que dava para as quatro series seriadas, as 4
séries, 1º 2º 3º 4º.
De acordo com a Lei 4024/61, os municípios se responsabilizariam por
convocarem a população para efetuar as matrículas na escola primária, visto que já
constava em seu artigo 27 que o ensino primário a partir dos sete anos seria
obrigatório. Nas escolas rurais de Astorga, a rádio e o próprio professor ou
professora era quem convocava a população para a matrícula das crianças.
Contatou-se que o professor que se dispusesse a ministrar aulas nas escolas
isoladas, automaticamente abraçava as outras atribuições, o ´Professor lavava,
limpava a escola, fazia a merenda, tudo era ele´, além de todos os outros cargos
administrativos que compunham uma instituição educativa. ”Cabe ao professor se
responsabilizar pelo prédio e materiais pertencentes à escola. Seguir o regulamento
de acordo com o programa” (ASTORGA, 1980c, 1961-1970, p.18). A profª Orendina
relata a sua experiência.
Eu comecei em 1956, no finalzinho do ano. Então eu fiquei até o final
do ano fazendo as matrículas. Os alunos moravam longe, cada um
num sitio. E eu visitei todos e matriculei. E em 1957 nós começamos
as aulas.
41
Maria José Lopes, foi Inspetora de Ensino entre o anos de 1970 e 1983, exercendo sempre essa função.
62
Tal depoimento evidencia que o processo educacional no perímetro do
Ribeirão Água Astorga antecedeu a 1961, data publicada no Livro “ASTORGA.
Municípios: sua história & sua gente” (1980c), ou seja, quatro anos após as
atividades educativas no local relatadas pela professora Orendina, contudo, somente
em 1980, com o decreto 1/80 que foi efetivado legalmente a situação das escolas
rurais no município de Astorga.
Pelo relato da professora Orendina, o caminho que a Educação Rural de
Astorga trilhou faz supor os esforços despendidos pelos professores para que o
projeto educacional iniciado no final do ano de 1956, no caso da escola Municipal
Rural Água Astorga, tivesse êxito.
O
crescimento
do
município,
consequência
da
propagação
do
empreendimento em terras férteis, empolgou pessoas de diversas localidades, entre
elas do Estado de São Paulo e Minas Gerais, aumentando a população em toda
essa região. Este quadro criou demanda por escolas que atendessem as crianças.
Sobre o crescimento do número de escolas rurais, a ex-inspetora de ensino do
município considera “[...] que foi o aumento da população, do sítio, veio muita gente
de fora pra Astorga, principalmente pra Astorga né, então foi isso”.
Almeida (2005, p, 286) expõe que a educação rural no Brasil, na década de
1940, consistia em “[...] poucas e precárias escolas, distantes umas das outras” (p.
286). Com o aumento da população no município, na década de 1950 e 1960, no
meio rural, foi preciso criar espaços para a prática educacional. As primeiras
iniciativas locais apresentavam características advindas do cenário nacional.
Em depoimento, a professora Orendina expõe as dificuldades desta
experiência, marcada pela falta de estrutura. Vejamos:
[...] eu comecei a lecionar não tinha casa de escola não, foi a
prefeitura, alugou uma sala na casa de um vizinho, vizinho nosso,
era bem pertinho, uma sala, ele tirou algumas paredes, fez uma sala
bem grande, comportava direitinho os alunos, e foi bom, é. As
crianças frequentavam bem e ficou lá até que eles construíram a
casa de escola.
Este relato revela os caminhos da educação rural, nos anos 50 e 60, do
interior do Paraná, em particular o da região de Astorga. Em uma sala, de uma casa
vizinha da professora, alugada pela prefeitura, indicam as práticas educacionais que
63
antecederam a institucionalização da escola primária. Esses anos de atividade,
anteriores à construção do espaço propriamente escolar, não foram preservados em
documentos oficiais da educação de Astorga. Porém, foram revividos pelas
lembranças conservadas na memória dessa primeira professora. O relato da
estrutura física da primeira casa escolar é realizado em meio a risos.
Quatro paredes, de tábuas, e coberta de telhas. Não tinha mais
nada, não tinha uma varanda, não tinha nada. A água era de poço,
de cisterna. Então, a gente chegava, já pegava um balde d’água que
estava fresquinha, cada aluno tinha o seu copo e uma caneca de tira
do balde pra eles tomar.
As lembranças adormecidas desse tempo que passou, fez com que as alunas
Maria José Malta e Jandira Malta42 reavivassem momentos vividos naquele primeiro
espaço escolar. A recordação do casarão dividido, casa para um lado e escola para
outro. Uma sala grande, de madeira e assoalho, sem forro, com vistas as telhas de
barro, deixando o ambiente escuro. O entoar da voz da professora que ensinava o
beabá, os números e expressões se embaralhavam com os rugidos dos animais que
eram criados ao redor do casarão. Mesmo com o aspecto sombrio, aquele lugar era
sinônimo de conhecimento, trazia esperança, ensinamento e desejo de mudança.
A precariedade das escolas isoladas no Brasil, de diferentes momentos
históricos a depender da região, é relatada em estudos por várias partes do país.
Vejamos o que diz Faria Filho (2000) sobre o Estado de Minas Gerais.
[...] produzia-se a representação da “escola isolada”, aquela que
funcionava na casa dos professores e em outros ambientes pouco
adaptados ao funcionamento de uma escola pública de qualidade,
como sendo um obstáculo quase que intransponível à realização da
tarefa educativa e salvacionista republicana, materializada na
educação primária (FARIA FILHO, 2000, p 30).
Assim, enquanto a região crescia demograficamente, os ideais republicanos
de desenvolvimento e o progresso, bem como assumir a educação como condição
para tal ideal, também se fazia presente em Astorga. Oferecer condições de
42
As irmãs Jandira Malta e Maria José Malta foram alunas da 1ª casa escolar nos anos de 1958 e
1959. Em 1960 segundo depoimento, as meninas ficaram sem estudar porque a professora não tinha
autorização para lecionar a 4ª série e somente no ano seguinte, em 1961 que a professora conseguiu
reunir alguns alunos dentre elas, as irmãs Malta que terminaram o 4ª ano em 1961, na Escola Rural
Água Astorga, recém-construída.
64
educação ao povo campesino, ensinando-os a ler e escrever, seria alinhar-se aos
ideais nacionais.
Na organização e adequação do tempo, as alunas da casa escolar adaptada
não tinham folga. D. Jandira Malta revela, em seu depoimento, o tempo despendido
entre a rotina da escola e da roça.
Ah, quando a gente sempre estudava, quando era meio período né,
então, a gente antes de ir pra escola, a gente estava lá puxando a
enxada né, trabalhando né, carpindo né. Aí depois, a gente ia pra
casa, se arrumava e ia pra escola. E quando as vezes era na parte
da manhã, primeiro a gente ia na escola, depois que a gente
chegava da escola [...] e almoçava e ia de novo pra lavoura né.
Com esta rotina exaustiva, a escola para elas e demais alunos era sinônimo
de progresso, de conseguir o diploma do 4º ano. O tempo na escola era o tempo de
escapar do trabalho pesado da roça e de se alinharem, sem mesmo se darem conta,
com as ideias republicanas de acabar com analfabetismo no país, com o apoio do
professor. Sobre o papel a ser desempenhado pelo professor frente ao
analfabetismo, Almeida (2005) expõe que sua tarefa era considerada essencial. “O
professor é percebido como um lutador, um guerreiro, como se estivesse em uma
cruzada ou em uma batalha contra o maior inimigo : o analfabetismo” (ALMEIDA,
2005, p. 290).
Desprovidas de oportunidades anteriores, as irmãs Malta iniciaram seus
estudos tardiamente. Jandira com 11 anos, Maria José com 10 e ainda um irmão
mais novo estudou nessa primeira escola. Tiveram experiência educativa ainda em
sua própria casa. Um empregado do pai, todas as noites, ensinava o que ele sabia
aos três irmãos. Assim relata Maria José:
Porque assim, eu entrei na primeira série, e ela passou a gente para
a segunda série, porque a gente já tinha estudado em casa com um
moço que trabalhava com o meu pai. Ele tinha bem estudo, então ele
ensinou nós. Então a gente entrou lá no primeiro ano, mas logo ela
percebeu que nós não precisava ficar no primeiro, porque nós já
estávamos sabendo. [...] então ela deu uma prova. [...] ai ela passou
nós para o segundo ano, nós três. Eu, minha irmã e meu irmão.
65
No depoimento sugere a prática da aceleração dos estudos43 devido ao
rendimento individual. No artigo 27 da Lei 4024/61 é declarada a possibilidade de
oferecer cursos para classes especiais para os alunos com distorção entre idade e
série.
Diferentemente da escola produzida nos grandes centros através dos grupos
escolares, as escolas isoladas eram condicionadas ao tempo do professor e dos
alunos. Os obstáculos e a realidade vivida pelo povo campesino diferenciava-o da
cidade, dessa maneira, na prática, o professor da escola rural levava em
consideração as especificidades do local. Sobre essa prática, afirmam Faria Filho e
Vidal que:
[...] daí as escolas isoladas insistirem em ter seus espaços e
horários próprios organizados de acordo com a convivência da
professora, dos (as) alunos (as) e levando em conta os costumes
locais [...] ( FARIA FILHO, VIDAL, 2000, p, 25).
No Livro de Avisos das Escolas Rurais (LAER)44 consta, na ata da reunião do
dia seis de maio de 1966, que os professores deixassem anotado o local e o horário
de
funcionamento
de
cada
estabelecimento.
Nele,
percebemos
horários
diferenciados demonstrando que cada professor adaptava seu tempo ao tempo
disponível. Os horários variavam das 8h às 12h; 8h30min às 12h30min; 9h às 13h;
11h às 15h; 12h às 15h; 12h às 16h; 14h às 18h (Astorga, 1961- 1980, p. 42 e 43). A
diferenciação nos horários representava a organização temporal executada por cada
professor, cada escola, cada grupo de alunos.
Conforme depoimentos das alunas, as aulas começavam às 8h e terminavam
às 12h, e no período vespertino o horário era das 13h às 17h. As irmãs Malta
43
A ação era utilizada para reparar os anos perdidos por falta, às vezes, de um local apropriado para
estudar, além de equiparar o conhecimento adquirido com a série de referência. Meios como este
eram comuns nas escolas rurais do período, não necessitando dos processos e documentos que
atualmente são impostos pelo sistema educativo. Na atualidade, de acordo com a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional 9.394/96, que regulamenta sobre o processo de aceleração de estudos
no artigo 24, a investigação do rendimento escolar deverá seguir alguns critérios: a) avaliação
contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalências dos aspectos qualitativos sobre os
quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais; b)
possibilidade de aceleração de estudos para alunos com atraso escolar; c) possibilidade de avanço
nos cursos e nas séries mediante verificação do aprendizado (BRASIL, LDB 9.394, 1996).
44
LAER é a sigla utilizada neste trabalho para denominar o Livro de Avisos para os professores das
Escolas Rurais com o registro das atas das reuniões organizadas pela Inspetoria de Ensino do
Município que tratava de assuntos relacionados à prática educativa, no período de 1961 a 1970.
66
iniciaram e terminaram sua escolaridade na escola rural Água Astorga, onde
estudaram somente até a quarta série porque moravam em um sítio distante da
cidade. A distância e a falta de meios de locomoção impediram-nas de dar
continuidade aos estudos. Maria José Malta relata que quando terminou seu período
escolar recebeu um diploma45 e foi realizada uma festa em comemoração ao título
alcançado, mas, dar continuidade ao estudo era difícil. Todas as adversidades
comungaram para que uma boa parte dos alunos interrompessem seus estudos na
4ª série.
A professora Zélia, que lecionara de 1963 a 1973, também relatou as
dificuldades de ir e vir à cidade. Segundo ela, nos períodos em que necessitava
fazer cursos, hospedava-se na casa de parentes pela impossibiliade de se
locomover, num mesmo dia, de sua casa à cidade.
5.2 Traços da Materialidade
Construída pela prefeitura do município, após aproximadamente 4 anos de
seu funcionamento em uma residência, a escola Municipal Rural Água Astorga tinha
um padrão próprio com as características e estrutura física relatadas pela professora
Maria Zélia e pelas alunas Maria José Malta e Sueli Malta Perugini46:
[...] construíram a escola, assim, até boa, com área na frente, tinha a
privada, o poço, cercada de balaustra, [...] com carteira, tudo. Tudo
bem arrumadinho. [...] Ah, era bem feita a escola, era de madeira,
mas era assim forrada, assoalhada, só não tinha cantina que faltava
[...].
É aí nós fomos na outra escola, ai nós estudou esse último ano do 4º
ano, já foi nessa escola nova. É verdade, tinha uma área de lado,
tinha vitrô assim, era forrada, era uma escola boa. [...] só sei que foi
construída lá, mas um tamanho bom. [...] já era cercada, bem
arrumadinha, ficava num lugar, bem, sem um matinho.
45
A Apuração do rendimento escolar era responsabilidade dos estabelecimentos de ensino, estes
deveriam “expedir certificados de conclusão de séries e ciclos e diplomas de conclusão de cursos”
(BRASIL, LDB 4.024, 1961).
46
Sueli Malta Perugini estudou na Escola Municipal Rural Água Astorga no período se 1970 à 1974.
67
Era de madeira, de assoalho e tinha uma área bem grande pro lado de fora, uma
varanda que pegava toda a frente da escola, tinha janelas que tinha vitrô mesmo, de vidro,
vidraça e tinha um porão muito grande embaixo daquela varanda. [...] Era pintadinha, bem
conservada.
A partir dos depoimentos, percebe-se que o espaço pensado para as ações
educativas estavam atreladas ao bem estar dos sujeitos, embora vivenciassem
períodos diferentes, professora e alunas expõem realidades das construções das
cidades. Janelas com vidros substituem as janelas de madeira que deixavam o
ambiente escuro. O forro, além de manter o clima do ambiente mais agradável por
diminuir o calor do sol, mantinha a proteção dos ventos e da chuva forte. O
assoalho, por sua vez, deixava um ambiente mais higienizado, eliminando o risco da
umidade.
Provavelmente, as características apresentadas motivavam a professora
Orendina a cumprir seu papel nos 20 anos que lecionou na Escola Rural Àgua
Astorga, mesmo ficando mais distante de sua casa. Acostumada com a vida dura
que vivia, os dois quilômetros percorridos por ela, todos os dias, ida e volta, não foi
motivo para deixar a docência. Consciente, sabia do seu papel junto à comunidade.
Assim, ela justifica a escolha do local de construção:
[...] a prefeitura não podia fazer no nosso sítio, porque ficava longe
para os meninos do outro perímetro, porque lá pega o lado da
estrada e o outro lado né. Então, era pra ficar melhor para o outro
lado do perímetro, e aí ficou longe pra mim, mas eu me acostumei,
eu andava, era acostumada a andar toda vida né.
O critério para escolha do local de construção da nova escola considerava a
média de distância entre um perímetro e outro. Em 1961, a escola rural Água
Astorga foi instalada em outro local. Foi alocada em um espaço específico, distante
das estruturas adaptadas da casa de família que funcionara até então. Segundo os
depoimentos, alunos e professores enfrentavam a longa caminhada e as
dificuldades do trajeto. As recordações dos dias de chuva, hoje, tiram risos de dona
Orendina:
A escola não tinha conforto, mas a gente acostumava né, com aquilo.
Ia a pé dia de chuva, às vezes eu chegava molhada na escola. Que
quando ia chover eu levava uma blusa, a gente ia de guarda-chuva,
68
mas chuva de vento molha assim mesmo. Aí, chegava na escola e
trocava. Meu guardapó ficava na escola e punha ele enxuto; Ia com
outro calçado, eu tinha uma bota de ir na escola né, a bota de zíper
na perna toda. Dia de barro, ai chegava na escola, tirava e punha o
sapato. É essa dificuldadezinhas fácil de passar.
A professora conta que os alunos andavam descalços, nos dias chuvosos
eles preferiam ir sem sapatos, pois se calçassem o barro era tanto que entrava,
atolando o pé. Jandira Malta recorda que os pés descalços chegavam grossos de
barro, para adentrar na sala de aula era preciso limpá-lo no limpador, uma espécie
de enxada cega presa a dois tocos virada com o corte para cima. Os referidos
depoimentos corroboram com os estudos de Almeida (2005), em que relata que “O
inverno, período de frio e chuvas intensas, é lembrado como a pior época, em parte
pelo sentimento de estar isolado e sozinho em um meio, por vezes, inóspito”
(ALMEIDA, 2005, p. 286).
É possível perceber que a mudança de local trouxe desconforto para alguns
alunos e para a professora Orendina, mas por outro lado, ascendeu a chance de
outros sujeitos terem a mesma oportunidade, equiparando a distância. Nas
recordações da aluna Maria José Malta, estudar era tranquilo, mas reconhece que
ficou difícil quando a escola foi edificada em outro local, mais longe de sua casa.
A ex-inspetora de ensino do município, Maria José Lopes, relata que o
terreno para construção das escolas rurais era cedido pelo dono do sítio,
preferencialmente perto de alguma casa para não ficar isolado. A prefeitura
construía a escola, depois disto era fundada uma associação de pais e professores
que ajudava na sua manutenção. A prefeitura em conjunto com o Estado mantinham
as escolas e se comprometiam com os vencimentos.
Em ata de reunião da
assembleia da associação de escola rural é demonstrada a preocupação em ajudar
a manter uma boa educação. Vejamos:
O Sr. Tesoureiro dando a importância [...] de cr$109,00, nada
aumentou e gastou durante os meses passados, e diz que está
pronto a ajudar a essa união bela, porque ele não tem filhos em
ponto de aula, mas tudo que for bom a Pátria está disposto a
trabalhar juntos com a comunidade porque é bom brasileiro (Ata da
APP, 1972, p.1v).
Reuniões semelhantes já ocorriam nas comunidades rurais quando da
necessidade de construção da escola. Segundo a ex-inspetora, os sitiantes se
69
aliavam para solicitar à prefeitura a instalação de uma nova escola na sua região,
visto que a distância a ser percorrida era grande ficando inviável transportar as
crianças, e, também porque muitas famílias não possuíam nenhum meio de
transporte e seus filhos teriam que caminhar grandes distâncias para estudar.
Conforme o projeto47 de construção da recém escola, estava previsto uma
sala com 48m², sendo oito metros de largura por seis metros de comprimento; o
telhado com quatro águas visando a proteção contra as intempéries e o conforto de
seus usuários. Incluso em seus limites foi construído uma privada. Na escola não
havia luz elétrica e água era de poço.
As experiências ocorridas neste espaço, permite-nos fazer uma reflexão
sobre o projeto pensado e o vivido por meio da memória dos sujeitos. Na planta
percebemos a preocupação para manter o ambiente iluminado e arejado. A sala de
aula tinha seis janelas; três de um lado e três de outro, favorecendo a iluminação e
ventilação. Uma porta e a varanda ocupando toda a frente da construção ainda
compõem o espaço escolar. Vejamos:
47
PARANÁ, Secretaria do Estado de Educação: Departamento de Ensino de Primeiro Grau. Plano de
Implantação da Lei 5692/71 – Ensino de 1º grau – Zona Rural (Acervo Departamento de Educação).
70
Figura 8: Planta baixa da escola indicando suas dependências e respectivas metragens.
Fonte: Plano de Implantação da Lei 5.692/71. Arquivos do Departamento de Educação.
A Fachada ilustrada apresenta a construção em madeira da sala de aula e
varanda de um extremo ao outro, no intuito de abrigar os alunos contra o sol e
chuvas, nos momentos de recreação, antes do início, e posteriormente, ao término
das aulas. Utilizariam este espaço para se protegerem enquanto aguardavam o
professor. Observemos sua fachada:
71
Figura 9: Fachada da Escola Municipal Água Astorga.
Fonte: Plano de Implantação da Lei 5.962/71. Arquivos Departamento de Educação.
A professora Orendina relatou que os alunos moradores do perímetro
contrário ao dela chegavam primeiro na escola. Quando ela se aproximava com o
restante da turma, os demais já estavam na escola pulando e brincando. Sueli
Perugini complementa que os alunos sempre chegavam mais cedo para brincar. A
varanda projetada servia, também, para abrigar os alunos em qualquer
eventualidade. Se o professor tivesse algum problema e não conseguisse cumprir o
horário daquele dia, os alunos teriam um lugar adequado para aguardar até serem
avisados da dispensa de aula.
Longe de suas casas e desprovidos de comunicação, professores e alunos
passavam um longo período no âmbito escolar, por essa razão, a escola foi cercada
com balaústras e seu espaço delimitado. Essa medida foi realizada em todas as
construções escolares rurais, com o intuito de manter todos em segurança. Nos
depoimentos é exposto que animais tinham livre acesso na redondeza e o espaço
cercado dificultava a sua presença dentro do perímetro demarcado.
A única imagem localizada em que foi materializada a Escola Rural Água
Astorga foi produzida no ano de 1980, ou seja, 21 anos após a sua inauguração. A
imagem revela certo abandono. O telhado da varanda retorcido, as paredes sem
pintura e manchadas, as janelas sem vidros e a cerca com aspecto de falta de
manutenção, como se pode observar na imagem seguinte:
72
Figura 10: Escola Municipal Rural Água Astorga.
Fonte: Plano de Implantação da Lei 5.692/71. Arquivos do Departamento de Educação.
Este momento cristalizado na imagem, nos limites da moldura revela a falta,
ou pouca manutenção ao longo de sua utilização. No entanto, a imagem evidencia a
planta ou projeto de construção apresentados anteriormente. Conforme mencionado,
o espaço da escola era cercado, protegendo professores e alunos e impedindo a
entrada de animais indesejáveis. Tal organização também ajudava a marcar o
espaço propriamente escolar, diferenciando o tempo de estudo dos demais tempos
da vida.
Embora a construção de escolas melhorasse as condições de estudo da
população rural, estudar nesse período era, para muitos alunos, um sacrificio. Para
chegar à escola e retornar para casa tinham que caminhar grandes distâncias,
enfrentando, não raras vezes, a chuva, o frio, o barro, a poeira. E, todos os dias,
sem exceção, as cercas de arame farpado; a travessia pelo pulador de cerca; o
encontro com as vacas e cachorros bravos da vizinhança cujo longínquo ruído
extraía medo e necessidade de cuidado; além das trilhas marcadas pelas patas dos
73
animais. Depois desta jornada, tinham que enfrentar, ainda, o duro trabalho exigido
pelos pais.
Sob a tutela da professora, um grupo de alunos era conduzido até a escola. A
rotina do tempo e espaço foi modificada com a instalação da escola em outro lugar.
Em depoimento, Orendina conta que muitos alunos moravam do mesmo lado que
ela e todos iam juntos para a jornada escolar.
[...] então era uma turma boa, ia sempre comigo, eles chegavam à
minha casa antes da minha saída e a gente ia juntos, e os do lado
contrário da escola, eu chegava, já estava todo mundo lá também,
fazendo bagunça (risos).
Sobre a comunidade escolar, a professora Zélia comenta que os alunos
moravam todos na redondeza, eram vizinhos. Os pais dos alunos eram proprietários
de pequenas áreas, onde cultivavam lavouras de milho, arroz e feijão e muita
plantação de café.
No período em que a professora Maria Zélia trabalhou na escola rural Água
Astorga, de 1963 a 1973, habitou próximo à instituição. Segundo ela, não haveria
nenhuma grande dificuldade, pois o sítio em que ela morava ficava bem em frente da
escola. Já a professora Orendina nos apresenta uma outra faceta: “Era muito sofrido
pra mim”.
A experiência da professora Orendina foi um pouco diferente. Como exposto
anteriormente, iniciou suas atividades na primeira casa escolar que ficava em um
sítio vizinho, próximo a sua residência. Contudo, com a mudança de endereço da
escola, para a professora continuar ensinando seus alunos a ler, escrever e contar,
passou a se deslocar todos os dias de sua casa enfrentando dificuldades no trajeto.
Assim, ambas possuem experiências diferentes, permitindo-nos observar as
diversas situações existentes.
74
5.3 Rotina Escolar
Na memória dos atores da escola rural, a rotina reunia atividades educativas
antes e após o recreio. O recreio com as atividades simultâneas entre professor e
alunos e as atividades extraclasses incluindo visitas da inspetoria, profissionais da
saúde, fotógrafo, religiosos, integrantes da banca examinadora, entre outros; e aulas
ao ar livre de ciências e datas comemorativas.
As alunas Maria José e Jandira Malta foram alunas da professora Orendina
na primeira casa escolar no ano de 1958, estudaram até a 4ª série, encerrando seus
estudos na nova escola instalada em 1961. Em sua memória, Maria José guarda
experiência e lembra que o conteúdo era difícil, suas notas não passavam de 7,0 e
revela que para ensinar, a professora utilizava dois quadros negros divididos pelo
número de turmas. Cada fila de carteiras reservadas ficava em frente de seu quadro,
uma medida para facilitar a visualização e dificultar a distração com a matéria das
outras turmas. Cada um deveria focar em seus estudos e dar conta dos mesmos.
Maria José Malta relatou que os deveres de história, expressão e matemática eram
passados pelo professor e cumpridos à risca pela classe multisseriada.
Enquanto a professora ensinava um conteúdo para uma determinada série,
os alunos da
outra série copiavam a matéria registrada no quadro. Quando
acabavam, ele apagava e imediatamente passava matéria para outra série,
enquanto os primeiros resolviam as atividades copiadas no caderno. Essa medida
tinha o objetivo de não deixar a turma ociosa evitando a indisciplina. Sueli Malta,
aluna da década de 1970 relata: “Eu lembro que ele passava o exercício tudo no
quadro né, a gente copiava no caderno e muitas vezes ele chamava aluno por aluno
pra ir ao quadro fazer, resolver no quadro as continhas”.
Além do uso do quadro negro, Maria José relata que realizavam atividades
em um livro indicado pelo professor e comprado pelos pais. Com este recurso os
alunos eram instruídos a resolverem as atividades propostas pelo professor. Em
uma das reuniões de professores rurais, no LAER, na ata do mês de julho de 1961,
é registrado “Que será obrigatório a compra da Gramática Expositiva Portuguesa”
(ASTORGA, 1961-1970, p.5v). Segundo relato da aluna Jandira Malta, era utilizado
um livro bem grosso para o professor passar atividades no quadro.
75
Desprovidos de variado material didático, restava ao professor o quadro negro
e o caderno dos alunos para que pudesse desenvolver suas aulas. As recordações
de como era o ensino na escola rural Água Astorga, é relatado pela aluna Jandira
Malta:
Já logo no primeiro dia já foi o a, e, i, o, u, o abc já entrou direto né,
tinha que aprender mesmo. [...] sempre copiando, nós fazia muita
cópia, nós fazia muito ditado né, história né, escrevia bastante
história, a gente inventava, ela mandava a gente inventar, história lá
e era assim. [...] a gente inventava da vida gente, qualquer coisa lá
inventava. [...] não dava figura não.
O depoimento retrata a metodologia utilizada pelos professores. A cópia
caracterizada pelo ensino tradicional, constituía-se de recurso usado com frequência
no intuito da memorização e aprendizado. Observa-se que não havia materiais
didáticos que motivassem os alunos nas atividades educativas. As lembranças da
aluna Jandira Malta acusam a tarefa tediosa executada durante o período que
estudou, sem suporte pedagógico dependia de suas experiências para fantasiar e
escrever suas redações. A produção de redações era uma exigência da Inspetoria,
registrada em várias atas do LAER da década de 1960. Era comum, nas reuniões
mensais, estimularem os professores na aplicação de produção textual explorando
as datas comemorativas. Na ata do mês de agosto de 1964 foi exposto: “Cada
professor deverá comemorar as datas históricas do mês com uma festinha interna,
aproveitando o tema para aplicar uma redação” (ASTORGA, 1961-1970, p.21v.).
A importância dada às datas festivas, aos feriados nacionais, aos
personagens alusivos fazia parte do currículo, acentuando o caráter exaltador,
nacionalista e patriótico.
A aluna Maria José, estudante entre 1957 e 1961, lembra que era pedido para
os pais comprarem cadernos de aritmética, linguagem, caligrafia e desenho, todos
eram encapados pela família. Sueli Malta, estudante da década de 1970, revela que
além dos cadernos era preciso comprar a cartilha, lápis e giz de cera. Material de
contagem era providenciado pelos alunos. “O professor pedia pra gente levar milho,
levava bastante milho numa caixinha de fósforo, quando a gente tava na primeira
série, pra gente aprender contar”.
No aviso nº 5 de 24/06/1961 do LAER, foi registrada a distribuição de
materiais didáticos pela Inspetoria, “Aviso, outrossim, que, possuo todo o material
76
“existente” na secretaria, no que posso servi-los, sendo inútil qualquer pedido extra,
pois não serão atendidos pela falta dos mesmos” (LAER, 1980c, p. 4). Pelo registro,
observa-se certa precariedade na disponibilização de materiais. Essa situação vai ao
encontro aos estudos de Almeida (2005) que pontua as adversidades da escola
rural, afirmando existirem “[...] poucos materiais pedagógicos, falta de livros, entre
outros” (p.286).
Apesar das dificuldades existentes, Dona Maria Zélia exalta o lado positivo do
trabalho. Segundo ela tinha dois quadros grandes, tinha carteira que acomodava os
alunos, o processo de ensino e aprendizagem se dava de forma tranquila. Dona
Orendina, por sua vez, expôs o seu medo de parar de lecionar na Escola Rural, de
tanta saudade que iria sentir.
Na organização das atividades diárias, a pausa para o descanso, dividindo o
tempo escolar em antes e depois do recreio, era vivenciada pelos atores, com
atividades diferenciadas pelos alunos e professor. Enquanto o professor aproveitava
este momento para colocar em dia as tarefas relacionadas à correção de cadernos e
planejamento de atividades, no interior da sala de aula, os alunos usufruíam da
liberdade para conversar e brincar no espaço externo. Assim relata uma aluna:
Ah! As brincadeiras às vezes, era nossa mesmo, porque ela coitada,
ela ficava lá dentro corrigindo caderno né, então nós ficava no canto,
nós era uns aluno muito bonzinho, sabe, a turma inteira não deu
trabalho para ela né.
Sueli Malta relatou que, algumas vezes, se afastavam do recinto escolar em
busca de frutas da época, nos sítios vizinhos. Coisas de criança. Apesar dessa
naturalidade campesina, os professores eram responsáveis por seus alunos. Nos
documentos analisados, registra-se que era proibido ao professor “Afastar-se dos
alunos quer em classe quer em recreio” e “Corrigir cadernos na hora da aula”
(ASTORGA, 1960-1970, p. 9).
Observa-se que o professor não poderia se ausentar, de forma alguma, seja
pelo motivo que fosse, porque os educandos ficariam sem atividades ou sozinhos.
Apesar de vivenciarem períodos diferentes, as irmãs mais velhas Jandira e Maria
José, e a mais nova Sueli expuseram que o tempo reservado para o recreio era
equacionado entre se alimentar, receber a merenda, conversar com os colegas e
brincar. Vejamos o depoimento de uma delas, Maria José:
77
Ah, nós brincava lá com os outros, ficava sentava, a gente já era
meio grandinha, então a gente tomava leite, era o leite, e ficava lá
acho que era uma meia hora de intervalo. Depois voltava tudo pra
dentro da sala e já começava estudar de novo.
As alunas Jandira e Maria José justificam que por já serem mocinhas no
tempo escolar, pois iniciaram tardiamente, não aderiam às brincadeiras de criança,
usavam o tempo em conversas com os outros alunos da mesma idade. Já a irmã
mais nova iniciou os estudos na idade ideal. Sueli conta que em seu tempo escolar,
no início da década de 1970, as meninas brincavam de amarelinha e os meninos de
bola queimada e bets. Relata que certo dia, os meninos brincando com o jogo de
bets, se machucaram. Um dos alunos, com seu bastão, atingiu a cabeça do colega,
ferindo-o
levemente.
Estes
depoimentos
deixam
ver
as
brincadeiras
e
comportamentos das crianças e adolescentes na escola, durante o espaço do
recreio. Uma vivência tipicamente do universo escolar.
Modificando a rotina em alguns dias, os professores e alunos eram visitados
por diferentes profissionais. Campanhas ligadas à saúde e serviços de registro
fotográfico eram recebidos pelos professores e alunos da Escola rural na década de
1970. Em suas lembranças, Sueli Perugini conta que campanhas de vacinas tiravam
o sono de alguns alunos, “Isso eu não esqueço menina! Eu tinha um medo da
vacina”. Outra mudança na rotina diária era quando se recebia a visita do fotógrafo,
oportunidade de registrar momentos especiais. Assim, fotógrafos e enfermeiros eram
os sujeitos que percorriam longas distâncias para marcarem a história dos alunos,
quer seja na prevenção de doenças ou na cristalização do tempo. O relato evidencia
a importância destes momentos, vejamos:
Ah, ia também um fotógrafo, de vez em quando tirar foto. Só que eu,
justo no dia que ele foi, eu faltei (risos). O meu irmão tem foto na
escola. Aí ele chegou em casa e falou: - Olha, você não sabe o que
você perdeu, foi um fotografo tirar foto de nós tudo lá. Falei: - Ai meu
Deus! Fiquei super triste (risos), por que naquele tempo era difícil
tirar foto.
A descontração também vem à memória das irmãs mais velhas Maria José e
Jandira ao relembrarem das atividades extraclasses, que, para elas, cultivava o
interesse dos alunos, sendo muitas vezes motivação para continuarem os estudos
mesmo com as dificuldades existentes. Elas se recordam dos piqueniques
78
realizados pela professora em dias que antecediam feriados importantes, assim
relata uma delas:
Ah, lembrança boa é quando a gente fazia piquenique, ai era uma
festeira, era bom demais, ai nós íamos à beira do rio, [...] tinha água
lá, arvoredo né. Ai, cada um levava um lanche, um bolo, um pão,
uma bolachinha, um biscoito [...]. Aquilo lá era muito bom, ai nós
passava o dia todo contente. Véspera assim de um dia importante,
assim, 15 de novembro, 7 de setembro. Sei lá uma data que marca
né, que tem comemoração [...].
Observa-se a estratégia da professora para registrar na memória das crianças
dias considerados importantes pela República, como o dia da Independência do
Brasil e o dia da Proclamação da República. O piquenique, que como a ex-aluna
registra, “era bom demais”, anunciava que o feriado tratava-se de uma festividade
importante.
A aluna Sueli Malta relatou com entusiasmo as experiências de germinação
de plantas que eram realizadas na escola. Segundo ela, a professora solicitava aos
alunos sementes variada como feijão e pepino para serem utilizadas nas atividades
práticas na disciplina de ciências, que eram submetidos ao método de observação.
Vejamos:
[...] era tipo de um trabalho sabe, ele explicava sobre a germinação
da semente, como germinava. Não era pra usar daquela verdura, era
pras crianças aprender como germinava as sementes de feijão, a
semente de arroz, então cada aluno levava um tipo de semente. [...]
Oh, mas era muito interessante, a gente todo dia ia lá jogar água
nela e esperar ela brotar (risos)[...] ele plantava num saquinho assim
né.[...] lá fora num cantinho do pátio.[...] Ia todo dia regar, jogar água
e observar ela.
.
O olhar curioso, no dia a dia, acompanhando o desenvolvimento das plantas,
suas modificações no decorrer do tempo ficou marcado na memória da ex-aluna.
Quanto à organização em sala, em depoimento Sueli Malta expõe que as
carteiras eram organizadas por filas, cada série era acomodada em uma delas, com
isso a professora dividia o quadro negro, um espaço para cada uma das séries e
passava fila por fila explicando o conteúdo. Diferentemente, a professora Orendina
revela sua estratégia de organização da sala, assim relata:
79
Eu fazia assim, no fundo da classe eu arrumava o quarto ano, mas
no começo da classe eu arrumava o segundo ano, então quando
assim, eu dava tarefa, dava uma explicação pro 4º ano e pedia
alguma coisa pra eles fazer e eu ia pro segundo ano ensinar.
Aquelas meninas mais espertas que acabava vinham me ajuda.
Ensinar o 2º ano.
Com o depoimento é desvendado sobre a organização mantida pela
professora Orendina, durante o período em que tinha duas séries por turma. Os
alunos maiores, da 4ª série eram dispostos no fundo da sala, nesta disposição ela
teria melhor visibilidade dos alunos menores, os da 2ª série, e quando os alunos da
4ª terminavam sua tarefa, auxiliavam a professora ensinando os alunos em estágios
menos avançados.
No ensino realizado concomitantemente para várias turmas, os alunos do
último estágio acabavam auxiliando. A aluna Sueli Malta expôs que os alunos da 4ª
série, os maiores e mais espertos, recebiam o programa do professor e passava em
uma das partes do quadro negro para o restante da turma da 4ª série. Enquanto isso
o professor mantinha o ensino para as outras turmas. O professor Sebastião recorda
que dar aula para classes multisseriadas era necessário ter astúcia e inteligência
para cumprir as exigências pedagógicas com todas as séries. Assim, ele concluiu:
[...] era uma escola multisseriada48, trabalhava com 1ª, 2ª 3ª e 4ª
série, tudo junto. [...] mas precisava saber ter um jogo de cintura pra
poder controlar senão não conseguia. [...] A 1ª série ficava mais
tempo, que as outras turmas. [...] Se trabalhasse com uma série,
muito, se desse mais atenção pra um, as vezes ficava faltando pras
outras.
As salas multisseriadas impuseram ao professor a busca de estratégias para
cumprir com a missão de ensinar, simultaneamente, alunos em estágio de
aprendizagem diferente. Recorrer ao auxilio de outros alunos mais avançados
configurou-se em uma prática escolar corriqueira, ou melhor, em uma condição sinequa-non.
48
De 1964 à 1977 a Escola Rural Água Astorga funcionava com dois professores, depois disso,
passou a ser sala multisseriada.
80
5.4 Traços do Relacionamento
A relação entre a professora e os alunos foi lembrada por uma ex-aluna como
sendo de carinho, como de quem queria o bem dos seus alunos, como muito boa.
Segundo ela, a professora D. Orendina corrigia com paciência o modo de falar dos
alunos, treinando-os para o modo culto da língua portuguesa. Assim relata,
Ah, era muito bom, que ela era muito boa professora pra gente, sabe.
É, corrigia alguma coisa da gente, que a gente falava errado. Falava:
“É memo né”? [...] a outra, “centium”. Ela: “ai não é memo, é mesmo”,
ela falava. E a Geralda “centium”. “Não é centium.
A ex-aluna Maria José percebia a professora como pacienciosa. Por outro
lado a professora D. Orendina via entusiasmo e dedicação no comportamento de
seus alunos, assim afirma:
[...] mas eu gostava, eu adorava lecionar lá, pelo seguinte, é que os
alunos iam pra aprende, não iam pra bagunça não. Sempre tem uma
ovelha negra né, mas a maior parte ia pra aprende e perguntava e
queria saber mesmo, era muito bom.
É interessante observar que o gosto pela profissão tinha uma relação direta
com a boa experiência e vivencia com os alunos. A professoras Maria Zélia guarda
boas lembranças de seu tempo, para ela, aqueles tempos eram bons, afirma que as
turmas eram boas, todos comportados e interessados. O professor Sebastião, que
lecionara entre os anos de 1975 a 1994, também afirma:
[...] então, até as vezes quando eles iam fazer visitas nas escolas, os
alunos tudo sentado, tudo comportados, até falava para o professor,
parece que a escola tava fechada professor, não tem aula (riso), que
nada estão todos estudando (risos), quem conversava mais era o
professor (risos).
Os depoimentos das professoras Orendina e Maria Zélia e do professor
Sebastião se aproximam em relação à forma como viam os seus alunos:
interessados e estudiosos. Eles entendiam esse bom comportamento em sala como
um sinal de respeito. Por outro lado, há relatos de como os alunos sentiam receios
de seus professores. A ex-aluna Sueli relata que o medo excessivo do professor
81
prejudicava o processo de ensino e aprendizagem, pois ela se esquivava dos
questionamentos e esclarecimentos de suas dúvidas sobre o conteúdo. Assim ela
relembra:
[...] as vezes atrapalhou um pouco a gente aprender por esse medo
que eu tinha do professor. Porque tinha muitas continhas mesmo, em
matemática, eu era bem difícil de eu aprender as continhas de
emprestar número, subtrair eu não conseguia aprender. Eu fui
aprender depois que eu sai da escola. Aí caiu ficha (risos). Aí eu
aprendi, ai assimilei, como que era fazer aquelas continhas, mas
antes eu não tinha coragem de chegar ao professor e pedir uma
orientação certa né, eu tinha muito receio.
É possível perceber que o aluno preservava um distanciamento, determinado
na maioria das vezes pelo receio e medo, do professor. Esta situação não permitia
um aprendizado mais efetivo em sala. Guardadas para si, as dúvidas prejudicavam o
desenvolvimento das atividades. Acrescentava-se a essa situação a dificuldade que
os alunos possuíam para realizarem suas atividades em casa. A maioria dos alunos
não contava com alguém para orientar. Os filhos mais velhos tinham que resolver
sozinhos as atividades de casa, não podiam contar com os pais semianalfabetos,
Jandira Malta relata que seus pais, “[...] só sabiam escrever o nome só e lê, eles não
tinha como ensinar a gente né, eles não tinham bagagem pra passar pra gente [...]”.
Já a irmã mais nova recorda que a ajuda vinha dos irmãos mais experientes,
vejamos:
[...] porque meus pais praticamente eles não estudaram, minha mãe
mesmo, ela praticamente aprendeu o nome e só, então os irmãos
mais velhos é que davam uma ajuda pra gente.
Pode-se perceber as dificuldades enfrentadas no processo de aprendizagem
dos alunos que viviam em um ambiente de pouco contato com a lingua escrita. Além
desta dificuldade, Jandira Malta relata a falta de condição física e de estrutura para
realizar suas atividades em casa, assim diz que:
[...] a noite tinha que fazer dever, tarefa com o claro da lamparina né,
não tinha luz elétrica. [...] a gente com sono. A gente trabalhava
bastante né, no pesado né, na roça né. A gente cansava né, depois
acabava de jantar dava aquele sono, ainda tinha que fazer o dever
com claro de lamparina.
82
No depoimento, percebem-se as dificuldades da vida no campo: trabalho
pesado durante o dia e sem luz elétrica realizar as atividades de casa se
transformava em algo muito penoso.
Esta situação relatada, mais as estradas ruins que dificultavam o acesso, o
distanciamento da cidade e o desgaste físico da rotina diária de serviço
desanimavam os alunos e a maioria não deu continuidade nos estudos. Relembra
Jandira Malta, “[...] foi até bom parar de estudar até certo ponto, a gente trabalhava
muito”. Dificilmente os filhos dos sitiantes foram dispensados do trabalho no campo,
além do horário que permaneciam na escola. Sustentá-los nos estudos, longe do
trabalho e com todos os afazeres e dificuldades da roça demandava uma situação
financeira estável, realidade pouco provável da maioria dos alunos das escolas
rurais. A condição de trabalho da criança e do jovem era uma realidade dos anos 60.
Passador (2006, p. 115) conclui em seus estudos que “[...] o mais comum é o jovem
após a quarta série primária, procurar empregos na cidade, como empregado
doméstico, no pequeno comércio ou na construção civil”.
Supostamente, a distância e a rotina diária afastavam a família das atividades
na escola. De acordo com a professora Orendina, a participação dos pais nas
reuniões propostas era insuficiente, ela expôs que as poucas vezes que solicitavam
a presença deles, uma minoria comparecia. ”Olha, quando eu fazia reunião com os
pais, ia alguns homens só. As mulheres não iam. Então não tinha muita
colaboração”. Este comportamento desestimulava a prática de reunir as famílias em
torno das questões educacionais. A aluna Jandira Malta não se recorda de reuniões
e justifica que não era necessário porque “os alunos eram comportados”. Quando a
professora necessitava enviar algum comunicado aos pais, ela passava no quadro e
os alunos copiavam no caderno. Embora não houvesse reunião de pais, a aluna
Maria José diz que seu pai sempre se preocupou com a educação dos filhos, “[...] o
pai sempre olhava os cadernos da gente pra ver. Ah, o meu pai era assim, ele dava
bastante atenção pros filhos nessa parte”. O incentivo dos pais ao estudo também foi
relatado por Sueli Malta, “[...] nunca ele falou hoje você não pode ir, você tem que
me ajudar no serviço, não, ele sempre apoiou”. Contudo, apesar de se sentir
apoiada pelo pai, as irmãs Malta concluíram a quarta série, encerrando seus
estudos.
83
Diferentemente das reuniões com a professora, as reuniões da Associação de
pais e mestres costumava reunir a comunidade . A pauta variava entre o relatório de
receita e despesa, orientações nutricionais e assuntos pertinentes a educação.
Passou a palavra ao Tesoureiro que leu o balancete, entrada e
compras da mesma e o débito atual. [...], passou a palavra a profª
Ione, a líder sobre a alimentação, que leu um artigo do jornal do
Mobral “Aprenda como usar a soja para fazer o leite e o pão [...]
passou a palavra a líder da higiene, [...] lendo [...] um artigo “Muito
cuidado com a sarna, principalmente as crianças”. [...] convidando os
presentes para o culto da palavra (ASTORGA, 1974, p. 6).
Está sendo organizada pelo sindicato rural, Prefeitura e Inspetoria
Municipal de Ensino a Campanha da verminose, assim pede a
colaboração de todos, pais, professores [...] (ASTORGA, 1978, p.24).
Nesta reunião foi anunciado aos pais dos alunos que as aulas
terminará no dia 29 do mesmo e que os exames finais serão dia 28
deste (ASTORGA, 1974, p.8).
Os fundos das promoções da Associação de Pais e Mestres, além de
proporcionarem melhorias para a escola, destinavam-se à realização da cerimonia
da primeira comunhão. A escola também era local de aulas de catecismo, uma vez
na semana, no sábado, os professores reuniam as crianças no intuito de inculcar a
fé católica. Desta maneira, observa-se que outra maneira de aproximação das
famílias da comunidade era por meio da religião, encontros de catequese eram
realizados no interior da escola.
5.5 Traços da Avaliação
Com relação ao processo avaliativo e a verificação do aprendizado,
realizavam-se, formalmente, de duas maneiras. A primeira, mensalmente, conduzida
pelo próprio professor e a segunda, no final do ano aplicado por uma banca
examinadora selecionada pela inspetoria de ensino antecipadamente.
As avaliações aplicadas mensalmente pelo professor tinham o objetivo de:
84
[...] diagnosticar o desenvolvimento dos alunos pesquisando e
interpretando os conhecimentos, as habilidades e as atitudes dos
mesmos tendo em vista as mudanças de comportamento propostas
nos objetivos (PARANÁ, Plano de Implantação da Lei 5592/71Ensino de 1º grau - Zona Rural).
De acordo com a ex inspetora Maria José Lopes, as orientadoras
da
Inspetoria de ensino elaboravam as provas e mimiografavam, nos dias marcados
cada professor retirava na inspetoria. Essa dinâmica mensal é descrita na ata do dia
cinco de outubro de 1966, “Depois do dia 15, procurar as provas que serão
aplicadas no final desse mês. Essa é a última prova bimestral do ano” (ASTORGA,
1966, p.48).
Os conteúdos destacados no programa49 distribuÍdos para todos os
professores no início do ano letivo e exigidos na avaliação eram trabalhados pelo
professor que deveria segui-lo à risca durante todo o bimestre e contemplavam as
disciplinas de Língua Portuguesa; Integração Social e Iniciação à Ciências.
A professora Maria Zélia relatou que após receber as questões já elaboradas
pelas orientadoras da Inspetoria de ensino, ela passava as questões no quadro e os
alunos copiavam. Após a aplicação as provas eram levadas de volta para Inspetoria
de Ensino para serem revisadas e vistadas, em ata de reunião do dia dois de
setembro de 1966 apresenta essa ação.
Levam no dia de hoje as provas para setembro, se o professor não
trouxe as provas que aplicaram em agosto, tragam-na até o dia 15
para serem revisadas, se assim não o fizeram, serão punidos
(ASTORGA, 1966, p.46).
Percebe-se que a técnica praticada todos os meses tinha como finalidade o
controle dos resultados, a observação do trabalho do professor e a certificação da
aplicação da avaliação.
A aluna Sueli Perugini estudante da década de 1970 descreve características
das avaliações. ”Era uma folha grampeada, umas três folhas, papel sulfite e ele já
trazia pronto as perguntas, na escola não tinha nada pra imprimir [...] só pra gente
responder tudo”.
49
O Programa faz parte do Plano de Implantação da Lei 5692/1971, elaborado pela Secretaria do estado da
Educação-Departamento de Ensino de 1º grau. (Arquivos do Departamento de Educação)
85
O processo de avaliação da aprendizagem se compunha informalmente de
outras atividades avaliativas planejadas pelo professor, como se recorda a aluna
Jandira: “Ela corrigia caderno por caderno, e dava nota”. No Plano de Implantação
da Lei 5692/71 consta o grupo de atividades que compunham a nota do bimenstre.
[...] testes de aproveitamento orais e escritos, questionários, tarefas
específicas, trabalhos de criação, observações espontâneas ou
dirigidas e outras que se recomendem (PARANÁ, , Plano de
Implantação da Lei 5592/71-Ensino de 1º grau - Zona Rural, p.81).
Ao aplicar a avaliação mensal e verificar os resultados, a professora Orendina
utilizava estratégias para diminuir a defasagem dos alunos, ela aplicava uma
avaliação relâmpago. Comunicava os alunos: “Oh, hoje nós vamos ter uma
sabatina”. Tudo ensinado naquele mês era recapitulado em forma de avaliação.
Observa-se que esse tipo de investigação era peculiar ao trabalho da professora
Orendina. Caso os alunos apresentassem dificuldade no domínio do conteúdo, ela
revisava. “Eu ensinava, ia no quadro negro e explicava, ensinava. Todo mês eu
fazia isso”.
Para os alunos com defasagem por causa da falta de assiduidade, ausência
justificada pelo auxílio dado aos seus pais na época da colheita, a professora se
empenhava em dupla jornada para amenizar a defasagem, combinava com os
alunos que depois da aula eles acompanhariam-na até sua casa e realizava a
recuperação dos conteúdos. Assim relata a professora:
Teve um ano que eu tinha o quarto ano e o segundo. Faltaram muito
e depois que eles voltaram para a aula, eu dei recuperação na minha
casa. [...] depois da escola, iam comigo já. Daí eu deixava eles a
vontade lá em casa descansando um pouco, [...] Eu pedia para eles
levar lanche e tomar. E dava uma recuperação pra eles.[...] Não tinha
outro jeito né, porque eu não queria que meus alunos reprovasse.
Essa situação era causada, essencialmente, por alunos que tinham
frequência baixa devido à necessidade de ajudar o pai na colheita. Dessa forma,
eram beneficiados com a dedicação da professora que realizava a dupla tarefa sem
ganho extra. Tal dedicação representava para professores e alunos a possibilidade
de finalização do ano letivo com um melhor rendimento dos alunos, a preocupação
era causada pela proximidade do exame final. A aluna Sueli Perugini relata essa
experiência:
86
No final do ano era, falava aquela época de exame. [...] a mãe
preparava marmita com almoço com frango, era uma comida assim,
forte, ela preparava por que a gente ia fazer um exame que era prova
do final do ano né. Então aí vinha diretora. [...] Até aquele dia era
muito importante, a gente ficava super preocupada [...] era final do
ano. [...] Era o exame. Medo de não passar né, ficar repetente,
morria de medo.
De acordo com ata da reunião de maio de 1963, os alunos que tivessem nota
superior a 4,5 deveriam realizar o exame final, entende-se que nota inferior estariam
automaticamente reprovados.
Fazia parte da organização do dia do exame, o professor solicitar para os
alunos trazerem lanche de casa. Essa medida, possivelmente, era com a intenção
do professor, neste dia, não necessitar preparar a merenda e, fundamentalmente
pela possível demora na realização do exame e a necessidade das crianças estarem
bem nutridas.
No dia marcado, os professores ficavam responsáveis em organizarem o
espaço para a realização do exame. Desprovido de qualquer tipo de facilidade e
muitas vezes, tendo que custearem as despesas com produtos de limpeza,
transformarem a escola num ambiente a contento da Inspetoria de ensino, não era
tão simples. Nas atas de reunião é comum encontrar dados que mostrem que as
escolas deveriam ser mais cuidadas, mesmo sabendo que o esforço era
desempenhado quase sempre por apenas um professor. Assim diz numa ata:
Fiz visitas no final do mês passado e de modo geral está a desejar.
Quanto a asseio, o professor deve cuidar mais de sua sala de aula.
Oriente os seus alunos, não confunda com orientar como somente
mandar executar. Professor deve estar junto encaminhando e
ajudando. Com quadro de folhinhas faça quadros, esses além de
ornamentar, alegrando o ambiente, servirá para trabalhos escolares.
O pátio não deve ser esquecido, pois o mesmo não é depósito de lixo
(ASTORGA, 1961-1970, p. 73).
A rigidez da cobrança revela um estado de higiene deficitário das escolas
rurais. Por outro lado, faz pensar nas dificuldades enfrentadas pelo professor para a
preservação do ambiente escolar asseado.
87
Para a aplicação do exame final, professores que lecionavam em outras
escolas rurais eram convocados para participarem da banca examinadora50. “Os
dias dos exames de cada escola já estão marcados, e peço que cada professor
tome conhecimento dos dias em que tomarão parte da banca examinadora”
(ASTORGA, 1961-1970, p.13v). A banca composta por três professores tinha a
função de aplicar o exame, corrigir e registrar a nota no livro. À espera da banca
examinadora, professor e alunos deveriam estar uniformizados e preparados para
realizarem a prova final. Assim constam as instruções em uma ata:
Durante a realização das provas não deverão os professores
perturbar o trabalho dos examinadores. O professor da classe deverá
permanecer em pé, de preferência no fundo da sala, observando o
exame. Poderá interferir no mesmo somente quando, a pedido do
examinador. Tem o examinador, neste dia toda autoridade dentro da
classe, podendo até determinar a retirada do professor, se este
demonstrar deliberada intenção de pertubar a normal aplicação da
prova (ASTORGA, 1961-1971, p. 34v).
O rigor das determinações trazia preocupação para professor e alunos. A
possibilidade de não passar de ano deixava todos amedrontados. Assim lembra
Maria José Malta:
Ah! A gente ficava preocupada, nossa! Com medo de não passar né?
Que no final do ano não passou, aí reprova né? Mas graças a Deus
nós nunca reprovou, nem eu nem meus irmãos, nem ninguém lá da
escola. Ela ensinava muito bem pra gente, tinha muita paciência pra
ensinar e a gente nunca reprovou.
O medo da avaliação era um sentimento presente na memória da ex-aluna. O
fato de a professora ensinar bem, no seu conceito e de haver um período de revisão
dos conteúdos, - conforme consta nos documentos analisados o aviso “Nesse mês o
professor não precisa fazer diário, pois suas aulas serão revisão das passadas”
(ASTORGA, 1966, p. 49) -, não afastava o medo provocado por aquele ritual de
avaliação. Por outro lado, havia também a preocupação, ou melhor, o medo do
professor, tendo em vista que sua eficiência não era medida apenas pelo
cumprimento das obrigações, mas também pelo rendimento de seus alunos.
Vejamos:
50
Ver em anexo a relação dos professores convocados para compor a banca examinadora.
88
Avisamos aos senhores professores que no final do ano letivo a
professora que não tiver a aprovação mínima de 70% dos alunos
matriculados a mesma será excluída do quadro de professores
(ASTORGA, 1961-1970, p. 93).
A aprovação mínima de 70% dos alunos era o principal critério de avaliação
da eficiência do professor, uma vez que o descumprimento desta prerrogativa
poderia significar a sua demissão.
Uma ex-aluna lembra que, na antiga casa escolar, a banca examinadora era
composta por professoras que ela nem se recorda. Mas, na nova escola a depoente
recorda que uma das aplicadoras era a ex inspetora Maria José Lopes, que ficou em
volta dos alunos indagando, questionando e fazendo perguntas sobre os exercícios
da prova. Recorda a aluna Maria José, inconformada com a situação que vivenciou.
Que ela falava: “oh, meninos vocês pensem bem, é uma coisa
comum, tirando cinco de seis só pode ficar?”. E eu ficava “como pode
ficar? Como pode ficar?” Mais mesmo, quebrei a cabeça pra por a
resposta naquela prova lá viu.
Conforme orientação da Inspetoria de ensino, o professor não poderia
interferir na aplicação do exame. A ex-professora, D. Orendina, lembra desse
período e relata que havia um bom relacionamento entre ela e os professores da
banca examinadora. Uns colaboravam com os outros. Quando a banca vinha na sua
escola aplicar o exame, ela ficava na sala, parada, observando e neutra. Ela, como
professora líder e responsável pela escola e pela turma, conhecia cada um de seus
alunos, mas mesmo assim não poderia interferir na dinâmica posta. Mais ou menos
aflitos todos seriam avaliados da mesma maneira.
Após a aplicação do exame era preparado, pelo professor da escola, o
almoço ou lanche para os membros da banca, que passavam o dia todo na escola
fazendo a escrituração das notas no livro de presença, uma vez que eram
responsáveis pelo lançamento das notas e por qualquer irregularidade que
houvesse. Assim:
Os boletins deverão estar todos em ordem. Todo aluno que entra em
prova, tem que ter seu boletim. Organize toda escrituração, não
somente na execução, mas na organização. Encape, capriche, e
encerre corretamente seus livros. Preste atenção ao fazer o diário.
89
Não rabisquem, não escrevam a lápis. Com ordem é que
conseguirão elevar o progresso na aprendizagem (ASTORGA, 1961,
p.48).
A exigência em relação ao cumprimento do horário de aula, a elaboração de
planejamento, ao preenchimento do diário de classe revela, por um lado, que tais
comportamentos foram forjados, tanto nos alunos como nos professores. Por outro
lado, revela a dificuldade da Inspetoria de Ensino em controlar o trabalho realizado
nas escolas isoladas, tendo em vista a sua distância da sede administrativa. A
premiação, instituída para o professor que atendia ao padrão de eficiência exigido,
indica a estratégia da Inspetoria para ter seus objetivos alcançados.
Em relato, o professor Sebastião expõe que o exame final para todos os
alunos deixou de ser aplicado, visto que à medida que alcançassem uma média
mínima nas provas bimestrais eram dispensados de realizarem o exame final.
Não aí não precisava, porque alcançava a média, e eu não tô
lembrado no momento né, mas parece que era quem tivesse 6, nota
6 né, já , até o final do ano já passava direto. Então com a notinha,
por exemplo, nota vermelha já existia, quando tinha essa nota mais
fraca, então tinha que recuperar esse aluno até a prova, né, até a
prova, o exame final.
Os dois processos formais de avaliação apresentados permite refletir sobre as
relações entre a Inspetoria de Ensino e os professores. Percebe-se que ao elaborar
as provas bimestrais controlariam a aplicação dos conteúdos estipulados. Os
professores não teriam alternativa de trabalho a não ser o programa ofertado, por
outro lado, o exame final apresentava dupla função: avaliar o aluno, medindo seu
conhecimento e aferir o potencial do professor. De acordo com o professor, ao
atribuir médias mínimas, garantia um melhor aproveitamento do conteúdo e das
notas obtidas, desobrigando o aluno do exame final. Deixar de enfrentar a avaliação
ao fim da 4º ano foi de certo modo um alívio para os alunos e professores. O medo,
a angústia e tensão eram sentimentos que permeavam o período de aplicação das
provas.
90
5.6 Percursos da Profissão Docente
Senhor!
Tu que ensinastes,
Perdoa se eu ensino,
Se eu levo o nome de mestre
que levaste na terra.
Concede-me o amor único
de minha escola,
que nem o sortilégio da beleza
seja capaz de roubar-lhe
minha ternura de todos os dias.
Gabriela Mistral.51
Nas escolas rurais, o professor era responsável por todas as ações no espaço
de seu domínio, sendo que ele executava ao mesmo tempo múltiplas funções, não
tendo alguém que o substituísse. A ele era dada a responsabilidade de fazer todas
as tarefas: limpar e organizar a sala, selecionar e cuidar dos materiais, preparar os
alimentos, além de ensinar a ler, escrever e calcular. Os alunos e o prédio escolar
ficavam sob sua responsabilidade.
O comportamento esperado do professor transitava entre os cuidados de
asseio com as salas de aula e pátio da escola e o de mestre. Aquele que deve
orientar e estar sempre junto ao seu aluno. Os deveres dos professores, assim como
o bom comportamento, eram expressos mensalmente em cada reunião pedagógica.
A Escola deve ser considerada como um templo, onde a fé se renova
e a vida se aperfeiçoa. Compete somente ao professor que oriente e
peça auxílio aos pais de seus alunos e alunas que o ajudem a ter
uma escola que toda criança merece ter [...] [...] Porque o professor
não a conserva? A escola é o reflexo de cada professor, de sua
casa, e como trata os seus [...] [...] queremos salas limpas,
organizadas e pátios cuidados. Só não consegue o que não quer
realizar. Queremos bons mestres e o mestre bom é completo, cuida
completamente da escola e não acha dificuldade em nada
(ASTORGA, 1961-1970, p. 59).
51
A oração foi retirada do convite de formatura da primeira turma do Projeto Logos II, realizado em 1979 no
município de Astorga.
91
Nos depoimentos das ex-alunas Maria José Malta e de Sueli Malta Perugini
percebe-se que os alunos auxiliavam o professor em seus afazeres. Essa prática se
manteve tanto na década de 1960 quanto na década de 1970, períodos vividos
pelas irmãs. Assim relata Maria José:
[...] ela fazia cada um limpar sua carteira, que sentava de dois em
dois, então acho que cada um limpava, aqueles dois que sentava,
limpava. Eu lembro que a gente limpava embaixo, onde que ia
colocar os livros, então, cada um limpava sua carteira. E varre, a
gente ajudava ela varre também [...].
E continua Sueli:
[...] a respeito da merenda, ele instruía, como eu mesmo estava na
quarta série [...], [...] ajudava a fazer a merenda, a sopa, ele instruía a
gente, ele explicava tudo certinho.
[...] a gente chegava um pouquinho mais cedo e cada um de nós, ele
pedia pra levar legumes, um levava batatinha, outro levava
mandioca, até eu lembro, eu levava muito cará, tinha muito cará, eu
gostava muito, eu levava cará. Aí a gente chegava lá um pouquinho
mais cedo, ele pedia pra gente ir mais cedo pra poder preparar, pra
cascar, picar, quando a gente era maiorzinha, a gente já sabia fazer
isso né. Então a gente chegava e deixava tudo picadinho, repolho,
couve, sabe, fazia tudo num balde enorme. [...] deixava tudo
preparado, tudo preparadinho dentro do balde, aí quando faltava, tipo
assim uma meia hora pra merenda, talvez ele mesmo ia lá e acendia
o fogo e ponhava cozinhar. Aí de vez em quando um ia lá dar uma
mexidinha (risos) Era muito gostoso. Era assim, mas sempre teve a
merenda, quando não era sopa era leite em pó. Ele explicava né,
orientava a gente.
Quando a escola ainda não possuía um fogão, a merenda era pré-preparada
pela professora. No dia em que serviria sopa, por exemplo, fazia em sua casa,
deixava secar bem para ficar mais leve. A distância a ser percorrida era de
aproximadamente dois quilômetros, ela se revezava com os alunos maiores para
carregar o caldeirão com a merenda. No local, no horário do recreio, uma vizinha
próxima oferecia água fervendo para acrescentar no caldeirão de sopa tornando-a
caldosa. Para a preparação do leite o processo era semelhante, misturava ao leite
em pó a água quente e servia aos alunos. Os estudantes por sua vez, traziam
consigo bolacha e pão para acompanhar a bebida quente.
Nos finais de semana, para a limpeza da sala, professores e alunos
combinavam e meninas e meninos maiores se revezavam. Segundo o depoimento
dos professores as crianças auxiliavam na limpeza da escola, no sábado. O dia em
92
que tinha aula, houve um período em que havia aulas no sábado, a professora
lecionava até o horário do intervalo e depois reunia os alunos, escolhia as meninas e
meninos grandes para ajudarem. As meninas ajudavam na lavagem da escola e os
meninos carpiam em volta dela e puxavam a água da cisterna. Era necessário lavar,
jogar água para retirar toda poeira ou barro acumulado durante a semana.
Nos documentos analisados encontramos registros sobre a importância de o
professor manter a escola em bom estado e se responsabilizar pela merenda, “Não
descuidem da merenda, façam-na diariamente seguindo as orientações da
orientadora da merenda” (ASTORGA, 1961-1970, p. 45).
Conscientes, os
professores sabiam que não havia outra pessoa designada para auxiliá-lo. No
depoimento da professora Orendina é revelado à multiplicidade de funções que
ocupava em prol do bem estar de seus alunos. Assim diz ela:
Olha, eu era a professora, era servente, era muitas vezes enfermeira,
era assim, psicóloga muitas vezes. (risos). Psicóloga analfabeta,
(risos) que beleza! Mas a gente, como se diz, fez tudo o que podia,
tinha umas meninas que desmaiava na escola, eu acho que mal
alimentada, né. Na parte da manhã e eu tinha que cuidar delas, ai eu
perguntei para o Dr. Arlos, como que eu fazia, ai ele me ensinou, não
põe de costa não, deita no seu colo de bruço e vai conversando que
elas voltam. Isso ai ele explicou a causa né. Foram várias vezes. E
sangramento do nariz também né. Como isso acontecia. Muito calor,
vinha de longe e ficava ainda pulando, brincando né (risos). Mas não
teve problema nenhum não.
Sem formação adequada, os professores à medida do possível acatavam as
determinações da Inspetoria de Ensino. A exaltação de comportamentos desejados
se fazia durante os encontros mensais. Contudo, percebemos que nem todo o
professor cumpria o que era solicitado. Julia (2001, p. 24) observa essa situação,
“[...] medem prudentemente seus atos em seu campo de atuação, distinguindo muito
bem o possível do desejável”. O isolamento dificultava o controle das ações dos
professores e dos alunos pela inspetoria de ensino. Professor e alunos
equacionavam as problemáticas diárias na coletividade. Em relação ao não
cumprimento das regras a ex inspetora auxiliar D. Maria José Lopes relata que “[...]
não era muito fácil dos professores seguirem normas”.
Reclamações foram registradas pela equipe da inspetoria, após visita nas
escolas. As exigências decorriam de denúncias dos pais e da comunidade local.
93
Segundo a ex-inspetora, os pais procuravam-na para informar, em especial, sobre
as faltas do professor.
Esta inspetoria planeja visitas escolares, e quer ter a satisfação de
encontrar seu corpo docente trabalhando de maneira eficiente.
Horário corretamente obedecido, planejamento das aulas, que façam
o diário, professores e alunos uniformizados. Escola limpa, pátio
limpo denota ponto favorável para que o professor vá classificandose para o prêmio que será oferecido ao final do ano (ASTORGA,
1961-1970, p. 188).
A equipe da Inspetoria de ensino acompanhava o trabalho do professor de
perto, por meio de visitas realizadas nas escolas rurais investigando seu trabalho.
Contudo, esse trabalho era insuficiente para garantir o funcionamento ideal das
escolas rurais.
Por outro lado, o depoimento das alunas exprime que a professora, também
tinha compromisso com seus alunos. Em seu depoimento, Maria José Malta expõe
que raramente a professora faltava, salvo os dias que não se sentia bem de saúde.
Nesse caso, enviava alguma pessoa para dispensá-los e avisá-los sobre o motivo.
Assim relata:
[...] talvez problema de saúde. [...] às vezes ela não tava boa, então
ela não ia né, mas era poucas vezes. [...] Nós morava perto, ai ela
avisava, mas já aconteceu da gente ir lá na escola né e ela não
aparecer e depois ir mandar avisar na escola mesmo né, porque daí
já avisava todos né? É, muitos morava longe, assim morava do outro
lado da estrada. [...] então não tinha como ela ir na casa avisa[...]
acho que o marido dela que ia lá avisa, falava que ela não podia ir,
que ela não tava bem, mas foi poucas vezes.
Além dos imprevistos de saúde, nos dias de reunião na Inspetoria de Ensino,
na cidade, os professores deixavam os alunos de sobreaviso e faltavam às aulas. A
aluna Jandira relata que “[...] ela se ausentava porque ela vinha em reunião de
professores aqui na cidade né, mas eu não sei quantas vezes que ela vinha, não
lembro mais, se era uma vez por mês [...]”. Segundo o depoimento da professora
Orendina, era ordem da Inspetoria de Ensino dispensar os alunos em dias de
reuniões.
A obrigatoriedade de frequência do professor é relatada nas atas de reuniões
do Livro de Avisos das Escolas Rurais do dia 24 de maio de 1961, a inspetora
94
auxiliar lembra a todos os professores da obrigatoriedade de presença, caso
contrário, seriam punidos com ”três faltas” (ASTORGA, 1961, p. 4). Desta forma, não
haveria outra tomada de decisão por parte do professor, senão a de dispensar os
alunos.
A condição de professor leigo e a falta de preparo para o magistério é
relatado pela ex-inspetora de ensino do município. Segundo ela, nas primeiras
décadas da colonização, nos anos de 1950, de 1960 e de 1970, o ingresso na
carreira pública do magistério ocorria por meio de convites informais ou por
influência política. As pessoas convidadas tinham, geralmente, um grau maior de
instrução, mas não passava da formação do antigo ginasial. Em alguns casos, o
próprio professor indicava um parente, que morava perto do local, e assim foi se
constituindo o quadro funcional das escolas rurais com professores leigos.
Apesar da lei 4024/1961 exigir em seu artigo 52 que “O ensino normal tem por
fim a formação de professores, orientadores, supervisores e administradores
escolares destinados ao ensino primário” (BRASIL, 1961), no artigo 116 da referida
lei é exposto que se houver insuficiência de profissionais formados, os candidatos a
professores do primário passará por exame de suficiência.
Enquanto não houver número suficiente de professores primários
formados pelas escolas normais ou pelos institutos de educação e
sempre que se registre esta falta, a habilitação ao exercício do
magistério, a título precário e até que cesse a falta, será feita por
meio de exame de suficiência [...] (BRASIL, 1961).
Sobre essa exigência consta na ata de reunião do dia 12 de agosto de 1964:
“Os professores que ainda não prestaram exame de suficiência nesta inspetoria,
deverão fazê-lo oportunamente cuja data será designada por esta inspetoria” (LAER,
ASTORGA, 1964, p.21 v). O exame, portanto, seria a certificação de aptidão para
lecionar nas séries iniciais.
Nesse sentido, para ser professor das escolas rurais bastava ter o 4º ano,
saber ler, escrever e contar. Ensinando o que sabia aos seus alunos. É o que depôs
a professora Maria Zélia, que iniciou a jornada de trabalho tendo apenas o quarto
ano do antigo primário.
Então eu naquela época só tinha o primário, mas assim a gente,
igual eu falei pra você, [...] nas reuniões pedagógicas, [...] eles
95
orientava muito a gente, a gente aprendia muita coisa naquelas
reuniões. Tinha as professoras,[...] [...] orientavam muito, explicava.
Qualquer dificuldade que as professoras achava, elas orientava, e ia
seguindo assim.
Em busca de amenizar os problemas com a qualificação dos professores das
escolas rurais, foram necessárias medidas a nível estadual e federal. Uma das
ações paranaenses em que o município ingressou foi o programa oferecido pela
CETEPAR. O programa foi uma das primeiras iniciativas para melhor capacitar e
formar professores que atuavam nas escolas rurais do estado paranaense. De
acordo com a matéria publicada na revista Astorga, 1979, o projeto tinha como
objetivo desenvolver um trabalho de melhor qualidade nas salas multisseriadas.
Guardadas em sua memória, o professor Sebastião recorda do curso que auxiliou
nas turmas de alfabetização.
[...] teve um treinamento pros professores pra escola multisseriada
né. Depois facilitou com esse treinamento porque pra alfabetização,
então foi implantado o método da bola, né. Até esqueci o nome
desse professor de Curitiba que implantou isso aqui. Então todas as
escolas do Paraná essa época estava implantando esse, esse
sistema da bola, e era bom a gente fazia o treinamento.
A mudança na legislação da educação das escolas rurais de Astorga foi
impulsionada na década de 1980, causando modificações no âmbito da educação
do meio rural. A exigência mínima para ministrar as aulas, fez surgir uma nova
mentalidade em relação à formação necessária. A Lei 5.692/71 expõe em seu art.
30. “Exigir-se-à como formação mínima para o exercício do magistério de 1º grau, da
1ª a 4ª séries, habilitação específica de 2º grau” (BRASIL, 1971).
Para escapar da situação irregular, os professores deveriam ingressar em
programas específicos para regularização do exercício de sua profissão. Como a
maioria dos professores de 1ª a 4ª séries não possuía tal exigência, foi necessário
que programas fossem criados pelo governo federal para atender a demanda. Temse registrado que em 1979, na cidade de Astorga, o Programa Logos II52 e titulou
52
O Programa Logos II foi implantado em diversas cidades que apresentavam semelhante
problemática. Seu intuito era de habilitar professores leigos e diminuir o déficit de docentes de 1º
grau. 0 Logos II destaca-se dos demais cursos destinados aos professores leigos por utilizar a
metodologia do ensino à distância — ajustando o processo ensino-aprendizagem às possibilidades
do aluno e permitindo alcançar uma clientela maior — e pela "amplitude do curso tanto em termos de
número de cursistas como de municípios atingidos (Em Aberto – Brasília, ano 2, nº 16, junho de 1983.
Disponível em http:// www.rbep.inep. gov.br/index.php/emaberto/article/viewFile/2182/ 1451.
96
vinte e seis professores, notícia comemorada pela administração pública sendo
divulgada na revista “Astorga – 1979”.
Os professores leigos de nosso município, através do Projeto Logos
II, aqui executado tiveram a oportunidade de aprimorar seus
conhecimentos e passaram da classe de professores leigos para
classe de normalistas (ASTORGA, 1979).
Passar da classe de professor leigo para professor normalista representava
melhorar a remuneração, assim diz o professor Sebastião: “[...] me sentia às vezes
desinteressado, porque o salário aquele tempo tava muito fraquinho, (risos), é então
quando fiz o Projeto Logos II, que já era como o magistério. [...] era pra [...] melhorar
a remuneração”.
Dos três professores que atuaram na Escola Rural Água Astorga, o professor
Sebastião Simão dos Santos recebeu o título de normalista por meio do Projeto
Logos II em 1979. A professora Zélia, no curso de sua profissão, ingressou na
Escola Normal recebendo o diploma de normalista.
Aquele que resolvesse não participar da formação exigida, seja o motivo qual
fosse, poderia perder sua vaga, caso um professor legalizado se interessasse. A
professora Orendina até iniciou o curso, mas por problemas de saúde acabou
desistindo. Prosseguiu com sua profissão até o fim. Hoje, lamenta o título dado a
seus esforços “Professor sem qualificação”. E complementa:
Aposentei como professora leiga. Me dói esse título. Agora
além de leiga eles põem sem habilitação. Eu fazia o mesmo
que as formadas fizeram, ganhando menos que elas por causa
disso, e ainda toma esse palavrão [...] (risos).
Embora exercida a função e cumprido o tempo de contribuição, a professora
Orendina demonstra descontentamento e indignação frente aos vencimentos e ao
título adquirido por consequência da mudança de mentalidade dos profissionais da
educação em virtude da exigência legal.
97
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste estudo, buscou-se investigar a história da educação rural do município
de Astorga, entre o período de 1957 a 1980, priorizando as práticas escolares e seu
cotidiano, com lócus de investigação a Escola Municipal Rural Água Astorga.
Interessou-se por trazer à cena, sujeitos que produziram uma prática escolar e sua
cultura no momento em que os Governos Federal, Estadual e Municipal efetivaram
políticas de ampliação, criando escolas rurais, num primeiro momento, e num
segundo de qualificação do corpo docente dessas escolas.
A construção de escolas, no meio rural, veio como resposta à demanda criada
pelo desenvolvimento que o município de Astorga alcançou. A década de 1960
configurou-se na que mais se construiu escolas no meio rural de Astorga, totalizando
27 escolas do total de 35 existentes. De 1965 a 1968, 15 escolas rurais foram
construídas, quase a metade do total na década, observando um avanço quantitativo
para a educação do município.
O crescimento quantitativo de escolas deparou-se com outra problemática: a
falta de profissionais com formação exigida por lei que era a formação profissional
secundária da escola normal. A estratégia adotada foi a de designar pessoas com o
maior grau de instrução local para lecionar nas escolas rurais. A prática chancelada
pelo poder público para as referidas escolas, nesse período, foi a de que o sujeito
que mais tivesse conhecimento poderia instruir aqueles com menor grau de
instrução. Vale lembrar que esta prática não era novidade, já que nas comunidades
e nas famílias se exercia um ensino não oficial, onde irmãos mais velhos ou sujeitos
com maior grau de instrução ensinavam aos mais novos ou aos com menor grau de
conhecimento, como atestam depoimento de ex-alunas.
No contexto rural, as escolas foram criadas espalhadas pelas comunidades e
distante da cidade, longe do olhar disciplinador da Inspetoria de Ensino. Nascidas
como escolas isoladas na lei, ou seja, possuíam uma só turma de alunos,
independente da série, entregue a um só docente. Não havia uma composição
hierárquica no interior da escola rural, tendo uma multiplicidade de funções
delegadas ao professor. Com o controle das matrículas e a formação de turmas seu
ofício foi burocratizado, sobrecarregando-o com outras tarefas. Além de educar, se
ocupava com o preparo da merenda, limpeza da escola e as tarefas administrativas.
98
Como estratégia, o professor delegava aos alunos responsabilidades e
afazeres que o ajudavam a vencer a rotina. Observou-se que essa dinâmica se
manteve ao longo do período estudado, mesmo com mudança legal, que visava uma
melhoria na qualidade de ensino, permanecendo a multiplicidade de funções do
professor. Por outro lado, percebeu-se que o sentimento de responsabilidade
coletiva entre professores e alunos era despertado pelo fato de se ajudarem
mutuamente nas dificuldades diárias do professor e também dos alunos.
O
projeto
educacional
das
escolas
rurais
de
Astorga
apresentava
características advindas do cenário nacional, precárias escolas instaladas em casas,
ambientes pouco
adaptados para o funcionamento
da prática
educativa.
Provisoriamente, a casa escolar Água Astorga foi instalada em uma parte de um
casarão, moradia de um lado e escola de outro. Com as adversidades foi necessário
melhorar as condições de ensino, a escola foi instalada em outro local, sendo que o
projeto de construção apresentava uma preocupação com o bem estar dos sujeitos,
atentando principalmente para proteção dos alunos e professor.
Via de regra, após a instalação das escolas rurais e contratação de
professores, a organização escolar estava circunscrita nas orientações da Inspetoria
de Ensino do Município em reuniões mensais com os professores, que recebiam
instruções gerais sobre a prática educativa e sobre as suas obrigações.
Constantemente era chamada a atenção dos professores sobre a comemoração das
datas cívicas, da aplicação das avaliações e exames, da higiene e organização do
ambiente escolar.
Nestas orientações, observa-se uma exaltação às celebrações e, na maioria
delas o objetivo era cultivar no aluno o amor e respeito à Pátria, sendo a escola
responsável por despertar estes sentimentos.
Os
documentos
analisados
deixam
ver
um
descompasso
entre
comportamento exigido do professor e o que acontecia no ambiente escolar. Nas
atas de reuniões eram frequentes as recomendações para que o professor
cumprisse com suas obrigações de ensinar a ler, escrever e contar e cuidar da
escola como se cuidava de sua casa. Apesar destas exigências, também se observa
as reclamações da Inspetoria devido à falta de asseio e de cuidado com o prédio
escolar e suas dependências. Assim, embora se observassem estratégias do
professor para cumprir com todas as suas obrigações, o descontentamento
mostrado pela Inspetoria de Ensino revela as dificuldades de se cumprirem, a gosto,
99
com todas as exigências. Sem apoio da Inspetoria e variantes como a poeira, o
barro, a vegetação que crescia o ambiente ficava com aspecto de descuido.
As práticas educativas executadas, no interior da escola e fora dela, ocorriam
intercalando as atividades pedagógicas, o momento de pausa com ações realizadas
pelos alunos e professor, as atividades extracurriculares incluindo pessoas inerentes
ao processo educativo, além das programações interdisciplinares que ocorriam ao ar
livre, estratégia para tornar o ensino mais dinâmico e prazeroso.
A responsabilidade com a verificação do conhecimento do aluno variava entre
a aplicação de provas bimestrais e finais. Neste processo, é observada a
fiscalização por parte da Inspetoria de Ensino que acompanhava as provas
bimestrais, rubricando-as uma a uma e aplicava as provas finais, além de fazer a
sua correção e lançamento das notas no livro de registros. Este trabalho contava
com o auxílio de uma banca, organizada pela Inspetoria por meio de rodízio entre os
professores. Uma estratégia utilizada como forma de manter o controle sobre a
aprendizagem.
Com a promulgação da Lei 5692/71, passou a vigorar a exigência mínima
para exercer o magistério de 1ª a 4ª série do Ensino de 1º grau. Nesse sentido, na
década de 1970 observa-se a preocupação de que os professores realizem a
formação na Escola Normal para legalizarem a situação. No caso das escolas rurais
de Astorga, a implantação da referida lei ocorreu na década de 1980, com o
chamado Plano de Implantação da Lei de 1971. Contudo, anterior a este Plano,
ações estavam sendo pensadas em nível nacional, como o Programa Logos II criado
para regularizar a situação dos professores leigos, habilitando-os ao magistério e
elevando-os à categoria de professor normalista. A formação era oferecida à
distância e cada um poderia adequar seu estudo com o tempo disponível. Em 1979,
o município de Astorga formou 26 professores pelo Programa Logos II.
Participar da capacitação representava regularizar a situação legalmente,
elevando a qualidade de ensino e, além disso, os professores serem beneficiados
com o aumento dos seus vencimentos. Por meio dos documentos, percebeu-se que
o professor ao recorrer à formação, abraçaria junto a ela, as adversidades como a
distância, a falta de estrutura e transporte. Decisão adiada por alguns e por outros
não concretizados. Este fato gerou um sentimento de injustiça por parte daqueles
que não realizaram sua qualificação, como atesta Dona Orendina, ao lembrar que
100
realizava as mesmas atividades recebendo menos e sem o status do professor
qualificado.
Uma melhor formação não foi acompanhada por mudanças na estrutura de
funcionamento das escolas isoladas. Os professores permaneciam exercendo sua
profissão nos mesmos locais afastados e precários, realizando múltiplas funções
como: merendeiro, zelador, secretário e diretor. Assim, cumprir com o que a lei
exigia, não trouxe modificações na prática da organização escolar. Em relação à
prática docente as fontes não permitiram observar alterações, o que requereria
novas investigações.
As atividades educativas na Escola Rural Água Astorga se encerraram no ano
de 1994, resultante da falta de demanda a escola foi demolida, pois a maioria das
novas famílias que se formaram se mudaram para a cidade em busca de melhores
condições de vida e de educação. Foram 33 anos dedicados a prática educativa
dessa comunidade.
101
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ficas/comentarios.pdf>. Acesso em: 24 ago. 2014.
106
ANEXOS
107
ANEXO A: ESCALAÇÃO DAS BANCAS EXAMINADORAS DAS ESCOLAS RURAIS
DE ASTORGA, 1962.
108
ANEXO B: DECRETO DE CRIAÇÃO DAS ESCOLAS RURAIS DE ASTORGA, 1980.
109
110
ANEXO C: OFÍCIO DE ENCAMINHAMENTO DO PLANO DE IMPLANTAÇÃO DA
LEI 5692/71.
111
ANEXO D: LIVRO DE REGISTRO MODELO III DA PRIMEIRA ESCOLA RURAL DE
ASTORGA.
112
ANEXO E: REGISTRO DE FREQUÊNCIA DIÁRIA DA PRIMEIRA ESCOLA RURAL
DE ASTORGA.
113
ANEXO
F:
CERTIFICADO
DE
CURSO
DE
APERFEIÇOAMENTO
DE
PROFESSORES PARA IMPLANTAÇÃO DE ENSINO DE 1º GRAU-DISTRITOS E
ZONA RURAL.
114
115
ANEXO G: DIPLOMA DO PROJETO LOGOS II QUE CONFERE O TÍTULO DE
PROFESSOR DE ENSINO DE 1º GRAU.
116
117
APÊNDICES
118
APÊNDICE A
Transcrição da entrevista com a prof.ª Orendina Carolina de Deus
Boa tarde hoje nós faremos uma entrevista com a professora Orendina Carolina de
Deus
Entrevistador: Boa tarde profª Orendina.
Entrevistado: Boa tarde.
Entrevistador: D. Orendina eu fui fazer uma entrevista com a professora Zélia e
o prof. Sebastião e eles me contaram que a Srª. Também trabalhou na escola
rural Água Astorga, eu gostaria de saber quando que a Srª começou a
trabalhar nessa escola?
Entrevistado: Eu comecei em 1956, no finalzinho do ano. Então eu fiquei até o final
do ano fazendo as matrículas, os alunos moravam longe, cada um num sitio. E eu
visitei todos e matriculei. E em 57 nós começamos as aulas.
Entrevistador: E a Srª lecionou nessa escola durante quanto tempo?
Entrevistado: 20 anos.
Entrevistador: Depois que a Srª parou de lecionar na escola rural Água Astorga
foi para outra escola?
Entrevistado: Fui para o Antenor Balarotti aqui em Astorga. Lecionei dois anos, um a
classe do 2º ano, um amor de classe. (risos). E depois eu tinha crises de bronquite
quase todos os dias, ai então, fiquei de licença, fui pra Curitiba e continuei de licença
até completar os 25 anos. E com ordem da junta médica. E assim, fiquei até
completar o tempo de serviço, porque foi pedido minha aposentadoria por invalidez,
a aposentadoria por invalidez saiu, não me lembro de qual o mês, mas daí quatro
meses saiu por contagem de tempo. Então foi uma aposentadoria bem aposentada.
Entrevistador: E quando a Srª lecionou lá na Escola Rural água Astorga, a Srª
morava onde?
Entrevistado: Morava num sítio nosso, lá perto. É porque eu comecei a lecionar não
tinha casa de escola não, foi a prefeitura alugou uma sala na casa de um vizinho,
vizinho nosso, era bem pertinho, uma sala, ele tirou algumas paredes, fez uma sala
bem grande, comportava direitinho os alunos, e foi bom, é as crianças frequentavam
bem e ficou lá até que eles construíram a casa de escola.
Entrevistador: E demorou para construir essa casa de escola?
Entrevistado: Olha me parece que foram dois anos. E pra mim foi, num foi ruim
porque o lugar, a escola era melhor, a casa lá era mais precária, mas era longe pra
mim, eram quase três km, eu ia a pé, passando debaixo de arame, enfrentando vaca
braba (risos), cachorro dos vizinhos, passando nas portas das casas, mas foi, a
gente era novo, a gente era nova, superou tudo
Entrevistador: Então quando foi transferida a escola para outro local, onde
ficava? Ficou mais longe?
Entrevistado: Ficou porque a prefeitura não podia fazer no nosso sítio, porque ficava
longe para os meninos do outro perímetro, porque lá pega o lado da estrada e o
outro lado né, então era pra ficar melhor para o outro lado do perímetro, e ai ficou
longe pra mim, mas eu me acostumei eu andava, era acostumada a andar toda vida
né.
Entrevistador: Nesses 18 anos trabalhando a Srª trabalhou nesse outro local a
srª morou sempre no mesmo sítio?
Entrevistado: Sim sempre no mesmo local.
119
Entrevistador: E os alunos ali da escola moravam onde?
Entrevistado: Tinham muitos que moravam na água Astorga mesmo, do meu lado.
Então era uma turma boa, ia sempre comigo, eles chegavam na minha casa antes
da minha saída e a gente ia juntos, e os do lado contrário da escola, eu chegava já
estava todo mundo lá também, fazendo bagunça (risos).
Entrevistador: E esses alunos iam de que forma para a escola? Eles usavam
transporte?
Entrevistado: Então, tinha uniforme, no começo, não lembro se a Zélia pediu, mas eu
pedi, era xadrezinha.
Entrevistador: o uniforme.
Entrevistado: O uniforme né. O primeiro ano um cadarcinho na gola; o segundo 2 e
assim por diante.
Entrevistador: E a família que fazia?
Entrevistado: Era em casa ela que fazia, eles que fazia.
Entrevistador: E o tecido? Onde eles compravam?
Entrevistado: Ah, eles mesmos que iam comprar, aqui na cidade e faziam, não tinha
ajuda de ninguém. É o Uniforme, depois passou o guarda pó branco né, todo mundo
e tem até hoje.
Entrevistador: E como eles iam pra escola?
Entrevistado: Descalço, pé no barro ou na poeira, (risos), e eles iam todos limpinhos,
todos bem organizadinhos.
Entrevistador: E eles iam a pé?
Entrevistado: Ia a pé, eu ia a pé. Eu quis ir uma vez de jipe, mas pra ir de jipe ficava
umas, 4 vezes mais longe pra ir. Tinha que pegar a estrada, ir lá no carriador em
cima e desce. Então não deu certo. As vezes quando eu não estava bem de saúde,
o meu marido me levava, mas se eu estava bem eu ia só a pé.
Entrevistador: Havia alguma criança que morava do lado de lá , que tinha rio
para atravessar?
Entrevistado: Não, eram todos do nosso lado. Tinha uns que moravam mais longe,
que moravam na fazenda, na fazenda lá esqueci o nome dela.
Entrevistador: Mas eles iam a pé também?
Entrevistado: Iam a pé, era menino grande já, eles começaram no terceiro ano. Eles
fizeram o 3º com a Maria Zélia e o quarto comigo.
Entrevistador: E a que horas começavam as aulas?
Entrevistado: A tarde começava ao meio dia, e de manhã começava as 8. Das 8 ao
meio dia. Da tarde era 1 hora, começava 1 hora e até as 5.
Entrevistador: E esse horário ele se mantinha durante todo o ano, sempre foi
dessa forma? Ou teve alguma alteração de horário, em algum ano que a Srª
trabalhou nessa escola?
Entrevistado: É teve um ano mesmo que eu não sei a data, mas, não sei se a
diretoria que mandou, concordou com alguém lá que deu opinião, ai passou um
horário diferente, mas não deu certo não, foi só um ano e já voltamos.
Entrevistador: E sabe por que foi feito esse horário diferente?
Entrevistado: Era por causa de colheita né, porque os alunos faltavam muito de aula
na ocasião de colheita. Teve 1 ano que eu tinha o quarto ano e o segundo. Faltaram
muito e depois que eles voltaram para a aula, eu dei recuperação na minha casa.
Eles iam na minha casa. Depois da escola, iam comigo já. Daí eu deixava eles a
vontade lá em casa descansando um pouco. Eles levavam lanche. Eu pedia para
eles levar lanche e tomar. E dava uma recuperação pra eles.
Entrevistador: Depois do período de aula?
120
Entrevistado: Depois do período de aula. Não tinha outro jeito né, porque eu não
queria que meus alunos reprovasse. Então era meia ranziza nesse ponto né. Então
eu fiz muito isso ai, e dava recuperação em casa.
Entrevistador: E quando era o período de férias?
Entrevistado: Ah, cada um nas suas casas né. Não tinha nada na escola. A escola
permanecia fechada.
Entrevistador: E que mês que era?
Entrevistado: Ah, igualzinho daqui, o nosso era o mesmo da, do município, da escola
municipal. Eu era paga pelo estado, (desculpa que eu to rouca hoje, tomei um
gelado e não me fez bem).
Entrevistador: Quando era o período de férias?
Entrevistado: Ah, era o mesmo daqui né. Não me lembro. De julho, era um pedaço
do mês de julho só. É mais era quase o julho todo. E no fim do ano começava em
dezembro, janeiro e fevereiro.
Entrevistador: Quando começavam as aulas?
Entrevistado: Finalzinho de fevereiro, sempre pegava um pouco do mês de fevereiro.
Entrevistador: D. Orendina e como que era a estrutura física da escola?
Entrevistado: Quatro paredes,(risos), de tábuas, e coberta de telhas, não tinha mais
nada, não tinha uma varanda, não tinha nada. A água era de poço, de cisterna.
Então a gente chegava já pegava um balde d’agua que tava fresquinha, cada aluno
tinha o seu copo e uma caneca de tira do balde pra eles toma. As vezes eu chegava
e ia servir a água pra eles pra depois ir pro trabalho. Era muito sofrido pra mim, mas
eu gostava, eu adorava lecionar lá, pelo seguinte, é que os alunos iam pra aprende,
não iam pra bagunça não. Sempre tem uma ovelha negra né, mas a maior parte iam
pra aprende e perguntava e queria saber mesmo, era muito bom.
Entrevistador: E como que era pra srª trabalhar nesse espaço?
Entrevistado: Era duas classes, no começo foram três,né. Primeiro, segundo e
terceiro. Dois anos, depois que entrou a Maria Zélia e separou. Eu fazia assim, no
fundo da classe eu arrumava o quarto ano, mas no começo da classe eu arrumava o
segundo ano, então quando assim, eu dava tarefa, dava uma explicação pro quarto
ano e pedia alguma coisa pra eles fazer e eu ia pro segundo ano ensina, aquelas
meninas mais espertas que acabava vinham me ajuda. Ensinar o 2º ano. E foi uma
coisa boa, com a colaboração.
Entrevistador: E a srª utilizava o quadro?
Entrevistado: É tinha só o quadro negro. Algumas coisas assim, que eu tinha minha
irmã aqui, ela diretora do grupo, do Balarotti. E ela às vezes ela tinha material
didático e ela passava pra mim . Então tudo que ocupei foi a Orenei, minha irmã que
me forneceu. Então, me facilitou muito com isso.
Entrevistador: A senhora gostava de trabalhar nesses espaços?
Entrevistado: Gostava. Eu pensava assim, quando eu aposentar eu não posso nem
passar aqui perto, que eu pego chora. Mas não, Deus faz todas as coisas certas.
Passava lá tranquila né.
Entrevistador: Quem é que cuidava da manutenção da escola?
Entrevistado: Nós, eu com as crianças. Era assim, tinha aula, de primeiro não tinha
aula de sábado e a gente ia no sábado de manhã, escolhia aquelas meninas
grandes, e meninos também pra tira água na cisterna e ajudar. E depois passou a
ter aula dia de sábado, eu lecionava até o recreio e daí nós íamos fazer a limpeza da
classe. Lavar a classe, porque o barro, a poeira, lá era demais. Então a gente, as
meninas me ajudavam, a gente limpava a classe. E merenda, eu, quando era sopa,
que eu comprei um caldeirão grande, fazia a merenda naquele caldeirão em casa,
121
deixava secar bem pra ficar mais leve, e levava. E a dona Vitória consorti, era uma
srª que morava pertinho da escola, ela me dava água fervendo. Ela fervia água na
chaleira e ia, mandava lá pra mim, ai eu misturava na sopa. Servia a sopa quentinha
também. E quando era leite, eu já batia o leite lá e ela mandava a água e punha
também, e tudo eu que fazia, partia, porque não tinha ninguém pra ajudar. Varre a
classe, as vezes a gente terminava tava suja, ai eu ia varre e as meninas grandes
ficavam pra me ajudar. Foi assim, vencemos.
Entrevistador: E algum reparo, de goteira, de cerca que arrebentou, carpi em
volta da escola, esses reparos assim quem é que fazia?
Entrevistado: Oh, carpi os meninos grandes carpiam no sábado, nós ia limpar a
classe e eles carpaiam né. Carpiam, rastelavam, deixava limpinho, não era grande o
espaço. É como é?
Entrevistador: Quem carpia e quem arrumava a cerca?
Entrevistado: Ah, se as criação, porque ali era pasto, estragasse, o dono da terra lá
era o seu Carlos Consorti, ele que concertava, e nem pedia os homens pra ajuda,
porque era o gado dele mesmo né, entrava lá e derrubava mais. Ele mesmo
consertava.
Entrevistador: E no período que a Srª trabalhou na escola rural Água Astorga
quem era responsável pela educação no município?
Entrevistado: Era a D. Guiomar, que eu acho que era, que ela era inspetora. E foi a
D. Maria José Lopes também, foi muito boa pra mim. Ela também foi inspetora. Não
sei se é diretora ou Inspetora. Acho que diretora. E A Ziza Abrão. A Ziza Abrão foi
uma mão de Deus na minha vida, porque eu fui entregar o material pra largar
porque, porque tinha meus dois meninos com problema, então tava muito difícil pra
mim, ai ela chamou o Levi, meu esposo e falou pra ele, “Olha quanto que você
paga, for pagar pra ficar no seu lugar na roça, quanto que você paga”. Ele falou,
“tanto”. Ai ela falou, “pois é, ela ganha um tanto a mais, então, você paga ainda
sobra isso pra você, e você ta ajudando lá seus vizinhos, ajudando os alunos pra
não fica tudo analfabeto”, ai ele concordou. O moço que até ficou morando na nossa
casa, e ele ficava em casa, cuidava assim, na beira da casa e ficou cuidando dos
meninos pra mim.
Entrevistador: Quem é que mantinha as escolas era o município ou era o
estado?
Entrevistado: Olha era os dois, porque a diretoria trazia merenda, mas o estado
também ajudava. Dava caderno, lápis, borracha coisas. Materiais das crianças usa,
o estado mandava pra inspetoria e a prefeitura que distribuía.
Entrevistador: E qual o papel da inspetoria de ensino no município? O que ela
fazia e qual era o papel dela em relação às escolas e aos professores que
trabalhavam nessas escolas?
Entrevistado: Fazia sempre reunião né, explicava como precisava ser. É, fazer o
programa, fazer os planos de aula conforme o programa que elas davam, usar todo
o material mandado durante o ano. Que no final do ano saia tudo em prova né,
aquelas provas finais. Era boa e elas visitavam as escolas também, conversavam
com os alunos.
Entrevistador: Dava um apoio pra vocês?
Entrevistado: Dava
Entrevistador: E como era a relação dos professores com a Inspetoria?
Entrevistado: Era boa, pra mim era, porque a gente ia nas reuniões, todo mundo
amigo, elas também amiga da gente, assim muito bom.
Entrevistador: E essa reunião era que período?
122
Entrevistado: Ah, não tinha horário não. A gente chegava, eu não me lembro se era
de manhã. Não era depois do almoço, era a tarde começava uma hora, mas não
demorava muito a terminar não; Elas falavam o que precisava, distribuíam os
programas. É ensinavam a gente às vezes fazer os planos de aula, alguma coisa,
pra ficar fácil para os alunos. Então, elas ajudavam sim.
Entrevistador: Nas escolas rurais trabalhavam professores que recebiam do
Estado e professores que recebiam do Município, mas todos eles iam à mesma
reunião. Qual que era a diferença?
Entrevistado: Assim, não era nenhuma. É todo mundo era de igual para igual. É
porque eu era do estado eu ia ter diferença com você, que não era?
Entrevistador: Quando vocês tinham reunião vocês dispensavam os alunos?
Entrevistado: Dispensava, era ordem da inspetoria.
Entrevistador: E qual era a relação entre professor e professor, vocês iam lá
nas reuniões, tinham os dias de exame, como era essa relação de professor
com professor?
Entrevistado: Era boa também, ajudavam uns aos outros, mas não tem como
explicar porque, elas iam na minha classe fazer o exame dos alunos, então eu ficava
neutra ali, não podia dar opinião né, elas tomavam conta da sala, mas também as
vezes elas pediam opinião comigo sobre um aluno que as vezes ele não fazia uma
coisa que podia ter acertado, essas coisas assim, era bom, não tinha dificuldade
não.
Entrevistador: As provas que vocês aplicavam, quem é que elaborava?
Entrevistado: A inspetoria, ah, eu não sei qual a pessoa né. Iam prontas, em papel
sulfite, todas as provas, era só distribuir para os alunos. Tá tudo ali.
Entrevistador: Era de acordo com o programa que a srª dava?
Entrevistado: Era bem de acordo.
Entrevistador: E o salário, quem pagava?
Entrevistado: O meu era o Estado, né. Eu fui municipal uns anos, depois então um
prefeito e levou os nomes nosso e passou para o Estado. Ele teve que ir em
Londrina aquele tempo, eu não sei porque tinha que ir lá prá fazer o juramento a
bandeira, pra tomar posse. Esse sistema de tomar posse, nós fomos lá tomar posse,
e voltamos profissional normal.
Entrevistador: E recebia no banco?
Entrevistado: Recebia no Banestado.
Entrevistador: Qual era a sua formação?
Entrevistado: Eu fiz a 8ª série lá em Minas, comecei o magistério, ai, mudamos pra
cá, parei porque não tinha como né. Ai, vim me matriculei. Assim bem no fim já.
Matriculei na Escola Normal e vim uns dias, mas não. Eu que vinha dirigindo né, de
jipe, que naquele tempo as estradas eram precárias, hoje não, hoje é tudo
cascalhado, o ônibus vai nas portas buscar. Naquele tempo eu queria vir de ônibus,
mas não tinha condição nenhuma. Ai, eu vinha, um dia choveu e quase eu morri no
meio do caminho de barro, e o jipe dançando, e ele entrava por meio da lavoura, ai
eu larguei, eu abandonei. E quando eu mudei de lá prá cá, já no finalzinho, teve o
Logus e eu entrei e não pude continuar, que eu tava doente. Eu tive um bronquite,
eu não podia ver giz, (risos), o pó de giz que eles falavam, ai eu ficava com falta de
ar e tosse. Então não tinha jeito, ai parei tudo. Aposentei como professora leiga. Me
dói esse título. Agora além de leiga eles põem sem habilitação, (risos). Eu fazia o
mesmo que as formadas fizeram, ganhando menos que elas por causa disso e ainda
toma esse palavrão, (risos).
Entrevistador: A Srª se sente ofendida?
123
Entrevistado: Não, eu estou brincando (risos), eu sei que quem não é formada, não
tem habilitação.
Entrevistador: Tiveram muitos professores leigos?
Entrevistado: Não, eu não sei. Ah teve alguns, porque teve uma classe de, que eu
frequentei o ano, Logos, tinha, era muita gente, mas quem desistiu foi só eu. Todos
eles concluíram. Morava longe, com filho com problema, não tinha como a gente
estudar. Agora que eu podia de estudar eu to sem voz (risos).
Entrevistador: Na época que a senhora trabalhou nas escolas rurais tiveram
algumas mudanças de leis. A senhora trabalhou um pouco com a lei do ensino
primário. E teve a lei 4024 de 1961. A srª lembra dessa lei?
Entrevistado: Foi quando mudou o cruzeiro? Sabe que eu não estou me lembrada
Entrevistador: Mas assim, houve essa mudança de lei. Lá na escola rural Água
Astorga, houve alguma mudança?
Entrevistado: não, se tivesse mudado eu lembrava, agora não houve mudança
nenhuma, eu lembro que a diretora foi lá, e falou sobre isso, mas também não exigiu
nada.
Entrevistador: Nada além daquilo que a srª já fazia?
Entrevistado: Era a mesma coisa, o mesmo programa, e o programa era elaborado
por elas, então alguma que elas tenham postos, eu nem notei que era lei diferente.
Entrevistador: Além de ser professora, a srª desempenhava outras funções?
Entrevistado: Olha, eu era a professora, era servente, era muitas vezes enfermeira,
era assim, psicóloga muitas vezes. (risos), psicóloga analfabeta, (risos) que beleza!
Mas a gente, como se diz, fez tudo o que podia, tinha umas meninas que desmaiava
na escola, eu acho que mal alimentada, né. Na parte da manhã e eu tinha que
cuidar delas, ai eu perguntei para o Dr. Arlos, como que eu fazia, ai ele me ensinou,
não põe de costa não. Deita no seu colo de bruço e vai conversando que elas
voltam. Isso ai ele explicou a causa né. Foram várias vezes. E sangramento do nariz
também né. Como isso acontecia. Muito calor, vinha de longe e ficava ainda
pulando, brincando né (risos). Mas não teve problema nenhum não.
Entrevistador: A srª conhecia as famílias dos alunos? Elas participavam na
vida escolar dos filhos?
Entrevistado: Conhecia. Olha pra falar que não era nenhuma, não sei se é demais,
mas, acho que foi. Não ia ninguém, elas não iam lá. Olha, quando eu fazia reunião
com os pais, ia alguns homens só. As mulheres não iam. Então não tinha muita
colaboração.
Entrevistador: Quais séries que a srª atendia?
Entrevistado: 2ª e 4ª
Entrevistador: Isso depois que a profª Zélia entrou?
Entrevistado: Sim, antes era 1ª, 2ª, 3ª e 4ª. Depois nós dividíamos e eu peguei 4º
ano também, porque precisava, os alunos fizeram o 3º ano, tudo queria estudar
mais, então eu dei o 4º ano.
Entrevistador: Como eram realizadas as avaliações?
Entrevistado: Pelo procedimento, pelo o que eles faziam em casa. Tinha aluno que
passava tarefa para casa vinha perfeito, bem feitinho. E outros, “Ah, eu não tive
tempo, porque eu fui ajudar na roça”. Ai eu deixava né. Ai tinha um do 4º ano que
não tinha feito nenhuma tarefa, e era longe da minha casa. Ai eu falei para o meu
marido “Ah, eu vou visitar aquela família”. E eu não conhecia os pais não. Ai eu fui
um dia, ele me levou lá, fora do horário de aula, e cheguei lá, quando cheguei, era
dois meninos, eles, como dizem “eles vazaram”, né (risos). A mulher veio alegre, me
cumprimenta, e eu falei pra ela “eu vim aqui e contei porque. Porque os meninos era
124
Valter e Nelson, eles não faz tarefa, eles não leva caderno bom, eles leva só um
rascunho e tá muito difícil”, e foi bem no começo do ano pra eles não ficar na quarta
série senão eles vão reprovar. Ai Ela falou “escuta, eles não leva caderno?”. “Leva
um caderninho ruim, cheio de orelha”, ai ela falou, “eu vou buscar o material que eu
tenho deles pra srª ver”. Tinha até cartolina grande de desenho, pra fazer mapa, eles
não levava, ai eu falei, “eu levei um caderno de uma menina do 4º ano”, ela falou
“olha a srª vai me desculpar, mas eu vou te contar, eu já xinguei a Srª muito, falei
que nunca vi uma professora relaxada assim, que não dava material nenhum”. Ai eu
falei “Olha aqui o caderno da minha aluna. Ela folheou tudo e falou “O meu marido
vai pegar eles e bater”. Eu falei “Eu vou te pedir, por favor, bater não, eu não quero
que faça isso não, porque eles vão tomar ódio de mim, então a srª dá conselho e
investiga de agora em diante.” “Na hora deles sair olha o material deles, o que eles
estão levando, e quando chega, olha o que trouxeram, porque senão eles vão
reprovar”. Eu falei pra ela, “todos os alunos fazem a tarefa, obedece, e eles não”.
Eram bons alunos, eram quietinhos, não faziam nenhum mal né. E daí melhoraram e
passaram de ano os dois.
Entrevistador: Além daquelas avaliações no final do ano, a srª fazia alguma
avaliação?
Entrevistado: Sempre eu fazia, ah eu falava pra eles “ Oh, hoje nós vamos ter uma
sabatina” (risos), Ai tirava de tudo que tinha ensinado no mês, e fazia. O que eles
não sabiam, porque não era prova de valer, eu ensinava, ia no quadro negro e
explicava, ensinava. Todo mês eu fazia isso.
Entrevistador: a srª tem memória de como era a frequência dos alunos?
Entrevistado: Ah, é no tempo da colheita tinha uns que faltavam, mas não era muito
não, porque eu pegava pesado com os pais, né, falava assim “Eu to recebendo pra
isso e eu quero ver o fruto do meu trabalho, e vocês também tem que ver o que os
filhos estão aprendendo, porque isso vai servir para eles, um bem que vocês podem
dar para seus filhos é esse”. Ai eles não faltava né.
Entrevistador: A srª tem alguma memória de algum curso que foi ofertado pelo
município, pelo estado para melhorar a prática do professor?
Entrevistado: Tinha todo, acho que era janeiro. Não sei se era dezembro ou janeiro
que tinha aula para nós. Era ótimo, era o mês inteiro. Elas ensinavam tudo o que a
gente precisava. Alguns métodos, como fazer um plano de aula, elaborar bem
direitinho. Ajudava sim, os cursos eram muito bons.
Entrevistador: Era a inspetoria que dava os cursos? E do Estado, era ofertado?
Entrevistado: Era. O estado não, eu fiz curso em Minas, porque eu dei 4 anos de
aula lá. Quando estava perto de me aposentar, eu tinha 20 anos, eu fui lá pra pegar.
Eu tinha 5 anos lá, e só peguei dois, porque eu era de menor e ninguém assinava
tudo pra mim, era minha prima que largou a escola pra mim pegar. Então peguei
dois anos. Ai ficou faltando 3 que era 25, ai eu terminei aqui.
Entrevistador: D. Orendina a Srª tem mais alguma coisa para contar desse
tempo que a srª trabalhou na Escola rural Água Astorga?
Entrevistado: O que eu tenho que relatar assim, as minhas meninas, eu tenho duas
meninas e tinha dois meninos. Os meninos, todos os dois com problema, né. Então,
mesmo o Levi ficando em casa, era mesmo difícil. Tinha dia que ele tinha que sair,
que ele era verdureiro, ele plantava pra vender. O dia que ele tinha que vender, que
saia, então os pais lá que ofereceram, que cada dia uma aluna das grandes, do 4º
ano vinha aqui em casa e ficava com eles. Foi muito boa, as meninas vinham e
cuidavam deles em casa, e das meninas, porque a mais velha tinha 9 anos, então,
elas vinham para companhia deles.
125
Entrevistador: Então por mais que era difícil, a Srª ainda tinha essa
problemática, os dois filhos com problemas, a srª ainda tem boas lembranças?
Entrevistado: É tenho boas lembranças. A escola não tinha conforto, mas a gente
acostumava né, com aquilo. Ia a pé dia de chuva, às vezes eu chegava molhada na
escola. Que quando ia chover eu levava uma blusa, a gente ia de guardachuva, mas
chuva de vento molha assim mesmo. Ai chegava na escola e trocava. Meu guardapó
ficava na escola e punha ele enxuto; Ia com outro calçado, eu tinha uma bota de ir
na escola né, a bota de zíper na perna toda (risos). Dia de barro, ai chegava na
escola, tirava e punha o sapato. É essa dificuldadezinhas fácil de passar.
Entrevistador: Eu agradeço muito pela colaboração e pelo o que a srª tem feito
pela educação, pela história da educação do município. Agradeço pela tua
acolhida.
Entrevistado: Não tem nada que agradecer, eu que te agradeço, recordar é viver né,
então eu vivi agora.
126
APÊNDICE B
Transcrição da entrevista com a prof.ª Maria Zélia Cardoso dos Santos
Entrevistador: Hoje nós estamos aqui com a professora Maria Zélia Cardoso
dos Santos e ela vai, é.... Hoje é dia 26 de outubro de 2014.
Entrevistador: É D. Zélia, nós sabemos que a sra. foi professora da Escola
Rural Água Astorga, quando que a sra. Começou a trabalhar nela?
Entrevistado: Foi 1963.
Entrevistador: E, quanto tempo ficou trabalhando lá?
Entrevistado: Ah, era assim, é 10 anos,
Entrevistador: 10 ANOS
Entrevistado: é que nós saímos de lá era 1973, então era 10 anos.
Entrevistador: E a sra. Trabalhou em outra escola sem ser a, a escola rural
Água Astorga?
Entrevistado: Sim, eu iniciei lá na Sória São Bento que faz, é o mesmo caminho,
assim, de daí, la também tinha muito aluno e era meu tio e minha prima, precisava
mais professor então a diretora deles pediram, né, pediu que eu ficasse lá, então
fiquei na casa deles, meu tio e fiquei 1 ano, durante um ano lá.
Entrevistador: E a sra. Morava onde?
Entrevistado: Aqui em Astorga, meus pais moravam aqui, depois eles mudaram pra
Rolandia, mas eu continuei aqui, não fui, assim, La em Rolandia não dei aula não.
Entrevistador: E, o tempo todo tempo que a Sra. trabalhou na, na, na escola
rural Água Astorga a Sra, morou aqui em Astorga?
Entrevistado: É, solteira eu não. Lá na água Astorga eu casei e, nesse ano, daí já ta
lá era a Orendina que tinha uma professora, e tinha muitos alunos então ela foi
dividido, eu fiquei com a 1ª e a 2ª serie e ela ficou com a 3ª e a 4ª, eram duas
professora na mesma escola, ela ia de manhã e eu ia a tarde,
Entrevistador: E a sra, é, ia pra escola é, de que forma?
Entrevistado: Não é, é pertinho, era assim, no sítio que eu morava ficava quase em
frente a escola, então não tinha dificuldade nenhuma.
Entrevistador: Ah, e essa escola então era instalada em um sítio.
Entrevistado: Sítio.
Entrevistador: A sra. Lembra no sítio de quem?
Entrevistado: Então, o sobrenome era Consorti, então eles doaram aquele terreno
pra escola e construíram a escola, assim, até boa, com área na frente, tinha a
privada, o poço, cercada de balaustra, assim era uma escola bem, assim, de
assoalho, com carteira, tudo, tudo bem arrumadinho.
Entrevistador: Quem é que construía a escola?
Entrevistado: A prefeitura, se eu não me engano foi a, na época do prefeito Anibal,
acho que é Anibal.
Entrevistador: E os alunos, onde que os alunos moravam?
Entrevistado: Então era tudo vizinhos, né, porque lá a, naquela época, assim os
situantes, eles, tinham, pequena propriedade, e moravam ali, cada um tinha seu
pedacinho de terra, Na época lá , naquela região, também tinha bastante, é assim,
plantação de café, depois veio a geada, uma geada muito forte, o fogo, dai acabo
com o cafezal, mas tinha planta, eles plantavam é, assim arroz, feijão, milho, soja
naquela época não tinha tanto não, era mais é milho e feijão.
127
Entrevistador: E como que essas crianças chegavam até a escola?
Entrevistado: Ai era tudo pertinho e eles iam a pé mesmo, a pé.
Entrevistador: E a que hora começava e terminava as aulas?
Entrevistado: Então de manhã era das 8 ao meio dia, daí eu, do meu horário era da
uma as cinco.
Entrevistador: Esse horário, ele se mantinha durante o ano todo, ou havia é um
horário alternativo?
Entrevistado: Então, foi no, acho que no ano seguinte, eles, assim, fez um teste pra
vê o ano agrícola, foi assim, nesse período as aulas começavam em janeiro, pra
terminar antes de dezembro, mas foi só aquele ano, não deu resultado não, então
daí os próximos anos já foi assim, é, começava em fevereiro e terminava as aulas
em dezembro.
Entrevistador: E quando que era o período de férias?
Entrevistado: Julho era o mês todo de férias,
Entrevistador: O mês todo.
Entrevistado: O mês todo
Entrevistador: As aulas terminavam quando?
Entrevistado: Em dezembro, lá pro dia 15 de dezembro a gente fazia encerramento
aqui com a diretora, vinha todas as professoras, fazia a reunião, fazia ata, né, e
encerramento do ano letivo,.
Entrevistador: E D. Zélia como que era a estrutura física da escola?
Entrevistado: Ah, era bem feita a escola, era de madeira, mas era assim forrada,
assoalhada, só não tinha cantina que faltava, mas era cercada de balaustra, todo
bem assim, uma área grande na frente.
Entrevistador: E como era pra senhora trabalhar nesse, nesse espaço?
Entrevistado. Nossa era tranquila tinha QUADRO, dois quadros grande, não tinha
problema não, as carteiras também, bem, assim, que acomodava bem as crianças.
Entrevistador: A senhora disse que tinha dois quadros grandes? Como era
usado os dois quadros?
Entrevistado: É porque eu dava 1º e 2º né, então eu separava, um era para o 1º e o
outro pro 2º.
Entrevistador: Ah, então a srª levava os dois, as duas séries ao mesmo tempo?
Entrevistado. É sim duas séries juntas.
Entrevistador: A sra. Quer falar um pouquinho como que era esse trabalho?
Entrevistado: Então, olha, ali os alunos eram, nossa! Eles participavam bem, era
diferente, acho que era diferente de hoje, eles tinham muito respeito, principalmente
da, da 2ª serie eles faziam os exercícios dele e ia ajuda a 1ª, tomava lição do, do
daqueles menores, eram assim, um clima assim, bem agradável, sem bagunça, eles
iam pra estudar mesmo, tinha assim, um, não precisava é, hum... Grita, era assim
muito sossegado. Muito bom.
Entrevistador: E a senhora tinha muitos alunos?
Entrevistado: Ah, eu acho que era a base de, de 20, 25.
Entrevistador: Nas duas turmas?
Entrevistado: Sim
Entrevistador: E quem cuidava d. Zélia da manutenção lá da escola? Quando é,
quebrava algum, né tinha algum reparo pra fazer, quem é que consertava?
Entrevistado: Então quando era um serviço assim de, um serviço mais pesado, que
exigia mais assim né, a gente ia na prefeitura e eles iam lá, mas quando era assim
serviço menor era os pais dos alunos que iam, ajudavam pra limpá o poço, prá carpi
o quintal, é concertar as, as vezes a cerca, eles ajudavam, nossa participava, o
128
marido também, ajudava, ia lá, se precisasse, eles eram assim bem, cooperava
bastante.
Entrevistador: E na outra escola que a srª lecionou, também, era, era assim?
Entrevistado: Sim, era, lá é também.
Entrevistador: Era da mesma forma, Os pais ajudavam?
Entrevistado: Ajudavam, e nossa gente, quando precisava era só chamar, eles até,
né, eles estavam sempre dispostos a, prá fazer qualquer serviço.
Entrevistador: E no período que a Srª trabalhou na escola rural Água Astorga,
quem é que estava a frente da direção da educação?
Entrevistado: D. Maria né, então, então, D. Zizá era inspetora e a D., Maria José
Lopes Diretora, então eles tinham aqui, como que falava, que a gente vinha no
núcleo, era ali onde era o, em frente ao Bradesco ali. Inspetoria, então ali, as
professoras era atendida ali, então qualquer problema a gente vinha com a direção,
até o seu Paulo Arruda Brasil também e, ele fazia parte ali, a, ali também havia as
coordenadoras então quando a gente tinha assim qualquer dificuldade, elas
orientavam a gente.
Entrevistador: mas na época a chefe maior, quem era?
Entrevistado: Maria José Lopes, na direção, era ela.
Entrevistador: E assim, quem que mantinha as escolas?
Entrevistado: A prefeitura, assim o material que precisasse, giz, concerto de carteira,
quando precisava de uma carteira a prefeitura levava, agora o estado mandava a
merenda, só que essa merenda, como não tinha cantina, a professora fazia a
merenda em casa e levava, porque era perto, isso, é, mas era assim, uma merenda
fácil di faze, era leite, é, um chocolate, é uma sopa assim que tomava no copo, que
nem a gente não tinha assim, é pratos, talheres , não, eles tomavam no copo, mas
era uma merenda gostosa e eles gostavam.
Entrevistador: E qual que era o papel da Inspetoria de Ensino do município? O
que elas faziam em relação a educação rural. Como era a relação com os
professores, assim...
Entrevistado: Então a gente tinha a reunião mensal, chamava reunião pedagógica,
uma vez por ano,
Entrevistador: Uma vez por ano?
Entrevistado: Não uma vez por mês, e uma vez por ano a gente reunia no final do
ano, mas todo mês a gente reunia e ali discutia com as, as professoras e a diretora,
então a gente fazia assim um círculo, qual era a dificuldade, assim o que que faltava,
então ali é é, a gente recebia orientação, e era bem atendida, elas atendia a gente
assim com carinho, educação.
Entrevistador: E, e, mas qual que era assim a questão pedagógica, como que
elas ajudavam vocês, na questão pedagógica.
Entrevistado: Então as provas, era assim, elas fornecia as questões já elaborada e a
gente usava o papel almaço, passava no quadro, pros alunos copiavam a pergunta,
respondia, e a gente corrigia aquela prova e trazia pra eles dá o visto.
Entrevistador: E essas provas eram, eram aplicadas de quanto em quanto
tempo?
Entrevistado: Acho que era o bimestre, né, bimestral. Cada bimestre valia, dava
nota, tinha boletim, tudo, era bem organizado.
Entrevistador: A srª era uma professora, é da esfera municipal ou da esfera
estadual?
Entrevistado: Então, no inicio eu entrei como municipal, depois o prefeito Anibal ele,
com o documento, ele, a gente, ele pegou os nossos documentos, e trouxe tudo pelo
129
estado, (riso), foi uma benção, passo todo mundo pro estado aquela época, então já
fiquei prof. Estadual.
Entrevistador: Mas nem todos os professores eram do regime estadual?
Entrevistado: Não, nem todos.
Entrevistador: Mas, vocês faziam as reuniões mensais todos juntos?
Entrevistado: Juntos.
Entrevistador: Não tinha diferença quem era estadual quem era municipal?
Entrevistado: Não
Entrevistador: recebiam os mesmos materiais e o apoio da inspetoria?
Entrevistado: Até a merenda, tudo era junto.
Entrevistador: E como que era a relação entre os professores?
Entrevistado: Ah, a gente reunia todo mês, era muito boa, principalmente no final do
ano que a gente fazia troca, né, de aplica o exame, então trocavam, eu como era lá
da Água Astorga vinha pra outra escola, e de lá vinha na minha. Então ali era tão
bom , porque os professores ficava o dia todo aplicava o exame, então ali a gente
fazia um almoço gostoso pra elas, um lanche, e daí a prefeitura levava e depois
vinha busca.
Entrevistador: Mas quando elas vinham, quando havia essa prova de exame
final na escola onde a srª atuava, no dia da prova onde a srª ficava?
Entrevistado: É a, ficava ali, né, mas não deixava assim, só ficava ali dando
assistência.
Entrevistador: Mas quem aplicava eram os outros escalados?
Entrevistado: Era os outros, ai naquele dia eles aplicavam o exame já corrigia, e
levava para a inspetoria da o visto né.
Entrevistador: E tinha bastante reprovação?
Entrevistado: nossa tinha, poucos alunos, tinha pouca reprovações.
Entrevistador: E o salário, quem é que pagava o salário?
Entrevistado: Então como eu disse no começo era a prefeitura, depois no estado
vinha pelo banco. Eu recebia no banco.
Entrevistador: tinha uma Conta salário?
Entrevistado: Isso, naquele tempo não sei se era já o Bradesco ou é o Banestado.
Entrevistador: E qual que era a sua formação?
Entrevistado: Então eu naquela época só tinha o primário, mas assim a gente, igual
eu falei pra você, a gente, nas reunião pedagógica, a gente, eles orientava muito a
gente, a gente aprendia muita coisa naquelas reuniões. Tinha as professoras que
chamava, pedagogia, as professoras, então elas orientavam muito, explicava
qualquer dificuldade que as professoras achava, elas orientava, e ia seguindo assim.
Entrevistador: E durante o tempo que a srª foi professora, das escolas rurais,
muitas mudanças ocorreram na questão legal, de leis, né?
Entrevistado: uhum
Entrevistador: Então, né teve a lei 4.024 de 61 que foi a 1ª lei da educação, ai 10
anos depois né, foi implantado uma nova lei, a de 1971, a 5.692, então a srª
passou por essas mudanças?
Entrevistado: Sim, nós tinha curso, vinha, eu morava longe, porque daqui, lá da mais
ou menos uns 15 km, e a gente não tinha condução pra ir, era de carroça, roda dura,
então eu não tinha parente aqui, então eu ficava aqui em Astorga. Ficava na casa
das minhas irmãs e ficava aquele período todo. Tinha que recebia orientação, era
assim, a formação nossa era assim.
Entrevistador: E a formação era de quanto em quanto tempo, a Srª tem
memória disso?
130
Entrevistado: Sempre era nas férias, julho, final do ano também.
Entrevistador: É além da srª ser professora, é a srª desempenhava outras
tarefas dentro do espaço escolar?
Entrevistado: Ah, acho que a única tarefa que eu, era a catequese, que eu formava
as crianças, pra receber a eucaristia, ate quando tinha a criança o padre ia lá fazia
festinha, e os pais também colaboravam, é só essa outra atividade minha que
quando tinha um aluno mais fraquinho, eu levava pra minha casa e dava aula
particular.
Entrevistador: No período contrário
Entrevistado: Sim
Entrevistador: Além da Srª ser professora né, trabalhava as questões
educacionais, lá na escola a srª fazia outra, outro serviço?
Entrevistado: Não assim, o serviço que tinha que fazer era de limpeza, naquela
época não tinha sim um, é como dizer.
Entrevistador: Tinha zelador?
Entrevistado: É zelador, cozinheiro, não tinha, mas os alunos colaboravam a gente
lavava cada quinze dias a escola, lavava carteira, e depois nós enceramos a escola,
ficou mais fácil, os alunos colaboravam, cada um tinha seu paninho de limpeza, e a
escola era assim, pra limpar o quintal os pais ajudavam, fazer a limpeza, então tinha
água boa, tinha privada, e a escola sempre limpinha.
Entrevistador: E, Mas essa limpeza que era feita de 15 em 15 dias era no
período de aula?
Entrevistado: É as vezes marcava assim no final de sábado, porque naquela época
até no sábado dava aula. Então ficava nesse período de sábado, juntava a turma e
fazia a limpeza.
Entrevistador: E eles participavam dessa tarefa, os alunos também?
Entrevistado: Sim, eles gostavam, nossa.
Entrevistador: E as famílias dos alunos, como era a participação dos pais?
Entrevistado: Ah, coitados eles tinha pouca instrução né, então eles tinham assim a
professora como assim, uma educadora (risos), tanto na parte moral e na parte do
ensino, eles tinham muita confiança na professora, tratava o professor muito bem.
Entrevistador: Mas eles não participavam assim, de ajudar o alunos na tarefa
de casa?
Entrevistado: Ah então eles tinham vontade, a maioria era analfabeto, não tinha
instrução, não tinha muito.
Entrevistador: Como era a srª achava difícil trabalhar com as duas séries ao
mesmo tempo?
Entrevistado: oh, fácil não era não né, porque o desgaste era bastante, só que os
alunos não era, assim aqueles alunos bagunceiros, que dava trabalho, a gente dava
assim eles cooperavam, quando da segunda serie terminava atividade eles iam
assim e ajudavam a atividade da 1ª, eles tomava lição, ai então eles colaboravam
nesse sentido.
Entrevistador: E a frequência dos alunos, como era?
Entrevistado: Nossa era boa, eles faltavam só quando chovia muito, ou muito frio,
assim, faltava mesmo.
Entrevistador: Os alunos da srª eram de 1ª e 2ª ano, eles faltavam em tempo de
colheita?
Entrevistado: Oh, eles eram assim menores, um pouco.
Entrevistador: E a srª tem alguma memória de algum curso que foi oferecido,
algum curso importante que foi oferecido para os professores?
131
Entrevistado: Então, lá, como eu disse, nas reuniões pedagógicas eles orientavam,
assim tinha assim curso no período de férias de pintura, é curso de como montar um
calendário, ou como fazer um enfeite ou até mesmo, como fala, assim, uma
criatividade, não lembro de todas, mas era assim, tinha sim, até, assim, enfeite de
natal, é essas coisinhas assim que a gente podia passar pras crianças.
Entrevistador: Tudo aprendido lá nas reuniões pedagógicas?
Entrevistado: Sim.
Entrevistador: A srª quer falar mais alguma coisa daquele tempo?
Entrevistado: Assim tive convivência com outra professora, né no período, a gente
sempre se encontrava, quando a gentes e reunia pra fazer festinha, os pais também
colaboravam, cada um levava assim, um pratinho, era gostoso fazer festinha pra
eles, a gente ensaiava eles, algum recital, ou canta, era assim, bem assim, sempre
as mães participativo.
Entrevistador: Então ta bom D, Zélia, eu agradeço pela contribuição que a srª
tem oferecido para a educação, mas antes de terminar a srª me disse que é
ficou lecionando na escola rural água Astorga até quando.
Entrevistado: De nada.
Entrevistador: A Srª sabe quem ficou La no lugar da srª
Entrevistado: Olha nesse período, que nós assim ficou ainda a Orendina, então , ela
ficou com esse período depois, acho que não chegou 1 ano ou dois , desmancharam
a escola, quem tinha sitio menor foi vendendo o sitio e formando fazenda, daí AP
prefeitura desmanchou a escola, e pegava os alunos La, ai traziam,
Entrevistador: Isso muito tempo depois.
Entrevistado: É depois
Entrevistador: Porque a Escola Água Astorga foi extinta, na década de 90 né?
Entrevistado: 90 né, então daí nesse período que eu lembro ficou a Orendina, depois
ela veio pra cidade também que ela tinha os filhos meio doentes e a prefeitura
levava. Então e nesse período também, era difícil, eu precisei ir para cidade para
continuar, eu fui fazer o mini ginásio, fui fazer escola normal, e daí a diretora naquela
época era a d. Maria José Lopes ainda, então ela pediu para o meu marido
Sebastião fica até que ela conseguisse outra professor pra fica ali, ai o Sebastião
aqui da cidade ele ia lá, de bicicleta, e os pais dele ainda naquela época também
morava lá, as vezes ele parava La na casa do pai dele quando chovia e não dava
pra vim, mas ele também sofreu muito aquela época, porque dava uns 15 km daqui
lá.
Entrevistador: Depois que a srª saiu ficou o Sr, Sebastião?
Entrevistado: Sim ficou
Entrevistador: Então ta bom, d Zélia, eu agradeço muito a colaboração da srª
ta
Entrevistado: ah, eu que te agradeço reviver essa história desde que fica tão
escondida né.
Entrevistador: É verdade, muito obrigada.
132
APÊNDICE C
Transcrição da entrevista com a prof. Sebastião Simão dos Santos
O Sr. Sebastião concedeu uma entrevista no dia 27 de outubro de 2014 para contar
como era a educação e estrutura da Escola Rural de Astorga.
Entrevistador: Boa tarde Sr. Sebastião.
Entrevistado: Boa tarde
Entrevistador: Sr. Sebastião nós sabemos que o Sr. Foi prof. da escola rural
Água Astorga, conta-nos um pouco como que foi essa experiência, esse início
de carreira.
Entrevistado: Bom, eu comecei no ano de 75, antes a minha esposa que foi
professora nessa escola, né. Nós mudamos pra cidade e depois ficou tendo
problema de professores lá, porque, nenhum se adaptava de ficar na escola, tinha
outros compromissos e a escola praticamente tava tendo prejuízo no ensino das
crianças, muita falta, né. Que o professor ia lá um dia e às vezes faltava muito né,
até que mudavam né, entrava outro. Passou um ou dois, três professores né, daí eu
fui convidado pela diretora D. Maria José Lopes, pra mim assim, é, ocupa o cargo
de professor até que conseguisse, até que conseguisse arruma outro né. Então eu
comecei no ano de 75, e fiquei, continuei.
Entrevistador: O Sr. Trabalhou em outra escola sem ser a escola rural Água
Astorga?
Entrevistado: Sim, depois sim trabalhei, trabalhei na, na escola Sória Medina, é, e
depois foram até o tio da minha esposa que era professor lá, tio Zezinho, que ele
chamava né. Ele mudou pra cidade e pediu pra mim se eu pudesse é, substituí-lo.
Assim, pegar a vaga dele lá, lá na escola Sória São Bento né. Então onde eu parei
na escola Sória Medina e passei na escola Sória São Bento, mas eu dava aula em
duas escolas, eu trabalhava na escola Água Astorga, de manhã, né, e na Sória São
Bento a tarde,
Entrevistador: E na água Astorga a tarde tinha algum outro professor que
trabalhava?
Entrevistado: Na água Astorga, não dai não, daí era só eu mesmo.
Entrevistador: Só de manhã que funcionava a escola?
Entrevistado: É
Entrevistador: Onde o Sr. Morava quando o Sr. Iniciou o trabalho como
professor?
Entrevistado: Morava aqui na cidade, é ate na rua Acre, perto da escola Sofientini
que eu morava, pertinho ali, então era longe, distante da escola que eu ia trabalhar
quase 15 km., é.
Entrevistador: e como que o Sr. Chegava até a escola?
Entrevistado: No começo eu ia sempre de bicicleta, né, as vezes eu pegava alguma
carona né também, eu ia de bicicleta, mas a maior parte do tempo de bicicleta, mas
daí quando eu comecei a trabalhar com duas escolas, daí eu comprei um carrinho e
ia de carro, eles subsidiava pra mim as, as despesas, né, então, eu, eu ia de carro.
Entrevistador: quem pagava as despesas pro Sr?
133
Entrevistado: Era a prefeitura, é , que passava o dinheiro pra gente.
Entrevistador: E os alunos, onde os alunos moravam?
Entrevistado: É... perto não era longe a escola não, é as vezes os que morava mais
longe, uns era uns dois km da escola, mais ou menos.
Entrevistador: E como eles chegavam até a escola?
Entrevistado: É a pé andando, porque pra passar pelos carreador né, outros
passavam por cerca né, é travessar as cerca pra ir, chega até na escola porque já
tinha muita passagem pra i, as vezes na lavoura, no meio da lavoura.
Entrevistador: Era difícil o acesso?
Entrevistado: É, é não era fácil não.
Entrevistador: E qual era o horário de aula, que horário que começava, e que
horas que terminava?
Entrevistado: Sim, lá na escola que trabalhava de manhã, era das 8 até meio dia é,
e na escola que trabalhava a tarde seria da uma as cinco, é.
Entrevistador: E o horário sempre foi fixo, esse horário, ou teve alguma época
que teve uma mudança?
Entrevistado: não, era fixo o horário. É
Entrevistador: E as férias, quando que ocorriam?
Entrevistado: As férias era de janeiro, dezembro e Janeiro. Começavam as aulas em
fevereiro né, dia 15 de fevereiro. Ia até 15 de fevereiro as férias né. É do dia 20 de
dezembro até mais ou menos 15 de fevereiro. E mês de julho tinha férias o mês todo
né. É depois que mudou depois que seria duas semanas só de férias em julho né.
Entrevistador: Mas sempre foi um mês?
Entrevistado: Era 1 mês.
Entrevistador: E como era trabalhar nessa escola?
Entrevistado: Era bom, eu gostava de trabalhar com os alunos né, no no
comportamento dos próprios alunos, que eles iam mesmo pra, pra aprender , né, é
assim , era uma escola multisseriada, trabalhava com 1ª, 2ª 3ª e 4ª série, toda
junta,né, então teve aquele teve um treinamento pros professores pra escola de
multisseriada né. Depois facilitou com esse treinamento porque pra alfabetização
então foi implantado o método da bola, né até esqueci o nome do, desse professor
de Curitiba que implantou isso aqui., é. Então todas as escolas do Paraná essa
época estava implantando esse, esse sistema da bola, e era bom a gente fazia o
treinamento, trabalhava... ocupava mais o tempo da gente mais com a 1ª série, as
outras séries dava explicação, mas já ia os materiais pra eles faze,eles mesmos, os
alunos trabalhavam, então quando eu trabalhava com uma série os outros estão
fazendo as atividades.
Entrevistador: Era um material impresso.
Entrevistado: É livros né , então, até as vezes quando eles iam fazer visitas nas
escolas, os alunos tudo sentado, tudo comportados, até falava para o professor,
parece que a escola tava fechada professor, não tem aula (riso), que nada estão
todos estudando (risos), quem conversava mais era o professor, que tava(risos),
Entrevistador: E quem cuidava da manutenção e dos reparos das escolas,
nesse período?
Entrevistado: Então eram o[...] os próprios alunos com o professor quando era coisa
simples, o professor mesmo fazia, né, fazia algum reparo na escola, quando tinha
necessidade convocava os pais, os pais dos alunos, né, ai eles, eles participavam, é
assim, até na merenda também, quando precisava, ajudavam, colaboravam, quer
dizer que não faltava, se não vinha, é as vezes não tinha, atrasava a merenda,
134
mandada pelo estado, né ou pela prefeitura, então, é usava os da produção lá da, é,
é , perto da escola mesmo,.
Entrevistador: Dos próprios agricultores?
Entrevistado: É dos próprios pais dos alunos que mandavam.
Entrevistador: Eles mandavam produtos e quem cozinhava?
Entrevistado: É, então é... é teve uma época que eles mandaram fogão, não tinha
uma cantina, mas mandaram fogão a gás né, e até era feito dentro da sala mesmo.
É
Entrevistador: O próprio professor?
Entrevistado: É ahan, cozinhava.
Entrevistador: No período que o Sr, Trabalhou quem que era responsável pela
educação?
Entrevistado: Com, então era a D. Maria José Lopes, né que era a diretora, depois
da D.Maria José Lopes, Passou pra Maria José Puziol né, também foi, foi é, diretora
também. É Inspetora municipal, i, ia tive outras que era da direção, a dona.Lucia, é
Tinha Lúcia Bonini e a Dirce podanoschi, se eu não me engano foi a Dirce
Podanósqu foi a última que eu trabalhei com ela, né. Depois quando, quando foi
assim demolidas as escolinhas rurais, e traziam os aluno prá cá, ai eu Passei a
trabalhar aqui na cidade, é.
Entrevistador: E, mas quem que mantinha as escolas , era o município ou era
o Estado?
Entrevistado: Era o município, o estado mandava bolachinha, a merenda assim
vinha do Estado.
Entrevistador: E materiais, assim para vocês trabalharem nas escolas,
materiais didáticos, caderno, livros.
Entrevistado: Assim, uma parte vinha do estado né. Que a escola Trabalhei numa
escola Estadual, então vinha o material do Estado, mas na outra municipal não, daí
seria mais material municipal, É a Água Astorga lá era municipal,
Entrevistador: E a Sória Saõ Bento?
Entrevistado: Era Estadual
Entrevistador: Então tinha diferença, de manutenção um que era de Estado o
outro que era de município, tinha diferença?
Entrevistado. Sim a manutenção sim, dava diferença sim, porque vinha material do
Estado para a escola Estadual.
Entrevistador: Mas o Sr. Achava diferença até do trabalho pedagógico?
Entrevistado: Não porque o trabalho pedagógico ai seria igual pra todos, prof.
Estadual como municipal era a mesma programação, todo, porque tinha que ser
cumprido né, então ia igual.
Entrevistador: Qual era o papel da Inspetoria de ensino junto aos
professores.? Entrevistado: Então eles davam um, um acompanhamento muito
bom, as vezes se não ia melhor talvez fosse o desinteresse do próprio professor ,
as vezes ne, que as vezes , a gente, como eu mesmo me sentia as vezes
desinteressado, porque o salário aquele tempo tava muito fraquinho, (risos), é então
quando fiz o projeto Logos II, que já era como o magistério. Então era pra ser,
melhorar a remuneração, então como eu trabalhava com dois períodos de escola,
então o prefeito ao invés de remunerar melhor ele passou a pagar só meio período
a mais só, é então em vez de receber dois períodos de duas escolas, recebia um
período e meio só, então quer dizer que não estimulava o professor, trabalha.
Entrevistador: E... como era a relação dos professores com a Inspetoria.
Entrevistado. Era boa
135
Entrevistador: E entre vocês
Entrevistado: Também, é às vezes trocava ideia entre os outros professores, porque
naquele tempo nas reuniões, é, pedagógica, as vezes é , quando era encerramento
de curso, que as vezes o curso era, pode ser o curso de até de uma semana né,
depois do encerramento fazia uma festinha, encerramento daquele curso, ate depois
tinha também, entrega de certificado, que todos os cursos que nós fazíamos tinha
certificado, né, recebia, eu tenho, ta guardado, eu não sei aonde que estão não, mas
tem, uma porção guardados.
Entrevistador: De certificados?
Entrevistado: É
Entrevistador: Quem pagava o salário de vocês?
Entrevistado: Então nós era, recebia na prefeitura, né, pegava o cheque da
prefeitura, né. Passava lá assinava a folha de recebimento, pegava o cheque e
descontava.
Entrevistador: O Sr. era um professor da rede municipal ou da rede estadual?
Entrevistado: sim, era municipal.
Entrevistador: E os professores que trabalhavam como professores estaduais
o Sr. Sabe como eles recebiam?
Entrevistado: É eu acho que eles recebiam direto no, na, no banco já, né, já iam e
recebiam no banco.
Entrevistador: E durante que, o tempo que o Sr. Foi professor tiveram muitas
mudanças nas leis, nas leis educacionais, porque a 1ª lei de Diretrizes e Bases
da educação foi 4.024 de 1961, e depois teve a de 1971, e houveram mudanças
nessa legislação em relação a alguns aspectos da educação, o Sr. Lembra?
Entrevistado: Não consigo lembra da época dessas leis, eu não consigo lembra, até
a tramitação dessas leis, então eu, mas é até, faz mais de 30 anos, né, que
aconteceu, a talvez a segunda né.
Entrevistador: Além de ser professor lá na escola água Astorga, o Sr,
desempenhava outras tarefas dentro da escola?
Entrevistado: Da ES..., não, na escola só como professor mesmo.
Entrevistador: Mas assim, além da questão pedagógica.
Entrevistado. Só da parte pedagógica e fazia algum trabalho assim, que fazia pra
escola ne,
Entrevistador: Que tipo de trabalho?
Entrevistado: É o quintal, por exemplo tinha um quintalzinho e o próprio professor
plantava uma mandioca pra faze, pro próprio aluno né, o professor usufruía daquilo
ali.
Entrevistador: Usava também na merenda?
Entrevistado: Usava pra merenda e pra eles, pra comunidade, eles podiam
pegavam.
Entrevistador: E os alunos auxiliavam nessas, nessas atividades?
Entrevistado: Não nessas atividades não, Isso não.
Entrevistador: E as famílias dos alunos, o Sr conhecia?
Entrevistado: Quase todos né.
Entrevistador: E eles participavam da vida escolar dos, das crianças?
Entrevistado: sim, quando, era assim, quando convocava para uma reunião, eles
participavam, mas não era sempre não, só quando tinha mesmo necessidade., as
vezes aqui na cidade, eles faziam uma feira, da, escolar né, , feira assim pra vender
produto até, as vezes a escola vinha também vendia né.
Entrevistador: participavam dessas feiras.
136
Entrevistado: Ahan
Entrevistador: E quais eram as séries que o Sr, atendia?
Entrevistado: Eu , da 1ª a 4ª.
Entrevistador: Como era trabalhar com todas essas series?
Entrevistado: Era complicado, porque a 1ª série ficava mais tempo, que as outras
turmas,
Entrevistador; Não tinha muito tempo pra dar suporte para as outras séries?
Entrevistado: Então era, é dava sim, mas precisava saber ter um jogo de cintura pra
poder controlar senão não conseguia. Se trabalhasse com uma série, muito, se
desse mais atenção pra um, as vezes ficava faltando pras outras.
Entrevistador: Como o Sr. Avaliava os alunos?
Entrevistado: então através provinhas mensais, né e bimestrais que servia da nota
pra passar de ano fazia os quatro bimestres, se eles alcançavam nota , dai não
precisavam fazer exame, daí já a própria nota já passava de ano .
Entrevistador: Então não eram todos os alunos que faziam o exame final?
Entrevistado: Não ai não precisava, porque alcançava a média, e eu não to
lembrado no momento né, mas parece que era quem tivesse 6, nota 6 né, já , até o
final do ano já passava direto. Então com a notinha, por exemplo nota vermelha já
existia, quando tinha essa nota mais fraca, então tinha que recuperar esse aluno até
a prova, né, até a prova, o exame final, é
Entrevistador: E como que era a frequência dos alunos?
Entrevistado: Era boa no sitio assim, só é época de chuvas né, e frio que às vezes
complicava um pouquinho, uns as vezes também morava mais longe, que não podia
participar, que não podia ir né, é esses problemas, até o dia de muito frio mesmo
então era ate difícil de ficar naquele ambiente ali sabe, por causa do frio.
Entrevistador: E nos períodos de colheita, como era a frequência dos alunos?
Entrevistado: É esses maiores as vezes faltavam para ajudar os pais, né , mas os
pequenos não, era normal,
Entrevistador: E o Sr, tem alguma memória de algum curso oferecido pelo
Departamento de Educação , pelo município, pelo estado, para melhorar sua
função como professor?
Entrevistado: Então tivemos, mas não consigo te falar assim o nome desses cursos
tivemos muitos cursos de aperfeiçoamento né, mas no momento assim não consigo
falar pra você.
Entrevistador: O Sr. Participava?
Entrevistado: Sim, participava.
Entrevistador: E auxiliou no seu trabalho educativo?
Entrevistado: É também.
Entrevistador: o Sr tem mais alguma memória desse tempo pra relatar pra
gente?
Entrevistado: Não consigo assim lembrar alguma coisa de interessante da parte
pedagógica, agora eu não consigo lembrar assim é.
Entrevistador: Como os alunos eram matriculados? Como era feito a
matrícula?
Entrevistado: As matrículas era feita sempre com antecedência, não era assim, era
feito projeto quando faziam as matrículas em todas as escolas, a nossa escola
também faziam na mesma época né, a matricula né, mas eu agora não lembro pra
contar pra você.
Entrevistador: Mas quem fazia a matrícula?
Entrevistado: Então, acho que eram os próprios professores.
137
Entrevistador: o senhor mesmo que fazia.
Entrevistado: Parece que é, não to lembrado muito bem não, já faz 30, quase 40
anos, 39 anos que eu comecei a trabalhar, e depois quando nós deixamos, depois
acabou desligando da função pedagógica né das escolas então, não consegue
lembrar.
Entrevistador: Certo, Sr. Sebastião, eu agradeço a colaboração do Sr para que
a gente pudesse desvendar um pouco desses acontecimentos da escola rural
né, para contribuir ate para a história do município né, e a gente agradece
muito a sua colaboração.
138
APÊNDICE D
Transcrição da entrevista com a aluna Maria José Malta.
Hoje é dia 01 de dezembro e estamos fazendo uma entrevista com a srª Maria José
Malta.
Entrevistador: Bom tarde Maria José?
Entrevistado: Boa tarde.
Entrevistador: Maria José eu gostaria de saber se você foi aluna de escola
rural
Entrevistado: Sim fui.
Entrevistador: E você foi aluna de qual escola rural?
Entrevistado Escola Rural Água Astorga.
Entrevistador: Que ano que a srª Iniciou?
Entrevistado: Em 1958
Entrevistador: E quando que a srª parou de estudar.
Entrevistado: Foi em 1960.
Entrevistador: Quem foi seu professor?
Entrevistado: Foi a Dona Orendina.
Entrevistador: D. Maria José como era a rotina da Escola Água Astorga?
Entrevistado: Ah estudo normal né, fazia os trabalhos na escola, os dever que o
professor passava né, ela, assim antes de ir embora, durante as aulas ela ensinava
bastante no quadro, depois ela passava exercícios pra gente fazer em casa, né,
passava bastante coisa pra gente fazer né. História, expressão, estuda matemática,
fazer tudo as contas.
Entrevistador: Que horas que a Srª estudava?
Entrevistado: Eu estudava era uma hora da tarde e saia 5 horas
Entrevistador: E como que a Dona Orendina dava aula, a Srª se lembra?
Entrevistado: Ah ela ensinava os dois né, livro, quadro, estudava bastante o livro né,
no quadro também, ela utilizava bastante.
Entrevistador: Quem ofertava esses livros pra senhora?
Entrevistado: Ela passava o nome pro meu pai e meu pai comprava o livro.
Entrevistador: E como que era estudar na Escola rural Água Astorga?
Entrevistado: Ah era tranquilo né, estudava lá, difícil quando ficou mais longe, mais
quando era perto era bom. Não era assim difícil, era normal.
Entrevistador: Como assim era perto, a escola rural não ficava em um lugar
só?
Entrevistado: Não, os primeiro ano, o segundo ano. Porque assim eu entrei na
primeira série, e ela passou a gente para a segunda série porque a gente já tinha
estudado em casa com um moço que trabalhava com o meu pai, ele tinha bem
estudo, então ele ensinou nós, então a gente entrou lá no primeiro ano, mas logo ela
percebeu que nós não precisava ficar no primeiro porque nós já estava sabendo, o
primeiro ano nos já sabia, então ela deu uma prova, vocês já estão sabendo o
primeiro ano, vocês vão entrar no segundo ano. Ai ela passou nós para o segundo
ano, nós três. Eu, minha irmã e meu irmão, tudo nós tinha, nós já passou.
Entrevistador: E a Srª tinha que idade quando começou a estudar?
139
Entrevistado: Dez anos.
Entrevistador: E seus irmãos?
Entrevistado: O meu irmão o José lá é uma ano mais novo e a minha irmã Jandira
um ano mais velha.
Entrevistador: Vocês entraram na escola na mesma época?
Entrevistado: Tudo na mesma época
Entrevistador: E sabiam as mesmas coisas que foi aprendido com essa pessoa
que morava em sua casa?
Entrevistado: Foi
Entrevistador: E como era essa primeira escola?
Entrevistado: Ah era uma casa normal assim, uma sala bem grande, diz que tiraram
uma parede do meio para ficar uma sala grande, e era uma casa normal, tinha
janela, de assoalho, um lugar assim num sítio, cheio de criação em volta, ali morava
o dono da casa, um senhor bem de idade.
Entrevistador: pertinho dessa sala?
Entrevistado: É tinha ate a porta, assim ele fechava a porta, porque pra cá era a
escola e lá era lá pra dentro. Era uma casona bem grande.
Entrevistador: Era de parede e meia?
Entrevistado: Isso parede e meia
Entrevistador: Então nessa escola era pertinho da sua casa?
Entrevistado: Essa era pertinho, uns 500 metros, bem pertinho mesmo.
Entrevistador: E depois para onde foi a escola?
Entrevistado: Ai depois, ai nós ficou 1, agora eu to lembrando que nós ficamos 1 ano
sem estudo, por causa que a professora não sabia se podia dar aula para o 4º serie,
ai depois acho que foi, porque nesse tempo nós tinha 14 anos, nos ficou 1 ano sem
estuda, ai depois ela conseguiu arrumar seis alunos pra poder ensinar a 4ª serie. É
ai nos fomos na outra escola, ai nós estudou esse último ano do 4º ano, já foi
nessa escola nova, é verdade, tinha uma área de lado, tinha vitrô assim, era forrada,
era uma escola boa.
Entrevistador: Construíram essa para ser escola mesmo?
Entrevistado: Isso
Entrevistador: A srª sabe quem que construiu essa escola?
Entrevistado: Ah, eu não sei, deve ser a prefeitura, eu sei que os donos do sítio era
o seu Jeremias, que morava, não sei se a prefeitura comprou lá, não sei, só sei que
foi construída lá, mas um tamanho bom, era já era cercada, bem arrumadinha, ficava
num lugar bem sem um matinho.
Entrevistador: E essa escola funcionava que período?
Entrevistado: Ah eu acho que de manhã a dona Zélia dava aula de manhã e a dona
Orendina a tarde.
Entrevistador: Como que era o horário de recreio?
Entrevistado: A nós brincava lá com os outros, ficava sentava, a gente já era meio
grandinha, então a gente tomava leite, era o leite, e ficava lá acho que era uma meia
hora de intervalo. Depois voltava tudo pra dentro da sala e já começava estudar de
novo.
Entrevistador: Então vocês brincavam fora dali da sala de aula?
Entrevistado: Isso, lá no pátio da escola.
Entrevistador: A escola era cercada?
Entrevistado: Cercada, ela era cercada.
Entrevistador: E a professora Orendina, ela fazia alguma outra tarefa ali na
escola sem ser dar aula?
140
Entrevistado: Não,
Entrevistador: Ela não fazia outra tarefa como limpar a escola.
Entrevistado: Não às vezes eu to lembrando, quem limpava era o povo que morava
lá tinha as moças, então ela limpava.
Entrevistador: E quem fazia a merenda?
Entrevistado: Era a família, o mesmo dono do sítio lá, trazia a vasilha de água
quente fervendo pra fazer o leite em pó, e só tomava o leite em pó, e se quisesse
tomar outra coisa a gente levava de casa, um pão, uma bolachinha, ai tinha lá o leite
pra gente tomar junto né.
Entrevistador: A srª tem alguma memória de alguma vez a srª ajudar a dona
Orendina a fazer a limpeza da escola, limpar as carteiras, varrer a sala.
Entrevistado: Eu to me lembrando, parece que ela fazia cada um limpa sua carteira,
que sentava de dois em dois, então acho que cada um limpava, aqueles dois que
sentava, limpava. Eu lembro que a gente limpava embaixo onde que ia colocar os
livros, então cada um limpava sua carteira, e varre, a gente ajudava ela varre
também, ajudava sim.
Entrevistador: Tinha muitos alunos?
Entrevistado: Tinha bastante, da nossa quarta até que não tinha muito, mas do
começo sim, 2º, 3º, tinha bastante.
Entrevistador: Ela dava aula para todas as séries?
Entrevistado: Todas as series.
Entrevistador: E como era o trabalho dela? A Srª lembra como que ela dava
aula para todo mundo junto?
Entrevistado: Então, Cada ano vamos supor, o 1º ano ela tinha uma turminha ela
explicava, depois o 2º ano ela ensinava para aqueles La e depois o 3º e a 4[ série,
era tudo assim.
Entrevistador: E a srª tem memória se vocês ajudavam os alunos mais fracos?
Entrevistado: Não, não ajudava não.
Entrevistador: Vocês terminavam o dever e vocês ficavam fazendo o que?
Entrevistado: Ah muitas vezes, ah eu já ajudei sim, mas apontar lápis deles tinha um
menino que falava assim: Aponta o meu lápis, eu pegava o lápis dele, ia lá e
apontava pra ele (risos). A única coisa que eu fiz pra ele era aponta o lápis pra ele,
mas outras parte não ajudava eles não, é.
Entrevistador: E o material escolar como que era?
Entrevistado: A tinha normal tinha caderno de caligrafia, sabe como é o de caligrafia.
Tinha o caderno de aritmética, que era tudo de quadradinho, tinha de desenho, a
gente fazia desenho, é fazia bastante desenho, nos caderno, é tinha de 3 ou 4
qualidade de caderno. De caligrafia, de, eles falavam linguagem, é tinha linguagem,
caligrafia, o de desenho e de aritmética que era tudo de quadradinho, tudo deste
jeito os cadernos.
Entrevistador: E vocês encapavam?
Entrevistado: Sim encapava os cadernos. Ela já pedia para encapar os cadernos,
livro também, encapava tudo, era tudo encapadinho.
Entrevistador: A srª fez até que série?
Entrevistado: Até a quarta.
Entrevistador: A srª terminou os estudos na escola rural Água Astorga?
Entrevistado: Terminei lá com a profª Orendina. Terminei lá. Ai teve uma festinha e
ai nós recebemos o diploma, nós tiramos foto, tenho até uma foto na escola.
Entrevistador: A srª lembra como que era a escola, sua estrutura física? Da
primeira escola como que era?
141
Entrevistado: Ah, era uma casa simples, simples mesmo, não tinha forro, nada,
coberta de telha, né, uma casa até assim, de parede escura, porque tudo madeira
velha, não tinha tinta nada, não tinha pintura nessa casa lá.
Entrevistador: Tinha energia?
Entrevistado: Tinha nada, tinha não, eles fizeram umas três, quatro janelas para
poder clarear né? Abriam a janela, ai, não era assim vitro ( mostrou a vidraça da
casa dela, modelo basculante) era janela mesmo, aquela que abre e fecha, de
assoalho.
Entrevistador: Como era viver nesse espaço escolar?
Entrevistado: Eu gostava, porque eu sentava bem perto assim, mais perto lá da
frente né? Só tinha uma carteira na minha frente assim, eu era da segunda, eu
gostava, sentia bem estudando.
Entrevistador: E quando a srª não estava na escola o que a srª fazia?
Entrevistado: Eu tava na roça, trabalhava até meio dia e depois do meio dia a gente
ia pra escola.
Entrevistador: Você morava a que distância da escola?
Entrevistado: A última escola era uns dois km. É passava no meio do pasto, passava
de pulador de cerca, porque não tinha porteira lá e tinha cerca e passava pelo
pulador. A professora também junto, ia e voltava junto.
Entrevistador: E era difícil o caminho?
Entrevistado: Ah, tinha lugar que era difícil, que era uns trios que não tinha nem
estradinha assim, era uns trios de pasto.
Entrevistador: Tinha animais no pasto? Era perigoso?
Entrevistado: Tinha, mas não muito não. As crianças ficavam meio longe pra lá das
vacas. Assim sempre cuidava né. A professora também olhava, pra gente presta
atenção né. É isso ai. Mas, foi meio trabalhoso, mas valeu a pena né? E hoje se a
gente sabe um pouquinho de lê e escreve, a gente aprendeu lá né?
Entrevistador: E como que era o relacionamento de vocês com a professora?
Entrevistado: Ah, era muito bom, que ela era, muito boa professora pra gente, sabe.
É, corrigia alguma coisa da gente, que a gente falava errado e falava: “é memo” né?
É memo não tá certo, a outra “centium”né. Ela: “ai não é memo, é mesmo”, ela
falava e a Geralda “centium” , “não é centium” e ela brigava com a Geralda.
É, mas é difícil né, assim foi um estudo bem puxado, assim sabe, ela mesmo fala
que o nosso foi, assim, não foi de 4ª série, foi mais, é foi assim um, mais forte, né?
Sei que é eu não era muito boa pra tirar nota não. Eu era meia (risos), era 6,5, 7,0,
quando fazia as provas, sabe. E no exame também, fala exame que é o último né,
também a nota era assim.
Entrevistador: Como vocês eram avaliados?
Entrevistado: É , no final do ano o exame era o último, não passou, ai reprovava. Na
onde era esse casarão ai, onde era a 1ª. 2ª e 3ª série era umas professora, aqui da
cidade, mas eu não sei o nome dela e depois no final do ano, da última, da 4ª série
que foi a d. Maria José Lopes, que foi aplica, mas os outros era as professoras de
aluno, até era mais ou menos, igual a ela, assim, elas ficavam lá em volta da gente,
fazendo pergunta pra gente responde, né, é que nem eu falei aquela hora do menino
da conta lá né, a conta de subtrair, de diminuir, como é que fala lá. Que ela falava:
“oh, meninos vocês pensem bem, é uma coisa comum, tirando cinco de seis so pode
ficar?”. E eu ficava, “Como pode ficar? Como pode ficar? Mais mesmo quebrei a
cabeça pra por a resposta naquela prova lá viu.
Entrevistador: Foi uma prova oral ou tinha pergunta na prova para vocês
responderem?
142
Entrevistado: Não, a pergunta, ela lia assim e tava ali na prova.
Entrevistador: E qual era a expectativa dessa prova?
Entrevistado: Ah a gente ficava preocupado, nossa! Com medo de não passar né?
Que no final do ano não passou ai reprova né?. Mas graças a Deus nós nunca
reprovou, nem eu nem meus irmãos, nem ninguém lá da escola. Ela ensinava muito
bem pra gente, tinha muita paciência pra ensinar e a gente nunca reprovou.
Entrevistador: E como que era o relacionamento entre os alunos?
Entrevistado: Ah sim, olha era muito comportado os alunos, a dona Orendina nunca
chamou a atenção de ninguém, por causa que estava brigando, ninguém nunca
brigou, sempre todo mundo combinou, precisa de ver, era muito tranquilo.
Entrevistador: Os pais participavam da vida escolar dos filhos?
Entrevistado: Não, não participava não. Nunca foi numa reunião, não tinha reunião
para os pais. Nunca lembro dos pais terem participado.
Entrevistador: Mas os seus pais perguntavam sobre o que tinha acontecido na
escola?
Entrevistado: Sim perguntavam, o pai sempre olhava os cadernos da gente pra ver
se tava, assim como que tava. Ah o meu pai era assim, ele dava bastante atenção
pros filhos nessa parte ai.
Entrevistador: E a srª tem memória das dificuldades ou até mesmo lembranças
boas que a srª teve enquanto estudante?
Entrevistado: Ah eu tinha assim que de chuva tinha que ir. Então era difícil pra gente
ir né. As vezes tava chovendo né, e a gente tinha que ir mesma coisa né. Não sei
nem se tinha sombrinha, sei lá de que que a gente ia, mas eu acho que era mesmo,
fazia aquele barro né, a gente tinha que ir descalço, não podia colocar um calçado
no pé, porque se por um calçado, ai não tinha jeito, ai o barro vinha subindo e
entrava dentro do sapato, ia descalço.
Entrevistador: E lembranças boas, que a srª lembra?
Entrevistado: Ah, lembrança boa é quando a gente fazia piquenique, ai era uma
festeira, era bom demais, ai nós ia na beira do rio lá, tinha água lá, arvoredo né, ai
cada um levava um lanche, um bolo, um pão, uma bolachinha, um biscoito, cada um
e fazia lá. Aquilo lá era muito bom, ai nós passava o dia todo contente, véspera
assim de um dia importante assim, 15 de novembro, 7 de setembro. Sei lá uma data
que marca né, que tem comemoração, para comemorar aquela data né, então a
gente ia faze isso ai.
Entrevistador: E quando a professora levava vocês para fazer esse piquenique,
ela também ensinava algumas coisas?
Entrevistado: Ensinava, antes lá né, ela explicava porque a gente estava fazendo o
piquenique né? Explicava, ela falava tudo e depois a gente ia comer, beber. E o
descobrimento primeiro ela explicava, porque nós estava lá né?
Entrevistador: Alguma vez a profª Orendina deixou de aula para vocês? Se ela
tinha alguma reunião?
Entrevistado: Ah, isso ai ela teve sim, é , talvez problema de saúde, também quando
as vezes ela não tava boa, então ela não ia né, mas era poucas vezes , não era
muita não.
Entrevistador: Ela avisava como?
Entrevistado: Nós morava perto ai ela avisava, mas já aconteceu da gente ir lá na
escola né e ela não aparecer e depois ir mandar avisar na escola mesmo né, porque
daí já avisava todos né? E muitos morava longe, assim morava do outro lado da
estrada né, vinha muitos de longe, então não tinha como ela ir na casa avisar né, ai
143
eles vinha La e depois ela vinha, mandava, acho que o marido dela que ia lá avisa,
falava que ela não podia ir, que ela não tava bem, mas foi poucas vezes.
Entrevistador: E a srª se recorda alguma vez da professora dona Orendina r
aula?
Entrevistado: Ah assim quando ela foi para ganhar o nenê, que ela tirou licença foi
outra professora La na escola, uns três meses, quatro meses, foi pouco tempo, ai ela
voltou da aula de novo.
Entrevistador: A srª tem mais algo a dizer sobre esse período que a Srª
estudou na escola rural Água Astorga?
Entrevistado: Ah, eu acho que eu não tenho não, acho que ta tudo certo, pode ser
que até tem, mas eu não cosigo lembrar né, porque faz muito tempo já né.
Entrevistador: Quantos anos a srª tem hoje
Entrevistado: Sessenta e seis
Entrevistador: Eu agradeço pela disponibilidade que a srª teve de conceder
essa entrevista, de contribuir com a história da educação das escolas rurais de
Astorga, muito obrigada.
Entrevistado: de nada, eu que agradeço.
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APÊNDICE E
Transcrição da entrevista com a aluna Jandira Malta.
Hoje é dia 19/12 e nós estamos aqui para fazer uma entrevista com a Srª Jandira
Malta.
Entrevistador: Bom dia.
Entrevistado: Bom dia.
Entrevistador: Dona Jandira você foi aluna da Escola Rural Água Astorga?
Entrevistado: Sim
Entrevistador: E quando a Srª começou a estudar lá. Qual foi a primeira Escola
que a Srª estudou. Conta um pouquinho, a senhora tem memória de como era
essa escola?
Entrevistado: Aonde eu comecei ainda tem a casa lá que é do irmão da dona Zélia o
Zezo, eu conheço ele por Zezo, você conhece ele, não conhece,
Entrevistador: Ahan.
Entrevistado: Quando eu estudava lá o sitio era de outra pessoa agora é dele e a
casa é a mesma ainda, a casa tinha uma sala grande que funcionava a escola tinha
uma sala grande sabe então eu estudei lá, eu acho que eu tinha mais ou menos uns
12 anos de idade quando eu comecei a estudar naquele lugar, nessa casa né que
ainda existe lá se você procurar ele, se você procurar a Dona Zélia você acha a casa
dele né, ainda tá lá a casa, então aí depois mudou a escola mais para baixo né aí
sim, ai fez uma escola mesmo, construiu uma escola por que ali funcionava numa
sala da casa.
Entrevistador: Era de parede e meia?
Entrevistado: Isso.
Entrevistador: E tinha morador?
Entrevistado: O dono, o antigo dono que já faleceu, morava no fundo.
Entrevistador: Você sabe por que ele cedeu essa sala?
Entrevistado: Eu não sei, por que faz muitos anos né, eu não sei quando a gente
mudou lá já funcionava assim né, e chamava, como é o nome dele, Januário.
Entrevistador: Seu Januário.
Entrevistado: Seu Januário, era do seu Januário, o irmão da dona Maria Zélia, que é
o seu Zezo que comprou dele deve te contar direitinho né.
Entrevistador: Então a Srª lembra assim mais ou menos o ano que era?
Entrevistado: Ah, eu não lembro mais não, o ano eu não lembro mais não por que já
faz muito tempo né, eu tinha a faixa de uns 12 pra 13 anos, agora to com meia sete,
você imagina quanto tempo faz né, faz muitos anos, ai mudou lá num outro sitio bem
longe, bem longe, bem mais pra baixo, pra lá, aí a prefeitura construiu lá uma escola,
só a escola mesmo né.
Entrevistador: Perto de uma estrada?
Entrevistado: é, tinha um carreador que saia na estrada. Num ficava muito longe da
e estrada não, era perto da estrada. Então, é assim.
Entrevistador: E aí a Senhora saiu dessa escola que era perto de casa e
estudou na escola construída?
Entrevistado: Eu terminei, como que fala. Eu estudei até a quarta série só, eu
terminei até a quarta série do primeiro grau lá na escola nova.
Entrevistador: Na água Astorga?
Entrevistado: É na Água Astorga
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Entrevistador: Certo. E quem é que foi seu professor?
Entrevistado: Sempre Foi a Dona Orendina, ela dava aula pra primeira série,
segunda, terceira, quarta, nós era tudo numa sala só né.
Entrevistador: Todos faziam parte da mesma turma, e ela dava aula pras quatro
séries?
Entrevistado: É as quatro séries.
Entrevistador: E tinha muitos alunos?
Entrevistado: Tinha bastante, enchia a sala.
Entrevistador: E como que era assim a rotina na escola, como você saia lá da
sua casa e ia pra escola. Conta, primeiro como era lá na primeira escola e
depois quando passou pra outra?
Entrevistado Ah, quando a gente sempre estudava quando era meio período né,
então a gente antes de ir pra escola, a gente tava lá puxando a enxada né,
trabalhando né, carpindo né, aí depois a gente ia pra casa, se arrumava e ia pra
escola e quando as vezes era na parte da manhã primeiro a gente ia na escola
depois que a gente chegava da escola, que tinha uma vez que era da parte da
manhã e outro ano na parte da tarde,a gente chegava em casa e almoçava. E ia de
novo pra lavoura né, e a dona Orendina ela sempre deu aula só meio período
mesmo, essa escola nunca teve período integral, é sempre foi meio período, e às
vezes eu ficava com as crianças dela pra ela dá aula assim, sabe, na, não espera aí,
não, tinha o dia todo sim não era, agora que eu to me lembrando pro que as vezes
eu ficava com as meninas dela, que as meninas dela era quase minha idade mesmo
né, você conhece as filhas dela né. Às vezes eu ficava com as meninas né pra ela.
Entrevistador: Pra ela poder trabalhar?
Entrevistado: É pra ela dá aula né, porque eu chegava da escola, nós ia pra casa,
ela também ia, às vezes quando era na parte da manhã, a gente Almoçava e eu
ficava na casa dela, e ela voltava lá da aula né. Era assim,
Entrevistador: Você cuidava dos filhos dela?
Entrevistado: É, não sempre, lá de vez em quando eu cuidava.
Entrevistador: E se não fosse essa ajuda, a D. Orendina também não
conseguiria?
Entrevistado: Não, mas, isso ai as vezes eu ajudava ela, as vezes quando o marido
dela as vezes não tava em casa né, para não ficar sozinha, mas a maioria do tempo
eu não ficava não, era lá de vez em quando, só sabe.
Entrevistador: E você morava pertinho da casa dela?
Entrevistado: Nós morava perto, nós era vizinho de sítio, né.
Entrevistador: Ahan, essa primeira escola, que você estudou, que era na casa
daquele senhor, é era longe ou era perto da sua casa?
Entrevistado: Era perto, não era muito longe não, ai depois que a escola mudou que
ficou longe.
Entrevistador: E como que vocês iam para a escola?
Entrevistado: Nós ia a pé, pulando por cima de cerca de pasto, as vezes tinha
aquele pulador, aqueles toco que eles colocava, uns toco assim na, na beira da
cerca, no tipo de uma escada, né, um baixinho, um mais alto, um mais alto, e do
outro lado também, a gente pulava por cima, vinha aquela turma de molecada da
escola, nós passava por meio dos pastos, era assim.
Entrevistador: Eles faziam esse instrumento ai para vocês passarem?
Entrevistado: Isso, porque pra ficar passando embaixo do arame era difícil, né.
Entrevistador: Com quem vocês iam ara a escola?
Entrevistado: Com quem?
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Entrevistador: É vocês iam com quem?
Entrevistado: Com quem? Ah nós ia só nós mesmo, eu já era mocinha já, essa
época eu já tinha uns 14 anos, sabe quando a escola mudou né, eu já tinha uns 14
anos, eu demorei pra entrar na escola, porque a gente, não tinha escola perto, né, é
a escola longe, daí nós mudou lá que a escola era mais pertinho, ai eu já entrei na
escola e fiquei só 4 anos, porque eu não reprovei nenhum ano. Eu entrei já na
primeira série que nesses tempo já entreva na primeira série, eu já tinha 13 anos né.
Não podia perder tempo né. Ai sai da escola quando fiz a quarta série.
Entrevistador: Então você estudou em que período, da manhã ou a tarde?
Entrevistado: Isso, não, é, foi porque algum ano dava certo da tarde, outro ano as
vezes era de manhã, e tem os meus irmãos também que estudaram com ela, mas
foi pouco depois eles foram mais foi com a D. Zélia, a Maria Zélia deu aula lá
também, você já entrevistou ela?
Entrevistador: Já entrevistei ela também.
Entrevistado: Então, meus irmãos estudou, foi aluno dela, né.
Entrevistador: E como nesse período a Dona Orendina, sua professora dava
aula, como que era a relação lá na escola de vocês, como ela ensinava, o que
ela utilizava para ensinar?
Entrevistado: Ah, ela utilizava um livro bem grosso, livrão, sabe, e ela era aquele
livro, que ela passava para nós, né.
Entrevistador: E como que era a rotina da escola? Vocês chegavam na escola
e já começavam a estudar? Ou você faziam uma outra atividade antes?
Entrevistado: Ah, era difícil fazer atividade hein, a gente mais estudava mesmo, fazia
alguns piquenique lá de vez em quando sabe, mas era difícil né? Mais estudava
mesmo.
Entrevistador: Vocês chegavam lá na escola e como era a srª lembra?
Entrevistado: Nós chegava e já ia estudar.
Entrevistador: Tinha uma oração, como era a rotina de vocês, a senhora tem
memória disso?
Entrevistado: Não, não tinha oração não, a escola nós mesmo limpava, né, tinha o
dia da semana que a gente limpava a sala né, a gente se juntava todo mundo ali,
limpava a sala, era assim.
Entrevistador: Ajudava bastante o professor.
Entrevistado: Ajudava.
Entrevistador: E assim, tinha o horário de aula, vocês tinham o recreio?
Entrevistado: Tinha, tinha um pouquinho de recreio sim.
Entrevistador: E o que vocês faziam no recreio?
Entrevistado: Ah no recreio, a gente brincava.
Entrevistador: Que tipo de brincadeira?
Entrevistado: Ah as brincadeira às vezes era nossa mesmo, porque ela coitada, ela
ficava lá dentro corrigindo caderno né, então nós ficava no canto, nós era uns aluno
muito bonzinho, sabe, a turma inteira não deu trabalho par ela né, tinha uns moleque
meio danado, mas era no caminho de escola que brigava longe da escola, né, na
hora de ir embora.
Entrevistador: Os alunos respeitavam? Como era a relação de vocês?.
Entrevistado: Tinha uns dois só assim sabe. Que as vezes quando saia da aula lá
longe, ai começava a arruma briga com os outro menino né, mas ali na sala de aula
eu não lembro que nenhum deu trabalho pra ela sabe, era todo mundo comportado,
não é que nem agora(risos), é tudo comportadinho e nós as vezes a gente
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inventava alguma brincadeira, mas eu nem lembro mais o tipo de brincadeira, mas
era difícil nós brincar, nós era adulto né.
Entrevistador: Ficava só conversando?
Entrevistado: é só conversando né, e a nossa merenda, o nosso lanche era só leite,
(risos), ela levava leite em pó que a prefeitura mandava e ai esquentava uma água
lá, nem cozinha tinha a escola, precisava de cozinha ela ia na casa do vizinho lá,
mandava esquentá uma água lá e fazia o leite e nós tomava, era assim.
Entrevistador: Isso tudo na hora do recreio?
Entrevistado: No recreio.
Entrevistador: No recreio, ela fazia o leite, entregava pra vocês?
Entrevistado: Tinha, tinha canequinha e às vezes assim tinha uma coisa de comer,
um lanche né, levava de casa era assim.
Entrevistador: E além de dar aula, vocês limpavam a escola?
Entrevistado: É nós limpava.
Entrevistador: A senhora tem assim lembrança se ela fazia mais alguma outra
tarefa sem ser a de professora.
Entrevistado: Lá na escola, não, não fazia não.
Entrevistador: Ela era às vezes merendeira né, por que não tinha merendeira,
não tinha zeladora.
Entrevistado: Não, era nós mesmos, ela e nós que se juntavam, nós era mocinhas
já.
Entrevistador: Mas todos os dias vocês limpavam a sala ou era só um dia na
semana.
Entrevistado: Não, era só uma vez por semana.
Entrevistador: E dona Jandira como que era o material didático que vocês
utilizavam lá na escola, que comprava? Material para vocês ler, escrever,
caderno.
Entrevistado: Ah, era tudo meus pais, era o meu pai que comprava a prefeitura não
dava nada.
Entrevistador: Tudo era comprado
Entrevistado: Tudo era comprado
Entrevistador: E você se lembra assim, conta um pouquinho da estrutura
física, de como era a escola. Aí você conta um pouquinho da primeira escola,
aquela casa, aquela sala, como era a estrutura, estrutura mesmo.
Entrevistado: Ah, era uma sala de assoalho né, era de assoalho alta, tinha escada
pra gente entrar por que era alto o chão, as paredes todas de madeira né, tinha
janela, mas não era assim (apontou para a janela de sua casa, de metal com vidros),
era daquelas janelas de madeira, sem forro né, não era forrada não, sem forro e a
outra lá eu não lembro se ela era forrada ou não, não lembro se ela tinha vitrô isso
eu não lembro.
Entrevistador: A mais nova.
Entrevistado: A mais nova, mas eu creio que tinha né, por que foi a prefeitura que
fez né, eu creio que tinha.
Entrevistador: E as atividades como eram realizadas?
Entrevistado: Olha, o ensino era muito diferente de agora por que eu vejo as
crianças que nem no tempo dos meus meninos já foi bem diferente, eles colavam
trabalho no caderno e nós não, não tinha esse negócio de ficar colando nada não, e
o modo de ensinar era totalmente diferente né, tudo diferente.
Entrevistador: O que a senhora vê que era diferente, conta um pouquinho o
que vocês faziam de diferente que a senhora vê que não era igual?
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Entrevistado: Ah, matemática também era diferente, muita coisa, o ensino totalmente
diferente por que quando os meus meninos tava na escola que às vezes eu ia olhar
o caderno deles ou as vezes eles estavam com alguma dificuldade eu ia ensinar eles
do meu jeito e eles não aceitavam, por que do jeito que eu aprendi né. Oh mãe, não
é assim, o professor ensina sim, assim, então não tem como, não tem como te
ensinar nada né, não tinha jeito de eu ensinar eles porque eu quem tava na escola
nesse modelo novo era eles, não tinha jeito eu não sabia como professora tava
ensinando eles que mudou muito assim. O método de ensino mudou muito, muito
mesmo né, as crianças agora aprendem brincando né e quando eu entrei na aula
não era assim não já logo no primeiro dia já foi o a, e , i, o, u, o abc já entrou direito
né, tinha que aprender mesmo.
Entrevistador: E sempre copiando?
Entrevistado: Sempre copiando, nós fazia muita cópia, nós fazia muito ditado né,
história né, escrevia bastante história.
Entrevistador: Que histórias vocês faziam?
Entrevistado: A gente inventava, ela mandava e a gente inventar, história lá e era
assim. Ah, a gente inventava da vida gente, qualquer coisa lá inventava.
Entrevistador: E era bom estudar lá?
Entrevistado: Ah, eu achava bom né, por que eu só conhecia aquele modo de
aprender né, aquele método, não conhecia outro né, então eu achava bom por que
ela foi boa professora ela tinha bastante paciência, a turma era muito boa né, os
alunos tudo bonzinho, tudo comportado né, era bom sim.
Entrevistador: A relação de vocês, era boa, tinha afetividade, entre os alunos e
a professora?
Entrevistado: Tinha, por que eles, eu sinto que eles é assim comigo até hoje. Ela
considera a gente como pessoa da família dela.
Entrevistador: Então vocês tinham um bom relacionamento?
Entrevistado: Teve, os primeiros vizinhos nosso foi eles, ela né e até hoje, ela mora
aqui perto, sempre estou lá na casa dela.
Entrevistador: E a relação entre os alunos, como era a relação entre vocês?
Entrevistado: é, a nossa relação, pelo menos na minha época foi muito bom, agora
dos meus irmão eu não sei, por que os meus irmãos eram bem mais novos que eu,
quando eles estudavam eu não estava estudando mais, então não sei como foi.
Entrevistador: E como eram as aulas da profª Orendina?
Entrevistado: Ah, ela passava dever pra primeira série fazer enquanto eles estão
fazendo aquele dever ela já estava dando aula pra terceira série.
Entrevistador: Utilizando o quadro?
Entrevistado: Existia dois quadros, ela dividia enquanto iam série estava copiando o
dever do quadro ela já estava dando aula pra terceira série, ou segunda série do
outro lado, que era duas carreiras de carteiras, cada carreira tinha um quadro em
frente.
Entrevistador: Quando alguns alunos terminavam o dever o que eles faziam?
Entrevistado: Ela esperava terminar, apagava e passava aula pros outros.
Entrevistador: A senhora tem memória de alguma vez ter terminado a atividade
e ter que ficar esperando?
Entrevistado: Não, ela controlava muito bem, ela era bem organizada.
Entrevistador: E como que era a relação dos pais de vocês na escola?
Entrevistado: Aquela época não existia reunião de pais, nunca teve, os pais não iam
na escola, não tinha reunião, não tinha nada, mas também nem precisava né, nós
mesmos ela passava aviso no quadro e a gente copiava e levava pra casa, era
149
assim. E nem precisava, por que ela não tinha o que reclamar dos alunos, não tinha
nada era só pra aprender ler, escrever, ali não tinha nada, naquela época era tudo
mais simples, não e que nem agora né, eu ate estranhei, um dia fui aqui no Serafim
eu cheguei na porta da sala de aula eu fiquei horrorizada de ver o comportamento
dos alunos de hoje, totalmente sem educação, as professoras sofrem com os
alunos, a gente respeitava muito a professora né, a tudo o que ela falava a gente
obedecia e respeitava.
Entrevistador: E como vocês eram avaliados, tinha avaliação, tinha prova?
Entrevistado: Tinha, ela fazia prova, ela avaliava nós, os dever que nós fazia ela
corrigia caderno por caderno, e dava nota né, ela levava aquele monte de caderno
pra casa todo dia né, pra corrigir né e lá dentro da sala de aula, na hora da aula a
gente fazia também e depois ela sentava lá, tinha a mesa dela que ela ficava
sentada lá, aquele que ia terminando ia levando lá e ela ia dando nota, era assim.
Entrevistador: Na quarta série tinha alguma prova diferente?
Entrevistado: Na quarta série já foi mais puxado, mais diferente, mais difícil, né.
Entrevistador: Alguma vez alguém aqui da inspetoria, da secretaria de
educação daqui foi aplicar prova lá na escola para vocês?
Entrevistado: Não lembro, não lembro não.
Entrevistador: E algum dia a professora Orendina ter que se ausentar?
Entrevistado: Ela se ausentava porque ela vinha em reunião de professores aqui na
cidade né, mas eu não sei quantas vezes que ela vinha, não lembro mais, se era
uma vez por mês.
Entrevistador: E nesse dia quem que dava aula para vocês?
Entrevistado: Ficava sem aula.
Entrevistador: E como ela avisava os pais que nesse dia não teria aula?
Entrevistado: As vezes ela nem escrevia nada, ela só falava né, ninguém faltava na
aula, ia todo mundo.
Entrevistador: E dia de chuva e de frio?
Entrevistado: A gente ia do mesmo jeito, nós andava descalço, porque lá fazia muito
barro, a gente ia descalço pra escola, chegava com os pés dessa altura de barro
(mostrou aproximadamente 10 cm),limpava os pezinhos no limpador, uma enxada
velha presa em dois tocos de madeira com o corte para cima, mas não cortava não,
a gente chegava e limpava os pés ali, ficava alto assim de barro ( aprox. 20 cm)
Entrevistador: Era difícil?
Entrevistado: Era, mas naquela época a gente não achava porque a gente estava
acostumado né com aquela vida, a gente não achava difícil. Eu sou uma pessoa que
eu enfrento qualquer coisa, porque a vida que nós levou lá no sítio foi muito difícil,
nós vivemos “uma vida de índio”, que a gente segurava com remédio do mato, se
ficava doente ninguém vinha em médico, sarava la mesmo né. Então foi bem difícil,
mas a gente não achava difícil. Eu acho que era difícil e a gente não achava difícil e
era bom, melhor que agora.
Entrevistador: D. Jandira ficou alguma coisa em sua memória sobre essa
experiência enquanto aluna lá na escola rural Água Astorga?
Entrevistado: Já faz muito tempo, as coisas vai apagando da mente né.
Entrevistador: Mas a senhora lembra quando a senhora terminou os estudos,
se a senhora começou com 12 anos, s[a srª terminou com 16, ai a Srª parou de
ir na escola, qual foi o sentimento da srª?
Entrevistado: Eu não sabia o que era assim, eu era menina muito inocente mesmo
com 16 anos sabe, a gente não tinha uma TV, porque uma TV ela abre bastante os
olhos da gente, a gente vê muita coisa assim, então a gente não sabia de nada, a
150
gente não, as coisas que existem no estudo assim, eu nem sabia, e pra falar bem a
verdade eu não gostava muito de estudar não (risos), foi até bom parar de estudar
até certo ponto, a gente trabalhava muito. Você vê, a noite tinha que fazer dever,
tarefa com o claro da lamparina né, não tinha luz elétrica, agora tem lá, mas naquela
época não tinha era difícil, a gente com sono, a gente trabalhava bastante né, no
pesado né, na roça né, a gente cansava né, depois acabava de jantar dava aquele
sono ainda tinha que fazer o dever com claro de lamparina né, então por isso que a
gente nem gostava muito de estuda, não é como hoje que o pessoal, as escolas tem
bastante brincadeira, tem passeio para os alunos, pra escola não ficar uma coisa
chata né, naquela época não tinha nada disso
Entrevistador: E quando vocês iam fazer essa tarefa a noite, seus pais
sentavam do lado, como que era essa relação de tarefa de casa?
Entrevistado: Sentava nada a gente tinha que se virar, eles não sabiam também né,
eles só sabiam escrever o nome só e lê, eles não tinha como ensinar a gente né,
eles não tinha bagagem pra passar pra gente né, É igual hoje que eu tenho só a
quarta série, se uma neta minha, se for pra mim ajudar num dever de casa, alguma
coisa eu não tenho bagagem pra isso, porque já faz muitos anos que eu conclui
esse é 1] grau até só a quarta serie, né, já faz muitos anos né, então não tem como
eu ensinar nada, e depois e tudo diferente agora, não é igual o tempo que eu
aprendi, não era como agora né, totalmente diferente.
Entrevistador: Então está certo d. Jandira, eu agradeço sua disponibilidade em
ajudar para gente recuperar um pouco dessa memória adormecida, para
registrar isso o que está na sua Memória para ficar guardado. Agradeço sua
disponibilidade e sua participação.
Entrevistado: De nada, mas se você for conversar com meus irmãos mais novos,
eles devem de lembrar mais coisas, porque eles estudou nessa escola depois que
ela mudou pra lá, eles estudaram lá, eles são mais novos que eu, então eles devem
lembrar mais coisas né.
Entrevistador: Então tá bom, obrigada.
151
APÊNDICE F
Transcrição da entrevista com a aluna Sueli Malta Perugini.
Hoje é dia 22 de dezembro de 2.014 e nós estamos aqui na casa da Sueli Malta
Perugini para conversarmos com ela.
Entrevistador: Boa tarde Sueli.
Entrevistado: Boa tarde.
Entrevistador: Sueli, você estudou em alguma escola rural?
Entrevistado: Sim eu estudei na escola rural Água Astorga.
Entrevistador: Em que ano foi isso?
Entrevistado: Foi em 1970.
Entrevistador: Você estudou lá até que ano?
Entrevistado: Até 1.974.
Entrevistador: Quem era seu professor?
Entrevistado: De início foi a Dona Orendina aí depois foi Dona Maria Zélia ai
continuou o restante dos anos a Maria Zélia mesmo
Entrevistador: Você estudou até que série?
Entrevistado: Até a quarta série.
Entrevistador: Você terminou lá mesmo na escola água Astorga?
Entrevistado: Isso
Entrevistador: Você estudava que período?
Entrevistado: De manhã e teve uma época que eu estudava a tarde também.
Entrevistador: E como era a rotina lá da escola?
Entrevistado: Olha, a gente ia a pé né, era uns 500 metros mais ou menos aí a gente
chegava lá, sempre chegava um pouquinho mais cedo né, sempre as crianças
gostavam de brincar né, aí a gente tinha horário certo de entrar aí era uma sala só
da primeira a quarta série. Tinha primeira, segunda, terceira e quarta série, tudo na
mesma sala, dividia as carteiras.
Entrevistador: Era uma sala multisseriada?
Entrevistado: Isso é tinha quadro negro para cada série.
Entrevistador: Um quadro para cada serie
Entrevistado: É
Entrevistador: E o professor dava aula para as quatro séries?
Entrevistado: Isso
Entrevistador: Isso era com a Dona Orendina
Entrevistado: Também
Entrevistador: Que série que você estudou com a Dona Orendina?
Entrevistado: O primeiro ano
Entrevistador: E com a Dona Zélia
Entrevistado: Aí foi uns dois ou três anos com a Maria Zélia, aí tinha vezes que ela
não podia ir e ia as cunhadas dela e outras professoras substitutas né, aí no final, foi
no ultimo ano foi com Sebastião.
Entrevistador: Você estudou com o professor Sebastião também?
Entrevistado: Isso, com ele também.
Entrevistador: Você estudou com os três professores?
Entrevistado: Isso é.
Entrevistador: Você achava diferença da metodologia dos três?
Entrevistado: Eu achava que tinha sim.
152
Entrevistador: Você quer contar um pouquinho?
Entrevistado: A Dona Orendina eu não lembro muito bem não, era o primeiro ano né,
eu era muito pequena né, mas ela era bem, um professora muito boa. Agora a Dona
Maria Zélia era mais, assim, ela já puxava mais, sentia que ela era Bem mais rígida,
uma professora muito boa.
Entrevistador: E depois com o Sr. Sebastião?
Entrevistado: Isso, o último ano foi com o professor Sebastião.
Entrevistador: E que horário você chegava na escola.
Entrevistado: Acho que era 8h.
Entrevistador: E a aula terminava que horário?
Entrevistado: Não to me lembrando, mais acho que era meio dia.
Entrevistador: E no outro período, o que você fazia?
Entrevistado: Ah, eu ficava em casa né, ajudava meu pai, as vezes a minha mãe no
serviço de casa e quando era maiorzinha eu ia até pra roça.
Entrevistador: Você lembra um período que você não pode ir na escola por que
tinha que ajudar seu pai na roça?
Entrevistado: Não, não teve, meu pai sempre deixou a gente estudar, só depois
quando a gente voltava da escola a gente ia ajudar ele, mas nunca ele falou hoje
você não pode ir, você tem que me ajudar no serviço não, ele sempre apoiou.
Entrevistador: E como que o professor dava aula, você tem uma memória
assim como que era a aula?
Entrevistado: Olha, eu lembro que ele passava o exercício tudo no quadro né, a
gente copiava no caderno e muitas vezes ele chamava aluno por aluno pra ir no
quadro fazer, resolver no quadro as continhas.
Entrevistador: E como que ele trabalhava com mais de uma série, como ele
dava conta de dar pro primeiro ano, pro segundo ano?
Entrevistado: Ele passava, as vezes o aluno da quarta série era maiorzinho, aí
aquele ajudava a passar no quadro as tarefas pra quarta série, ele dava conteúdo
pra criança e a criança ia lá e passava, sempre tinha uns assim, mais inteligentes,
aprendia mais né, então aí ele passava pro primeiro ano o exercício, pro segundo, aí
enquanto a gente copiava ele ia pras outras séries passar.
Entrevistador: E tinha mais que um quadro na sala?
Entrevistado: Tinha, um pra cada série.
Entrevistador: Como ele organizava ?
Entrevistado: Ele organizava assim, aí até que resolvia no caderno as matérias aí ele
ia acompanhando os outros alunos da outra série né, depois ele passava nos
cadernos corrigindo, mais ou menos assim.
Entrevistador: E vocês ajudavam uns aos outros?
Entrevistado: Ajudava, ajudava sim.
Entrevistador: Aquele que tinha mais dificuldade?
Entrevistado: Isso, ele pedia pra ajudar, aquele que conseguia resolver né, então
sempre tinha uns mais inteligente, que tinha mais facilidades de aprender né, então
aqueles eles ajudavam o professor também.
Entrevistador: E o professor, além dele fazer a parte educativa ele fazia uma
outra função, outra tarefa, sem ser a de professor?
Entrevistado: Olha, isso a respeito da merenda né, ele instruía, como eu mesmo
estava na quarta série, eu fazia muita, ajudava a fazer a merenda, a sopa, ele
instruía a gente, ele explicava tudo certinho.
Entrevistador: Mas você fazia a merenda em que horário?
153
Entrevistado: No final da, era dez horas, eu acho a hora da merenda né, então,
quando faltava um pouquinho pra, aí ele já pedia pras crianças ir lá preparar.
Entrevistador: Fazer sopa? Vocês que preparavam? Tinha um fogão?
Entrevistado: Tinha então agora eu to me lembrando, assim, a gente chegava um
pouquinho mais cedo e cada um de nós, ele pedia pra levar legumes, um levava
batatinha, outro levava mandioca, até eu lembro, eu levava muito cará, tinha muito
cará, eu gostava muito, eu levava cará. Aí a gente chegava lá um pouquinho mais
cedo, ele pedia pra gente ir mais cedo pra poder preparar, pra cascar, picar, quando
a gente era maiorzinha a gente já sabia fazer isso né, então a gente chegava e
deixava tudo picadinho, repolho, couve, sabe, fazia tudo num balde enorme.
Entrevistador: Tinha um balde de cozinhar lá na escola?
Entrevistado: Tinha lá na escola.
Entrevistador: E a água?
Entrevistado: Água de poço.
Entrevistador: Vocês mesmo que tiravam a água do poço?
Entrevistado: Eram os meninos, os maiores. Aí deixava tudo preparado, tudo
preparadinho dentro do balde aí quando faltava, tipo assim uma meia hora pra
merenda, talvez ele mesmo ia lá e acendia o fogo e ponhava cozinhar. Aí de vez em
quando um ia lá dar uma mexidinha (risos) Era muito gostoso. Era assim, mas
sempre teve a merenda, quando não era sopa era leite em pó.
Entrevistador: E vocês faziam também o leite?
Entrevistado: Fazia também, ele explicava né, orientava a gente.
Entrevistador: Para a sopa vocês traziam os legumes, tinha mais alguma coisa
na sopa?
Entrevistado: Tinha macarrão.
Entrevistador: E o macarrão, vinha de onde?
Entrevistado: Era, acho que a prefeitura que mandava o macarrão.
Entrevistador: E vocês viam quando a prefeitura trazia o macarrão
Entrevistado: Nunca cheguei a ver, não sei como e quando eles levavam a gente
não via chegar (risos) Eu acho talvez que era o professor, a gente nunca viu chegar
nem o leite em pó, macarrão, óleo.
Entrevistador: Tinha tudo lá?
Entrevistado: Tinha tudo, sal, só que eu não me lembro de ter visto chegar (risos).
Entrevistador: E além de vocês fazerem a merenda, quem fazia a limpeza da
sala?
Entrevistado: ah, a gente também fazia, final de semana, no sábado, a gente ia era
tudo assoalho né e tinha que ser lavado, aí o professor falava, oh, sábado vamos
escalar, cada vez era uma, tinha os alunos que no outro sábado era outros alunos,
era revezado.
Entrevistador: Tinha uma escala?
Entrevistado: É Tinha uma escala, a gente ia no sábado, lavava todinha a escola, os
maiores né, os meninos também.
Entrevistador: O professor que combinava?
Entrevistado: Combinava.
Entrevistador: O professor também ia?
Entrevistado: Também ia e a gente lavava toda a escola.
Entrevistador: Como era horário de recreio? O que vocês faziam além de
comer a merenda?
154
Entrevistado: Ah a gente brincava, a gente brincava de amarelinha, os meninos
brincavam de bola queimada. Até meu irmão sofreu um acidente de jogar betz, esse
negócio é perigoso né. E
Entrevistador: Lá na escola?
Entrevistado: Lá na escolas mesmo, o menino foi erguer assim a betz pra bater na
bola e ele estava atrás e pegou na cabeça e cortou.
Entrevistador: E o que o professor fez?
Entrevistado: Ah, ele olhou.
Entrevistador: E o professor no momento do recreio ele ficava
supervisionando vocês?
Entrevistado: Ele ficava dentro da escola fazendo outra atividade, ele ficava dentro
da escola ele nunca ficava lá junto.
Entrevistador: E a escola, era cercada?
Entrevistado: Cercada
Entrevistador: E vocês permaneciam no local cercado?
Entrevistado: Olha que eu me lembre na hora do intervalo a gente dava uma
escapadinha. Tinha um sitio que tinha muito poncã, muita fruta, era pertinho, então a
gente ia lá pedia umas frutas (risos).
Entrevistador: Você lembra mais ou menos quantos alunos que estudavam ali?
Entrevistado: Não era muito não, eu acho que uns vinte alunos, uns vinte alunos se
tivesse.
Entrevistador: Sueli, como que era o material didático que vocês usavam?
Você tem memória de como era? Quem comprava?
Entrevistado: Alguma coisa só, pouca coisa, meu pai que comprava a cartilha,
caderno, lápis, giz de cera, aquelas coisas pra fazer os desenhos né, e a gente
levava também, o professor pedia pra gente levar milho, levava bastante milho numa
caixinha de fósforo, quando a gente tava na primeira série, pra gente aprender
contar (risos)
Entrevistador: Era material de contagem?
Entrevistado: É, a Maria Zélia eles pediam para gente levar feijão, semente de
pepino, várias coisas pra plantar La.
Entrevistador: Plantar ali na escola?
Entrevistado: É, no espacinho lá.
Entrevistador: Para quê?
Entrevistado: Ah, era tipo de um trabalho sabe, ele explicava sobre a germinação da
semente, como germinava. Não era pra usar daquela verdura, era pras crianças
aprender como germinava as sementes de feijão, a semente de arroz, então cada
aluno levava um tipo de semente.
Entrevistador: E vocês observavam?
Entrevistado: Oh, mas era muito interessante, a gente todo dia ia lá jogar água nela
e esperar ela brotar (risos)
Entrevistador: Com a supervisão do professor?
Entrevistado: Sempre, ele plantava num saquinho assim né.
Entrevistador: E ficava dentro do pátio?
Entrevistado: Isso, lá fora num cantinho do pátio.
Entrevistador: Aí todo dia vocês iam lá ver?
Entrevistado: Ia todo dia regar, jogar água e observar ela.
Entrevistador: E vocês faziam algumas anotações dessas observações?
Entrevistado: Não, não anotava não.
Entrevistador: Vocês tinham visitas de outras pessoas lá na escola?
155
Entrevistado: Olha, tinha a diretora, só a diretora. Ah, tinha também o pessoal da
vacina. Isso eu não esqueço menina, eu tinha um medo da vacina. Ah, ia também
um fotografo, ia de vez em quando tirar foto. Só que eu, justo no dia que ele foi eu
faltei (risos). O meu irmão tem foto na escola, aí ele chegou em casa e falou, olha,
você não sabe o que você perdeu, foi um fotografo tirar foto de nós tudo lá, falei aí
meu Deus, fiquei super triste (risos), por que naquele tempo era difícil tirar foto.
Entrevistador: Me conta um pouquinho Sueli, você tem memória de como era a
escola, da estrutura física da escola?
Entrevistado: Era de madeira, de assoalho e tinha uma área bem grande pro lado de
fora, uma varanda eu pegava toda a frente da escola, tinha janelas que tinha vitro
mesmo, de vidro, vidraça e tinha um porão muito grande embaixo daquela varanda,
no meu tempo não, antes as crianças falavam que o professor colocava de castigo,
mas eu acho que era brincadeira, por que quase cabia uma criança de pé, escuro lá,
mas nunca ponhou, no tempo que eu estudei não. Era as crianças que... Era
brincadeira (risos). Era pintadinha, bem conservada.
Entrevistador: E como era viver nesse espaço escolar?
Entrevistado: Olha, era gostoso, era. Só que não tinha muito conforto, por que a,
banheiro mesmo não tinha, era privada, longe da escola, quando dava temporal,
chuva de vento, molhava bastante dentro. Tinha goteira, a gente morria de medo.
Quando data temporal aquilo parecia que balançava tudo né, era uma sala grande,
enorme né, então, tinha bastante medo.
Entrevistador: Você costumava faltar nas aulas?
Entrevistado: Olha, de vez em quando eu faltava, as vezes eu estava sentindo uma
dorzinha na barriga assim, eu já não ia, falava pra mãe, hoje eu não to bem, eu não
ia pra escola (risos).
Entrevistador: Mas você gostava de ir na escola?
Entrevistado: Gostava, gostava sim, até depois eu continuei indo com a minha irmã
né, por que ela não queria estudar, eu já tinha concluído a quarta série aí não tinha
necessidade de eu ir né, aí fui mais um ano com ela, pra ela poder seguir, Mas
mesmo assim ela não conseguiu, ela não terminou a quarta série, até o professor
Sebastião foi na nossa casa conversou com ela, fez o impossível mesmo mas ela
não, mas aí o que acontece, depois eu fiquei dando aula pra ela em casa. Eu fui
professora da minha irmã. Ela aprendeu tudo o que eu aprendi, eu passei tudo pra
ela e te a letra dela é mais bonita que a minha (risos)
Entrevistador: E a relação de vocês alunos, como era?
Entrevistado: Olha, lá na escola a gente se dava muito bem, que a gente tinha muito
respeito ao professor, mas no caminho tinha muitas brigas, eu mesmo sofria muito
violência verbal, tinha as maiores, as repetentes, era mocinha já né e eu como
nunca fui repetente, sempre fui menos, então as vezes eu levava um lanchinho que
sempre minha mãe preparava um lanche, mesmo que tinha sopa e elas queria, elas
tomavam o lanche no caminho.
Entrevistador: E você não falava nada?
Entrevistado: Tinha medo, elas são grande, era grande, até um dia meu irmão, pra
me defender, ele até agrediu umas das meninas indo pra escola, por que elas
queriam por eu queriam pegar meu lanche de toda forma e elas não levavam nada
sabe. Então era assim.
Entrevistador: Era difícil o acesso até a escola?
Entrevistado: Era, era difícil, não era estrada, a gente ia por trilhos, passava no meio
de pasto, no meio de grama. Na época de frio mesmo, a grama molhada muito
orvalho, bem difícil.
156
Entrevistador: Sempre a pé e em grupo?
Entrevistado: Sempre em grupinho, a gente passava na casa das pessoas e os
alunos iam juntos.
Entrevistador: No período que você estudou a professora Zélia morava onde?
Entrevistado: Morava lá no sítio.
Entrevistador: Sueli, como era o relacionamento entre vocês e o professor(a)?
Entrevistado: Olha, era bom, por que a gente tinha bastante respeito pelo professor,
as vezes a gente levantava um pouquinho na sala pra conversar mas era coisa do
estudo mesmo né, então eu mesmo tinha muito receio, eu tinha muito receio do
professor, respeitava mesmo.
Entrevistador: Seus pais falavam alguma coisa em relação a isso, a questão do
respeito pelo professor?
Entrevistado: Não, não falava pro que a gente já, naquele tempo a gente tinha um
respeito tão grande até pelos próprios pais né, Até o jeito dos Pais olhar pra gente a
gente já sabia. Mas tinha umas crianças que não tinham muito respeito pelo
professor não. Era uns meninos que era mais levadinho, agora eu as vezes
atrapalhou um pouco a gente aprender por esse medo que eu tinha do professor,
por que tinha muitas continhas mesmo, em matemática eu era bem difícil de eu
aprender, as continhas de emprestar número, subtrair eu não conseguia aprender,
eu fui aprender depois que eu sai da escola. Aí caiu ficha (risos) Aí eu aprendi, ai
assimilei, como que era fazer aquelas continhas, mas antes eu não tinha coragem
de chegar ao professor e pedir uma orientação certa né, eu tinha muito receio.
Entrevistador: E quando chovia?
Entrevistado: Ah, a gente faltava, por que era muito longe e os pais não tinham carro
pra levar né, as vezes a estrada também, no caminho não dava pra passar com
carro tinha que dar volta bem longe, a gente faltava.
Entrevistador: E os seus pais, participavam das atividades que tinha na escola.
O professor chamava pra conversar?
Entrevistado: Reunião você fala né, muito pouco não tinha quase reunião, era
poucos alunos né, as crianças eram Bem mais calma aquele tempo.
Entrevistador: E tinha ajuda dos pais em casa?
Entrevistado: Sim, tinha dos irmos mais velhos, por que meus pais praticamente eles
não estudaram, minha mãe mesmo, ela praticamente aprendeu o nome e só, então
os irmãos mais velhos é que davam uma ajuda pra gente.
Entrevistador: Você lembra de alguma avaliação que você fez neste período?
Entrevistado: Fazia, era uma folha grampeada, umas três folhas, papel sulfite e ele
já trazia pronto as perguntas, na escola não tinha nada pra imprimir aquelas coisas
né, ele já trazia pronto, só pra gente responder tudo.
Entrevistador: Você lembra alguma vez de vir uma equipe do departamento da
inspetoria aplicar prova pra vocês
Entrevistado: No final do ano era, falava aquela época de exame. Nossa, dia de
exame era muito, a mãe preparava marmita com almoço com frango, era uma
comida assim, forte, ela preparava por que a gente ia fazer um exame que era prova
do final do ano né. Então aí vinha diretora, vinha mais alguém, mas não to lembrada
quem era, mas vinha, até aquele dia era muito importante, a gente ficava super
preocupada naquele dia, era final do ano, então era prova final né. Era o exame.
Entrevistador: Mas qual era a preocupação de vocês Sueli?
Entrevistado: Medo de não passar né, ficar repetente, morria de medo, por que esse
dia era muito importante.
157
Entrevistador: Além desse exame final o professor aplicava também outras
provas bimestrais?
Entrevistado: Ah sim, tinha prova também, tudo prontinha, cada série só entregava e
no final passava recolhendo.
Entrevistador: Sueli, o que ficou em sua memória sobre sua experiência de
estudar lá na escola rural Água Astorga?
Entrevistado: Olha, ficou assim, que a gente, era um período muito gostoso né, a
gente tinha as amizades né, os pais da gente era mais jovens, os irmãos, era tudo
unido né, agora a minha mãe faleceu, todo mundo casou. Ah, então, no sábado
também tinha catequese.
Entrevistador: Quem dava catequese?
Entrevistado: Era o professor mesmo, não era todo sábado não.
Entrevistador: Você teve formatura da quarta série?
Entrevistado: Acho que não teve não, por que nem foto eu tenho, os meus irmãos
mais velhos tem foto e eu não. Então eu acho que não teve não.
Entrevistador: Eu agradeço pela sua entrevista estar colaborando para compor
a educação rural de Astorga, pela sua disponibilidade.
Entrevistado: Ah, o que eu consegui lembrar né, por que muitas coisas a gente nem
lembra né.
Entrevistador: Muito obrigado.
158
APÊNDICE F
Transcrição da entrevista com a Inspetora Maria José Lopes.
Hoje é dia 19 de dezembro e nós estamos aqui fazendo uma entrevista com a
professora Maria José Lopes.
Entrevistador: Boa tarde d. Maria José?
Entrevistado: Boa tarde
Entrevistador: D. Maria José nós sabemos que a Srª foi inspetora de ensino
das escolas rurais do município de Astorga, quando que a srº começou nessa
função e quanto tempo ficou?
Entrevistado: Olha eu comecei em 1970 e fiquei até 1983.
Entrevistador: Como inspetora e antes disso?
Entrevistado: Antes disso eu trabalhei como secretária do Adolpho durante muitos
anos né, eu trabalhei no Stela Maris, como secretária, voltei para o Adolpho e fui
convidada para inspetora auxiliar, ai fui para a inspetoria regional.
Entrevistador: E quem era inspetora nessa época?
Entrevistado: Inspetor regional era o Sr. Paulo Camargo Arruda Brasil, e ai a d.
Tutica, Maria Aparecida de Pozzo, era inspetora de tudo, que eles falavam do ensino
primário, né, do 1º grau, tinha a Ziza da merenda escolar e eu como inspetora
auxiliar.
Entrevistador: E D. Maria José a gente sabe que a educação escolar de
Astorga ela se expandiu, teve um grande crescimento do município na década
de 60, porque houveram muitas criações de escolas nessa década, a Srª sabe
me dizer, a Srª tem memória de como foi essa expansão?
Entrevistado: è o que te falei isso acho que foi o aumento da população, do sítio,
veio muita gente de fora pra Astorga, principalmente pra Astorga né, então foi isso
que foi né, os fazendeiros foi assim, eles pediam escola porque as vezes era longe
pra uma criança transportar de um lugar para outro, então eles solicitavam pra
prefeitura e era construída ali a escola.
Entrevistador: E eles cediam o terreno?
Entrevistado: Eles cediam o terreno e a prefeitura construía a escola. E ali fundava a
associação de pais e professores e expandiam, e ajudavam bastante a escola, com
a associação deles né.
Entrevistador: E no período que a srª trabalhou como inspetora quem era
responsável pela educação das escolas rurais?
Entrevistado: Eu era responsável pelas escolas rurais e tinha as auxiliares, né, tinha
da merenda escolar, tinha orientadora, e tinha secretária né, que ajudou bastante
nessa parte ai da, elas faziam assim apostila distribuía para as escolas rurais, elas
aplicavam provas nas escolas, e a gente visitava, todo mês eu e as meninas faziam
visitas nas escolas rurais, todo mês a gente visitava a escola.
Entrevistador: E em relação a competência das escolas rurais, estadual ou
municipal, quem era responsável?
Entrevistado: Mais como você fala
Entrevistador: É quem que mantinha as escolas?
Entrevistado: Pois é eu to falando é isso, a prefeitura e o estado. O estado tinha
cinco escolas estaduais, era 36 escolas e 31 era municipal, e a prefeitura mantinham
as escolas municipais e o estado as estaduais, merenda e a associação também
fazia assim, elas faziam promoções, né, comprava muitas coisas pra escola
também.
159
Entrevistador: A própria comunidade?
Entrevistado: A própria comunidade, tinha aquela feira, agrícola que a gente fazia na
cidade, e os produtos agrícolas era em benéfico das escolas,
Entrevistador: Essa ajuda que vocês recebiam tanto do estado quanto do
município a srª sabe me dizer como era enviada, como vocês recebiam, vocês
recebiam em dinheiro, vocês recebiam em materiais?
Entrevisto: Não recebia material também, material de limpeza, a merenda e esse ,
tinha o pró município, eles davam uma verba muito grande pro município, então era
comprado em material, comprado móveis, tinha uma pessoa responsável por essa
parte que era a Lucinéia Xavier Lopes, que ela era responsável por essa parte do
pró-município. O dinheiro vinha direto pra prefeitura a gente fazia as compras e a
prefeitura que fazia toda a contabilidade, o dinheiro vinha direto para a prefeitura.
Entrevistador: E o estado como que funcionava?
Entrevistado: Era a mesma coisa também, o que dava para o município dava
também para a do Estado.
Entrevistador: Sempre em forma de dinheiro, a srª nunca precisou até Curitiba
buscar material?
Entrevistado: Não a gente ia buscar de caminhão, já trazia o material direto de lá,
trazia sabão em pó, detergente, era mais material de limpeza né.
Entrevistador: E material didático?
Entrevistado: Material didático eles davam também, caderno que era distribuído, a
prefeitura também dava caderno pra distribuir,
Entrevistador: Onde e como era feito o pagamento dos professores
municipais?
Entrevistado: Era da prefeitura, eles recebiam através de Cheque, tinha a folha de
pagamento, eles recebiam e do estado já vinha pela coletoria, vinha direto pela
coletoria estadual, dos professores estaduais, né dos professores estaduais. Vinha
direto da coletoria e os professores recebiam La.
Entrevistador: E qual era o papel da inspetoria de ensino no município de
Astorga?
Entrevistado: Era assim, era como se diz, a gente, como que eu falo, orientava tudo
né, quer dizer que aquelas meninas é tudo na responsabilidade da gente, que cada
um tinha sua função, orientadora, secretária, né cada um tinha sua função dentro da
inspetoria. E elas forneciam as apostilas para os professores, né,
Entrevistador: Elas produziam as apostilas?
Entrevistado: As apostilas para as professoras, todo mês aquelas apostilas, no fim
do mês as provas era feita aqui, na inspetoria, rodava no mimiógrafo e eram
encaminhados para as escolas.
Entrevistador: E como era a relação das escolas com a inspetoria, as escolas
seguiam as normas, era difícil?
Entrevistado: Não, era muito fácil de elas seguir as normas, depois entrou aquele
projeto também que a Noirma cuidava, que elas foram se especializando, né e quem
fazia o projeto recebia como 2º grau, igual que era o normal daquele tempo que era
para regularizar e dar esse conhecimento para os professores, todos eles fizeram
esse projeto Logos II.
Entrevistador: Como a prefeitura não pagava os professores estaduais como
que era a relação de trabalho com esses professores que não eram
municipais?
Entrevistado: Era a mesma coisa, tudo junto nas reuniões mensais era junto, tudo
que fazia era junto com as municipais. E a prefeitura assumia se precisasse de
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alguma coisa das estaduais, era a mesma coisa da municipal, a gente dava também
se ganhasse uma todas elas.
Entrevistador: D. Maria José a srª lembra como era definido o local onde seria
construída uma escola?
Entrevistado: Lembro sim, assim pessoas que vinham geralmente pedir, eles eram,
tinham o lugar reservado pra essa construção, né, mais perto das fazendas, perto
das casas para não ficar muito isolado,
Entrevistador: Como era decidida a planta da escola?
Entrevistado: isso é ficava por conta da prefeitura né. Tinham um padrão que todas
as escolas eram um padrão só. Todas possuíam uma sala, com mitório La fora. A
prefeitura que construía sempre um padrão só.
Entrevistador: Então as escolas elas eram semelhantes?
Entrevistado: Eram.
Entrevistador: Tinha alguma escola que a srª recorda que tinha mais que uma
sala?
Entrevistado: Tinha, tinha sim a escola da granada que tinham duas salas, deixa eu
ver qual que era a outra, Paranaguá, tinham duas salas.
Entrevistador: E como era feita a manutenção da escolas rurais?
Entrevistado: Era tudo a prefeitura que fazia tudo esse trabalho, mesmo nas escolas
estaduais a prefeitura que assumia o trabalho
Entrevistador: A Srª tem memória d. Maria José de algum curso, de cursos
ofertados pela inspetoria ofertados para os professores?
Entrevistado: Ah tem, sempre tinha esses cursos, tinha, às vezes vinha da Telepar,
esse curso, daqui mesmo tinha as orientadoras que às vezes dava bastante
orientação, principalmente nas reuniões né,
Entrevistador: E como a Inspetoria ela cuidava ela acompanhava o trabalho do
professor, por que nas escolas rurais elas eram distantes da cidade, e como
vocês faziam esse acompanhamento?
Entrevistado: A gente ia muito nas escolas, frequentava muito, as vezes eu ia, as
orientadoras, e tinham as pessoas igual eu falei pra você a associação, ali os pais
cuidavam das escolas, se o professor faltava muito ele ia comunicar, né, o
presidente ou outra pessoa, então era assim, a gente sempre estava nas escolas,
mas nunca teve problema de professor faltar muito tempo, só quando faltava eles
avisavam né, por motivo de doença,
Entrevistador: E quais eram as exigências da época para trabalhar como
professor nas escolas rurais de Astorga?
Entrevistado: Ah não tinha exigência porque a gente pegava, assim porque as vezes
não tinha como a gente levar gente daqui pra lá porque era muito longe, então a
gente pegava aquelas pessoas com mais instrução dali mesmo, ai a gente tinha
teste todo ano, fazia teste de, uma avaliação, principalmente os professores novos,
tinha um concurso fazia os testes.
Entrevistador: Eles eram selecionados a partir de um concurso?
Entrevistado: É um concurso, aqueles que tiravam os primeiros lugares pegavam as
escolas melhores, mais na beira de estrada né, e geralmente a gente pegava a
pessoa do local, porque igual a Serrinha era uma escola que não tinha jeito, so tinha
o Arlindo ali, e tinha que ser ele mesmo.
Entrevistador: D. Maria José, no decorrer do caminho da educação de Astorga,
nesse período que a Srª ficou principalmente, mudaram as leis educacionais,
então nós tivemos a lei 4024/1961, tivemos a 71 e nós estamos hoje na 9394/96.
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Essas mudanças de leis, o que influenciou o trabalho da inspetoria com o
trabalho pedagógico das escolas?
Entrevistado: Ah eu acho que a gente seguiu sempre a linha que deu muito certo,
porque sempre foi a gente começou com as orientadoras que seguiam basicamente
o que era determinado para as escolas estaduais, tinha os planos que a gente
seguia direitinho
Entrevistador: D. Maria José no período de 1960 a 1980, a Sr tem alguma
memória das matrículas, como eram realizadas as matrículas?
Entrevistado: Eram as professoras mesmo quem fazia as matrículas, na escola, a
gente anunciava no rádio, ia lá avisava. Porque assim o prof. Antes de começar ele
ia pra escola, fazia tudo ele quem limpava, porque não tinha servente, prof lavava,
limpava a escola, fazia a merenda, tudo era ele, então eles iam antes já limpava e já
avisava o dia de matrículas, e tinha escola que tinha as vezes dois professores,
outros que dava para as quatro series seriadas, as 4 series, 1º 2º 3º 4º.
Entrevistador: D, Maria José a srª tem mais alguma coisa pra dizer sobre as
escolas rurais, sobre o trabalho que a srª desenvolveu em um longo período,
quais foram as dificuldades, quais foram as facilidades, o que ganhou, o que a
educação ganhou nesse período?
Entrevistado: Ah minha filha, tem coisas assim boas e ruins, teve coisa difícil, por
exemplo, para ir nas escolas dia de chuva, era difícil, a gente tinha que ir de jipão,
porque a Kombi não descia, mas não teve muita dificuldade.a gente trabalhou com
uma turma muito boa, uma equipe, a prefeitura ajudava muito né.
Entrevistador: Eu agradeço a participação da srª, para reconstruir a história da
educação de Astorga.
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Dissertação - Programa de Pós-Graduação em Educação