UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE CENTRO TECNOLÓGICO MESTRADO EM SISTEMAS DE GESTÃO JOSÉ LUIZ PEREIRA DUARTE SILVA ESTRUTURAÇÃO DE PROJECT FINANCE COM FINANCIADORES INTERNOS E EXTERNOS: ESTUDO DE CASO DE UM PROJETO TERMELÉTRICO Niterói 2010 JOSÉ LUIZ PEREIRA DUARTE SILVA ESTRUTURAÇÃO DE PROJECT FINANCE COM FINANCIADORES INTERNOS E EXTERNOS: ESTUDO DE CASO DE UM PROJETO TERMELÉTRICO Orientador: Luís Perez Zotes, D.Sc. Niterói 2010 JOSÉ LUIZ PEREIRA DUARTE SILVA ESTRUTURAÇÃO DE PROJECT FINANCE COM FINANCIADORES INTERNOS E EXTERNOS: ESTUDO DE CASO DE UM PROJETO TERMELÉTRICO Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Sistemas de Gestão da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Sistemas de Gestão. Área de Concentração: Sistema de Gestão pela Qualidade Total. Aprovado em 17 de dezembro de 2010 BANCA EXAMINADORA: ________________________________________ Prof. Luís Perez Zotes, D.Sc. Universidade Federal Fluminense ______________________________________ Prof. José Rodrigues de Farias Filho, D.Sc. Universidade Federal Fluminense ________________________________________ Profª. Cristina Gomes de Souza, D.Sc. CEFET Dedico este trabalho Aos meus pais, Dalmo e Vera, pela educação que me proporcionaram e, também, pelos ensinamentos de retidão dados ao longo de minha vida. À minha esposa, Cristina, pela compreensão e apoio dedicados durante o desenvolvimento de minha pesquisa. Aos meus filhos, Marina e Bernardo, por estimularem a força que me move para mostrar-lhes o caminho a seguir. Ao meu tio e padrinho, Dalton, pelo incansável apoio em seguir em meu aprimoramento pessoal. A Deus, por iluminar os meus passos e dar forças para ir em frente. AGRADECIMENTOS Agradeço a todos os professores, mestres e doutores, do curso de Mestrado em Sistemas de Gestão, da Universidade Federal Fluminense, pelos valiosos ensinamentos e pelas preciosas horas despendidas no intuito de partilhar seus conhecimentos conosco, seus discípulos. Agradeço a toda a equipe da secretaria do curso, especialmente a Hellen Costa Ramos, Luis Felipe Ramos Pereira e Rosana Therezinha Queiroz de Oliveira, pelo apoio fornecido ao longo desta temporada acadêmica. Agradeço a todos os colegas de turma, incansáveis incentivadores uns dos outros, pelos marcantes momentos de aprendizado e compartilhamento de experiências. Agradeço, em particular, ao meu orientador, Professor Luís Perez Zotes, D.Sc., por sua disponibilidade, pelos seus conselhos e pela confiança em mim depositada, predicados sem os quais não seria possível realizar este trabalho. “A sabedoria não se transmite, é preciso que nós a descubramos fazendo uma caminhada que ninguém pode fazer em nosso lugar e que ninguém nos pode evitar, porque a sabedoria é uma maneira de ver as coisas. (Marcel Proust)”. RESUMO O objetivo geral desta pesquisa é analisar um empreendimento financiado na modalidade Project Finance através de um estudo de caso real e detalhar a complexidade desta técnica de financiamento, abordando os riscos inerentes à adoção de múltiplas fontes de recursos e seus conflitos. O projeto-alvo foi a usina termelétrica Termopernambuco, cuja construção iniciou-se no ano 2000 e teve sua conclusão em 2004, tendo recebido financiamentos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A concepção deste estudo se deu através de uma extensa pesquisa realizada em livros, teses, dissertações, textos publicados por especialistas e materiais disponíveis que versam sobre o tema. A metodologia de pesquisa tem como base o estudo de caso que retratará a complexidade da estruturação de um financiamento na modalidade Project Finance e os diversos custos de estruturação decorrentes de sua utilização. Ao final, observa-se o impacto financeiro decorrente da dissonância entre os prazos de ingresso dos recursos de terceiros, representado pela alteração do custo de captação. Palavras-chave: Project Finance. Projeto. Riscos. Financiadores. Custos de Estruturação. ABSTRACT This work has for goal to investigate an enterprise financed in the Project Finance modality through a study of a real case and show the complexity of this financing technique, talking about the inherent risks by the adoption of multiple resources of funds and its conflicts. The target project was the thermoelectric unit Termopernambuco, whose construction started in 2000 and finished in 2004, receiving financial recourses from Interamerican Development Bank (IDB) and Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). This study is the result of a widespread research accomplished in books, thesis, others dissertations, texts published by specialists and available materials that deal with the theme. A case study portrays the complexity of financing structuring in Project Finance modality and the several structuring costs of its utilization. At the end, it’s possible to see the current financial impacts of the dissonance among the third party resources entrance, represented by the alteration of capitation cost. Keywords: Project Finance. Project. Risks. Lenders. Structuring Costs. LISTA DE FIGURAS Figura 01 Elementos Básicos de um Project Finance...........................................26 Figura 02 Organograma do BNDES......................................................................63 Figura 03 Fluxograma para obtenção de financiamento do BNDES....................68 Figura 04 Organograma da CAF...........................................................................73 Figura 05 Modelo de Negócios da COFACE........................................................75 Figura 06 Fluxograma IFO....................................................................................77 Figura 07 Fluxograma da Pesquisa......................................................................93 Figura 08 Organograma Societário da Neoenergia..............................................99 Figura 09 Linha do tempo do projeto Termopernambuco...................................117 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Gráfico 01 Cotação do Dólar..................................................................................95 Gráfico 02 Cotação do Ouro...................................................................................95 Foto 01 Usina Termelétrica Termopernambuco...............................................100 Gráfico 03 CMPC..................................................................................................120 LISTA DE QUADROS Quadro 01 Comparativo entre Project Finance e Corporate Finance....................33 Quadro 02 Membros Mutuários do BID..................................................................55 Quadro 03 Membros Não Mutuários do BID...........................................................56 Quadro 04 Termos e Condições para obtenção de financiamento do BID............59 Quadro 05 Encargos e Comissões em operações do BNDES...............................65 Quadro 06 Projetos brasileiros apoiados pela CAF................................................74 Quadro 07 Condições de financiamento do JBIC...................................................78 Quadro 08 Empreendimentos apoiados pela MIGA...............................................81 LISTA DE TABELAS Tabela 01 Distribuição dos registros encontrados por tipo de documento...........17 Tabela 02 Distribuição de registros por veículo de publicação.............................18 Tabela 03 Distribuição de registros de artigos por autor.......................................19 Tabela 04 Distribuição de registros por ano de publicação...................................21 Tabela 05 Distribuição de registros por setor produtivo........................................22 Tabela 06 Investimentos da Neoenergia...............................................................98 Tabela 07 Custo médio ponderado de capital.....................................................120 Tabela 08 Usos e Fontes do Projeto – com BNDES...........................................121 Tabela 09 Usos e Fontes do Projeto – sem BNDES...........................................122 Tabela 10 Empreendimentos com Financiamento Conjunto entre BNDES e BID......................................................................................................124 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ACE - Agência de Crédito à Exportação AID – Agência Internacional de Desenvolvimento AMGI – Agência Multilateral de Garantia de Investimento ANBID – Associação Nacional dos Bancos de Investimento BACEN – Banco Central do Brasil BEI – Banco Europeu de Investimento BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento BIRD – Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social BNDESPAR – BNDES Participações S.A. CAF – Corporação Andina de Fomento CCR – Companhia de Concessões Rodoviárias CEDAE – Companhia Estadual de Águas e Esgoto CFI – Corporação Financeira Internacional CIADI - Centro Internacional para Arbitragem de Disputas sobre Investimentos CMPC – Custo Médio Ponderado de Capital CODEFAT - Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador COFACE - Compagnie Française d´Assurance pour le Commerce Extérieur CRI – Certificado de Recebíveis Imobiliários DEST - Departamento de Coordenação das Empresas Estatais Federais DNAEE – Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica EIA – Estudo de Impacto Ambiental EMBASA – Empresa Baiana de Água e Saneamento FCO – Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste FDP - Fundo para Financiamento de Prevenção de Desastres FILP - Fiscal Investment Loan Program (Programa Fiscal de Investimento e Empréstimo do Governo Japonês) FINAME – Agência Especial de Financiamento Industrial FINEM – Financiamento a Empreendimentos FIRII - Fundo para Financiamento de Iniciativas de Integração Regional de InfraEstrutura FMI – Fundo Monetário Internacional FUMIN – Fundo Multilateral de Investimentos HOFP – Hibernia Oil Field Partners ICSD – Índice de Cobertura do Serviço da Dívida IFC – International Finance Corporation IFO – International Financial Operations INDES - Instituto Interamericano de Desenvolvimento Social INTAL - Instituto para a Integração de América Latina e do Caribe IPCA – Índice de Preços ao Consumidor Amplo IPO – Initial Public Offering (Oferta Pública Inicial) JBIC – Japan Bank for International Cooperation LIBOR – London Interbank Offered Rate MIDC - Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior MIGA – Multilateral investment Guarantee Agency MPOG - Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão MW - Megawatt O&M – Operação e Manutenção OEA – Organização dos Estados Americanos PND – Programa Nacional de Desestatização PPF – Mecanismo de Preparação de Projetos PPP – Parceria Público-Privada PREVI – Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil PROPEF - Mecanismo de Preparação e Execução de Projetos PURPA - Public Utility Regulatory Policy Act (Lei da Política de Regulamentação de Serviços Públicos) RIMA – Relatório de Impacto Ambiental SANEAGO – Saneamento de Goiás S.A. SBCE – Seguradora Brasileira de Crédito à Exportação S.A. SEMESA – Serra da Mesa Energia S.A. SPE – Sociedade de Propósito Específico TAPS – Trans Alaska Pipeline System TCU – Tribunal de Contas da União TIR – Taxa Interna de Retorno TJLP – Taxa de Juros de Longo Prazo WACC – Weighted Average Cost of Capital SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................... 1 1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA ....................................................... 1 1.2 APRESENTAÇÃO DA SITUAÇÃO-PROBLEMA .................................. 7 1.3 OBJETIVOS DA PESQUISA ................................................................. 8 1.3.1 Objetivo geral ...................................................................................... 9 1.3.2 Objetivos específicos ......................................................................... 9 1.4 QUESTÕES .......................................................................................... 9 1.5 RELEVÂNCIA DO PROBLEMA........................................................... 12 1.6 DELIMITAÇÕES DO ESTUDO ........................................................... 12 1.7 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO ..................................................... 13 2 REVISÃO DA LITERATURA .............................................................. 15 2.1 ESTUDO BIBLIOMÉTRICO ................................................................ 15 2.1.1 Tipo de publicação ............................................................................ 17 2.1.2 Publicações, periódicos e jornais ................................................... 18 2.1.3 Artigos por autor ............................................................................... 19 2.1.4 Ano de publicação ............................................................................ 20 2.1.5 Áreas temáticas ................................................................................. 21 2.1.6 Resultados ......................................................................................... 22 2.2 DEFINIÇÃO DE PROJECT FINANCE ................................................ 25 2.3 BREVE HISTÓRICO DO PROJECT FINANCE .................................. 27 2.4 CARACTERÍSTICAS DO PROJECT FINANCE ................................. 28 2.4.1 Exigências e adequações ................................................................. 28 2.4.2 Contratos ........................................................................................... 29 2.4.3 Project Finance versus Corporate Finance .................................... 31 2.4.4 Vantagens do Project Finance ......................................................... 35 2.4.5 Desvantagens do Project Finance ................................................... 36 2.4.6 Estrutura de projeto .......................................................................... 37 2.4.7 Riscos e mitigações .......................................................................... 38 2.4.8 Formas de financiamento ................................................................. 45 2.4.9 Sistemas de garantia ........................................................................ 46 2.4.10 As PPP’s com apoio da estruturação de Project Finance ............ 47 2.4.10.1 Estruturas de financiamento público-privadas .................................... 50 2.5 ENTIDADES PÚBLICAS E PRIVADAS DE FINANCIAMENTO ......... 52 2.5.1 Bancos de Fomento .......................................................................... 53 2.5.1.1 Banco Interamericano de Desenvolvimento ....................................... 53 2.5.1.2 Banco Mundial .................................................................................... 60 2.5.1.3 Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social ................. 62 2.5.2 Agências Multilaterais ...................................................................... 71 2.5.2.1 Corporação Andina de Fomento ......................................................... 72 2.5.2.2 Compagnie Française d´Assurance pour le Commerce Extérieur ...... 74 2.5.2.3 Japan Bank for International Cooperation ........................................... 76 2.5.2.4 Multilateral Investment Guarantee Agency ......................................... 80 2.5.3 Bancos Comerciais ........................................................................... 82 2.5.3.1 Banco do Brasil S.A. ........................................................................... 82 2.5.3.2 Demais Bancos Comerciais ................................................................ 84 2.5.3.3 ANBID – Rankings de Financiamento ................................................. 85 3. METODOLOGIA DE PESQUISA ....................................................... 87 3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS .............................................................. 87 3.2 CLASSIFICAÇÕES DAS PESQUISAS ............................................... 87 3.3 FASES DA PESQUISA ....................................................................... 90 3.4 ESCOLHA DO TIPO DE PESQUISA ADEQUADO ............................ 91 3.5 COLETA DE DADOS .......................................................................... 91 3.6 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS .................................. 92 3.7 LIMITAÇÕES DO MÉTODO ............................................................... 93 3.8 FLUXOGRAMA DA PESQUISA............................................................93 4 ESTUDO DE CASO ............................................................................ 94 4.1 OBJETIVO .......................................................................................... 94 4.2 O GRUPO NEOENERGIA .................................................................. 96 4.3 A USINA TERMELÉTRICA TERMOPERNAMBUCO ....................... 100 4.3.1 Contratos Técnico-Operacionais ................................................... 100 4.3.1.1 Contrato de Engenharia, Compra de Equipamentos e Construção .. 101 4.3.1.2 Contrato de Operação e Manutenção ............................................... 102 4.3.1.3 Acordo de Compra de Energia .......................................................... 103 4.3.1.4 Acordo de Fornecimento de Gás ...................................................... 103 4.3.1.5 Contrato de Arrendamento do Terreno ............................................. 104 2 4.3.1.6 Contrato de Uso do Sistema de Transmissão .................................. 104 4.3.1.7 Contrato de Conexão ao Sistema de Transmissão .......................... 105 4.3.1.8 Contrato de Fornecimento de Água Bruta ........................................ 105 4.3.2 Contratos Financeiros .................................................................... 105 4.3.2.1 Contrato de Financiamento com o BID ............................................. 106 4.3.2.2 Contrato de Emissão de Dívida Subordinada ................................... 107 4.3.2.3 Contrato de Financiamento com o BNDES ....................................... 109 4.3.2.4 Contrato de Empréstimo Subordinado .............................................. 110 4.3.3 Contratos de Garantia .................................................................... 111 4.3.3.1 Acordo de Contribuição de Capital ................................................... 112 4.3.3.2 Acordo de Suporte de Acionistas ...................................................... 112 4.3.3.3 Acordo de Retenção de Ações ......................................................... 113 4.3.3.4 Contrato de Penhor de Ações e dos Direitos de Crédito .................. 113 4.3.3.5 Contrato de Penhor de Contas ......................................................... 114 4.3.3.6 Contrato de Penhor de Ativos ........................................................... 114 4.3.3.7 Contrato de Cessão Condicional do Contrato de Arrendamento ..... 115 4.3.3.8 Contrato de Penhor de Direitos Emergentes da Autorização ........... 115 4.3.3.9 Contrato de Cessão Condicional de Contratos e Penhor dos Direitos de Crédito .............................................................................................. 116 4.4 OBSERVAÇÕES SOBRE A ESTRUTURA CONTRATUAL.............. 117 4.5 IMPLICAÇÕES ECONÔMICO-FINANCEIRAS.................................. 118 5. CONCLUSÃO ................................................................................... 123 5.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE A PESQUISA....................................... 123 5.2 OBSERVAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES............................. 127 REFERÊNCIAS ................................................................................ 128 GLOSSÁRIO .................................................................................... 131 APÊNDICES ..................................................................................... 140 ANEXOS ........................................................................................... 146 1 1 INTRODUÇÃO 1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA O Project Finance1 é uma técnica de financiamento utilizada, geralmente, em projetos de infra-estrutura de grande porte. Este tipo de financiamento pressupõe que as receitas geradas pelo empreendimento sejam capazes de fazer frente às despesas de pagamento dos recursos obtidos para sua consecução. Contudo, não se trata de uma ferramenta recente. A história relata que transações baseadas nas características deste tipo de instrumento já eram utilizadas pelos ingleses há mais de 700 anos. Um exemplo disso foi o empréstimo que a Coroa Britânica fez, em 1299, com o banco florentino Frescobaldi, um dos principais existentes no mundo na época (que possuía como principais concorrentes os Bancos Bardi, Peruzzi e Acciauioli, também de Florença, e o Banco de Veneza, todos da Itália), para exploração de minas de prata na região de Devon, litoral sudoeste da Inglaterra. Como forma de pagamento da dívida, os ingleses permitiram que os italianos extraíssem prata pelo período de um ano, sem limite de quantidade. O detalhe relevante nesta transação foi que a Inglaterra não deu qualquer garantia da qualidade da prata a ser extraída e os italianos assumiram o risco de performance da operação (FINNERTY, 1999). Apesar de ser uma ferramenta com um histórico bastante antigo, somente em tempos mais recentes, entre as décadas de 60 e 80, se pode detectar sua utilização intensiva em projetos de grande envergadura ao redor do mundo. Um deles é o projeto de larga escala Trans Alaska Pipeline System (TAPS), desenvolvido entre 1969 e 1977 por uma joint venture formada por oito das maiores empresas de petróleo do mundo. Este empreendimento previa a construção de um oleoduto com 1.300 Km de extensão, ao custo de quase US$ 8 bilhões, para o transporte do petróleo bruto e gás natural liquefeito do norte do Alasca para o porto de Valdez no sul do estado, único livre de gelo. Os esforços pré-construção 1 Project Finance – traduz-se como financiamento de projetos; trata-se de uma técnica específica para financiamento de projetos. 2 demandaram aproximadamente 6 anos (de 1969 a 1975) e se destinaram à seleção da melhor rota, desenho do oleoduto e estudos geológicos. Sua fase de construção se deu entre março de 1975 e maio de 1977, e chegou a empregar mais de 28.000 trabalhadores em seu momento de pico. Sua inauguração ocorreu em 20 de junho de 1977, quando ocorreu o primeiro transporte de óleo. Até maio de 2008, já foram transportados algo como 15 bilhões de barris de petróleo bruto até o porto de Valdez (FINNERTY, 1999). Outro exemplo é o Hibernia Oil Field Partners (HOFP) formado por 5 grandes companhias de petróleo em 1988 para a exploração petrolífera ao largo da costa de Terra Nova, no Canadá, num investimento de pouco mais de US$ 4 bilhões. As empresas ExxonMobil Canada (33,125%), Chevron Canada Resources (26,875%), Petro-Canada (20%), Canada Hibernia Holding Corporation (8,5%), Murphy Oil (6,5%) e StatoilHydro Canada Ltd. (5%) uniram-se para construir uma plataforma de dimensões colossais, projetada para resistir a impactos com o gelo e icebergs, muito comuns na região de exploração. Sua altura é de 224 metros, equivalente à metade do Empire State Building, em Nova York, e é capaz de armazenar em seus tanques aproximadamente 1,3 milhão de barris de petróleo bruto. Uma tripulação de 185 pessoas se encarrega de manter o gigante em funcionamento. Cumpre ressaltar que este projeto foi concebido por intermédio de uma parceria entre as iniciativas pública e privada, um dos primeiros exemplos de PPP, cuja utilização e sinergia com o Project Finance será alvo de estudo em seção própria (FINNERTY, 1999). Um caso emblemático é o projeto da Euro Disneyland. A Walt Disney Company, conhecida empresa americana do ramo de entretenimento, sediada em Burbank, na Califórnia, expandiu seus domínios além do território americano quando da implantação do primeiro empreendimento fora dos Estados Unidos. A Tokyo Disneyland, localizada em Chiba, nos arredores de Tóquio, no Japão, foi inaugurada em abril de 1983. Já a Euro Disney localiza-se a 32 km de Paris, na França, ocupando uma área de aproximadamente 20 milhões de m2. Este posicionamento foi estrategicamente estudado, pois, num raio de seis horas de carro, flutua uma população de quase 100 milhões de habitantes, distribuída, principalmente, entre França, Inglaterra, Itália, Alemanha, Bélgica, Holanda e Suíça. Sua inauguração 3 ocorreu em 1992, e, além do parque temático do Reino Encantado, a Disney construiu um resort com sete hotéis, um parque aquático e um centro de exposições. Este projeto, concebido após a assinatura de um acordo com o governo francês em 1985, contava com uma estrutura financeira bastante alavancada, em meio a uma intrincada relação societária. O alto grau de alavancagem determinou um risco financeiro nas mesmas proporções, onerando o risco operacional para o projeto. A geração de recebíveis imobiliários era essencial para equilibrar o fluxo de caixa do projeto, trazendo-o a um nível de risco aceitável. Deste modo, em 1988, começaram os trabalhos de construção, e, apesar da recessão causada pela Guerra do Golfo, em 1990, a Euro Disneyland foi inaugurada em abril de 1992. Seu custo, na fase inicial, foi orçado em 14 bilhões de francos franceses. Em 1995, o nome do empreendimento foi alterado para Disneyland Paris, permanecendo Euro Disney como o nome da parceria empresarial que controla o complexo. Com o advento do Euro como moeda única da comunidade européia, em 1999, a mudança mostrou-se bastante oportuna, pois Euro Disneyland soava muito financeiro. Em 2008, atraiu mais de 15 milhões de visitantes, mas no início não foi nada fácil. Superar a resistência cultural francesa foi um dos maiores obstáculos enfrentados pelo projeto. Para tanto, foi obrigado a inserir em seus cardápios de café da manhã e de almoço vinhos e cervejas, de modo a satisfazer os visitantes de países próximos, cujas culturas possuem tais hábitos (FINNERTY, 1999). Mais recentemente, a partir do início da década de 90, a estruturação de projetos baseados na modalidade Project Finance passou a ser bastante difundida no mercado financeiro brasileiro. Levando em consideração uma diretriz governamental de privilegiar a privatização de seus ativos, principalmente os de energia elétrica e de telecomunicações, pela necessidade de melhoria da qualidade dos produtos e serviços oferecidos, houve a geração de uma enorme quantidade de projetos. Com a estabilidade econômica proporcionada pelo Plano Real, implementado em 1994, e com a confiança de órgãos financiadores internos e externos em alta, vários deles foram concebidos nesta modalidade, contando com a 4 criatividade de bancos comerciais, de desenvolvimento, de investimentos, de entidades multilaterais e de assessores financeiros especializados. Para o sucesso deste tipo de financiamento, é necessário que o empreendimento, enquanto projeto, mostre capacidade de geração de fluxos de caixa suficientemente consistentes para que os financiadores aportem seu capital em troca de uma remuneração adequada. As garantias envolvidas neste modelo de crédito são bastante complexas. Um apoio jurídico constante se faz necessário para que todas as amarrações contratuais possam dar o lastro garantidor ao crédito concedido. Em alguns casos, envolvendo mais de um órgão financiador direto ou indireto, a estrutura contratual tende a se tornar cara e complicada. Coadunar todos os interesses em jogo se transforma numa árdua tarefa para os assessores financeiros e jurídicos. A participação dos financiadores pari passu é um requisito fundamental para a mitigação dos riscos de ampliação do número de contratos necessários à garantia dos empréstimos concedidos. Caso contrário, o projeto corre, ainda em sua fase negocial, riscos que podem levá-lo à inviabilização. A despeito de todas essas peculiaridades, o Project Finance vem se destacando como uma excelente técnica de engenharia financeira para consecução de grandes projetos corporativos, tais como usinas de energia, principalmente térmicas e eólicas, oleodutos, refinarias, estradas, plataformas de petróleo e obras de infra-estrutura em geral. Esta modalidade de estruturação financeira aparece como uma boa alternativa aos métodos convencionais de financiamento para projetos intensivos em capital. Sua complexidade faz com que cada projeto seja único, necessitando de elaboração sob medida. Cada aspecto deve ser observado em seus detalhes, visando proporcionar uma perfeita integração entre todas as partes que o constituem. A título de informação, já que não será alvo de maior aprofundamento em sua teoria neste estudo, compreende-se como “método convencional de financiamento” 5 aqueles que são dados diretamente à empresa que deseja implementar melhorias em sua estrutura operacional, seja ampliando sua capacidade de produção dos mecanismos pré-existentes, seja através de novos projetos de expansão. Este tipo de financiamento chama-se Corporate Finance, ou seja, financiamento corporativo. Este é fornecido diretamente à empresa já constituída e suas garantias podem ser formadas por aval ou fiança dos acionistas (garantia pessoal) ou gravame em ativos existentes (garantia real). O crédito cedido passa a integrar o balanço da companhia e sua utilização pode não ficar vinculada exclusivamente aos projetos de investimentos para os quais se destina. O fluxo de caixa garantidor do pagamento das parcelas de dívida (principal + juros) é o gerado pela empresa como um todo. A única garantia executável, em caso de inadimplência, é aquela dada no contrato de cessão de crédito. Diferentemente, no Project Finance temos como base creditícia o fluxo de caixa futuro gerado pelo projeto, cercado de todas as amarrações contratuais que o compõe. Os projetos nacionais estruturados como Project Finance, em sua grande maioria não são considerados “projetos”, visto que boa parte partiu de empreendimentos já existentes e, alguns, eram provenientes de processos de privatização. Abaixo, um breve relato de projetos com essas características (Bonomi, 2004): – Ponte S.A. – Ponte Rio – Niterói – este é um bom exemplo de Project Finance “à brasileira”, tendo sido financiado em R$ 36 milhões pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em 1996, pelo prazo de 10 anos, com garantia do fluxo de recebíveis de pedágio. Fruto de um Programa de Concessões Rodoviárias do Governo Federal, em 1994, a Ponte era uma rodovia pré-existente, que carecia de maiores investimentos para manutenção de sua complexa e sensível estrutura física; – SEMESA S.A. – Serra da Mesa Energia – em 1993, o Governo Federal deu início a um processo de parceria com a iniciativa privada para aumento da capacidade instalada de energia elétrica no sistema energético nacional, através de um processo de licitação onde ao vencedor caberia a conclusão do aproveitamento hidrelétrico de Serra da Mesa, mapeado pelo Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica (DNAEE) e pela Eletrobrás. Serra da Mesa Energia S.A., cujo principal acionista era o 6 Banco Nacional S.A., e Furnas Centrais Elétricas, representando os interesses estatais, formaram parceria até a quebra do Nacional, que foi substituído, em 1997, pela VBC Energia, empresa composta por Votorantim, Bradesco e Camargo Corrêa. No ano seguinte, a obra foi concluída, recebendo a VBC 51,54% da energia gerada e Furnas, o restante. Com 1.275 MW de capacidade de geração, Serra da Mesa é o elo de ligação entre os sistemas Sul/Sudeste/Centro-Oeste e Norte/Nordeste, tendo consumido investimentos de aproximadamente US$ 800 milhões; e – Via Lagos S.A. – objeto de uma concorrência para licitação de um trecho de 60 km, ligando Rio Bonito a São Pedro D’Aldeia, no estado do Rio de Janeiro, promovida de Departamento de Estradas de Rodagem estadual, a Via Lagos, Sociedade de Propósito Específico (SPE) criada pela Companhia de Concessões Rodoviárias (CCR), teve seu contrato de concessão homologado em 18/03/1997, com investimentos previstos da ordem de US$82 milhões, a fim de recuperar esta importante malha viária na ligação com a Região dos Lagos fluminense. O financiamento contou com recursos nacionais do BNDES (equivalente a US$ 20 milhões) e internacionais do BID (US$ 37 milhões), totalizando US$ 57 milhões. Os US$ 25 milhões restantes foram a contrapartida oferecida pelos patrocinadores do projeto. Porém, é importante ressaltar a existência de empreendimentos nacionais que partiram da “estaca zero”, não havendo nenhum empreendimento pré-existente. Como exemplo, pode-se citar: – Hospital da Criança – empreendimento hospitalar voltado ao atendimento de exclusivo a crianças, localiza-se no bairro do Jabaquara, na capital paulista, tendo sido o projeto idealizado e construído, em 1998, pelo Grupo Hospital Nossa Senhora de Lourdes, financiado por meio da venda de cotas de um fundo imobiliário, cujos cotistas são remunerados por um contrato de locação de longo prazo (20 anos); e – Shopping Pátio Higienópolis – um shopping center em um bairro de alto poder aquisitivo em São Paulo (SP), financiado por uma estrutura de recebíveis imobiliários lastreada em Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI). 7 1.2 APRESENTAÇÃO DA SITUAÇÃO-PROBLEMA A diversidade de aplicações da estruturação de financiamentos na modalidade Project Finance remete à necessidade de elaborar estruturas que possam, além de tornar os projetos uma realidade operacional, dar aos envolvidos, sejam eles patrocinadores (sponsors), financiadores (lenders) ou compradores (offtakers), as garantias necessárias de que os riscos incorridos são remuneráveis a taxas consideradas justas para as partes. O plano de negócios (business plan) inicial prevê o funcionamento do projeto de acordo com determinadas premissas de custos, prazos e recursos financiáveis. Caso algum desses pressupostos não se concretize como planejado, o projeto sofrerá desvios, os quais deverão ser corrigidos o quanto antes. O acréscimo de custos decorrente destes imprevistos, certamente, afetará o retorno esperado do projeto. O suporte financeiro na fase pré-operacional deve ser suprido parte com capital próprio e parte com capital de terceiros (bancos ou agências de financiamento). Esta relação é, normalmente, da ordem de 30% de recursos dos interessados na consecução do projeto e 70% de órgãos financiadores. Entretanto, encontramos exemplos de empreendimentos mais ou menos alavancados, ou seja, com percentuais de participação de capital de terceiros maiores ou menores do que os habitualmente utilizados. Isso se dá à medida que os riscos envolvidos estejam bem delineados e mitigados através de mecanismos de garantia. Quanto maior o nível de garantia previsto, maior pode ser o apetite de financiamento dos bancos comerciais e de fomento, pois o nível de certeza de recebimento dos valores emprestados torna-se maior. O contrário também é verdadeiro; maiores riscos, sem a devida mitigação, afastam o interesse de financiamento, pois são maiores as chances de inadimplência por parte do projeto. Nesta relação comercial, alguns conflitos podem ocorrer quando temos dois ou mais financiadores, internos e/ou externos, além de vários fornecedores de insumos e/ou de serviços. Estão em jogo diversos interesses das partes envolvidas, cada qual buscando a otimização de seus retornos. 8 Observando todas essas nuances, o problema de pesquisa se constitui da seguinte questão: “Será que os custos de estruturação incorridos para costurar todos os interesses envolvidos, principalmente quando do financiamento conjunto por órgãos nacionais e estrangeiros, não comprometem a atratividade desta modalidade, colocando em risco a viabilidade do projeto e, consequentemente, a rentabilidade esperada pelos acionistas?”. 1.3 OBJETIVOS DA PESQUISA A partir de meados da década de 90, com a premissa de que o Estado não possuía recursos públicos suficientes para alavancagem de vários projetos ao mesmo tempo, e de que a iniciativa privada poderia se beneficiar com retornos adequados aos níveis de investimento necessários para a implementação de projetos de interesse estratégico ou não, o Project Finance apresentou-se como ferramenta apropriada à construção deste tipo de negócio. O desenvolvimento de empreendimentos nesta modalidade, teoricamente, não onera a estrutura de capital das empresas patrocinadoras, haja vista sua consecução por intermédio de companhias de propósito específico (special purpose companies), criadas especialmente para encampar os recursos financeiros próprios (dos sponsors) e de terceiros (dos lenders), necessários à sua execução. A intenção é não ocasionar impactos negativos no balanço da patrocinadora, alterando sua relação de capital e comprometendo sua classificação de risco, tornando mais onerosos futuros empréstimos necessários à condução de suas atividades essenciais. Para tanto, esta dissertação tem os seguintes objetivos: 9 1.3.1 Objetivo Geral O objetivo geral desta dissertação é investigar as possibilidades de financiamento de projetos de grande porte, através do uso da modalidade Project Finance, com a utilização de fontes de recursos nacionais e internacionais, analisando se os custos de estruturação incorridos para harmonizar os interesses das partes não colocariam em risco a rentabilidade dos acionistas e, por conseguinte, a atratividade do projeto. 1.3.2 Objetivos Específicos Derivados do objetivo geral, os objetivos específicos deste trabalho são: – – analisar a estrutura conceitual do projeto; aferir o impacto da decisão de tomada de obtenção de financiamentos internos e externos; – avaliar a relação custo-benefício incorrida por esta tomada de decisão; – aferir o impacto contratual das variações de prazos entre os financiadores; – analisar as decisões tomadas pelos controladores da companhia no pós- financiamento; 1.4 QUESTÕES O mercado brasileiro encontra-se em fase de expansão, com nossa economia figurando entre as principais do mundo. Com o fortalecimento de seus pilares de sustentação, obtidos através de uma política econômica e fiscal bem executada, o Brasil passou a integrar um seleto grupo de países emergentes chamado “BRIC” (Brasil, Rússia, Índia e China). Atualmente, a China é tida como locomotiva da economia internacional, pois qualquer movimento que realize tem impactos relevantes nas economias de países industrializados ou emergentes. Apesar da forte 10 desaceleração da economia mundial, provocada inicialmente pela crise das hipotecas de alto risco (subprime loans) americanas, que atingiu seu ápice em 2008, e expandida aos bancos que detinham tais papéis (alguns chegaram a “quebrar” efetivamente, a exemplo do americano Lehman Brothers), o Brasil mostrou-se sólido e suficientemente seguro para aporte de recursos para investimentos de longo prazo. O País possui um grande potencial a ser explorado em todas as áreas da economia e a estruturação de projetos na modalidade Project Finance pode ser um facilitador desse crescimento, desde que obedecidos determinados parâmetros de execução que respondam às seguintes questões: – o investimento é de interesse relevante à economia nacional? – o investidor público possui capacidade de execução do empreendimento? – os órgãos de financiamento públicos e privados têm interesse em apoiar o projeto, dada sua relevância para a economia local? – existe histórico de parcerias bem sucedidas entre os membros financiadores? – há conflitos de interesses entre financiados e financiadores? Como forma de atender aos anseios dos patrocinadores do projeto (sponsors), que devem oferecer um projeto exeqüível do ponto de vista econômicofinanceiro, é presumível que os financiadores (lenders) estejam aptos a suprir recursos em quantidade e custos adequados à consecução do empreendimento. Para isso, é necessário que sua estrutura geral seja compatível com os parâmetros considerados ideais para o sucesso do projeto. Contratos de garantia de venda dos insumos produzidos, de modo a gerar um fluxo de caixa consistente e constante ao longo do período de financiamento, contratos de execução das obras com garantia de completação (completion guarantee), contratos financeiros com taxas de mercado que propiciem uma adequada remuneração do capital próprio e de terceiros, contratos de seguro que dêem suporte no caso da ocorrência de algum sinistro, dentre outros, devem dar respaldo àqueles propensos a colocar seus recursos à disposição do projeto. Especificamente no caso de financiamentos conjuntos providos por entes nacionais e internacionais, é de se supor que ambos estejam alinhados na estratégia global de financiamento, aportando recursos nas quantidades necessárias e dentro 11 dos prazos especificados no plano do projeto. Qualquer divergência nas interpretações contratuais pode acarretar atrasos danosos ao cronograma físicofinanceiro do empreendimento, causando o que se chama na literatura do tema de cost overruns, ou seja, custos adicionais não precificados no fluxo de caixa do projeto. Neste caso específico de compartilhamento de financiamentos entre mais de banco, é conjecturável que os riscos de descompasso entre as liberações de recursos possam causar um aumento de custos de estruturação, mais precisamente no incremento do volume de contratos de garantia necessários para cobrir eventuais não aportes necessários ao cumprimento do cronograma físico-financeiro das obras. Além disso, serão necessários recursos próprios para cobrir, mesmo que temporariamente, a ausência do capital de terceiros. Certamente, isto reduzirá o nível de alavancagem do projeto, diminuindo, assim, a taxa interna de retorno do investimento. Portanto, pode-se estabelecer como questionamentos adicionais os seguintes: – A dissonância entre regras de financiamento entre entidades nacionais e internacionais pode onerar os custos de transação de estruturação financeira de projetos, ocasionando a necessidade de maior volume de contratos financeiros para regular as relações entre os lenders e os sponsors? – A não entrada dos recursos, sejam eles internos ou externos, dentro do prazo estabelecido no cronograma físico-financeiro do projeto, pode alterar a taxa interna de retorno do empreendimento e, consequentemente, dos acionistas, devido à possibilidade de exigência do financiador que primeiro comparecer com seus recursos de que os acionistas cumpram o cronograma aportando recursos próprios, podendo afetar, assim, o equilíbrio econômico-financeiro do projeto? Esta dissertação pretende examinar esse contexto e buscar respostas aos questionamentos realizados, de modo a beneficiar aqueles que utilizam o Project Finance como instrumento de financiamento a projetos. 12 1.5 RELEVÂNCIA DO PROBLEMA A relevância atribuída a essa pesquisa reside no fato de ser um estudo de um caso real que se propõe a demonstrar empiricamente o aumento de custos na sua estruturação contratual e financeira. Avaliar as melhores práticas de gestão de projeto, de modo a não onerar os custos envolvidos na sua estruturação contratual, sugerindo o estabelecimento de novos mecanismos de mitigação de riscos específicos, envolvendo duas ou mais entidades financiadoras de um projeto, poderá fazer com que os retornos esperados para os envolvidos não sofram alterações indesejáveis. 1.6 DELIMITAÇÕES DO ESTUDO Este estudo está voltado à abordagem de uma técnica de financiamento específica, bastante adequada ao momento atual de expansão econômica nacional, aplicada em passado recente a um projeto de geração de energia constante de um programa prioritário do governo federal nesta área. A pesquisa foca na estruturação contratual e financeira adotada para o Project Finance do projeto termelétrico Termopernambuco, localizado na região nordeste do Brasil, ocorrida no espaço temporal entre os anos de 2000 e 2004. Avalia a estratégia de financiamento implementada, bem como os impactos decorrentes desta decisão em sua estrutura contratual. Aborda os aspectos jurídicos relevantes relacionados à sua execução, além de um levantamento dos custos de estruturação adicionais provocados por dissonância entre órgãos financiadores internos e externos, o que levou à confecção de uma série de contratos não previstos inicialmente, além do aporte extraordinário de recursos próprios. Este trabalho não aborda aspectos relacionados a metodologias específicas de avaliação econômico-financeira de projetos, como por exemplo “fluxo de caixa 13 projetado trazido a valor presente”, no que tange a emitir juízo de valor acerca de sua validade e dos resultados por elas proporcionados. 1.7 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO Segundo MARCONI e LAKATOS (2009), a dissertação é um estudo de natureza reflexiva que consiste na ordenação de idéias sobre um determinado tema. Constitui-se num trabalho científico que requer defesa de sua tese de embasamento. Assim, esta pesquisa está estruturada de modo a fornecer um estudo com perspectiva didática, onde se observará uma determinada sistematização, ordenação e interpretação de dados (LAKATOS e MARCONI, 2009). Esta pesquisa terá a seguinte estrutura: – CAPÍTULO 1 – na INTRODUÇÃO apresentam-se: a contextualização do tema, com uma breve abordagem sobre “Project Finance” e seu emprego; a situação-problema a ser investigada; os objetivos da pesquisa, subdivididos em objetivo geral e objetivos específicos; questões, que são levantadas como norte a ser seguido na exploração do tema; hipóteses; delimitações do estudo, com foco bem delineado; relevância do problema, dando um contorno de importância ao foco da pesquisa; e estrutura da dissertação; – CAPÍTULO 2 – na REVISÃO DA LITERATURA serão abordados: um estudo bibliométrico sobre o tema, a definição de Project Finance, de forma bastante objetiva; o histórico, discorrendo sobre o tema ao longo do tempo; as características do Project Finance, com suas vantagens e desvantagens, estruturas e riscos inerentes, formas e fontes de financiamento; e algumas entidades públicas e privadas de financiamento a projetos; e – CAPÍTULO 3 – na METODOLOGIA DE PESQUISA serão enfocados: as classificações das pesquisas, as fases da pesquisa, a escolha do tipo de pesquisa adequado, posteriormente representado por um estudo de caso; 14 a forma de coleta e tratamento de dados; a análise de tais dados; e, por fim, as limitações do método escolhido. – CAPÍTULO 4 – no ESTUDO DE CASO será realizada uma contextualização temporal do período em que o Projeto Termopernambuco foi concebido, será apresentada a estrutura de seu grupo controlador, serão apresentados todos os principais contratos que compuseram sua estruturação, com ênfase nos contratos financeiros e especial atenção aos contratos de garantia. Por fim, serão feitas observações sobre a estrutura contratual e as implicações econômico-financeiras advindas. – CAPÍTULO 5 – na CONCLUSÃO serão apresentadas considerações sobre a pesquisa, com comentários sobre o desenvolvimento do Projeto Termopernambuco e suas fontes de financiamento e seus impactos no contexto geral do empreendimento, em especial na rentabilidade e no risco do projeto. Observações finais e recomendações arrematarão este capítulo. 15 2 REVISÃO DA LITERATURA Neste capítulo pretende-se realizar uma apresentação de tópicos relativos à base de pesquisa sobre o tema Project Finance. Seus itens foram selecionados e ordenados de forma a promover o melhor entendimento acerca do objeto da dissertação. Para isso, buscou-se a fundamentação teórica disponível na literatura nacional e estrangeira, de modo a trazer à luz todos os detalhes relativos à estruturação de financiamentos de projetos. Por tratar-se de assunto relativamente novo na literatura mundial, como descrito no tópico relativo ao seu histórico, suas fontes de pesquisa ainda não se apresentam em quantidade expressiva; contudo, em termos de qualidade técnica, as mesmas denotam o que há de mais relevante e atual sobre Project Finance. 2.1 ESTUDO BIBLIOMÉTRICO A “bibliografia estatística”, hoje denominada “bibliometria”, provém do termo em inglês “statistical bibliography”, e é representada por um conjunto de leis e princípios cujo objetivo principal é definir quais são os fundamentos teóricos da Ciência da Informação. Sua primeira utilização foi registrada em 1922 pelo inglês E. Wyndham Hulme (1859 – 1954), que, assim, identificou os processos científicos pela metodologia de contagem de documentos. Em 1944, o americano Charles Francis Gosnell voltou a utilizar a expressão statistical bibliography em um artigo no qual versava sobre a obsolescência da literatura. Outro americano, L. M. Rasig, em 1962, em estudo intitulado Statistical bibliography in health science, fez referência à bibliometria pela terceira vez. Em 1969, Allan Pritchard escreveu o artigo Statistical Bibliography or Bibliometrics, onde o termo bibliometria foi utilizado para expressar uma metodologia 16 baseada na matemática e na estatística voltada para a quantificação e investigação dos processos de comunicação escrita. Segundo Guedes, Borschiver (2005), existem três leis que parametrizam o uso da bibliometria: (i) Lei de Bradford, (ii) Lei de Lotka e (iii) Lei de Zipf. A primeira lei pretende estimar o grau de relevância dos periódicos em uma determinada área do conhecimento, dado que as publicações que possuem um número maior de citações sobre um determinado tema formam o núcleo de periódicos, conferindo, portanto, maior qualidade e relevância para aquele tema. A Lei de Lotka refere-se à produtividade dos autores e fundamenta-se no princípio de que “alguns autores publicam muito e muitos publicam pouco”. Desta forma, considerou que a relação entre o número de autores e o número de artigos publicados segue a Lei do Inverso Quadrado 1/n2, ou seja, o número de pesquisadores que escreveram dois artigos é igual a ¼ do número de pesquisadores que escreveram um artigo. A Lei de Zipf relaciona a freqüência de ocorrência de palavras em um determinado texto com a representatividade da informação. A essa relação chamou de lei da indexação automática, conseqüência do princípio geral do menor esforço. Neste contexto, afirma que se palavras que aparecem em um texto em quantidade superior à média forem relacionadas em ordem decrescente de freqüência a graduação das mesmas será inversamente proporcional à sua ocorrência. À confecção dessa lista de ocorrência dá-se o nome de rank, onde a palavra de maior ocorrência tem ordem de série 1, a seguinte, ordem 2, a terceira, ordem 3 e assim sucessivamente. Nos dias de hoje, a bibliometria tem sua utilização facilitada pelos mecanismos de acesso. As fontes de informações digitais e por meio da internet, em conjunto com as ferramentas tecnológicas desenvolvidas, são significativamente importantes no auxílio da análise de artigos e de seus autores. O estudo bibliométrico sobre o tema Project Finance foi realizado por intermédio de pesquisa no Portal de Periódicos CAPES, em especial aos dados indexados na Base de Dados do ISI Web of Knowledge (ISI). A ISI é uma base de dados indexada a uma plataforma de pesquisa virtual que contém quase 10.000 periódicos, em sua essência, internacionais, os quais cobrem todas as áreas da ciência. Além de periódicos, esta base indexa outros elementos, tais como, patentes 17 e publicações em conferências. Quanto ao horizonte temporal disponibilizado nesta base, observa-se que a mesma indexa textos completos publicados em periódicos desde o ano de 1969 e resumos publicados desde 1964. O estudo foi desenvolvido em cinco etapas distintas: (i) a primeira etapa, consistiu em verificar quantos registros por tipo de documento, ou publicação, corresponderam à pesquisa pela palavra-chave “Project Finance”; (ii) na segunda, foram selecionados e analisados os registros sob a forma de publicações, periódicos e jornais; (iii) na terceira etapa, fez-se uma triagem do número de artigos por autor; (iv) na quarta, foram analisados temporalmente os artigos e revisões da segunda etapa; e, por último, (v) foram classificados os artigos por área temática. A seguir, temos um detalhamento de cada fase da pesquisa. 2.1.1 Tipo de publicação Inicialmente, foi efetuada uma busca utilizando a frase exata “Project Finance”. Esta busca retornou 79 registros. Foi feito, então, um refinamento na pesquisa com base na subárea de “negócios e economia”, resultando em um universo de 46 documentos, cuja distribuição está apresentada na Tabela 01. Tabela 01. Distribuição dos registros encontrados por tipo de documento. Tipo de Publicação ARTICLE REVIEW ART AND LITERATURE BOOK TOTAL Fonte: ISI, 2009 Nº de Registros 27 7 6 6 46 Participação 59% 15% 13% 13% 100% A pesquisa foi, então, novamente refinada, considerando apenas os documentos em artigos e revisões, obtendo um total de 34 ocorrências. Foi procedida, então, uma análise bibliométrica sobre estes registros. Os resultados desta análise são apresentados a seguir. 18 2.1.2 Publicações, periódicos e jornais Dos periódicos, publicações e jornais indexados na base, 34 registros atenderam aos parâmetros da busca. Na Tabela 02 encontramos os dados referentes à distribuição dos registros obtidos, no que tange ao título do periódico, e que representam 74 % do total de registros encontrados. Compreende-se como título da publicação o título do veículo no qual o texto foi publicado. Isto é completamente distinto do título do artigo. Tabela 02 - Distribuição de registros por veículo de publicação. Título do Periódico AMERICAN BANKRUPTCY LAW JOURNAL APPLIED BIOCHEMISTRY AND BIOTECHNOLOGY BUSINESS LAWYER COMPUTERS & EDUCATION ECONOMIC THEORY ENERGY POLICY EUROPEAN FINANCIAL MANAGEMENT INSTITUTIONAL INVESTOR INTERFACES INTERNATIONAL JOURNAL OF FINANCE & ECONOMICS JOURNAL OF COMMON MARKET STUDIES JOURNAL OF COMPARATIVE ECONOMICS JOURNAL OF DEVELOPING AREAS JOURNAL OF DEVELOPMENT STUDIES JOURNAL OF FINANCE JOURNAL OF FINANCIAL AND QUANTITATIVE ANALYSIS JOURNAL OF FINANCIAL ECONOMICS JOURNAL OF INDUSTRIAL ECONOMICS JOURNAL OF THE OPERATIONAL RESEARCH SOCIETY LONG RANGE PLANNING MANAGEMENT SCIENCE MANCHESTER SCHOOL OF ECONOMIC AND SOCIAL STUDIES NATIONAL WESTMINSTER BANK QUARTERLY REVIEW R & D MANAGEMENT RESEARCH POLICY SERVICE INDUSTRIES JOURNAL SINGAPORE ECONOMIC REVIEW SLOAN MANAGEMENT REVIEW WORLD DEVELOPMENT TOTAL Fonte: ISI, 2009 Nº de Artigos Participação 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 2 6% 1 3% 2 6% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 1 3% 2 6% 1 3% 1 3% 3 9% 34 100% Observando a tabela 02 é possível utilizar uma análise de PARETO para identificar os periódicos que serão monitorados com: 19 • Maior nível de atenção (classe A), com monitoramento de todos os próximos números que serão publicados do periódico: - World Development. • Nível intermediário de atenção (classe B), com monitoramento freqüente: - Energy Policy, Institutional Investor e Service Industrial Journal. • Nível intermediário de atenção (classe C), com monitoramento eventual: - Todos os demais periódicos. 2.1.3 Artigos por autor Nesta etapa da pesquisa, efetuou-se um levantamento dos dados com tratamento equânime em autoria e co-autoria das publicações. A Tabela 03 apresenta a distribuição de registros e respectivos autores dos artigos indexados na base ISI. Tabela 03 - Distribuição de registros de artigos por autor. Autor WHITE, J ALTUG, S BALL, DF BALLESTERO, E BEIDLEMAN, CR BJERRE, CS COBBE, JH CRAWFORD, M DAILAMI, M DALLAMI, M DAM, L DAYANAND, N DOH, JP ESTY, BC FADHLEY, S FLETCHER, D GADANECZ, B GATTI, S GRIEVE, A HAUSWALD, R Nº de Registros 2 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 Participação 4% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 20 Tabela 03 - Distribuição de registros de artigos por autor. HELLIAR, C 1 HIMBERG, H 1 HONOHAN, P 1 HOWCROFT, B 1 HUANG, HZ 1 KAHN, E 1 KAIVANTO, K 1 KELLER, JB 1 LEIPZIGER, D 1 LELAND, HE 1 LEV, B 1 MARGERISON, J 1 MARTON, A 1 MEGGINSON, WL 1 MICHAELSON, R 1 MOSLEY, P 1 OZLER, S 1 PADMAN, R 1 PLATH, PB 1 POWER, D 1 RAMAMURTI, R 1 RASKOVICH, A 1 RIGAMONTI, A 1 SAITA, F 1 SANDLER, L 1 SCHOLTENS, B 1 SENATI, M 1 SIGMAN, HC 1 SINCLAIR, D 1 SMITH, EE 1 Total 51 Fonte: ISI, 2009 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 100% 2.1.4 Ano de publicação A Tabela 04 apresenta os dados referentes à distribuição de registros quanto ao ano de publicação dos artigos selecionados. Isto permite uma observação acurada de como a produção científica no tema pesquisado tem evoluído ao longo do tempo. Efetuando uma análise dos dados referentes ao ano de publicação, observase que: 21 • O primeiro registro sobre o tema Project Finance foi feito em um artigo datado há mais de 30 anos, mais precisamente, em 1976; • Podemos verificar um ciclo de produção mais acentuada na área nos últimos 10 anos (entre 1998 e 2008), com uma pequena retração entre 2000 e 2002; • Surpreende o fato de somente um artigo ter sido publicado no ano de 2008. Caberá, futuramente, uma análise mais aprofundada sobre a relevância que o tema está tendo na comunidade científica. Tabela 04 - Distribuição de registros por ano de publicação. Ano de Publicação 1976 1982 1983 1984 1985 1986 1990 1992 1995 1996 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2007 2008 Total Fonte: ISI, 2009 Nº de Publicações 1 1 1 2 2 1 1 1 2 2 3 3 1 2 2 3 5 1 34 Participação 3% 3% 3% 6% 6% 3% 3% 3% 6% 6% 9% 9% 3% 6% 6% 9% 15% 3% 100% 2.1.5 Áreas temáticas A Tabela 05 apresenta os dados referentes à distribuição de registros quanto ao tema de publicação. Isto permite perceber a abrangência da produção científica no tema pesquisado. 22 Analisando a tabela abaixo, observa-se que o tema pesquisado tem maior associação com as áreas de Negócios e Economia, Administração Pública e Governo e Legislação. Tabela 05 - Distribuição de registros por setor produtivo. Áreas/Setores BUSINESS & ECONOMICS PUBLIC ADMINISTRATION GOVERNMENT & LAW ENGINEERING ENVIRONMENTAL SCIENCES & ECOLOGY COMPUTER SCIENCE OPERATIONS RESEARCH & MANAGEMENT SCIENCE ENERGY & FUELS GEOGRAPHY AREA STUDIES BIOCHEMISTRY & MOLECULAR BIOLOGY BIOPHYSICS BIOTECHNOLOGY & APPLIED MICROBIOLOGY EDUCATION & EDUCATIONAL RESEARCH INTERNATIONAL RELATIONS MATHEMATICS PSYCHOLOGY SCIENCE & TECHNOLOGY - OTHER TOPICS TOTAL Fonte: ISI, 2009 Nº de Registros 34 7 5 4 4 3 3 2 2 1 1 1 1 1 1 1 1 1 73 Participação 47% 10% 7% 5% 5% 4% 4% 3% 3% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 1% 100% 2.1.6 Resultados A pesquisa bibliométrica foi realizada com a proposta de estabelecer um conjunto de critérios e normas que possibilitasse uma seleção adequada de artigos, de acordo com os preceitos básicos da bibliometria, levando em consideração o referencial inicialmente apurado na pesquisa. A seguir, pode-se verificar o resultado da aplicação dessas regras: a) Seleção dos 3 artigos mais antigos de autores diferentes presentes na base de dados, representando, em conjunto, 9% do universo de artigos coletados. Com base nesta regra foram selecionados os seguintes textos: 23 • External Project Finance in Developing-Countries - Institutional Implications of Recent Trends, WHITE, 1976. • The New Middlemen in Project Finance, SANDLER, 1982. • The Crisis In Aid-Supported Project Finance, CRAWFORD, 1986. b) Seleção dos 9 artigos mais recentes de autores diferentes presentes na base. Com base nesta regra, foram selecionados os seguintes textos: • Reassessing Risk in Developing Country Infrastructure, DOH e RAMAMURTI, 2003. • Creditor Evidence Rights, from Enforcement, the Global and Debt Syndicated Ownership Structure: Loan Market, ESTY e MEGGINSON, 2003. • Pivotal Buyers and Bargaining Position, RASKOWICH, 2003 • Credit-Spread Determinants and Interlocking Contracts: A Study of the Ras Gas Project, DALLAMI e HAUSWALD, 2007. • Measuring Value-At-Risk in Project Finance Transactions, GATTI e RIGAMONTI, 2007 • Public Provision of Sales Contingent Claims Backed Finance to SMES: A Policy Alternative, KAIVANTO e STONEMAN, 2007. • Financial Synergies and the Optimal Scope of the Firm: Implications for Mergers, Spinoffs, and Structured Finance, LELAND, 2007. • Banking on the Equator. Are Banks that Adopted the Equator Principles Different from Non-Adopters,SCHOLTENS e DAM, 2007 • The Term Structure of Credit Spreads in Project Finance, SORGE e GADANECZ, 2008. c) Seleção dos 9 artigos com maior grau de relevância, presentes na base. A ordenação pelo grau de relevância foi fornecida automaticamente pela base de dados do ISI WEB of Knowledge, sendo a esta relevância a combinação entre o número de vezes em que o artigo foi citado pelos periódicos que constam da base ISI e o fator de impacto (JCR) do periódico em que o artigo foi publicado. Com base nesta regra foram selecionados os seguintes textos: 24 • The term structure of credit spreads in Project Finance, SORGE e GADANECZ, 2008. • Project Finance: A credit strategy based on contractual linkages, HOWCROFT e FADHLEY, 1998. • Project Finance: a multi-criteria approach to arbitration, BALLESTERO, 2000. • Measuring value-at-risk in Project Finance transactions, GATTI, RIGAMONTI, SAITA et al., 2007. • Credit-spread determinants and interlocking contracts: A study of the Ras Gas project, DALLAMI e HAUSWALD, 2007. • Banking on the Equator. Are banks that adopted the Equator Principles different from non-adopters?, SCHOLTENS e DAM, 2007. • The role of lender behavior in international Project Finance, ALTUG, OZLER e USMAN, 2002. • The production tax credit for wind turbine powerplants is an ineffective incentive, KAHN, 1996. • Evaluating FINESSE: a case-study in group-based CAL, MICHAELSON, HELLIAR, POWER et al., 2001 d) Seleção de artigos com maior relevância para cada ano entre 1998 e 2008. Com esta medida, busca-se identificar quais os artigos tiveram maior relevância nos momentos de pico do tema pesquisado; ou seja, a evolução da moda. • 1998 Artigo selecionado (1/3): Project Finance: A credit strategy based on contractual linkages, HOWCROFT e FADHLEY, 1998. • 2000 Artigo selecionado (1/1): Project Finance: a multi-criteria approach to arbitration, BALLESTERO, 2000. 25 • 2001 Artigo selecionado (1/2): Evaluating FINESSE: a case-study in groupbased CAL, MICHAELSON, HELLIAR, POWER et al., 2001. • 2002 Artigo selecionado (1/2): The role of lender behavior in international Project Finance, ALTUG, OZLER e USMAN, 2002. • 2007 Artigos selecionados (2/5): Measuring value-at-risk in Project Finance transactions, GATTI, RIGAMONTI, SAITA et al., 2007; Credit-spread determinants and interlocking contracts: A study of the Ras Gas project, DALLAMI e HAUSWALD, 2007. • 2008 Artigo selecionado (1/1): The term structure of credit spreads in Project Finance, SORGE e GADANECZ, 2008. Neste trabalho, foram citados alguns dos artigos selecionados que, de alguma forma, trouxeram contribuição à pesquisa, enriquecendo os temas abordados com exemplos e experiências extraídos da literatura internacional. 2.2 DEFINIÇÃO DE PROJECT FINANCE Segundo Finnerty (1999, p.2): O Project Finance pode ser definido como a captação de recursos para financiar um projeto de capital economicamente separável, no qual os provedores de recursos vêem o fluxo de caixa vindo do projeto como fonte primária de recursos para atender ao serviço de seus empréstimos e fornecer o retorno sobre seu capital investido no projeto. 26 Este projeto, revestido de caráter jurídico distinto e segregado dos seus patrocinadores, pode abranger uma série de empreendimentos, que necessitem de estrutura econômico-financeira própria capaz de atrair investidores de capital, tais como: instalações de geração de energia, gasodutos, oleodutos, refinarias, portos, aeroportos, estradas, etc. Um empreendimento desenvolvido na modalidade Project Finance necessita, quase na totalidade dos casos, de uma sofisticada engenharia financeira, cujo objetivo principal é a adequada alocação de riscos e retornos entre os participantes da estruturação de modo mais eficiente do que numa operação financeira convencional. A figura abaixo retrata a estrutura básica de uma operação de Project Finance. Figura 01 – Elementos Básicos de um Project Finance Fonte: Finnerty, 1999. Como objeto central, tem-se o ativo correspondente ao projeto. Para sua iniciação, são necessários recursos próprios (de capital) e de terceiros (de empréstimos), que gerarão retorno aos investidores de capital e patrocinadores e pagamento da dívida aos credores. Os fornecedores entregam suprimento de matéria-prima, mediante contratos de fornecimento, que estabelecem as relações comerciais com o projeto. Processada, a matéria-prima transforma-se em produto 27 acabado, que representa a produção adquirida pelos compradores, os quais, em contrapartida, mediante os contratos de compra pré-estabelecidos, pagam determinada quantia, que representa o fluxo de caixa do projeto. 2.3 BREVE HISTÓRICO DO PROJECT FINANCE O Project Finance tem seus primórdios há 700 anos, na Inglaterra. Naquela época, a Coroa Britânica contratou junto ao banco italiano Frescobaldi um financiamento para exploração de uma jazida de prata na região de Devon. Como pagamento, os ingleses permitiram aos italianos o controle de operação e extração das minas durante o prazo fixo de um ano. Não foi dada garantia de qualidade, nem estabelecida quantidade de prata a ser extraída. Os riscos e benefícios eram todos do banco italiano. Este modelo de financiamento é o que se chama atualmente de Empréstimo com Pagamento em Produção. Sua utilização se deu de maneira mais expressiva nas décadas de 50 e 60 em projetos de exploração de reservas, como minerais, óleo e gás. No exterior, mais precisamente nos Estados Unidos, o Project Finance obteve forte impulso quando da promulgação, em 1978, da Lei da Política de Regulamentação de Serviços Públicos (PURPA). Por esta lei, as companhias distribuidoras de energia elétrica ficavam obrigadas a adquirir toda a produção de energia de produtores qualificados e independentes por intermédio de contratos de longo prazo. Este dispositivo contratual serviu para alavancar financiamentos para a execução de novos projetos e foi responsável pelo crescimento dos produtores independentes de energia. No Brasil, o Project Finance se desenvolveu a partir das privatizações iniciadas na década de 90, no governo do presidente Fernando Collor de Mello, por meio do Programa Nacional de Desestatização (PND), regulamentado pela Lei nº. 8.031, de 12 de abril de 1990. Calcadas na incapacidade do estado de prover recursos para a manutenção e desenvolvimento de novos empreendimentos, as privatizações tomaram maior vulto na administração do presidente Fernando 28 Henrique Cardoso, quando foram alienados os controles de empresas como Vale do Rio Doce, Embraer e Telebrás. Ao longo dos anos 90 e 2000, vários ativos foram privatizados e a necessidade de expansão da produção fez com que o BNDES e sua subsidiária BNDESPAR, cumprindo o papel de fomentadores do desenvolvimento econômico e social do país, atuassem no financiamento das primeiras operações de Project Finance brasileiras. Outro agente bastante importante na disseminação do Project Finance no Brasil foi a Petrobras. Desde o final da década de 90, sob comando do governo federal, e empresa participou, e ainda participa, da estruturação de diversos empreendimentos, no setor energético, de forma intensa. Vários projetos de unidades termelétricas, principalmente aqueles movidos a gás, puderam ser tirados do papel e postos em prática, graças à garantia de suprimento de matéria-prima (o gás) e de recursos financeiros e, também, de garantia creditícia a terceiros. 2.4 CARACTERÍSTICAS DO PROJECT FINANCE 2.4.1 Exigências e adequações Em sua origem, um projeto não possui qualquer histórico creditício no qual possa se basear para aspirar à obtenção de financiamentos para sua execução. Por isso, é preciso que o mesmo se mostre, aos olhos das entidades financiadoras, como um empreendimento técnica e economicamente viável. Pelo lado técnico, para que os emprestadores de recursos se sensibilizem, são necessárias garantias de que o projeto terá a produção estipulada em seu caso-base. Para isso, normalmente, são requeridas opiniões de consultores de engenharia independentes, de modo a atestar sua exeqüibilidade. Pelo lado financeiro, é preciso que os credores sintam-se confortáveis com a capacidade do projeto gerar fluxos de caixa consistentes ao longo do tempo, como forma de garantir o pagamento dos empréstimos concedidos, bem como remunerar 29 adequadamente os inversores de capital próprio. Sua consistência deve ser tal que, mesmo diante da ocorrência de eventos desfavoráveis, possibilite honrar seus compromissos financeiros. Além disso, deve ter a garantia do fornecimento de matéria-prima suficiente para sua operação e uma gerência capacitada para gestão do projeto. O projeto demandante de financiamento na modalidade Project Finance deve atuar como uma unidade autônoma, capaz de gerar retornos superiores aos que poderiam ser obtidos caso as atividades fossem desenvolvidas pela empresa patrocinadora. Este ponto deve ser encarado positivamente, tendo em vista que proporciona maior capacidade de alavancagem à patrocinadora, permitindo que outros projetos, com baixo grau de atratividade, ou mesmo necessidades financeiras meramente operacionais, sejam executados. De acordo com Filha e Castro (2000, p.109): Do ponto de vista dos financiadores, a análise de projetos industriais é, na sua essência, um estudo visando verificar a viabilidade do projeto, através da aferição das taxas de retorno e de sua capacidade de pagamento, associada a uma estrutura de garantias negociada em contrapartida aos créditos a serem concedidos. 2.4.2 Contratos Como visto em sua definição, a estruturação adequada da parte jurídica de um Project Finance é condição sine qua non para seu sucesso. As relações existentes entre todas as partes envolvidas devem ser suficientemente estáveis e financeiramente suportáveis, de modo a manter um equilíbrio representativo do desejo comum de alcançar seus retornos individuais ao final do projeto. Segundo Enei (2007, p.37), o Project Finance caracteriza-se por um “conjunto de contratos coligados celebrados com o objetivo de alocar responsabilidades e 30 riscos de forma clara, preferencialmente às partes que estejam mais aptas a absorvê-los”. Entre os principais contratos celebrados no âmbito de uma operação de Project Finance, podemos citar (BONOMI; MALVESSI, 2004, p.69): – Contrato de Caução de Ações (Share Pledge Agreement) – cauciona as ações do projeto em favor dos financiadores; – Contrato de Cessão de Direitos de Concessão (Concession Rights Assignment Agreement) – garante aos credores a cessão dos direitos oriundos de contratos de concessão; – Contrato de Cessão de Direitos Relacionados a Seguros (Insurance Assignment Agreement) – obriga que recursos provenientes de indenização de sinistros sejam depositados em contas do projeto ou cedidos diretamente aos credores; – Contrato de Empréstimo (Loan Agreement) – regula a relação entre o tomador e o doador dos recursos; – Contrato de Penhor de Contas Bancárias (Escrow Account Agreement) – rege o penhor dos recursos depositados em contas-correntes do projeto; – Contrato de Retenção de Ações (Share Retention Agreement) – obriga os acionistas a manter sua participação no projeto até o prazo final do empréstimo, ou seja, não pode haver troca de controle durante sua vigência; – Contrato de Suporte Financeiro dos Patrocinadores (Sponsors Support Agreement) – este contrato prevê a possibilidade de aporte de recursos pelos acionistas para o cumprimento de obrigações decorrentes de outros contratos; – Contrato de Termos Comuns (Common Terms Agreement) – define os principais termos dos contratos do projeto; e – Contrato entre Credores (Inter-creditor Agreement) – regulamenta a relação entre os financiadores do projeto, principalmente no que diz respeito à partilha de garantias. Este trabalho explorará exaustivamente as relações contratuais pertinentes à consecução do Projeto Termopernambuco, especialmente no que diz respeito à 31 parte financeira, responsável pelo incremento do número de contratos necessários à garantia de sua execução. 2.4.3 Project Finance versus Corporate Finance É importante destacar quando se pode, ou se deve, usar estruturas de financiamento de projetos (Project Finance) em detrimento dos financiamentos corporativos (Corporate Finance). Convém ressaltar que nem sempre a primeira opção é a melhor, pois dependerá dos custos e benefícios envolvidos na transação. Por isso, é necessário que se entendam as variáveis de cada modalidade e suas características. Somente após uma análise detalhada de todos os fatores é que os acionistas de uma empresa devem definir qual a ferramenta ideal a ser utilizada. Utilizar a técnica do Project Finance é conveniente quando um patrocinador possui um bom projeto, economicamente separável em sua carteira, capaz de atrair financiadores que não estariam dispostos a fornecerem fundos caso o mesmo permanecesse no portfólio da empresa. Quando a estruturação em separado puder oferecer um custo de captação de recursos a taxas mais baixas do que em um financiamento corporativo, deve-se empreendê-la. Um ponto relevante na decisão de financiamento é o conhecimento da estrutura de capital do projeto. Para isso, é essencial entender o conceito de estrutura de capital. Esta estrutura é composta de capital próprio (dos acionistas) e de terceiros (dos financiadores). A estrutura de capital ideal é aquela em que se usa o máximo de capital de terceiros em relação ao capital próprio, sem que se comprometa a capacidade de geração de um fluxo de caixa consistente que suporte o pagamento das dívidas e remuneração do capital dos acionistas. O custo total de captação deve levar em consideração os custos de capital próprio (dos tomadores) e de terceiros (dos emprestadores). Para isso, os mesmos 32 devem ser ponderados de acordo com a sua participação individual no custo geral. A isto se chama Custo Médio Ponderado de Capital (CMPC), tradução do original em inglês Weighted Average Cost of Capital (WACC). O custo do capital próprio pode ser estimado pelo Capital Asset Pricing Model (CAPM), um dos modelos teóricos mais bem aceitos pelo mercado financeiro, e é dado pela fórmula (ROSS, WESTERFIELD, JAFFE, 1995, p. 247): Rp = Rf + β x (Rm – Rf), onde: Rp é o custo (ou retorno esperado) do capital próprio; Rf é a taxa livre de risco (há algum tempo, especialistas utilizavam o retorno dado pela caderneta de poupança, considerando-a investimento de “risco zero”, por sua “garantia”. Contudo, hoje em dia, há métodos bem mais sofisticados para seu cálculo, cuja elaboração não será abordada neste trabalho); β é a medida de risco não-diversificável do investimento em relação ao risco do mercado; Rm é o retorno percentual médio esperado pelo mercado para a totalidade dos ativos que o compõem (carteira representativa do mercado). O custo do capital de terceiros é dado pela taxa cobrada pelo financiamento, que pode embutir uma parcela fixa e outra variável. A fixa é um percentual e a variável é representada por um indexador, como a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), a London Interbank Offered Rate (LIBOR) ou o câmbio (geralmente, o dólar americano). Segundo Bordeaux-Rêgo et al (2008), de forma conjunta, o CMPC ou WACC é representado pela fórmula a seguir: WACC = (E/V) x Re + (D/V) x Rd x (1 – T), onde: E = valor de mercado do capital próprio da empresa; D = valor de mercado da dívida de longo prazo da empresa; V = D + E = capital total da empresa; E/V = proporção do capital próprio em relação ao capital total; 33 D/V = proporção do capital de terceiros em relação ao capital total; Re = retorno mínimo esperado ou custo do capital próprio; Rd = custo do capital de terceiros; T = alíquota de imposto de renda de pessoa jurídica para efeito de apuração de lucro real; 1 – T = benefício fiscal proporcionado pelo pagamento de juros da dívida. O Corporate Finance deve ser a alternativa quando o projeto (que pode ser uma expansão de capacidade produtiva, por exemplo) não for atraente o bastante para ser financiado como uma unidade independente. Para auxiliar nesta comparação, foi elaborado o quadro abaixo com a sinopse dos principais pontos a serem verificados quando da decisão de investimento. VARIÁVEL Alocação de Riscos PROJECT FINANCE CORPORATE FINANCE ♦ Direito de regresso limitado ou ♦ Direito de regresso irrestrito nulo junto aos sponsors junto aos sponsors ♦ Os riscos do projeto são alocados às partes que os suportem contratualmente ♦ Os riscos são diluídos entre os ativos do portfólio dos sponsors ♦ Agilidade na montagem de Financiamentos ♦ Estruturação financeira complexa em termos de volume de informação, custos de transação operações financeiras ♦ Flexibilidade para uso de recursos captados e demanda de tempo ♦ Limitação de uso dos fluxos de caixa gerados para pagamento de dívidas e de dividendos, o último quando possível e permitido Estrutura Organizacional ♦ Entidade apartada da empresa ♦ Empresas sob forma de patrocinadora sob a forma de sociedades anônimas, como responsabilidade corporações de grande porte limitada ou sociedade anônima (SPE) ♦ Fluxos de caixa gerados por ♦ Fluxos de caixa e ativos do ativos e negócios diversos projeto segregados dos ativos formam fluxo de caixa único dos sponsors da empresa 34 VARIÁVEL Controle PROJECT FINANCE ♦ Controle dos CORPORATE FINANCE com sponsors monitoramento dos demais intervenientes do projeto ♦ Compromissos ♦ Incentivos contratuais dos menores agentes no e não pelo sucesso de um custos que em são ♦ Os custos de agência são um maiores do que em um projeto estruturado ♦ Suporte creditício provindo de outras pelos Conselhos Fiscal e de ♦ Incentivos são generalizados financiamento corporativo Nível de Alavancagem realizado projeto os do acionistas da companhia ao sucesso do projeto ♦ Geralmente, aos Administração da empresa atrelados desempenho pertence ♦ Monitoramento suportam o monitoramento Custos de Agência ♦ Controle fontes, como ♦ Empréstimos comprometem o grau de endividamento da fornecedores, compradores, etc., empresa, facilitam alavancagem futura (durante a empréstimos tomada de bancários pelo reduzindo sua a existência da dívida) projeto ♦ Pelo fato do projeto ter sólidas amarras contratuais, tende a possuir alta alavancagem. Risco de Falência ♦ Credores somente têm acesso aos ativos do projeto ♦ Credores têm à disposição a carteira ♦ Os ativos dos sponsors não concorrem com a insolvência do projeto de ativos dos sponsors do projeto ♦ Maiores custos para solução de pendências financeiras ♦ Custos menores de resolução de embaraços (disputa judicial) financeiros (arbitragem) Contratos de Dívida ♦ São feitos sob medida (tailor ♦ A carteira de ativos do pode servir de made) para suporte pelo projeto sponsor de garantia creditícia em caso acordo com suas características ♦ Ativos são de insolvência penhoráveis para honrar serviço da dívida Quadro 01 – Comparativo entre Project Finance e Corporate Finance ♦ A dívida não é garantida por ativos específicos 35 2.4.4 Vantagens do Project Finance A opção pela montagem do financiamento na modalidade Project Finance traz como suas principais vantagens: – Compartilhamento de riscos – os riscos financeiros e operacionais são divididos entre os diversos intervenientes do projeto, como patrocinadores, fornecedores, compradores, construtores, financiadores, etc. Deste modo, podem ser viabilizados empreendimentos de grande magnitude que não o seriam caso os riscos tivessem que ser suportados por uma única parte; – Economia de escala – dependendo da localização de um projeto, este pode beneficiar mais de uma companhia, as quais podem formar um empreendimento conjunto (joint venture) para consecução do mesmo, trazendo economias de escala que seriam inalcançáveis individualmente; – Expansão da capacidade de endividamento – como visto anteriormente, um Project Finance bem elaborado de um empreendimento possibilita a atração de capitais de terceiros baseado em sua estabilidade estrutural. Os contratos servem de lastro para o aumento da alavancagem financeira, que, em boa parcela dos projetos, chega a 70% do capital total; – Redução de custos de financiamento – as garantias contratuais de compra de matéria-prima e de venda da produção, afiançando a continuidade do fluxo de caixa do projeto, podem estabelecer níveis altos de classificação risco (rating)2 e, consequentemente, custos financeiros mais baixos para a SPE; – Redução de custos de pendências financeiras – pelo fato de possuir uma quantidade menor de contratos de financiamento e, por conseguinte, de credores, um projeto tende a ter custos de solução de conflitos jurídicos menores do que os de uma empresa padrão, que ao longo de determinado período pode contrair vários empréstimos corporativos simultaneamente, desde que haja capacidade financeira para tal; e 2 N.A. Níveis altos de classificação de risco (rating) implicam, ao contrário do que se pode depreender, maiores garantias de retorno do capital emprestado. A título ilustrativo, tabelas de classificação de risco são disponibilizadas no Apêndice A. 36 – Registro da dívida fora do balanço do patrocinador (off balance sheet) – até o advento da Instrução CVM 408/04, os recursos captados através da sociedade de propósito específico liberavam capacidade de alavancagem para os patrocinadores, possibilitando, assim, a tomada de novos empréstimos para investimento em outras atividades da empresa-mãe. Contudo, essa instrução determinou a consolidação em balanço das dívidas contraídas por projetos a ela subordinados. Deste modo, “perdeuse” uma vantagem comparativa considerável para o Project Finance. Cabe ressalvar que esta observação somente é válida caso a empresa principal seja uma companhia aberta, ou seja, uma sociedade anônima. 2.4.5 Desvantagens do Project Finance Abaixo, destacam-se algumas desvantagens deste modelo de financiamento (FINNERTY, 1999): – Complexidade contratual – a existência de vários intervenientes na estruturação de um Project Finance torna a discussão acerca dos detalhes contratuais uma tarefa demorada e onerosa do ponto de vista financeiro. Estes pontos denotam um aumento dos custos de estruturação necessários à conclusão das negociações; – Custos de transação – devido à complexidade estrutural do projeto, os custos envolvendo pesquisas, despesas de início de desenho da melhor estrutura, estudos para obtenção de possíveis benefícios fiscais, despesas com agentes de gerenciamento e elaboração de toda a documentação jurídica de suporte, tendem a ser maiores do que em um financiamento normal. Algumas vezes, os custos se tornam tão altos que os ganhos de rating que seriam obtidos em relação à condução do investimento pela empresa principal são anulados; e – Necessidade de cenário estável – a implementação de um projeto na modalidade Project Finance exige um cenário de estabilidade macroeconômica e política, com aspectos legais e marcos regulatórios 37 consistentes, o que nem sempre é possível ou detectável para o longo prazo. 2.4.6 Estrutura de projeto Basicamente, participam da formação da estrutura básica de um projeto concebido na modalidade Project Finance dois tipos de intervenientes: os sponsors/shareholders e os stakeholders. Os primeiros são os interessados no desenvolvimento do projeto e os segundos, aqueles que darão suas contribuições individuais para a formação e concretização do empreendimento. Todos serão beneficiados pelos resultados econômicos gerados pelo projeto, recebendo em troca uma remuneração que crie valor para o capital investido. O passo inicial é constituição do uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) para acolher o projeto. Orbitam esta entidade jurídica vários agentes, como: acionista (shareholder)/patrocinador (sponsor), agente fiduciário (trustee), assessor jurídico (legal adivsor), banco líder (arranger), comprador (offtaker), conselheiro financeiro (financial advisor), construtor (constructor), engenheiro independente (independent engineer), financiador (lender), fornecedor (supplier), operador (operator), poder concedente e seguradora (insurance company). A elaboração de um sólido plano de negócios (business plan)3 é fundamental para a atração de potenciais parceiros para desenvolvimento do projeto. Igualmente, são imprescindíveis as autorizações dos órgãos ambientais e do poder concedente para sua implantação. As participações de operador, construtor e fornecedor na fase preliminar minimizam o risco de conclusão, também chamado de risco de completação (completion risk), haja vista o interesse de todos no sucesso do empreendimento. Cabe ressaltar que o fornecedor de equipamentos e serviços pode ser outra fonte de recursos, tendo em vista que em muitos países Agências de 3 N.A. O Apêndice B apresenta um roteiro completo para elaboração de um business plan. 38 Crédito à Exportação (ACE)4 incentivam suas empresas exportadoras através de concessão de financiamento aos compradores. 2.4.7 Riscos e mitigações A avaliação e prevenção de possíveis riscos inerentes a um projeto financiado como Project Finance consome tempo e recursos durante a fase de sua estruturação. Deve-se procurar incessantemente pela melhor forma de mitigação, de modo a reduzir os impactos futuros provenientes de uma situação de risco. Segundo Finnerty (1999, p.39): Os credores de um projeto exigirão a proteção contra certos riscos básicos. Emprestar a um projeto antes do início da construção, sem proteção contra os vários riscos financeiros e do negócio, exporia os credores do projeto a riscos de capital. Um ponto de vista bastante interessante, e não observado em outros autores, possui Vellutini (2006), quando ressalta o “risco do acionista”, traduzido na capacidade setorial dos sponsors de um projeto. Para ele, os financiadores sempre devem certificar-se de que o principal acionista do empreendimento possui especialização no setor, além de um currículo que demonstre sua experiência e histórico de sucesso na área. De acordo com Dymond; Pineda (2004), os riscos técnicos, creditícios, regulatórios e econômicos devem ser alocados entre as partes envolvidas por meio de detalhadas relações contratuais. Segundo Sorge e Gadanecz (2004), o risco político deve ser tratado como uma importante preocupação na estruturação contratual de um projeto. A melhor maneira 4 de mitigar este risco, que envolve expropriações, guerras ou Na literatura internacional encontra-se comumente o termo ECA, que significa Export Credit Agency. 39 conversibilidades, é a obtenção garantias junto a agências de crédito à exportação ou bancos multilaterais de desenvolvimento. De acordo com Nevitt e Fabozzi (2000, p. 2), a melhor forma de entender as preocupações dos financiadores de projetos é considerar as causas mais comuns de falência destes empreendimentos, a saber: a) Atraso na completação, com aumento das despesas de juros sobre financiamento e atraso no início do fluxo de receitas; b) Sobrecustos de capital; c) Falhas técnicas; d) Falência do contratante; e) Interferências governamentais; f) Perdas não seguradas; g) Aumento de preços ou escassez de matéria-prima; h) Obsolescência técnica da planta; i) Perda de competitividade no mercado consumidor; j) Expropriação; k) Falha no gerenciamento; l) Projeções otimistas de valores de reservas, a exemplo de óleo e gás; m)Insolvência financeira do governo anfitrião. A seguir, serão abordados, então, os principais riscos ocorrentes em projetos estruturados e os instrumentos para sua mitigação (FINNERTY, 1999; BONOMI, 2004; VELLUTINI, 2006): • Risco do Acionista Conceito – é o risco que corre o credor de que um acionista/patrocinador de um projeto não possua especialização no ramo no qual pretenda implementar o empreendimento. Mitigante – exigência pelos financiadores de experiência e histórico de sucesso no setor relacionado ao projeto. 40 • Risco Ambiental Conceito – é o risco relacionado a possíveis impactos negativos do projeto sobre o meio ambiente. Estes podem ocasionar atrasos no desenvolvimento do empreendimento ou, até mesmo, a necessidade de um redesenho do projeto-base para solução desses impasses. Mitigante – profundo conhecimento da legislação regulatória ambiental da localidade onde se projeta instalar o empreendimento, tanto em nível federal, quanto estadual ou municipal. Um estudo de impacto ambiental (EIA) bem realizado, acompanhado de um relatório de impacto sobre o meio ambiente (RIMA), pode prevenir o projeto de futuros problemas de meio ambiente. A obtenção das licenças prévia, de instalação e de operação são condições necessárias para o funcionamento da SPE. • Risco de Câmbio Conceito – este risco ocorre quando os fluxos de receitas e despesas do projeto são denominados em duas ou mais moedas diferentes. Neste caso, o descasamento de taxas cambiais afeta o fluxo de caixa e pode causar problemas para honrar o serviço da dívida existente. Mitigante – a melhor forma de proteção à exposição cambial é a realização de operações de hedge por intermédio de contratos a termo e a futuro das moedas constantes no contrato de financiamento ou contratos de swap de moedas. • Risco Comercial ou de Mercado Conceito – os fluxos de um projeto são, normalmente, baseados em contratos de compra e venda de longo prazo. Na hipótese de um comprador adquirir toda a capacidade de produção do empreendimento, ele fica exposto à variação de quantidade e preço que pode ocorrer em sua demanda de terceiros. É a este risco comercial/mercadológico que os financiadores do projeto não devem ficar sujeitos. 41 Mitigante – exigência por parte dos credores do projeto de que eventuais cláusulas de isenção de responsabilidade dos compradores sejam as mais limitadas possíveis, garantindo constância e previsibilidade do fluxo de caixa do empreendimento. • Risco de Construção/Conclusão Conceito – diz respeito ao risco do projeto não ser concluído dentro do prazo previsto por questões técnicas ou financeiras. Mitigante – assinatura de contrato de empreitada global de data certa e preço fixo (modalidade turnkey) com empreiteiros comprovadamente capazes e experientes naquele tipo de construção. A solidez financeira do empreiteiro, ou do consórcio de empreiteiros, deve ser aferida antes de sua contratação, de modo a evitar problemas posteriores. • Risco Econômico Conceito – risco inerente à demanda pelo produto ou serviço fornecido pelo projeto. Caso haja queda nos níveis de venda projetados ou aumento de preço da matéria-prima, corre-se o risco econômico de que o empreendimento não possa cobrir seus custos operacionais e gerar uma taxa de retorno atraente aos sponsors, além de cumprir com suas obrigações contratuais de pagamento aos credores da dívida. Mitigante – obter compromisso dos acionistas de aportes financeiros para satisfazer o serviço da dívida, realizar operações de hedge com contratos futuros e a termo de commodities para compensar oscilações do preço da matéria-prima e buscar outros mercados com potencial de consumo para suprir eventual queda na demanda e restabelecer os níveis de venda e, conseqüentemente, de geração de receitas. • Risco Financeiro 42 Conceito – é o risco que corre o projeto de um aumento extemporâneo nas taxas de juros flutuantes contratadas para o financiamento. Mitigante – o cenário ideal seria a assunção de contratos com taxas de juros fixas. Porém, na maioria dos empréstimos bancários existentes atualmente, as instituições financeiras, para sua segurança, compõem sua remuneração com taxas de juros flutuantes. Graças ao desenvolvimento de ferramentas financeiras de proteção pelo mercado, o projeto pode realizar operações de hedge comprando contratos de teto (cap) de taxas de juros ou contratos de swap de taxas de juros com contraparte definida. • Risco de Força Maior Conceito – é o risco relacionado à ocorrência de eventos fortuitos, ou seja, fora do controle das partes envolvidas, que possam prejudicar o desenvolvimento do projeto, seja em sua fase de construção, seja em sua fase de operação. Estes riscos incluem falha técnica irreparável, incêndio, greve, revoluções, convulsões sociais, terremoto, terrorismo5, etc. Mitigante – contratação de pacote de seguros que cubra todos os possíveis riscos (all risk insurance). Por medida de segurança, os financiadores exigem ser beneficiários da apólice para o caso de ocorrência de sinistro. • Risco de Inadimplência /Falência Conceito – este risco refere-se à possibilidade do mutuário da dívida ficar inadimplente, entrar em processo de recuperação judicial ou extrajudicial ou de falência perante o credor. N.A. O Projeto Termopernambuco, que comporá o Estudo de Caso, à época de sua negociação contratual, foi obrigado pelo BID a realizar um seguro contra terrorismo, devido aos ataques de 11 de setembro ao World Trade Center, em Nova York, apesar do baixíssimo risco de sua ocorrência no Brasil. 5 43 Mitigante – neste caso, o financiador deve proteger-se por intermédio da exigência de contratação pelo projeto de um pacote de seguros (security package) com garantias reais. Normalmente, os acionistas também são compelidos a empenhar todo o capital social da empresa em favor do credor, bem como ceder seus direitos sobre empréstimos subordinados contraídos. • Risco Legal Conceito – é o risco de perdas relacionado à falta de suporte legal a um contrato jurídico por ausência de representatividade de uma das partes negociadoras, de legalidade ou de insuficiência documental. Mitigante – contratos bem estruturados, com clara definição dos direitos e obrigações existentes entre as partes, que sejam legalmente constituídos e exeqüíveis. Financiadores e credores devem basear-se em avaliações e pareceres jurídicos emanados de consultores com experiência comprovada e renomada competência. • Risco de Operação e Manutenção Conceito – este risco é relacionado à operação e manutenção do projeto por seu operador. Mitigante – o financiador deve exigir do mutuário a confecção de um contrato de O&M com um operador tecnicamente capacitado que contenha dispositivos de garantia de disponibilidade, bônus e penalidades por performance e cláusula de rescisão, de modo a incentivar a operação eficiente do empreendimento. • Risco Político Conceito – é o risco que o projeto corre de que determinadas ações de autoridades políticas da localidade em que está instalado interfiram no seu desenvolvimento e/ou viabilização. Pode ocorrer através de sanções legais ou 44 tributárias, dentre outros, tornando o projeto insustentável do ponto de vista econômico-financeiro. Mitigante – este risco pode ser minimizado por intermédio de contratação de seguro contra risco político, contratos com empresas regionais ou tomada de recursos financeiros com bancos locais, os quais poderiam sofrer impactos negativos com o insucesso do projeto. • Risco Regulatório Conceito – este risco diz respeito à estrutura regulatória do setor de atuação do empreendimento. Mudanças evolutivas na legislação pertinente podem causar transtornos ao bom desenvolvimento do projeto. Mitigante – realização de minuciosa revisão da estrutura regulatória setorial para plena adequação do empreendimento às normas de seu mercado de atuação. • Risco de Suprimento de Matéria-Prima Conceito – é o risco que corre o projeto da interrupção do fornecimento ou do transporte de matérias-primas necessárias ao seu processamento. Mitigante – a melhor forma de proteção para este risco é a assinatura de contratos de longo prazo, com cláusulas de garantia de fornecimento e de penalização, caso o mesmo não ocorra, entre o projeto e potenciais fornecedores. • Risco Tecnológico Conceito – é inerente à tecnologia utilizada para consecução do projeto. Dependendo do grau de avanço tecnológico do investimento, pode ocorrer, no transcurso de sua construção, obsolescência dos equipamentos/tecnologia utilizados, ocasionando desempenho técnico abaixo do esperado e conseqüente afetação do fluxo de caixa. 45 Mitigante – nesta situação, o ideal é o fechamento de contrato na modalidade turnkey, onde construtores e operadores garantem o cumprimento de preços, prazos e, principalmente, performance estipulados no projeto-base. Caso isso não aconteça, poderão incidir penalidades que deverão ser direcionadas à satisfação do fluxo de caixa para pagamento das dívidas. 2.4.8 Formas de financiamento Invariavelmente, os empreendimentos necessitam de aportes financeiros antes, durante e após seu planejamento. Na primeira fase, os patrocinadores do projeto criam e capitalizam uma SPE para a elaboração do projeto-base, quando são feitos os estudos de viabilidade econômico-financeira do negócio. Na segunda etapa, depois da aferição de sua exequibilidade, inicia-se a busca pelas fontes de financiamento. Neste ponto, Borges (1998, p.5) elenca que “as estruturas financeiras que servem de fontes ao projeto são o capital de risco (equity), os empréstimos (debt), os instrumentos híbridos (como debêntures conversíveis em ações) e o arrendamento (leasing)”. O capital de risco (equity) representa a parcela de capital próprio investida pelos acionistas do projeto. Pode ser representado por equity direto, quando os sponsors participam da administração ou operação do negócio, ou indireto, caso em que delegam poderes a profissionais especializados para tal. Os empréstimos podem ser: bancários, concedidos por bancos comerciais, de investimento ou de desenvolvimento, nacionais e internacionais, representados por empréstimos-pontes (bridge loan), bônus (bonds), créditos de médio e longo prazos (medium and long term credit facilities); de mercado de capitais, por meio da emissão de debêntures simples e notas promissórias (commercial papers), abertura de capital ou oferta pública inicial (IPO – Initial Public Offering). 46 Os recursos híbridos (quasi equity) são um misto de capital e dívida, a exemplo de debêntures conversíveis ou ações resgatáveis. Na ocorrência de default, os detentores destes títulos têm preferência no recebimento de suas parcelas. O arrendamento mercantil (leasing) se dá por intermédio de contrato entre uma instituição financeira (arrendador) e seu cliente (arrendatário), onde o primeiro, proprietário de um determinado bem, transfere a posse e o usufruto deste para o segundo, mediante uma remuneração durante a vigência do contrato, que pode conter ou não cláusula de opção de compra pelo arrendatário. De maneira geral, os emprestadores de recursos exigem que os tomadores aportem, pelo menos, 30% do capital do capital total do projeto como forma de comprovar sua credibilidade no empreendimento. Para as operações de Project Finance do BNDES esta necessidade de contribuição do capital próprio se reduz para 20%, podendo chegar a 15% no caso específico de financiamento para compra de aeronaves nacionais. 2.4.9 Sistemas de garantia Os níveis de garantia prestados pelos credores aos financiadores variam conforme as exigências que estes últimos fazem para assegurar o retorno dos recursos emprestados. O grau de cessão de garantias pelos sponsors também é resultado de seu comprometimento com o projeto e, por isso, torna-se imprescindível que estejam engajados na estruturação ótima do financiamento para o sucesso do empreendimento. As garantias utilizadas nos arranjos financeiros para estruturas de Project Finance classificam-se em: – Full recourse – nesta modalidade, além do fluxo de caixa do projeto, os financiadores contam com garantias pessoais dos acionistas para cobertura do serviço da dívida contraída. Desta forma, todo o risco de 47 inadimplemento está amparado por garantias reais, que resguardam o retorno aos credores dos capitais investidos. – Limited recourse – neste caso, segundo Bonomi, Malvessi (2004, p.65), os recursos tomados são afiançados por um mix de garantias formado por recursos gerados pelo fluxo de caixa do empreendimento e por outras convencionais, tais como: hipotecas, caução de ações da SPE, cartas de crédito bancário (letter of credit), garantia extra de caixa (cash collateral), etc.; e – Non-recourse – nesta categoria incluem-se pouquíssimos projetos concebidos no Brasil. Trata-se do Project Finance “puro”, ou seja, do financiamento baseado única e exclusivamente no fluxo de caixa do empreendimento, sem nenhuma garantia prestada pelos tomadores de recursos. Em hipótese alguma o patrimônio dos acionistas/sponsors é acessado pelos financiadores, que assumem todo o risco do êxito do projeto. Juridicamente, diz-se que não há o “direito de regresso” pelos credores contra os devedores. Mesmo no cenário internacional, segundo estudo realizado por Howcroft e Fadhley (1998), apenas 7% do total de financiamentos internacionais pode ser incluído nesta categoria. 2.4.10 As PPP’s com apoio da estruturação de Project Finance As parcerias público-privadas (PPP), regulamentadas pela Lei nº. 11.079, de 30 de dezembro de 2004, representam um importante instrumento de execução de projetos de infra-estrutura, que pode ser utilizado em conjunto com estruturas de Project Finance. Esta modalidade de parceria surgiu da necessidade do poder público, em todas as suas esferas (federal, estadual e municipal), de satisfazer os anseios cada vez maiores da prestação de serviços públicos à população. Pela limitação de recursos existentes para todos os projetos, optou-se pela conjugação de interesses públicos e privados mediante alocação de receitas públicas para garantir os 48 investimentos necessários, bem como a remuneração adequada para os empreendedores. Nas PPP’s há a predominância do interesse público na consecução dos empreendimentos para atendimento à população e por parte da iniciativa privada o intuito de auferir lucros para o capital investido. Deste modo, o fluxo financeiro necessário para satisfação do pagamento de dívidas assumidas e o retorno previsto para o projeto pode ser complementado pelo poder público. De acordo com a Lei 11.079, as parcerias público-privadas são contratos administrativos de concessão que podem assumir duas formas: – Concessão administrativa – é representada por um contrato de prestação de serviços onde a Administração Pública é a usuária direta ou indireta dos serviços prestados; e – Concessão patrocinada – é aquela que envolve a concessão de serviços públicos ou obras públicas com a contraprestação financeira do parceiro público ao privado, além da tarifa cobrada dos usuários. Vários projetos estratégicos de pequeno, médio e grande portes podem ser concebidos mediante parceria público-privada. Estradas, portos, aeroportos, ferrovias, presídios, hospitais, estações de tratamento de água e esgoto, dentre outros, são alguns exemplos de empreendimentos que podem ser beneficiados por parcerias ao invés de simples privatizações. Entre os anos de 2006 e 2010, principalmente, foram originados no Brasil alguns projetos elaborados pelo governo federal e muitos outros por iniciativas estaduais, que tiveram que promulgar legislação própria, de acordo com os interesses de cada estado. Na esfera federal, pode-se destacar: – Projeto Datacenter – trata-se de projeto para construção de complexo tecnológico para o consórcio formado pelo Banco do Brasil S.A. e pela Caixa Econômica Federal para compartilhamento de espaço físico de suas respectivas áreas de tecnologia; 49 – Projeto de Irrigação Baixio de Irecê – é o maior projeto federal de irrigação e localiza-se entre os municípios de Itaguaçu e Xique-Xique, no Estado da Bahia, com captação de 61,3 m3/s de água do Rio São Francisco. – Projeto Pontal – projeto de irrigação no semi-árido pernambucano, com aproximadamente 33.000 hectares (ha), destinado à fruticultura. A captação de águas será feita diretamente do Rio São Francisco à velocidade de 7,8 m3/s; – Projeto Salitre – projeto de irrigação em Juazeiro (BA), com 67.000 ha, no pólo de fruticultura Petrolina/Juazeiro, com captação de águas do São Francisco à vazão de 32 m3/s; – Projetos Rodoviários BR 116/381 e BR 040 – para melhoria de estradas federais no Estado de Minas Gerais; Cabe ressaltar que os empreendimentos rodoviários e de irrigação estão com seus projetos tratados em nível de prioridade pelo governo federal. Nos estados, destacam-se: – PPP Metrô de São Paulo – Linha 4 – concorrência internacional, sob o formato de concessão patrocinada, para exploração da operação de transporte de passageiros, que prevê a execução de obras de construção da extensão do metrô paulistano; – PPP MG-050 – a estrada que liga Belo Horizonte (MG) a Ribeirão Preto (SP), com 372 km de extensão, tornou-se a primeira concessão rodoviária sob a modalidade de parceria público-privada no país e será executada por um consórcio liderado pelo grupo Equipav, de São Paulo; – Projeto Centro Integrado de Ressocialização de Itaquitinga – destina-se à de exploração de unidade prisional para reinserção de infratores à sociedade pernambucana. O vencedor do processo licitatório ficará responsável pela construção, administração, operação e manutenção do complexo; – Projeto para construção e operação do Sistema de Disposição Oceânica do Jaguaribe, em Salvador, patrocinado pela Empresa Baiana de Água e Saneamento S.A. (EMBASA); e 50 – PPP Penitenciária – MG – trata-se de projeto do governo mineiro, sob a forma de concessão administrativa, para construção, manutenção e gestão de complexo penitenciário em Ribeirão das Neves, região metropolitana de Belo Horizonte, que disponibilizará aproximadamente 3.000 vagas no sistema prisional estadual. 2.4.10.1 Estruturas de financiamento público-privadas Existem várias estruturas de financiamento que podem ser usadas para concepção de projetos na modalidade Project Finance. A maior parte delas não encontra respaldo jurídico específico na legislação brasileira e serve somente como referência para a montagem de estruturas operacionais. A principal diferença entre os modelos reside no modo como os entes públicos e privados alocam as responsabilidades inerentes a cada um, distribuem os riscos e repartem os resultados proporcionados pelos projetos. A seguir, comentam-se alguns exemplos de estruturas público-privadas citados por Finnerty (1999): – Captura de Valor – ocorre por meio de uma tributação especial cobrada por melhorias resultantes de um projeto. Por exemplo, uma melhoria nos sistemas públicos de transporte de uma determinada região incrementa o comércio da área, gerando lucros maiores para os proprietários de negócios privados. O governo, em contrapartida, institui uma taxação específica que servirá para cobrir os gastos públicos realizados para tal; – Desenvolvimento Especulativo – neste modelo empresas privadas identificam uma necessidade pública ainda não atendida e, após negociação e obtenção de consentimento do governo local, elabora processo de planejamento e obtenção de licenças e alvarás por sua conta e risco. Após aferição da viabilidade econômico-financeira do projeto, o governo pode juntar-se ao parceiro privado para o desenvolvimento do projeto mediante colaboração financeira à sua execução; 51 – Expansão Complementar – entidades privadas realizam a expansão de uma instalação governamental já existente, passando a deter os direitos de propriedade sobre a benfeitoria e passam a operar toda a instalação, ou somente a sua parte, através de um contrato firmado com o governo; – Franquia Perpétua – neste formato, empresas privadas financiam e operam o projeto sob a forma de uma concessão perpétua concedida pelo governo. As empresas detêm o direito de propriedade sobre os ativos e o governo atua unicamente como um mediador com o usuário, regulamentando os níveis de segurança, qualidade do serviço e tarifas a serem cobradas. Os concessionários são responsáveis exclusivos pela contratação de suporte financeiro para execução de melhorias ao empreendimento; – Modelo Build – Operate – Transfer – BOT (Construir – Operar – Transferir) – neste formato, empresas privadas recebem uma concessão para financiar, construir e operar um projeto por um determinado período de tempo, após o qual a propriedade é revertida ao governo anfitrião, desde que satisfeitas as obrigações contraídas para sua construção e o atingimento do retorno esperado pelos investidores; – Modelo Build – Transfer – Operate – BTO (Construir – Transferir – Operar) – modelo no qual os entes privados financiam e constroem um empreendimento, transferindo, após os testes finais de conclusão, os direitos legais ao governo local. Posteriormente, por intermédio de um contrato de longo prazo, arrendam-no de volta do governo beneficiando-se da receita gerada pelo projeto, que deve ser suficiente para o pagamento do custo do arrendamento e do retorno do capital investido; – Modelo Buy – Build – Operate – BBO (Comprar – Construir – Operar) – neste caso as empresas privadas compram uma unidade do governo que necessite de melhorias e, então, modernizam ou expandem estas instalações e operam como instalação regulamentada e lucrativa de uso público. Podem enquadrar-se neste modelo rodovias, pontes, aeroportos, ferrovias, portos, etc.; – Modelo Lease – Develop – Operate – LDO (Arrendar – Desenvolver – Operar) – é utilizado quando um entidade privada arrenda uma instalação pública pré-existente, promove sua expansão e desenvolvimento, passando a operá-la sob contrato de compartilhamento de receita com o 52 governo por um período fixo. Cabe ressaltar que a propriedade legal continua sendo governamental e que o empreendimento volta a ser totalmente público ao final do prazo do acordo; – Privatização Temporária – entidades privadas assumem a operação e manutenção de uma instalação governamental existente que precise de reparação, passando a receber taxas pagas pelos usuários até que ocorra a recuperação do investimento realizado (incluem-se aí o pagamento a empréstimos obtidos e remuneração do capital próprio) ou a expiração do prazo contratual. Com o passar do tempo e com o aperfeiçoamento das técnicas de parcerias, novos modelos vão surgindo e dentre eles destacam-se: – Modelo Design – Finance – Build – Operate – Transfer – DFBOT (Projetar – Financiar – Construir – Operar – Transferir) – neste caso, o parceiro público especifica o serviço a ser ofertado e o parceiro privado incumbe-se da elaboração do projeto de engenharia, financiamento, construção, operação e transferência do ativo ao poder concedente. O risco é compartilhado entre os parceiros público e privado; e – Modelo Build – Finance – Operate – Transfer – BFOT (Construir – Financiar – Operar – Transferir) – neste formato, o parceiro público especifica o serviço e desenvolve o projeto de engenharia, ficando o parceiro privado com a responsabilidade de financiar, construir e operar o projeto, retornando o mesmo ao poder público ao final do prazo de concessão. O risco é tomado pelo parceiro púbico. 2.5 ENTIDADES PÚBLICAS E PRIVADAS DE FINANCIAMENTO Este tópico abordará o estudo de algumas entidades públicas e privadas que ofertam financiamento e outros tipos de atividades assessórias ao ramo financeiro, a exemplo de garantias, para consecução de projetos em várias modalidades, incluindo, evidentemente, o Project Finance. 53 Para fins práticos, os órgãos abordados foram subdivididos em três categorias básicas: bancos de fomento, agências multilaterais e bancos comerciais. Apesar dos bancos considerados de fomento à economia, como o BNDES, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Mundial, se enquadrarem na literatura sobre o tema também como agências multilaterais de crédito, optou-se por dedicar um espaço próprio para sua exposição. 2.5.1 Bancos de Fomento Os bancos de fomento são entidades responsáveis pelo fornecimento de suporte financeiro a investimentos que visem ao crescimento sustentável de determinada área da economia. A função de apoiar projetos economicamente viáveis, ou, às vezes, nem tanto, face às características do tipo de empreendimento, setor econômico, ou desenvolvimento esperado para determinado região, faz parte do escopo de atuação destas entidades financeiras. A seguir, serão abordadas as características dos principais bancos de fomento que fornecem recursos de longo prazo a projetos. 2.5.1.1 Banco Interamericano de Desenvolvimento O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) foi criado, em 1959, por intermédio de um acordo entre os países componentes da Organização dos Estados Americanos – OEA, e sua sede localiza-se em Washington - D.C., EUA. O BID tem como um dos seus objetivos principais apoiar o desenvolvimento dos países da América Latina e do Caribe, buscando melhorar os indicadores sociais da região, especialmente os níveis de alfabetização e de nutrição, além do aumento da expectativa de vida da população. 54 O BID atua em conjunto com governos, organizações da sociedade civil e empresas, concedendo empréstimos e realizando operações de cooperação técnica não reembolsáveis (recursos a fundo perdido). O financiamento de pesquisas, incluindo assessoria e assistência técnica, visa à modernização de áreas de importância singular para as populações dos países membros, a exemplo de educação, alimentação e segurança. Além dessas, infra-estrutura, energia e comércio fazem parte do portfólio de ação do Banco. Em termos administrativos, o BID possui a Assembléia de Governadores como órgão máximo deliberativo. A supervisão das operações concedidas pelo Banco é de competência da Diretoria Executiva, cujos membros possuem mandatos de três anos, e o acompanhamento do dia-a-dia cabe à equipe de administração da entidade. Cada país tem direito de nomear um Governador para a Assembléia de Governadores e o peso dos votos é proporcional ao valor do capital subscrito por cada nação. Geralmente, esses Governadores são Ministros da Fazenda, presidentes de bancos centrais ou outros funcionários de alto nível. O principal acionista são os Estados Unidos da América, com aproximadamente 30% do poder de voto. Os países latino-americanos e caribenhos membros do Banco detêm uma participação em torno de 50%. O restante é representado por países de diversos continentes que são membros avulsos. Como uma de suas funções, a Assembléia de Governadores tem autonomia para eleger o Presidente do BID, para um mandato de cinco anos, sendo ele o principal executivo e o representante legal do Banco em suas operações cotidianas. Sua função é presidir as reuniões da Diretoria Executiva e possui voto de minerva, em caso de empate nas deliberações votadas. Um Vice-Presidente Executivo e outros quatro Vice-Presidentes compõem a equipe responsável pela gestão da entidade. A Diretoria Executiva é o órgão responsável pela supervisão e controle das atividades executadas, estabelecendo as políticas operacionais e orçamentárias da instituição. A aprovação de projetos, a fixação das taxas de juros cobradas nas 55 operações concedidas e a autorização de captação de recursos em mercado também são escopo de sua atuação. As políticas operacionais do Banco estão divididas em: gerais, que são aquelas comuns às atividades relacionadas aos financiamentos; e setoriais, que norteiam as atividades em áreas específicas. Além disso, possui uma clara política de aquisições, a qual estabelece os critérios para compra de bens e serviços objeto de financiamentos e uma política de divulgação de informações, o que propicia um acompanhamento das atividades operacionais desenvolvidas. Para efeito de acompanhamento dos projetos financiados, o BID possui mecanismos de supervisão e de prestação de contas que vão desde a fase de elaboração do projeto até sua execução. Auditorias externas são responsáveis pela verificação da correta aplicação dos recursos emprestados. O BID é composto por em sua totalidade por 47 países membros, divididos em mutuários e não mutuários. Os primeiros são todos da América Latina e Caribe e somam 26 nações. O quadro a seguir os relaciona em dois grupos: GRUPO I GRUPO II Destino de 65% dos recursos disponíveis Destino de 35% dos recursos disponíveis Argentina Belize Honduras Bahamas Bolívia Jamaica Barbados Colômbia Nicarágua Brasil Costa Rica Panamá Chile El Salvador Paraguai México Equador Peru Trinidad e Tobago Guatemala Uruguai Guiana República Dominicana Venezuela Haiti Suriname Quadro 02 – Membros mutuários do BID Os países membros não mutuários do BID são em número de 21 e sua associação se dá por meio de subscrição de capital. Os benefícios advindos desta parceria são representados pela preferência nos processos de aquisições e contratações provenientes dos projetos financiados pelo banco, pois somente países 56 membros podem fornecer insumos (materiais, equipamentos e serviços) para o desenvolvimento de negócios dos países membros mutuários. O quadro abaixo enumera os países membros não mutuários: EUROPEUS NÂO EUROPEUS Alemanha França Áustria Itália Bélgica Noruega Croácia Países Baixos Dinamarca Portugal Eslovênia Reino Unido Espanha Suécia Finlândia Suíça Canadá Estados Unidos da América Israel Japão República da Coréia Quadro 03 – Membros Não Mutuários do BID De modo a promover o desenvolvimento dos países da América Latina e do Caribe, o BID se vale de alguns mecanismos específicos para o atingimento de seus objetivos, a saber: • Mecanismos de Preparação de Projetos A fim de dar suporte à preparação de projetos, o BID possui cinco ferramentas principais: o Mecanismo de Preparação de Projetos (PPF), que visa a maximizar a estruturação dos projetos, tornando-se um indutor na aprovação de financiamentos e na execução dos empreendimentos; o Mecanismo de Preparação e Execução de Projetos (PROPEF), que financia eventuais atividades adicionais necessárias ao início dos projetos; o Fundo de Infra-Estrutura (InfraFund), cujo objetivo é apoiar entidades públicas, privadas ou mistas na identificação, desenvolvimento e preparação de projetos voltados para infra-estrutura que sejam sustentáveis e passíveis de financiamento bancário; o Fundo para Financiamento de Iniciativas de Integração Regional de Infra-Estrutura (FIRII), que disponibiliza recursos para estudos de integração física regional e preparação de projetos para transações de infra-estrutura transnacionais; e o Fundo para Financiamento 57 de Prevenção de Desastres (FDP), com recursos de cooperação técnica para preparação de projetos de prevenção de desastres e de avaliação de riscos. • Produtos Financeiros O financiamento de programas e projetos de desenvolvimento nos países da América Latina e Caribe é feito através de empréstimos, doações, garantias e investimentos. Os três primeiros são utilizados em projetos de investimentos das iniciativas pública e privada, em reformas políticas, na superação de crises financeiras ou de desastres provocados pela natureza. Os empréstimos podem ser realizados a taxas de mercado ou com recursos subsidiados, de acordo com sua destinação. As garantias creditícias providas pelo Banco em empréstimos comerciais e em emissões de títulos servem para facilitar o acesso de seus clientes aos mercados de capitais locais e internacionais. O Banco também pode investir em projetos de pequena escala e de baixa atratividade através do Fundo Multilateral de Investimentos (FUMIN). • Institutos O BID também financia dois institutos: o Instituto para a Integração de América Latina e do Caribe (INTAL), com sede em Buenos Aires, Argentina, cujo foco principal é o desenvolvimento e treinamento de funcionários de governos e representantes da sociedade civil para atuação em questões relativas a comércio exterior e integração regional; e o Instituto Interamericano de Desenvolvimento Social (INDES), que fornece capacitação a funcionários dos governos centrais, administradores do serviço público e demais profissionais envolvidos em projeto, avaliação e execução de políticas e programas de caráter social, com foco na redução da pobreza dos países membros. O Banco Interamericano de Desenvolvimento dispõe de recursos de capital da ordem de US$100 bilhões, provenientes de capitalizações integralizadas e exigíveis dos países membros e de fundos obtidos no mercado financeiro internacional. Os programas e projetos são financiados por empréstimos que, em 58 sua grande maioria, obedecem a taxas de mercado. Contudo, alguns, dependendo de suas características e destinações, são subsidiados com recursos especiais. O BID tem uma capacidade anual de financiamento em torno de US$8 bilhões e quase todos são aprovados, desembolsados e amortizados em dólares americanos. Recentemente, o Banco passou a aprovar empréstimos em moeda local do país requerente. Outra vantagem das linhas de financiamento são os prazos de repagamento, que variam entre 8 e 15 anos, para o setor privado, e 15 e 25 anos, para o setor público. As taxas de juros cobradas são compostas pelos custos incorridos pelo Banco para captação de recursos, acrescidos de encargos e spreads. Também são cobradas comissões de análise (para definição da aprovação do pleito), comissões de manutenção de linha de crédito (para recursos não desembolsados), comissões de estruturação de financiamento e comissões de administração de recursos. As condições financeiras para empréstimos variam de acordo com as estratégias adotadas para gestão da dívida pelo mutuário. Basicamente, existem dois tipos disponibilizados pelo BID: empréstimo em Moeda Única (normalmente, dólar americano, podendo ainda, ser disponibilizado em euros, ienes ou francos suíços) com taxa de juros ajustável e empréstimo em Moeda Única com taxa de juros vinculada à taxa de juros do mercado interfinanceiro de Londres (LIBOR). No primeiro, a taxa de juros é revisitada a cada período de seis meses, de modo a representar o efetivo custo do empréstimo e no segundo, a cada três meses, de acordo com a variação da LIBOR deste período em relação à moeda específica do financiamento. Desde 2005, os mutuários dos setores público e privado têm à sua disposição financiamentos no Mecanismo de Moeda Local, desde que haja no mercado financeiro internacional disponibilidade de moeda para realização de operações de swap da dívida pendente. Ressalte-se que os empréstimos do BID podem ser divididos em duas tranches: BID A Loan – aporte direto de recursos e BID B Loan – aporte de recursos por bancos comerciais com garantia do BID. 59 O quadro a seguir apresenta todas as condições de financiamento disponibilizadas pelo BID: Quadro 04 – Termos e Condições para obtenção de financiamento do BID Fonte: BID, 2009 60 Como beneficiários de projetos financiados pelo BID, pode-se citar: – Projeto de Energia Termopernambuco – 2001; – Companhia de Águas e Saneamento de Goiânia – 2002; – Apoio a microempresas rurais – 2003; – Programa de saneamento do Estado do Ceará – 2003; – Planta hidrelétrica de Campos Novos – 2004; – Transporte urbano da cidade de Curitiba – 2004; – Programa de apoio ao Sistema de Proteção da Amazônia – 2005; – Programa de desenvolvimento urbano da cidade de Santos – 2005; – Linha de Transmissão de Energia ATE II – 2006; – Melhoria da Eficiência Comercial e Operacional da CEDAE – 2006; – Programa de desenvolvimento urbano e inclusão social de Niterói – 2007; – Projeto de Telecomunicações da Embratel – 2007; – Reabilitação do Centro Histórico do município do Rio de Janeiro – 2007; – Ampliação do corredor Mercosul: estrada Florianópolis – Osório – 2008; – Projeto de Bioenergia Itumbiara – 2008; – Projeto Metrô de São Paulo – Linha 4 – 2008; – Programa – de eficiência energética para clientes de baixa renda – 2009. Projeto da central termelétrica do Pecém – 2009; 2.5.1.2 Banco Mundial O Banco Mundial foi criado, inicialmente, para financiar a reconstrução das nações devastadas pela 2ª Guerra Mundial. Atualmente, sua função principal é a de prestar financiamentos para o combate à pobreza nos países em desenvolvimento. Sua composição administrativa é a de uma cooperativa, onde os países membros, num total de 185, são acionistas e sua capitalização depende da representatividade de sua economia. Sob esta ótica, os Estados Unidos são o maior contribuinte, detendo 16,4% dos votos, seguidos de Japão, com 7,9%, Alemanha, com 4,5% e por Reino Unido e França, ambos com 4,3% dos direitos de voto. Os 61 62,6% restantes são divididos entre os demais países. Sua gestão é feita por 24 diretores executivos, sendo cinco dos principais acionistas e 19 representando os outros 180 países. Semanalmente, se reúnem para definir estratégias relativas aos negócios, empréstimos, garantias e orçamento administrativo. Os recursos são utilizados para construção de escolas, hospitais, estradas, fontes de energia e demais projetos que visem à melhoria da qualidade de vida dos povos dos países mutuários. O Grupo Banco Mundial é composto por cinco entidades distintas: o Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento (BIRD), que fornece empréstimos e assistência técnica para países em desenvolvimento; a Agência Internacional de Desenvolvimento (AID), que busca a redução da pobreza nos países mutuários mais pobres, por intermédio de financiamentos sem juros – estes dois organismos (BIRD e AID) formam o que se chama efetivamente de Banco Mundial; a Agência Multilateral de Garantia de Investimentos (AMGI), que oferece garantias a investidores estrangeiros em empréstimos a países em desenvolvimento; a Corporação Financeira Internacional (CFI), cujo objetivo é o crescimento das nações em desenvolvimento através de fornecimento de empréstimos ao setor privado e a prestação de assessoria técnica a empresas e governos; e o Centro Internacional para Arbitragem de Disputas sobre Investimentos (CIADI), que atua como mediador em embates jurídicos para resolução de disputas entre investidores estrangeiros e os países anfitriões, mediante decisão conciliatória ou arbitrada. O Banco Mundial aproveita-se de sua potencialidade creditícia para tomar recursos no mercado financeiro internacional a taxas privilegiadas e repassá-los em condições similares a países em desenvolvimento que não teriam esta mesma possibilidade. Estes empréstimos financiam reformas institucionais e políticas, bem como investimentos em bens, obras e serviços em infra-estrutura que gerem desenvolvimento social e econômico ao país mutuário, que, em determinadas circunstâncias, pode obter carência de até dez anos para iniciar o pagamento da dívida. A cada empréstimo são elaborados documentos de atingimento de objetivos do financiamento e realizado estreito acompanhamento dos resultados obtidos, via 62 indicadores de desempenho, garantindo o êxito de cada programa ou projeto apoiado. Abaixo, são listados alguns projetos nacionais financiados com recursos do Banco Mundial: – Projeto de assistência técnica ao setor energético do Brasil – 2003; – Projeto de sustentabilidade ambiental de Brasília – 2005; – Projeto de melhoria do transporte rodoviário federal – 2006; – Projeto para redução da pobreza rural em Pernambuco – 2006; – Projeto de cogeração energética Lages Bioenergética Ltda. – 2007; – Projeto do Metrô de São Paulo – linha 4 - 2008; – Projeto de desenvolvimento integrado municipal de Pelotas – 2008; – Projeto de desenvolvimento econômico regional do Ceará – 2009; – Projeto de transporte de massa do Rio de Janeiro – 2009; – Projeto de desenvolvimento rural sustentável do Rio de Janeiro – 2009. 2.5.1.3 Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social Fundado em 20 de junho de 1952, o BNDES é um órgão vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MIDC) e seu objetivo principal é dar apoio a empreendimentos industriais e de infra-estrutura que visem ao desenvolvimento do Brasil. Trata-se do maior financiador de longo prazo do mercado brasileiro. Dentro de sua política de apoio financeiro a programas e projetos, o BNDES possui duas subsidiárias integrais: a FINAME, agência especial de financiamento industrial, encarregada de suprir recursos para financiar a comercialização de máquinas e equipamentos industriais de fabricação nacional (fonte: www.bndes.gov.br); e a BNDESPAR, empresa de participações, cujo objetivo é dar suporte à subscrição de títulos e valores mobiliários no mercado de capitais brasileiro, adquirindo participação societária em empresas com vistas ao seu 63 desenvolvimento. Após a maturação dos investimentos, a BNDESPAR aliena as participações detidas, auferindo os benefícios da valorização das companhias. Administrativamente, o BNDES possui sua estrutura representada no organograma a seguir: Figura 02 – Organograma do BNDES Fonte: BNDES, 2009 Importante identificar que a Área de Planejamento (AP) é a porta de entrada para todos os empreendimentos a serem financiados, inclusive aqueles na 64 modalidade Project Finance. Para isso, o interessado deverá formalizar uma Consulta Prévia ao Banco, que, após aprovação do apoio financeiro, envolverá as demais áreas intervenientes no processo, a exemplo da Área Jurídica, da Área Financeira e da Área de Estruturação de Projetos. O apoio financeiro prestado pelo BNDES se dá dentro de suas políticas operacionais, cujos critérios priorizam projetos que induzam ao desenvolvimento local com inclusão social, melhoria dos níveis de emprego e renda e geração de divisas. As operações de financiamento podem ser realizadas de três formas distintas: • Direta – feita diretamente pelo BNDES ou por intermédio de um mandatário, mediante apresentação de carta-consulta; • Indireta – realizada através de uma instituição financeira credenciada; • Mista – feita de forma combinada, ou seja, pelo BNDES e por um agente credenciado. Quanto ao tipo, as operações se dividem em: • Operações de financiamento realizadas diretamente pelo BNDES – crédito rotativo para empresas fechadas ou subscrição de valores mobiliários de empresas de capital aberto; • Operações de financiamento realizadas por intermédio de instituições financeiras credenciadas – apoio à exportação de bens e serviços nas fases de pré-embarque e pós-embarque; BNDES Automático – até R$10 milhões para obras civis, montagens, instalações, compra de equipamentos nacionais novos e capital de giro; e FINAME – Máquinas e Equipamentos em Geral, Máquinas e Equipamentos Agrícolas e Leasing – aquisição de máquinas e equipamentos novos de fabricação nacional; • Operações de financiamento realizadas diretamente com o BNDES e/ou por meio de instituições financeiras credenciadas – Empréstimo Ponte, Financiamento a Empreendimentos (FINEM) e Project Finance. Em suas operações financeiras, o BNDES cobra encargos e comissões de acordo com o tipo de empreendimento financiado, podendo ser pagos na 65 apresentação do projeto ou descontados na primeira parcela de liberação de recursos. O quadro abaixo explicita essas condições. Relacionados a operações-padrão Item Taxa 0,2% do valor da colaboração financeira solicitada, até o máximo de R$ 679.927,00. Valores até R$ 203.978,00 deverão ser integralmente pagos na Comissão de Estudo apresentação do projeto. Parcelas excedentes a R$ 203.978,00 serão descontadas da primeira liberação. 0,2% do valor da colaboração financeira contratada, até o máximo de R$ Comissão de 6.799.274,00. O valor assim apurado será descontado da primeira Estruturação liberação, deduzido o valor pago a título de Comissão de Estudo. Encargo por Reserva de 0,1% por 30 dias ou fração incidente sobre o valor do crédito ou saldo não Crédito utilizado. Reescalonamento de financiamentos: até 0,5% do valor da dívida. Alteração da Beneficiária, quando implicar uma reanálise econômicofinanceira da operação: 0,2% sobre o valor do saldo devedor, limitada a R$ Comissão por Alteração 203.978,00. Contratual Alteração da finalidade do projeto, quando implicar em uma reanálise da operação: 0,2% sobre o valor do saldo devedor, limitada a R$ 203.978,00. Demais Casos: R$ 3.399,00 para micro, pequenas e médias empresas e R$ 11.332,00. Comissão de prestação 1% incidente sobre o valor do principal da dívida garantida. de garantia 1. a ser paga na data da confirmação da carta de crédito, incidente sobre o principal da dívida garantida: Encargo por Confirmação de Carta de Crédito o 1% para operações com prazos inferiores ou iguais a 3 (três) anos; o 1,5% para operações com prazos superiores a 3 (três) anos; 2. 1% ao ano sobre o saldo devedor da dívida garantida, a partir da data da confirmação da carta de crédito, exigível nas datas em que forem devidos os pagamentos de juros ao credor da carta de crédito. Comissão de Administração em Até 1% flat sobre o valor liberado. operações de PósEmbarque Encargo por Compromisso em 0,5% a.a incidente sobre o valor do crédito ou saldo não utilizado. operações de PósEmbarque Comissão de Administração de Equivalente à taxa de risco de crédito nas operações diretas. Garantia Prestada Quadro 05 – Encargos e Comissões em operações do BNDES Fonte: BNDES, 2009 66 Relacionados a operações garantidas em nome da União Item Comissão de Fiscalização Taxa 0,5% incidente sobre o saldo devedor médio do principal garantido no semestre anterior. Relacionados a operações com Renda Variável Item Taxa Comissão de Coordenação Comissão de Garantia de Subscrição de Valores Mobiliários O valor das comissões nas operações de valores mobiliários será Comissão de Colocação de fixado de acordo com as condições usualmente praticadas em Valores Mobiliários operações no mercado de capitais. Encargo por Subscrição de Valores Mobiliários Comissão por Coobrigação em Debêntures Observações: 1. Os encargos e as comissões financeiras são devidos em operações realizadas sob a forma de apoio direto ou misto, incidente sobre o valor do crédito direto. Nas operações de apoio indireto automático, os encargos e comissões não são aplicáveis na relação BNDES Instituição Financeira Credenciada; 2. Nas operações de crédito de apoio à exportação são devidas apenas a Comissão de Administração em Operações de Pós-Embarque e o Encargo por Compromisso em Operações de Pós-Embarque, as demais comissões/encargos não são exigíveis; 3. Não são aplicáveis os encargos e comissões em operações onde o cliente seja entidade da Administração Pública Direta ou autárquica, bem como em operações com aplicação nãoreembolsável de recursos pelo BNDES; 4. A Comissão por Alteração Contratual será devida em operações realizadas sob a forma de apoio direto ou misto, exigível previamente à formalização jurídica da referida alteração. 5. Os valores em reais apresentados estão expressos na data-base de 01 de julho de 2007 e serão reajustados anualmente pelo IPCA. Quadro 05 – Encargos e comissões em operações do BNDES Fonte: BNDES, 2009 Dentre os empreendimentos e projetos financiáveis com verbas do BNDES encontram-se: – Implantação, ampliação, recuperação e modernização de instalações; – Inovação e desenvolvimento tecnológico; – Investimentos em infra-estrutura social e urbana; – Investimentos sociais em empresas; – Produção, comercialização, importação e exportação de bens e serviços. 67 Para consecução dos empreendimentos também são necessários vários itens, tangíveis ou intangíveis, que podem ser ou não financiáveis pelo Banco. A seguir, relacionam-se alguns deles. • Itens Financiáveis: – Capital de giro para investimento em ativo permanente imobilizado; – Despesas com estudos e projetos de engenharia do empreendimento; – Despesas pré-operacionais; – Gastos com treinamento de pessoal; – Máquinas e equipamento novos importados, sem similar nacional, somente para o setor industrial; – Máquinas e equipamento novos, com índice de nacionalização igual ou superior a 60%; – Obras civis, montagens e instalações; – Reforma de equipamentos e instalações visando à modernização e ampliação da capacidade produtiva; dentre outros. • Itens não financiáveis: – Aquisição de animais para revenda; – Aquisição de máquinas e equipamentos novos não credenciados; – Aquisição de terrenos e demais bens classificados como imóveis; – Comércio de armas; – Empreendimentos imobiliários (edifícios, escritórios, flats, loteamento, etc.) destinados à revenda ou aluguel; – Motéis, saunas e termas; – Empreendimentos relacionados a jogos de azar e similares, dentre outros. Para obtenção de financiamento junto ao BNDES é necessário protocolizar o documento chamado “Consulta Prévia”, onde ficam registradas as características da empresa solicitante dos recursos e do empreendimento a ser financiado. Técnicos avaliam o enquadramento da operação nas Políticas Operacionais do Banco. A figura a seguir detalha o passo a passo de tramitação desde a apresentação da carta-consulta até a liberação dos recursos. 68 Figura 03 – Fluxograma para obtenção de financiamento do BNDES Fonte: BNDES, 2009 As principais etapas da tramitação dos projetos são sucintamente discriminadas abaixo em ordem cronológica: – Consulta Prévia – a empresa interessada em financiar o projeto envia solicitação de apoio por intermédio de Consulta Prévia, seguindo as orientações contidas no Roteiro de Informações; – Perspectiva – são cadastrados no nível Perspectiva os projetos que não apresentaram todas as informações requeridas no Roteiro e seus dossiês são caracterizados com mera “carta de intenção”, até que sejam complementados os dados faltantes; – Enquadramento – fase de avaliação da viabilidade de execução do projeto e do comprometimento de aporte de recursos próprios. É atribuída 69 classificação de risco de crédito à empresa patrocinadora do empreendimento e, após aprovação no Comitê de Enquadramento e Crédito, o processo é enviado à Diretoria, para apreciação e deferimento do limite de crédito sugerido para a operação; – Apresentação do Projeto – a empresa prepara e apresenta todas as informações e documentações relativas ao pleito no prazo máximo de 60 dias a contar da data de comunicação do enquadramento; – Análise do Projeto – após a apresentação do projeto pela empresa, o BNDES tem um prazo de 60 dias para elaborar sua análise. O Relatório de Avaliação do Projeto deve ser apreciado pelo Diretor da Área Operacional e submetido à avaliação da Diretoria do Banco para aprovação; – Contratação – nesta fase, a área jurídica do Banco elabora o instrumento contratual, que deve ser firmado no prazo de até 60 dias após a comunicação ao mutuário da aprovação do projeto; – Desembolsos – as liberações de recursos seguem o cronograma estabelecido em contrato, devendo, a cada etapa, haver a conclusão e comprovação da correta destinação do dinheiro, de modo a propiciar a liberação da parcela seguinte. O BNDES possui um programa próprio para financiamento de projetos na modalidade Project Finance e para sua adesão é necessário que sejam atendidas determinadas especificidades como: – A entidade beneficiária do programa deve ser uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) com a finalidade única de implementar o projeto a ser financiado; – Os fluxos de caixa, riscos e patrimônio do projeto devem estar apartados da empresa patrocinadora; – As receitas futuras projetadas devem ser contratualmente cedidas em favor dos órgãos financiadores; e – Os fluxos de caixa futuros devem ser suficientes para honrar o serviço da dívida contraída para execução do empreendimento. Em relação a requisitos mínimos para concessão deste tipo de financiamento, o BNDES exige que Índice de Cobertura do Serviço da Dívida (ICSD) seja 70 equivalente a 1,3 vezes o valor das amortizações programadas e que a TIR (Taxa Interna de Retorno) do projeto seja de no mínimo 8% ao ano, em termos reais. São proibidas, sob qualquer pretexto, operações de mútuos (empréstimos) entre a entidade beneficiária e seus controladores. A participação de capital próprio dos acionistas no investimento projetado deve ser equivalente a, no mínimo, 20% do total. Em termos gerais, uma série de garantias é requerida dos mutuários para obtenção dos recursos financiáveis pelo BNDES. São garantias que antecedem o funcionamento do empreendimento, garantias durante sua existência e vigência do financiamento e garantias reais, que visem a dar conforto aos emprestadores de capital. A seguir, detalha-se um pouco mais cada uma destas garantias: – Garantias Pré-Operacionais – na fase de implantação do projeto, os controladores da SPE beneficiária do empréstimo devem: comprometer-se a aportar os recursos próprios necessários à sua implementação; celebrar contratos com empreiteiros de obras civis e fornecedores de máquinas e equipamentos garantindo a conclusão do projeto dentro do cronograma previsto; e contratar um seguro-garantia contra riscos diversos, tendo como beneficiários os financiadores do projeto (BNDES e/ou bancos credenciados); – Garantias Operacionais – na etapa operacional do projeto, os controladores da beneficiária devem penhorar as ações representativas do controle da SPE e dos direitos emergentes dos contratos de geração de fluxo de caixa em favor dos financiadores e, ainda, outorgar-lhes a assunção do controle da mutuária, quando for o caso. Adicionalmente, os financiadores podem solicitar garantia pessoal dos controladores, mediante aval ou fiança; – Garantias Reais – normalmente, o Banco exige garantias reais de 130% do valor disponibilizado, podendo abster-se destas, caso haja o compromisso da beneficiária em não ofertar a terceiros as mesmas garantias e/ou recebíveis sem prévia consulta e expressa autorização dos financiadores. 71 Os prazos de amortização da dívida contraída são analisados caso a caso, de acordo com a capacidade de geração de caixa pela sociedade beneficiária. Realizada esta avaliação, o BNDES estipula seu nível de participação no empreendimento, que poderá alcançar até 75% do ativo total projetado. Dentro do portfólio financiado pelo BNDES no decorrer dos anos de 2008 e 2009 destacam-se: – Apoio ao plano de investimentos da Cia. Vale do Rio Doce S.A.; – Apoio ao plano de investimentos da Companhia de Gás de São Paulo; – Aumento da capacidade produtiva da Fiat Automóveis em Betim – MG; – Implantação de fábrica de processamento de soja da Cargill S.A.; – Implantação de fábrica de produção de aerogeradores da Wind Power S.A.; – Implantação do Estaleiro Atlântico Sul no porto de Suape – PE; – Projeto da UHE Santo Antonio Energia; – Projeto de implantação da unidade de eteno da Braskem S.A.; – Projeto de implantação de fábrica de cimento da Votorantim S.A.; – Projeto de modernização operacional do Metro Rio; – Projeto para abertura de novas lojas do Magazine Luiza S.A.; 2.5.2 Agências Multilaterais As agências multilaterais são organismos que buscam colaborar para a viabilização de projetos fornecendo-lhes recursos financeiros para análise de viabilidade, estruturação e implantação, facilidades de crédito para exportação/importação e seguros de garantia, dentre outros. Suas atuações não se restringem a áreas comerciais, mas também proporcionam benefícios de ordem sócio-cultural, assim, contribuindo para o bem-estar geral das populações atendidas. Existem inúmeras agências multilaterais ao redor do mundo. Dentre as mais importantes destacam-se Banco Mundial, BID, BNDES (estes três tratados nesta dissertação como Bancos de Fomento, especificamente), Fundo Monetário Internacional (FMI), Corporação Andina de Fomento (CAF), Banco Europeu de 72 Investimento (BEI), Japan Bank for International Cooperation (JBIC), etc. Algumas agências multilaterais são classificadas como agências de crédito à exportação, ou seja, procuram viabilizar a exportação de bens e serviços de seus países de origem como forma de facilitar o acesso a mercados em todo o mundo. A Compagnie Française d´Assurance pour le Commerce Extérieur (COFACE), da França, a SACE, italiana, e o JBIC, japonês, são notórios exemplos. Apesar de sua variedade, este estudo tomará como exemplo algumas das principais entidades incentivadoras de projetos no Brasil. 2.5.2.1 Corporação Andina de Fomento A Corporação Andina de Fomento (CAF) é uma instituição financeira multilateral com sede em Caracas, na Venezuela, criada em 1970, com o objetivo de prestar assistência financeira a empresas públicas e privadas da América Latina, visando ao desenvolvimento sustentável e integração dos países da região. A CAF possui entre seus acionistas 15 países latino-americanos (Argentina, Brasil, Bolívia, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, Jamaica, México, Panamá, Paraguai, República Dominicana, Trinidad e Tobago, Uruguai e Venezuela), a Espanha, por seus interesses de investimento nos países de mesma língua-pátria, além de catorze bancos privados da região. A CAF possui uma vasta gama de produtos e serviços para atender as mais variadas necessidades de seus clientes, a exemplo de: – Assessoria Financeira; – Cooperação Técnica; – Empréstimos de curto, médio e longo prazos; – Empréstimos do tipo A/B, em conjunto com instituições multilaterais e bancos internacionais; – Financiamento Estruturado, com ou sem garantias adicionais; – Garantias e Avais; 73 – Garantias Parciais; – Linhas de Crédito; – Participações Acionárias; e – Serviços de Tesouraria. A figura a seguir mostra a estrutura organizacional da corporação. Figura 04 – Organograma da CAF Fonte: CAF, 2009 A Corporação Andina de Fomento também atua na administração e gestão de fundos de terceiros destinados a oferecer apoio financeiro a empresas e governos de países do bloco. O principal deles é o Fundo de Cooperação Técnica do 74 Ministério da Economia da Espanha, que visa a atender projetos voltados a investimentos em áreas de energia, infra-estrutura, integração regional, desenvolvimento social e ambiental, que beneficiem os povos e reduzam a pobreza e desigualdade social. Como objeto principal de abordagem desta pesquisa, é importante destacar que a CAF também atua na área de financiamentos estruturados do tipo Project Finance. Deste modo, são estudados projetos dirigidos ao setor de infra-estrutura e que tenham, preferencialmente, contratos de concessão já outorgados pelos poderes concedentes locais como forma de minimizar os riscos regulatórios e políticos dos empreendimentos. São considerados elegíveis à obtenção desta modalidade de financiamento investidores dos setores públicos ou privados. A seguir, destacam-se alguns projetos que obtiveram apoio da CAF. Empreendimento Valor Aprovado (US$) Data Gasoduto Brasil-Bolívia 80.000.000 25.11.1998 Integração Energética Brasil-Venezuela 26.000.000 09.12.1999 Rede Viária do Estado de Rondônia 35.000.000 19.06.2002 Programa de Apoio a Governos Municipais 200.000.000 24.10.2006 Manejo e drenagem de Águas de Brasília - DF 60.095.000 24.09.2007 Programa de Infraestrutura de Manaus – AM 75.000.000 11.03.2008 Pavimentação da Estrada Caminhos Novos - PB 100.000.000 11.07.2008 Infraestrutura social e mitigação da pobreza 500.000.000 10.08.2009 Quadro 06 – Projetos brasileiros apoiados pela CAF Fonte: CAF, 2009 2.5.2.2 Compagnie Française d´Assurance pour le Commerce Extérieur A Compagnie Française d´Assurance pour le Commerce Extérieur (COFACE) é uma empresa francesa, sediada em Paris, e faz parte de um dos maiores conglomerados financeiros da França, o Grupo Natixis Banques Populaires. 75 A empresa, há mais de 60 anos atuando no mercado mundial e presente em mais de 90 países, possui um quadro de sete mil colaboradores e um portfólio de 130 mil clientes ao redor do globo. Sua linha de serviços compreende: seguro de crédito doméstico e de exportação (seu carro-chefe), gestão de cobrança nacional e internacional, informações comerciais estratégicas e financiamento de recebíveis. Sua estratégia de atuação está representada no modelo de negócios abaixo: Figura 05 – Modelo de Negócios da COFACE Fonte: COFACE, 2009 A COFACE está presente no Brasil desde 1998, tendo adquirido, recentemente, a Sociedade Brasileira de Crédito à Exportação (SBCE), que possuía características de atuação semelhantes às de sua matriz. Dentro das linhas de serviços citadas anteriormente, seu Seguro de Crédito Doméstico possui coberturas para processos falimentares (falência e recuperação judicial) e mora simples; o Seguro de Crédito à Exportação cobre riscos comerciais e riscos políticos e extraordinários até o limite de 90% do limite de crédito segurado e não pago; gestão de cobrança nacional e internacional, através dos serviços de recuperação e gerenciamento de carteiras vencidas; informações comerciais estratégicas, amparadas por um banco de dados de mais de 50 milhões de empresas em todo o mundo, proporcionando um maior conhecimento dos potenciais clientes; e financiamento de recebíveis, mixando securitização, gestão e financiamento de recebíveis corporativos. 76 2.5.2.3 Japan Bank for International Cooperation O Japan Bank for International Cooperation (JBIC) é uma entidade internacional de cooperação criada em 1999 e constituída em sua totalidade por capital do governo japonês. Seu objetivo principal é fortalecer as relações econômicas entre o Japão e parceiros estrangeiros do setor privado, através de financiamento preferencial ao investimento externo e comercial de empresas japonesas. Em muitos casos, é considerado como uma ECA (Export Credit Agency). Por intermédio do mecanismo de International Financial Operations (IFO), ou seja, operações de financiamento internacional, o JBIC apóia, direta e indiretamente, empresas japonesas na importação, exportação e investimento em diversos países em todos os continentes. As operações do tipo IFO possuem como fontes principais de recursos o Programa Fiscal de Investimento e Empréstimo do Governo Japonês (FILP - Fiscal Investment Loan Program), cujos fundos são obtidos por meio de lançamento de títulos públicos no mercado de capitais local, os provenientes de lançamento de bônus do JBIC nos mercado de capitais interno e externo e capital próprio. Tendo em vista a procedência dos fundos, torna-se essencial a adoção de regras rígidas de garantia de repagamento dos empréstimos concedidos. Todas as operações apoiadas por financiamentos concedidos pelo JBIC levam em consideração o chamado “Japan Interest”, ou seja, o interesse japonês de investir em outros países. No caso brasileiro, o apoio pode se dar em conjunto com outros organismos financeiros, como Banco Mundial, BID ou BNDES e devem ser destinados, prioritariamente, aos segmentos de infra-estrutura, energia e recursos naturais, além de projetos chamados de mecanismo de desenvolvimento limpo (MDL), voltados ao combate de gases que provoquem o efeito estufa. O suporte financeiro a empresas japonesas, suas matrizes ou filiais localizadas em solo brasileiro, seja em processos de exportação ou importação de bens e serviços, é ponto-chave para o Banco. 77 O passo a passo para obtenção de um empréstimo na modalidade IFO encontra-se no fluxograma abaixo: 1. Contato direto com o JBIC 2. Escolha do tipo de financiamento 3. Análise de viabilidade do projeto 4.Análise do risco de crédito do projeto Fase Inicial 6. Submissão dos termos contratuais à Diretoria do Banco 5. Negociação do contrato, garantias e condições gerais de financiamento Fase Intermediária 7. Aprovação do financiamento pela Diretoria do JBIC 8. Assinatura do contrato de financiamento Fase Final 9. Monitoramento do projeto Fase Pós-Liberação Figura 06 – Fluxograma IFO As condições gerais de empréstimos IFO estão sujeitas a uma análise prévia da situação econômico-financeira do requerente por técnicos da instituição. Em condições normais, o quadro a seguir apresenta os tipos de financiamento, indexadores e participação limite do capital japonês. 78 1. As pequenas e médias empresas têm condições especiais de empréstimo. 2. A taxa de empréstimo em Iene depende do período de carência e de amortização. Para maiores informações sobre as taxas, favor entrar em contato com o JBIC. 3. As taxas referentes ao Financiamento à Importação/Investimento variam dependendo: do grau de contribuição para o ingresso de empresas japonesas no mercado exterior, da significância como cooperação econômica internacional, da contribuição para a garantia de suprimento de recursos naturais para o Japão e da preservação e contribuição com o meio ambiente. As condições de financiamento para os recursos naturais são mais favoráveis. 4. FILP - Programa Fiscal de Investimento e Empréstimo do Governo Japonês. Pode ser oferecida à taxa variável de Iene LIBOR + spread. 5. Pode ser oferecida à taxa fixa. 6. Revisado semestralmente. Quadro 07 – Condições de financiamento do JBIC Fonte: JBIC, 2009 As operações de IFO podem ter seis modalidades distintas, tratadas aqui pormenorizadamente: – Financiamento à exportação – nesta modalidade o JBIC financia os exportadores japoneses (Crédito ao Fornecedor – Supplier’s Credit), os importadores nos países de destino dos bens de capital ou serviços tecnológicos (Crédito ao Comprador – Buyer’s Credit) ou os bancos estrangeiros responsáveis pelas transações (Empréstimo Bancário – Bank Loan); – Financiamento à importação – tem a finalidade de efetuar empréstimos ao importador japonês ou ao exportador estrangeiro; – Financiamento ao investimento externo – apóia investimentos diretos de empresas ou investidores japoneses no exterior; – Financiamento não vinculado (Untied Loan) – são recursos de longo prazo destinados a projetos de desenvolvimento da infra-estrutura sócio- 79 econômica de países em desenvolvimento não vinculados à aquisição de bens e serviços de empresas japonesas; – Garantia – destina-se a garantir operações financeiras de bancos privados, lançamento de títulos de governos estrangeiros em mercado de capitais, fianças bancárias (Garantia de Execução - Performance Bond e Garantia de Reembolso - Refundment Bond) para exportações de equipamentos japoneses ou importações de recursos naturais essenciais ao Japão e empréstimos de empresas japonesas; – Participação acionária – realiza injeção de recursos em subsidiárias de empresas japonesas com vistas à execução de projetos de interesse estratégico. Dentre os projetos IFO apoiados no Brasil pelo JBIC encontram-se: • Na modalidade Bank Loan: – Produção de Aços da Usiminas; – Papel e Celulose da Cenibra; – Alumínio do Estado do Pará; – Exploração de Petróleo da Petrobras; – Transporte de Gás de Cabiúnas; – Instalação da Unidade de Craqueamento da Refinaria Landulpho Alves (RLAM); – Modernização da Refinaria Alberto Pasqualini (REFAP); – Modernização do Setor de Logística da Vale. • Na modalidade Buyer’s Credit: – Gás Natural de Urucu da Petrobras; – Gasoduto Brasil-Bolívia. • Na modalidade Untied Loan: – Exploração de Minério de Ferro de Carajás – Vale; – Interligação Elétrica Norte-Sul; – Rodovia Mercosul; – Expansão da Rede de Telecomunicação da Telesp/Telemar; 80 – Modernização do Metrô Urbano de Fortaleza. • Na modalidade Garantia: – Modernização da Refinaria do Planalto Paulista (REPLAN). 2.5.2.4 Multilateral Investment Guarantee Agency A Multilateral Investment Guarantee Agency (MIGA) faz parte do Grupo Banco Mundial e tem como função principal a prestação de garantia a investidores em projetos estruturados. Adicionalmente, possui um Serviço de Informação ao Investidor que se constitui em um vasto de banco de dados, com informações sobre oportunidades de investimento em países em desenvolvimento em todos os continentes. Sua assistência técnica é um serviço de assessoramento a investidores e governos com a finalidade de obter as melhores condições negociais para o sucesso dos empreendimentos. Os tipos de garantia oferecidos pela MIGA são: – Expropriação – proteção contra atos de expropriação de parte ou todo de um projeto de investimento por ato do governo anfitrião; – Guerra, terrorismo e perturbação da ordem pública – cobertura contra perdas, danos, destruição ou desaparecimento de ativos componentes do projeto que provoquem sua inviabilidade econômica e sejam decorrentes de atos como revolução, insurreição, golpes de estado, sabotagem e terrorismo; – Inconversibilidade de moedas e restrição de transferência – protege contra possíveis perdas por incapacidade de cambiar e remeter recursos financeiros por alguma ação governamental impeditiva; – Não pagamento de obrigações financeiras soberanas – protege contra o risco de um governo não honrar suas obrigações para com o investidor; e – Quebra de contrato – garantia contra violação de cláusulas contratuais por uma das partes que enseje uma disputa jurídica. A cobertura somente será obtida após decisão judicial final ou laudo arbitral definitivo. 81 Além de seu portfólio de garantias e assistência técnica, a MIGA auxilia seus clientes por intermédio de ações que visem ao bom andamento de seus projetos de investimento, conforme abaixo: – Dissuasão a ações prejudiciais por interferência de governos; – Garantia adicional para aumento dos prazos de financiamento, podendo, em alguns casos, chegar a 20 anos; – Garantia para redução dos custos de financiamento pela diminuição da avaliação de riscos; – Mediação na solução de conflitos ao primeiro sinal de controvérsia entre partes envolvidas no projeto; – Promoção de acesso a empréstimos bancários; e – Prover informações sobre tópicos ambientais e sociais específicos de determinado país para facilitar a aceitação do investimento. O quadro a seguir elenca empreendimentos apoiados pela MIGA: BENEFICIÁRIO SETOR PAÍS INVESTIDOR VALOR GARANTIDO ANO (US$) Serra da Mesa Transmissora de Energia S.A. Energia Espanha 33.000.000 2009 Itumbiara Transmissora de Energia Ltda. Energia Espanha 35.400.000 2007 Sul Transmissora de Energia S.A. Energia Espanha 10.700.000 2006 Nordeste Transmissora de Energia S.A. Energia Espanha 23.100.000 2006 Rabobank International Brasil S.A. Bancos EUA 66.500.000 2005 Termocabo Ltda. Energia Holanda 26.760.000 2004 Transporte Espanha 61.700.000 2002 Global Village Telecom Ltda. Telecom Israel 94.000.000 2002 Nordeste Generation Ltda. Energia Cingapura 50.000.000 2002 Barracuda Caratinga Leasing Co. Óleo e Gás Japão 72.000.000 2001 Light Serviços de Eletricidade S.A. Energia EUA 23.000.000 2001 Furukawa Industrial S.A. Produtos Elétricos Elétrico Japão 5.000.000 2001 Banco do Estado de São Paulo S.A. Bancos Espanha 200.000.000 2001 BCP S.A. Telecom Holanda 230.000.000 2000 VBC Energia S.A. Energia Cayman Is 100.000.000 2000 Metrô de Salvador S.A. Quadro 08 – Empreendimentos apoiados pela MIGA Fonte: MIGA, 2009 82 BENEFICIÁRIO VALOR PAÍS SETOR INVESTIDOR GARANTIDO ANO (US$) Gasoduto Brasil-Bolívia Óleo e Gás EUA 14.600.000 1999 Banco Santander Brasil Bancos EUA 19.500.000 1999 Eletrônicos Holanda 27.000.000 1997 Philips do Brasil Ltda. Quadro 08 – Empreendimentos apoiados pela MIGA Fonte: MIGA, 2009 2.5.3 Bancos Comerciais Serão abordadas, a seguir, instituições financeiras que operam freqüentemente no mercado bancário e de mercado de capitais e que oferecem suporte a projetos. Os bancos comerciais e de investimento nacionais e internacionais estão aptos a criar condições propícias ao desenvolvimento de novos investimentos que supram as necessidades de atendimento à população de determinada região, por meio da execução de um projeto específico, como uma usina de geração de energia, um terminal aeroviário, portuário ou rodoviário, uma obra de infra-estrutura viária, como estradas e pontes, etc. De forma especial, incluiu-se nesta seção uma associação representante das instituições que atuam no mercado de capitais brasileiro, de forma a apresentar um ranqueamento das atuações individuais em prol do financiamento ou assessoramento a projetos na modalidade Project Finance. 2.5.3.1 Banco do Brasil S.A. De acordo com Oliveira e Pacheco (2005), o Banco do Brasil (BB) é o banco mais antigo do país, criado por D. João VI, em 1808. Sua classificação societária é a de uma sociedade de economia mista, controlada pelo Governo Federal. A participação deste, por intermédio do Tesouro Nacional, é de 51,9% das ações 83 ordinárias, ficando a Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil (PREVI) com 10,4%, Fundo de Garantia à Exportação com 8,9%, BNDES Participações (BNDESPAR) com 2,4%, 11,7% em poder de estrangeiros e o restante, 14,7%, com os demais acionistas em mercado (CVM, 2010). Até 1986, o BB possuía a condição de autoridade monetária nacional, perdida quando da extinção da chamada Conta-Movimento, que permitia ao Banco o suprimento automático de recursos para fazer frente às suas operações bancárias e às de suporte às necessidades do governo. Dentre suas atividades, o Banco do Brasil tem as seguintes atribuições (OLIVEIRA e PACHECO, 2005): – Administrador da Câmara de Compensação de Cheques e Outros Papéis; – Agente financeiro do Tesouro Nacional; – Executor dos serviços bancários de interesse do governo federal e de suas autarquias; e – Financiador da atividade agropecuária do País, com recursos advindos de depósitos em cadernetas de poupança. Por intermédio da atuação de suas diversas áreas, principalmente a Comercial e a de Mercado de Capitais, o Banco pode estruturar operações que propiciem recursos financeiros a empresas para desenvolvimento de projetos estruturados, inclusive na modalidade Project Finance. Este apoio pode se dar através de operações financeiras lastreadas em recursos próprios (financiamento direto de longo prazo), recursos provenientes de operações igualmente de longo prazo em mercado de capitais e de fundos governamentais administrados pelo Banco, com o objetivo de alavancar o desenvolvimento regional, como o Fundo Constitucional de Financiamento do Centro Oeste (FCO). Nos últimos anos, o Banco do Brasil tem participado do financiamento de vários projetos na modalidade Project Finance, o que se confirma por sua colocação de destaque nos rankings de financiamento da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (ANBID). 84 2.5.3.2 Demais Bancos Comerciais Os bancos comerciais têm como função principal o suprimento de fundos em quantidade adequada para financiar, a curto, médio e longo prazos, atividades comerciais, industriais, de prestação de serviços e pessoas físicas. Esses bancos nada mais são do que intermediários financeiros, ou seja, captam recursos de quem os tem de sobra, os chamados poupadores, remunerando seu capital a uma determinada taxa, e emprestando esses mesmos recursos a quem deles necessita, chamados de tomadores de recursos, cobrando uma taxa superior à paga aos aplicadores. Desta forma, fica estabelecido o spread bancário, que é a diferença entre as taxas de captação e de aplicação de recursos. Basicamente, é deste modo que os bancos auferem seu lucro. Segundo Fortuna (2002), para atender esses objetivos, os bancos podem: – Captar depósitos à vista e a prazo; – Descontar títulos comerciais; – Efetuar a prestação de serviços à sua clientela; – Obter recursos externos para repasse a clientes; – Obter recursos junto a instituições oficiais para repasse aos clientes; – Promover abertura de limites de créditos; – Realizar abertura de contas-correntes; e – Realizar operações financeiras especiais, incluindo crédito rural, de câmbio e de comércio exterior. Bancos comerciais, principalmente os de médio e grande porte, possuem em seu portfólio de serviços, como visto acima, a realização de operações específicas, as quais incluem o financiamento de projetos. Muitos deles suportam linhas creditícias próprias para Project Finance, operam em mercado de capitais para obtenção de recursos de terceiros, lançando títulos ou montando operações estruturadas, ou, simplesmente, atuam como intermediários em repasses de bancos de fomento. 85 2.5.3.3 ANBID – Rankings de Financiamento A Associação Nacional dos Bancos de Investimento (ANBID) é uma entidade de classe que reúne os principais bancos comerciais, bancos de investimento, bancos de fomento, bancos múltiplos com carteira de investimento, empresas de gestão de ativos (asset management) e de consultoria financeira do Brasil. Sua atuação é voltada para a normatização e adequação das atividades de seus associados para execução de atividades financeiras de acordo com as melhores práticas de mercado de capitais. Dentre as principais funções da ANBID destacam-se: – Disseminar entre seus associados a adoção das melhores práticas de mercado e de respeito aos investidores; – Fornecer suporte à atuação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) como agente regulador do mercado de capitais; – Fortalecer as atividades de mercado de capitais como mecanismo indutor do desenvolvimento e apoio financeiro a empreendimentos; e – Orientar investidores e agentes de mercado em relação às características dos produtos disponíveis em mercado. Objetivando zelar pelos interesses de seus associados perante o mercado, órgãos reguladores, governos e agências internacionais, a ANBID mantém uma Área de Representação e possui Comissões e Subcomissões Técnicas, que funcionam como canais de comunicação com esses agentes. Encontram-se entre as principais Comissões de Representação, a Comissão de Administração de Recursos de Terceiros, a Comissão de Assuntos Jurídicos, a Comissão de Certificação, a Comissão de Compliance, a Comissão de Finanças Corporativas, a Comissão de Fundos Estruturados, a Comissão de Private Banking, e a Comissão de Serviços Qualificados em Mercado de Capitais. 86 De forma a acompanhar a evolução das operações estruturadas por seus associados, a ANBID elabora rankings representativos de quantidade e montante de negócios realizados pelos bancos e consultorias. O ranking ANBID de Financiamento de Projetos classifica os agentes em três categorias: assessor financeiro, que auxilia a entidade representativa do projeto a elaborar o modelo econômico-financeiro, definir fontes de financiamento de longo prazo para suas necessidades, auxiliar durante a etapa de due diligence e de negociação de contratos; estruturador, onde o papel do banco é mais significativo, que se propõe a, em conjunto com o beneficiário, delinear o processo de sindicalização e de negociação dos termos do financiamento ideais para o projeto; e emprestador, caso em que analisa a viabilidade econômico-financeira do empreendimento e aporta seus recursos para o financiamento ou oferece garantia financeira por meio de carta de fiança. Em 2009, os volumes financeiros e de negócios envolvendo Project Finance no Brasil foram bastante expressivos. A ANBID divulga, periodicamente, os rankings de financiamento de projetos abrangendo estes dois parâmetros. A título ilustrativo encontram-se, como anexos, os rankings de financiadores de projetos daquele ano. 87 3 METODOLOGIA DE PESQUISA 3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS Este capítulo abordará a metodologia de pesquisa utilizada nesta dissertação, cujo foco principal é o estudo do Project Finance como ferramenta de financiamento de projetos. Neste caso, é importante entender os conceitos e finalidades que envolvem uma pesquisa. Segundo Gil (2009), pesquisa é o procedimento racional e sistemático que tem como objetivo proporcionar respostas aos problemas que são propostos. Avançando um pouco mais no conceito, mas voltando no tempo, de acordo com Ander-Egg (1978 apud MARCONI e LAKATOS, 2009, p.1), a pesquisa é um procedimento reflexivo sistemático, controlado e crítico, que permite descobrir fatos novos ou dados, relações e leis, em qualquer campo do conhecimento. 3.2 CLASSIFICAÇÕES DAS PESQUISAS Gil (2009) classifica as pesquisas de acordo com seus objetivos e de acordo com os procedimentos técnicos realizados. Em relação aos objetivos, as pesquisas podem ser: – Descritivas – têm como objetivo a descrição das características de uma população ou de um fenômeno específico ou estabelecer relações entre variáveis determinadas. Abordam o estudo de uma característica de um determinado grupo, estabelecendo relações entre variáveis específicas, como, por exemplo, nível de renda versus escolaridade ou preferência político-partidária versus grau de instrução; 88 – Explicativas – focam na identificação de fatores determinísticos ou contributivos para a ocorrência de um determinado fato. Tem como base o aprofundamento de uma realidade já conhecida, explicando o porquê e a razão das coisas. Os resultados dos estudos explicativos podem ser mais claramente identificados em estudos experimentais ou ex-post facto; e – Exploratórias – o objetivo principal é proporcionar maior conhecimento do problema a ser abordado. Com um planejamento bastante flexível, permite abordagens que envolvam farto levantamento bibliográfico, entrevistas e análise de exemplos precedentes, o que se expressa sob a forma de uma pesquisa bibliográfica, propriamente dita, ou um estudo de caso. Em relação aos procedimentos técnicos realizados, as pesquisas classificamse em: – Bibliográficas – embasadas em material pré-existente, como livros, artigos científicos, periódicos e impressos diversos, tem como diferencial o fato de permitir ao pesquisador cobrir o tema em pauta com uma quantidade de informações bem maior do que numa pesquisa direta. As fontes de consulta devem ser fidedignas, para que não se reproduza erros incorridos pela fonte secundária; – Coorte – altamente reconhecidas nos meios científicos, abrangem amostras que possuam características em comum, analisadas por um determinado espaço temporal, onde a ação de variáveis produzirá diagnósticos conclusivos. Para proporcionarem resultados críveis, as amostras devem ser bem amplas, o que pode tornar a pesquisa onerosa do ponto de vista financeiro; – Documentais – similares às bibliográficas, baseiam-se em documentos já elaborados. Os materiais utilizados devem passar por um amplo processo de depuração, de forma a tornar seus dados uma fonte confiável de informações. As fontes mais comuns são cartas, diários pessoais, fotos, memorandos, regulamentos, relatórios de empresas, tabelas com dados estatísticos, etc. Esta modalidade tem como principais vantagens seu baixo custo de obtenção (certas fontes cobram por acesso a seus arquivos) e a estabilidade e riqueza de seus dados; 89 – Estudos de Campo – desenvolvidos pela observação direta do pesquisador das atividades de uma comunidade, que pode ser um grupo de estudo, de trabalho ou mesmo de lazer. Esta modalidade tem sua aplicação mais usual nas áreas de Saúde Pública, Sociologia, Administração e Educação; – Estudos de Caso – consistem em uma profunda e exaustiva exploração de um ou poucos objetos de análise. Sua utilização tem como objetivos a manutenção da individualidade do objeto em estudo, a exploração de situações reais e a formulação de hipóteses e teorias acerca das observações realizadas. Como neste tipo de pesquisa, normalmente, não são estabelecidos procedimentos padronizados rigorosos, o pesquisador deve ter cuidado na coleta e, principalmente, na análise de dados, de modo a prevenir possíveis interpretações distorcidas. A extrapolação da avaliação realizada para outro objeto de análise também fica prejudicada, impedindo a generalização de resultados observados; – Experimentais – trata-se do mais prestigiado delineamento junto à comunidade científica, pois o pesquisador é um agente ativo no processo. É o método ideal para testar relações de causa e efeito. Sua limitação se dá à medida que muitas variáveis estão presentes e, às vezes, se torna fator impeditivo de obtenção de um resultado mais consistente; – Ex-Post Facto – trata de fatos do passado e é semelhante à pesquisa experimental, pois se destina a verificar relações entre determinadas variáveis, sobre as quais, contudo, não se tem controle, pois já ocorreram. Aplicável na comparação entre amostras, para extração de correlações entre elas; – Levantamentos – pesquisas feitas mediante interrogação direta, produzindo resultados após uma medição quantitativa das respostas dadas. A seleção de uma amostra expressiva propicia a extrapolação das conclusões para a totalidade do universo em questão. Têm como vantagens economia e rapidez de realização e conhecimento imediato da realidade dos entrevistados e como desvantagem a possibilidade de obtenção de dados distorcidos, pois cada pessoa tem sua percepção (dado subjetivo); – Participantes – são pesquisas caracterizadas pela participação interativa entre os pesquisadores e as populações que se quer analisar. Por sua 90 similaridade com a pesquisa-ação, muitos autores entendem serem sinônimas; e – Pesquisas-ação – definida por Thiollent (1985 apud MARCONI e LAKATOS, 2009, p.55) como sendo um tipo de pesquisa com base empírica, a qual é concebida em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo, no qual pesquisadores e participantes do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo. A pesquisa ora apresentada classifica-se, no que diz respeito ao seu objetivo, em exploratória, e no que tange aos procedimentos técnicos, em estudo de caso, sendo o Projeto Termopernambuco seu alvo. 3.3 FASES DA PESQUISA Conceitualmente, segundo MARCONI e LAKATOS (2009), as pesquisas se dividem nas seguintes fases: escolha do tema, onde o pesquisador deve definir o assunto a ser estudado e pesquisado; levantamento de dados, fase na qual se coletam dados acerca do tema escolhido; formulação do problema, quando se deve refletir sobre questões relevantes para as quais se buscam soluções; definição dos termos, onde o autor precisa clarificar tudo aquilo que possa causar interpretação dúbia ou errônea na sua pesquisa; construção das hipóteses, ou seja, realizar proposições na tentativa de validar a resposta aos problemas apresentados; indicação de variáveis, elecando aquelas que possam afetar de algum modo o objeto do estudo; delimitação da pesquisa, onde são estabelecidos os limites do processo investigativo; amostragem, onde parte do universo de possibilidades de pesquisas é retirada para avaliação; seleção de métodos e técnicas, quando é definido o instrumental metodológico a ser utilizado no estudo do problema; organização do instrumental de pesquisa, que requer tempo e perseverança; e, finalmente, teste de instrumentos e procedimentos, momento no qual se procura validar os instrumentos de pesquisa, testando-os sobre uma diminuta parcela 91 escolhida aleatoriamente, estatisticamente chamada de população, da amostra sobre o qual serão definitivamente aplicados. Para este trabalho, seguiu-se a receita convencional, ou seja, foi escolhido o tema a ser tratado, realizou-se uma vasta pesquisa em materiais didáticos disponíveis, formulou-se o problema a ser explorado, escolheu-se o método adequado à pesquisa, formularam-se hipóteses, que foram observadas ao longo do estudo e chegou-se a conclusões pontuais, permitindo que outros pesquisadores as complementem, futuramente, com novas visões. 3.4 ESCOLHA DO TIPO DE PESQUISA ADEQUADO Para cada objetivo existe um tipo de pesquisa adequado. Caberá ao pesquisador avaliar, de posse dos instrumentos disponíveis, qual é aquela que melhor se adapta aos anseios de respostas às questionamentos existentes acerca de determinado tema. Para esta pesquisa optou-se por um estudo de caso real, onde as ocorrências precedentes foram a condição causal de questionamentos pelo pesquisador. Situações atípicas, ao olhar do autor, no contexto de financiamento de projetos, levaram a uma análise exploratória do porquê do acontecimento de determinados fatos que interferiram na fluidez de linhas de financiamento usuais. 3.5 COLETA DE DADOS A coleta de dados é uma tarefa árdua e demorada, que demanda certa dose de paciência e perseverança. Além de um registro de dados consistente, realizado com bastante atenção, é preciso um forte comprometimento pessoal do pesquisador nesta etapa da investigação. 92 De acordo com MARCONI e LAKATOS (2009, p.19), vários são os métodos para realização de coleta de dados. Dentre os mais utilizados, pode-se citar: coleta documental, observação, entrevista, questionário, formulário, medidas de opinião, técnicas mercadológicas, testes, sociometria, análise de conteúdo e história de vida. “Em termos de coleta de dados, o estudo de caso é o mais completo dos delineamentos, pois se vale tanto de dados de gente quanto de dados de papel” (GIL, 2009, p.141). Nesta modalidade, os dados são obtidos, basicamente, por intermédio de entrevistas, depoimentos pessoais, análise documental, observação participante e observação espontânea. Para o estudo de caso desta pesquisa foram realizadas observações espontâneas e participativas, quando da elaboração do plano de negócios do projeto e da negociação de suas fontes de financiamento, bem como avaliação de grande quantidade de documentos relacionados com o mesmo. Serão foco de maior atenção os contratos financeiros e seus apêndices, principalmente no que diz respeito aos financiamentos providos pelo BNDES, BID e bancos comerciais estrangeiros. 3.6 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS Após a obtenção é a vez da análise e interpretação dos dados. Analisar dados significa tentar estabelecer correlação entre o objeto que se estuda e os fatores que orbitam em torno dele. A interpretação é uma prerrogativa individual, onde cada pessoa busca contextualizar a real significância do material coletado em relação àquilo que se propõe para o tema sob exame. Num estudo de caso, os dados analisados são eminentemente de natureza qualitativa, devendo-se tomar muito cuidado com o sentimento de certeza que pode dominar o pesquisador acerca de suas conclusões sobre o assunto em questão. 93 3.7 LIMITAÇÕES DO MÉTODO Como visto anteriormente, o estudo de caso é um tipo de pesquisa onde a possibilidade de ocorrência de vieses é constante, devido à falta de rigor metodológico. A flexibilidade encontrada neste método tem como principal risco a geração de um grande volume de informações, cujo tratamento torna-se difícil, ou às vezes impossível, de levar a um exame interpretativo minucioso daquilo que se constitui como alvo de análise da pesquisa. Para tentar minimizar os riscos inerentes a esta metodologia, procurou-se estabelecer critérios de coleta de dados bastante exigentes, de modo a obter dados de fontes públicas e de reconhecida aceitação no mercado em que se insere o objeto de estudo, de modo a gerar uma avaliação consistente acerca dos questionamentos impostos. 3.8 FLUXOGRAMA DA PESQUISA Esta pesquisa seguirá o fluxo abaixo apresentado: Figura 07 – Fluxograma da Pesquisa 94 4 ESTUDO DE CASO 4.1 OBJETIVO Para a concepção deste trabalho, foi utilizada a metodologia de Estudo de Caso, a fim de ilustrar as peculiaridades da técnica de estruturação de empreendimentos baseada na modalidade Project Finance. A complexidade jurídica envolvendo a estruturação de projetos neste formato torna sua consecução um intrincado quebra-cabeças de contratos operacionais, financeiros e de garantia, os quais vão regular as relações entre as partes envolvidas. O Projeto Termopernambuco, objeto deste estudo, teve sua estruturação financeira concebida em um momento significativamente ímpar na história recente de nosso País. Tratava-se de um tempo de grande incógnita para a sociedade brasileira e, principalmente, para o mercado financeiro e de capitais. A possibilidade de mudanças na estrutura política do Brasil, proveniente da provável alteração da condução da política econômica, trazia um cenário de grandes incertezas. A busca por “ativos de proteção”, como dólar, ouro e imóveis, tornou-se prática corrente no biênio 2001/2002. Para corroborar esta afirmação, são reproduzidos, a seguir, os gráficos com as cotações anuais dos ativos mais procurados. Como se pode observar no gráfico a seguir, a cotação do dólar americano, moeda-base do contrato de financiamento com o BID, estava em trajetória descendente desde o ano de 2002, quando chegou a alcançar, no 4º trimestre daquele ano, o valor máximo de R$ 3,53 (cotação de fechamento 52% superior à do ano anterior). 95 Gráfico 01 – Cotação do Dólar (R$/US$1,00) Fonte: Economática, 2010. No período crítico da estruturação do projeto, a cotação do ouro, como se visualiza no gráfico abaixo, também disparou (variação de 80%, de 2001 para 2002), mostrando a insegurança reinante, por conta das possíveis mudanças políticas. Gráfico 02 – Cotação do Ouro (R$/g) Fonte: Economática, 2010 A retração do mercado, face à nova realidade, fez com que os bancos reduzissem sua exposição a todo tipo de risco. Como visto no capítulo 2.4.7, que trata de riscos, o melhor mitigante para o risco político é a participação de capitais de instituições financeiras do país anfitrião no projeto em estruturação. É neste instante que o Projeto Termopernambuco encontra uma de suas maiores dificuldades. Alinhar o ingresso de capitais externos, provenientes do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e de bancos comerciais internacionais com aqueles 96 originados internamente, via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), requer sintonia fina entre as partes, devido à necessidade de compartilhamento de garantias. Por ser o principal agente de fomento do governo brasileiro, este banco tem por característica financiar empreendimentos que beneficiem a infraestrutura básica do país. E, em se tratando de energia elétrica, este é um insumo básico para o atingimento de taxas sustentáveis de crescimento. Como banco de governo, o BNDES tem em seus quadros, teoricamente, decisores substituíveis por mudanças de ideologias de momento. Assumir a responsabilidade de dar acesso a grandes somas de recursos em tais circunstâncias deveria ser uma tarefa tecnicamente factível, mas, nem sempre é assim. A ênfase do estudo de caso serão os contratos financeiros e suas nuances, que levaram a situações específicas. Também serão citados os demais contratos que compõem toda a estrutura jurídica do empreendimento. Os contratos adicionais, necessários ao cumprimento de exigências por parte dos financiadores, e que em condições normais seriam dispensáveis, serão destacados, demonstrando empiricamente o porquê do aumento de custos jurídicos gerados pela elaboração e negociação dos mesmos. Importante salientar que a fonte de informação destes documentos foi o prospecto definitivo da primeira emissão pública de debêntures simples da Termopernambuco, ocorrida em novembro de 2005, disponível no sítio da Comissão de Valores Mobiliários (http://www.cvm.gov.br). 4.2 O GRUPO NEOENERGIA A Neoenergia, anteriormente denominada Guaraniana, foi fundada em 1996 como uma paper company e no ano seguinte foi integralmente adquirida pelo BB – Banco de Investimento, banco de investimentos do Banco do Brasil S.A., pela IBERDROLA ENERGIA, uma companhia energética espanhola, e pela Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil (PREVI), o maior fundo de pensão brasileiro, com o objetivo de ser a empresa holding onde seriam reunidos todos os investimentos no segmento de energia elétrica do grupo, tendo como foco prioritário a Região Nordeste do Brasil. 97 Em seu breve histórico de atuação, a empresa realizou importantes investimentos no setor de energia elétrica brasileiro. No ano de 1997, a Neoenergia adquiriu, por intermédio de leilões estaduais de privatização, os controles acionários da Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia – COELBA, pagando o valor aproximado de R$ 1,7 bilhão, e da Companhia Energética do Rio Grande do Norte – COSERN, com desembolso de R$ 674 milhões. Em 2000, ainda sob a denominação de Guaraniana, foi arrematado, em outro leilão estadual de privatização, o controle acionário da Companhia de Eletricidade do Estado de Pernambuco – CELPE, pelo preço mínimo constante no edital de desestatização, estabelecido em R$ 1,8 bilhão. A compra da CELPE foi um movimento estratégico na busca da consolidação da atuação do grupo na região nordeste. A sinergia gerada pela condução conjunta das três distribuidoras era o principal motivador do vultoso investimento. Ainda naquele ano, a empresa tomou a decisão estratégica de incrementar seus investimentos na geração própria de energia, de modo a garantir seu suprimento aos consumidores. Para isso, as construções da Usina Hidrelétrica de Itapebi, na Bahia, com 450 MW de potência instalada, e das termelétricas Termopernambuco (532 MW) e Termoaçú (330 MW), esta em parceria com a Petrobras, no Rio Grande do Norte, foram fundamentais. Em 2003, as três usinas entraram em operação, fornecendo energia às distribuidoras e otimizando, desta forma, o desempenho do grupo. A mudança da denominação social da empresa ocorreu em 2004, quando Guaraniana passou a se chamar Neoenergia, numa analogia às novas energias que estariam sendo agregadas à empresa e a seus consumidores, seja por intermédio de suas geradoras, seja por meio de sua recém-criada comercializadora NC Energia e de suas distribuidoras. Porém, a alteração de nome teve mais motivos do que simplesmente uma jogada de marketing; a reorganização societária e o reequilíbrio econônico-financeiro da empresa foram o pano de fundo para obtenção de melhores indicadores de eficiência administrativa e de satisfação dos consumidores. Os anos de 2005, 2006 e 2007, foram voltados a aquisições de participações e a investimentos em várias centrais hidrelétricas, além de passar a atuar no 98 segmento de transmissão de energia elétrica. Dentre os principais empreendimentos, destacam-se: – UHE de Baguari, com 140 MW de potência instalada, em parceria com a Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG) e Furnas Centrais Elétricas; – UHE de Corumbá III, com 94 MW, tendo como sócios a Companhia Energética de Goiás (CELG) e Companhia Energética de Brasília (CEB); – UHE de Dardanelos (atualmente, Energética Águas da Pedra), com 261 MW, em consórcio com a Eletronorte, Companhia Hidrelétrica do São Francisco (CHESF) e Companhia Norderto Odebretch (CNO); – Transmissão de Energia do Rio Grande do Sul (RS Energia) e Transmissão de Energia de Santa Catarina (SC Energia), com 260 km e 360 km de linhas de transmissão de energia, respectivamente. Desde a sua criação, o Grupo Neoenergia realizou investimentos de aproximadamente R$15 bilhões, conforme se observa no quadro seguinte: Tabela 06 – Investimentos da Neoenergia INVESTIMENTOS (Em R$ milhões) 1997/2003 2004 2005 2006 2007 2008 TOTAL - - - - 2.151,9 1.956,2 825,4 30,4 4.963,8 Em aquisições de empresas / ações COELBA CELPE COSERN OUTROS 2.151,9 1.956,2 825,4 30,4 4.963,8 - - - 194,0 1.031,7 677,9 1.903,6 89,7 58,3 0,4 148,4 13,4 29,1 7,4 50,0 14,8 2,2 0,8 9,9 5,0 14,7 47,4 14,8 2,2 0,7 66,1 30,3 1,8 71,3 28,5 0,5 1,6 55,6 273,4 22,2 (37,4) 50,0 25,8 57,9 57,7 24,8 44,6 8,0 94,8 348,5 348,9 1.086,3 737,2 76,0 61,1 59,7 129,0 53,3 45,1 9,6 165,1 2.771,2 1.563,5 571,7 322,4 2.457,6 279,1 37,4 140,1 20,8 50,9 7,8 470,1 510,3 218,5 192,8 52,6 55,4 13,7 758,4 643,2 272,3 342,4 77,6 135,5 31,5 1.121,1 909,1 385,5 196,9 12,4 88,8 37,3 1.194,8 631,0 219,8 372,0 4.536,3 1.133,4 1.815,8 163,5 776,3 88,2 7.128,4 9.325,0 618,5 808,4 1.168,5 1.468,1 Realizados pelas empresas de geração de energia elétrica (Ativo Permanente) TERMOAÇU TERMOPERNAMBUCO ITAPEBI BAGUARI I GOIAS SUL AFLUENTE ÁGUAS DA PEDRA RIO PCH I BAHIA PCH I NEOINVEST GERAÇÃO CIII Realizados pelas empresas de distribuição de energia elétrica COELBA Subvenção "Luz para Todos" CELPE Subvenção "Luz para Todos" COSERN Subvenção "Luz para Todos" Total de investimentos Fonte: CVM, 2010. 123,3 (2,1) 1.126,4 1.474,9 14.863,5 99 No organograma abaixo, pode-se verificar a atual composição societária do Grupo Neoenergia: Figura 08 – Organograma Societário da Neoenergia. Doravante, para efeito deste trabalho, todas as referências à antiga Guaraniana, serão feitas por sua nova denominação, ou seja, Neoenergia. 100 4.3 A USINA TERMELÉTRICA TERMOPERNAMBUCO Criada em 25 de abril de 2000, a empresa Termopernambuco S.A. tinha como objetivo construir, operar e manter uma usina termelétrica a gás, de 532 MW, a ser instalada no Complexo Portuário de Suape, no município de Ipojuca, Estado de Pernambuco. Trata-se de uma usina térmica de ciclo combinado 2x1, constituída por dois turbogeradores industriais movidos a gás natural produzidos pela empresa americana General Electric (GE), com capacidade nominal de 170 MW (ISO) cada, e um turbogerador movido a vapor de condensação de 192 MW (ISO). Sua construção teve início em 2001, sendo o empreendimento inserido no Programa Prioritário de Termeletricidade (PPT) do governo brasileiro à época. Este programa visava solucionar os problemas decorrentes da escassez de energia elétrica ocorrido na virada do milênio. O investimento total foi de aproximadamente US$ 400 milhões, sendo 30% providos com recursos próprios dos sócios e 70% provenientes de financiamentos de terceiros (BNDES, BID e bancos comerciais internacionais). A operação comercial da UTE Termopernambuco teve início no dia 15 de maio de 2004, quando passou a vigorar o contrato de fornecimento de gás natural com a Copergás e a Petrobras, com disponibilidade de volume diário de 2.150.000 m3. Foto 01: Usina Termelétrica Termopernambuco Fonte: Site da Empresa. 101 4.3.1 Contratos Técnico-Operacionais Nesta seção, serão abordados os contratos firmados pela Termopernambuco, de modo a tornar o empreendimento viável, sob o ponto de vista técnicooperacional. Foram celebrados contratos com construtores, fornecedores de equipamentos e insumos, mantenedores, operadores, transportadores de energia, fornecedor de água, dentre outros. 4.3.1.1 Contrato de Engenharia, Compra de Equipamentos e Construção Neste empreendimento, o Contrato de Engenharia, Compra de Equipamentos e Construção (Engeneering, Procurement and Construction – EPC Contract) foi celebrado por intermédio de dois documentos distintos, cada um atendendo a uma finalidade específica para execução das obras de construção da termelétrica: um relativo ao fornecimento de equipamentos para a Ilha de Potência (Power Island) e outro para o entorno da Ilha de Potência, também conhecido como Balance of Plant (BOP). O fornecimento das turbinas, e de outros equipamentos especializados da Ilha de Potência, foi contratado com a General Electric, que os entregou no início de 2003, pelo valor aproximado de US$ 140 milhões. O contrato engloba o fornecimento da engenharia, de equipamentos e serviços de assistência técnica e treinamentos para todos os sistemas da Ilha. O outro contrato de EPC foi assinado, em fevereiro de 2001, com um consórcio composto pela Construtora Norberto Odebrecht S.A. (CNO), pela Promon Engenharia Ltda. (Promon) e pela Inepar S.A. Indústria e Construções, que poucos meses depois deixou o grupo. As duas primeiras foram as responsáveis pelas obras civis de engenharia, incluindo a montagem eletromecânica de todos os sistemas, suprimento e os serviços de treinamento específicos para manuseio dos equipamentos que compõem o BOP. 102 4.3.1.2 Contrato de Operação e Manutenção O Contrato de Operação e Manutenção (Operation and Maintenance – O&M Contract) visa à operação e manutenção da usina dentre dos melhores padrões internacionais, dando conforto às exigências estabelecidas pelos bancos credores do financiamento. Tecnicamente, a operação e manutenção da usina são regulamentadas por meio de um contrato de prestação de serviços firmado entre a Termopernambuco e a operadora espanhola de energia IBERDROLA Generación S.A.. Além disso, este contrato tem por objetivo o fornecimento pela operadora da assistência técnica necessária ao adequado funcionamento do empreendimento, incluindo serviços e reposição de peças e serviços de transferência de know-how, de modo a propiciar os melhores resultados na administração, gerência, operação e manutenção da usina e da geração de energia elétrica. Para tanto, o contrato se dividiu em duas partes, abrangendo um Período de Mobilização, que visa a seleção, recrutamento e treinamento de pessoal efetivo de O&M, e um Período de Operação, propriamente dito, onde são estabelecidos os Planos Anuais de O&M e a execução das atividades rotineiras. O operador é responsável pelas manutenções planejadas e não planejadas, esta última proveniente de interrupções forçadas de funcionamento, além de eventuais serviços extras, que devem ser alvo de negociações comerciais específicas entre as partes. Vis-à-vis as características especiais dos equipamentos componentes da usina (turbinas a gás e a vapor), todas as manutenções de grande porte necessárias durante a existência do empreendimento, a serem realizadas a cada 6 (seis) anos, foram contratadas diretamente com a General Electric, fornecedora destes equipamentos. 103 4.3.1.3 Acordo de Compra de Energia Por meio de acordos de compra de energia (Power Purchase Agreement PPA), a Termopernambuco firmou, pelo prazo de 20 anos, com as distribuidoras CELPE e COELBA, PPAs do tipo “take-or-pay”, o que pressupõe o pagamento de um valor mensal fixo, havendo ou não o consumo de energia por parte das compradoras. Os PPAs foram estruturados como contratos financeiros, cuja liquidação se dá de acordo com as diferenças observadas em relação aos preços praticados no Mercado Atacadista de Energia Elétrica (MAE), de modo a viabilizar, na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), a compra e venda de energia. Sendo o preço na CCEE maior do que o custo variável da usina, o Projeto produz energia para atendimento de suas obrigações com as distribuidoras. No caso de ser inferior ao custo variável de geração, a usina não gera energia e a compra mais barato no mercado de atacado, para atender os compromissos assumidos nos PPAs. Estes acordos representam a garantia de um fluxo financeiro estável de receita mínima para que a Termopernambuco possa fazer frente a seus compromissos com os financiadores. 4.3.1.4 Acordo de Fornecimento de Gás O gás natural utilizado como combustível para movimentação das turbinas, e consequente geração de energia, é fornecido pela Companhia Pernambucana de Gás – Copergás, por intermédio do gasoduto Pilar-Cabo. Esta empresa tem como controladoras a Gaspetro, subsidiária da Petrobrás responsável pela venda do gás às distribuidoras em cada estado, com 41,5%, a Gaspart, pertencente ao conglomerado japonês Mitsui & Co., Ltd., com 41,5%, e o Estado de Pernambuco, com 17%. A Copergás realizou a construção do gasoduto que interliga a usina à rede de distribuição da Petrobras. O fornecimento de gás previsto em contrato é de aproximadamente 2,15 milhões m3/dia. 104 As obrigações da Termopernambuco estabelecidas no Acordo de Compra de Gás (Gas Supply Agreement – GSA) incluem: (i) uma Cláusula “Take-or-Pay”, estipulando que a empresa pague à COPERGÁS um consumo mensal mínimo, referente a uma taxa de “commodity”, representando um pagamento total anual não inferior a 70% do volume contratado; (ii) uma Cláusula “Ship-or-Pay”, que representa a remuneração pelo transporte do gás, havendo ou não consumo pela Termopernambuco; e (iii) uma Cláusula “Deliver or Pay”, que estabelece o pagamento de uma determinada quantia mensal, havendo ou não a entrega do gás, para 100% do valor contratado. 4.3.1.5 Contrato de Arrendamento de Terreno Este contrato foi celebrado entre Termopernambuco e Suape – Complexo Industrial Portuário Governador Eraldo Gueiros com o objetivo de formalizar o aluguel do terreno necessário à implantação do projeto. A área possui aproximadamente 150.000 m2 e o prazo de aluguel é de 25 anos, renovável por igual período mediante acordo formal entre as partes. A princípio, o BID somente financia projetos que sejam implementados em área própria, tendo sido necessário, neste caso, um acordo de cessão condicional dos direitos decorrentes deste contrato. 4.3.1.6 Contrato de Uso do Sistema de Transmissão O Contrato de Uso do Sistema de Transmissão (CUST) foi assinado em julho de 2001 entre a Termopernambuco, o Operador Nacional do Sistema (ONS) e companhias transmissoras de energia, de modo a regular as relações de uso da rede básica de transmissão de energia elétrica pelo projeto. O gerenciamento da operação dos sistemas interligados de energia é responsabilidade do ONS, assim como a cobrança e liquidação financeira dos custos pela utilização dos sistemas e eventual execução das garantias, por conta e ordem das empresas transmissoras. 105 4.3.1.7 Contrato de Conexão ao Sistema de Transmissão O Contrato de Conexão ao Sistema de Transmissão, também chamado de CCT, foi firmado em setembro de 2001 entre a Termopernambuco e a Companhia Hidrelétrica do São Francisco – CHESF, subsidiária integral da Eletrobrás – empresa estatal holding do setor elétrico brasileiro, com a anuência do ONS. Este contrato permanecerá em vigor durante a existência da companhia, regulando os termos, condições e responsabilidades técnico-operacionais da conexão do empreendimento com a rede básica de energia elétrica. A tarifa de conexão é estabelecida por livre negociação entre as partes. 4.3.1.8 Contrato de Fornecimento de Água Bruta O objeto deste contrato, firmado em outubro de 2001 com a COMPESA – Companhia Pernambucana de Saneamento, é a venda de aproximadamente 20.000m3 mensais de água em estado bruto, ou seja, não submetida a nenhum tratamento de purificação, à Termopernambuco, que a utiliza para o resfriamento de suas turbinas e caldeiras. O prazo total de duração do contrato é de 20 anos. 4.3.2 Contratos Financeiros Os instrumentos financeiros principais foram contratados com o BID e o BNDES, de modo a suprir os 70% relativos aos capitais de terceiros. O primeiro possuía linhas de crédito e acesso a bancos internacionais parceiros em condições adequadas de preço e prazo às necessidades do projeto: carência de dois anos e repagamento do principal em onze anos, para a tranche A e nove anos para a tranche B. O segundo, com recursos especiais para usinas do PPT, prevê amortização em um período de onze anos, com carência de oito meses a partir da assinatura do contrato para pagamento do principal da dívida. 106 Recursos nacionais de longo prazo, nos mercados financeiros e de capitais nacional, naquela época, não passavam de quatro anos, o que já era considerado bastante arriscado, haja vista o histórico existente em linhas de crédito. Isto levou o projeto a buscar o financiamento da parte em reais no único banco brasileiro que o fornecia com características similares às dos mercados internacionais. Respondendo a algumas questões levantadas nos objetivos específicos deste trabalho, estabelecidas no item 1.3.2, observa-se que esta foi uma decisão tecnicamente acertada dos sponsors do empreendimento, mas que trouxe, pelo lado prático, como será visto mais adiante, uma série de transtornos ao equilíbrio econômico-financeiro do projeto. 4.3.2.1 Contrato de Financiamento com o BID Após alguns meses de negociação, a Termopernambuco S.A. contratou com o BID, em 19 de junho de 2002, um financiamento internacional no valor global de US$ 192,4 milhões, sendo US$ 42,4 milhões com recursos diretamente fornecidos pelo BID (tranche A) e US$ 150 milhões provenientes de um consórcio de bancos estrangeiros liderados pelo banco espanhol BBVA (tranche B). O contrato de financiamento firmado é regido pela Lei de Nova York. Durante 11 meses, de agosto de 2002 até junho de 2003, o BID realizou desembolsos de modo a atender as necessidades financeiras do Projeto. No entanto, em julho de 2003, os mesmos foram suspensos, devido a não aprovação pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) dos primeiros aditamentos, ocorridos em junho de 2002, aos PPAs celebrados entre a Termopernambuco e as distribuidoras Coelba e Celpe. Tais alterações diziam respeito à inclusão da térmica no PPT e a mudanças ocorridas na legislação setorial de energia, a fim de viabilizar o financiamento externo do projeto. Deste modo, em julho de 2005, houve o aditamento do contrato, de forma a refletir os ajustes implementados, e, então, os desembolsos foram retomados. 107 Com o fito de proteger seus direitos contratuais, o BID estabeleceu uma série de covenants a serem observados pelo financiado, dentre os quais se destacam: (i) a necessidade de obtenção de autorização do BID para realizar qualquer alteração de estrutura societária e/ou cláusulas estatutárias; (ii) a autorização expressa do BID para tomada de novos empréstimos; (iii) a obrigatoriedade de manutenção da relação debt/equity (relação entre a dívida e o capital próprio) em 70%/30%; (iv) as restrições a venda, compra ou dação em garantia de qualquer ativo; (v) a obrigação de contratação de todos os seguros necessários à proteção do financiamento; (vi) a restrição para pagamento de benefícios (dividendos e/ou juros sobre o capital próprio) aos acionistas controladores; e (vii) a obrigatoriedade de apresentação periódica de demonstrações financeiras auditadas por companhias de primeira linha. Adicionalmente, este contrato prevê que a falta de pagamento de qualquer parcela da dívida – principal ou juros, a rescisão de contratos afetos à operacionalidade do projeto, a não obtenção das autorizações governamentais necessárias, a interrupção imotivada das atividades operacionais, a decretação judicial de falência/insolvência, são eventos de inadimplemento e poderiam, a critério do BID, ensejar a rescisão do contrato, declaração de vencimento antecipado e execução das garantias oferecidas. Em princípio, pela quantidade de condicionantes, este Contrato de Financiamento com o BID poderia ser visto como um contrato draconiano, mas deve ser percebido como proteção aos capitais emprestados, haja vista o descompasso notado à época em relação ao andamento das negociações com o BNDES, responsável por fornecer recursos em moeda nacional suficientes ao curso normal do projeto e consequente observância das premissas estabelecidas no caso-base. 4.3.2.2 Contrato de Emissão de Dívida Subordinada Em 06 de novembro de 2005, aproveitando-se da persistente queda da cotação do dólar americano no mercado cambial brasileiro, os gestores da Termopernambuco realizaram a emissão de uma dívida subordinada, via 108 debêntures, no mercado de capitais nacional, com o objetivo de liquidar sua dívida com o BID e, por conseguinte, se desvencilhar das restrições contratuais impostas pelo financiamento externo. Para tanto, foi celebrado entre o emissor (Termopernambuco) e os bancos intermediários (Banco do Brasil, Bradesco e Santander) um Contrato de Coordenação, Distribuição e Colocação Pública de debêntures do tipo simples, de espécie subordinada, não conversíveis em ações, sob o regime de Garantia Firme, ou seja, caso o mercado não absorvesse a totalidade dos papéis emitidos, os bancos coordenadores da operação se responsabilizariam pelo pagamento do valor restante à Termopernambuco, registrando os papéis em suas carteiras próprias. Com isso, foi realizada a distribuição pública de 45.000 debêntures no valor nominal de R$ 10.000,00 (dez mil reais) cada, em duas séries, totalizando um montante de R$ 450.000.000,00 (quatrocentos e cinquenta milhões de reais), coordenada pelos bancos intermediários. A primeira série possui vencimento em 06 de outubro de 2011, pagando uma remuneração de 108% a.a. da variação da taxa do Certificado de Depósito Interbancário (CDI), e a segunda em 06 de maio de 2013, com remuneração do CDI, mais um spread de 1,85% a.a.. Como característica comum a este tipo de dívida subordinada, foi dada aos debenturistas uma garantia fidejussória (fiança) da Neoenergia, controladora do projeto. Novamente, os sponsors do empreendimento tomaram uma decisão que pode ser considerada, para aquele momento, em linha com as necessidades de maximização de retorno do empreendimento, quando optaram por emitir dívida em moeda nacional, liquidando a dívida em moeda estrangeira, face à queda na cotação do dólar (vide gráfico 01). Com isto, aborda-se o último objetivo específico proposto no item 1.3.2. desta pesquisa. 109 4.3.2.3 Contrato de Financiamento com o BNDES Em 07 de fevereiro de 2001, ao mesmo tempo em que foram feitos os primeiros contatos com o BID, iniciaram-se as tratativas com o BNDES por meio do pedido de enquadramento do projeto. A partir daí, foram realizadas reuniões, visitas e apresentações, visando ao cumprimento dos trâmites específicos para efetivação da concessão de apoio financeiro. Durante um período bastante extenso, cumpriram-se vários requisitos técnico-operacionais e financeiros, a exemplo de enquadramento de materiais financiáveis e de adequação do quadro de usos e fontes. Somente no dia 04 de fevereiro de 2004, quase três anos depois, a Termopernambuco obteve a aprovação de um financiamento no valor de aproximadamente R$ 265 milhões (US$ 90 milhões), tendo sua controladora Neoenergia como fiadora e principal pagadora do empréstimo. Este tipo de garantia assessória descaracteriza, tecnicamente, o Project Finance “puro”. Contudo, estas foram as condições impostas à época para a liberação do financiamento. Apesar disso, no dia 28 de janeiro de 2004, a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL expediu a Resolução Nº. 40 que, levando em consideração os baixos níveis de armazenamento de água nas bacias hidrológicas da região nordeste e a capacidade de despacho de energia das termelétricas integrantes do PPT já existentes, impôs restrição de lastro físico de gás às geradoras de energia lá localizadas, inviabilizando o pleno funcionamento da usina Termopernambuco naquele momento e a consequente geração prevista de caixa para satisfação das obrigações financeiras. A par deste condicionante, o banco suspendeu, unilateralmente, a liberação dos recursos contratados. Posteriormente, a situação foi regularizada com o “Termo de Acordo de Recomposição de Lastro das Térmicas do PPT do Nordeste”, firmado, em 18 de novembro de 2004, entre a Petrobras e as usinas nordestinas incluídas no PPT. Isto posto, o Contrato de Empréstimo com o BNDES teve que ser aditado em junho de 2005, sendo o primeiro desembolso realizado efetivamente no mês de agosto seguinte, ou seja, quatro anos e sete meses após o primeiro contato. Durante todo este período, o projeto manteve-se em andamento graças a recursos próprios disponibilizados pelos sponsors, o que afetou as características do projeto-base e as taxas de retorno esperadas. 110 Dentre as várias obrigações de fazer e de não fazer impostas pelo contrato com o BNDES, destacam-se: (i) a não redução de capital sem prévia anuência do banco; (ii) a manutenção de dívida onerosa líquida inferior a 70% do valor do ativo total do projeto; (iii) a manutenção de regularidade operacional perante a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), a Companhia Pernambucana de Recursos Hídricos (CPRH) e ao Operador Nacional do Sistema (ONS); e, (iv) a não distribuição de dividendos aos acionistas acima do percentual mínimo legal obrigatório, no caso de não observância dos saldos mínimos previstos no contrato de financiamento. Neste último caso, o BNDES poderia, inclusive, efetuar a rescisão do contrato, declarando vencimento antecipado da totalidade, ou de parte, da dívida, com a execução das garantias oferecidas. Outra situação que poderia levar a tal atitude seria a declaração de vencimento antecipado do contrato de financiamento externo pelo BID. Contudo, esta é uma hipótese descartada, pelo fato deste financiamento ter sido substituído pela emissão de debêntures. 4.3.2.4 Contrato de Empréstimo Subordinado Este Contrato de Empréstimo, do tipo subordinado, ou seja, que não detém a preferência de recebimento em caso de insolvência do devedor, foi firmado, em junho de 2002, entre a Termopernambuco e suas controladoras Celpe e Neoenergia com o objetivo de suprir a insuficiência de capitais de terceiros, tendo em vista as dificuldades para conclusão das negociações do empréstimo do BNDES. Este contrato de empréstimo subordinado, regido pela lei do estado norteamericano de Nova York, fez parte das negociações com o BID para liberação da tranche internacional e garantir a exequibilidade do projeto. A partir do primeiro desembolso da tranche nacional contratada com o BNDES, a obrigação de Neoenergia e Celpe realizarem aportes financeiros cessou. Neste momento, a Termopernambuco saldou, com os recursos recebidos, sua dívida com a distribuidora do grupo. 111 Conforme abordado no item 4.1, este é um tipo de contrato fora dos padrões da estrutura convencional de um Project Finance, haja vista a coobrigação dos controladores no suprimento de fundos necessários à cobertura da ausência de um dos financiadores. Isto se traduziu na incerteza do atingimento das taxas de retorno estimadas, provocando um aumento dos custos do empreendimento com a consequente redução do retorno dos sponsors. Contratos como este vão contra o modelo teórico do Project Finance, que pressupõe que somente o empreendimento seja responsável pela garantia do fluxo de caixa, que, contratualmente, deve honrar as obrigações contraídas para sua execução. 4.3.3 Contratos de Garantia Pouco antes da liberação dos recursos do BID, foram firmados, no início de junho de 2002, vários contratos adicionais, de modo a fornecer mais garantias aos credores internacionais, haja vista o não ingresso dos recursos do BNDES no projeto até aquela data. Alguns instrumentos, como citado mais adiante, ficaram submetidos à legislação brasileira e outros à do estado norte-americano de Nova York. No mês de julho de 2005, quando da assinatura do contrato de financiamento com o banco brasileiro, todos os demais contratos tiveram que ser substituídos ou aditados, visando à inclusão do BNDES como beneficiário do security package, em igualdade de condições com o BID. Na mesma época, estes bancos firmaram um documento chamado de Acordo entre Credores (Intercreditor’s Agreement), cujo objetivo era regulamentar suas posições como credores da Termopernambuco e compartilhar as garantias oferecidas pelo projeto e pela holding. 112 4.3.3.1 Acordo de Contribuição de Capital Com o objetivo de regular o mecanismo de aportes obrigatórios de capital na Termopernambuco, até que o BNDES liberasse seu financiamento, foi firmado, em 2002, um Acordo de Contribuição de Capital, ou Equity Contribution Agreement, em sua versão na língua inglesa, entre Termopernambuco, CELPE, Neoenergia, BID e Banco do Brasil S.A., este último na figura de administrador das contas bancárias da Termopernambuco. A preservação da relação debt/equity na proporção 70%:30%, conforme estabelecido no Contrato de Empréstimo do BID, foi o principal motivador deste contrato. Estavam cobertos por esta obrigação, a título de dívida subordinada, todos os pagamentos necessários para fazer frente a uma possível insuficiência financeira da Termopernambuco. O aditamento a este contrato ocorreu em julho de 2005 para inclusão do BNDES como beneficiário, a fim de que os desembolsos deste pudessem ocorrer a partir do mês de agosto, como efetivamente aconteceu. Por outro lado, desvinculouse a distribuidora pernambucana de energia, que deixou de ser parte no mesmo, mediante a liquidação do Contrato de Empréstimo Subordinado da CELPE, citado no item 4.3.2.4. Este contrato de contribuição de capital era regido pela Lei de Nova York. 4.3.3.2 Acordo de Suporte de Acionistas Por este acordo, Celpe e Neoenergia se comprometiam a bancar os custos relacionados a possíveis danos oriundos de qualquer atraso na construção e/ou de problemas de desempenho da usina, que viessem a impedir e realização plena do fluxo de caixa projetado. Para isto, em junho de 2002, Termopernambuco, CELPE, Neoenergia e BID, assinaram o Acordo de Suporte de Acionistas (Sponsor Support Agreement), dando as garantias exigidas pelo BID para liberação de recursos. 113 No mês de julho de 2005, este acordo teve que ser aditado para inclusão do BNDES como beneficiário, bem como para excluir a CELPE do mesmo, mediante a quitação do empréstimo subordinado com esta, o que ocorreu em agosto de 2005, com a liberação da 1ª parcela de recursos da tranche nacional. Este contrato também era regido pela Lei de Nova York. 4.3.3.3 Acordo de Retenção de Ações Fazendo parte do mesmo pacote de garantias, Neoenergia, CELPE, Termopernambuco e BID assinaram o Acordo de Retenção de Ações (Share Retention Agreement), estabelecendo que até a data de encerramento do projeto a holding não poderia alienar sua participação acionária, direta ou indireta, na distribuidora de energia pernambucana ou no projeto. Como única exceção, foi permitida a transferência das ações de emissão da Termopernambuco detidas pela CELPE, em cumprimento a determinação da ANEEL, no âmbito do programa de desverticalização das empresas energéticas, dividindo-as em empresas independentes de geração, transmissão, comercialização e distribuição de energia elétrica. Baseada neste acordo, a aprovação pela Neoenergia da emissão de novas ações ou valores mobiliários, que viessem a outorgar a seu titular o direito de subscrever ou adquirir ações de emissão da Termopernambuco, necessitaria de prévia anuência dos bancos credores. Atualmente, pela inclusão do BNDES e liquidação do contrato com o BID, as referidas emissões e/ou qualquer alteração do estatuto social da Termopernambuco terão que contar com o aval do BNDES. 4.3.3.4 Contrato de Penhor de Ações e dos Direitos de Crédito Neste contrato ficou estabelecido que a Neoenergia cederia aos bancos credores, sob a forma de penhor: (i) as ações existentes da Termopernambuco, bem 114 como as provenientes de futuras aquisições, de sua titularidade; (ii) seus direitos de crédito contra a Termopernambuco, relativos aos empréstimos subordinados;(iii) todos os seus direitos relacionados a dividendos e/ou juros sobre o capital próprio; e (iv) todos os direitos e rendimentos inerentes às ações dadas em garantia. Firmado entre a Termopernambuco, a Neoenergia, a CELPE e o BID, em junho de 2002, foi substituído por outro, assinado em julho de 2005, de modo que o BNDES figurasse como beneficiário das mesmas garantias usufruídas pelo BID. Para os efeitos legais, este contrato ficou vinculado à legislação brasileira. 4.3.3.5 Contrato de Penhor de Contas Por intermédio deste contrato, Termopernambuco e Neoenergia deram em penhor todos os direitos de crédito contra o Banco do Brasil, administrador das contas correntes, relativos aos recursos depositados, incluindo juros e valores pagos a qualquer título, e, também, todos os certificados e valores mobiliários porventura adquiridos e os direitos de créditos decorrentes de investimentos permitidos, com recursos depositados nas contas correntes. Assim como os contratos anteriores, este instrumento, assinado inicialmente entre a Termopernambuco, a Neoenergia, a CELPE, o Banco do Brasil S.A. e o BID, em 2002, foi substituído por um novo, em julho de 2005, passando o BNDES a compartilhar das mesmas garantias oferecidas ao BID. Este contrato também é regido pela Lei Brasileira. 4.3.3.6 Contrato de Penhor de Ativos Por este Contrato de Penhor de Ativos, com foro nacional, firmado na mesma época que o anterior entre a Termopernambuco e o BID, e também substituído por um novo para inclusão do BNDES, foram dados em penhor pelo projeto: (i) todos os 115 equipamentos e ativos fixos existentes, assim como aqueles bens móveis que futuramente viessem a fazer parte da usina; (ii) todos os bens compreendidos por estoques, peças de reposição, suprimentos e quaisquer bens tangíveis de sua propriedade; e (iii) os direitos referentes às apólices de seguro contratadas. 4.3.3.7 Contrato de Cessão Condicional do Contrato de Arrendamento Subscrito em 2002 entre a Termopernambuco e o BID, foi substituído por outro celebrado em 2005, onde o BNDES passou a figurar como beneficiário em igualdade de condições com o BID. Este contrato estabelecia a cessão aos bancos credores de todos os direitos e obrigações, presentes e futuros, decorrentes do Contrato de Arrendamento do terreno para implantação da usina. A cessão deste contrato tinha sua eficácia condicionada à ocorrência de determinadas condições suspensivas, dentre as quais se destacam: (i) a celebração de um contrato com um terceiro operador capaz de assegurar a operação adequada do projeto; e, (ii) a cessão e transferência pelo BID a um novo operador de seus direitos decorrentes do Contrato de Cessão Condicional de Contrato de Arrendamento e do Contrato de Arrendamento. Para garantia da plena exequibilidade deste instrumento, SUAPE firmou, em 2002, um termo de anuência concordando com a cessão condicional do contrato de arrendamento. Este contrato é regido pela Lei Brasileira. 4.3.3.8 Contrato de Penhor de Direitos Emergentes da Autorização Por intermédio deste instrumento, também regulado pela Legislação Brasileira, a Termopernambuco ofereceu em penhor todos os seus direitos emergentes da condição de Produtor Independente de Energia – PIE, onde se inclui toda a energia elétrica gerada e, consequentemente, os créditos provenientes de 116 sua venda, bem como quaisquer valores que o projeto venha a receber da ANEEL a titulo de indenização por um eventual cancelamento da condição de produtor independente. Igualmente firmado em 2002 com o BID, foi aditado em 2005, para inclusão do BNDES como beneficiário. 4.3.3.9 Contrato de Cessão Condicional de Contratos e Penhor de Direitos de Crédito Do mesmo modo que os demais contratos, este foi assinado, em 2002, com o BID e substituído, em 2005, por um novo, que incluiu o BNDES. Por intermédio deste instrumento, a Termopernambuco cedia aos bancos credores todos os direitos e obrigações, presentes e futuras, decorrentes dos contratos operacionais do projeto (EPC, PPA, GSA, O&M, CCT e CUST). Possíveis pagamentos ao projeto, decorrentes de perdas e danos com a rescisão dos contratos cedidos, também foram dados em penhor. Para tanto, a Termopernambuco teve que notificar suas contrapartes, a fim de obter, quando necessário, anuência sobre a cessão de cada contrato e garantia cedidos e, também, sobre o penhor dos direitos de créditos, objeto do Contrato de Cessão Condicional de Contratos e Penhor de Direitos de Crédito. Este documento ficou submetido à Lei Brasileira. 117 4.4 OBSERVAÇÕES SOBRE A ESTRUTURA CONTRATUAL Como se pôde observar na seção anterior, o atraso na liberação do empréstimo pelo BNDES ocasionou um acréscimo de custos jurídico-administrativos relacionados à confecção, efetivamente, de vários contratos de garantia, bem como do aditamento posterior daqueles já existentes. Há que se ressaltar que sua elaboração tomou um tempo bastante significativo na execução do Projeto Termopernambuco. Foram aproximadamente dois anos de negociações entre os financial advisors e todas as contrapartes até a assinatura somente dos contratos de financiamento externos. Após a conclusão da parte internacional, foram mais dois anos para o fechamento das negociações com o BNDES e assinatura de todos os contratos, incluindo o aditamento daqueles pré-existentes por conta do financiamento com o BID. Este estudo trouxe à cena a importância da estruturação jurídica de contratos como suporte à consecução de empreendimentos na modalidade Project Finance. É inquestionável seu valor para o conforto não só dos financiadores, com também das demais partes envolvidas na operação, como construtores, compradores da energia gerada, seguradores, etc.. A linha do tempo dá uma visão perspectiva das principais etapas do projeto: Figura 09 – Linha do Tempo do projeto Termopernambuco 118 4.5 IMPLICAÇÕES ECONÔMICO-FINANCEIRAS Além de todas as demandas contratuais anteriormente relatadas, estes movimentos, que não faziam parte do business plan original e do cronograma inicial do projeto, proporcionaram um desequilíbrio na relação debt/equity, alterando sua taxa de retorno prevista. No que tange aos custos de capital de um projeto, eles se dividem em custo do capital próprio (Re ou CCP) e custo do capital de terceiros (Rd ou CCT). O primeiro diz respeito à taxa de retorno exigida pelos investidores para aplicação de seus recursos e o segundo, à taxa dos empréstimos contraídos junto aos agentes financiadores do projeto. Empreendimentos de grande porte tendem a utilizar um mix de fontes de recursos; parte proveniente do capital do próprio acionista, parte obtida com bancos. A proporção adequada das participações dependerá dos custos, tanto de oportunidade do capital próprio, quanto dos de financiamento. Segundo Ross, Westerfield, Jordan (2000, p.345), a questão da estrutura de capital é tratada pelo que se chama de “Teoria da Pizza”. Esta teoria, chamada de Proposição I de Modigliani e Miller (M&M), sem considerar os impostos, estabelece que o modelo da estrutura de capital pode se dar na relação 40% de ações (capital próprio) e 60% de dívida (capital de terceiros) ou 60% de ações e 40% de dívida, sem que haja alteração do tamanho da pizza, independentemente da forma como os acionistas a repartam (o tamanho da pizza – ou seja, o valor da empresa – será sempre de 100%). Em outras palavras, alterar a estrutura de capital da companhia não muda seu valor total, porém, há impactos importantes nos custos dos capitais próprios e de terceiros. Considerando o cálculo do custo médio ponderado de capital, ainda sem levar em conta os impostos, conforme abaixo, tem-se: WACC = (E/V) x Re + (D/V) x Rd Rearranjando seus termos, chega-se à seguinte equação: Re = WACC + (WACC – Rd) x (D/E) 119 Portanto, o custo do capital próprio (Re) depende de três variáveis: (i) da taxa de retorno sobre os ativos da empresa (WACC), (ii) do custo do capital de terceiros (Rd) e, (iii) da relação entre dívidas e capital próprio (D/E). Esta foi a Proposição II de M&M, que diz que o custo do capital próprio de uma empresa é linearmente dependente de sua estrutura de capital. Além disso, quando se incluem os impostos decorrentes da atividade comercial (imposto de renda e contribuição social sobre o lucro líquido), o custo do capital de terceiros se beneficia do pagamento de juros, o que reduz a base de cálculo do IR, e o custo médio ponderado de capital fica assim representado: CMPC = CCP x % CP + CCT x % CT x (1 – T), onde, % CP = participação do capital próprio; % CT = participação do capital de terceiros; (1 – T) = benefício fiscal da dívida; T = alíquota de impostos. Em Project Finance, esta relação de participação, adotada pela grande maioria dos bancos de financiamento, a exemplo de BID e BNDES, é, usualmente, de 30% de capital próprio e de 70% de capital de terceiros. Os projetos, por ainda não serem ativos operacionais, passam a contar, desta forma, com um bom índice de alavancagem e, como contrapartida aos riscos assumidos pelos emprestadores, apresentam um nível de presença de capital dos shareholders condizente com a convicção destes na exequibilidade do empreendimento. É importante ressaltar que à medida que o nível de alavancagem diminui, o custo médio ponderado de capital aumenta, pois se reduz a parcela da equação em que há benefício fiscal da dívida e se aumenta aquela que não o tem. O quadro abaixo exemplifica esta assertiva: Supondo os níveis de alavancagem variando de 0% (sem alavancagem) a 100% (alavancagem total), o custo do capital próprio de 12% (retorno exigido pelos 120 acionistas) e o custo de capital de terceiros de 9% (custo da dívida)6, temos os seguintes resultados para o custo médio ponderado de capital: Tabela 07 – Custo médio ponderado de capital CCP 12% 12% 12% 12% 12% 12% 12% 12% 12% 12% 12% CCT 9% 9% 9% 9% 9% 9% 9% 9% 9% 9% 9% T 34% 34% 34% 34% 34% 34% 34% 34% 34% 34% 34% D/(D+E) 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% CMPC 12,00% 11,39% 10,79% 10,18% 9,58% 8,97% 8,36% 7,76% 7,15% 6,55% 5,94% A alíquota de impostos (T) é composta por: - Imposto de Renda (IR) – 25% sobre o lucro real apurado; e - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) – 9%. O gráfico a seguir ilustra o comportamento das taxas de descontos resultantes dos níveis de alavancagem aplicados: CMPC 4,00% 5, 94 % 7, 15 % 7, 76 % 6,00% 6, 55 % 8, 36 % 9, 58 % 10 ,7 9 % 8, 97 % 8,00% 10 ,1 8% 12 ,0 0 ,3 9% 10,00% 11 Taxa de Desconto 12,00% % 14,00% 2,00% 0,00% 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% Alavancagem Gráfico 03 – CMPC Os níveis de alavancagem são meramente ilustrativos. Em casos reais, dificilmente se teriam as hipóteses extremas de alavancagem (0% e 100%). Os custos de capital próprio e de terceiros situamse próximos àqueles efetivamente implementados no caso-base. O CMPC a 70% foi o adotado. 6 121 À medida que a taxa de desconto, representada pelo CMPC, diminui, maior fica o valor do projeto, pelo fato do custo de capital apresentar uma relação inversamente proporcional ao valor presente na função, como visto na fórmula abaixo. Para o caso de projetos financiados por fontes de recursos próprios e de terceiros, o CMPC representa a taxa pela qual se desconta o fluxo de caixa livre projetado do empreendimento para calcular o valor presente do negócio. FCL t n VPL = ∑ t=1 (1 + CMPC) t Trazendo estas considerações para o caso em estudo, sem considerar os efeitos da inflação, ou seja, em valores reais, têm-se as seguintes situações: - Na projeção inicial do caso-base, a relação entre capitais está demonstrada na tabela a seguir: Tabela 08 – Usos e Fontes do Projeto - com BNDES Usos Obras, Instalações e Equipamentos Total % Fontes 403 100% Capital Próprio % 121 30% Capital de Terceiros BNDES 90 22% BID 192 48% 403 100% 403 100% Valores em US$MM Neste sentido, o cálculo do CMPC fica assim representado: CMPC = 12% x 30% + 9% x 70% x (1 – 34%) Donde, CMPC = 7,76% - Como conseqüência do atraso da entrada dos recursos do BNDES, a relação de capitais foi, por um período de tempo, alterada para: 122 Tabela 09 – Usos e Fontes do Projeto – sem BNDES Usos Obras, Instalações e Equipamentos Total % Fontes 403 100% Capital Próprio % 211 52% Capital de Terceiros BNDES 0 0% BID 192 48% 403 100% 403 100% Valores em US$MM O novo CMPC fica: CMPC = 12% x 52% + 9% x 48% x (1 – 34%) Donde, CMPC = 9,11% Portanto, houve um incremento de 17,40% na taxa de desconto do projeto, o que, consequentemente, diminui seu valor presente. Deste modo, comprova-se o impacto financeiro negativo provocado pelo atraso na liberação dos recursos do BNDES para o projeto Termopernambuco. 123 5 CONCLUSÃO 5.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE A PESQUISA A estruturação de empreendimentos mediante a aplicação da técnica do Project Finance pode transformar-se numa ferramenta capaz de auferir múltiplos benefícios, desde que haja um cenário adequado para sua implementação. Para isso, é de suma importância avaliar a relevância do projeto para a economia do país. No caso em questão, a execução do Projeto Termopernambuco, uma usina termelétrica com 532 MW de potência instalada, traduziu-se na necessidade pública de aumentar a capacidade instalada de energia elétrica no Brasil por meio de energias alternativas, especialmente gás natural, em virtude da ênfase governamental em importar este insumo por intermédio do Gasoduto BrasilBolívia, construído especificamente para este fim. A escassez de chuvas entre os anos de 1997 e 1999, fez com que os reservatórios da usinas hidrelétricas, principalmente nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, chegassem a níveis críticos. Isto, somado à falta de investimentos públicos em geração e distribuição de energia elétrica ao longo dos anos, tornava o quadro alarmante. Para tentar solucionar os efeitos dos blecautes que atingiam o País, o Governo Federal estabeleceu o Programa Prioritário de Termeletricidade (PPT), por meio do Decreto 3.371, de 24.02.2000, incluindo a Termopernambuco no rol de usinas elegíveis para obtenção de apoio especial de financiamento pelo BNDES, além da garantia do fornecimento de gás natural e manutenção das tarifas remuneratórias pelo prazo de 20 anos. Deste modo, com a garantia de suporte federal baseado em legislação específica, o capital privado foi estimulado a assumir projetos que até então não lhes eram atraentes, do ponto de vista econômicofinanceiro. Assim, responde-se ao questionamento da relevância do investimento para a economia nacional. 124 O ponto seguinte diz respeito à capacidade pública de executar gastos para atendimento das necessidades de geração de energia no país. Apesar de o Brasil possuir um histórico de forte geração por energia hidrelétrica, suprindo aproximadamente 90% de suas necessidades, fica evidenciado, pela elaboração de um plano que prioriza um programa emergencial de energia termelétrica, que não houve planejamento de longo prazo, tampouco recursos públicos disponíveis, para fazer com que o crescimento da demanda por energia fosse acompanhado por um aumento de oferta. A falta de capacidade financeira do Governo para realizar investimentos relevantes no setor elétrico engessou o crescimento do PIB do Brasil durante os anos 90, que cresceu em média 2% ao ano (IBGE, 2009), bem aquém do esperado. No que tange a parcerias bem sucedidas entre membros financiadores, em especial o BNDES e o BID, há um histórico positivo. Estes bancos são responsáveis pelo financiamento de vários empreendimentos em território nacional, destacando-se o setor de infraestrutura. A título de ilustração, a tabela abaixo enumera alguns projetos que tiveram apoio financeiro destes bancos: Tabela 10 - Empreendimentos com Financiamento Conjunto entre BNDES e BID Empreendimento Setor Capital Próprio BNDES BID (A Loan) BID (B Loan) Outros UHE Itá Energia 250,0 375,0 75,0 300,0 0,0 Via Lagos Rodovias 26,0 19,5 18,0 19,0 0,0 AutoBan Rodovias 233,8 115,2 50,0 48,0 71,1 UHE Campos Novos Energia 181,4 267,5 75,0 0,0 0,0 UHE Cana Brava Energia 127,8 138,0 75,0 82,5 0,0 UTE Termope Energia 121,1 90,0 42,4 150,0 0,0 Fonte: Velluttini, 2006 Total 1.000,0 82,5 518,1 523,9 423,3 403,5 O conflito de interesses entre financiadores pode surgir à medida que suas regras de financiamento não são flexíveis o suficiente para amparar múltiplas fontes de recursos, com prazos e moedas diferentes. Para minimizar estes problemas há o Intercreditor’s Agreement, documento que visa a estabelecer regras claras de repartição de garantias, estipulando direitos e deveres para as partes, de modo a equalizar as possíveis diferenças entre suas políticas de crédito. Contudo, alguns fatores externos podem influenciar negativamente as parcerias de financiamento. Como exemplo, pode ocorrer casos em que entes estatais, por questões de cunho político, terminem por não aderir ao cronograma prévio de liberação de recursos, 125 ocasionando problemas para a execução do projeto. Quando isto ocorre, normalmente, o lado que primeiro financiar o projeto vai exigir dos patrocinadores o aporte de recursos, no lugar daquele que não compareceu na data aprazada. Isto onera o empreendimento, causando desequilíbrio nos retornos esperados pelo projeto-base e reduzindo a rentabilidade dos acionistas. Segundo Vellutini (2006, p.99), por inferência do autor7 e baseado nos dados expostos, o empréstimo de longo prazo à Termopernambuco compreendia um financiamento do BID (A Loan, no valor de US$42,4 milhões e B Loan, no valor de US$150 milhões, assinados em 19 de junho de 2002) e um do BNDES (no valor de US$90 milhões). Em sua nota de rodapé, fica explícito que o BNDES não aportou sua parte quando da liberação dos recursos do BID, provocando a necessidade de um empréstimo subordinado pelos acionistas, neste caso, capital próprio, de custo mais alto do que o de terceiros, para cobertura da ausência daquele banco estatal brasileiro, que encontrava-se em situação de espera pelas possíveis mudanças políticas a serem implementadas pela eleição de 2002 para a Presidência da República8. Isto ocasionou um desequilíbrio na relação debt/equity (capital de terceiros versus capital próprio) projetada no caso-base, alterando as taxas de retorno dos acionistas pelo incremento de custos proporcionados por uma nova leva de documentos jurídicos adicionais para regular as novas relações entre financiadores e financiado e, como citado anteriormente, pelo aporte de recursos próprios, de custo mais elevado que os recursos de terceiros. Finalmente, em 04 de fevereiro de 2004, quando da liberação do empréstimo do BNDES, no montante de aproximadamente R$265 milhões (equivalentes a US$90 milhões), restabeleceu-se o equilíbrio econômico-financeiro do projeto. Contudo, para efeito da remuneração dos capitais investidos, esta já havia sido distorcida em relação ao planejamento inicial de longo prazo. 7 O autor desta dissertação é conhecedor dos detalhes estruturais do Projeto Termopernambuco e, portanto, reconhece ser de sua inteira responsabilidade a inferência realizada em leitura de Vellutini (2006, p.99), o qual se absteve de nomear os empreendimentos sobre os quais dissertou em seu livro por questões próprias. 8 Também inferência do autor desta dissertação. 126 Acredita-se, portanto, que o objetivo deste trabalho, de apresentar o contexto que abrange o desenvolvimento de projetos na modalidade Project Finance e todas as dificuldades e benefícios de sua adoção, foi alcançado. Sua complexidade estrutural, com grande quantidade de contratos e necessidade de compartilhamento de todos os riscos envolvidos, torna o Project Finance um compensador desafio àqueles que optam por um modelo moderno de estruturação financeira. Apesar dos benefícios teoricamente existentes nesta modalidade, características peculiares do cenário político-econômico brasileiro podem interpor obstáculos que, financeiramente, venham a alterar as projeções básicas dos projetos. O estudo do Caso Termopernambuco pôde ilustrar, de forma bastante didática, como o Project Finance pode auxiliar na execução de todo tipo de empreendimento, em especial aqueles ligados à infra-estrutura em geral. Também realçou as dificuldades que são encontradas na consecução de projetos com múltiplos intervenientes. Os organismos externos e internos encontram-se aptos a prover financiamentos nesta modalidade, sendo necessário um esforço de unicidade na consecução dos tratamentos individuais para obtenção de linhas de financiamento adequadas, em volumes, taxas e prazos, para empreitadas deste tipo. Com a experiência adquirida ao longo dos últimos 20 anos, o BNDES, como principal agente de fomento do governo federal, assim como outros bancos públicos e privados, já assimilaram conceitualmente as características do Project Finance e podem dar total apoio financeiro a estruturações do gênero. Por isso, crê-se que este modelo de financiamento possa ser utilizado de forma bastante intensa por investidores brasileiros e estrangeiros, de modo a proporcionar condições de desenvolvimento da infra-estrutura nacional, viabilizando a construção de usinas de energia, estradas, portos, aeroportos e, assim, permitindo a continuidade do crescimento do país. 127 5.2 OBSERVAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES Somadas todas as variáveis anteriormente descritas, resta a conclusão de que o empreendimento teve um sobrecusto imposto pelo atraso na liberação de recursos do BNDES, o que ocasionou a necessidade de uma série de garantias adicionais, que apresentaram custos financeiros excedentes aos projetados inicialmente, por conta de novos contratos jurídicos, custos com advogados nacionais e internacionais e de aporte de recursos não previstos pelos acionistas. A melhor forma de evitar em outros empreendimentos os transtornos ocorridos na estruturação do Projeto Termopernambuco é alinhar as fontes de financiamento externa e interna num mesmo pacote financeiro, com direitos e obrigações idênticos, e com mesmo timing de desembolso, de modo a não onerar os percentuais programados de capital próprio e de terceiros estabelecidos no casobase da operação. As condições de cenário macroeconômico e político estáveis são fundamentais para a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro de qualquer projeto financiado na modalidade Project Finance. Ao vislumbre deste cenário, resta a seguinte resposta à pergunta enunciada no problema da pesquisa: – Os custos de estruturação necessários para harmonizar todos os interesses de financiadores não tiram a atratividade do projeto? – Considerando todos os problemas apresentados no projeto em questão, os custos incorridos para levá-lo à sua conclusão foram elevados em relação ao caso-base, diminuindo a rentabilidade esperada pelos acionistas e reduzindo, assim, sua atratividade. A partir do que foi contextualizado, a busca de soluções criativas para o financiamento de projetos, visando, principalmente, respostas às situações como as elencadas neste trabalho, abre um novo horizonte de pesquisas sobre o tema, e que deve ser aprofundado em estudos posteriores por quem aprecia a técnica do Project Finance. 128 REFERÊNCIAS BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO - BID. Disponível em: http://www.bid.org. Acesso em: 20 ago. 2010. BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL - BNDES. Disponível em: http://www.bndes.gov.br. Acessos em diversas datas. BONOMI, Cláudio Augusto; MALVESSI, Oscar. Project Finance no Brasil: Fundamentos e Estudo de Casos / 2ª. ed. São Paulo: Atlas, 2004. BORDEAUX-RÊGO, Ricardo, et al. Viabilidade Econômico-Financeira de Projetos / 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2008. BORGES, Luiz F. X. Project Finance e Infra-estrutura: Descrição e Críticas. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, 1998. ______ e FARIA, Viviana C.. Project Finance: Considerações sobre a aplicação em infra-estrutura no Brasil. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, 2002. COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS http://www.cvm.gov.br. Acessos em diversas datas. – CVM. Disponível em: DYMOND, Christopher; PINEDA, Ilse. Brazilian Power Project Finance. Journal of Project Finance, v.7, no.1, Spring 2001, p. 29 – 34. ENEI, José Virgílio Lopes. Project Finance: Financiamento com foco em empreendimentos (parcerias público-privadas, leverage buy-outs e outras figuras afins). São Paulo: Saraiva, 2007. FILHA, Dulce C. M.; CASTRO, Marcial P. S.. Project Finance para a Indústria: Estruturação de Financiamento. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, 2000. FINNERTY, John D.. Project Finance: Engenharia Financeira baseada em ativos. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1999. 129 FITCHRATINGS. Disponível em: http://www.fitchratings.com.br. Acesso em: 09 out. 2009. FORTUNA, Eduardo; Mercado Financeiro: produtos e serviços / 15ª ed. Rio de Janeiro: Qualitymark Ed., 2002. GIL, Antonio C.; Como Elaborar Projetos de Pesquisa / 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2009. GUEDES, V.L.S.; BORSCHIVER, S. Bibliometria: uma ferramenta estatística para a gestão da informação e do conhecimento em sistemas de informação, de comunicação e de avalação científica e tecnológica. In: ENCONTRO NACIONAL DE CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 6., 2005, Salvador. Anais... Salvador, 2005. p. 1-18. HOWCROFT, Barry; FADHLEY, Sabah. Project Finance: a credit strategy based on contractual linkages. The Service Industries Journal, v. 18, n. 2, p. 90-111, abr. 1998. JAPAN BANK FOR INTERNATIONAL COOPERATION - JBIC. Disponível em: http://www.jbic.com.br. Acesso em: 23 set. 2009. MARCONI, Marina de A.; LAKATOS, Eva M.; Técnicas de Pesquisa / 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2009. MOODY’S INVESTORS SERVICE. Disponível em: http://www.moodys.com.br. Acesso em: 09 out. 2009. MULTILATERAL INVESTMENT GUARANTEE http://www.miga.org. Acesso em: 27 set. 2009 AGENCY. Disponível em: NEVITT, Peter K.; Fabozzi, Frank J..Project Financing / 7ª ed. London: Euromoney Books, 2000. OLIVEIRA, Álvaro Eduardo dos Anjos. Plano de Negócios: Elaboração, Execução e Controle. 2004. 109f. Dissertação (Mestrado em Sistemas de Gestão). Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2004. OLIVEIRA, Gilson A.; PACHECO, Marcelo M.. Mercado Financeiro. São Paulo: Editora Fundamento Educacional, 2005. 130 ROSS, S.; WESTERFIELD, R.; JAFFE, J. Administração Financeira. São Paulo: Atlas, 1995. ROSS, S.; WESTERFIELD, R.; JORDAN, B. Princípios de Administração Financeira. São Paulo: Atlas, 2000. STANDARD & POOR’S. Disponível em: http://www2.standardandpoors.com. Acesso em: 09 out. 2009 VELLUTINI, Roberto. Estruturas de Project Finance em projetos privados: fundamentos e estudos de casos no setor elétrico do Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier; Washington, Estados Unidos: Banco Interamericano de Desenvolvimento, 2006. SORGE, Marco; GADANECZ, Blaise. The term structure of credit spreads in Project Finance. International Journal of Finance & Economics, v. 13, n 1, p. 68-81, 2008. 131 GLOSSÁRIO Acionista (shareholder)/patrocinador (sponsor) – é o agente investidor que busca retorno ou possui interesse estratégico no projeto (p. ex.: uma empresa de distribuição de energia elétrica pode investir numa construção de usina hidrelétrica/termelétrica para que esta lhe forneça a energia a ser vendida). O acionista pode ser o único patrocinador do projeto ou pode formar um consórcio com outros agentes (construtores, operadores, fornecedores e compradores). Agente fiduciário (trustee) – é o responsável nomeado para administração ou custódia de bens de terceiros. O agente fiduciário pode responsabilizar-se pela gestão do fluxo de caixa, controlando a realização de despesas e receitas do projeto. Alavancagem – para efeitos deste estudo, a alavancagem pode ser financeira, quando recursos de terceiros (empréstimos e financiamentos) de longo prazo produzem efeitos positivos sobre a taxa de retorno do empreendimento, ou operacional. Financeiramente, quanto maior o grau de endividamento da empresa, maior a alavancagem. Operacionalmente, significa que um aumento de x% nas vendas proporciona um crescimento de “n” vezes x% no lucro bruto da empresa. All risk insurance - trata-se de apólice de seguro que cobre o risco de toda e qualquer perda, exceto aquelas especificamente excluídas. É comumente utilizada em obras de grande porte para cobertura de riscos de engenharia. Assessor jurídico (legal advisor) – presta consultoria nas questões legais do projeto, atuando na elaboração de contratos e negociação com advogados das contrapartes. Normalmente, é um escritório de advocacia de grande porte, com experiência comprovada na área. Asset management – significa administração de ativos. 132 Banco líder (arranger) – responsável pela estruturação econômico-financeira do financiamento, realiza contato com outros bancos para sindicalização do financiamento, o que significa compartilhamento de riscos e retornos. Bank loan – significa empréstimo bancário. Bond – em finanças, são títulos de dívida emitidos no exterior que rendem juros e correção monetária pelo prazo de sua emissão. Bridge loan – traduz-se como empréstimo-ponte. Serve como empréstimo de curto prazo enquanto não são definidos os critérios para o empréstimo de longo prazo. Geralmente, quita-se o bridge loan com parcela do empréstimo de longo prazo. Business plan – representa o “plano de negócios” do empreendimento, onde são definidos todos os passos a serem cumpridos para a execução plena do projeto. Deve possuir diretrizes claras acerca de todas as fases que englobam a consecução do plano inicial. Dentre os principais tópicos que compõem um business plan, podese destacar: sumário executivo, análise estratégica de mercado e competidores, estratégia de marketing e vendas e plano financeiro. Buyer’s credit – trata-se de uma modalidade de financiamento à importação, onde o comprador recebe crédito bancário de uma instituição do país exportador. Cap – em finanças, utiliza-se para expressar um limite ou teto para alguma operação financeira. Cash collateral – garantia extra que se dá a um credor, além da que presumivelmente seria suficiente. Ocorre quando o credor não se sente seguro de que a garantia normal poderá cobrir seus prejuízos eventuais. Caução – é uma forma de garantia a um possível dano ou falta de cumprimento de uma obrigação. A caução pode ser real, se for dado em garantia algum bem móvel ou imóvel, ou fidejussória, quando é dada garantia pessoal. 133 Commercial paper – é um título de dívida de curto prazo (nota promissária) emitido por pessoa jurídica não financeira, sem garantia real, com prazo certo de vencimento e negociável em mercado secundário. Commodity – significa mercadoria ou bem econômico. São, geralmente, produtos agropecuários ou recursos naturais em estado bruto ou com baixo índice de industrialização. Completion guarantee – significa garantia de conclusão do empreendimento. Completion risk – significa risco de conclusão do empreendimento. Compliance – significa conformidade, ou seja, agir de acordo com padrões previamente determinados. Também pode ser entendido com sistema de controles internos. Comprador (offtaker) – é o adquirente da produção da SPE. O contrato de compra é de longo prazo e possui obrigações para ambas as partes (confiabilidade, capacidade, disponibilidade, prazo, preço e qualidade são variáveis importantes). Conselheiro financeiro (financial advisor) – contratado pelo acionista, tem a obrigação de instruí-lo quanto aos riscos envolvidos na estrutura do projeto e quais seriam os instrumentos e as fontes de financiamento capazes de mitigá-los. Pode ser um banco comercial ou uma consultoria financeira de reconhecida reputação internacional. Construtor (constructor - engineering, procurement and construction contractor) – elabora o projeto de engenharia, gerencia a obtenção de material e constrói o empreendimento baseado num contrato (EPC Contract) com cláusulas de penalização relativas a danos e atrasos. A maioria dos empreendimentos possui contrato no formato turnkey, que significa a entrega do projeto funcionando conforme especificações técnicas próprias. 134 Controladores – detêm o controle acionário de uma sociedade, possuindo a maioria de seu capital votante, e são responsáveis pela mesma perante os órgãos de fiscalização e controle. Corporate Finance – significa financiamento corporativo, aquele dado diretamente a uma empresa já em fase operacional. Cost overrun – significa sobrecusto, ou seja, aquilo que excede o custo previsto inicialmente. Covenant – obrigação imposta em contrato. Custo de Agência (Agency Cost) – é o custo da resolução de conflitos de interesses entre acionistas e administradores. Craqueamento – Processo de refinação que modifica a composição do petróleo por efeitos combinados de temperatura e pressão. Default – em finanças, significa o não cumprimento de uma obrigação financeira; não pagamento de uma dívida. Debt – significa dívida. Due Diligence – a devida diligência é um processo que se constitui na análise e avaliação pormenorizada de documentos e informações de determinada empresa e/ou ativo durante processo de compra ou venda. Normalmente, se dá enfoque jurídico ou contábil a este procedimento. Empréstimos subordinados – são empréstimos que se subordinam ao cumprimento de cláusulas e preferência específicas. Engenheiro independente (independent engineer) – Desempenha papel semelhante ao de uma auditoria independente, assegurando aos demais participantes a viabilidade e condições técnicas do projeto. 135 Equity – significa o capital próprio da empresa (patrimônio líquido), resultado da soma dos bens e direitos menos as obrigações e exigibilidades. Expertise – é o conhecimento que se adquire pela experiência e prática. Financiador (lender) – é aquele que fornece recursos financeiros para a execução do projeto. O agente financiador de um empreendimento pode ser um banco, um fundo de pensão, fundos de financiamento, agências bilaterais ou multilaterais e agências de crédito à exportação – ACE. Financial Advisors – significa assessores financeiros. São especialistas na montagem e negociação na estruturação de empreendimentos. Fornecedor (supplier) – fornece os insumos necessários para o desenvolvimento do projeto. Normalmente, são negócios regulados por contratos de fornecimento de longo prazo (p.ex.: garantia de fornecimento de matérias-primas, energia, transporte, etc.). Hedging – são operações financeiras em mercado futuro com o objetivo de proteger o preço de um ativo ou de uma posição alavancada. Holding – empresa controladora; detentora de participação acionária em outras companhias, chamadas de subsidiárias. Hipoteca – é um tipo de garantia dada com bem imóvel, sem que haja a transferência ao credor da posse do bem gravado. ISO – International Organization for Standardization (Organização Internacional para Padronização) é uma entidade sediada em Genebra, na Suíça, que congrega institutos nacionais de padronização de 163 países, com o objetivo de desenvolver e publicar modelos padronizados internacionalmente aceitos. O termo “ISO” provém do grego “isos”, que significa “igual”. 136 Joint venture – juridicamente, trata-se de um acordo de cooperação entre duas ou mais empresas visando explorar um empreendimento comum. Leasing – trata-se de um contrato de arrendamento mercantil, onde se tem a posse temporária, mas não a propriedade de um bem. O contrato de leasing pode prever, ao seu final, a preferência de compra do bem pelo arrendatário. Letter of credit – em sua tradução direta significa carta de crédito. Trata-se de um instrumento financeiro com especificações determinadas emitido por um banco a favor de seu cliente para cumprimento de uma obrigação assumida. Libor – a London Interbank Offered Rate é a taxa de juros praticada em negócios entre bancos internacionais, entre estes bancos e empresas ou governos, para grandes empréstimos no mercado de eurodólar, tendo como centro principal destas transações Londres, na Inglaterra. Medium and long term debt facilities – significa empréstimos de médio e longo prazos. Off balance sheet – significa a não inclusão do financiamento obtido pelo projeto no balanço de sua empresa patrocinadora. Operador (operator) – é o agente contratado especialmente para operar e realizar a manutenção do projeto. Paper company – empresa sem atividade operacional própria criada para deter, em tempo futuro, participação acionária em outras companhias. Pari passu – significa ao mesmo tempo, simultaneamente. Performance Bond – é um seguro-garantia prestado por um banco a seu cliente visando a proteção deste relativamente ao cumprimento da execução de um determinado contrato de longo prazo. 137 Poder concedente – é o agente autorizador, regulamentador e fiscalizador. Via de regra, é representado por um órgão governamental. Quasi equity – representa um tipo de dívida que pode converter-se em capital próprio. Por exemplo, debêntures conversíveis em ações. Rating – significa a avaliação de risco de determinada dívida ou empresa; opinião independente sobre a capacidade de pagamento de principal e juros pelo emitente de título de dívida. Refundment bond – é um seguro que repõe ao importador os valores pagos adiantadamente no caso do não cumprimento de uma exportação contratualmente avençada. Riscos – são eventos de natureza e data incertas, cuja ocorrência independe de vontade própria ou alheia. Em projetos, os riscos podem ser classificados de várias formas: risco operacional, risco comercial, risco de falência, risco político, risco de conclusão, risco legal, dentre outros. Security package – é o pacote de garantias a ser oferecido aos credores, como, por exemplo: caução das ações que constituem o capital social, penhor de direitos de crédito, penhor dos equipamentos, cessão do benefício de apólices de seguros, penhor dos direitos emergentes da concessão, hipotecas, garantias bancárias, comfort letters, suporte dos acionistas, dentre outras. Seguradora (insurance company) – é a companhia que garante o reembolso a possíveis sinistros que possam ocorrer durante o período de construção e de vida útil do projeto. Shareholders – acionistas. Sindicalização – em finanças, significa a divisão de uma operação financeira, iniciada por uma única instituição, com diversas outras, de modo a repartir os riscos 138 e retornos, sem comprometer a capacidade individual de suprir novos pedidos de financiamento. Sociedade de Propósito Específico (SPE) – É uma entidade jurídica independente; é a empresa criada para incorporar o projeto. Special Purpose Company (SPC) – o mesmo que SPE. Stakeholder – é todo interveniente (pessoa, grupo ou entidade) que possui interesse, em geral, financeiro, em determinado empreendimento. Não são necessariamente acionistas ou credores, mas visam ao fluxo de caixa do projeto. Subprime loan – são empréstimos abaixo da taxa “Prime Rate”, ou seja, empréstimos de baixo custo com o objetivo de proporcionar crédito facilitado sem a contrapartida de garantias suficientes pelo tomador do financiamento, o que gera uma elevação no risco de crédito. Supplier’s credit – corresponde ao crédito fornecido pelo exportador de um bem a seu cliente no exterior. Swap – são operações de proteção contra a flutuação indesejada de taxas específicas, normalmente, representadas por contratos de pagamentos periódicos com uma contraparte. O swap mais usado é chamado de plain vanilla, que consiste na troca de uma taxa pré-fixada por uma taxa flutuante. As operações que mais utilizam o swap são aquelas realizadas nos mercados de ouro, câmbio, juros, índices de preços, debêntures e ações de empresas de capital aberto. Timing – expressão na língua inglesa comumente utilizada no mercado financeiro global que significa “sincronismo”. Turnkey – na linguagem comercial de financiamento de projetos, traduz-se como “chave em mãos”. Entende-se como a entrega, pelo executante de uma obra do projeto, para uso imediato pelo contratante da empreitada. 139 Untied loan – financiamento não vinculado, representativo de recursos de longo prazo, necessário ao desenvolvimento de projetos a serem executados por um governo ou uma empresa estrangeira. 140 APÊNDICES APÊNDICE A – Tabelas de Rating Neste apêndice são apresentadas as tabelas de rating em escala crescente de risco das três principais empresas internacionais classificadoras de risco (Moody”s, Standard & Poor’s e FitchRatings). P.Ex.: AAA significa o grau mais alto da escala, correspondendo a um nível de risco baixo para o emissor de uma dívida (baixíssimo risco de inadimplência) e D significa o grau mais baixo da escala, correspondendo a um nível de risco alto para o emissor de uma dívida (altíssimo risco de inadimplência ou insolvência declarada). Moody’s Dívida Corporativa de Longo Prazo Aaa Aa A Baa Ba B Caa Ca C Obs1: A Moody’s utiliza os números 1, 2 e 3 para atribuir graus de risco entre as classificações Aa e Caa, sendo o 1 melhor risco do que o 3. Obs.2: O conceito de risco mais baixo adotado pela Moody’s é representado pela letra C, enquanto que nas demais agências é D. 141 Standard & Poor’s Escala Nacional Brasil brAAA brAA brA brBBB brBB brB brCCC brCC brC brD Obs.:Os ratings que variam entre 'brAA' e 'brB' podem ser modificados pela adição de um sinal de mais (+) ou menos (-) para demonstrar a capacidade relativa dentro de uma categoria de rating. 142 FitchRatings Rating Nacional (escala brasileira) AAA (bra) AA+ (bra) AA (bra) AA- (bra) A+ (bra) A (bra) A-(bra) BBB+ (bra) BBB (bra) BBB- (bra) BB+ (bra) BB (bra) BB- (bra) B+ (bra) B (bra) B- (bra) CCC (bra) CC (bra) C (bra) D (bra) 143 APÊNDICE B – Plano de Negócios Este apêndice propõe-se a tratar da melhor maneira de se elaborar um plano de negócios que sustente a estruturação de um financiamento na modalidade Project Finance. Segundo Dornelas (2001 apud OLIVEIRA, 2004, p.35), um plano de negócios deve ter a seguinte estrutura: 1. Capa 2. Sumário 3. Sumário Estendido 3.1. Declaração de Visão 3.2 Declaração de Missão 3.3 Propósitos Gerais e Específicos dos Negócios, Objetivos e Metas 3.4 Estratégia de Marketing 3.5 Processo de Produção 3.6 Equipe Gerencial 3.7 Investimentos e Retornos Financeiros 4. Produtos e Serviços 4.1 Descrição dos Produtos (características e benefícios) 4.2 Previsão de lançamento de Novos Produtos e Serviços 5. Análise da Indústria 5.1 Análise do Setor 5.2 Definição do Nicho de Mercado 5.3 Análise da Concorrência 5.4 Diferenciais Competitivos 6. Plano de Marketing 6.1 Estratégia de Marketing (preço, produto, praça e promoção) 6.2 Canais de Venda e Distribuição 6.3 Projeção de Vendas 7. Plano Operacional 7.1 Análise das Instalações 144 7.2 Equipamentos e Máquinas Necessárias 7.3 Funcionários e Insumos Necessários 7.4 Processo de Produção 7.5 Terceirização 8. Estrutura da Empresa 8.1 Estrutura Organizacional 8.2 Assessorias Externas (jurídica, contábil, etc.) 8.3 Equipe de Gestão 9. Plano Financeiro 9.1 Balanço Patrimonial 9.2 Demonstrativos de Resultado 9.3 Fluxos de Caixa 10 Anexos Sobre este mesmo tema, com enfoque sintético, Bonomi; Malvessi (2004, p.43) elencam os principais aspectos a serem considerados num business plan: - Descrição do empreendimento; - Declaração da missão; - Estágio de desenvolvimento; - Produtos e serviços; - Mercado(s)-alvo(s); - Estratégia de marketing e vendas; - Concorrentes e distribuição de mercado; - Diferenciação e vantagens sobre a concorrência; - Administração; - Operações; - Metas de longo prazo; - Riscos; - Obtenção de recursos (quadro de usos e fontes); - Resultados e criação de valor; - Estratégias de saída. 145 Evidentemente, todos os itens relativos à montagem de um bom Plano de Negócios são importantes. Contudo, o Plano Financeiro tem especial importância por sustentar os financiamentos contraídos para consecução do projeto. Segundo Finnerty (1999, p.87): Projetar o plano ótimo de financiamento para um projeto geralmente envolve alcançar seis objetivos principais: (1) assegurar a disponibilidade de recursos financeiros suficientes à conclusão do projeto; (2) assegurar os recursos necessários ao menor custo possível; (3) minimizar a exposição de crédito dos patrocinadores do projeto; (4) estabelecer uma política de dividendos que maximize a taxa de retorno sobre o capital dos patrocinadores do projeto, sujeita às limitações impostas por credores e ao fluxo de caixa gerado pelo projeto; (5) maximizar o valor dos benefícios fiscais decorrentes da propriedade aos quais o projeto dará margem; e (6) alcançar um tratamento regulamentário o mais benéfico possível. 146 Anexo A – Ranking ANBIMA de Financiamento de Projetos – Valor Fonte: ANBIMA, 2010 147 Anexo B – Ranking ANBIMA de Financiamento de Projetos – Número de Projetos Fonte: ANBIMA, 2010