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Davi x Golias: os admiráveis pecuaristas irlandeses
Confesso que, nos últimos dias, perdi algumas preciosas horas de trabalho e de
laser maldizendo a pecuária e os pecuaristas irlandeses. E veja bem, de forma
alguma eximo de culpa, nesse episódio do embargo europeu, o governo e a
cadeia produtiva da carne bovina do Brasil. Prometemos o que não podíamos
e/ou não tínhamos vontade de cumprir, e falhamos em negociar condições mais
favoráveis à nossa realidade produtiva. Isso não dá para negar.
Mas que os irlandeses souberam aproveitar a confusão para encontrar “cabelo
em ovo”, isso eles souberam. Os problemas brasileiros, no que diz respeito à
rastreabilidade (principalmente) e à sanidade animal, foram escancarados e
maximizados ao extremo. Já as nossas vantagens, ou nossos pontos fortes,
foram totalmente esquecidos. Pode- se dizer que foram ignorados por completo.
A Comissão Européia toma as suas decisões com base, principalmente, nos
pareces técnicos das missões que, regularmente, vêm em missão ao Brasil. Mas
é óbvio que o lobby dos pecuaristas europeus, notadamente o dos irlandeses,
exerce significativa influência no processo.
Têm muita força esses irlandeses, muita mesmo. Mas o que é a pecuária
irlandesa perto da brasileira? Um cisco! Veja na tabela 1.
Tabela 1.
Pecuária brasileira x pecuária irlandesa – 2006.
Quesito
Rebanho bovino – mi cabeças
Abate anual – mi cabeças
Produção de carne bovina – mi
tec
Área de pastagem – mi ha
Brasil
Irlanda
Brasil / Irlanda
203,43
6,88
2.857%
47,25
1,77
2.569%
10,42
0,57
176,45
3,01
1.728%
5.762%
Fonte: FAO / Conab / Scot Consultoria
No Brasil, são mais de 2,5 milhões de pecuaristas. Na Irlanda, de 5,8 milhões de
habitantes, quantos serão os pecuaristas? No Brasil, que abate mais de 45
milhões de cabeças bovinas por ano, o PIB do agronegócio pecuário, de acordo
com o Cepea – Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, da
Universidade de São Paulo, é de R$152 bilhões. Na Irlanda, que abate apenas
1,77 milhões de cabeças bovinas ao ano, qual será o volume de riqueza gerado
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pela pecuária? Qual será a representatividade dessa atividade quando se
considera o PIB da UE?
Pense nisso e me responda. Quem deveria ter mais força, mais “peso político”,
mais espaço na mídia: os pecuaristas brasileiros ou os irlandeses? Agora,
responda essa: quem de fato tem?
Os pecuaristas brasileiros são muito mais eficientes, muito mais competitivos.
Sem apoio algum, sem subsídios, produzem com menos da metade do custo
europeu. No Brasil nunca houve vaca louca, ao contrário da Europa e dos Estados
Unidos. Os produtores brasileiros não usam hormônios, ao contrário de
argentinos e americanos. Os índices de vacinação contra febre aftosa, na maior
parte do Brasil, se aproximam de 100%.
No que diz respeito à produtividade, entre 2001 e 2006, enquanto as áreas de
pastagem do Brasil encolheram 2%, o rebanho bovino cresceu 15%, a produção
de carne bovina 53% e as exportações 181%. Lógico que a abertura de novos
mercados e a modernização do parque frigorífico contribuíram para que o País
se tornasse o maior exportador de carne bovina do planeta, tanto em volume
quanto em faturamento. Mas isso não seria possível se o pecuarista brasileiro,
com ou sem crise, não tivesse investido pesado no negócio, “entupindo” o Velho
Continente de carne vermelha barata, e de boa qualidade.
Fantástico tudo isso, não? Mas ainda assim, perante os olhos de boa parte do
mundo (principalmente da Europa), quem é melhor? O pecuarista brasileiro ou o
irlandês? O fato é que, enquanto os inexpressivos e ineficientes produtores
irlandeses batem, os gigantescos e competitivos produtores brasileiros
apanham. Não tem algo errado aí?
Os pecuaristas brasileiros, dentro e fora do País, têm sido taxados de
ineficientes, antiquados, escravocratas, destruidores da natureza, etc. Dê uma
lida nos principais jornais e revistas da última semana, para entender o que eu
estou querendo dizer. Já os irlandeses estão ganhando fama de defensores da
saúde pública e da responsabilidade sócio ambiental.
Alguém já viu uma campanha em defesa da carne brasileira ou do pecuarista
brasileiro? Esqueçam os veículos de mídia especializados. Pregar para
agropecuaristas que a pecuária não é a causa do aquecimento global, que a
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carne bovina faz bem à saúde e que o produto brasileiro é de boa qualidade é a
mesma coisa que pregar o evangelho num convento. Qual o efeito prático?
Quero dizer o seguinte. A pecuária brasileira gira em torno do seu mundinho
próprio, enquanto seus inimigos buscam a massa. Os pecuaristas irlandeses não
ficam falando mal da carne brasileira apenas em dias de campo, revistas e sites
de pecuária. Eles se esforçam para “cutucar” o governo e os consumidores. Suas
campanhas ganharam o mundo através de jornais, revistas, TV e internet.
Alguém já viu uma entidade de classe, que represente os interesses dos
pecuaristas brasileiros, ser consultada antes da criação ou alteração de alguma
lei que, de alguma forma, interfira no andamento da atividade? Algo relacionado
ao desmatamento, a impostos ou ao controle de trânsito animal, por exemplo?
Já os irlandeses estão sempre a par de tudo. A Comissão Européia, por exemplo,
além de ouvi- los sempre, presta conta a eles sobre tudo que faz. É
impressionante!
Pensando nisso tudo é que passei a admirar os tais pecuaristas irlandeses. Eles
podem ser economicamente pouco representativos e bastante ineficientes do
ponto de vista produtivo. Mas ao invés de serem expulsos do mercado, trataram
de derrubar seu principal adversário. Agora, colhem os louros da vitória, como
ilustra a figura 1.
Figura 1.
Boi gordo na Irlanda em euros por quilo de carcaça.
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3,25
3,26
3,24
3,22
3,19
3,20
3,18
3,16
3,14
3,14
12/1/2008
19/1/2008
3,14
3,12
3,10
3,08
3,08
3,06
5/1/2008
26/1/2008
2/2/2008
Fonte: Farmes Journal
Tamanho, definitivamente, não é documento. Está provado que pequenos
grupos, bem articulados, podem mais do que grandes forças mal organizadas.
Essa é a grande lição que vem da Irlanda. Tenhamos, pelo menos, a humildade
de aprender com ela.
Cordialmente,
Fabiano R. Tito Rosa
zootecnista
Scot Consultoria
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Davi x Golias - Associação Brasileira de Angus