SILVANA CORRÊA DE BARROS LAMPERT
PROMOÇÃO E EDUCAÇÃO EM SAÚDE:
PROBLEMATIZANDO A PRÁTICA DO AGENTE
COMUNITÁRIO DE SAÚDE
ITAJAÍ (SC)
2012
UNIVALI
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação, Extensão e Cultura – ProPPEC
Mestrado Profissional em Saúde e Gestão do Trabalho
SILVANA CORRÊA DE BARROS LAMPERT
PROMOÇÃO E DUCAÇÃO EM SAÚDE:
PROBLEMATIZANDO A PRÁTICA DO AGENTE
COMUNITÁRIO DE SAÚDE
Dissertação apresentada ao Mestrado em
Saúde e Gestão do Trabalho do Programa
de Pós-Graduação da Universidade do
Vale do Itajaí como requisito para
obtenção do título de Mestre. Área de
Concentração: Promoção e Educação em
Saúde.
Orientadora: Profª Dra. Águeda Lenita
Pereira Wendhausen.
ITAJAÍ (SC)
2012
FICHA CATALOGRÁFICA
L197p
Lampert, Silvana Corrêa de Barros, 1972Promoção e educação em saúde: problematizando a prática do
agente comunitário de saúde / Silvana Corrêa de Barros Lampert,
2012.
112f. il.; il.; fig.; quadr.
Anexos, Apêndices
Cópia de computador (Printout(s)).
Dissertação (Mestrado) Universidade do Vale do Itajaí. Centro de
Ciências da Saúde. Mestrado em Saúde e Gestão do Trabalho.
“Orientadora: Profª. Dra. Águeda Lenita Pereira Wendhausen”
Bibliografia : p.91-99
1. Promoção da saúde. 2. Saúde pública. 3. Atenção à saúde.
4. Agentes comunitários da saúde. I. Título.
CDU: 614
Josete de Almeida Burg – CRB 14.ª 293
UNIVALI
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação, Extensão e Cultura – ProPPEC
Mestrado Profissional em Saúde e Gestão do Trabalho
CERTIFICADO DE APROVAÇÃO
SILVANA CORRÊA DE BARROS LAMPERT
PROMOÇÃO E DUCAÇÃO EM SAÚDE:
PROBLEMATIZANDO A PRÁTICA DO AGENTE
COMUNITÁRIO DE SAÚDE
Dissertação avaliada e aprovada pela
Comissão Examinadora e referendada pelo
Colegiado como requisito à obtenção do
grau de Mestre em Saúde e Gestão do
Trabalho.
Itajaí (SC), 13 de julho de 2012.
Orientadora:
_______________________________
Profª Dra. Águeda Lenita Pereira Wendhausen
Banca Interna:
__________________________________
Dra. Stella Maris Brum Lopes
Banca Externa:
________________________________
Dra. Maria Soledad Rivera
Banca Externa:
________________________________
Maria Elisabeth Kleba da Silva
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a DEUS por ter me mostrado a força de seu amor
incondicional e por estar sempre do meu lado, me ouvindo com a serenidade de um
sábio e conduzindo minha vida com seu cajado. Obrigado por me mostrar o quanto
preciso de TI!
A minha mãe JUSSARA, mulher de personalidade forte, que me ensinou o valor de
um caráter. Figura sempre presente em minha vida, me impulsionando nas horas
difíceis. Obrigado por me ajudar a tornar esse sonho possível!
A meu pai ODILON, que apesar de ausente, foi quem me ensinou a “transformar
pedras em flores”. Tenho certeza que sentes orgulho de mim.
Aos meus filhos INAIARA e LUÍS FELIPE fonte de toda a minha força e inspiração
nos momentos difíceis. Sei que muito estive ausente, mas tudo o que fiz, foi por
VOCÊS!
A minha avó ZENAIRA, que embora não esteja mais entre nós, deixou um legado de
valores e princípios para os seus. Foi para mim um exemplo de força e
determinação. Amo-te além da vida!
A MARIA MADALENA NUNES MONTEIRO, cuja perda me fez escolher a área da
saúde. Tua simplicidade e benevolência influenciaram a minha vida.
Ao meu namorado FERNANDO pela paciência nos momentos difíceis, pelo apoio e
palavras de incentivo. Acima de tudo és um grande amigo e companheiro que muito
respeito e admiro.
A meu amigo de longa data ALEXANDRE RAPHAEL CABRAL que mesmo “do
outro lado do mundo” sempre se fez presente em minha vida. “Figura certa nas
horas incertas”, minha felicidade eu reparto contigo!
Aos meus colegas enfermeiros KARLA, ENEIDA e RAFAEL e a minha EQUIPE 007
pela compreensão e apoio nos momentos em que me fiz ausente no trabalho. Valeu
pela força!
A minha orientadora e mestre DRA. ÁGUEDA por acreditar em mim e me direcionar
no caminho certo, compartilhando conhecimentos e contribuindo para o meu
crescimento profissional. Sempre te levarei do lado esquerdo do peito!
Aos PROFESSORES e COLEGAS DE MESTRADO, que em muito contribuíram
nessa caminhada.
Aos AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE pelo acolhimento, confiança e o
aprendizado que me proporcionaram. Nada teria sido possível sem vocês!
O meu muito obrigado a todos!
Se, na verdade, não estou no mundo para
simplesmente a ele me adaptar, mas para
transformá-lo; se não é possível mudá-lo
sem um certo sonho ou projeto de mundo,
devo usar toda possibilidade que tenha
para não apenas falar de minha utopia,
mas participar de práticas com ela
coerentes.
Paulo Freire
LAMPERT, Silvana Corrêa de Barros. Promoção e educação em saúde:
problematizando a prática do agente comunitário de saúde. 2012. Dissertação
(Programa de Mestrado Profissionalizante em Saúde e Gestão do Trabalho) Universidade do Vale do Itajaí/SC, Itajaí, 2012. Orientadora: Profª. Dra. Águeda
Lenita Pereira Wendhausen.
RESUMO
Vários são os conceitos acerca da Promoção da Saúde, bem como as suas variadas
interpretações e aplicabilidades. Isso se reflete na forma como percebemos e trabalhamos a
Promoção, utilizando como ferramenta a Educação em Saúde. No entanto, para melhor
discorrer sobre o assunto, se fez necessária uma retrospectiva histórica para que possamos
melhor compreender o momento atual. Objetivamos trabalhar o conceito de Promoção da
Saúde de forma a problematizar a prática dos Agentes Comunitários de Saúde, visando
torná-los profissionais mais críticos e atuantes na sua comunidade, intervindo como agentes
transformadores de uma realidade social marginalizada e excluída. O estudo foi
desenvolvido em uma Unidade Básica de Saúde, no município de Itajaí/SC, por meio de
quatro oficinas com os Agentes Comunitários de Saúde (ACS). Através da Teoria
Problematizadora de Paulo Freire, foi suscitado nos mesmos, alguns questionamentos sobre
o que é Promoção da Saúde, qual a sua real dimensão, de que forma ela se dá na prática e
como ela pode ser aplicada no dia a dia da Estratégia Saúde da Família. Os resultados
obtidos através destes encontros serviram para discutir e refletir o conceito, as concepções
e práticas de Promoção da Saúde desenvolvidas pelos ACS e sua ligação com a Educação
Popular em Saúde. Foi possível observar nas falas conflitos, contradições, despreparo e
desconhecimento quando o assunto é Promoção e Educação Popular em Saúde. Promoção
que segue sendo confundida com Prevenção. O modelo de educação bancária ainda
persiste, perpetuando a alienação nos modos de entender e fazer saúde que se reflete nas
propostas educativas realizadas pela Estratégia de Saúde da Família. Persiste ainda a
conduta prescritiva dos profissionais, muitos ainda formados no modelo biomédico, o que
nos faz pensar que muito ainda temos que caminhar para mudar o modelo de atenção.
Palavras-chave: Promoção da Saúde. Educação em Saúde. Agentes Comunitários de
Saúde.
LAMPERT, Silvana Corrêa de Barros. Health education and promotion:
questioning the practice of the community health agent. 2012. Dissertation (Master’s
Degree Program in Health and Management of Work) - University of Vale do
Itajai/SC, Itajaí, 2012. Supervisor: Prof. Dr. Pereira Wendhausen, Águeda Lenita.
ABSTRACT
There are several concepts of health promotion, as well as their various interpretations and
applications. This is reflected in the way we perceive and deal with Promotion, used as a tool
in Health Education. To discuss this subject properly, a historical retrospective is needed, so
that we can better understand the present. This work discusses the concept of health
promotion, in order to examine the practice of Community Health Workers (CHW), seeking to
make these professionals more critical and active in their communities, so that they can
become agents of change of a marginalized and excluded social context. The study was
conducted in a Basic Health Unit in the town of Itajaí/SC, through four workshops with
Community Health Agents. Using Paulo Freire’s Investigation Theory, the health workers
were questioned about the nature of Health Promotion, its real dimension, how it is put into
practice, and how it can be applied in the everyday practices of the Family Health Strategy
(FHS). The results obtained in these workshops formed the basis of discussion and reflection
on the concept, the beliefs and practices of health promotion developed by the CHWs, and
its connection with Popular Education in Health. It was observed, in the conflicting speeches,
that there are contradictions, a lack of training, and a lack of knowledge when it comes to
Promotion and Popular Education in Health Promotion. Heath promotion is often confused
with prevention. The banking model of education still persists, perpetuating a sense of
alienation in relation to ways of understanding and doing health that is reflected in the
educational proposals of the FHS. Prescriptive conduct is still common among professionals,
many of whom are still trained according to a biomedical model. This suggests that we still
have a long way to go in order to change the existing healthcare model.
Keywords: Health Promotion. Health Education. Community Health Agents.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1
Figura 2
Figura 3
Figura 4
Mural “História do Nome” ......................................................................... 65
“Resgatando a nossa História” ................................................................. 66
Grupo 1 – “O que entendemos por Promoção/Educação Popular em
Saúde” ..................................................................................................... 84
Grupo 2 – “O que entendemos por Promoção/Educação Popular
em Saúde” ................................................................................................ 85
LISTA DE QUADRO
Quadro 1 A evolução das conferências de promoção da saúde .............................. 32
LISTA DE APÊNDICES
Apêndice A Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.................................... 101
Apêndice B Consentimento de Participação do Sujeito......................................... 102
LISTA DE ANEXOS
Anexo A Atribuições do Comitê Gestor da PMPS................................................. 104
Anexo B Objetivos e Estratégias da Agenda Nacional ......................................... 105
Anexo C Normas da Revista Trabalho, Educação e Saúde Pública para
preparo de manuscritos .......................................................................... 108
LISTA DE SIGLAS
ACS
ASB
CLS
CNS
CONEP
ESF
ICIRA
MCP
MS
NOB
OMS
ONGs
ONU
PACS
PIB
PNPS
PSF
PUC-SP
SESI
SESP
SIAB
SISNEP
SUS
TCLE
TSB
UBS
UNICAMPI
USP
Comunitários de Saúde
Auxiliar em Saúde Bucal
Conselhos Locais de Saúde
Conferência Nacional de Saúde
Comissão Nacional de Ética em Pesquisa
Estratégia Saúde da Família
Instituto Chileno para a Reforma Agrária
Movimento de Cultura Popular
Ministério da Saúde
Normas Operacionais Básicas
Organização Mundial da Saúde
Organizações não Governamentais
Organização das Nações Unidas
Programa de Agentes Comunitários de Saúde
Produto Interno Bruno
Política Nacional de Promoção da Saúde
Programa de Saúde da Família
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Setor de Educação e Cultura do Serviço Social da Indústria
Serviço Especial de Saúde Pública
Sistema de Informação da Atenção Básica
Sistema Nacional de Informação sobre Ética em Pesquisa envolvendo
Seres Humanos
Sistema Único de Saúde
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Técnico em Saúde Bucal
Unidade Básica de Saúde
Universidade Estadual de Campinas
Universidade do Estado de São Paulo
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO / JUSTIFICATIVA .................................................................... 13
2
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA........................................................................ 18
2.1 Breve retrospectiva histórica da saúde no Brasil e a entrada do ACS
como trabalhador em saúde ......................................................................... 18
2.2 O conceito ampliado de saúde e a Promoção da Saúde na atualidade ..... 26
2.3 A história das concepções de promoção da saúde..................................... 29
2.4 Breve retrospectiva histórica das ações educativas no campo da
saúde ............................................................................................................... 39
3
METODOLOGIA ............................................................................................... 51
3.1 Paulo Freire: uma síntese biográfica e suas ideias ..................................... 52
3.2 Local da investigação ..................................................................................... 54
3.3 Sujeitos pesquisados .................................................................................... 56
3.4 Procedimentos de coleta dos dados ............................................................. 56
3.5 Análise dos dados .......................................................................................... 59
3.6 Aspectos éticos .............................................................................................. 60
4
RESULTADOS E DISCUSSÃO........................................................................ 62
4.1 Identificações do trabalho e das participantes ............................................ 62
4.2 Dando início às discussões ........................................................................... 66
5
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................. 87
REFERÊNCIAS ................................................................................................ 91
APÊNDICES .................................................................................................. 100
ANEXOS ......................................................................................................... 103
13
1 INTRODUÇÃO / JUSTIFICATIVA
Desde que iniciei minha atuação como enfermeira em Saúde Pública, em
1999, mais especificamente dentro da Estratégia Saúde da Família (ESF), sempre
tive um olhar voltado para os anseios da comunidade e me questionava de que
forma o trabalho em equipe, dentro do modelo de saúde atual, poderia ser útil e
provocar necessárias e positivas transformações.
ESF iniciou em 1994, marcada pela evolução histórica e organização do
sistema de saúde no Brasil. É uma estratégia de reorientação do modelo assistencial
operacionalizada mediante a implantação de equipes multiprofissionais em unidades
básicas de saúde. Tais equipes possuem uma composição mínima constituída por:
médico generalista ou especialista em saúde da família ou médico de família e
comunidade, enfermeiro generalista ou especialista em saúde da família, auxiliar ou
técnico de enfermagem e agentes comunitários de saúde, podendo acrescentar a
esta composição, como parte da equipe multiprofissional, os profissionais de saúde
bucal: cirurgião dentista generalista ou especialista em saúde da família, auxiliar
e/ou técnico em Saúde Bucal (BRASIL, 2011).
Dentre os profissionais da equipe de Saúde da Família, sempre me chamou a
atenção à atuação dos agentes comunitários de saúde (ACS), justamente pelo fato
de ter livre acesso a mundos com características tão singulares.
Por ser um morador na comunidade em que trabalha e ser capacitado a partir
de referenciais biomédicos, esse papel diferenciado do ACS dentro da equipe, faz
dele um ator que suscita múltiplas interpretações e intervenções. O caráter híbrido e
polifônico desse ator pode funcionar ora como faciliador, ora como empecilho na
mediação entre a comunidade e a equipe (NUNES et al., 2002).
O ACS é um trabalhador que faz parte da equipe de saúde da comunidade
onde mora e, segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2000a), tem como principal
atribuição estabelecer um elo de ligação entre esses dois universos. Nogueira et al.
(2000) e Carvalho (2002) confirmam o discurso preconizado pelo Ministério da
Saúde - MS e ressaltam a importância do papel social do ACS como mediador,
interferindo positivamente no trabalho da equipe de saúde. Silva e Dalmaso (2002)
constatam que essa identidade ambivalente permite que, em determinadas
situações, o ACS se aproxime mais do pólo institucional, ao passo que em outras se
14
dirige mais para o pólo comunitário. O livre acesso a mundos com características
diferentes (o do usuário e o da unidade de saúde) pode ser um facilitador no
trabalho de promoção e vigilância da saúde, pois viabiliza à equipe obter as
informações necessárias para um diagnóstico situacional e à partir dele mapear o
território de abrangência e estabelecer prioridades e estratégias de intervenção que
se fizerem necessárias.
Em virtude do papel mediador, exercido pelo ACS, Nunes et al. (2002, p.
1640) se referem a esse ator social como sendo o “ator mais intrigante” da equipe.
Segundo Bornstein (2007, p. 205), “a função mediadora exercida pelo ACS pode ser
de grande importância na mudança do modelo assistencial”. Em consonância, Jorge
et al. (2007, p. 12) afirmam que o ACS
vem exercendo o papel de porta voz da comunidade, ajudando a dar
respostas às necessidades da população, desenvolvendo ações de
promoção, prevenção e incentivo à organização local que visam a
melhoria da vida das famílias sob sua responsabilidade.
Neste contexto, a atuação dos ACS é de grande interesse tendo em vista que
estes exercem um papel importante dentro da equipe de Saúde da Família, na
permanente busca pela comunicação e trocas de experiências entre os profissionais
da ESF e a comunidade.
Na prática, pude observar que essa dicotomia, muitas vezes, causava
conflitos dentro e fora da equipe. Durante minhas visitas domiciliares, ouvia de
usuários questionamentos sobre qual era, afinal, o papel do ACS. O usuário percebe
o ACS como um fiscalizador em virtude de seu monitoramento da comunidade, ou
seja, se está tomando o anti-hipertensivo, se levou o filho para tomar a vacina ou se
a gestante fez a consulta de pré-natal. Em contrapartida entendo que as funções do
ACS podem estar diretamente ligadas à promoção, como o estímulo a manutenção
e
melhoria
das
condições
de
saúde
da
população,
a
promoção
da
desmonopolização do saber técnico para a população assistida e o estímulo à
incorporação da noção do autocuidado. Porém, o que se observa no cotidiano é que
quando o ACS circula entre a comunidade e a equipe, ele não quer ser reconhecido
como comunidade, também se reconhece no papel de fiscalizador. Essa visão que
os usuários e o próprio ACS têm dele próprio instiga uma reflexão sobre a identidade
desse ator. O que remete a pensar que o papel do ACS é uma identidade em
construção. O ACS talvez não tivesse se apropriado do seu importante papel. Por
15
outro lado, quando questionados sobre o assunto, referem sentir-se desvalorizados,
muitos não se sentem como integrantes da equipe de saúde, não conseguem
visualizar o impacto de suas ações e falta motivação.
Naquele momento percebi que poderia ajudá-los para que resgatassem sua
autoestima e valorização profissional. Nascia assim a preocupação com estes
profissionais para que os mesmos conseguissem estabelecer vínculos de
compromisso e corresponsabilidade com a comunidade, bem como estimular a
organização das comunidades de forma a exercer o controle social das ações e
serviços de saúde, através da concepção e prática da Promoção e Educação em
Saúde.
O presente projeto assim justifica-se pelos relatos, tantas vezes mencionados,
das ACS quanto ao fato de sentirem necessidade de se instrumentalizar para poder
desenvolver, junto à comunidade, ações educativas que promovessem mudanças
positivas para a sua saúde. Entretanto, além de não terem clareza desse papel
educativo, não sabem que hoje a Educação em Saúde pode fazer parte de uma
estratégia maior, a Promoção da Saúde cuja efetivação é condição sine qua non
para que sejam cumpridos os preceitos do Sistema Único de Saúde - SUS e ESF.
Esta discussão foi retomada inúmeras vezes até que se tornou um projeto.
Seu intuito vem ao encontro de um dos eixos da Atenção Básica que trata da
Promoção da Saúde e suas conexões com a prática da Educação em Saúde,
valorizando os diferentes saberes para a construção da cidadania e autonomia de
seus cidadãos, onde a ESF exerce papel fundamental.
Levando-se em consideração que o ACS como parte da comunidade, tem o
desafio de reconhecer na realidade local necessidades e potencialidades de
mudança, bem como de articular-se com a mesma em prol dessas mudanças,
pressupõe-se que o mesmo deva estar devidamente preparado para exercer o seu
papel como educador. Para tanto, deve apropriar-se do conhecimento necessário
para conquistar sua autoconfiança, bem como estabelecer uma relação dialógica
que possibilite estabelecer o vínculo e conquistar a confiança da população de sua
área de abrangência. Suas ações devem ser voltadas para os problemas detectados
no diagnóstico realizado a partir do cadastramento das famílias, sempre sob o olhar
atento de seu enfermeiro supervisor. Sua atuação deve levar em conta a realidade
específica de cada comunidade, sempre amparado num planejamento prévio com
toda a equipe de Saúde da Família.
16
Para que o mesmo consiga desenvolver ações de Promoção da Saúde é
preciso perceber quais são as suas concepções sobre saúde e de que forma
percebem e aplicam esse conhecimento na prática. As ações de Educação em
Saúde tem relação direta com a Promoção da Saúde, seja quando se relacionam a
seus princípios; por exemplo, desenvolver habilidades para a saúde, fortalecer a
ação comunitária e mesmo quando se fala em mudança do modelo assistencial,
pois, numa educação emancipatória, o usuário é tratado como sujeito e não objeto.
Foi com estas ideias que tentamos problematizar algumas práticas dos ACS.
Para problematizar estes temas escolhi trabalhar com o método Paulo Freire
e busquei juntamente aos ACS, através da reflexão-ação sobre suas atuais práticas
de Promoção e Educação promover resignificações.
A escolha pela pesquisa qualitativa, tendo como inspiração a Pesquisa
Participante, dá-se pelo fato de que a mesma envolve um processo de investigação,
educação e ação. Trabalhar na perspectiva libertadora constitui-se num grande
desafio, pois segundo Freire (1981, p. 35), a “pesquisa como ato de conhecimento,
tem como sujeitos cognoscentes, de um lado, os pesquisadores profissionais; de
outro os grupos populares e, como objeto a ser desvelado, a realidade concreta”.
Levando-se em consideração que a ESF é a porta de entrada para o SUS e
que a mesma é uma ferramenta usada para a mudança no modelo de atenção,
considero ser pertinente este estudo, por entender que o papel do ACS se constitui e
se afirma como tal, na medida em que esse se apropria do real sentido e significado
da sua existência.
Assim constitui-se o objetivo geral do estudo discutir e refletir sobre o
conceito, as concepções e as práticas de Promoção da Saúde desenvolvidas pelos
ACS e sua ligação com a Educação em Saúde com vistas à elaboração de
propostas de ações para a comunidade assistida.
Escolhi realizar oficinas com os ACS por entender que é uma forma de
vivenciar situações concretas e significativas, baseada no tripé: sentir-pensar-agir,
com objetivos pedagógicos. É o espaço onde ocorrem apropriação, construção e
produção de conhecimentos teóricos e práticos, de forma ativa e reflexiva. Cuberes
apud Vieira e Volquind (2002, p. 11), conceitua como sendo “um tempo e um espaço
para aprendizagem; um processo ativo de transformação recíproca entre sujeito e
objeto; um caminho com alternativas, com equilibrações que nos aproximam
progressivamente do objeto a conhecer”.
17
Utilizei-me da metodologia problematizadora de Paulo Freire, para discutir
questões relativas à Promoção de Saúde e Educação em Saúde (concepções e
aplicabilidades) e identificar como ocorre a atuação dos ACS neste contexto:
verificar as dificuldades e potencialidades no que se refere à forma como os ACS
percebem e trabalham a Promoção da Saúde e a Educação em Saúde com a
comunidade, dentro e fora da Unidade Básica de Saúde - UBS e, finalmente, propor
junto com os ACS ações de saúde visando à Promoção da Saúde da comunidade
através da Educação em Saúde.
18
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 Breve retrospectiva histórica da saúde no Brasil e a entrada do ACS como
trabalhador em saúde
O movimento da Reforma Sanitária Brasileira remonta a segunda metade dos
anos 70 em meio a lutas por liberdade democrática contra a ditadura, movimento
sindical e posteriormente movimentos sociais que exerciam pressão sobre a
Assembleia Nacional Constituinte. Mas é somente na década de 80 que este
movimento toma força a partir da organização da sociedade civil que lutava em prol
de uma saúde de qualidade, em todos os níveis de complexidade (DONIAK, 2002).
Essa luta culminou com a 8ª Conferência Nacional de Saúde – CNS, realizada em
Brasília no ano de 1986, e em muito contribuiu para a elaboração da nova
Constituição Federal de 1988 que criou e instituiu o Sistema Único de Saúde – SUS.
Nos anos 90 o Brasil foi palco de grandes mudanças nas políticas de saúde,
norteadas pela urgência em romper com paradigmas dominantes no campo da
saúde e a necessidade de reorganizar a atenção básica.
Foram necessárias as leis orgânicas 8.080 e a 8.142, homologadas somente
em 1990, para que efetivamente entrassem em vigor os artigos da Constituição. E
somente em 1992, com dois anos e atraso, é que se realiza a 9ª CNS que define as
Normas Operacionais Básicas (NOB), para que o SUS começasse a funcionar, de
fato (DA ROS et al., 2006).
A NOB/96 surge como um instrumento de regulação do SUS, redefinindo as
responsabilidades dos Estados, do Distrito Federal e da União, ao mesmo tempo em
que explicita e dá consequência prática, em toda sua totalidade aos princípios e
diretrizes do SUS. Está consubstanciada na Constituição Federal e nas Leis No.
8.080/90 e No. 8.142/90, favorecendo, ainda, mudanças essenciais no modelo de
atenção à saúde no Brasil (BRASIL, 1996).
Com o advento do SUS foi estabelecido um conjunto de prioridades políticas
de forma a garantir a mudança no modelo assistencial vigente, ainda focado numa
visão biomédica e hospitalocêntrica. Neste contexto, surge o então chamado
Programa de Saúde da Família (PSF) com a finalidade de reorganizar os sistemas
19
de saúde, reorientando suas práticas, tendo como propósito a superação
fragmentada do ser humano. Seu foco principal é o de desenvolver uma atenção
integral, prestada por equipe multiprofissional, ao indivíduo e comunidade,
fomentando a intensa participação desta. Para tanto, em junho de 1991 deu-se início
a implantação do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) e, na
sequência, em janeiro de 1994, formaram-se as primeiras equipes de Saúde da
Família, incorporando e ampliando a atuação dos ACS com o propósito de auxiliar
os municípios na implementação da Atenção Básica.
Segundo Sá Filha (2000), o PACS foi o primeiro programa a trabalhar com
noção de área de abrangência e cobertura por família, fugindo da concepção
meramente individualista, enfocando a família como objeto de ação.
Considerando que o PSF tem como objetivo a reorganização da atenção
primária, muitos e complexos são os desafios a serem superados para consolidar-se
enquanto tal, sendo imprudente estabelecer um tempo para finalizar esta
reorganização.
Embora rotulado como programa, o PSF, por suas especificidades, foge à
concepção usual dos demais programas concebidos no Ministério da Saúde (MS), já
que não é uma intervenção vertical e paralela as atividades dos serviços de saúde.
Pelo contrário, caracteriza-se como uma estratégia que possibilita a integração e
promove a organização das atividades em um território definido, com o propósito de
propiciar o enfrentamento e resolução dos problemas identificados (BRASIL, 1997a).
Sendo assim, o MS entende que se faz necessário uma mudança de nomenclatura
passando o PSF a ser chamado de Estratégia Saúde da Família (ESF).
Em virtude da expansão do PSF e consolidação da ESF, em 28 de março de
2006 o MS aprovou a Política Nacional de Atenção Básica, através da publicação da
Portaria nº 648. A referida Portaria estabelecia a revisão de diretrizes e normas para
a organização da Atenção Básica para o PSF e o PACS. A mesma foi revogada em
21 de outubro de 2011 quando passou a vigorar a Portaria 2.488.
Segundo a Portaria 2.488, o Ministério da Saúde caracteriza a Atenção
Básica
20
[...] por um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e
coletivo, que abrange a promoção e a proteção da saúde, a
prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação,
redução de danos e a manutenção da saúde com o objetivo de
desenvolver uma atenção integral que impacte na situação de saúde
e autonomia das pessoas e nos determinantes e condicionantes de
saúde das coletividades. É desenvolvida por meio do exercício de
práticas de cuidado e gestão, democráticas e participativas, sob
forma de trabalho em equipe, dirigidas a populações de territórios
definidos, pelas quais assume a responsabilidade sanitária,
considerando a dinamicidade existente no território em que vivem
essas populações. Utiliza tecnologias de cuidado complexas e
variadas que devem auxiliar no manejo das demandas e
necessidades de saúde de maior freqüência e relevância em seu
território, observando critérios de risco, vulnerabilidade, resiliência e
o imperativo ético de que toda demanda, necessidade de saúde ou
sofrimento devem ser acolhidos. É desenvolvida com o mais alto
grau de descentralização e capilaridade, próxima da vida das
pessoas. Deve ser o contato preferencial dos usuários, a principal
porta de entrada e centro de comunicação da Rede de Atenção à
Saúde. Orienta-se pelos princípios da universalidade, da
acessibilidade, do vínculo, da continuidade do cuidado, da
integralidade da atenção, responsabilização, da humanização, da
equidade e da participação social. A Atenção Básica considera o
sujeito em sua singularidade e inserção sócio-cultural, buscando
produzir a atenção integral (BRASIL, 2011).
Para que tais ações possam ser colocadas em prática, faz-se necessária a
formação das Equipes de Saúde da Família, cujas condições foram determinadas,
conforme a Portaria 2.488:
I - Existência de equipe multiprofissional (equipe saúde da família) composta por, no
mínimo, médico generalista ou especialista em saúde da família ou médico de
família e comunidade, enfermeiro generalista ou especialista em saúde da família,
auxiliar ou técnico de enfermagem e agentes comunitários de saúde, podendo
acrescentar a esta composição, como parte da equipe multiprofissional, os
profissionais de saúde bucal: cirurgião dentista generalista ou especialista em saúde
da família, auxiliar e/ou técnico em Saúde Bucal;
II - O número de ACS deve ser suficiente para cobrir 100% da população
cadastrada, com um máximo de 750 pessoas por ACS e de 12 ACS por equipe de
Saúde da Família, não ultrapassando o limite máximo recomendado de pessoas por
equipe;
21
III - Cada equipe de saúde da família deve ser responsável por, no máximo, 4.000
pessoas, sendo a média recomendada de 3.000 pessoas, respeitando critérios de
equidade para esta definição. Recomenda- se que o número de pessoas por equipe
considere o grau de vulnerabilidade das famílias daquele território, sendo que
quanto maior o grau de vulnerabilidade menor deverá ser a quantidade de pessoas
por equipe;
IV - Cadastramento de cada profissional de saúde em apenas 01 (uma) ESF,
exceção feita somente ao profissional médico que poderá atuar em no máximo 02
(duas) ESF e com carga horária total de 40 (quarenta) horas semanais; e,
V - Carga horária de 40 (quarenta) horas semanais para todos os profissionais de
saúde membros da equipe de saúde da família. A jornada de 40 (quarenta) horas
deve observar a necessidade de dedicação mínima de 32 (trinta e duas) horas da
carga horária para atividades na equipe de saúde da família podendo, conforme
decisão e prévia autorização do gestor, dedicar até 08 (oito) horas do total da carga
horária para prestação de serviços na rede de urgência do município ou para
atividades de especialização em saúde da família, residência multiprofissional e/ou
de medicina de família e de comunidade, bem como atividades de educação
permanente e apoio matricial.
Serão admitidas também, além da inserção integral (40h), as seguintes
modalidades de inserção dos profissionais médicos generalistas ou especialistas em
saúde da família ou médicos de família e comunidade nas Equipes de Saúde da
Família, com as respectivas equivalências de incentivo federal:
I - 2 (dois) médicos integrados a uma única equipe em uma mesma UBS, cumprindo
individualmente carga horária semanal de 30 horas (equivalente a 01 (um) médico
com jornada de 40 horas semanais), com repasse integral do incentivo financeiro
referente a uma equipe de saúde da família;
II - 3 (três) médicos integrados a uma equipe em uma mesma UBS, cumprindo
individualmente carga horária semanal de 30 horas (equivalente a 02 (dois) médicos
22
com jornada de 40 horas, de duas equipes), com repasse integral do incentivo
financeiro referente a duas equipes de saúde da família;
III - 4 (quatro) médicos integrados a uma equipe em uma mesma UBS, com carga
horária semanal de 30 horas (equivalente a 03 (três) médicos com jornada de 40
horas semanais, de três equipes), com repasse integral do incentivo financeiro
referente a três equipes de saúde da família;
IV - 2 (dois) médicos integrados a uma equipe, cumprindo individualmente jornada
de 20 horas semanais, e demais profissionais com jornada de 40 horas semanais,
com repasse mensal equivalente a 85% do incentivo financeiro referente a uma
equipe de saúde da família; e
V - 1 (um) médico cumprindo jornada de 20 horas semanais e demais profissionais
com jornada de 40 horas semanais, com repasse mensal equivalente a 60% do
incentivo financeiro referente a uma equipe de saúde da família. Tendo em vista a
presença do médico em horário parcial, o gestor municipal deve organizar os
protocolos de atuação da equipe, os fluxos e a retaguarda assistencial, para atender
a esta especificidade. Além disso, é recomendável que o número de usuários por
equipe seja próximo de 2.500 pessoas. As equipes com esta configuração são
denominadas Equipes Transitórias, pois, ainda que não tenham tempo mínimo
estabelecido de permanência neste formato, é desejável que o gestor, tão logo
tenha condições, transite para um dos formatos anteriores que preveem horas de
médico disponíveis durante todo o tempo de funcionamento da equipe.
A referida Portaria diz que os profissionais de saúde bucal que compõem as
equipes de saúde da família podem se organizar nas seguintes modalidades:
I - Cirurgião dentista generalista ou especialista em saúde da família e auxiliar em
saúde bucal (ASB);
II - Cirurgião dentista generalista ou especialista em saúde da família, técnico em
saúde bucal (TSB) e auxiliar em saúde bucal (ASB); e
23
III - Profissionais das modalidades I ou II que operam em Unidade Odontológica
Móvel.
Independente da modalidade adotada recomenda-se que os profissionais de
Saúde Bucal, estejam vinculados a uma ESF e compartilhem a gestão e o processo
de trabalho da equipe tendo responsabilidade sanitária pela mesma população e
território que a ESF à qual integra, e com jornada de trabalho de 40 horas semanais
para todos os seus componentes.
Cada Equipe de Saúde da Família que for implantada com os profissionais de
saúde bucal ou quando se introduzir pela primeira vez os profissionais de saúde
bucal numa equipe já implantada, modalidade I ou II, o gestor receberá do Ministério
da Saúde os equipamentos odontológicos, através de doação direta ou o repasse de
recursos necessários para adquiri-los (equipo odontológico completo).
Além da reorganização dos serviços de saúde, a Estratégia Saúde da Família
tem como pressuposto a reorganização das práticas profissionais.
O trabalho do ACS vem sendo respaldado, legalmente, nos seguintes
documentos:
- Portaria nº 1.886/1997 (BRASIL, 1997b) que aprova as normas e diretrizes
do Programa de Agente Comunitário de Saúde e do Programa de Saúde da
Família, com vistas a regulamentar a implantação e operacionalização dos
referidos Programas.
- Decreto nº 3.189/1999 (BRASIL, 1999) que fixa as diretrizes para o
exercício da atividade de Agente Comunitário de Saúde (ACS) e dá outras
providências.
- Lei nº 10.507/2002 (BRASIL, 2002b) que cria a profissão do Agente
Comunitário de Saúde e dá outras providências. A referida Lei foi revogada
em 2006 quando passou a vigorar a Lei nº 11.350, de 5 de outubro de 2006.
- Portaria nº 44/GM de 03 de janeiro de 2002 (BRASIL, 2002c) que define as
atribuições do ACS na prevenção e no controle da malária e da dengue.
- Lei nº 11.350/2006 (BRASIL, 2006) que regulamenta o § 5º do art. 198 da
Constituição, dispõe sobre o aproveitamento de pessoal amparado pelo
parágrafo único do art. 2º da Emenda Constitucional nº 51, de 14 de fevereiro
de 2006, e dá outras providências.
24
Segundo a Portaria MS n° 2488, de 21 de outubro de 2011, as atribuições
específicas do Agente Comunitário de Saúde são:
I - trabalhar com adscrição de famílias em base geográfica definida, a microárea;
II - cadastrar todas as pessoas de sua microárea e manter os cadastros atualizados;
III - orientar as famílias quanto à utilização dos serviços de saúde disponíveis;
IV - realizar atividades programadas e de atenção à demanda espontânea;
V - acompanhar, por meio de visita domiciliar, todas as famílias e indivíduos sob sua
responsabilidade. As visitas deverão ser programadas em conjunto com a equipe,
considerando os critérios de risco e vulnerabilidade de modo que famílias com maior
necessidade sejam visitadas mais vezes, mantendo como referência a média de 1
(uma) visita/família/mês;
VI - desenvolver ações que busquem a integração entre a equipe de saúde e a
população adscrita à UBS, considerando as características e as finalidades do
trabalho de acompanhamento de indivíduos e grupos sociais ou coletividade;
VII - desenvolver atividades de promoção da saúde, de prevenção das doenças e
agravos e de vigilância à saúde, por meio de visitas domiciliares e de ações
educativas individuais e coletivas nos domicílios e na comunidade, como por
exemplo, combate à Dengue, malária, leishmaniose, entre outras, mantendo a
equipe informada, principalmente a respeito das situações de risco; e
VIII - estar em contato permanente com as famílias, desenvolvendo ações
educativas, visando à promoção da saúde, à prevenção das doenças, e ao
acompanhamento das pessoas com problemas de saúde, bem como ao
acompanhamento das condicionalidades do Programa Bolsa Família ou de qualquer
outro
programa
similar
de
transferência
de
renda
e
enfrentamento
de
vulnerabilidades implantado pelo Governo Federal, estadual e municipal de acordo
com o planejamento da equipe.
25
É permitido ao ACS desenvolver outras atividades nas Unidades Básicas de
Saúde, desde que vinculadas às atribuições acima.
De acordo com o art. 3º da Portaria 2.488, o Agente Comunitário de Saúde
tem como atribuição o exercício de atividades de prevenção de doenças e promoção
da saúde, mediante ações domiciliares ou comunitárias, individuais ou coletivas,
desenvolvidas em conformidade com as diretrizes do SUS e sob supervisão do
gestor municipal, distrital, estadual ou federal.
Parágrafo único. São consideradas atividades do Agente Comunitário de Saúde, na
sua área de atuação:
I - a utilização de instrumentos para diagnóstico demográfico e sócio-cultural da
comunidade;
II - a promoção de ações de educação para a saúde individual e coletiva;
III - o registro, para fins exclusivos de controle e planejamento das ações de saúde,
de nascimentos, óbitos, doenças e outros agravos à saúde;
IV - o estímulo à participação da comunidade nas políticas públicas voltadas para a
área da saúde;
V - a realização de visitas domiciliares periódicas para monitoramento de situações
de risco à família; e
VI - a participação em ações que fortaleçam os elos entre o setor saúde e outras
políticas que promovam a qualidade de vida.
Dentro da nova proposta de ver e entender saúde, é possível identificar duas
dimensões na prática do ACS. A primeira, diz respeito a um caráter estritamente
técnico, relacionado ao atendimento individual e coletivo, o monitoramento de
grupos ou problemas de saúde específicos ou a intervenção para prevenção de
agravos. A segunda se refere a um caráter mais político, explícito no auxílio a
organização da comunidade e luta por melhorias nas condições de vida. É
26
justamente nesta dimensão de caráter mais político que a Educação em Saúde
influencia no relacionamento desenvolvido entre o ACS e usuários/comunidade. No
entanto, a prática da Educação em Saúde exige dos profissionais certa cautela, no
sentido de não torná-la impositiva, ou seja, restringi-la ao mero cumprimento de
orientações repassadas pelos profissionais da ESF. Para que o conceito de
Promoção da Saúde possa, realmente, se efetivar como pensado atualmente, a
Educação em Saúde correspondente necessita ser inclusiva, permeando a troca de
saberes, contribuindo para a efetiva gestão compartilhada dos serviços de saúde e
conhecimento
do
processo
saúde-doença.
Ou
seja,
ela
necessita
ser
“libertadora/problematizadora”, como sabiamente nos ensina Paulo Freire (2005, p.
78). Assim se faz necessário que partamos de um “novo” conceito de saúde que não
aquele que preconizava este processo unicausal ou até multicausal, mas em
considerar o peso destes determinantes, o que passa a ocorrer no Brasil após a 8ª
Conferência de Saúde de 1986 como discorreremos a seguir.
2.2 O conceito ampliado de saúde e a Promoção da Saúde na atualidade
Wendhausen e Saupe (2007) ao se referir à Promoção da Saúde dizem que,
embora a efetivação de suas práticas transcenda o setor sanitário, ela reúne
potencial extraordinário para o desenvolvimento do conceito ampliado de saúde.
O próprio debate em torno do conceito de Promoção de Saúde tem como
ponto de partida o conceito de saúde (CZERESNIA; FREITAS, 2009). Sendo assim,
faz-se necessário, primeiramente, entender o que é saúde e como esta é atualmente
concebida em seu conceito mais amplo.
O conceito de saúde é muito mais do que a ausência de doença, mais do que
o conceito biomédico. Ainda é algo diferente do que propôs a OMS1, que coloca
vários determinantes à saúde, admitindo que todos tem a mesma influência.
O Conceito Ampliado de Saúde é sem dúvida, um dos mais importantes
avanços propiciados pela 8ª CNS, onde diz que saúde é considerada como:
1
A OMS organismo sanitário internacional integrante da ONU, fundada em 1948, diz que: “saúde é o
estado do mais completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de enfermidade
ou invalidez” (OMS, 1946).
27
[...] resultante das condições de alimentação, habitação, educação,
renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer,
liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde. É,
assim, antes de tudo, o resultado das formas de organização social
da produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos
níveis de vida (DA ROS et al., 2006, p. 56).
Segundo a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 196,
saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante
políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de
doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às
ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação
(BRASIL, 1988).
Neste conceito saúde/doença fica entendida como um processo, que é
determinado socialmente.
Assim, adotar como eixo o paradigma promocional, como forma de produzir
saúde, significa comprometer-se com sujeitos e coletividades que expressem
crescente autonomia, crescente capacidade para gerenciar satisfatoriamente os
limites e os riscos impostos pela doença, pela constituição genética e pelo contexto
sócio-político-econômico-cultural, enfim pela vida (CAPONI, 2003).
A Promoção da Saúde emerge como estratégia poderosa e de relevância
para o desenvolvimento social. Ela abarca uma série de princípios que fundamentam
uma série de estratégias, no intuito de promover as condições necessárias às
populações para que se tornem saudáveis e façam escolhas saudáveis. As referidas
estratégias baseiam-se em vários campos do pensamento como: antropologia,
epidemiologia, sociologia, psicologia e outras ciências do comportamento, saúde
pública, ciência política, educação e comunicação, entre outros e suas respectivas
metodologias (HEALTH PROMOTION AGENCY FOR NORTHERN IRELAND, 2004).
Sendo assim, essa forma de conceber saúde reconhece o ser humano na sua
integralidade e a saúde como qualidade de vida. Porém, as gritantes desigualdades
sociais que assolam nosso país constituem um importante desafio na garantia aos
direitos de saúde da população. Para tanto, é preciso gerar condições e
oportunidades para o desenvolvimento social como forma de quebrar o ciclo da
exclusão.
O desenvolvimento de políticas sociais e econômicas se faz necessário para
o desenvolvimento econômico sustentável e distribuição de renda. Cabe ao SUS
28
garantir ações de promoção, proteção e recuperação da saúde tanto do indivíduo
como da coletividade, equitativamente falando (PEREIRA, 2004). Somente assim o
“direito” sairia do papel e passaria a integrar o cotidiano da vida dos brasileiros, o
que se traduz como tarefa árdua e imbricada.
Ao se perceber saúde como qualidade de vida faz-se necessário voltar o olhar
para os condicionantes e os determinantes de saúde citados no Artigo 3º das
Disposições Gerais da Lei 8.080, como: alimentação, moradia, saneamento básico,
meio ambiente, trabalho, renda, educação, transporte, lazer e o acesso que a
população tem aos bens e serviços que lhe são essenciais e de direito (BRASIL,
1990).
É no estabelecimento de parcerias com outros setores e atores que
conseguimos estender a reflexão sobre a nova concepção de saúde. Sendo assim, é
possível desencadear um processo de repensar novas formas de planejar, organizar
e pôr em prática questões relativas à saúde. Para tanto, podemos contar com os
mais variados espaços como: escolas, igrejas, associação de moradores, sindicatos,
empresas, indústrias, Organizações não Governamentais - ONGs, Conselhos Locais
de Saúde – CLS e Conselho Municipal de Saúde entre outros setores e Secretarias
da Administração Municipal.
O conceito ampliado de saúde precisa ser pensado além do ponto de vista da
doença, levando-se em consideração os aspectos econômicos, políticos e históricosociais do ser humano. É preciso entender as relações dinâmicas que o indivíduo
mantém com o outro e sua comunidade, bem como suas variadas formas de
conviver e interagir com o meio ambiente. A partir dessas percepções, do
estabelecimento de parcerias e da participação do maior número de atores
diretamente envolvidos é que podemos então trabalhar, de uma forma mais eficaz,
questões relativas à Promoção da Saúde.
A Promoção da Saúde tem estreita relação com um movimento de crítica à
medicalização do setor e com a vigilância à saúde, que desloca radicalmente o olhar
da doença para o modo de vida das pessoas. Sua essência não limita saúde a mera
ausência de doença e supõe o direito e a capacidade de exercer ação sobre seus
determinantes sociais. Essa aproximação entre a promoção e a vigilância nada mais
é do que o fortalecimento da capacidade de resposta aos velhos e novos desafios.
A atuação dessa vigilância é caracterizada pela intervenção sobre problemas
de saúde que requerem atenção e acompanhamento contínuos; articulação entre
29
ações promocionais, preventivas, curativas e reabilitadoras; atuação intersetorial;
ação sobre o território e intervenção sob a forma de operações (PAIM; ALMEIDA
FILHO, 2000).
Constitui-se num olhar, numa atitude incorporada ao cotidiano, buscando
descortinar e ampliar o campo de visibilidade possibilitando ações mais concretas.
2.3 A história das concepções de promoção da saúde
O médico historiador Henry Ernest Sigerist foi quem utilizou, pela primeira
vez, a expressão “promoção da saúde” no ano de 1945. Sigerist nasceu em 1891
em Paris e morreu em 1957 na Suíça. Graduado na Universidade de Zurique
dedicou-se ao estudo da história da medicina (PEREIRA; PENTEADO; MARCELO,
2000). Foi ele quem definiu as quatro tarefas essenciais da medicina: a promoção de
saúde, a prevenção de doenças, o tratamento dos doentes e a reabilitação,
afirmando que “la salud se promueve proporcionando condiciones de vida decentes,
buenas condiciones de trabajo, educación, cultura física y descanso” (SIGERIST
apud TERRIS, 1992, p. 38).
Essa definição original da promoção, que chama a atenção para os
determinantes sociais da saúde difere da concepção difundida pelo Informe Lalonde
(1974), que privilegiou os fatores particulares (TERRIS, 1992).
O documento de Lalonde destaca a limitação das ações centradas na
assistência médica e questiona oficialmente o impacto e o custo elevado dos
cuidados médicos na saúde (FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ, 2000). O mesmo
propõe ampliar o campo de atuação da saúde pública, intervindo com ênfase em
segmentos da população com maior risco, enfatiza que melhorar a saúde implica em
mudanças de comportamentos cuja responsabilidade cabe a cada indivíduo, bem
como contribui para a identificação de desigualdades sanitárias. Aumenta cada vez
mais a noção de que Promoção da Saúde estava embutida na “História Natural da
Doença”, principalmente quando era considerada unicamente como uma possível
mudança de comportamento, ou seja, como algo a prevenir o risco de adoecer. A
Promoção da Saúde comportaria três níveis de “prevenção” para o que o indivíduo,
juntamente com a família ou grupos, atuaria. Era, portanto neste momento, um
30
enfoque ligado ao risco de adoecer e a escolha individual de um “comportamento”
mais saudável (BUSS, 2003).
Em contraposição, em 1978, ocorreu em Alma-Ata, na Rússia (atual
Cazaquistão), a I Conferência Internacional sobre Atenção Primária à Saúde. A
referida Conferência reconhece a saúde como um direito fundamental do ser
humano e teve um significado ímpar para a saúde pública. Menciona a adoção de
um conjunto de medidas, entre as quais, a Educação em Saúde, a prevenção de
doenças e agravos, o saneamento básico e a prioridade para a atenção à saúde
materno-infantil. Dos resultados obtidos, alguns tiveram bastante significância como:
o incentivo ao aleitamento materno, a adesão ao esquema vacinal, a procura e
distribuição do soro de reidratação oral, o controle da diarreia e infecções
respiratórias, bem como o estabelecimento da prática de puericultura (MATTA;
MOROSINI, 2006).
A Promoção e Proteção da saúde em nível mundial passam a ser condição
sine qua non para o contínuo desenvolvimento social e econômico, contribuindo
para a melhoria da qualidade de vida e para a paz entre os povos. É nessa
Conferência que se reforça o compromisso nacional e internacional com a Atenção
Primária à Saúde, concentrando esforços, de cunho técnico e financeiro, com
especial atenção aos países em desenvolvimento.
O conceito de Promoção da Saúde, assim como o desenvolvimento de novas
práticas coerentes com suas bases político-ideológicas, vem sendo construído nos
últimos anos a partir destes e outros questionamentos que se concretizam a partir da
I Conferência Internacional de Promoção da Saúde, realizada em Ottawa em 1986.
No Brasil, neste momento trava-se uma luta histórica por uma atenção à
saúde cujo modelo priorize ações com impacto positivo para a saúde do sujeito e
coletividade, o que se concentra na 8a Conferência Nacional de Saúde. O esforço
investido para a formulação, implementação e concretização de políticas de
promoção, proteção e recuperação da saúde, traduz a consciência de que o modelo
biomédico, com todo o seu instrumental científico-tecnológico, por si só, não dá
conta da gama de determinantes e condicionantes a que estamos submetidos. Fazse necessário pensar saúde de uma forma mais global, relacionando-a aos modos
de viver e não de forma reducionista relacionando-a meramente a determinação
genética e biológica.
31
Estudos contemporâneos realizados sobre a saúde mundial apontam para
uma realidade preocupante. A pobreza crescente, fruto do descontrole do processo
de globalização, que não deu conta de questões relativas ao desenvolvimento
social, tem provocado consequências desastrosas para a saúde da população. A
violação dos direitos humanos, o crescente número de vítimas de violências e
acidentes, o ressurgimento de antigas endemias, o aumento de doenças crônicas
não transmissíveis e a disseminação de micro-organismos desconhecidos tem sido
motivo de alerta mundial. Tais consequências tornam evidente a incapacidade do
modelo biomédico vigente em dar conta de tal problemática, o que inviabiliza as
promessas de saúde para todos no início do século XXI (DECLARAÇÃO DE ALMAATA, 1978 apud BRASIL, 2002a; KICKBUSCH, 2003; SANTOS, 2001).
No Brasil o Ministério da Saúde Pública, cria através da Portaria nº 1190 –
GAB/MS, de 14/07/2005, o Comitê Gestor da Política Nacional de Promoção da
Saúde, cujas atribuições encontram-se em anexo (Anexo A). Embora possamos ter
críticas, pois essa política tem desdobramentos operacionais que se voltam muito
mais para a mudança de comportamento individual que para a busca da cidadania, o
Ministério da Saúde assume a Promoção da Saúde como uma prioridade nacional.
A partir daí estabelece uma Agenda Nacional (2005-2007) num esforço de
sistematização e consolidação de ações e estratégias no campo da Promoção da
Saúde, bem como a construção de documento que subsidie o trabalho do Comitê
Gestor da Política Nacional de Promoção da Saúde. Os objetivos e as estratégias
para atingi-los estão no anexo (Anexo B).
Em resposta às demandas do setor sanitário, em 2006 o MS publica a Política
Nacional de Promoção da Saúde (PNPS). Esse modo de entender saúde traduz-se
na definição de seu objetivo geral que é o de:
[...] promover a qualidade de vida e reduzir vulnerabilidade e riscos à
saúde relacionados aos seus determinantes e condicionantes –
modos de viver, condições de trabalho, habitação, ambiente,
educação, lazer, cultura, acesso a bens e serviços essenciais [...]
(BRASIL, 2006).
Assim, em nosso país cujas demandas da realidade sanitária brasileira
suscitam medidas urgentes na tentativa de reduzir os riscos e promover uma vida
saudável, outros modos de compreender o estreito vínculo entre a produção do
conhecimento e qualidade de vida, como o paradigma da Promoção da Saúde e da
32
Educação em Saúde, podem contribuir na busca da integralidade e da produção de
cidadania e autonomia. A população brasileira vem construindo, ao longo dos anos,
um extraordinário processo dialógico de teoria/prática, reflexão/ação. Esse processo
se expressa na criação do SUS que vem aprofundando o debate em torno da saúde.
O somatório de atitudes pró-ativas, baseada na cooperação e no respeito às
singularidades, promovem mudanças na cultura organizacional cujo objetivo é a
adoção de práticas horizontais de gestão com ênfase na organização do trabalho em
equipe. A Promoção e Educação em Saúde, tem como finalidade a formação de
sujeitos críticos e comprometidos com a saúde individual e coletiva. Para tal, é
importante entender que para alcançarmos uma saúde de qualidade é preciso
compartilhar, trocar, construir e disseminar o conhecimento, articulando e somando
esforços em prol do bem viver.
Para que o desenvolvimento no campo da Promoção da Saúde possa ser
visualizado historicamente, proponho o seguinte esquema, por ordem cronológica,
conforme Quadro 1. A seguir discorreremos sobre cada um destes eventos.
ANO
CONFERÊNCIA
1986 I Conferência Internacional sobre
Promoção da Saúde em Ottawa
1988 II Conferência Internacional sobre
Promoção da Saúde em Adelaide
1991 III Conferência Internacional sobre
Promoção da Saúde em Sundsvall
1992 Conferência
Internacional
sobre
Promoção da Saúde em Bogotá
1993 Primeira Conferência de Promoção da
Saúde no Caribe, em Port of Spain
1997 IV Conferência Internacional sobre
Promoção da Saúde em Jacarta
1998 Rede de Mega Países para Promoção
da Saúde, Suíça
2000 V Conferência Internacional sobre
Promoção da Saúde na cidade do
México
TEMA/OBJETIVO
Promoção da Saúde nos Países
Industrializados
Promoção da Saúde e Políticas
Públicas Saudáveis
Promoção da Saúde e Ambientes
Favoráveis à Saúde
Promoção da Saúde na América Latina
Elaborada, a pedido da 13ª Reunião dos
Ministros responsáveis pela saúde da
região. A Carta do Caribe para a
Promoção da Saúde defendia a
igualdade social e a atenção primária
em saúde como fatores de bem-estar
social.
Promoção da Saúde no Século XXI
Comunicação
Nasceu
do
reconhecimento
da
necessidade e do potencial para
possibilitar um maior impacto na saúde
mundial, por meio da formação de uma
aliança entre os países mais populosos.
Promoção da Saúde: Rumo a Maior
Equidade
33
ANO
CONFERÊNCIA
TEMA/OBJETIVO
2002 III Conferência Latino Americana de Visão Crítica da Promoção da Saúde e
Promoção da Saúde e Educação para a Educação para Saúde: Situação Atual e
Saúde, em São Paulo
Perspectivas
2005 VI Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde num Mundo
Promoção da Saúde em Bangkok
Globalizado
2007 Conferência Internacional de Saúde De Alma-Ata à Declaração do Milênio
para o Desenvolvimento, em Buenos
Aires
2009 VII
Conferência
Mundial
sobre Ação sobre os Determinantes Sociais
Promoção da Saúde em Nairobi de Saúde para a Equidade
(Quênia)
Quadro 1 - A evolução das conferências de promoção da saúde
Fonte: Elaborado pela pesquisadora (2012)
Em decorrência das expectativas mundiais por uma saúde pública eficiente, a
I Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde em Ottawa (1986) teve como
tema a “Promoção da Saúde nos Países Industrializados”, focalizando em especial
as necessidades dos países industrializados, e estendendo tal necessidade aos
demais países.
Mediante os progressos alcançados após a Declaração de Alma-Ata para a
Atenção Primária à saúde, o documento da OMS “As Metas de Saúde para Todos” e
o debate ocorrido na Assembléia Mundial da Saúde sobre as ações intersetoriais
necessárias, foi elaborada a Carta de Ottawa, que estabelecia fatores de
importância para o alcance de uma saúde para todos. Este momento é emblemático
para a nova perspectiva da Promoção da Saúde e a Carta de Ottawa daí decorrente
identifica cinco estratégias básicas, as quais continuam sendo referência são
(BRASIL, 2002a):
− Criação de políticas de saúde pública.
− Criação de ambientes de suporte para a saúde.
− Reforço da ação e participação comunitárias.
− Desenvolvimento das capacidades individuais.
− Reorientação dos serviços de saúde.
Na sequência, a II Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde em
Adelaide (1988) teve como tema central a “Promoção da Saúde e Políticas Públicas
Saudáveis” (BRASIL, 2002a), ressaltando a importância das políticas voltadas para
34
a saúde e as principais alternativas mantiveram a direção já estabelecida nas
Conferências de Alma-Ata e Ottawa.
As estratégias para a ação em prol de políticas públicas voltadas para a
saúde foram estabelecidas no documento denominado Declaração de Adelaide,
cujas recomendações estabelecem uma nova direção para as políticas de saúde,
pelo realce do envolvimento dos indivíduos, pela cooperação entre os diferentes
setores da sociedade e os cuidados primários de saúde (e a sua criação). Identificou
quatro áreas prioritárias: apoio à saúde da mulher; alimentação e nutrição; tabaco e
álcool; criação de ambientes favoráveis.
Três anos depois, a III Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde
foi realizada em Sundsvall (1991), cujo tema era “Promoção da Saúde e Ambientes
Favoráveis à Saúde” (BRASIL, 2002a), com a conclamação de todos os povos do
globo para o engajamento na causa ecológica como fator de saúde, apontando para
a situação de milhões de pessoas que vivem em extrema pobreza, em ambientes
ameaçadores à saúde. Propõe a ação de diversos segmentos da sociedade para
obtenção do desenvolvimento de ambientes físicos, sociais, econômicos e políticos
mais favoráveis à saúde.
A Conferência de Sundsvall (BRASIL, 2002a) aponta dois princípios para a
implementação das estratégias da saúde para todos:
− A equidade deve ser uma prioridade básica na criação de ambientes de
suporte para a saúde.
− Deve ser reconhecida a interdependência entre os seres humanos na ação
pública para a criação de ambientes de suporte para a saúde.
A Declaração de Sundsvall preconiza que o princípio da equidade deve
nortear a criação de ambientes promotores de saúde (SÍCOLI; NASCIMENTO,
2003), e que todos tem um papel na criação de ambientes favoráveis e promotores
da saúde.
Engloba quatro aspectos importantes: a dimensão social; a dimensão política;
a dimensão econômica e a necessidade de reconhecer e utilizar a capacidade e o
conhecimento das mulheres em todos os setores, inclusive o político e o econômico.
Em decorrência das discussões a nível mundial, em 1992 ocorre a
Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde de Bogotá trazendo ao debate
35
o significado da “Promoção da Saúde na América Latina” (BRASIL, 2002a), para o
qual foram apresentados compromissos e estratégias relacionadas com o sucesso
da saúde da população da região. A referida Conferência discutiu a transformação
da cultura e do setor saúde a fim de garantir acesso universal e estimulou o
compromisso social para assumir a vontade política de fazer da saúde uma
prioridade (WESTPHAL, 2006; HEIDMANN et al., 2006).
No ano seguinte, em 1993, foi elaborada a Primeira Conferência de Promoção
da Saúde no Caribe, em Port of Spain. A Carta do Caribe para a Promoção da
Saúde, foi elaborada a pedido da 13ª Reunião dos Ministros responsáveis pela
saúde da região. O documento, seguindo as metas das conferências anteriores,
defende a igualdade social e a atenção primária em saúde como fatores de bemestar social.
A Carta do Caribe (OPS, 1993) reforçou a importância da Promoção da
Saúde, e apresentou seis estratégias fundamentais.
− Elaboração de políticas públicas saúdáveis.
− Reorientação dos serviços de saúde.
− Empoderamento das comunidades para alcançar o bem-estar.
− Criação de ambientes favoráveis à saúde.
− Desenvolvimento/implementação de habilidades pessoais para a saúde.
− Construção de alianças, principalmente com os meios de comunicação.
Com o tema “Promoção da Saúde no Século XXI”, ocorreu em 1997 a IV
Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde em Jacarta. A mesma destacase por ter sido a primeira a ter lugar em um país em desenvolvimento e a incluir o
setor privado no apoio à promoção da saúde. Ofereceu uma reflexão sobre os
determinantes da saúde, na identificação das direções e estratégias necessárias
para enfrentar os desafios do século XXI, tendo originado a Declaração de Jacarta
(BRASIL, 2002a). O referido documento identifica cinco prioridades:
− Promoção da responsabilidade social da saúde.
− Aumento dos investimentos para o desenvolvimento da saúde.
− Consolidação e expansão das parcerias para a promoção da saúde.
36
− Aumento das capacidades comunitárias e do empowerment individual.
− Assegurar infraestruturas para a promoção da saúde.
Ainda nesta conferência é criada uma aliança mundial para a promoção da
saúde que tem como meta promover as prioridades de ação para a promoção da
saúde:
− Aumento da sensibilização sobre os determinantes da saúde em constante
mudança.
− Apoio à criação de atividades de colaboração e de redes para o
desenvolvimento sanitário.
− Mobilização de recursos para a promoção da saúde.
− Acumulação de conhecimentos sobre as melhores práticas.
− Facilitação da aprendizagem partilhada.
− Promoção da solidariedade em ação.
− Promoção da transparência e da responsabilidade pública na prestação de
contas na promoção da saúde.
Em consonância ao movimento existente na época, no ano de 1998, em
Genebra, Suiça, foi idealizada pela Organização Mundial da Saúde a Rede de
Megapaíses para Promoção da Saúde em reconhecimento da necessidade da
formação de uma aliança entre os países mais populosos na busca de soluções
para a promoção da saúde (BRASIL, 2002a).
Atualmente os megapaíses (Bangladesh, Brasil, China, Índia, Indonésia,
Japão, México, Nigéria, Paquistão, Federação Russa e Estados Unidos da América)
atingem 60% da população mundial. Tal diversidade de países engloba todos os
níveis de desenvolvimento, o que implica diferentes estágios nos padrões de
morbidade e de mortalidade. Tal realidade exige um trabalho conjunto, cuja
representatividade os permita traçar os rumos para a aquisição de políticas de
promoção à saúde. Para tal, a Rede de Megapaíses propõe como metas: melhorar a
base de informações da promoção, desenvolvimento da saúde, aumento da
intersetorialidade e parcerias para melhorar a distribuição dos recursos para a
saúde.
37
Na virada do século, no ano 2000, acontece a V Conferência Internacional
sobre Promoção da Saúde na Cidade do México, com o tema “Promoção da Saúde:
Rumo a Maior Equidade”. A mesma reconheceu a responsabilidade dos governantes
nas políticas de saúde, assim como a necessidade do compartilhamento dessas
estratégias entre todos os setores sociais (BRASIL, 2002a).
O documento proposto, a Declaração do México, constatou uma melhora
significativa do bem-estar social em muitos países do mundo, porém ressaltou a
persistência de problemas que exigiam solução urgente e, para tanto, estabeleceu
ações dirigidas à saúde, em especial à Saúde Pública.
A Declaração reforça a importância das ações de promoção à saúde nos
programas e políticas governamentais, no nível local, regional, nacional e
internacional, bem como valoriza as ações intersetoriais para assegurar a
implementação das ações de promoção e ampliar as parcerias na área da saúde. No
entanto, verificou-se que persistiam ainda muitos problemas de saúde que
prejudicavam o desenvolvimento econômico e social. Portanto, deveriam ser
urgentemente resolvidos para promover uma situação mais equitativa em termos de
saúde e bem estar. Foi constatada a urgência de se abordar os determinantes
sociais, econômicos e ambientais da saúde e o fortalecimento de mecanismos de
colaboração para a promoção da saúde em todos os níveis e setores da sociedade
(WESTPHAL, 2006).
Já no Brasil, em 2002, acontece em São Paulo a III Conferência Latino
Americana de Promoção da Saúde e Educação para a Saúde. O tema da
Conferência, "Visão Crítica da Promoção da Saúde e Educação para Saúde:
Situação Atual e Perspectivas", teve como objetivo o estímulo e o desenvolvimento
de estratégias de promoção da qualidade de vida e saúde e educação para a saúde
na América Latina. Promoveu o debate sobre princípios, estratégias e compromissos
orientados para a universalidade e a equidade no acesso aos direitos fundamentais
e sociais da região.
Voltando às Conferências Internacionais, em 2005 ocorre a VI Conferência
Internacional sobre Promoção da Saúde em Bangkok. O tema foi a “Promoção da
Saúde num Mundo Globalizado”, com a elaboração da Carta de Bangkok, que
buscou identificar as ações, os compromissos e as promessas necessárias para
abordar os determinantes da saúde num mundo globalizado, através da promoção
da saúde.
38
A Promoção da Saúde foi definida na Carta de Bankok como sendo “o
processo que permite às pessoas aumentar o controle sobre sua saúde e seus
determinantes, mobilizando-se (individualmente e coletivamente) para melhorar a
sua saúde” (WHO, 2005).
A Carta de Bangkok se dirigiu a todas as organizações responsáveis pela
manutenção dos objetivos de saúde, e defendeu como requisito do desenvolvimento
global as políticas e alianças capazes de capacitar as comunidades para a melhoria
social, além de reafirmar os valores e estratégias da Carta de Ottawa.
Em 2007, em Buenos Aires, Argentina, é realizada a Conferência
Internacional de Saúde para o Desenvolvimento, promovida pelo Ministério de
Saúde do país. Seu tema, “De Alma-Ata à Declaração do Milênio; Conferência
Internacional de Saúde para o Desenvolvimento: Direitos, Fatos e Realidades”,
buscou contribuir para a concretização dos “Objetivos de Desenvolvimento do
Milênio” previstos para 2015, ressaltando a importância da força de trabalho em
saúde.
Os principais tópicos em discussão foram os “Cuidados primários e sistemas
de saúde no atual contexto global”, os “Recursos humanos para o novo milênio” e a
“Equidade na saúde e financiamento”. Referenda o evento – vide internet.
Mais recentemente, em 2009, em Nairobi/Quênia, houve a VII Conferência
Mundial sobre Promoção da Saúde. O tema “Ação sobre os Determinantes Sociais
de Saúde para a Equidade” foi amplamente discutido, sendo reforçado os benefícios
da Promoção da Saúde quando utilizada corretamente.
A VII Conferência trouxe como temas centrais: o empoderamento comunitário
e dos indivíduos, o fortalecimento dos processos participativos e o fortalecimento
das lideranças e das forças de trabalho. A partir do debate em torno dos temas,
buscou-se reafirmar os valores, princípios e estratégias de ações para a Promoção
da Saúde no intuito de reduzir as iniquidades em saúde e a pobreza e promover
saúde e qualidade de vida (WHO, 2010).
O ex-presidente da Comissão dos Determinantes da Saúde, o Professor
Michael Marmout, destacou em seu discurso os aspectos chaves para que se
alcance uma Promoção da Saúde de qualidade:
− Justiça Social.
− Maior poder às comunidades, no domínio social, psicológico e político.
39
− Criação de condições que permitam às pessoas um maior controle sobre
suas próprias vidas.
Declarou que os países de baixa renda foram afetados pela crise financeira
internacional e que em muitos países o problema está na má distribuição de renda e
na forma como esta é utilizada e não propriamente a falta de dinheiro.
A presente Conferência contou com a participação de mais de 500 delegados
provenientes de 102 países e culminou com uma Declaração para a Ação.
A Promoção da Saúde se estabelece dentro de uma proposta holística,
incorporando a integralidade e a complexa relação sujeito-ambiente, contemplando
em seus projetos, questões éticas, valores, situações concretas, engajamento ativo
e a construção dinâmica do conhecimento. A noção de correlação entre as
comunidades, os profissionais e os espaços institucionais nos remete a um trabalho
educativo em rede onde o emprego das metodologias participativas visam a
interação e a mobilização social (POLONIA; ALVES, 2003) e um sujeito ativo em
relação à sua saúde. Neste sentido a Educação em Saúde como estratégia para
promover a saúde deve ter o mesmo embasamento, de fomentar nos sujeitos que a
saúde é um direito e é produzida socialmente. Para se obter uma prática educativa
emancipatória é preciso compreender como foi historicamente pensada e praticada,
para chegar-se atualmente ao que se propõe que seja um educar para a
emancipação.
2.4 Breve retrospectiva histórica das ações educativas no campo da saúde
Desde a Europa Medieval, acreditava-se na importância da educação em
saúde. Na época, para obter boa saúde e viver mais, era preciso uma alimentação
correta, práticas adequadas de higiene e horas prolongadas de sono. Já no século
XVIII, sob a luz das ideias de John Locke, houve uma intensa divulgação de
conhecimentos científicos, por meio de publicações em livros e periódicos,
referentes a questões de higiene e saúde. Porém este conhecimento ficou restrito as
classes dominantes (ROSEN, 1994). Pode-se dizer que não só naquela época, mas
também nos dias atuais, a pura e simples divulgação de informações ainda é vista
40
como suficiente para provocar mudanças no comportamento da população. O que
não só não é verdade, como é igualmente perigoso.
Após uma série de investigações realizadas na Europa, a Teoria Microbiana
das Doenças, que sustenta que os microorganismos são a causa de inúmeras
doenças, foi confirmada no final do século XIX (ROSEN, 1994). A concepção
biológica da doença foi marcada por uma educação controladora, baseada na teoria
tradicional liderada por Durkheim, hoje considerado um dos pais da Sociologia
moderna. Sua teoria explicava de uma forma simplista o surgimento das doenças
condicionando-as à “ignorância e descaso das pessoas”. O ensino higienista, desde
o início do século XIX, já fazia parte do curriculum de formação médica exercendo
influencias na área de educação em saúde.
No Brasil, até o início do século XX as preocupações do setor saúde estavam
focadas apenas nas situações de epidemia e, no campo da educação, limitava-se ao
ensino de hábitos de higiene. A visão positivista subjacente era de que a educação
poderia corrigir através da higiene a ignorância do indivíduo que comprometia a sua
saúde, e de que a saúde individual era a base da estabilidade e segurança da
nação. Em virtude disso, o nascimento da Educação em Saúde no Brasil é marcado
por discursos e práticas normalizadoras. O controle sobre a doença e o exclusivo
poder da cura estava nas práticas dos profissionais, “rotulando as eventuais
resistências e os saberes alternativos de cegueira política, ignorância do povo, má-fé
dos charlatães” (ALVES, 2005 apud COSTA, 1987, p. 44).
O primeiro movimento sistemático de Educação em Saúde no Brasil ocorreu
durante o governo de Rodrigues Alves, em 1904, liderado por Oswaldo Cruz. Nessa
época, o poder exercido pela polícia sanitária no Rio de Janeiro, através de práticas
coercitivas de Educação em Saúde no controle das enfermidades, vacinação
compulsória, vigilância sobre o comportamento da população pobre, influenciou na
arquitetônica das cidades e dos portos. Vasconcelos (2001) denominou essas
práticas de Educação Higienista.
Movimentos de resistência e expressão de descontentamento como a Revolta
da Vacina (1906) e as greves ocorreram em virtude do aumento populacional de
imigrantes
europeus
avessos
às
ideologias
e
práticas
de
dominação
(VASCONCELOS, 2001).
Surge em 1923, através da Lei Elói Chaves, um novo modelo de regulamento
sanitário, de assistência médica, chamado “Caixas de Aposentadorias e Pensões”
41
para trabalhadores das ferrovias. Nesse momento, o movimento higienista amplia
seus horizontes, seu poder de atuação e interfere na educação da população
através de medidas de divulgação de higiene pessoal e pública, inspeções médicas
de imigrantes, além do confinamento de leprosos e tuberculosos.
Neste mesmo período surge o que Vasconcelos (2001) chama de Educação
Sanitária. A educação com abordagem preventiva, presente na Educação Sanitária,
tinha como objetivo principal o indivíduo com comportamento saudável, e o
educador propunha a indução de uma mudança de hábitos que promovesse a saúde
e evitasse as doenças (ALVES, 2005).
A Educação Sanitária se definiu como uma Especialidade da medicina
preventiva, devido aos educadores sanitários utilizar como base filosófica a medicina
cujos:
[...] problemas são definidos sob o ponto de vista médico e os
diagnósticos proporcionam o ponto de partida. As atividades de
educação sanitária são afins a esse padrão de problemas
medicamente definidos que freqüentemente terminam em programas
ou campanhas fragmentadas e focalizadas em um problema apenas
(STOTZ, 1993, p. 18).
Segundo Stotz (1993), a educação com abordagem preventiva, que ocorreu a
partir da década de 20, possuía como objetivo principal o indivíduo com
comportamento saudável. O sujeito desta ação era o educador através de
comportamentos persuasivos sobre os riscos de doenças. As estratégias de
prevenção de doenças ocorriam pelo desenvolvimento de comportamentos
saudáveis, ou seja, adequados, propondo a extinção ou a mudança de
comportamento individual para a eficácia do processo.
Segundo Vasconcelos (2001), o sujeito ainda possuía papel inativo no
processo educativo sendo culpabilizado individualmente pelas doenças que o
acometiam. Esta culpabilização era escamoteada pelo modelo biologicista na sua
determinação.
A Educação em Saúde, dentro da perspectiva sanitária, teve o sujeito como
um depositário de conhecimentos, partindo do pressuposto de que o profissional era
o detentor de todo o saber para a saúde e que o sujeito não tinha conhecimento
suficiente, isto é, científico sobre as doenças e as corretas medidas de prevenção,
culpabilizando-o caso viesse a adoecer, pois apontava que realmente não tinha
42
modificado seus comportamentos perante as prevenções ditadas por um “educador”
(VASCONCELOS, 1997). Segundo Freire (2005), este modo de educação se
chamou de bancária, na qual não havia diálogo, e sim o opressor ditando regras
sobre o oprimido.
Essa ideologia permeou fortemente a Educação em Saúde até meados de
1940, quando outras formas de participação social começaram a surgir no Brasil,
iniciando com os movimentos operários da Era Vargas (VASCONCELOS, 2003).
Como consequência do pós-guerra, o Brasil passou a programar projetos de
apoio internacional – com influência norte-americana – principalmente nos serviços
de saúde brasileiro. Também vale registrar que foi devido aos interesses na
exploração de borracha e minérios na região amazônica que os EUA instalaram a
Fundação do Serviço Especial de Saúde Pública (SESP), com o objetivo de
controlar as grandes endemias da região através da educação sanitária com
técnicas mais modernas, ainda que impositivas, com os grupos, como a utilização de
recursos audiovisuais, participação e lideranças comunitárias (VASCONCELOS,
2001; WENDHAUSEN; SAUPE, 2003). Nesse momento, ainda se destinou ao
sujeito a responsabilidade pelo processo saúde/doença, não sendo considerados
como determinantes os fatores culturais, subjetivos, valores e costumes.
Na década de 50, houve a necessidade de modernização da agricultura e da
educação do homem rural, pois a exploração rural exigia a participação do
trabalhador na incorporação de tecnologias. Nesse momento histórico se deu início
à alfabetização de adultos no Brasil, com a proposta dos Círculos de Cultura de
Paulo Freire, que abrangiam educação e mudança político-social (VASCONCELOS,
2001). Essa forma de educação diferenciava-se pela oportunidade dada ao
educando de manifestar-se e ser valorizado, apontando que é possível construir
saberes a partir do diálogo. Nessa década e no início da seguinte, o cenário político
brasileiro foi turbulento. Os movimentos sociais ganharam espaço. Começou a
alterar-se
a
percepção
do
processo
saúde/doença,
considerado
pela
multidimensionalidade e relacionando-o aos aspectos sociais (WENDHAUSEN;
SAUPE, 2003).
Na década de 60, o fato marcante foi o surgimento da perspectiva da
Medicina Comunitária, em que foi possível perceber um apelo à participação da
comunidade para a solução dos problemas de saúde existentes. Entretanto, como
afirma Alves (2005), por trás desse apelo de participação comunitária pareceu
43
camuflar-se o mesmo discurso da culpabilidade dos sujeitos, com a ressalva desta
passar da individualidade para a coletividade. As práticas de Educação em Saúde
comunitárias continuavam semelhantes à visão anterior e partiam, então, do
pressuposto de que as comunidades seriam as responsáveis pela solução de seus
problemas de saúde, devendo, para isto, serem conscientizadas (ALVES, 2005).
Segundo Vasconcelos (2001), houve um encontro entre as vertentes no
campo da saúde e da Educação em Saúde, pois a visão de sujeito social era menos
determinada pelas circunstâncias. Ainda não prevalecia o questionamento do direito
de ter saúde, mas se começou a relacionar doença com as condições de vida e com
a
participação
nas
manifestações
de
encaminhamentos
dos
problemas,
considerando que a própria educação poderia resolver.
Entretanto, na década de 60, durante o regime militar (1964), o campo da
Educação em Saúde permaneceu sem se expressar publicamente, devido à
limitação dos espaços institucionais para sua realização. Constatou-se a expansão
dos serviços médicos privados e da medicina curativa em detrimento dos serviços de
atenção preventiva. Este modelo assistencial de cunho curativo, hospitalocêntrico,
fragmentado e de baixa resolubilidade não favorecia a Promoção à Saúde ou a
atenção primária, que contava com a participação popular. Smeke e Oliveira (2001)
afirmam que durante esse tempo a Educação em Saúde se referiu ao controle sobre
os sujeitos.
Em contraponto, ao padrão de imposição de normas e comportamentos
considerados adequados pela educação, na época do regime militar despertou-se
uma resistência e aumentou a insatisfação da população, que acelerou, ao longo da
década de 1970, a organização de movimentos sociais. Esses reuniram intelectuais
e populares visando à ampliação de conceitos sobre o processo saúde/doença e o
papel do educador e da Educação em Saúde, pois a falência na saúde se
expressava pelas condições de vida, refletindo nos altos índices de mortalidade
infantil, acidentes de trabalho, epidemias como a meningite e a crise previdenciária
(VASCONCELOS, 2001; VALLA; STOTZ, 1993; ALVES, 2005).
O modelo hegemônico vigente nesse período preconiza a persuasão sobre o
indivíduo que deveria adotar comportamentos mais saudáveis mediante a
divulgação por meios de comunicação de massa, TV, folhetos, cartazes e jornais,
responsabilizando o sujeito pelos seus comportamentos. O que fica nítido é o
esquecimento de que o sujeito possui subjetividade e que as soluções dos
44
problemas de saúde requerem ações socialmente sustentadas pelos aspectos
culturais, políticos e econômicos da sociedade em que esse mesmo indivíduo está
inserido (STOTZ, 1993). A medicina curativa é praticada nos consultórios
particulares, nos hospitais e nos grandes ambulatórios da Previdência Social. A
medicina preventiva e a Educação em Saúde são realizadas por órgãos ou pessoas
isoladas sem maiores recursos (VASCONCELOS, 1997).
Dentre os movimentos que se apresentaram no início na década de 70 que
procuraram rescindir com a tradição autoritária e normalizadora da relação entre os
serviços de saúde e a população se destaca o movimento da Educação Popular em
Saúde (VASCONCELOS, 2001). Este movimento foi precipitado pela insatisfação de
alguns profissionais de saúde com os serviços oficiais, dirigindo-se para as periferias
dos grandes centros urbanos e regiões rurais, aproximando, assim, as classes
populares dos movimentos sociais locais. Através de um realinhamento ideológico
apresentava uma postura contra-hegemônica na Educação em Saúde.
Este Movimento surgiu a partir de experiências de serviços comunitários,
desvinculados do Estado, transformando-se em movimentos sociais que lutavam
pela Reforma Sanitária. A iniciativa dos profissionais em inserir-se em serviços de
saúde que prestavam assistência às classes populares se deu integrada a projetos
mais amplos, dentre os quais predominava a metodologia da Educação Popular
(VASCONCELOS, 2001). Dessa forma, esta metodologia foi assimilada pelo
movimento dos profissionais, compondo seu elemento estruturante essencial.
Nesse período, pós-regime militar, na faculdade de Saúde Pública da
Universidade do Estado de São Paulo (USP) se fez um grande investimento ao
redirecionar a profissionalização do educador de saúde pública. Sua compreensão
englobaria o processo saúde/doença na sua multicausalidade social, econômica,
cultural, e despertando a visão crítica na identificação dos obstáculos ao
desenvolvimento da população e o surgimento de propostas e medidas educativas
corretas. Esta visão de ensino despertaria nos alunos, futuros educadores, o
desenvolvimento do caráter crítico, participativo e politizador. As práticas dessa
Educação em Saúde proporcionavam flexibilização e ampliação, distanciando-se
das ações impositivas da educação higienista. Nesse momento, tratou-se de
reavaliações e reorientações aos avanços para uma participação social e política
efetiva (VASCONCELOS, 2001).
45
A partir das teorias e práticas referenciadas e desenvolvidas na Educação
Popular e na saúde constituiu-se o Movimento Sanitário, com idealizações contrárias
e incompatíveis às medidas autoritárias. Nesse momento, manifestou-se a
preocupação com a autonomia do sujeito. Sujeito este que é social, competente,
responsável por transformações sociopolíticas voltadas na busca de seus interesses
(VASCONCELOS, 2001).
Alterou-se aos poucos a concepção saúde/doença, saindo do modelo
tradicional biologicista que preconizava a prevenção das doenças pela mudança de
atitudes e comportamentos individuais, incluindo informações verticalizadas para
manter a saúde e a intervenção curativa em caso de doença, para ser resultante da
inter-relação causal entre fatores sociais, econômicos, culturais e a consideração
dos determinantes psicossociais dos comportamentos de saúde (ALVES, 2005).
A Educação em Saúde, baseada na determinação social do processo
saúde/doença, considerou a luta política para a melhoria de condições de vida e
saúde. O discurso do educador mudou, pois mediante a persuasão política deveria
envolver os usuários em momentos reivindicatórios, tendo, também, o objetivo de
desenvolver uma consciência sanitária sobre os limites e possibilidades de sua ação
como sujeitos capazes de promover mudanças políticas, econômicas e sociais.
Nesses movimentos sociais e de reavaliação dos conceitos, a Educação em
Saúde passou a ter novo foco, no qual profissionais e população compartilhavam
saberes e buscavam a melhoria da qualidade de vida das pessoas (WENDHAUSEN;
SAUPE, 2003). A proposta de práticas educativas referentes às necessidades dos
usuários se inseriu no discurso emergente de Educação em Saúde – o modelo
dialógico. Em oposição ao modelo tradicional, trabalhou-se com a perspectiva de
sujeitos das práticas de saúde (AYRES, 2001). A partir de 1980, as conquistas da
democracia política começaram a acontecer com o movimento pela Reforma
Sanitária, que ganhou importância e ênfase na Constituição de 1988, na construção
do SUS, entre outras lutas mais globais nas políticas sociais. Também a
Participação Social ganhou espaço como princípio do SUS, a criação de Conselhos
de Saúde e Conferências de Saúde e na ampliação da representação popular nas
três esferas do governo; municipal, estadual, federal (WENDHAUSEN; SAUPE,
2003).
Vale ressaltar que a concepção de saúde e a Educação em Saúde estavam
na efervescência de debates e construções não só no âmbito nacional, mas também
46
internacional. Em 1978, a Conferência Mundial de Saúde-Alma Ata resultou no
acordo da meta Saúde Para Todos no ano 2000 e, em 1986, com a I Conferência
Mundial da Promoção à Saúde- Ottawa/Canadá se enfatizou novamente a
assistência primária e a Promoção da Saúde (WENDHAUSEN; SAUPE, 2003).
Nessa perspectiva, a Educação em Saúde é uma estratégia para se fazer a
Promoção da Saúde de modo dialógico com a população, participativo e, por fim,
emancipatório, valorizando sua autonomia e co-responsabilidade pelo processo
saúde/doença.
A Educação em Saúde adquiriu novas características, após muitas
discussões nacionais e internacionais, como: a relação com o usuário; a
comunicação horizontal entre profissional e população; privilegiamento do diálogo e
os saberes diferentes; o respeito ao outro e sua alteridade concepção mais de saúde
e a acentuação de recursos de pessoas e a participação e empoderamento do
usuário e coletivo (WENDHAUSEN; SAUPE, 2003).
Para Briceño-Léon (1996) há dois princípios básicos na orientação das ações
de saúde: é necessário conhecer o ser humano, pois só conhecendo o sujeito e
suas circunstâncias se tornam possível uma ação eficiente e permanente. Devem-se
compreender suas crenças, hábitos, papéis, e as circunstâncias, condições objetivas
em que vivem; e contar com ele, pois é preciso envolver os indivíduos nas ações, o
que se contrapõe à sua imposição. O autor afirma que apenas com a participação
comunitária é possível assegurar sustentabilidade e efetividade das ações de saúde.
Dentre os modelos de Educação em Saúde, o modelo dialógico conforma-se
à proposta da integralidade, uma vez que favorece o reconhecimento dos usuários
enquanto sujeitos portadores de saberes sobre o processo saúde-doença-cuidado e
de condições concretas de vida. Nesse aspecto, este modelo contribui para uma
apreensão mais compreensiva das necessidades de saúde dos sujeitos e na
humanização da ação educativa, tornando-as mais sensíveis a seus destinatários
(BRICEÑO-LÉON, 1996).
Este autor sugere sete teses para uma educação e participação em saúde:
− Tese I: A educação não é só o que acontece nos programas educacionais,
mas em toda a ação sanitária. Nesta tese, o autor ressalta a importância de
estudar as formas de aplicação das políticas públicas em geral, ver o tipo
de mensagem e qual o tipo de ação educativa que ali se desenvolve. Outro
47
fator importante é preparar “toda” a equipe envolvida nas campanhas para
o ponto de vista educacional.
− Tese II: A ignorância não é um vazio a ser preenchido, mas um cheio a ser
transformado. Esta tese afirma que o objetivo da educação não é
preencher o vazio da ignorância, mas transformar os cheios cognitivos e
comportamentais que o sujeito possui previamente. Para isso, é muito
importante conhecer os saberes e as práticas da população, identificar de
forma clara o que vai ser trabalhado, tentar transformar os conceitos, os
hábitos de forma crítica, porém respeitosa e solidariamente.
− Tese III: Não há um que sabe e outro que não sabe, mas dois que sabem
coisas distintas. Isto quer dizer que a educação é um processo bidirecional,
já que os dois sabem, os dois devem dizer algo, assim, ambos geram um
acordo de transformação de seus próprios saberes. Mas se alguém não
quer fazer algo pela sua própria saúde, obviamente o outro não pode fazêlo.
− Tese IV: A educação deve ser dialogada e participativa. Um processo de
diálogo é participativo e a educação deve ser participativa em si mesma.
Esse processo envolve confrontação de perspectivas e prioridades. O que
deve acontecer é tentar confrontar os saberes sem dominação e sem
submissão.
− Tese V: A instrução deve reforçar a confiança das pessoas em si mesmas.
A confiança é um fator fundamental no sucesso de uma ação. As crenças e
expectativas sempre surgem de um aprendizado social, ou seja, da ação e
das mensagens verbais dos outros sujeitos.
− Tese VI: A educação deve procurar reforçar o modelo de conhecimento
tipo esforço-recompensa: a ação educativa estará junto com as realizações
que se consigam através de esforços. As realizações obtidas a partir de
metas que o indivíduo possa cumprir, objetivos que signifiquem um
estímulo à inteligência. Se o sujeito trabalha, participa e obtém realizações,
reforça-se, assim, a ideia conectiva do esforço e realização.
− Tese VII: A educação deve fomentar a responsabilidade individual e a
cooperação coletiva. Uma boa política de estímulo à participação deve
fomentar o interesse e o compromisso de cada indivíduo com as metas de
48
saúde. A educação deve enfatizar o sujeito e sua responsabilidade
individual, ressaltar a relação que existe entre o que ele faz e o que pode
obter para seu próprio benefício e, concomitantemente, desenvolver os
mecanismos de cooperação e de construção da solidariedade que tornem
possível a ação coletiva.
Como vimos anteriormente, o modelo tradicional de educação, mais
conhecido como “Educação Bancária” caracteriza-se como um modelo depositário,
cuja marca é a unidirecionalidade e a verticalidade da relação educador-educando.
Os homens eram vistos como seres de adaptação, do ajustamento. Um dos
objetivos fundamentais da concepção bancária é dificultar, em tudo, o pensar
autêntico, inibindo o poder de criar, de atuar. Indoutrinar os educandos no sentido de
sua acomodação ao mundo da opressão, ou seja, transformar a mentalidade dos
oprimidos e não a situação que os oprime. Portanto, ela nega a dialogicidade como
essência da educação e se faz antidialógica (FREIRE, 2005).
Em 2007 o Ministério da Saúde propõe, através dos Cadernos de Educação
Popular em Saúde que se faça uma educação baseada nos preceitos de Paulo
Freire, ou seja, uma educação capaz de transformar as tradicionais práticas de
Educação em Saúde em práticas pedagógicas que levem à superação das situações
que limitam o viver com o máximo de qualidade de vida que todos merecemos
(BRASIL, 2007).
Assim, a Educação em Saúde que proponho, como diz Campos et al. (2004),
faz parte do processo de fortalecimento da participação comunitária politizada,
recomendado pelas políticas de saúde, aspirando à gestão participativa das políticas
públicas. Sendo assim, o processo de fortalecimento da co-responsabilização na
produção da saúde se dá pelo estabelecimento de parcerias intersetoriais,
interinstitucionais e com entidades não-governamentais e da sociedade civil.
Briceño-Léon (1996, p. 12), inspirado nos critérios de Paulo Freire, lembra
que, a dinâmica de educação para saúde, não tem um alguém que sabe e outro que
não sabe, mas dois que sabem coisas diferentes; daí a afirmação de que “a
ignorância não é um buraco a ser preenchido, mas um ‘cheio’ a ser transformado”.
A Concepção problematizadora e libertadora vê no educador um humanista
revolucionário, cuja ação deve estar infundida da profunda crença nos homens e no
seu poder criador a serviço da libertação. A libertação autêntica é práxis que implica
49
a ação e a reflexão dos homens sobre o mundo para transformá-lo. A educação
libertadora e problematizadora é um ato cognoscente, que afirma a dialogicidade e
se faz dialógica (FREIRE, 2005).
A mudança de perspectiva no pensar e fazer no campo da Educação
Popular em Saúde nos convida a (re) pensar propostas de ações que atendam aos
interesses e necessidades da comunidade. Para tanto, a criação destas propostas
deve emergir de uma prática dialógica, que contemple a autoconsciência como
prática político-pedagógica, valorizando a pluralidade de saberes e rompendo os
espaços formais na busca da aproximação entre os diferentes saberes e as diversas
culturas.
Vasconcelos (1999) entende o educador como um mediador entre os saberes
acadêmicos e a construção local do conhecimento necessário à dinamização da
assistência à saúde. Sendo assim, a educação em saúde passa a ser um
instrumento de construção da participação popular. Nesse sentido, a Educação
Popular em Saúde é também um instrumento de Promoção da Saúde.
Como confirma Oliveira (2008, p. 101)
[...] enquanto as atividades de Educação em Saúde apenas tiverem a
finalidade de depositar conhecimento sobre riscos, normas, causas e
efeitos, dificilmente conseguirão mobilizar e motivar as pessoas a
terem atitudes e comportamentos saudáveis. Isso porque, mais uma
vez o modelo tradicional será fortalecido, em detrimento do modelo
alternativo, estando com isso, possivelmente fadadas ao fracasso da
mobilização das pessoas para a transformação do modelo
assistencial, bem como, da sua participação e responsabilização na
promoção da saúde.
Por outro lado, deve-se levar em conta que o SUS é construído em seu
cotidiano por profissionais que têm por atribuição serem agentes de mudança, mas,
no entanto, foram e em grande parte ainda são, formados no modelo tradicional. A
falta de formação para consolidar na prática o avanço da legislação evidencia a
lacuna existente entre o discurso de mudança e a prática que se efetiva nos serviços
(ARIOLI, 2012).
A proposta de educação problematizadora pode ser entendida como um
movimento em espiral, em alguns momentos eles se cruzam e em outros eles
podem se distanciar (ALVIN; FERREIRA, 2007). O método Paulo Freire, aplicado à
saúde,
através
da
educação
problematizadora
não
provoca
modificações
50
significativas de imediato. A mudança só é percebida quando o educando der sinais
de transformação ao longo de contínuos processos de intermediação e construção
de novos saberes. A Educação Popular tem como pressuposto a disponibilidade e a
abertura para ouvir o outro, num encontro onde “quem educa é dialeticamente
educado”.
Assim, imbuída desta proposta da Educação Popular em Saúde como parte
da Promoção da Saúde, proponho a discussão de suas práticas com Agentes
Comunitários de Saúde através do pensamento de Paulo Freire, considerando-os
como parte fundamental para a consecução das duas em seu cotidiano.
51
3 METODOLOGIA
O presente estudo teve a intenção de descrever a vivência e a troca de
experiências entre a pesquisadora e os Agentes Comunitários de Saúde, de uma
UBS no município de Itajaí/SC, através da Educação Popular em Saúde que tem
como alicerce a problematização de Paulo Freire. Tratou-se, portanto, de uma
pesquisa qualitativa inspirada na pesquisa participante o que possibilitou a
interpretação dos fenômenos observáveis, mediante a descrição e compreensão dos
seus significados. O conceito de participação dentro da Pesquisa Participante não é
unívoco no sentido de que pode ser concebido tanto com relação aos
pesquisadores, quanto com relação à população pesquisada, ou envolvida no
processo (HAGUETTE, 1987). A autora define participação como sendo “uma ação
reflexionada em um processo orgânico de mudança, cujos protagonistas são os
pesquisadores e a população interessada na mudança” (HAGUETTE, 1987, p. 141143).
Na pesquisa qualitativa, a interação entre o pesquisador e os atores sociais
envolvidos no trabalho é de suma importância. Nesse processo de interagir, partindo
de planos desiguais, ambas as partes buscam uma compreensão mútua. O
pesquisador tem como principal objetivo não ser considerado um “igual”, mas ser
aceito na convivência (MINAYO et al., 1994).
A interação entre o pesquisador e os atores sociais estudados, foi parte
fundamental da investigação qualitativa, em que nada substituiu o olhar atento do
pesquisador de campo à realidade das relações sociais.
Neste capítulo apresento os aspectos metodológicos que nortearam a
pesquisa. Inicio com uma síntese biográfica do educador e pensador Paulo Freire e
o seu referencial metodológico utilizado para a coleta e análise dos dados. Na
sequência discorro sobre o local da investigação, os sujeitos pesquisados,
procedimentos de coleta e análise de dados e aspectos éticos.
52
3.1 Paulo Freire: uma síntese biográfica e suas idéias
Devido à sua importância literária e reconhecimento internacional de sua
práxis educativa, não poderia deixar de mencionar uma pequena biografia deste
estudioso, ativista social e trabalhador cultural chamado Paulo Freire.
As informações desta biografia foram retiradas do Instituto Paulo Freire
(FREIRE, 2012). Paulo Reglus Neves Freire nasceu no dia 19 de setembro de 1921
em Recife, no nordeste do Brasil, uma das regiões mais pobres do país, onde logo
cedo pôde experimentar as dificuldades de sobrevivência das classes populares.
Trabalhou inicialmente no Colégio Oswaldo Cruz como professor de Língua
Portuguesa e diretor do Setor de Educação e Cultura do Serviço Social da Indústria
– SESI, onde posteriormente foi superintendente. Paulo Freire foi quase tudo o que
deve ser um educador, de professor de escola à criador de ideias e “métodos”.
Sua filosofia educacional expressou-se primeiramente em 1958 na sua tese
de concurso para a Universidade do Recife, e, mais tarde, como professor de
História e Filosofia da Educação daquela Universidade, bem como em suas
primeiras experiências de alfabetização como a de Angicos, Rio Grande do Norte,
em 1963.
A coragem de pôr em prática um autêntico trabalho de educação que
identifica a alfabetização com um processo de conscientização, capacitando o
oprimido tanto para a aquisição dos instrumentos de leitura e escrita quanto para a
sua libertação fez dele um dos primeiros brasileiros a serem exilados.
Em 1969, trabalhou como professor na Universidade de Harvard, em estreita
colaboração com numerosos grupos engajados em novas experiências educacionais
tanto em zonas rurais quanto urbanas. Durante os dez anos seguintes, foi Consultor
Especial do departamento de Educação do Conselho Mundial das Igrejas, em
Genebra (Suíça). Nesse período, deu consultoria educacional junto a vários
governos do Terceiro Mundo, principalmente na África. Em 1980, depois de 16 anos
de exílio, retornou ao Brasil para “reaprender” seu país. Lecionou na Universidade
Estadual de Campinas (UNICAMP) e na Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo (PUC-SP).
Em 1989, tornou-se Secretário de Educação no município de São Paulo, onde
durante o seu mandato, fez um grande esforço na implementação de movimentos de
53
alfabetização, de revisão curricular e empenhou-se na recuperação salarial dos
professores.
A metodologia por ele desenvolvida foi muito utilizada no Brasil em
campanhas de alfabetização e, por isso, ele foi acusado de subverter a ordem
instituída, sendo preso após o Golpe Militar de 1964. Depois de 72 dias de reclusão,
foi convencido a deixar o país. Exilou-se primeiro no Chile, onde, encontrando um
clima social e político favorável ao desenvolvimento de suas teses. Durante cinco
anos desenvolveu trabalhos em programas de educação de adultos no Instituto
Chileno para a Reforma Agrária (ICIRA). Neste período Paulo Freire escreveu a sua
principal obra: Pedagogia do Oprimido.
O senso de humor esteve sempre presente na vida e obra deste pensador e a
não menos constante indignação contra todo tipo de injustiça. Casou-se, em 1944,
com a professora primária Elza Maia Costa Oliveira, com quem teve cinco filhos.
Após a morte de sua primeira esposa, casou-se com Ana Maria Araújo Freire, uma
ex-aluna.
Entre as muitas obras que Paulo Freire escreveu temos: Educação: prática da
liberdade (1967), Pedagogia do oprimido (1968), Cartas à Guiné-Bissau (1975),
Pedagogia da esperança (1992) e À sombra desta mangueira (1995).
Sua prática educativa lhe rendeu reconhecimento mundial através de
numerosas homenagens. Além de ter seu nome adotado por muitas instituições, é
cidadão honorário de várias cidades no Brasil e no exterior.
A Paulo Freire foi outorgado o título de doutor Honoris Causa por 27
universidades. Por seus trabalhos na área educacional recebeu entre outros, os
seguintes prêmios: “Prêmio Rei Balduíno para o Desenvolvimento” (Bélgica, 1980);
“Prêmio UNESCO da Educação para a Paz” (1986) e “Prêmio Andrés Bello” da
Organização dos Estados Americanos, como Educador do Continente (1992). No dia
10 de abril de 1997, lançou seu último livro, intitulado “Pedagogia da Autonomia:
Saberes necessários à prática educativa”. Paulo Freire faleceu no dia 2 de maio de
1997 em São Paulo, vítima de um infarto agudo do miocárdio.
Sua elaboração pedagógica teve como ponto de partida o estudo da
linguagem do povo, tendo desenvolvido mais do que uma prática de alfabetização,
uma pedagogia crítico libertadora. A educação como prática da liberdade dá-se
através da relação dialógica. A educação problematizadora, cuidadosamente
pensada e elaborada por Freire, trata de uma pergunta que requer diretividade. É a
54
partir do questionamento, da provocação, do fazer pensar que se constrói o novo. A
apresentação de uma proposta que centraliza a dimensão do conhecimento, o
sentimento de aceitação do outro, a interação e a subjetividade é um verdadeiro
exercício de cidadania. É nessa proposta de dialogicidade que o ato de
conhecimento tem como pressuposto fundamental a cultura do educando,
compreendida como ponto de partida no seu processo de ler e entender o mundo
percebendo-se como sujeito histórico. Sua proposta político pedagógica considera
educador e educando como sujeitos do processo de construção do conhecimento.
Nesse sentido, pretende despertar a consciência das pessoas para reinventar uma
sociedade mais justa e igualitária, rompendo com a relação cristalizadora de
dominação, com a verticalidade do mando, com a exclusão social e a interdição da
leitura do mundo àqueles menos favorecidos. A educação libertadora de Paulo
Freire é um instrumento de transformação do homem e da sociedade no mundo,
com o mundo e para o mundo. Sua contribuição intelectual apresentou uma síntese
inovadora das mais importantes correntes do pensamento filosófico de sua época (o
existencialismo, a fenomenologia e o marxismo – sem conotação ortodoxa).
O método de alfabetização criado por Paulo Freire nasceu no interior do
Movimento de Cultura Popular (MCP) do Recife, no final da década de 50. O então
chamado Círculo de Cultura viabiliza, através do diálogo, que seus participantes
respondam às provocações feitas pelo coordenador/pesquisador sobre o objeto de
estudo e a representação da realidade a ser decodificada. As perguntas mais
frequentemente utilizadas no Círculo de Cultura são: Quê? Por quê? Como? Para
quê? Por quem? Para quem? Contra quê? Contra quem? A favor de quem? A favor
de quê? Essa dialogicidade aprofunda a leitura de mundo dos participantes, viabiliza
um olhar crítico e diferenciado a cerca da realidade de forma a suscitar em seus
partícipes um sentimento de comprometimento com vista à transformação desta
realidade.
3.2 Local da investigação
O município de Itajaí localiza-se no Litoral Centro-Norte Catarinense nos
paralelos 26º 54’ de latitude Sul e 48º 39’ de longitude Oeste, junto a foz do rio Itajaí-
55
Açú, com uma área de 303,6 km2, e uma população de 183.388 habitantes
(INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010). Encontra-se
distante 91 km da capital Florianópolis ao Sul e a 84 km da cidade mais populosa do
estado, Joinville, ao Norte.
Itajaí foi criada pela Lei nº 164, de 04/04/1859, mas sua instalação somente
se deu em 15 de Junho de 1860. A comarca de Itajaí foi criada pela lei nº 603 de
13/04/1968. Em 01/05/1876, a Vila do Santíssimo Sacramento de Itajaí foi
transformada em cidade.
O município concilia o ar sossegado ao ritmo cosmopolita das atividades
portuárias, petrolífera, comercial e universitária, sendo considerado o maior centro
pesqueiro e principal exportador de produtos congelados do Brasil.
Imigrantes açorianos e alemães moldaram a cidade-porto, tendo deixado sua
influência nos costumes, sotaques, na carpintaria naval, na culinária, no casario
histórico e no cotidiano da vida dos Itajaienses.
Já o comércio, a prestação de serviços, o turismo e as indústrias fazem com
que Itajaí se destaque como uma das cidades com as mais variadas fontes de
renda. Itajaí possui o 2º maior PIB (Produto Interno Bruto) do Estado e proporciona
uma alta qualidade de vida a seus moradores.
Itajaí possui belezas naturais como: a Praia do Atalaia, Praia de Cabeçudas,
Praia de Jeremias e Praia Brava. Oferece uma diversificada gastronomia que pode
ser apreciada na Marejada – Festa Portuguesa e do Pescado e Festa do Colono.
Conta também com o Festival de Música Cidade de Itajaí, Porto, Píer Turístico,
Parques Aquáticos, praças e a beleza singular do voo da garça sobre o Saco da
Fazenda.
O município conta com o quantitativo de 36 postos de atendimento
ambulatorial e médico, distribuídos pelas regiões administrativas da cidade e ainda
dispõe de 291 ACS dispostos em 33 equipes de Estratégia Saúde da Família e 4
equipes de Estratégia Agentes Comunitários de Saúde.
O local selecionado para a realização do trabalho de campo é uma Unidade
Básica de Saúde (UBS) do município de Itajaí/SC, atualmente composta por quatro
ESF, totalizando um quantitativo de 35 ACS. É importante lembrar que o Bairro onde
a Unidade está inserida, é o segundo mais populoso de Itajaí e tem como
característica a ausência de um Conselho Local de Saúde e a pouca atuação da
Associação de Moradores. Esta Unidade faz parte das 33 equipes de ESF do
56
município de Itajaí e atualmente acompanha 4.787 famílias cadastradas no Sistema
de Informação da Atenção Básica - SIAB (ITAJAI, 2012), totalizando 16.958
pessoas. O que chama à atenção para a necessidade, em curto prazo, de uma 5ª
equipe de Saúde da Família, levando-se em consideração o aumento populacional e
a existência de área de invasão, bem como a construção de mais uma UBS que
viabilize a divisão do trabalho das equipes de Saúde da Família, a readequação do
fluxo de pessoas e proporcione espaço físico e infraestrutura adequada para o
atendimento à população.
3.3 Sujeitos pesquisados
Estabeleceu-se uma amostra de conveniência pela possibilidade de acesso e
execução da pesquisa na instituição selecionada, uma vez que atuo na mesma
como Enfermeira da Estratégia Saúde da Família. O alvo desta pesquisa foram os
35 Agentes Comunitários de Saúde (ACS) das quatro Equipes de Saúde da Família
(ESF) de uma Unidade Básica de Saúde (UBS) no município de Itajaí/SC. O estudo
foi realizado de novembro de 2011 a Janeiro de 2012.
O critério de seleção da população do estudo incluiu todos os ACS da referida
unidade, desde que não estivessem em período de férias e/ou afastamento para
tratamento de saúde e que aceitassem participar da pesquisa e assinassem o Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndices A e B). Respeitado o referido
critério de seleção participaram da pesquisa 16 ACS, das 35 efetivamente ligadas à
unidade.
3.4 Procedimentos de coleta dos dados
Primeiramente foi realizado um convite a todos os ACS da UBS do Rio Bonito
para participarem da pesquisa. A coleta de dados se deu através do
desenvolvimento de quatro oficinas, com duração média de 1h30min com os 16 ACS
que manifestaram interesse. A data de realização das mesmas foi pactuada com o
57
grupo. A realização das oficinas teve por objetivo fomentar a discussão em torno da
prática dos ACS em relação à Promoção e Educação em Saúde de forma a
possibilitar uma reflexão crítica sobre o seu papel enquanto profissional da ESF.
Para a realização das mesmas foram utilizadas oficinas, utilizando o referencial
proposto por Freire, a partir das seguintes categorias: levantamento dos temas
geradores, codificação, descodificação e desvelamento crítico citado por Brandão
(2005), acrescidas dos cinco princípios epistemológicos de Freire, adotados pelo
Caderno de Educação Popular em Saúde (BRASIL, 2007).
Para Brandão (2005), o levantamento dos temas geradores são falas que
desvelam o mundo em que se vive; um momento comum de descoberta. Convertese numa luta comum por uma consciência da realidade e consciência de si, que
fazem desta procura o ponto de partida do processo de educação e da ação cultural
do tipo libertador (FREIRE, 2001). Segundo Freire (2005) na codificação os
participantes integram a significação das palavras ou temas geradores em seu
contexto existencial, eles as redescobrem num mundo expresso em seu
comportamento. Decodificar é sinônimo de decifrar, ou seja, dentro de um Círculo de
Cultura é a decomposição de um todo nos elementos que o constituem. A
decodificação é a análise crítica de situações vivenciadas que permite o despertar
de uma conscientização. Desvelar significa tirar o véu, descobrir, revelar. O
desvelamento crítico é a última etapa da metodologia problematizadora de Paulo
Freire. É quando se revela uma nova realidade, ou seja, outra forma de ver e
entender o mundo (ROCHA, 2005).
Freire (2001) refere que a conscientização é mais que uma simples tomada
de consciência. Supõe, por sua vez, o superar falsa consciência e uma melhor
inserção crítica da pessoa conscientizada numa realidade desmistificada. Essa
consciência, advinda de um processo dialógico e reflexivo, transforma a vida das
pessoas e as ajuda a reorganizar o seu modo de vida. Tais modificações não
acontecem apenas no nível das ações, mas também nas percepções de cada
indivíduo, nas suas atividades e na sua interação com o mundo do qual faz parte.
As oficinas foram feitas da seguinte forma:
a) 1ª OFICINA:
Inicialmente foi realizado o acolhimento dos participantes, com breve
explanação da pesquisadora sobre os objetivos do trabalho e explicado de que
58
forma aconteceriam as oficinas, baseadas na problematização de Paulo Freire.
Mediante a concordância das participantes foi dado início as oficinas, com a
realização de uma dinâmica de grupo, como forma de aquecimento, sensibilização e
aproximação do grupo. Para tanto, foi utilizada uma dinâmica reflexiva baseada na
técnica de apresentação do sujeito, através da “História do Nome”.
b) 2ª OFICINA:
Foi dado um “feedback” do que foi visto na primeira oficina. Na sequência,
iniciamos à discussão do tema proposto, partindo de uma dramatização sobre a
seguinte problemática: “como as ACS abordam a questão da Promoção da Saúde e
Educação Popular em Saúde no cotidiano de seu trabalho?”. A partir daí foi discutido
o conceito ampliado de saúde para então trabalhar as concepções sobre Promoção
da Saúde e como se dá sua aplicabilidade na prática, no decorrer do trabalho dos
ACS. Os temas geradores que nortearam a problemática das dramatizações foram
posteriormente codificados e descodificados pelo grupo. Todo o processo de
discussão e posterior desvelamento crítico foi gravado e transcrito pela
pesquisadora.
c) 3ª OFICINA:
Iniciamos relembrando o que fora discutido nas duas primeiras oficinas.
Baseado nas falas da segunda oficina foi discutido e refletido com o grupo a
importância da escuta, de forma a problematizar a prática dos agentes comunitários
de saúde, na tentativa de identificar suas dificuldades e potencialidades. Sendo
assim, iniciamos a oficina com a dinâmica do “telefone sem fio” e a seguir a leitura
do texto “as sete atitudes de um bom ouvinte”. Retomei a questão do “saber ouvir”
trazendo para o círculo algumas das falas dos participantes que foram gravadas e
transcritas para que fizessem um exercício de “ouvir o que foi falado”, como um
instrumento de releitura coletiva da realidade social onde se vive e se trabalha. O
tema gerador que norteou as dinâmicas foi codificado, descodificado e desvelado
pelo grupo. Todo o processo de discussão foi gravado e transcrito pela
pesquisadora.
d) 4ª OFICINA:
Iniciamos fazendo uma retomada de tudo o que foi discutido nas oficinas. Na
59
sequência, foi mostrado slides com figuras relacionadas ao tema da pesquisa. Logo
após o grupo novamente foi dividido para que através da técnica de colagem
pudessem montar um conceito sobre Promoção e outro sobre Educação Popular em
Saúde. Na sequência foi realizado a apresentação dos grupos e posterior
fechamento das discussões, tendo por objetivo o incentivo a propostas de ações em
saúde por parte dos ACS para a realização de atividades de Promoção de Saúde na
comunidade, levando-se em consideração os recursos materiais e humanos
disponíveis, bem como a realidade local.
Será dado o retorno do trabalho desenvolvido para as quatro Equipes de
Saúde da Família na Unidade Básica de Saúde do Rio Bonito e Secretaria Municipal
de Saúde de Itajaí/SC.
3.5 Análise dos dados
Tomando por base a metodologia de Paulo Freire, a análise dos dados se deu
através da observação e escrita realizada por mim levando em consideração as
quatro categorias propostas por Freire: o levantamento dos temas geradores em
Promoção e Educação Popular em Saúde, codificação, descodificação e finalmente
desvelamento crítico. Procurei nos escritos e no que foi observado ressaltar o
processo de reflexão que foi gerado no grupo a partir da temática proposta, os
entraves e pontos críticos gerados na prática.
A eficácia e a validade do método consistem em partir da problematização da
prática do ACS, de que forma ele percebe e aplica a Promoção da Saúde e a
Educação Popular em Saúde, do valor pragmático das suas ações e da realidade
local em que está inserido. Respeitando o senso comum e dele partindo, o
conhecimento se constrói e a partir dele se propõe a sua superação.
A partir da leitura do conteúdo das transcrições das oficinas, tentei captar as
categorias propostas por Freire, frente aos objetivos propostos neste estudo. Neste
sentido auxiliou-me o referencial de Minayo (2007) sobre análise de um conteúdo,
quando propõe que se captem os núcleos de sentido que compõem a comunicação,
cuja presença ou frequência signifiquem alguma coisa para o objeto analítico visado;
60
no meu caso as categorias de Freire e concepções e práticas de Promoção e
Educação.
3.6 Aspectos éticos
Este projeto de pesquisa foi enviado inicialmente ao SISNEP (Sistema
Nacional de Informação sobre Ética em Pesquisa envolvendo Seres Humanos) para
ser cadastrado. No preenchimento da folha de rosto do SISNEP providenciamos a
assinatura de aquiescência da Instituição participante, no caso Prefeitura Municipal
de Itajaí/Secretaria de Saúde do Município. Para obter o aceite da instituição foi feito
contato com a administração, pela pesquisadora, para agendamento de um
momento, objetivando expor o tema da pesquisa e obter a aquiescência para
realizar o estudo. Para a realização da pesquisa foi entregue e assinado um termo
de solicitação à instituição.
Imediatamente foi enviado e submetido ao parecer da Comissão de Ética em
Pesquisa da UNIVALI, para que sua execução fosse aprovada pelos padrões da
Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) através do Parecer nº.
581/2000.
Obtido o deferimento da instituição e a aprovação da Comissão de Ética e
Pesquisa, deu-se início a coleta dos dados propriamente dita. Foram fornecidas
duas vias, sendo uma pertencente ao entrevistado e outra ao pesquisador.
Justificando a necessidade premente de estabelecer uma relação ética na execução
da pesquisa, o propósito do presente estudo foi elucidado às pessoas envolvidas
para que conhecessem a lógica do processo, bem como sua contribuição iminente
como membros integrantes.
Foi garantido o anonimato aos participantes da pesquisa, podendo estes
desistirem a qualquer tempo da mesma, sem que haja transtornos ou necessidade
de esclarecimento de seus motivos. Ressaltou-se que os resultados obtidos no
estudo serão manuseados somente pela pesquisadora envolvida e que poderão ser
divulgados e publicados por meio de artigos ou em eventos científicos (Apêndice A).
61
Foi entregue uma cópia do trabalho à instituição e feito o convite para a
apresentação pública, deste estudo, no Curso de Mestrado de Saúde e Gestão do
Trabalho.
Para garantir o anonimato dos participantes, na transcrição de suas falas, foi
estabelecida uma denominação fictícia para cada integrante. Optou-se por identificálos pela letra P (participante) seguida de um número correspondente. Por exemplo:
(P1) = participante número hum.
62
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
A análise e discussão dos dados se deram a partir do referencial teórico de
Paulo Freire para o qual são propostas quatro categorias: levantamento dos temas
geradores, codificação, descodificação e desvelamento crítico. Os materiais
produzidos nas quatro oficinas foram analisados e discutidos dentro desta
categorização, sendo que as etapas foram acontecendo ao mesmo tempo no
decorrer das últimas três oficinas. Brandão (2005) pondera que, embora o método
aponte as regras de como fazer sempre é possível criar sobre o método, inovar
instrumentos e procedimentos de trabalho. Sendo assim, da forma como ocorreram
as oficinas, as etapas do método não serão discutidas individualmente e sim num
conjunto.
A realização das oficinas teve início no dia 17 de novembro de 2011,
perfazendo um total de quatro oficinas, com o término em 11/01/2012. As mesmas
foram desenvolvidas na UBS do Rio Bonito, na Sala das ACS.
4.1 Identificações do trabalho e das participantes
O primeiro encontro aconteceu no dia 17 de dezembro de 2011 e contou com
a participação de 18 pessoas, sendo 16 ACS, a facilitadora (pesquisadora) e uma
enfermeira que se propôs a ajudar a pesquisadora.
Num primeiro momento houve a apresentação da pesquisadora, o objetivo do
trabalho, o cuidado com o anonimato dos participantes, além da importância da
contribuição individual e coletiva para o desenvolvimento da pesquisa. Foi
esclarecido que a participação era de cunho voluntário e que a aceitação não
implicaria em obrigatoriedade, podendo interromper a participação em qualquer
momento, mediante comunicado à pesquisadora. A seguir foram distribuídos para
cada Agente Comunitário de Saúde o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
– TCLE (Apêndices A e B) para que todas pudessem ler e preencher os dados
solicitantes. Após o preenchimento do mesmo, foi recolhido o referido documento
63
pela pesquisadora. Em seguida, foi solicitado para que as ACS fizessem um círculo
com cadeiras para que pudéssemos dar início à primeira oficina.
Mas, por que trabalhar em círculo? Porque na figura do círculo, todos se
olham, se vêem e estão numa relação de igualdade. Neste círculo, não há um
detentor do saber, mas um animador das discussões que, de forma solidária,
participa de uma atividade comum em que todos ensinam e aprendem. Sendo
assim, “o que o círculo produz são modos próprios e novos, solidários, coletivos, de
pensar” (BRANDÃO, 2005, p. 44-45). O Círculo trás na sua essência uma proposta
fecunda e uma prática de ensino-aprendizagem dialógica valorizando a pluralidade
de saberes e partilhando os saberes construídos. Optei por fazer uma
reapresentação das participantes como forma de quebrar o gelo, trabalhar a
apropriação, iniciar a sensibilização e estabelecer uma maior aproximação e
inclusão. Para tanto foi utilizada uma dinâmica reflexiva baseada na técnica de
apresentação através da “História do Nome”. Esta dinâmica consistia no seguinte:
foram distribuídas folhas em branco (A4) e solicitado para que construíssem seu
nome e figura ou imagens relacionada a si, usando de toda a sua criatividade. Para
tanto foram dados lápis de cor, canetinhas e giz de cera. Também foi solicitado que
procurassem se lembrar de quem lhes escolheu o nome e qual o significado de seu
nome. A dinâmica transcorreu calmamente, numa interação bastante harmoniosa
entre as participantes, com muitos risos e clima de descontração. Um dos fatores
para tal entrosamento deu-se pelo fato de todas serem colegas de trabalho e já
conviverem a algum tempo juntas, inclusive comigo que sou enfermeira de uma das
quatro equipes de Saúde da Família. Como era um grupo grande, houve a
necessidade que se acomodassem em duas mesas, havendo troca permanente
entre ambas do material disponibilizado para a dinâmica. Após o término da tarefa
foi solicitado para que todas retornassem a seus lugares no círculo. Tão logo o
círculo foi formado, solicitei para que todas virassem as folhas A4, de forma que
todas as demais pudessem observar o que as colegas produziram. Foi então que
solicitei para que alguém se disponibilizasse a iniciar a apresentação, como não
houve um consenso num primeiro momento, foi-me solicitado para que eu desse
início a mesma. Pude observar durante a apresentação de cada participante o
quanto essa dinâmica suscitou lembranças e sentimentos que extravasaram durante
a explanação, bem como a escrita criativa do nome através de acrósticos e
desenhos traduzindo a identidade de cada um. Essa reflexão sobre a identidade de
64
cada sujeito permite que se percebam como tendo um maior controle sobre suas
vidas, o que possibilitou a identificação do eu como sujeito. Segundo Gonzáles-Rey
(2003) compreender a questão subjetiva do sujeito, significa considerar a suja
trajetória histórica, sua singularidade, a sua diversidade e a forma que ele se
expressa e protagoniza seu espaço na sociedade.
Foi possível observar através da fala das participantes o significado contido
em seus nomes, e as características individuais que as distinguem ou o momento
presente pelo qual estão passando. Grifo algumas características que nas suas falas
foram mais enfatizadas:
[...] sou conhecida como esquentada, motivo pelo qual sou chamada de
pimentinha, conforme escrevi e pintei em minha folha (P1).
[...] reservada, sincera e o que é meu, é meu! (P2).
[...] hoje eu estou aqui por obrigação, no sentido de responsabilidade e vontade de
contribuir, mas se pudesse estaria escondidinha numa caixinha [...] me sinto
renovada a cada dia, sou uma pessoa paciente e prestativa (P9).
[...] quem escolheu (meu nome) foi minha mãe em homenagem a Nossa Senhora
quando ela veio de Portugal para o Brasil (P10).
[...] no Livro dos Nomes (meu nome) significa a escolhida. Considero-me uma
pessoa prestativa. Meu nome foi escolhido por meu pai (P13).
[...] meu nome é de origem indígena, mas não sei o seu significado. Minha
característica principal é ser sincera (P16).
As metodologias participativas, que utilizam recursos lúdicos, nada mais são
do que estratégias que possibilitam e facilitam a vivência de sentimentos e
percepções sobre determinados fatos ou informações. Refletir sobre eles,
ressignificar seus conhecimentos e valores possibilita ao grupo visualizar
possibilidades de mudanças a partir da construção de novas práticas e
conhecimentos.
Em observância a prática aqui desenvolvida, Lane e Codo (1982) afirmam
que uma das funções do grupo é definir papéis e a identidade dos indivíduos, de
forma a garantir sua produtividade e mudança social.
Na sequencia foi apresentado as participantes o livro “um nome para o seu
bebê” de Nelson Oliver e Daniele Alvim, e realizado a leitura do significado dos
nomes de todos os presentes, o que foi muito bem recebido pelo grupo, com
65
demonstrações de risos, gargalhadas, brincadeiras e sinais de concordância e
discordância. Apenas o nome de uma das participantes não foi encontrado no livro,
tendo me comprometido a tentar descobri-lo.
Um ponto positivo foi o respeito dos demais colegas da Unidade Básica de
Saúde em não interromper as atividades durante o período de execução da oficina.
Houve, por parte dos participantes, boa aceitação e acolhimento do tema proposto.
Ao final foi sugerida, por um dos participantes, a confecção de um mural onde foram
colados todos os trabalhos, conforme se pode observar na figura 1:
Figura 1 - Mural “História do Nome”
Fonte: A autora (2011).
O mesmo foi apreciado pelo grupo que tirou fotos com ele juntamente à
pesquisadora conforme figura 2.
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Figura 2 - “Resgatando a nossa História”
Fonte: A autora (2011)
Para encerrar as atividades foi lido por mim um texto intitulado “Amigo”, onde
ao término da leitura todos aplaudiram e houve manifestações de satisfação com o
trabalho desenvolvido. Para o fechamento do encontro foi oferecido um lanche onde,
em meio a conversas informais, muitas ACS disseram sentir “falta de momentos
como esse”, para sentar, conviver, trocar e aprender. Pude observar nesse primeiro
momento que a experiência teve um impacto positivo, tendo propiciado uma maior
aproximação do grupo e que a mesma atingiu o objetivo proposto.
4.2 Dando início às discussões
O segundo encontro ocorreu no dia 30 de novembro de 2011 às 13h e 30
min., na sala de Reuniões da UBS. Antes de dar início ao tema proposto procurei
resgatar o que havia sido desenvolvido no primeiro encontro. A seguir solicitei que o
grupo se dividisse em dois para uma dramatização sobre a seguinte problemática:
“como as ACS abordam a questão da Promoção da Saúde e Educação Popular
em Saúde no cotidiano de seu trabalho?”. Foram dados 15 minutos para que os
grupos se organizassem e fornecidas roupas e acessórios para que fizessem uso.
Após o tempo estipulado deu-se início as apresentações, tendo sido orientados para
que o segundo grupo observasse o primeiro e vice-versa para posterior discussão
do tema abordado. Durante a fase de ensaio ambos os grupos demonstraram bom
entrosamento, não havendo nenhum participante que se declarou contrário à
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dinâmica sugerida. Foi observado um clima de muita descontração, risos e muita
criatividade. Após os ensaios foi dada sequencia a apresentação dos grupos.
O primeiro grupo de dramatização trouxe a história de Dona Fulana, uma
moradora da área, poliqueixosa, que vive com sua filha adolescente e mais quatro
crianças. A mesma relata não ter tempo de ir até a unidade, porque dorme até tarde.
Solicita para que a ACS marque uma consulta no período da tarde para que ela
possa fazer o almoço e cuidar dos afazeres domésticos. Pede para ser agendada
com o médico de sua preferência e é orientada pela mesma que isso não é possível,
pois o médico responsável pela sua área é outro. A ACS oferece um agendamento
de Consulta de Enfermagem o que não é aceito pela moradora que solicita visita de
um profissional médico. O mesmo pedido é feito por sua vizinha que nesse momento
chega até sua casa, pois havia visto a Técnica de Enfermagem e a ACS entrando na
casa de Dona Fulana. A moradora aproveita e pede para que a ACS lhe traga
medicamento para a dor no estômago e é informada pela mesma que não está
autorizada a entregar medicação. Dona Fulana insiste: “pode me dar só o remédio,
ficha é para outra coisa. Ficha é para o oculista”! No mesmo instante a vizinha
interrompe a conversa e diz para a ACS que está com 80 anos e necessita que ela
marque uma consulta para ela na unidade. A ACS combina de repassar o caso a
Enfermeira e solicita para a dona da casa assinar a folha de visita domiciliar. Ao
retornar para a unidade a ACS encontra a Enfermeira sobrecarregada e atarefada
com a parte burocrática. Após aguardar um tempo, consegue pedir ajuda a
Enfermeira da equipe que prontamente vai com ela até a casa de Dona Fulana. Ao
chegar lá a Enfermeira é muito direta e objetiva, dizendo que Dona Alzira necessita
“pegar ficha como todo mundo” para consultar com o médico de sua área e que a
mesma deverá levar sua filha junto para pegar o pedido de exame. A enfermeira
evita responder a certos questionamentos da moradora sobre a função da ACS e
limita-se a dizer: “a obrigação dela não é ficar marcando ficha para a senhora. A
senhora pode ir de manhã como todo mundo vai”. No caso da vizinha idosa ela
autoriza a Agente Comunitária de Saúde a agendar uma consulta médica e reforça
que Dona Fulana deverá procurar a unidade pela manhã. Em seguida despede-se e
retorna a unidade.
O segundo grupo retrata a história de Dona Beltrana que mora com uma
filha adolescente que sumiu de casa por dois meses e retorna grávida, com um
problema na perna após um acidente de moto e referindo problemas ginecológicos.
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A família recebe a visita da ACS que escuta as queixas da adolescente que
confessa estar com depressão. No meio da conversa a agente de saúde percebe o
clima tenso entre mãe e filha que não conseguem conversar civilizadamente. A
adolescente pede para que a ACS lhe entregue uma pomada ginecológica e esta
nega o pedido explicando que necessita de receita médica. Imediatamente a
adolescente repreende a ACS dizendo que sempre pegou o medicamento na
unidade. A ACS oferta a visita da médica da equipe e imediatamente entra em
contato pelo celular com a enfermeira para expor a situação. A enfermeira diz que o
carro da visita acaba de chegar à unidade e que irá incluir essa família para
visitação. Logo após entra no consultório da médica e antes mesmo de começar a
falar é questionada sobre a inclusão de mais um paciente para consulta clínica:
“Não, o negócio é o seguinte, já colocaram um a mais para eu atender e eu não
gosto disso”!
A enfermeira diz não saber o motivo, pede para que a médica
questione a coordenadora da unidade e critica as colegas de trabalho por
sobrecarregam a agenda médica. Quando novamente tenta falar sobre o assunto
que a trouxe ali, toca o celular da médica que atende a uma ligação particular.
Quando a ligação termina a enfermeira expõe o caso da família e alega tê-lo incluído
nas visitas do dia, pois não foram preenchidas todas as vagas. A médica reclama do
sol e pergunta se o motorista já chegou. A Enfermeira responde que sim e que ele
só foi tomar água. A médica então ironiza: “o motorista pode tomar água, eu tenho
que atender paciente a mais...”. Nisso a enfermeira a convida para ir e a médica
pergunta: “ela não pode vir aqui”? A enfermeira faz sinal que não e ambas vão até o
carro. Ao chegar à casa de Dona Beltrana, a Enfermeira apresenta a médica que vai
conversar com a adolescente. A filha de Dona Beltrana queixa-se da perna e de
corrimento. A médica ironiza: “e a barriga é o quê? É gordura mesmo”? A
adolescente diz ter dado umas voltas, que não usou preservativo e que tem medo de
estar com um problema sério. A médica enquanto isso prescreve e depois se volta
para a adolescente e diz: “aqui é o Beta, aqui a pomadinha, aqui é o
encaminhamento para o ortopedista. E isso aqui é uso de preservativo contínuo. É
bom, previne a gravidez. Podes ir fazer”! A adolescente questiona sobre o problema
da perna e a médica a interrompe dizendo: “o problema da perna é com o
Ortopedista! Eu sou Clínico Geral, eu já fiz a minha parte. Passar bem”! Dona
Beltrana agradece a visita e todos se retiram.
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O que chamou a atenção foi que embora as dramatizações tenham sido
criativas, perdura o modelo biomédico, prescritivo que se evidencia no atendimento
queixa-conduta. Para Kawamoto (1995 apud SANT’ANA; TAIA; MEDEIROS, 2001),
a visita domiciliar visa prestar assistência educativa no domicílio, e também através
dela pode-se fazer uma avaliação sócio-econômica do indivíduo e sua família,
prestando uma assistência específica a cada caso.
Mediante essa constatação, solicitei aos participantes para que fizessem seus
comentários a respeito que foram os seguintes:
A falta de um preparo dos profissionais da Estratégia Saúde da Família para
trabalhar questões relativas à Promoção de Saúde: desde o entendimento do que é
Promoção, passando por formas de abordagem da comunidade e o estabelecimento
de estratégias e parcerias de forma a socializar e instrumentalizar a comunidade
para que a mesma possa ter uma qualidade de vida melhor.
[...] na verdade a gente não tem esse treinamento pra essa abordagem, porque o
próprio paciente não deixa a gente chegar a foco nenhum. [...] tem uns lugares que a
gente sabe que pode chegar e falar, ver se a pessoa está cuidando da hipertensão,
dos problemas, se tem gestante, se está prevenindo a gravidez. A gente chega
nesse foco, mas a grande maioria é só essa pressão de atendimento. Eles
confundem o atendimento do postinho com a exclusividade da gente cuidar da vida
deles, entendeu? Uma dor de estômago é um exagero. E não pode pegar ficha!
Então tu não parte da promoção. A grande maioria, na verdade, não dão essa
liberdade de você promover a saúde (P9).
Fica evidenciado que a comunidade não relaciona saúde com ações de
Promoção da Saúde. Existe uma alienação por parte da mesma que só consegue
vislumbrar um atendimento imediato, que sane suas queixas, sem haver a
preocupação se tornar mais hábeis em reverter seu quadro. Isso pode ter haver com
a intensa medicalização que se instaurou na sociedade.
Por medicalização entende-se a introjeção gradual de padrões sociais, culturais
e políticos a partir de parâmetros instituídos pela ciência médica, cuja subjetividade
resultante é uma necessidade (demanda) crescente de atos médicos normalizadores e
interventivos sobre a vida e a saúde. A medicalização seria, na área da saúde, um dos
efeitos daquilo que o discurso sociológico chama de “controle social”. Não estamos
falando aqui do sentido de controle social proposto pelo Movimento da Reforma
Sanitária, que seria o controle público (da população) sobre as políticas e ações de
saúde, mas no sentido que lhe é dado tradicionalmente pelas ciências sociais, isto é,
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“que uma pessoa e sua ação está de fato condicionada e limitada pelos grupos, pelas
instituições e pela sociedade inteira, da qual é membro”. Neste sentido os indivíduos
estariam condicionados a mecanismos mais ou menos ajustados, instituídos
socialmente e a partir dos quais agiriam (BOBBIO; MATTEUCCI, 1981, p. 426 apud
WENDHAUSEN, 2002).
A “medicalização da sociedade” tem sido muito discutida atualmente, em
virtude do incessante aumento da produção e do consumo de cuidados
profissionais. A medicalização não se refere somente ao uso abusivo de medicação,
mas a falta de autonomia do sujeito que depende da opinião de um especialista.
Tomar muita medicação é um sintoma!
Tesser (2006, p. 61) ao se referir sobre o assunto diz que:
A medicalização transforma culturalmente as populações com um
declínio da capacidade de enfrentamento autônomo da maior parte
dos adoecimentos e das dores cotidianas. Isso desemboca num
consumo abusivo e contraprodutivo dos serviços biomédicos,
gerando dependência excessiva e alienação.
Conforme a medicina foi se inserindo socialmente, as práticas e os discursos
foram se apropriando da racionalidade médica. Ou seja, uma vez que o cidadão
comum passa a ter acesso às informações amplamente difundidas pelos meios de
comunicação, que concebem saúde como um valor primordial, a vida torna-se
medicalizada. Por exemplo, a publicidade investe maciçamente na venda de
medicamentos que prometem milagres de efeitos imediatos. A saúde numa
sociedade capitalista é entendida como sinônimo de força de trabalho e
produtividade.
Medicalização, segundo Wendhausen (2002), é a visão que leva as pessoas
a buscar de forma abusiva e descontrolada, na área da saúde, atos médicos para
obter saúde. Fazer do normal uma coisa rara é hoje um fenômeno coletivo. Assim
eles esperam que o serviço de saúde resolva seu problema, e, no caso
principalmente o médico que é a figura a quem se atribui este papel. Mas todos os
profissionais de saúde, a enfermeira, o fisioterapeuta, etc., sofremos desse mesmo
mal, porque também somos produto dessa medicalização, ou seja, introjetamos
historicamente que saúde depende somente de atos médicos. Consequentemente
há uma banalização do uso de fármacos, e o desenvolvimento da crença de que
saúde se obtém nas prateleiras das farmácias. Nascimento (2003) denomina este
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fenômeno de o mito da saúde em pílulas. De acordo com esta autora as dificuldades
da vida passam a ser consideradas como problemas médicos solucionáveis através
de fármacos. Para cada dor, seja ela física ou emocional, existe um tratamento, um
medicamento. Como se não bastasse, convivemos ainda com a mensagem de alerta
“ao persistirem os sintomas o médico deverá ser consultado” invertendo a lógica
como se primeiro o usuário tivesse que ter o problema para só então buscar ajuda. A
racionalidade moderna está em crise. Na realidade, o que se tem feito não é outra
coisa senão medicalizar o sofrimento.
Outro aspecto discutido pelo grupo é o entendimento de que a promoção não
se concentra somente na figura do médico, mas que toda a equipe tem essa
responsabilidade. E que todos estão deixando a desejar, cada um, preocupado com
os seus afazeres e com a parte burocrática, esquecendo-se de olhar e ouvir
adequadamente.
[...] É o que eu falei. Não é só o atendimento do médico, são todos. Na grande
maioria atende assim. Não tem um olhar no paciente, ele tem um atendimento
rápido [...] Não tem um envolvimento para que o médico também tenha a paciência
de fazer a promoção (P9).
Uma situação muito comum relatada pelas ACS foi a divergência de
interesses entre o que se quer falar para a comunidade e o que ela realmente
necessita. Isso fez com que o grupo refletisse a forma como estamos trabalhando e
que o resultado tem sido insatisfatório, não correspondendo às expectativas da
comunidade assistida.
[...] é complicado ficar todo o dia na mesma casa. Vou lá naquela casa falar sobre
HIV, amanhã vou lá falar sobre Diabetes. Nunca consegue falar, por quê? [...] se tu
chegar a falar de diabetes: ”Meu Deus! Como doem as minhas costas!”, aí já vem
com a história [...] Eles falam outra coisa e já “vão em cima” de ti pedindo consulta,
não te dão espaço para promover, para fazer o teu trabalho, então é complicado
(P4).
Foi discutido também o fato de que, embora a ESF tenha surgido como uma
estratégia para a mudança do modelo de atenção, ainda persiste, muito forte, na
cultura popular aquele modelo biomédico centrado na figura do médico.
[...] eles querem assistencialismo e não promoção de saúde. [...] Eles querem o
médico, o remédio e a consulta. Só isso! (P8).
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Refletindo sobre as dificuldades no cotidiano da unidade de saúde as ACS
referiram se sentir desamparadas no atendimento à comunidade. Que gostariam de
um suporte mais eficaz por parte do restante da equipe e que os profissionais estão
muito presos atendendo demanda dentro da unidade e deixam de realizar ações
importantes na comunidade.
[...] a ESF não é só o agente de saúde, [...] o agente de saúde precisa do enfermeiro
e precisa do médico e ESF é na rua. O médico tem que sair na rua com o agente de
saúde (P15).
O trabalho em equipe é essencial para a obtenção de resultados, mas para
que isso ocorra não há espaço para individualismos, é preciso um esforço conjunto
onde glórias e fracassos devem ser entendidos como de responsabilidade de todos
os membros da equipe.
O sentido de equipe nasce da integração individuo/organização, evidenciada
pela adesão espontânea aos compromissos e metas, sem a imposição de valores ou
procedimentos. O trabalho em equipe só atinge os seus objetivos quando há
cooperação e envolvimento de todos. No entanto, a complexidade do atendimento
das necessiddes de saúde exige uma flexibilidade nos limites das competências de
cada profissional da equipe.
O trabalho multiprofissional refere-se à recomposição de diferentes
processos de trabalho que, concomitantemente devem flexibilizar a
divisão do trabalho; preservar as diferenças técnicas entre os
trabalhadores especializados; arguir a desigualdade na valoração
dos distintos trabalhos e respectivos agentes, bem como nos
processos decisórios e tornarem consideração a interdependência
dos trabalhos especializados no exercício da autonomia técnica,
dada a necessidade de autonomia profissional para a qualidade da
intervenção em saúde (PEDUZZI, 2000, p. 6).
É importante que a equipe esteja disposta a compartilhar objetivos, decisões,
responsabilidades e resultados. É preciso ter clareza dos objetivos, discutir um plano
de trabalho em que todos possam estar inseridos, aprimorar as relações
interpessoais e a escuta qualificada. Não menos importante seria o responsabilizarse democrática e solidariamente pelos resultados, quer sejam positivos ou
negativos.
Segundo Robbins (2002, p. 267), isso é possível de ser alcançado pelo “[...]
aumento da motivação e satisfação do funcionário, níveis mais altos de
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produtividade, comprometimento comum com as metas, expansão das habilidades
no trabalho e flexibilidade organizacional [...]”.
Houve uma crítica quanto à forma como os profissionais de nível superior
prestam o atendimento à comunidade. A falta de envolvimento e de compromisso
por parte de alguns tem prejudicado a imagem do SUS e suscitado reclamações por
parte da comunidade, que são manifestadas durante a visita domiciliar das ACS.
Muitas relatam ser mal recebidas e que por vezes as famílias sequer abrem as
portas para recebê-las. Algumas relataram que ao chegar às famílias os moradores
perguntam: “o que elas estão fazendo ali”? Referindo desconhecer o seu real papel
dentro da ESF. O que também é um consenso é o fato de estar “perdendo o seu
espaço” ou que talvez não o tenham conquistado.
[...] o médico prescreve e não olha o paciente, ele não tem aquele olhar [...] não tem
envolvimento! Então, se o médico não tem, passa para o enfermeiro que também tá
cheio de problemas [...] e a gente vai ter qual atendimento? (P9).
[...] eu acho que na verdade ACS, médicos, enfermeiros deveriam dar mais ouvidos
à comunidade. Às vezes as pessoas chegam aqui com dor de cabeça e na verdade
elas não querem o remédio para a dor de cabeça, elas querem conversar! (P4).
[...] E é dessa conversa que vai sair à promoção. É essa conversa que está faltando
[...] a gente precisa do enfermeiro e do médico para tanta gente. É a atenção que
eles querem. Que a gente poderia dar e que não tem. [...] da ESF mesmo, não é só
nossa. É de todos, de toda a equipe! (P9).
[...] o médico, ao invés de analisar o problema, o histórico do paciente, ele empurra
encaminhamento, ele empurra encaminhamento... Aí enche o nosso sistema de
consultas com um monte de encaminhamentos que poderiam ser resolvidos. [...]
Mas há uma necessidade de aprimorar o atendimento para essas pessoas. Quando
nós, enquanto agentes de saúde, vamos às casas para levar a promoção, nós não
conseguimos levar essa promoção porque eles saem correndo atrás, literalmente
correndo: Hei! Eu preciso de você, eu queria... Vem cá! Eu preciso de uma consulta,
eu preciso disso, daquilo... Eles querem somente a consulta! Porque para eles é
esse o nosso papel, agendar uma consulta para eles. Eles acham que nós somos as
meninas de agendamento de consultas ou de entrega de consulta. Esse é o nosso
papel (P11).
[...] eles querem que a gente verifique a pressão, mas nós não verificamos a
pressão. Quem verifica é a técnica. Então, quando a gente faz aquela visita com a
técnica, que às vezes eu vou à área com as nossas técnicas, aí é gostoso! Porque
daí a gente também faz essa visita de verificação de pressão, de como a pessoa tá.
Porque parece que aquilo dá um... O paciente vê com outros olhos, né? Nós somos
somente as meninas que entregam consulta e encaminhamentos (P11).
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Quando questionadas sobre a forma de abordagem utilizada para orientação
à comunidade as ACS pontuaram as facilidades e dificuldades no cotidiano de seu
trabalho. Reforçando se sentirem gratificadas e importantes quando conseguem
ajudar alguém.
[...] Eu sempre observo, aí eu puxo alguma coisa que seja relacionada àquilo, até eu
conseguir chegar ao assunto que eu realmente quero. Principalmente para essa
meninada grávida aí (P8).
[...] Tem um ou outro paciente que é comprometido, presta atenção e realmente faz
as coisas que você explicou. [...] Tem um ou dois pacientes que seguem as
orientações (P8).
[...] O seu Fulano! Ele estava bem doente, ele estava tendo ataque assim, que vinha
até o SAMU. Eles davam aquela injeção mais forte para ele, ataque mesmo, do
sistema nervoso. Porque aí eu comecei a observar porque que ele estava daquele
jeito: a esposa tinha falecido, ele trabalhando à noite, um monte de filhos, de noras e
crianças. O dia inteiro dentro de casa correndo. Crianças chorando, as filhas
brigando, conversando [...] Trabalhava de noite e dormia de dia. Ele não estava mais
conseguindo dormir e outra coisa, ele perdeu a esposa. Então, querendo ou não
essas pessoas mais idosas são bem companheiras, onde ele estava ficando ruim. Aí
veio um e queria internar ele aqui, queria internar ele ali. Aí eu em conversa [...]
disse para ele: por que o senhor não vai ao Centro de Múltiplo Uso? [...] expliquei os
horários, o que fazia e o que não fazia. Desde então, nunca mais deu aquelas coisas
nele, e ele participa ali direto, o seu Fulano, mas são poucos o que você consegue...
(P8).
[...] quando a gente consegue avançar com um paciente desse, que aceita, que
consegue entender o que a gente fala, pelo menos eu acredito que é pelo menos
gratificante, eu acho que é gostoso assim, saber que alguém entendeu, enfim qual é
o teu papel aí (P4).
Dessa discussão surgiu a reflexão acerca das propostas educativas
realizadas pela ESF, que têm ficado mais no âmbito das intenções, sem que de fato
haja um impacto positivo na vida das pessoas. Por outro lado, quando colocadas em
prática, são desenvolvidas de modo intuitivo sem a preocupação de criar espaços
para o diálogo com os atores envolvidos, desmerecendo-os como sujeitos de sua
própria história.
No que se refere ao processo saúde/doença ficou muito claro o entendimento
do grupo de que a promoção é algo muito maior do que um mero conceito. Que ela
é feita de sujeitos comprometidos com as questões sociais, que ela depende de uma
rede de suporte que permita acionar vários setores em prol do bem estar comum. É
fundamental um olhar crítico e diferenciado sobre a dinâmica social, política e
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cultural de cada comunidade para que a abordagem dos profissionais da Estratégia
Saúde da Família seja eficiente e eficaz.
[...] Eu volto a repetir a mesma coisa, pela encenação que a gente fez, tanto o nosso
grupo, como o segundo grupo, porque a maioria das doenças e das coisas que
acontecem também envolve muito o social (P8).
[...] Não é só o posto, precisamos ter pracinha para as crianças, nós precisamos de
cursos para essa meninada, a gente tem que ter estrutura para poder ajudar a
saúde. Quantos na rua [...] tem depressão? Nós estávamos conversando [...] a
maioria na rua [...] tomam antidepressivo, na minha área tem um monte [...] (P8).
[...] Cada vez vai aumentando, né? Então a gente não tem aqui um psicólogo, né?
Que podia ser uma vez por semana, ali na Capela. Um psiquiatra uma ou duas
vezes por semana, alguma coisa diferente aonde pudesse [...] fazer este tratamento
junto com a pessoa (P8).
Aprofundando-nos um pouco mais na discussão, foi solicitado para que as
ACS levantassem as principais deficiências no atendimento à comunidade. “Que tipo
de população estaria de fora das ações, hoje colocadas em prática, pela unidade de
saúde?”. Foram citados os adolescentes, a população masculina em idade produtiva
e a mulher vítima de violência.
[...] O adolescente não tem uma política voltada para ele [...] (P4).
[...] O homem não tem projeto, o pai de família não tem projeto, ele trabalha, ele
sai... (P9).
[...] a mulher que sofre violência ela não tem um curso pra fazer pra ela poder sair
do domínio do marido. Ela não tem! Ela é obrigada às vezes a ficar apanhando ali,
porque ela apanha e os filhos comem, [...] vai fazer o quê? Precisa muita coisa! (P8).
Retomando as discussões anteriores, e fazendo um “feedback” de tudo o que
foi falado até então, voltei a questionar: o que seria a Promoção de Saúde? De todas
as respostas a que mais chamou a atenção foi à fala de uma das participantes que
reforça a importância de uma rede estruturada, de recursos humanos e financeiros
que possibilitem sanar as necessidades da comunidade. Mesmo tendo um
entendimento de que Promoção da Saúde é interdisciplinar e advêm de vários
fatores, atribuem-na a outras pessoas e não aos usuários e a si mesma como parte
deste processo. É como se as condições para realizá-la só viessem de fora e não
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dependesse também de nosso entendimento e reivindicação para que se realize.
Não conseguem perceber os recursos de que já dispõem.
Conseguem perceber as faltas, mas não as relacionam com sua produção
social e de que envolvem os direitos que não sabemos ou buscamos. Assim,
sentem-se somente impotentes diante das faltas, como expressa a seguinte fala:
[...] Você ter o que oferecer não só quando você vai numa família. Que nem teve o
caso da Cicrana. Que ali envolve tudo! [...] vamos falar da alimentação: como é que
ela ia amamentar a criança se ela não tinha o que comer? Como é que ela ia ter
uma boa higiene nela e na criança se ela não tinha nem um sabonete para tomar um
banho, para dar um banho na criança? (P8).
Outro momento importante foi o debate onde as Agentes Comunitárias de
Saúde mencionam a dificuldade e a necessidade de se estabelecer parcerias, por
entender que a ESF não tem a “fórmula mágica” para resolver todos os problemas
condizentes à comunidade. Todas concordam que a teoria diz uma coisa, mas na
prática não funciona como deveria. Ou seja, que a intersetorialidade ainda é um nó
crítico quando o assunto é promoção. Ficou evidenciado a necessidade de se
discutir sobre essas deficiências e que esse momento deveria ser partilhado com a
comunidade. Não sob forma de palestras, consideradas ineficazes, mas sim de
forma problematizadora, estabelecendo prioridades e acionando os setores
envolvidos.
Outra questão levantada foi que a comunidade pouco responde ao chamado
para participar dos grupos. Qual o motivo? Desmotivação? Descrédito? Será que em
algum momento foi dada a oportunidade dos usuários manifestarem-se? Será que
suas reais necessidades estão sendo sanadas? Isso nos remeteu a pensar a forma
com que a comunidade vinha sendo vista e trabalhada pelos profissionais da ESF.
Será que não continuamos a olhá-la como um objeto a quem nós profissionais
devemos modelar porque está errada?
Outro foco do trabalho das ACS são os grupos. E quando se fala em grupos a
primeira coisa que veio à cabeça das ACS foi “palestra”. Mas, ao mesmo tempo,
existe uma consciência de que essa forma de trabalhar não surte efeito. Segundo foi
falado, às vezes, na opinião delas, é preciso lançar mão de alguns artifícios, mesmo
que de forma “impositiva” ou “punitiva” para que a comunidade entenda e colabore.
Chama a atenção nessa fala o caráter prescritivo do modelo biomédico enraizado no
fazer cotidiano das equipes. Ficou claro que ainda persiste a forma equivocada de
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se trabalhar com palestras, construídas a partir do interesse dos profissionais o que
não condiz com as necessidades da comunidade assistida, motivo pelo qual pode
ser que a adesão seja muito pequena e os grupos esvaziem-se com facilidade.
[...] Esta aí o problema, só que ninguém quer participar! É aí que a comunidade não
participa (P8).
[...] Ela não participa porque ela não vê resultados (P1).
[...] eles estão cansados da gente só fazer palestra, palestra e não agir. Eles não
estão vendo a gente [...] está faltando ajuda da secretaria, está faltando ajuda de
todos para a gente plantar essa ação para população (P15).
A idéia que algumas pessoas possuem é de que primeiro se deve ensinar
para que o povo aja em conformidade com o que pensamos e isso deve se fazer a
qualquer preço, até mesmo oferecendo-lhe algum benefício como o bolsa-família ou
um medicamento que no final das contas é apenas seu direito. Essa Educação em
Saúde tem a ver com a que estamos criticando. Se ao final quisermos um usuário
crítico e emancipado, temos que admitir que o nosso poder sobre sua saúde pode
ser compartilhado. Ou seja, o saber popular pode ser considerado e em contraste
com o saber técnico pode gerar um novo saber. Para que isto aconteça é preciso
uma nova forma de educar, que considere o usuário como um sujeito pensante que
também pode e deve decidir sobre sua vida e saúde.
Os depoimentos a seguir ilustram esta maneira de conceber Educação em
Saúde:
[...] o que resolve mesmo, é aquele paciente [...] que é mais fácil. Aquele que é
comprometido, aquele resolve. Agora tem paciente que você pode fazer 10 palestras
da mesma coisa e não vai mudar (P8).
[...] A gente tem que educar primeiro o paciente para depois deixar o povo falar, não
é? (P1).
[...] uma das maneiras que a gente faz para tentar educar o povo, [...] eu vou dar um
exemplo: “Bolsa Família”. [...] para eles virem pesar, que é um dever dos pais
trazerem os seus filhos [...] a gente acaba falando [...] vocês tem que pesar aquela
criança porque se não vocês vão perder o benefício da “Bolsa Família”. Já para eles
compreenderem que [...] “para eu não perder o meu beneficio eu preciso ir pesar o
meu filho” (P5).
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Quando questionadas sobre em que situações encontram maior dificuldade
em fazer orientação, as respostam foram: medicação e vacinação do idoso.
A dificuldade quanto à medicação é referida a situações em que as pessoas
são analfabetas, o que dificulta a administração dos medicamentos, mesmo que
sejam separados em caixas ou pacotinhos coloridos. Também foram citados casos
de pessoas com problemas de visão, outros em que a medicação controlada ou de
uso contínuo é administrada só quando acham necessidade, sem falar nas que
dividem a medicação com familiares e amigos. Também foi discutido o uso abusivo e
indiscriminado da automedicação, o que chama a atenção para a cultura da
medicalização.
A dificuldade quanto à vacinação dos idosos, segundo eles mesmos, pode ser
pelo fato de causar reações adversas. Demonstram dificuldades de aceitação
quanto ao local para aplicação o que causa algum tipo de constrangimento e dificulta
a adesão durante as campanhas.
Os ACS referem dificuldade na argumentação para convencer a comunidade
a tomar a medicação nos horários prescritos, bem como “persuadir” os idosos a
tomar a vacina e fazê-los perder o medo de alguma complicação. Sendo assim,
novamente reivindicam capacitações que as tornem preparadas para a abordagem
das famílias nos diferentes ciclos de vida.
[...] a gente explica, mostra horário, pega receita, explica como é que faz, como é
que não faz, eles teimam que o médico falou que é para fazer assim, ou que a
vizinha faz assim. Ai você explica de novo que cada pessoa é uma pessoa, [...] cada
pessoa reage de uma forma, [...] o que dá para aquela pessoa não dá para essa. Só
que a gente nota muita dificuldade principalmente nos idosos. Aqueles que os filhos
abandonaram [...]. Aí é bem complicado. A gente separa, pode separar todo o dia a
medicação... Todo dia ele toma? Ele não toma! Ele toma do jeito que ele acha que
tem que ser (P8).
[...] A gente está no limite, no século 21, mas essas pessoas ainda têm a mente
muito voltada às coisas antigas. Não tem aquele pensamento: “não agora as coisas
estão evoluindo, as coisas estão melhores”. Por quê? Porque ficam atreladas
somente em novelas, não assistem jornais, não se desenvolvem assim, na forma de
pensar [...] (P11).
[...] Nós não estamos preparadas para fazer prevenção, infelizmente é isso. Por que
a gente é contratada e não oferecem um curso [...] (P15).
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A partir das discussões realizadas ao longo da segunda oficina, verificou-se a
necessidade de se refletir as práticas e planejar as ações de acordo com cada
realidade. Para tanto, esse planejamento deve ser amplamente discutido entre os
profissionais da ESF que prestam a assistência e a comunidade organizada, por
entender que discutir questões relativas à coletividade é exercer o controle social.
Isso já está de acordo com a nova visão da Promoção e Educação em Saúde, já que
trata as pessoas como sujeitos que participam das ações de saúde da comunidade.
Em conversa com a coordenadora da unidade, em virtude das festas de final
de ano, ficou definido a inviabilidade da continuidade das oficinas, uma vez que
havia uma programação de folgas na semana do Natal e na semana do Ano Novo, e
as equipes de Saúde da Família estariam se revezando no atendimento à
comunidade. Sendo assim, as duas últimas oficinas foram retomadas no mês de
janeiro de 2012, no período de férias da pesquisadora.
O terceiro encontro foi agendado para o dia 03 de janeiro de 2012 no mesmo
local e horário dos anteriores. Compareceram as ACS que haviam vindo
anteriormente. Ao analisar a fala das participantes em oficina anterior, ficou
evidenciada a dificuldade em ouvir, de fato, o outro. Tentei problematizar a prática
dos agentes comunitários de saúde em suas relações com a comunidade, na
tentativa de identificar suas dificuldades e potencialidades. Decidi iniciar os trabalhos
propondo a dinâmica do “telefone sem fio”. Após duas tentativas e muitas risadas o
grupo chegou à conclusão de que não ouvir direito o outro é uma falha de
comunicação grave, e alguns se perderam por não estarem prestando a atenção no
que deviam, o que ficou evidenciado na fala de uma das participantes.
[...] Não prestei a atenção na minha amiga. Eu fiquei escutando a conversa da outra
querendo passar para ela (P1).
Após o fechamento da dinâmica foi distribuído aos participantes um texto
intitulado “as sete atitudes de um bom ouvinte” para ser lido em dupla. Nesse
momento alguns participantes demonstram alívio pela leitura não ser individual. Foi
solicitado para que as duplas lessem e discutissem o conteúdo, sublinhando aquilo
que fosse importante, procurando relacionar no que cada um se encaixa no texto,
levando em consideração suas dificuldades e potencialidades. Enquanto eram
dadas as orientações, algumas ACS estavam distraídas com seus celulares. Solicitei
para que mantivessem seus aparelhos desligados ou no vibra call para que não
80
atrapalhassem as demais colegas. Após o tempo estipulado deu-se início ao debate.
Foram muito interessantes e surpreendentes as reflexões que surgiram em torno do
tema proposto. Cito aqui algumas delas:
[...] eu acho que é mais difícil ouvir porque geralmente a gente sempre quer dar a
opinião da gente antes da pessoa falar realmente o que está acontecendo. Eu acho
que já é um instinto de a gente querer falar e não ouvir (P8).
[...] não tenho paciência de escutar, já saio fora! (P1).
[...] tenho momentos que eu não sou de muito falar [...] Eu prefiro mais ouvir. Porque
no ouvir eu escuto e no ouvir eu aprendo. [...]. Também eu gosto de falar, mas
depende da situação e da ocasião. Mas eu prefiro mais ouvir, é mais importante
(P12).
[...] Eu até escuto, só que o problema é a minha mente. [...]. A minha mente fica
viajando. [...]. A gente escuta sim, mas a mente... (P5).
[...] acho que a pessoa tem que prestar mais a atenção no conteúdo e não na
pessoa que está falando. [...]. Primeiro eu ouço e depois eu dou minha resposta. [...]
Nem sempre a gente concorda com a pessoa que está falando [...] (P6).
[...] A qualidade de ouvir é importante [...]. Não somente saber ouvir, mas saber
guardar o que a pessoa está falando [...] porque o falar é prata e o ouvir é ouro [...]
quando nós ouvimos com atenção, com interesse, pretendendo ajudar aquela
pessoa aí tornamo-nos bons ouvintes (P11).
[...] o mais difícil é você não julgar a pessoa que está falando [...]. Como eu julgo
primeiro se é coordenador, enfermeira ou o técnico [...] na situação de ouvinte é não
julgar a pessoa que está falando (P9).
Como observamos nas falas dos ACS escutar pode ter diferentes conotações
para cada um e é um dos mais importantes fatores na relação com as pessoas que
contatam, como por exemplo, a ACS que julga as pessoas antes de ouvi-las: pelo
seu cargo, seus trajes, seu saber, etc.
Tomando por base o pressuposto que ensinar não é transmitir conhecimento
e sim criar espaços de discussão onde o mesmo possa ser compartilhado, isso só é
possível quando o “escutar” se torna mais importante do que o “falar”, como destaca
Freire:
81
Escutar significa a disponibilidade permanente por parte do sujeito
que escuta para a abertura à fala do outro, ou gesto do outro, às
diferenças do outro [...] é escutando bem que me preparo para
melhor me colocar ou melhor me situar do ponto de vista das ideias.
Como sujeito que se dá ao discurso do outro, sem preconceitos, o
bom escutador fala e diz sua posição com desenvoltura (FREIRE,
2000, p. 135).
Conforme o debate foi esquentando, surgiram exemplos de situações vividas,
por algumas das participantes, que traduzem o papel do Agente Comunitário de
Saúde. Exemplos em que a escuta foi essencial para o estabelecimento do vínculo e
de uma relação de confiança mútua, bem como algumas falas que refletem a
satisfação com o seu trabalho ao sentirem-se úteis na vida de alguém.
[...]. Eu tenho outra senhora, a primeira vez que eu fui à área aqui, eu fui lá embaixo,
no final da rua [...] na casa 15 tinha uma senhora na porta, uma senhora bem de
idade, 76 anos. E eu fui lá falar com ela [...] ela estava debruçada e eu cheguei até
ela e disse: Bom dia senhora! Ela falou assim: “Bom dia! Ué, gente nova no
pedaço”? Eu digo: É, eu estou no lugar da Beltrana. Aí ela pegou e falou assim:
Quer entrar? Eu digo: Não senhora! Eu só vim lhe conhecer [...]. Aí ela pegou e falou
assim: Entra! Sentamos na escada da casa dela, estava o tempo meio “chuviscoso”.
A primeira pergunta que aquela mulher me fez foi a seguinte. Ela disse assim pra
mim: Como é seu nome? Eu digo: O meu nome é “Fulana”. “Fulana” eu vou lhe fazer
uma pergunta: Eu tenho 76 anos, eu estou no final da minha vida, eu quero
perguntar para você o que é que a gente encontra do outro lado da vida, quando a
gente morre? Eu disse: Misericórdia! Eu cá comigo, aqui dentro. Eu digo: Meu Deus!
O que eu vou responder para ela? Eu digo: Olha dona Fulana é o seguinte [...] nesse
momento eu não vou lhe responder. A senhora tem bíblia? Ela falou assim: tenho!
Então a senhora vai pegar a sua bíblia, a senhora vai começar a ler a sua bíblia
desde o primeiro capítulo de gênesis e daqui a 15 dias eu vou me preparar e vou vir
lhe trazer esta resposta [...] porque, realmente, a senhora me pegou de surpresa!
Quinze dias depois eu voltei. Eu fiquei lá na casa daquela mulher das 09h15min da
manhã ao meio dia e meio, conversando com ela. Essa mulher chorava igual criança
pequena. Hoje, eu tenho aquela senhora, meu Deus! Como minha avó! Foi uma
pessoa assim que eu aprendi a amar, aprendi a gostar. E é uma pessoa totalmente
carente! Eu, de verdade, eu gostaria que quando eu estivesse nessa situação, nessa
idade, que alguém falasse, conversasse comigo, me desse uma atenção. Que Deus
está me dando sabedoria para dar para esse povo, com certeza! Porque tem muita
gente aí fora, nas nossas áreas... Tem pessoas chatas! Tem pessoas que dá
vontade de você pegar e... Muitas coisas nós temos que engolir, mas tem pessoas
que realmente precisam de uma palavra amiga, de um abraço, de um carinho, de
um beijo. Vale muito mais do que uma consulta e um medicamento, é a atenção!
(P12).
Neste exemplo fica bem clara a atenção com que a ACS dispensou à pessoa
e o fato de voltar, pela segunda vez consecutiva, no mesmo mês, demonstrou a
82
atenção e importância que deu a conversa da senhora, fatores fundamentais na
escuta qualificada.
Durante os debates procurei me deter no papel de mediadora, o que exigiu
um esforço particular no sentido de não interferir nas “verdades” do grupo, uma vez
que essa foi minha primeira experiência com a metodologia problematizadora. O
exercício de mediação possibilita ao pesquisador-educador aprender enquanto
educa o que contribui para a elaboração de uma nova forma de ver o mundo e suas
infinitas possibilidades. De acordo com Andaló (2006) mediações são processos
facilitadores, que possibilitam ao indivíduo apreender o mundo que o cerca em seus
significados.
Na sequencia foi oferecido um lanche, enquanto eu preparava o retroprojetor
para dar sequência aos trabalhos.
Decorrido o intervalo, retomei a questão do “saber ouvir” trazendo para o
círculo algumas das falas dos participantes que foram gravadas e transcritas para
que fizessem um exercício de “ouvir o que foi falado”, como um instrumento de
releitura coletiva da realidade social onde se vive e se trabalha.
Através desse exercício foi possível resgatar nas falas: as concepções do
grupo sobre saúde/doença, que foi relacionada com fatores sociais; foi observado
que o conceito de Promoção confunde-se ainda ao de Prevenção; a percepção das
ACS sobre Educação Popular em Saúde ainda é entendida como palestra, “uma
receita de bolo”, algo que já se leva pronto; no bairro onde vivem e trabalham o
Controle Social não é efetivo e que a comunidade não está organizada e preparada
para exercê-lo; foi possível discutir que, apesar das ACS não se sentirem
valorizadas na sua função e que seu papel nem sempre é entendido pela
comunidade, muito tem sido feito, apesar de todas as dificuldades encontradas no
dia a dia; muitas situações puderam ser resolvidas ou amenizadas quando a escuta
foi qualificada e houve um maior comprometimento da equipe, inclusive para acionar
parcerias; quando a escuta é inadequada muito pouco ou quase nada é feito, não
trazendo nenhum benefício às famílias atendidas; a falta de comprometimento e de
preparo dos profissionais da ESF interfere na qualidade do atendimento prestado;
falta de planejamento das equipes para prestar um atendimento de melhor
qualidade; considerando que a assistência pressupõe uma ação educativa, faz-se
necessário a criação de ambientes favoráveis que possibilitem a reflexão, a
83
ressignificação do cotidiano e a tentativa de construir novas práticas e
conhecimentos.
O último encontro ocorreu dia 11 de janeiro de 2012 quando iniciei os
trabalhos fazendo uma retomada de tudo o que foi discutido ao longo das três
primeiras oficinas. Foram relembrados os conceitos de Saúde, Promoção e
Educação Popular em Saúde. Ao final foram exibidos alguns slides com um
agrupamento de figuras mostrando a diversidade cultural do povo brasileiro, fazendo
menção às crenças, às origens, às práticas esportivas, o cuidado com a natureza e
com o planeta, as festas típicas de cada região, o incentivo à alimentação saudável
e as diferenças raciais. Nesse momento houve algumas intervenções por parte dos
participantes, pois alguns desconheciam algumas das festas típicas que foram
mostradas, como o Festival de Parintins na Amazônia, onde o Boi Garantido e o Boi
Caprichoso foram confundidos com o Bumba meu Boi. Tão logo se encerraram as
discussões solicitei para que o grande grupo se dividisse em dois pequenos grupos
e com o auxílio de revistas cada grupo recortasse figuras e procurasse montar um
conceito do que ficou entendido como Promoção e Educação Popular em Saúde.
Para tanto solicitei que cada grupo elegesse uma ou duas relatoras para explanar
sobre o tema proposto. Para a respectiva dinâmica foi determinado 30 minutos para
a execução. A referida dinâmica transcorreu num clima descontraído, todas
buscavam figuras relativas ao tema proposto, faziam sugestões para as colegas e
trocavam entre si as revistas e demais materiais ofertados. A pesquisadora esteve
sempre presente em ambos os grupos, acompanhando de perto o trabalho de
construção dos cartazes e as discussões de cada grupo. Depois de decorrido o
tempo estipulado deu-se início a apresentação dos grupos.
No momento da apresentação houve certo nervosismo por parte das
relatoras, o que foi logo superado com o apoio e o incentivo da pesquisadora e o
restante do grupo. Trago aqui algumas falas que considero importantes:
Grupo 1:
[...] promoção seria: ter saúde, amor, dinheiro, harmonia em casa, equilíbrio
emocional, trabalho coletivo, esporte, moradia, alimentação, lazer, religião, lutar por
melhorias na assistência à saúde (em busca de soluções) e a comunidade unida (a
luta é do povo). [...] segundo o que discutimos no grupo sobre educação popular o
que chegou mais próximo do nosso entendimento seria [...] Saber que pode fazer a
84
diferença, cada um com as suas ideias, seus limites. Religião, felicidade, cultura,
isso faz parte da Educação Popular em Saúde (P9).
Figura 3 - Grupo 1 – “O que entendemos por Promoção/Educação Popular em Saúde”
Fonte: A autora (2012)
Grupo 2:
[...] a Promoção em Saúde ela não é só médico, remédio e consulta. Precisa ter
alguma coisa a mais. Como é que a pessoa vai melhorar, vai ter saúde se ela tem
uma condição financeira “zero”, se ela não tem uma boa alimentação, se ela não
tem condições de praticar um exercício, seja porque só tem academia paga. Agora a
gente tem aqui (se referindo à Academia Popular). Tem outros lugares que não tem.
[...] a pessoa sem lazer também não tem saúde. Tudo isso que está aqui engloba
Promoção à Saúde: o lazer, uma boa casa que propicie boas condições para ela
viver. Aqui, tem uma mulher com uma criança pedindo esmola. Não adianta você
tirar uma pessoa dessas daqui da rua e trazer na Unidade pra consultar, dar um
remédio, dar uma receita e ela voltar para a mesma situação. Amanhã ela vai estar
com o mesmo problema (P8).
[...] Ela precisa ter toda uma estrutura voltada para ela! [...] Acesso também ao
transporte, ao trabalho [...] Aqui eu tenho um autoexame de mama, que sempre está
na mídia. Isso aqui é uma Promoção à Saúde também. O acesso a preservativo é
85
uma Promoção à Saúde. A gente escreveu aqui que também Promoção à Saúde
quer dizer acesso ao atendimento, consultas, exames, escuta e resolutividade (P8).
Figura 4 - Grupo 2 – “O que entendemos por Promoção/Educação
Popular em Saúde”
Fonte: A autora (2012)
Após a apresentação dos grupos (Figuras 3 e 4) foi feito um breve intervalo
para um café. Na sequencia foi solicitado para os presentes que sugerissem
propostas de ações voltadas à Promoção tendo como eixo estruturante a Educação
Popular em Saúde. Foram elencados os seguintes temas: gravidez na adolescência,
saúde do homem, violência contra a mulher, criação de um Conselho Local de
86
Saúde, a necessidade de otimizar o espaço das escolas municipais oferecendo
cursos técnicos à noite para a comunidade, escola aberta nos finais de semana para
oferecer cursos e atividades esportivas aos jovens, estabelecer parcerias com os
setores públicos e privados que viabilizassem o desenvolvimento de todas essas
atividades.
Uma grande dificuldade que as ACS referem diz respeito ao espaço físico
para a realização de atividades com a comunidade, fora da unidade básica. Embora
se tenha a Igreja ao lado da unidade, seu salão é reservado para atividades de
artesanato e aulas de eucaristia o que reduz a disponibilidade de dias e horários. O
mesmo ocorre com o Centro de Múltiplo Uso, que atende a população idosa. Como
são quatro equipes e todas necessitam desses espaços os momentos para
desenvolver tais atividades acabam sendo insuficientes. O espaço das escolas e
creches é de melhor acesso, já que as atividades são realizadas em horários de
funcionamento das mesmas.
87
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A ESF é uma proposta voltada para o desenvolvimento local uma vez que
prioriza as capacidades endógenas da população, incentiva a participação popular,
facilita o acesso ao conhecimento, auxilia na mobilização e no fortalecimento da
comunidade em prol da melhoria de sua qualidade de vida.
Dentro deste contexto, o ACS pode ser uma peça chave que auxilia a
comunidade a se organizar e a tomar para si a responsabilidade pelo seu
desenvolvimento. No entanto, para que isso ocorra depende de como os ACS se
apropriam de sua identidade, da forma como ocorre a prática na realidade, bem
como a forma com que foram capacitados.
O presente trabalho, através da Metodologia Problematizadora de Paulo
Freire buscou discutir e refletir as concepções e práticas de Promoção da Saúde
desenvolvidas pelos ACS e sua ligação com a Educação Popular em Saúde.
Durante as oficinas o debate em torno do tema proposto foi muito interessante
e recheado de exemplos oriundos de experiências vivenciadas no cotidiano do
trabalho das ACS. Entretanto, os resultados ora apresentados não pretendem ser
exaustivos e tem como objetivo principal estimular debates semelhantes por parte
daqueles que venham a utilizar a referida metodologia.
Percebi que as ACS se sentiram acolhidas na primeira oficina, onde o
entrosamento foi excelente possibilitando a inclusão de todas no grupo, que
permaneceu coeso até o final dos trabalhos. Considero este um aspecto
fundamental ao se trabalhar em educação, ou seja, o sujeito com quem me relaciono
deve sentir-se confiante e incluído no que vou propor para que efetivamente aja
como sujeito capaz de tornar-se melhor.
Foi possível observar nas falas conflitos, contradições, despreparo e
desconhecimento quando o assunto é Promoção e Educação Popular em Saúde.
Promoção que segue sendo confundida com a Prevenção ou mesmo com a
concepção de saúde/doença. Ao final, embora tenha sido discutido o conceito de
Promoção, não ficou muito claro para alguns participantes que a Promoção da
Saúde não concerne exclusivamente ao setor sanitário, que saúde é um direito a ser
conquistado e não se dá de igual forma para todos, dependo do estrato que
pertencem.
88
A definição de Promoção da Saúde expressa na Carta de Ottawa (BRASIL,
2002a) chama atenção para o almejado protagonismo das pessoas e a necessidade
de que desenvolvam a habilidade e o poder de atuar em benefício da própria
qualidade de vida, enquanto sujeitos e/ou comunidades ativas. Ou seja, ela exige
que profissionais e comunidade se tornem protagonistas de um processo de
mudança que visa o bem comum. Para tanto, as ações sobre a determinação da
saúde demandam uma composição inter e intra-setorial, de forma a ampliar a
consciência sanitária. Sendo assim, há de se mudar drasticamente os padrões
econômicos no interior da sociedade e intensificar as políticas sociais para que haja
um impacto positivo na qualidade de vida das pessoas. Promoção tem a ver com a
atitude em todo o cuidado de saúde, com toda a assistência desde a forma como
acolho este usuário até a sua passagem por outros serviços de saúde e finalmente a
resolução de seu problema de forma efetiva e o mais rápido possível. Em suas
práticas as ACS demonstram a importância que dão ao acolhimento do usuário.
Porém suas práticas de escuta precisam ser repensadas.
Pude observar que o conceito de Educação Popular foi ainda mais difícil de
discutir, uma vez que a Educação Popular em Saúde é ainda entendida e
confundida com palestras prontas, sem nenhum enfoque crítico que permita a
reflexão sobre o conteúdo a ser falado. O modelo de educação bancária ainda
persiste, perpetuando a alienação nos modos de entender e fazer saúde, servindo
como um instrumento de dominação da população por sua característica autoritária
e coercitiva, o que foi verificado nas falas de algumas ACS. Isto se torna mais forte
na medida que observamos que são os próprios profissionais de saúde que
mantêem e acreditam em tais práticas. Em contraponto a Educação Popular tem
como mote formar sujeitos com conhecimento e consciência cidadã e organizar o
trabalho político para a afirmação do sujeito. “A conscientização é uma das
fundamentais tarefas de uma educação realmente libertadora e por isso respeitadora
do homem como pessoa” (FREIRE; NOGUEIRA, 2002, p. 45).
Desta discussão surgiu a reflexão acerca das propostas educativas realizadas
pela ESF, onde muitas têm ficado no âmbito das intenções, sem que de fato haja um
impacto positivo na vida das pessoas. Por outro lado, quando colocadas em prática,
são desenvolvidas de modo intuitivo sem a preocupação de criar espaços para o
diálogo com os atores envolvidos, desmerecendo-os como sujeitos de sua própria
história. Há ainda muita confusão entre o modelo de saúde tradicional e o modelo
89
atual, o que ficou evidenciado na conduta prescritiva dos profissionais de saúde
durante as dramatizações. A consequente especialização desnecessária foi
verificada nos debates que seguiram as dramatizações, quando alguns participantes
do grupo sugerem a existência de especialistas na área de Saúde Mental para o
atendimento da população nas Unidades Básicas de Saúde.
Uma das dificuldades encontradas é a questão da medicalização e a
consequente culpabilização da vítima. São consequências autoritárias do modelo
biomédico que se chocam com uma Educação em Saúde e a Promoção da Saúde
emancipatórias. Outro ponto fraco encontrado é o trabalho em equipe que se
encontra fragilizado pela falta de estímulo/compromisso de seus integrantes. É
importante que a equipe esteja disposta a compartilhar objetivos, decisões,
responsabilidades e resultados. É preciso ter clareza dos objetivos, discutir um plano
de trabalho em que todos possam estar incluídos, aprimorar as relações
interpessoais e a escuta. Não menos importante seria o responsabilizar-se
democrática e solidariamente pelos resultados, quer sejam positivos ou negativos.
No entanto, o que ficou evidenciado nas dramatizações e nas falas das ACS foi a
falta de uma programação durante as visitas domiciliares.
Como potencialidades verificaram-se: a possibilidade de se trabalhar com os
adolescentes, buscando alternativas para que tenham uma ocupação; a escuta das
ACS que apesar de não se apropriarem dela, ainda sim existe e deve ser
trabalhada. Ao final aponto que a reflexão ou os fez perceber ou os fez confirmar de
que a situação social interfere na saúde-doença.
Aplicar o método da problematização proposto por Freire pode oferecer um
caminho diferente de educar, pois considera o outro no seu fazer e pensar e tem
relação com a Educação permanente proposta pelo Ministério da Saúde. A proposta
de Freire tem a ver com nossa própria vivência: a de profissionais que durante toda
a sua vida estão e estiveram expostos a uma atitude autoritária e não
experimentaram a participação. Foi complicado separar as etapas propostas por
Freire, ainda que na discussão. Na prática as etapas, principalmente a codificação e
decodificação se interpenetravam de tal maneira que ficaria difícil descrevê-las em
separado. Assim é que em vários momentos da prática proposta me encontrei com
meus próprios fantasmas autoritários e tive que reaprender outra forma de me
colocar frente aos ACS.
90
Quando questionados quanto à prática em Promoção e Educação surgiram os
seguintes temas geradores: relação com o usuário, o trabalho do ACS não é
valorizado, o ACS tem uma escuta, mas não a reconhece, a medicalização, a
culpabilização da vítima, falta de um trabalho em equipe, os ACS não são ouvidos
pela equipe. Como codificação, vimos que não é possível fazer promoção nas atuais
práticas de saúde, a relação de controle com o usuário e a escuta que se evidencia
de formas diferentes entre os ACS. Quanto às decodificações foi possível fazê-las
no momento em que problematizei as práticas e concepções das participantes,
outras, quando como pesquisadora, tomei contato com o que as ACS trouxeram,
como: práticas muito medicalizadas que denotam uma saúde somente ligada ao
biológico; trabalho não é em equipe, pouca valorização dos espaços de troca, pouca
valorização do ouvir (ouvir relacionado a não julgar, não falar tanto deixando o outro
se colocar, valorizar o que o outro traz e deixá-lo falar mais). Nos desvelamentos
pude perceber que para os ACS saúde tem a ver com o modo de andar a vida, que
eles possuem uma escuta, mas que é preciso valorizar e qualificar mais o que já
fazem e por fim, trouxeram ideias de como trabalhar Promoção e Educação para
além da área da saúde. O próprio fato de possibilitar aos ACS se expressarem,
trocar opiniões, ter alguém que escutasse suas falas, pode ter valorizado suas
práticas. Sugere-se que o estudo seja ampliado para as demais equipes de Saúde
da
Família,
contribuindo
desenvolvimento
para
de atividades
ações
mais
para melhoria
eficazes
do
no
serviço,
planejamento
e
respeitando
as
características individuais de cada realidade social e principalmente proporcionando
aos trabalhadores a oportunidade de experimentarem uma metodologia participativa.
Assim como um estudo que possibilite criar uma tecnologia a partir dessa prática.
91
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VASCONCELOS, E. M. Educação popular e a atenção à saúde da família. 3. ed.
São Paulo: Hucitec, 2006.
100
APÊNDICES
101
APÊNDICE A - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Gostaria de convidá-lo para participar em um trabalho acadêmico intitulado “PROMOÇÃO
DA SAÚDE: Problematizando a prática do Agente Comunitário de Saúde”. Este tem por
objetivo discutir e refletir as concepções e práticas de Promoção da Saúde desenvolvidas
pelos ACS, da UBS do Rio Bonito, e sua ligação com a Educação Popular em Saúde, com
vistas à elaboração de propostas de ações para a comunidade assistida.
Para isto, serão realizados cinco encontros com os ACS que aceitarem participar da
pesquisa, utilizando a metodologia problematizadora de Paulo Freire. Os dados obtidos
serão sigilosos, assegurando o anonimato dos participantes e utilizados somente para os
devidos fins da pesquisa.
Quanto aos aspectos éticos, gostaria de informar que:
a) Seus dados pessoais serão mantidos em sigilo, sendo garantido o seu anonimato.
b) Os resultados deste trabalho serão utilizados somente com finalidade acadêmica,
podendo ser divulgado em publicações científicas.
c) A aceitação não implica que estará obrigado(a) a participar, podendo interromper sua
participação em qualquer momento mesmo que já tenha iniciado, bastando, para tanto,
comunicar aos responsáveis pela pesquisa.
d) Você não terá direito à remuneração pela sua participação, ela é voluntária.
e) Este trabalho é de cunho acadêmico e não visa intervenção imediata.
f) Será realizada a devolutiva dos resultados em uma data marcada na instituição para a
discussão dos achados nesta pesquisa.
g) Durante a participação, se tiver alguma reclamação, do ponto de vista ético, você poderá
contatar o responsável por este trabalho.
102
APÊNDICE B - Consentimento de Participação do Sujeito
CONSENTIMENTO DE PARTICIPAÇÃO DO SUJEITO
Eu, ______________________________________________,RG_________________CPF
___________________ abaixo assinado, concordo em participar do presente estudo como
sujeito. Fui devidamente informado e esclarecido sobre a pesquisa, os procedimentos nela
envolvidos, assim como os possíveis riscos e benefícios decorrentes de minha participação.
Foi-me garantido que posso retirar meu consentimento a qualquer momento.
Local e data: __________________________________________________
Nome: _______________________________________________________
Assinatura do Sujeito ou Responsável:
_____________________________________________________________
Telefone para contato:___________________________________________
Pesquisador Responsável: Profa. Dra. Águeda Wendhausen
E-mail: [email protected]
Telefone (s): 47 3341 7932
Assinatura: _______________________________________
Acadêmico: Silvana Corrêa de Barros Lampert
E-mail: [email protected]
Telefone (s): 47 9650 5150
Assinatura:________________________________________
103
ANEXOS
104
ANEXO A – Atribuições do Comitê Gestor da PMPS
Atribuições do Comitê Gestor da Política Nacional de Promoção da Saúde:
• Consolidar a proposta da PNPS e de sua Agenda Nacional.
• Coordenar a implantação da PNPS e articulação com demais setores
governamentais e não-governamentais.
• Incentivar Estados e Municípios para elaborar Planos de PS; articular e
integrar ações de PS no SUS.
• Monitorar e avaliar as estratégias de implementação da PNPS e seu
impacto.
105
ANEXO B - Objetivos e Estratégias da Agenda Nacional
OBJETIVO 1
Estimular e contribuir na elaboração de políticas, estratégias e ações
integradas e intersetoriais que ampliem o acesso aos modos de viver mais
favoráveis à saúde e à qualidade de vida e fortaleçam as ações de prevenção e
controle de doenças e agravos não transmissíveis (DANT) e transmissíveis (DT).
ESTRATÉGIA 1
ESTRATÉGIA 2
ESTRATÉGIA 3
ESTRATÉGIA 4
ESTRATÉGIA 5
ESTRATÉGIA 6
Implantação das recomendações da Estratégia Global de
Alimentação Saudável e Atividade Física no país.
Estimular a alimentação saudável na perspectiva da segurança
alimentar e nutricional contribuindo com as Metas do Milênio
para garantir o direito humano à alimentação adequada e com a
implementação da Estratégia Global.
Estimular a prática de atividade física e de lazer em consonância
com a implementação da Estratégia Global.
Controlar e reduzir o consumo do tabaco, álcool e outras drogas.
Reduzir a carga de morbimortalidade decorrente dos agravos por
causas externas – acidentes de trânsito e violências.
Ampliar e fortalecer as ações de prevenção e controle das
doenças de notificação compulsória e outras de interesse de
saúde pública, conforme o perfil epidemiológico loco-regional.
OBJETIVO 2
Definir mecanismos e instrumentos para o monitoramento, acompanhamento
e avaliação das estratégias de promoção da saúde e a vigilância de doenças e
agravos não transmissíveis (DANT) no Brasil.
ESTRATÉGIA 1
Fomentar e realizar ações de monitoramento, acompanhamento
e avaliação das estratégias de promoção da saúde e a
vigilância da DANT.
106
OBJETIVO 3
Fomentar e desenvolver estudos e pesquisas para a produção de
conhecimentos, evidências e práticas no campo da promoção da saúde e doenças e
agravos não transmissíveis.
ESTRATÉGIA 1
Contribuir para a produção de conhecimentos, evidências e
práticas na área de promoção da saúde e doenças e
agravos não transmissíveis (DANT).
OBJETIVO 4
Sensibilizar e qualificar gestores, profissionais e usuários de saúde quanto à
promoção da saúde, vigilância e prevenção de DANT.
ESTRATÉGIA 1
ESTRATÉGIA 2
Promover a educação permanente em saúde quanto à
promoção da saúde, vigilância e prevenção de DANT.
Estimular e implantar práticas de co-gestão dos processos de
trabalho em saúde, qualificando gestores, profissionais e
usuários do SUS para o trabalho intersetorial e interdisciplinar
no cotidiano da gestão, da atenção e do controle social dos
serviços.
OBJETIVO 5
Favorecer a preservação do meio ambiente e a promoção de entornos e
ambientes mais seguros e saudáveis.
ESTRATÉGIA 1
ESTRATÉGIA 2
Fortalecer a área de vigilância ambiental em saúde no SUS.
Implementar projetos nas esferas federal, estadual e municipal
que visem à criação de entornos e ambientes saudáveis.
OBJETIVO 6
Superar a fragmentação das ações e aumentar a efetividade e eficiência das
políticas específicas do setor sanitário mediante o fortalecimento da promoção da
107
saúde como eixo integrador/articulador das agendas dos serviços de saúde e a
formulação de políticas públicas saudáveis.
ESTRATÉGIA 1
ESTRATÉGIA 2
ESTRATÉGIA 3
Estimular e constituir espaços de planejamento e tomada de
decisão colegiada (intra e intersetorial) visando à formulação
de políticas públicas saudáveis.
Sensibilizar e pactuar estratégias de promoção da saúde
nas várias instâncias do SUS.
Ampliar a relação dos serviços de saúde com os territórios
em que se localizam e os demais equipamentos públicos
nele existentes.
108
APÊNDICE C – Normas da Revista Trabalho, Educação e Saúde Pública para
preparo de manuscritos
Trabalho, Educação e Saúde publica contribuições originais com o intuito de
desenvolver o estudo sobre temas relacionados à educação profissional em saúde.
A política editorial da revista consiste em discutir esta área sob a ótica da
organização do mundo do trabalho, de uma perspectiva crítica, sistemática e
interdisciplinar. Antes de fazer a submissão de um manuscrito, recomenda-se a
leitura e o atendimento das normas para publicação.
A revista aceita contribuições inéditas dos seguintes tipos:
Ensaios - Produção textual de amplo alcance teórico-analítico, não conclusivo e não
exaustivo. Tamanho: 6.000 a 10.000 palavras, incluindo referências bibliográficas,
figuras e notas.
Artigos - Apresentação de resultado de pesquisa de natureza empírica ou
conceitual em consonância com a linha editorial da revista. Tamanho: 4.000 a 8.000
palavras, incluindo referências bibliográficas, figuras e notas.
Debates - Discussão sobre temas específicos, tanto encomendados pelos editores a
dois ou mais autores, quanto advindos de colaboradores. Tamanho: até 5.000
palavras, incluindo referências bibliográficas, figuras e notas.
Relatos - Descrição de experiências que apresentem inovações relativas aos
campos temáticos da revista. Tamanho: 3.000 a 5.000 palavras, incluindo
referências bibliográficas e figuras.
Entrevistas - Opinião ou posição de entrevistado qualificado nas áreas de
conhecimento da revista.
Resenhas - Crítica de livro relacionado aos campos de confluência da revista,
publicado ou traduzido nos últimos três anos. Tamanho: até 1.500 palavras.
Apresentação do manuscrito
Colaborações devem ser digitadas no Word, na fonte Times New Roman, em corpo
12, em espaço duplo, e enviadas para o endereço da revista, em duas cópias
impressas numeradas e uma cópia em CD ou DVD. O manuscrito deve ser enviado
com uma folha de rosto, onde constarão as seguintes informações: título com até
100 caracteres, incluindo espaços; nome(s) do(s) autor(es) e da(s) respectiva(s)
instituição(ões) por extenso; endereço para correspondência e telefones do primeiro
autor; nota biográfica com dados profissionais (cargo, filiação institucional, titulação,
cidade e país) e e-mail do(s) autor(es). Artigos, ensaios, debates e relatos devem
109
ainda conter um resumo em português e em inglês (abstract) de, no máximo, 200
palavras, e título em inglês, além do título na língua original. Os manuscritos podem
ser apresentados em português, espanhol, inglês e francês. O título deve ser
conciso e representativo do conteúdo do texto. O(s) autor(es) deve(m) indicar se a
pesquisa é financiada, se é resultado de dissertação de mestrado ou tese de
doutorado, se foi aprovada por Comitê de Ética da área e se há conflitos de
interesse. Em texto com dois ou mais autores, logo após as notas de fim, devem vir
especificadas, de forma sucinta, as responsabilidades de cada autor na preparação
do manuscrito.
Palavras-chave - Mínimo de três e máximo de cinco palavras-chave descritoras do
conteúdo do trabalho, apresentadas na língua original e em inglês (keywords).
Figuras - Tabelas, quadros, diagramas, fotografias, gráficos e ilustrações devem ser
apresentados em arquivos separados, com instruções sobre o local em que devem
aparecer no texto. As referências devem ser feitas através de números (ex. Gráfico
3) e não por expressões como “a figura abaixo”. O número de figuras não deve
ultrapassar o máximo de seis por artigo, salvo exceções específicas ao campo
temático do manuscrito, caso em que o autor deverá manter uma comunicação
prévia com os editores. Todas as figuras, com exceção de fotografias, devem ser
numeradas e ter título, estando apenas as iniciais do título em maiúsculas.
Notas - As notas devem vir ao fim do texto, sucintas e numeradas de forma
consecutiva. Não devem ser utilizadas para referências bibliográficas.
Grifos - Solicita-se a não utilização de sublinhados e negritos. As aspas simples
podem ser usadas para chamar a atenção para um item particular do texto. Palavras
de outras línguas, que não o português, devem ser italicizadas, assim como títulos
de obras mencionadas.
Citações - Citação no corpo do texto deve vir marcada com aspas duplas, com
sobrenome do autor, ano e página, como no exemplo (Bourdieu, 1983, p. 126);
citação com autor incluído no texto deve vir Gramsci (1982); citação com autor não
incluído no texto será (Frigotto e Ciavatta, 2001). No caso de citação com mais de
três autores, somente o sobrenome do primeiro deverá aparecer no texto, como em
Spink et al. (2001). Se a citação exceder três linhas, deverá vir com recuo à
esquerda equivalente a um parágrafo, em corpo 11.
Referências - Para elaboração das referências, Trabalho, Educação e Saúde adota
a norma NBR 6023, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Todas as
referências citadas, inclusive nas notas, nos quadros e nas figuras, deverão compor
as referências bibliográficas ao fim do texto, em ordem alfabética, sem numeração
de entrada, e um espaço entre elas. Nas referências serão citados, no máximo, até
três autores com todos os nomes. No caso de mais de três autores, citar apenas o
110
primeiro, seguido da expressão et al. Diferentes títulos de um mesmo autor,
publicados no mesmo ano, deverão ser distinguidos, adicionando-se uma letra em
minúscula após a data (ex. 2010a, 2010b), tanto nas citações no corpo do texto
quanto na lista de referências bibliográficas. Observem-se os exemplos a seguir:
Artigo
AROUCA, Antônio Sergio. Quanto vale a saúde dos trabalhadores. Saúde em
Debate, Rio de Janeiro, v. 8, n. 3, p. 243-265, dez. 1995-mar. 1996.
SPINK, Mary J. P. et al. A construção da Aids-notícia. Cadernos de Saúde Pública,
Rio de Janeiro, v. 17, n. 4, p. 851-862, 2001.
Livro e tese
GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. 4. ed. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1982.
MENDES-GONÇALVES, Ricardo Bruno. Medicina e história: raízes sociais do
trabalho do médico. Dissertação (Mestrado) - São Paulo, Faculdade de Medicina,
USP, 1979.
Capítulo de livro
BOURDIEU, Pierre. O campo científico. In: ORTIZ, Renato (Org.). Pierre Bourdieu:
sociologia. São Paulo:Ática, 1983. p. 122-155.
Resumo de congressos
LAURELL, Asa Cristina. O Estado e a garantia do direito à saúde. In: CONGRESSO
BRASILEIRO DE SAÚDE COLETIVA, 8., 2006, Rio de Janeiro. Anais... Rio de
Janeiro: Abrasco, 2006. 1 CD-ROM.
Dados fornecidos por agências governamentais (Secretarias, Ministérios, IBGE
etc.)
RIO DE JANEIRO. Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro (SMS-RJ).
Dados sobre acidentes ocupacionais com material biológico. Rio de Janeiro:
Programa de DST-Aids/Coordenação de Doenças Transmissíveis/Superintendência
de Saúde Coletiva - SMS-RJ, 2000.
Leis, decretos, portarias etc.
BRASIL. Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e
Bases da Educação Nacional. Diário Oficial da República Federativa do Brasil,
Poder Executivo, Brasília, DF, 23 dez. 1996. Seção I, p. 27.839.
Relatórios técnicos
BRASIL. Ministério da Saúde. Ministério da Educação. Referencial curricular para
curso técnico de agente comunitário de saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2004.
64 p. (Série A. Normas e manuais técnicos)
111
Relatórios de atividades ou finais de reuniões
BRASIL. Ministério da Saúde. Relatório final das atividades. Rio de Janeiro:
Fundação Oswaldo Cruz, 1999.
Jornal
a. Sem indicação de autoria: O GLOBO. Fórum de debates discute o projeto
Educando o Cidadão do Futuro. O Globo, Rio de Janeiro, 6 jul. 2001. Caderno 1, p.
18.
b. Com autoria: TOURAINE, Alan. Uma resistência possível. Folha de S. Paulo, São
Paulo, 3 jul. 2001. Mais, Caderno 7, p. 18-20.
Internet
a. Texto em periódico eletrônico: SANTOS, Milton. Entrevista por José C. Leite. São
Paulo, 1999. Teoria e Debate, 40. Disponível em: . Acesso em: 12 jul. 2001.
b. Texto em jornal eletrônico: NAHMIAS, Michèle. Dans le pays en développement,
l’évaluation des risques laisse à désirer. Le Monde, Paris, 2 jul. 2002. Disponível em:
http://www.lemonde.fr/recherche - resultts/1.9687,0.html. Acesso em: 21 jul. 2002.
c. Texto disponível (fora de revista ou jornal): BRASIL. Ministério da Educação.
Educação profissional: referenciais curriculares nacionais da educação profissional
de ensino técnico - área Saúde, 2000. Disponível em: . Acesso em: 4 mar. 2002.
CD-ROM
BRASIL. Ministério da Saúde. Sistema de informação sobre mortalidade - 1979 a
1996. Brasília, 1997. 1 CD-ROM.
Revisão
A revista se reserva o direito de sugerir alterações em usos informais da língua e de
corrigir variantes não padrão do português.
Avaliação
As contribuições encaminhadas à revista são, primeiramente, avaliadas pelos
editores, que julgam a adequação temática do texto à linha editorial da publicação e,
posteriormente, por até três pareceristas ad hoc. Nomes dos autores e avaliadores
de cada original são de conhecimento exclusivo dos editores. Os originais
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devem ser submetidos simultaneamente a outra revista. Originais submetidos à
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Exceto nos casos em que está indicado o contrário, ficam concedidos à revista os
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obriga a devolver os originais das colaborações enviadas. Os textos assinados são
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Benefício dos autores
Após a publicação, os autores recebem dois exemplares do número da revista no
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Endereço para envio
Os manuscritos devem ser enviados para os editores da revista:
Revista Trabalho, Educação e Saúde
Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio/Fiocruz
Avenida Brasil, 4.365 – Manguinhos
CEP 21040-360 – Rio de Janeiro – RJ - Brasil
Para maiores informações, consultar os editores: [email protected]
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