Corrupção e o
Pacote Cravinho
Adriana Oliveira ¤ José Moreira
Inês Morgado ¤ Inês Perestrelo
Conclusões preliminares do estudo “Corrupção e Ética em
Democracia: o caso de Portugal”, elaborado pelo Instituto
Superior de Ciências do Trabalho e da empresa (ISCTE), divulgado
pelo PÚBLICO no dia 24 de Fevereiro de 2007

objectivo principal do estudo: apreender o ambiente ético em que a
democracia Portuguesa funciona com especial enfoque na análise da
percepção e das práticas dos cidadãos.

Quis-se compreender:

o que pensam os cidadãos sobre corrupção;
qual o grau de importância da corrupção em confronto com outros temas da
agenda pública;
como julgam os comportamentos relacionados com o desempenho de cargos
públicos e políticos (definição social de corrupção);
que avaliação fazem do combate à corrupção e que medidas/reformas
consideram fundamentais para o seu combate.




A corrupção enquanto fenómeno social é considerada pela maioria dos
cidadãos como um comportamento ou prática desviante daquilo que seria
aceitável na vida pública.

Evidência deste facto será a quase consensual condenação abstracta do
fenómeno. A corrupção não suscita posições dicotómicas. Ninguém é a favor
da corrupção. Todos, ou quase todos, condenam a corrupção.

Contudo, essa intolerância ocorre apenas ao nível simbólico (valorativo),
sendo que ao nível estratégico de ancoragem dos julgamentos existe alguma
flexibilidade: na prática, as pessoas vão pactuando através de uma série de
expedientes que não necessariamente pela via do suborno.

O problema imediato que se levanta é o de saber qual o padrão pelo qual se
mede esse desvio. Isto é, que definição de corrupção ou que critérios e
exigências no exercício de funções estão em jogo e em referência às
quais os cidadãos condenam ou toleram um determinado comportamento
ou prática na vida pública?
1. Avaliação da eficácia do combate à
corrupção

A grande maioria dos
portugueses (83,8%) considera
que o combate à corrupção em
Portugal é ineficaz.

Apenas 16,2% consideram que
o actual sistema de controlo é
eficaz (gráfico 1).
2. Quem é responsabilizado pelo insucesso?

O Governo - é o órgão mais
responsabilizado pela ineficácia de
combate à corrupção (45%).

O aparelho judicial, responsável
pelo enforcement / aplicação da
Lei, também sai bastante
penalizado no seu desempenho
(23,9%).

São também coresponsabilizados os próprios
cidadãos (20,9%).

A classe política (7,6%).

A sociedade civil organizada
(2,3%).
3. Áreas de Risco

O futebol e a actividade
partidária são vistas como as
áreas mais expostas à
corrupção (respectivamente
24,4% e 22,7% das respostas).

Segue-se a administração
central (17,9%) e as grandes
empresas (12,5%) (gráfico 3).
4 Aspectos a ter em consideração na leitura
destes valores:

I. efeito de mediatização –
atendendo à importância da
comunicação social, em
particular da televisão, na
formulação das percepções
dos cidadãos sobre o
fenómeno, não é de
estranhar que as áreas de
actividade tidas como mais
corruptas sejam aquelas
cujos casos/investigações
de corrupção tenham tido
maior cobertura mediática
nos últimos tempos (ex,
futebol: investigações “apito
dourado”);

II. efeito anti-elitismo
(“nós Vs eles”) –
a corrupção também
aparece como problemática
nas esferas de actividade ou
instituições onde existe uma
relação de poder com o
cidadão (consumidor,
utente, eleitor) distante e
impessoal que alimenta um
sentimento de privação
relativa;
4 aspectos a ter em consideração na leitura
destes valores:

III. efeito de tolerância por
proximidade –
por oposição, as esferas de
actividade de cariz
descentralizado,
nomeadamente, PMEs,
autarquias e administração
regional, são julgadas como
menos corruptas e isto deve-se
ao facto de nas instituições ao
nível local existirem laços de
proximidade e familiaridade que
esbatem a divisão “nós Vs
eles”, o que resulta não só em
alguma cumplicidade entre os
actores, como também numa
maior objectivação nas
avaliações do desempenho dos
ocupantes dos cargos;

IV. efeito de tolerância por
desconhecimento –
no caso da administração
europeia e do meio financeiro
(Bolsa de Valores, etc.), o
desconhecimento destas
instituições, do seu
funcionamento e dos seus
actores, assim como a não
proximidade/convivência
poderá explicar a integridade
conferida a esses níveis.
4. Desempenho da Justiça

De um modo geral, os portugueses
consideram que a Justiça é pouco
severa com os Membros do
Governo (87,2%), Deputados da
AR (85,3%), Dirigentes
Desportivos (85,2%) e
Presidentes de Câmara (78,7%).

Os Chefes de empresa integram
também este grupo, ainda que com
um valor menos acentuado
(72,9%).

Em contraste, a mão pesada da
Lei faz-se sentir no caso dos
cidadãos comuns e dos
pequenos delinquentes, embora
seja o cidadão comum quem mais
sofre com os excessos da justiça
(30,5% muito severa, contra os
17,7% expressos para os pequenos
delinquentes) (gráfico 4).
5. Relevância da Corrupção para a Agenda
Governamental





A corrupção aparece como
quarta prioridade do
Governo a curto prazo.
Os portugueses continuam a
dar primazia:
ao desemprego (20,6%),
à saúde (17,8%),
e ao crescimento económico
(12,9%) - que apenas
supera a corrupção por duas
décimas percentuais
(12,7%) (gráfico 5).
6. Definição social de corrupção: como é que
os portugueses definem a
corrupção?






Considerando que a corrupção é um
fenómeno complexo e multidimensional
construiu-se um indicador social de
corrupção com base em 5 dimensões:
a) a legalidade,
b) a justiça/nobreza da acção,
c) a relação com a norma social,
d) o domínio/consciência da acção e
e) a consequência da acção.
6. Definição social de corrupção: como é que
os portugueses definem a
corrupção?

Os resultados confirmam a ideia de que Portugal é um país propício para a
corrupção não transactiva. Os portugueses condenam essencialmente a
corrupção enquanto suborno ou extorsão, mas toleram as suas
manifestações mais cinzentas, como por exemplo, a prática que é
vulgarmente conhecida por
“puxar os cordelinhos”.

A média das respostas a este indicador composto é de 2,7, numa escala em
que:
1 corresponde a uma definição de corrupção que envolve não só a corrupção
prevista na Lei, mas também um grande conjunto de comportamentos que
atenta contra as expectativas das pessoas e dos valores democráticos;
4 corresponde a uma definição minimalista que assenta essencialmente na
letra da Lei.



Ora a média de 2,7 está bem mais perto do pólo minimalista do que do pólo
em que a corrupção é entendida por relação a um conjunto mais vasto de
comportamentos.
6. Definição social de corrupção: como é que
os portugueses definem a
corrupção?

A maioria dos portugueses tende a ter uma concepção de corrupção
algo permissiva (54%), isto é, considera como actos corruptos os
comportamentos que mais se aproximam da definição penal, o que
deixa uma ampla margem de tolerância para toda uma série de
práticas não reguladas ou de difícil regulação, nomeadamente,
conflitos de interesse, cunhas, amiguismos, favorecimentos,
patronagem política, etc.

Se a este valor adicionarmos os 11,3% dos inquiridos que têm uma
concepção ainda mais restrita de corrupção, pode-se concluir que os
portugueses exprimem maioritariamente (65,3%) uma visão
minimalista dos standards de ética na vida pública.

De facto, só 5,5% dos inquiridos considera que a definição de
corrupção vai muito além da definição legal expressa pelo código
penal e pelas leis crime (gráfico 6).
6. Definição social de corrupção: como é que
os portugueses definem a
corrupção?
7. Que sanções?

Atendendo à percepção de impunidade que os
portugueses formulam em relação à classe política, não
surpreende que as sanções consideradas mais
adequadas para os crimes de grande corrupção (isto é,
praticada por políticos e altos cargos públicos) sejam de
natureza mais severa/radical do que aquelas que
vigoram actualmente (pena de prisão e multa):

“A demissão sem possibilidade de readmissão” (22,2%);

e “A perda de acesso a cargos políticos” (18,7%).
7. Que sanções?

Não obstante a relevância
dada a este novo tipo de
medidas, o arquétipo de
repressão convencional
continua presente:

a pena de prisão (18,5% das
respostas);

a suspensão de funções
(15,9%);

a multa (6,5%)
(gráfico7)
8. O que fazer?

Se por um lado, o cidadão não sente dificuldade em expressar o seu ponto de
vista sobre o grau de corrupção existente no seu país ou a sanção a aplicar, o
mesmo não se poderá dizer quando confrontado com a pergunta sobre “o que
fazer?”, isto é, quando convidado a opinar sobre o tipo de medidas a adoptar
para o seu controlo e prevenção.

12,3% dos inquiridos não expressaram opinião, dos quais 11% “Não Sabem”.

Analisando apenas as respostas às medidas sugeridas, podemos aferir que:

quase ninguém considera que o actual sistema judicial, no modo como é
composto e funciona, é adequado para controlar o fenómeno (0,5%).

42,3% dos inquiridos consideram prioritária a criação de uma agência anticorrupção com amplos poderes de investigação (gráfico 8).
8. O que fazer?
A corrupção em Portugal


Na sua essência, a corrupção, ao nível políticoadmnistrativo de um Estado, consiste num acto secreto
praticado por um funcionário ou por um político, que
solicita ou aceita para si ou para terceiros, com ele
relacionados, e por ele próprio ou por interposta pessoa,
uma vantagem patrimonial indevida, como contrapartida
da prática de actos ou pela omissão de actos contrários
aos seus deveres funcionais.
O acto em si é de uma simplicidade extrema, os efeitos
que gera são profundamente complexos, constituindo,
quando não detectados a tempo, um problema grave
para o Estado de Direito.

A sua disseminação conduz à desregulação dos sistemas
político, social e económico, e à degradação incontornável dos
serviços do Estado, especialmente porque são ignorados os
princípios da imparcialidade e igualdade que devem nortear a
Administração Pública, as Polícias e os Tribunais.

O Banco Mundial, num relatório recente, garante mesmo que a
corrupção é “o maior obstáculo ao desenvolvimento económico
e social”.

Daniel Kaufman garante que “(…) um país corrupto tem
tendência para captar investimentos na ordem de 5 por cento
menos do que países relativamente não corruptos, e para
perder metade de um ponto percentual do produto interno bruto
por ano.”



A corrupção tornou-se, a partir dos anos 80, o principal
problema das democracias ocidentais.
A Transparency International (TI), uma organização
privada dedicada ao combate à corrupção, defende, no
seu relatório de 2002, que “a percepção da corrupção
como um problema global marca um importante ponto de
viragem” nas atitudes dos governos e das sociedades.
Esta organização, elabora rankings anuais dos países
menos corruptos a nível mundial, baseados na
percepção que os agentes económicos têm sobre os
níveis de corrupção existentes nos países onde
trabalham.

No ranking de 2006, Portugal posicionase na 26ª posição a nível mundial, e na
14ª a nível da União Europeia.
Country Rank:

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
1 Finland
1 Iceland
1 New Zealand
4 Denmark
5 Singapore
6 Sweden
(…)
23 Spain
24 Barbados
24 Estonia
26 Macao
26 Portugal 28 Malta
28 Slovenia
28 Uruguay





28 Malta
28 Slovenia
28 Uruguay
(…)
156 Congo Democratic Republic
156 Sudan
160 Guinea
160 Iraq
160 Myanmar
163 Haiti

A democracia portuguesa, à semelhança de grande parte das suas
congéneres europeias, não consegui criar mecanismos
administrativos e decisórios impermeabilizadores à reprodução de
práticas corruptas sistemáticas.

O modelo de desenvolvimento económico do nosso país, muito
assente no Estado, na subsídio-dependência, no proteccionismo, a
que se junta o adiamento das reformas estruturais, na administração
Pública, na Justiça, Educação e Saúde, criam espaço para a
economia paralela, para o tráfico de influências, e para um séquito de
clientelas.

Em termos puramente estatísticos, a realidade portuguesa confirma a
tendência mundial para a enorme discrepância entre a criminalidade
real e a criminalidade participada, nos crimes que estamos a analisar.

Num inquérito realizado por Boaventura Sousa Santos em 1996, 8,4%
dos inquiridos admitiam ter sido convidados por funcionários públicos
a gratificar ou comprar favores dos mesmos. Se extrapolarmos esta
percentagem para um universo de 7,5 milhões de portugueses com
mais de 24 anos, obtém-se um assustador número de 600 mil
portugueses que já terão sido aliciados a comprar favores de um
funcionário público.

O adiamento constante do combate sistemático do fenómeno da
corrupção em Portugal, ou a tendência para o exercício do combate
demagógico, em proclamação de comício, reforçou a tendência para o
desenvolvimento dos cenários de corrupção, que permitiram o
crescimento galopante da acção dos agentes corruptos, por exemplo
na Administração Pública e no Poder Local



A isto tudo há que juntar duas características
especialmente perigosas do nosso poder políticoadministrativo:
- primeira, tem a ver com a permissão de acumulação de
cargos, a não limitação de mandatos e, no caso das
autarquias, com a concentração excessiva de poderes
nas mãos dos presidentes das câmaras municipais,
especialmente sobre decisões económicas e no
urbanismo;
- a segunda, a burocracia excessiva, feita do
emaranhamento de leis e regras, que permite o poder
arbitrário, e institucionaliza a doutrina do “dá-se um jeito”.

Segundo o Grupo de Estados Contra a Corrupção (GRECO), um corpo de peritos formado pelo
Conselho da Europa para combater a corrupção nos estados membros, no seu relatório de
avaliação a Portugal, no nosso país “as mais frequentes formas de corrupção são a aceitação e
solicitação de subornos por parte de funcionários públicos, realizada por entidades exteriores ao
Estado”.
Em favor da sua tese, os peritos da GRECO citam números da Polícia Judiciária, referentes a
investigações efectuadas em 2001, que levaram a julgamento:








3 casos relacionados com a corrupção na Administração Pública central,
17 nas autarquias,
3 em tribunais
17 na polícia,
1 na Segurança Social,
46 em laboratórios farmacêuticos,
2 em institutos públicos,
6 na Direcção-Geral de Viação
As fatídicas áreas de corrupção:
(Procurador-geral adjunto Euclides Dâmaso
Simões)






adjudicação de obras públicas e respectiva
fiscalização;
licenciamento de obras particulares;
fiscalização tributária;
actuação fiscalizadora dos órgãos de
inspecção e de polícia;
exames para obtenção de título de condução
automóvel
actos médicos de prescrição de medicamentos
O perfil do corrupto português:
(Estudo inédito de Departamento Central de
Investigação e Acção Penal e do Centro de
Estudos Judiciários)





Sexo masculino
Casado
Entre os 35 e os 45 anos
Não tem antecedentes criminais
Trabalha sob a tutela do Ministério da administração
Interna e presta serviço na GNR, no distrito de Lisboa
As maiores fontes de corrupção na
democracia portuguesa actual
(Maria José Morgado e José Vegar, O Inimigo sem
Rosto: fraude e corrupção em Portugal)

- Administração Pública, nos seus mais diversos níveis, degradada pelo
abandono dos critérios de gestão e promoção assentes na competência e no
mérito, e ainda por uma ultraburocratização, que longe de balizar condutas e
regras, aumenta o poder arbitrário dos funcionários;

A burocracia torna tão difícil qualquer relação com os serviços públicos, que
abre caminho para o chamado “speed-money”, ou seja, só o suborno ao
funcionário desbloqueia o problema;
A falta de formação profissional, de estímulos profissionais, a progressão
automática e uniforme das carreiras, a desvalorização do zelo e do mérito,
levam à progressiva substituição do interesse público por critérios de interesse
pessoal e partidário. Mais ainda quando os directores-gerais, os homens forte
da estrutura, o topo dos cargos da Função Pública, alcançam os seus lugares
quase totalmente através de nomeação partidária.

As maiores fontes de corrupção na
democracia portuguesa actual
(Maria José Morgado e José Vegar, O Inimigo sem
Rosto: fraude e corrupção em Portugal)

- utilização perversa do seu cargo por parte de alguns decisores da
administração Central e Local – ministros, autarcas, secretários de Estado e
directores-gerais – assente na oportunidade de por vezes fazerem uso venal do seu
poder, especialmente na adjudicação e contratação de serviços e empresas, sem
que se verifique uma detecção imediata pela fiscalização.

Quando estas adjudicações e contratações não são feitas segundo critérios de
competência, isenção e respeito pela concorrência, mas sim de clientelismo, de
interesses privados, e especialmente políticos, o Estado, através de certos
representantes, assina contratos cujas cláusulas beneficiam unilateral e
excessivamente os grupos privados.

O laxismo institucional, neste campo, tem sido tal que a acusação no caso do
hospital Amadora-Sintra, normal num Estado de Direito, surge como algo de inédito.

O problema é que há casos em que, aparentemente, tudo é feito de modo legal e
escrupuloso, mas os contratos realizados violam gravemente princípios públicos, até
o dever de zelo, já que o dinheiro gasto não corresponde de maneira alguma ao
serviço prestado.
As maiores fontes de corrupção na
democracia portuguesa actual
(Maria José Morgado e José Vegar, O Inimigo sem
Rosto: fraude e corrupção em Portugal)

- grandes necessidades financeiras dos partidos políticos, muito
para além dos orçamentos permitidos por Lei.
Estas necessidades financeiras constantes e pesadas geram uma
pressão permanente no mercado das obras públicas e adjudicação de
serviços, só para referir os mais óbvios;

- mercado das obras públicas e serviços.
Por si só é um manancial de oportunidades de corrupção, também por
omissão de fiscalização adequada.
Práticas de cambão e viciação de concursos, determinadas pela
avidez do clientelismo e dos interesses ocultos.
Obviamente, é o cidadão a sofrer as consequências. Segundo o diário
britânico Financial Times, “subornos resultam na atribuição dos
maiores concursos a empresas incapazes de realizar eficientemente o
trabalho, e a um custo superior para o erário público;
As maiores fontes de corrupção na
democracia portuguesa actual
(Maria José Morgado e José Vegar, O Inimigo sem
Rosto: fraude e corrupção em Portugal)

- o financiamento do futebol, dada a popularidade procurada por
políticos e autarcas através de financiamentos, doações e outros
expedientes. Isto acontece porque o futebol gera grande simpatia
entre o eleitorado, mas também porque é uma força centrífuga, que
atrai a si os empreiteiros e os seus negócios com as autarquias,
envolvendo terrenos e construções – a tríade autarquias, futebol e
construção civil. Alguns clubes de futebol de dimensão regional ou
local são já encarados como os “off-shore dos pequeninos”;

- instalação de fenómenos crónicos de evasão fiscal, por parte
dos particulares e empresas. Quando a evasão fiscal se torna uma
possibilidade de fácil concretização, apenas dependente do fiscal ou
do funcionário competente, gera-se uma impunidade geral, que anula
completamente os princípios de equidade da administração Fiscal;
As maiores fontes de corrupção na
democracia portuguesa actual
(Maria José Morgado e José Vegar, O Inimigo sem
Rosto: fraude e corrupção em Portugal)

- não funcionamento das instâncias de controlo e fiscalização
efectivos ao nível dos vários serviços, porque demasiado
formalistas, gera, por si, um clima de impunidade extremamente
aliciante para o candidato à corrupção, porque permite que os
fenómenos de tráfico de influências e de corrupção adquiram uma tal
exuberância e solidez de cumplicidades, que torna praticamente
impossível combatê-los por via criminal.
Enquadramento ao nível
internacional
A Corrupção coloca em perigo a estabilidade e segurança das
sociedades, na medida em que mina as instituições e os valores
da democracia, os valores éticos e a justiça, comprometendo o
desenvolvimento sustentável e o Estado de Direito.
A corrupção é vista como um fenómeno transnacional o que torna
essencial a cooperação ao nível internacional.
Documentos analisados:
 Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção
 Relatório de 2005 do GRECO (Groupe d’Etats contre la
corruption/
Group of States against corruption)
Enquadramento ao nível
internacional

Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (assinada
por Portugal em 2004)
Perante os problemas que corrupção cria às sociedades
actuais, comprometendo o desenvolvimento sustentável e as
estruturas do Estado de Direito
 Perante “uma” corrupção cada vez menos local e cada vez
mais relacionada com outras formas de criminalidade que não
respeitam fronteiras (em especial a criminalidade organizada e
a criminalidade económica)
 Considera necessária uma abordagem global e multidisciplinar
para prevenir e combater a corrupção de forma eficaz
 Considera também que prestação de assistência técnica aos
Estados pode ser um meio de os ajudar as escolher as
melhores formas de actuar

Enquadramento ao nível
internacional

Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (assinada
por Portugal em 2004)

Faz referência ao trabalho desenvolvido (no âmbito da ONU)
pela Comissão para a Prevenção do Crime e a Justiça Penal e
o Gabinete das Nações Unidas para o Controlo da Droga e a
Prevenção do Crime
Faz ainda referência ao trabalho desenvolvido por outras
organizações internacionais e regionais (como o Conselho da
Europa, a Organização para a Cooperação e o
Desenvolvimento Económico)
Menciona instrumentos multilaterais destinados a prevenir a a
combater a corrupção (como a Convenção Penal sobre a
Corrupção)


Enquadramento ao nível
internacional

GRECO
Formas de procedimento:
 o procedimento de avaliação é baseado no princípio da
avaliação mútua
 Os Estados têm de responder a um questionário de avaliação
 São organizadas visitas aos Estados (por um grupo de peritos)
 São elaborados relatórios de avaliação. Os relatórios de
avaliação têm duas partes, uma descritiva onde são
apresentadas as respostas do questionário e outras
informações recolhidas, e uma analítica onde se tecem
observações e recomendações devidamente fundamentadas.
Enquadramento ao nível
internacional

GRECO

Os membros do GRECO devem tomar em consideração as
recomendações feitas e implementá-las, dentro do prazo
estabelecido pelo GRECO.
Todas as informações estão protegidas por uma norma geral
de confidencialidade. No entanto é possível fazer breves
sumários dos relatórios públicos. Além disso, quando um país o
requisite o GRECO pode tornar todos os relatórios sobre esse
mesmo país públicos.
É elaborado um relatório anual que contém informação sobre
os métodos de trabalho internos da organização, bem como os
sumários dos relatórios de avaliação, do período em questão.


Enquadramento ao nível
internacional

GRECO
RELATÓRIO DE AVALIAÇÃO RELATIVO A PORTUGAL (2005)



O relatório tem como base as respostas ao questionário, bem
como a visita de uma equipa de peritos – GRECO Evaluation
Team (GET) – a Portugal realizada entre 14 e 18 de Novembro.
O relatório versa sobre 3 grandes temas: procedimentos de
combate à corrupção, administração pública e corrupção e
pessoas colectivas e corrupção.
Para o nosso trabalho interessa essencialmente ter em conta a
análise e as recomendações do GRECO para o segundo tema
(administração pública e corrupção).
Nações Unidas

Gabinete das Nações Unidas para o
Controlo da Droga e a Prevenção do
Crime
• Programa Global contra a Corrupção
• Anti-Corruption Toolkit
um guia de recomendações para o
desenvolvimento de estratégias de
luta contra a corrupção
ANTI-CORRUPTION TOOLKIT






Avaliação da Corrupção e das Capacidades
Institucionais contra a Corrupção
Institucionalização e Reforma das
Instituições
Meios de Prevenção
Prevenção Social e Poder dos Cidadãos
Aplicação
Legislação contra a Corrupção
Avaliação da Corrupção e das
Capacidades Institucionais contra
a Corrupção

avaliação prévia da natureza e extensão
da corrupção: inquéritos, entrevistas, case
studies, etc.

avaliação tanto quantitativa como
qualitativa da corrupção
• Quantitativa: extensão
• Qualitativa: natureza

avaliação das capacidades institucionais
e as suas reacções à corrupção
Institucionalização e Reforma
das Instituições

Agência especializada contra a
corrupção (ou adaptação de instituições já
existentes ou mistura das duas):
• Vantagens: impulso, especialização, eficiência, rapidez
• Desvantagens: custos, rivalidades, isolamento, colisão
com instituições existentes


Instituições de auditoria (Tribunal de Contas)
Ombudsman (Provedor de Justiça)
Institucionalização e Reforma
das Instituições






Fortalecimento das instituições judiciais
Reforma da função pública
Códigos de conduta
Planos de acção contra a corrupção
Fortalecimento dos governos locais
Papel dos Parlamentos
Meios de Prevenção








Controlo público de riqueza dos titulares de altos
cargos públicos
Autoridade para fiscalizar a contratação pública
Evitar corrupção nos concursos públicos
Pactos de integridade
Redução da complexidade procedimental
Redução e estruturação da discricionariedade
Gestão baseada em objectivos
Uso de incentivos para motivar os funcionários
públicos
Prevenção Social e Poder dos
Cidadãos





Acesso à informação
Mobilização da sociedade civil através
da educação pública e de campanhas
de sensibilização
Formação dos meios de comunicação e
jornalismo de investigação
Mecanismos de controlo social
Mecanismos de denúncias públicas
Aplicação




Orientações para a investigação da
corrupção
Invenstigações financeiras e controlo de
património
Teste de integridade (“sting”)
Operações de vigilância electrónica
Legislação contra a
Corrupção

Protecção para denunciantes
Corrupção

Situações em que um funcionário solicita
ou aceita uma vantagem patrimonial ou
não patrimonial (ou a sua promessa)
como contrapartida de um acto (lícito ou
ilícito) que traduz o exercício efectivo do
cargo em que se encontra investido
Corrupção

Corrupção activa e passiva

Para acto ilícito ou lícito
Pacote Cravinho



Criação da Comissão para a Prevenção
da Corrupção (CPC)
Alterações à Lei de Acesso aos
Documentos Administrativos (LADA)
Alterações ao Código Penal e à
legislação penal avulsa sobre prevenção
e repressão da corrupção
Alterações à Lada

A proposta pretende alargar o campo de
aplicação do regime estendendo o
conceito de documento administrativo
aos documentos relativos à actividade
desenvolvida pelas:
Alterações à Lada







empresas municipais, intermunicipais e regionais;
empresas concessionárias da gestão de empresas
públicas;
sociedades de capitais públicos;
sociedades de economia mista controladas;
empresas concessionarias ou gestoras de serviços
públicos;
empresas concessionárias de obras públicas;
entidades de qualquer natureza que tenham participação
de capitais públicos.
Alterações ao CP

Artigo 118º (Prazos de prescrição para o
procedimento criminal)
• Proposta: 15 anos nos crimes previstos nos
arts. 372º, 373º, 374º, 375º, n.º 1, 377º, n.º 1,
379º, n.º 1, 382º, 383º e 384º do Código
Penal e nos crimes previstos nos arts. 16º,
17º e 18º da Lei n.º 34/87
Alterações ao CP
Artigo 372º
(Corrupção passiva para acto determinado)
1- O funcionário que por si, ou por interposta pessoa, com o seu
consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou
para terceiro, directa ou indirectamente, sem que lhe seja
devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua
promessa, para a pratica ou omissão de um qualquer acto ou
omissão inerente ao exercício das suas funções ou por
estas facilitado, ainda que anterior àquela solicitação ou
aceitação, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.
2 – Se o acto ou omissão forem contrários aos deveres do
cargo, o agente é punido com pena de prisão de 2 a 8
anos.
Alterações ao CP
Artigo 373º
(Corrupção passiva em razão das funções)
1 - Na pena prevista no artigo anterior incorre o funcionário
que, por si ou por interposta pessoa, com o seu
consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si
ou para terceiro, directa ou indirectamente, por causa
das suas funções, mas sem que lhe seja devida,
vantagem patrimonial ou não patrimonial, de pessoa que
perante ele tenha tido ou tenha qualquer pretensão
dependente do exercício das suas funções públicas.
Alterações ao CP
Artigo 374º
(Corrupção activa)
1 – Quem, por si ou por interposta pessoa, com o seu
consentimento ou ratificação, der ou prometer a
funcionário, ou a terceiro com conhecimento daquele,
vantagem patrimonial ou não patrimonial que ao
funcionário não seja devida, com os fins e nas
circunstancias indicadas nos artigos 372º e 373º, é
punido com pena de prisão de 1 a 6 anos.
2 - É correspondentemente aplicável o disposto na alínea b)
do artº. 364º.
Alterações à lei n.º 4/83

A lei do controlo público da riqueza dos
titulares de cargos políticos passa a
exigir que as contas bancárias à ordem
e os direitos de crédito superiores a 50
salários mínimos constem da descrição
dos elementos do activo patrimonial.
Alterações à lei n.º 4/83

O Ministério Público passa a analisar
anualmente uma amostra aleatória das
declarações apresentadas após o termo
do mandato.
Alterações à lei n.º 34/87


Os crimes de corrupção previstos para
os titulares de cargos políticos são
alterados da mesma forma que os
crimes de corrupção constantes do
Código Penal.
Este regime torna-se aplicável ao
titulares de altos cargos públicos,
fazendo referência à enumeração da Lei
n.º 64/93 (art. 3º)
Alterações à lei n.º 34/87

Assim, o regime será aplicado aos
titulares dos seguintes cargos:
• Presidente do conselho de administração de
•
empresa pública e de sociedade anónima de
capitais exclusiva ou maioritáriamente
públicos
Gestor público e membro do conselho de
administração sociedade anónima de capitais
exclusiva ou maioritariamente públicos,
designado por entidades pública
Alterações à lei n.º 5/2002
(Medidas de combate à criminalidade organizada
e económico-financeira)
 O regime especial de recolha de prova, quebra
do segredo profissional e perda de bens a
favor do Estado torna-se aplicável aos crimes
de:
•
•
•
•
Tráfico de influência;
Corrupção activa e passiva;
Peculato;
...
outras medidas: Constituição
de assistentes por associações

A proposta prevê a constituição de
assistentes por associações sem fins
lucrativos cujo objecto principal seja o
combate à corrupção sem sujeição ao
pagamento de qualquer taxa de justiça.
outras medidas:
Comunicação ao ministério Público

A tomada de conhecimento de qualquer
crime no âmbito de uma inspecção ou
fiscalização deve ser comunicada
imediatamente ao MP.
outras medidas:
Garantia dos denunciantes


Sanção disciplinar é presumida como
acto de retaliação
Denunciantes têm direito ao anonimato
até ao momento da acusação
FIM
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O Inimigo sem Rosto: fraude e corrupção em Portugal