INSATISFAÇÃO NO AMBIENTE DE TRABALHO COMO EVIDÊNCIA DE
ADOECIMENTO
PEREIRA, André Marcelo Lima; LIMA, Leonice Domingos dos Santos Cintra
Unicastelo, Mestrando em Ciências Ambientais
Unicastelo, Profa. Drª Titular do Programa de Mestrado em Ciências Ambientais
[email protected]; [email protected]
Resumo- Este trabalho de pesquisa investiga o sentimento de insatisfação recorrente vinculado ao
ambiente de trabalho, que pode estar na base de doenças mentais e físicas e constitui assim elementos das
doenças somatizadas a partir das relações de trabalho. Apresenta um questionário aplicado com
colaboradores da Irmandade Santa Casa de Misericórdia de Fernandópolis, em 2014. Os resultados
apontam que as pressões e tensões do cotidiano hospitalar, a ansiedade acumulada e a falta de
reconhecimento podem estar vinculadas a estados de estresse, depressão e quadros patológicos variados
que têm sua embrionagem nas situações de trabalho.
Palavras-chave: Insatisfação no trabalho. Patologias. Adoecimento.
Introdução e Estado da Arte
As recentes formas das organizações do
trabalho, dentro do sistema capitalista, resultam
habitualmente em insatisfação do trabalhador no
ambiente de trabalho. Os impactos negativos das
exigências da produção na saúde do trabalhador
se constituem em objetos desta pesquisa. Se, por
um lado, os modelos organizacionais podem
representar um benefício ao trabalhador (salários,
promoção, segurança, saúde, qualidade de vida)
e promover satisfação, por outro lado, as
pressões, exigências e riscos das tarefas podem
causar acidentes de trabalho, insatisfação e
desenhar um quadro patológico de estresse,
ansiedade, frustração, e adoecimento. A coação,
o autoritarismo, a arbitrariedade, a falta de
autonomia nos modos operatórios e de liberdade,
além dos riscos inerentes ao trabalho, infundem
constrangimento, insatisfação e baixa autoestima,
temor, tensão, frustração e adoecimento.
A insatisfação e o sofrimento começam
quando o trabalhador perde a significação da
tarefa. A realidade contemporânea do mundo do
trabalho revela um paradoxo: se o trabalho traz o
mínimo de satisfação e pode promover realização
pessoal, também traz insegurança, insatisfações,
desilusões, ansiedade, angústia, problemas que,
gradualmente, comprometem a saúde física,
mental e social e evoluem para patologias
associadas ao trabalho. O sofrimento começa
quando a relação homem-trabalho é bloqueada e
o nível de insatisfação não pode mais diminuir
(DEJOURS, 2003): cabe ao trabalhador controlar
as condições emocionais (mágoa, orgulho, rancor
etc.) e procurar adaptar-se, continuamente, às
solicitações
do
trabalho
para
não
se
desestabilizar emocionalmente e desenvolver
enfermidades. Para o autor, só uma intervenção
oportuna, com medidas corretivas adequadas e
consistentes no indivíduo e no ambiente
relacional de trabalho, pode transpor os
obstáculos da insatisfação, do estresse,
inadaptação, sofrimento, angústia, depressão, do
sofrimento invisível, mas vivenciado pelo
trabalhador. Todavia, para Freud (2006), o
trabalho também pode ser o mediador entre a
reapropriação e a realização do ego, portanto,
uma forma de prazer e realização.
O sofrimento é empobrecedor: anula a
criatividade, conduz à insatisfação, à depressão,
à tristeza, à vivência da indignidade, da vergonha,
do cansaço físico e mental, enquanto a vontade
não consegue realizar investimentos afetivos. O
sofrimento surge não tanto pelas exigências
mentais do trabalho, mas pela impossibilidade de
evolução para o alívio da tensão: “a certeza de
que o nível atingido de insatisfação não pode
mais diminuir marca o começo do sofrimento”
(DEJOURS, 1992, p. 52).
Para Dejours (1992), na impossibilidade de
realização do sujeito no trabalho, surgem a
insatisfação, a tristeza, o sofrimento. Tende-se a
inviabilizar a satisfação do indivíduo quando sua
identidade é ofendida por pressões e normas, não
permitindo atingir o que Freud (1996) chamou de
realização da felicidade, a satisfação pelo
trabalho escolhido, realizado segundo as aptidões
do trabalhador, fator de alegria no trabalho e
equilíbrio emocional.
Encontro de Pós-Graduação e Iniciação Científica – Universidade Camilo Castelo Branco
199
Este estudo visa relacionar a insatisfação,
persistente e recorrente no trabalho, e processos
de adoecimento vinculado às das tarefas e às
relações do ambiente de trabalho.
Material e Métodos
Esta pesquisa se caracteriza como qualitativa.
Para
sua
realização,
seguiram-se
as
determinações da Resolução n.º 196/96, do
Conselho Nacional de Saúde, obrigatórias para
pesquisas científicas que envolvam seres
humanos. Os participantes assinaram, também, o
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, em
observância ao Código de Ética.
O questionário, aplicado a 97 funcionários da
Irmandade Santa Casa de Misericórdia de
Fernandópolis (SP), investigou os níveis de
tensão, ansiedade e insatisfação (via valorização,
reconhecimento e relações no ambiente de
trabalho). As respostas foram interpretadas em
valores relativos do quantum da amostra.
Resultados
Os resultados obtidos na aplicação do
questionário
apontam
que
100%
dos
trabalhadores estão satisfeitos com o que fazem,
mas revelam restrições. A pesquisa apresenta
que 46% dos participantes acham que as chefias
controlam em demasia a realização das tarefas,
17,52% dos quais referem falta de “escuta” dos
chefes a sugestões dos colaboradores para quem
as tarefas devem ser executadas sem discussão;
para 13,4% dos colaboradores, os superiores
hierárquicos lhes dão pouca atenção. Por outro
lado, 72,1% dos ocupantes de cargos superiores
revelam preocupação com o que ocorre no
ambiente de trabalho. Dentre os pesquisados,
49,48% buscam alternativas para a execução das
tarefas e 26,8% se apressam em cumpri-las.
30,92% se dizem não valorizados, 19,58%
chateados,
irritados,
aborrecidos
ou
incomodados, 11,34% se dizem tensos e 2%
tristes, embora 38,14% se mostrem otimistas com
o que fazem e esperam da Instituição.
Dos questionados, 37,11% se dizem não
reconhecidos e 50,51% se acham reconhecidos
pelo
que
fazem
(esforço, envolvimento,
acolhimento, amor ao trabalho), embora
lamentem que esse reconhecimento não se
traduza em benefícios (materiais ou reais, via
salários e promoções) para o trabalhador.
Discussão dos Resultados
A pesquisa mostra a existência de pressão
constante na execução das tarefas, revelada pelo
controle e vigilância das chefias e imposição de
normas e exigências pertinentes às atividades.
Em decorrência, os questionados se sentem
oprimidos, tensos, ansiosos na execução das
tarefas, limitados em sua autonomia e liberdade
de criação diante da vigilância e controle
executados pelas chefias, e não valorizados;
dessa forma, estão em permanente estado de
temor diante da possibilidade de danos à saúde e
adoecimento originado das situações do trabalho
e riscos a que se expõem, além da constante
tensão advinda do controle e vigilância de seus
superiores e da execução das tarefas – o que os
leva, invariavelmente, a temer o desemprego e
não conseguir prover a subsistência própria e a
de sua família.
Conclusão
As constantes pressões no trabalho hospitalar,
pela organização do trabalho, pelo controle e pela
responsabilidade requerida do trabalhador, fazem
com que este se sinta tenso, ansioso, insatisfeito
de modo persistente, às vezes frustrado e triste.
O trabalhador convive constantemente com a
exigência de não poder cometer falhas, sob
controle, tensão e ansiedade. Como tais pressões
e estados de ansiedade são inerentes à tarefa,
podem, gradualmente, conduzir a estados de
tristeza, frustração, vivenciados subjetivamente, e
de engajamento exagerado pela responsabilidade
para com vidas; alia-se a esse contexto a não
valorização do trabalhador, exposto a riscos e
exigências do ambiente de trabalho – o que pode
abrir caminho para o adoecimento proveniente
das atividades laborativas e comprometer sua
saúde física e mental.
Referências
DEJOURS, Jacques Christophe. A loucura do
trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho.
Trad. Ana Isabel Paraguay e Lúcia Leal Ferreira.
5. ed. ampl. São Paulo : Cortez/Oboré, 1992.
168p.
DEJOURS, Jacques Christophe. A loucura do
trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho.
Trad. Ana Isabel Paraguay e Lúcia Leal Ferreira.
5. ed. ampl. São Paulo : Cortez, 2003.
FREUD, S. (1996). Além do princípio de prazer.
Trad. Jayme Salomão. Rio de Janeiro : Imago,
1996. v. XVIII. (Edição standard brasileira das
obras psicológicas completas de Sigmund Freud)
FREUD, Anna. O ego e os mecanismos de
defesa. Trad. Francisco E. Settineri. Porto Alegre
: Artmed, 2006. 124p.
Encontro de Pós-Graduação e Iniciação Científica – Universidade Camilo Castelo Branco
200
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