UMA FEDERAÇÃO MAIOR QUE O PIB. IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, Professor Emérito das Universidades Mackenzie, Paulista e Escola de Comando e Estado Maior do Exército, Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo e do Centro de Extensão Universitária - CEU. Muito se falou, nos oito anos de governo Fernando Henrique, em reforma tributária, mas pouco se fez para implementá-la, com olímpico desinteresse pelo projeto do Executivo para um novo sistema tributário, consubstanciado no PEC 175, do distante ano de 1995. Como fracassou o governo em duas reformas essenciais (administrativa e previdenciária), o custo da Federação passou a ser insuportável, não sendo coberto pelo elevado nível da carga tributária, que, apesar de quase confiscatória para um país que não presta serviços públicos, é insuficiente para cobrir a previdência oficial, a esclerosada máquina estatal e os juros da rolagem da dívida mobiliária. Neste contexto, teorizou o governo o amor à reforma tributária e praticou o obsoletismo fiscal, mantendo técnicas ultrapassadas de arrecadação, multiplicando exigências burocráticas desnecessárias e tornando o cipoal de imposições administrativas um verdadeiro “paraíso” para as pressões tributárias desmedidas, sempre que o “déficit fiscal” crescia. A reforma tributária, portanto, apesar de necessária, ficou à deriva, visto que o governo, habituado a trabalhar com técnicas superadas, preocupou-se, apenas, em instituir novas fórmulas de aumento de arrecadação, criando imposições de duvidosa constitucionalidade, inclusive com a implosão do princípio da legalidade, substituído pelo “princípio do palpite fiscal”, ao criar a norma anti-elisão. Por esta norma, o contribuinte que, entre duas leis, escolher aquela que propicie menor peso contributivo, mesmo agindo sem dolo, fraude ou má-fé, será punido. Em vez de revogar, o governo, a lei mais favorável ao contribuinte, bastará ao agente fiscal “desconsiderá-la” e aplicar aquela que lhe pareça mais conveniente ou for de sua preferência arrecadatória. E o Poder Público fez vistas grossas a tais violências --o que elevou a carga tributária a mais do que 1/3 do PIB--, pois necessita sempre de mais recursos, por não ter realizado a única reforma efetivamente necessária, qual seja, a de reduzir o peso da Administração sobre o cidadão, tornando leve e ágil a máquina burocrática. A Federação Brasileira (custo administrativo e previdenciário) não cabe no PIB e é bem possível, pelo amor que tem ao fortalecimento das estruturas burocráticas, que o futuro presidente, se for aquele que lidera as pesquisas eleitorais, torne o Estado ainda mais pesado e a carga tributária mais escorchante com a instituição de novos tributos (grandes fortunas, heranças etc.). 2 Estou convencido que a melhor política tributária é aquela em que a carga é reduzida, pois evita a sonegação e alavanca o desenvolvimento. Em 1986/87, o Secretário da Receita Federal Adjunto, Eivany Silva, reduziu de 55% para 25% o teto do imposto sobre a renda de pessoas físicas e teve aumento de arrecadação pela simples diminuição da evasão fiscal. É princípio universal que quanto maior a carga, maior a sonegação, quanto menor a carga, menor a sonegação. A reforma tributária ideal, a meu ver, passaria por uma redução do peso dos tributos para que o país pudesse crescer, aumentando, por decorrência, a arrecadação; passaria pela eliminação da guerra fiscal entre os Estados, através da federalização de suas normas; passaria pela unificação dos tributos circulatórios (PIS, COFINS, ISS, ICMS e IPI) num IVA, como ocorre na Europa; passaria pela eliminação dos tributos cumulativos e passaria pela desoneração tributária da circulação de dinheiro, que torna, no momento, os juros reais muito elevados. Só será possível tal reforma, se o Estado também for reformado em sua capacidade dispenditiva, que é enorme e descompassadora. Se permanecer o festival de gastos previdenciários oficiais e das estruturas ineficientes e multiplicadas, qualquer que seja a reforma será inútil, porque não será lancetado o problema maior do país, que é uma Administração maior do que a sociedade e, o que é ainda pior, prestando serviços públicos de péssima qualidade! São Paulo, 11 de outubro de 2002. IGSM/mos 3 A2002-100 UMA FED MAIOR QUE O PIB 4