PÚBLICO, QUI 16 MAI 2013 | 47
Quando a adopção
é um duplo trauma
Debate Adopção de crianças
por casais do mesmo sexo
Abel Matos Santos
1.
Iniciativas legislativas para que
se aprove a adopção por pares
homossexuais são erróneas e
imprudentes porque desprezam
os direitos das crianças e
ignoram importantes estudos
e pesquisas da área psicológica
e social no que diz respeito às
necessidades daquelas.
2. Cada criança precisa de um
pai e de uma mãe. Quando se altera o curso
natural da vida, é determinante o superior
interesse da criança. Os estudos em Ciências
Sociais têm repetidamente demonstrado a
importância vital de ambos os progenitores,
o pai e a mãe, para um ambiente saudável e
positivo no desenvolvimento da criança e os
riscos que correm se criados sem um deles. A
mãe e o pai trazem contribuições únicas que
são essenciais para a sua saúde e bem-estar.
3. Crianças que foram privadas, por
exemplo, do cuidado materno durante
longos períodos de tempo na fase precoce
das suas vidas, revelaram em geral menor
capacidade de sentir e de se emocionarem,
tendem a criar relações superficiais, a
mostrar tendências antissociais e são mais
hostis ao longo do seu crescimento.
4. Os pais têm talentos específicos. São
bons a disciplinar, a brincar e a levar as
crianças a enfrentar desafios. São modelos
a seguir para as crianças. A sua presença
em casa protege a criança do medo e
fortalece a capacidade da criança para se
sentir segura. A vasta investigação cientifica
sobre os graves problemas psíquicos,
académicos e sociais nos jovens criados em
famílias sem um dos pais demonstraram a
importância da sua presença em casa para
um desenvolvimento saudável.
5. Os direitos e as necessidades da criança
a uma mãe e a um pai devem ser protegidos
pelo Estado. Os adultos não têm o direito de
deliberadamente privar uma criança de um
pai e de uma mãe.
6. Um estudo australiano (Children in
Three Contexts) feito com crianças a viver
com casais heterossexuais casados, com
casais heterossexuais em união de facto e
com pares homossexuais revelou que os
primeiros forneciam o melhor ambiente
para um desenvolvimento social da criança
e para a sua educação, os casais em união
de facto eram os segundos e os pares
homossexuais aparecem em último.
7. Existem académicos e activistas que se
opõem a esta evidência, apoiando-se em
estudos malfeitos e metodologicamente
enviesados. Dois estudos de 2010
são frequentemente citados porque
defendem que as crianças que foram
deliberadamente privadas dos benefícios
da complementaridade na família com
pai e mãe não sofrem danos psicológicos.
Contudo, os dados recolhidos são autoinformações dadas pela mãe ou pai,
estando estas a par da agenda política do
investigador. O que distorce os resultados.
8. Muita da investigação feita com
pares homossexuais tem graves falhas
metodológicas. É muitas vezes dito que
não existe evidência de que as crianças são
prejudicadas e agredidas emocionalmente
se forem criadas por pares homossexuais.
Mas a ausência de evidência não prova
que não exista. Quer apenas dizer que não
existe evidência.
9. As crianças têm o direito e a necessidade
à parentalidade conjunta por um pai e
uma mãe. De acordo com um dos maiores
psiquiatras americanos (Fitzgibbons), as
relações homossexuais não fornecem o
ambiente ideal para
que se possam criar
e educar crianças,
por várias razões:
primeiro, os pares
homossexuais
tendem a ser mais
promíscuos. Um dos
mais abrangentes
estudos com pares
homossexuais (The
Male Couple), revelou
que apenas 7 de 156
pares homossexuais
tinham um
relacionamento
sexual
exclusivamente
monogâmico. A
maioria destas
relações duraram
menos de cinco
anos. Segundo,
as uniões são
muito frágeis. A
probabilidade de
quebra da relação é
elevada nos pares de
lésbicas. No estudo
de 2010 (US National
Longitudinal Lesbian
Family Study) 40%
dos pares que
tiveram um filho (por
inseminação artificial) tinham-se separado.
10. Privar deliberadamente uma criança
da possibilidade de ter um pai e uma mãe
magoa e faz mal à criança. As crianças
adoptadas, em geral, vivenciam traumas
de abandono precoce, na fase inicial das
suas vidas e devem ser protegidas de um
trauma adicional como seria esta cruel
experiência social.
Estarão os direitos dos homossexuais
acima das necessidades e direitos da
criança a uma mãe e a um pai? Quem
protege estas crianças?
Privar deliberadamente
uma criança da
possibilidade
de ter um pai
e uma mãe
magoa e faz
mal à criança.
Estarão os
direitos dos
homossexuais
acima das
necessidades
e direitos da
criança?
Psicólogo clínico e sexologista
“Filhos das fufas”?
Debate Adopção de crianças
por casais do mesmo sexo
Paulo Côrte-Real
A
o longo dos últimos anos, a
ILGA Portugal tem tentado
chamar a atenção para a
situação de famílias com
crianças criadas por casais
do mesmo sexo, casados ou
unidos de facto. Sobretudo
casais de mulheres, porque
o recurso à inseminação
artificial, ainda que
limitado em Portugal, existe para todas
as mulheres na maior parte dos países
civilizados — e, aliás, bem aqui ao lado, em
Espanha, desde 1988.
Na ação popular que interpusemos
contra o Estado português para garantir a
segurança e o bem-estar destas famílias,
apresentamos apenas 10 exemplos — que
incluem também situações com casais
de homens, porque existe, por exemplo,
adoção singular em Portugal e um homem
gay ou uma mulher lésbica já podem,
portanto, adotar e passar depois a viver
também em casal. Mas as famílias são
muitas mais.
Famílias em que as crianças só vêem
reconhecida na lei uma figura parental,
embora conheçam duas — e saibam muito
bem quem são as suas mães ou os seus
pais. Famílias em que uma das mães ou
um dos pais pura e simplesmente não
existe legalmente, nem na escola, nem no
hospital, nem para a assistência à família,
nem em caso de separação ou divórcio,
nem em caso de morte da única figura
legalmente reconhecida.
Superior interesse de crianças? Era o
que devíamos assegurar, sim. E o interesse
destas crianças é obviamente a segurança
e proteção que as demais já têm. Pois é
isso que o Estado português lhes nega,
com base no preconceito, na ignorância
— e na displicência e negligência com
que se trata as famílias de pessoas que,
como aprendemos diariamente com base
na prevalência do insulto quotidiano,
são, afinal, um bocadinho menos do que
pessoas. No fundo, o Estado ainda nos diz
— e diz às nossas crianças — que as nossas
crianças não interessam porque não são
bem filhas de pessoas: afinal são só filhas
de “fufas” ou de “paneleiros”.
Qualquer discriminação implica um
juízo de desvalor, qualquer discriminação
tem subjacente o insulto. Mas nunca
uma agressão foi tão violenta quanto
aquela que, pela vontade de menorizar
e de discriminar, incide sobre as nossas
crianças.
É isso que será combatido ou reiterado
no nosso Parlamento, no dia 17 de maio,
Dia Mundial de Luta Contra a Homofobia
e Transfobia.
No passado recente, o Parlamento
rejeitou a possibilidade de candidatura
à adoção por casais do mesmo sexo,
que voltará a ser discutida. E bastaria a
leitura do livro Famílias no Plural, que
editámos recentemente e que conta
com contributos de personalidades de
renome em diversos campos do saber
a nível nacional e internacional, para
compreender que a manutenção dessa
discriminação se baseia exclusivamente
no preconceito.
Mas, para além dessa questão, discutese ainda desta vez, e pela primeira vez,
a proteção das nossas crianças com a
possibilidade de coadoção nas famílias
que já existem.
O Tribunal Europeu de Direitos
Humanos condenou este ano a Áustria
precisamente
por não estender
aos casais do
mesmo sexo a
possibilidade de
coadoção (ou seja,
de reconhecimento
legal da segunda
figura parental) que
existe para casais
de sexo diferente.
O mesmo tribunal
aponta Portugal
como um exemplo
da mesma violação
da Convenção
Europeia de
Direitos Humanos,
a par da Roménia,
Rússia e Ucrânia.
Qualquer
pessoa que olhe
responsavelmente
para esta questão
e para a realidade
das crianças
criadas por casais
do mesmo sexo
compreende que
fazer incidir a
discriminação
sobre as nossas
crianças é
absolutamente
inaceitável. Temos, portanto, como o
TEDH veio clarificar, a obrigação de
garantir a todas as crianças a mesma
proteção, independentemente dos
preconceitos ou até de divergências
ideológicas. O dia de amanhã será,
por isso, um dia em que também se
escreve uma página da história dos
Direitos Humanos em Portugal — e
que só se pode escrever com a palavra
“responsabilidade”.
Qualquer
discriminação
tem subjacente
o insulto. Mas
nunca uma
agressão foi
tão violenta
quanto aquela
que, pela
vontade de
menorizar e de
discriminar,
incide sobre
as nossas
crianças
Presidente da direcção da ILGA
Portugal – Intervenção Lésbica, Gay,
Bissexual e Transgénero)
Download

Quando a adopção é um duplo trauma “Filhos das fufas”?