O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Centro Universitário de Volta Redonda (UniFOA), Volta Redonda, Professor do Curso de Jornalismo [email protected] Resumo: Esse artigo apresenta a história da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda. A emissora que pertenceu a Companhia Siderúrgica nacional (CSN) e funcionou de 1955 a 1980 quando a empresa encerrou suas as atividades. A CSN utilizou a rádio como canal direto de comunicação, com os metalúrgicos, através das produções de programas musicais, reportagens, festivais, festas, radionovelas, transmissão de atividades esportivas e inaugurações da siderúrgica. O objetivo central do trabalho é buscar entender o papel da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda nos “Lares da família siderúrgica”. Palavras-chave: Rádio. CSN. Rádio-empresa. Volta Redonda. The end of Brazilian National Forge Company Radio Abstract: This article presents pieces of historical information about Brazilian National Forge Radio in Volta Redonda. After all, the radio station once belonged to Companhia Siderúrgica Nacional (National Forge Company) and it worked from 1955 to 1980, when the press was closed down. CSN used radio as a direct medium to communicate with forge workers as it advertised musical productions and programs, promoted festivals, parties the same way it produced reportages, radio soap-operas, the transmission of sports events and announced the beginning of new activities in the forge company. Keywords: Radio. CSN. Radio company. Volta Redonda. R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 107 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres O Trabalhismo e a Rádio CSN A Rádio Siderúrgica Nacional foi fundada em Volta Redonda, em 9 de abril de 1955. Essa data marcava também as festividades dos 14 anos de atividades da Companhia Siderúrgica Nacional. Durante a inauguração da emissora, o texto de abertura da programação foi lido pelo primeiro locutor da Rádio Siderúrgica, o radialista José Madureira: Entardece tranquilamente. Hoje, pela primeira vez, foi ao ar a ZYP-26. Graças a Deus e ao desejo de vencer foram corados de pleno êxito os nossos trabalhos. Nessa hora de amor e confraternização humana, dirigimos a virgem Maria nosso pensamento, pedindo a mãe do céu, que a Companhia Siderúrgica Nacional, e a todos os nossos ouvintes que vibram nesta máquina gigantesca que é Volta Redonda, paz de espírito tão necessária, ao trabalho honesto e dignificante. O texto inicial de inauguração da Rádio Siderúrgica valorizava o trabalho, qualificando-o como honesto e dignificante. A partir do Estado Novo (1937-1945), houve uma reorientação na forma de lidar com a questão trabalhista. Ao invés de ser um “caso de polícia”, o operário-brasileiro se torna o centro das atenções do governo. As relações entre Vargas e o trabalhador brasileiro seriam marcadas pelo trabalhismo, ou seja, pela negociação constante entre Vargas e os trabalhadores urbanos. Como propõe Ângela de Castro Gomes, A importância e o papel do cidadão-trabalhador tinham assim uma dimensão material comprovável nas numerosas e variadas iniciativas desencadeadas pelo Estado, tendo como finalidade precípua a criação e proteção deste novo homem brasileiro (Gomes, 2005, p. 237). Nota-se, ainda, nessa mensagem de abertura da Rádio Siderúrgica como havia a preocupação de destacar a dimensão do trabalho da siderúrgica construída em Volta Redonda. Esse discurso evidencia como a diretoria da CSN realçava em suas cerimônias a importância da empresa para Volta Redonda, o que impressionava a todos. A CSN era o símbolo da industrialização nacional. Temos também a figura do trabalhador-cidadão, que participa das atividades sociais da empresa, através das atividades de lazer, da participação nos aniversários da empresa, inaugurações e outras efemérides. Construir uma imagem da cidadania através do trabalho foi uma preocupação constante da empresa. A questão do trabalho como um patrimônio do país sempre era destacada na emissora. Lucília de Almeida Neves afirma: A conjuntura delimitada pelos anos 40 e início dos anos 60 foi caracterizada pela crença de expressivos segmentos da sociedade civil brasileira de que a modernidade só seria possível se apoiada em um programa governamental sustentado pela industrialização, por políticas sociais distributivistas e por efetiva defesa do patrimônio econômico e cultural do país. (Neves, 2001, p.172) R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 108 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres A organização sindical funcionava nesse período como um recurso de métodos que iriam disciplinar a classe trabalhadora. (Neves, 2001, p. 237) Em Volta Redonda, logo após a instalação da CSN, foi instalado o Sindicato dos Metalúrgicos, sobre esse fato Bezerra (2006) comenta: A cidade de Volta Redonda foi palco de atuação de movimentos políticos e sociais, por se tratar de uma cidade tipicamente operária onde foi implantada a maior usina siderúrgica da América Latina na década de 1940, a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). A inauguração da siderúrgica na cidade marcou o surgimento do Sindicato dos Metalúrgicos, entidade sob a qual os trabalhadores se organizaram em sua luta por melhores condições de trabalho e de vida. No período inicial, o sindicato teve uma relevante participação política com disputas na direção entre partidários varguistas (PSD) e os comunistas (PCB). Esta dinâmica de embates perdurou até 1957, quando finalmente os comunistas conseguem vencer a eleição para a diretoria do sindicato, o qual teve como marca a atuação combativa até o golpe civil militar de 1964. (Bezerra, 2006, p. 1) Essa disputa pela diretoria do sindicato, com a posterior vitória das lideranças do PCB, demonstra as limitações do ideário trabalhista predominante na Rádio CSN. O discurso trabalhista divulgado pelas ondas da Rádio não eliminou as divergências políticas no seio do operariado, cujo maior exemplo são as eleições para a diretoria do sindicato. Com o retorno à democracia e ao pluripartidarismo, a presença dos partidos disputando os votos operários demonstra a importância do operariado no jogo político. No plano da gestão de trabalho, Volta Redonda também deve ser pensada no contexto maior da legislação social estabelecida nos anos 1940. Pensamos o Estado Novo (19371945) como um processo de incorporação de elementos constitutivos tanto da lógica do empresariado quanto das lutas dos trabalhadores em um novo plano político, numa agenda centralizada pelo Estado. (Gomes, 2005, p. 238). Assim o Estado passou a instituiu uma ideologia de que: Só o trabalho podia constituir-se em medida de avaliação do valor social dos indivíduos e, por conseguinte, em critério de justiça social. Só o trabalho podia ser o princípio orientador das ações de um verdadeiro Estado democrático, de um Estado “administrador do bem comum”. (Gomes, 2005, p. 238) Vemos fortemente a questão do valor que o trabalho tinha que transmitir. O Estado criou formas de controlar a população através do conceito de todos fazerem parte de uma grande família, e na CSN esse discurso era difundido por todos os seus veículos de comunicação, seja o jornal ou em sua emissora. Esta era uma nova forma de exercício do poder que, sem abdicar da soberania do Estado – controle sobre o território -, suplementava-a com um controle sobre a sociedade. Ou seja, com um controle que era fundamentalmente uma técnica de construção do povo/nação como uma grande família, em que o Estado/presidente era o pai/guia. (Gomes, 2005, p. 238) R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 109 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres A “grande família”, segundo o governo, trabalhava para o progresso do Brasil. A ideia de família substitui a ideia da luta de classes, tão propagada pelos representantes do Partido Comunista, pela perspectiva da harmonia entre os operários e a empresa, todos empenhados num único objetivo: trabalhar pelo desenvolvimento da nação. Em um dos anúncios sobre o aniversário da CSN, projeta-se a perspectiva de que as atividades desenvolvidas pela empresa geram o desenvolvimento para a cidade e para o país: Dezesseis anos de luta pelo progresso do Brasil. Festejos da CSN. Dia 8 segunda-feira, na quadra do Recreio do Trabalhador, às 20 horas, voleibol masculino, Volta Redonda e Academia Militar Agulhas Negras. Vinte e uma horas, basquetebol masculino, Botafogo do Rio e Toshiba de Porto Alegre. (Fonoteca Fundação CSN. Gravação extraída dos arquivos da emissora da CSN). Durante as décadas de 1950 e 1960 havia a necessidade de realizar o plano de expansão da CSN. Para isso, seria necessário abrir novas vagas e ampliar a mão-de-obra disponível, principalmente após a emancipação de Volta Redonda. Em um plano simbólico divulgado pela empresa, Volta Redonda era o “Eldorado” que prosperava em emprego e bons salários para os operários. A cidade de Volta Redonda era responsável pela geração de empregos, mas o que geralmente não era destacado é que o trabalho era pesado e desgastante, já que se tratava da produção de aço. Nessa época, o valor social do trabalho era questão central. Era esse o grande esforço do novo Estado Nacional. Ele enfrentava a questão social não como uma questão operária, mas como um problema de todos os homens e todas as classes, já que eram trabalhadores todos aqueles que produziam. (Gomes, 2005, p. 238). A Rádio Siderúrgica Nacional pode ser definida como um instrumento da CSN e do governo para a divulgação de políticas sociais e difusão da cultura do país. O esvaziamento e fim da Rádio Siderúrgica Nacional No dia 31 de dezembro de 1980, a Companhia Siderúrgica Nacional enviou comunicado para a equipe da Rádio Siderúrgica para que fosse anunciado o fim das transmissões da emissora. Para os locutores, provavelmente esse fato foi o mais difícil de ser noticiado. Para analisar como foi o impacto para esses profissionais e moradores da cidade de Volta Redonda, analisamos o depoimento dos radialistas que trabalharam na emissora. Marialva Barbosa (2008) define essa difícil tarefa do historiador: Ao reconstruir no presente, a partir do rastro que o passado deixou como marca, coloca-se também em cena a questão memorável. Haverá sempre algo esquecido e algo lembrado nesse passado reatualizado. Mais do que a questão do objeto memorável, há que se pensar, pois, na dimensão do esquecimento que essas emissões evocam. (Barbosa, 2008, p. 94) A nota de encerramento da Rádio da CSN não explicou os motivos reais que levaram o fim da emissora. Vemos claramente a preocupação do locutor de que a emissora caísse no esquecimento. A leitura da nota foi feita pelo radialista José Madureira: R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 110 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres Mais um ano se avizinha. Todas as esperanças se renovam em busca de dias melhores. De muitas realizações. No entanto todos nós da Rádio Siderúrgica não podemos comungar dessa mesma esperança, porque a partir de amanhã, nosso prefixo não mais ressoará para os nossos ouvintes. (Madureira, 1980). Barbosa (2008), citando Ricoeur (2000), define os tipos de esquecimentos que existem: ... há que se considerarem as múltiplas possibilidades de esquecimento o que faz com que alguns autores proponham uma tipologia do esquecimento (pragmática), estabelecendo níveis diferenciados, mesmo em relação ao chamado esquecimento profundo: esquecimento por apagamento de restos; por persistências de restos; e em decorrência da memória. A uma memória impedida corresponderia o esquecimento produto da narrativa; e aos usos e abusos da memória corresponderia o esquecimento comandado, numa dimensão institucional. (Barbosa, 2008, p. 95) A fala de José Madureira é ainda mais valorizada, já que ele também foi o responsável em ler a nota de abertura da emissora em 1955 e tinha assim uma ligação muito forte com a Rádio pela função desempenhada durante esses anos na emissora. Uma mensagem que caiu em um esquecimento de muitos ouvintes que viveram esse momento e ficou registrada em áudio. A nota segue da seguinte forma: Como é triste a despedida, pois é um pedaço da gente que se vai, nós que partilhamos dessa rádio, vivemos como se fosse a nossa própria vida. Tanto nos momentos de alegria e tristeza, daquilo que falamos com entusiasmo e felicidade e também dando as informações que muitos ouvintes não desejavam ouvir, no entanto éramos obrigados a fazer. Cumprimos com o nosso dever e sem falsa modéstia, podemos afirmar com a maior dignidade, respeito e sempre com espírito profissional. Agradecemos a Deus a oportunidade que recebemos por essa onda amiga da RS. Em conhecermos pessoas, em aumentar o nosso relacionamento, uns pessoalmente, outros que apenas se mantiveram restritos através do rádio, porém o suficiente para sentirmos que cumprimos o nosso papel de comunicador. Nesse momento que já se tornou saudade, iremos enviar a todos que ao longo desses anos nos prestigiaram, com sua audiência principalmente no esporte, todo o nosso afeto, e elevando o nosso pensamento ao bom Deus, que derrame suas bênçãos sobre todos os lares, procurando abrir os corações para brotar mais amor entre as pessoas. Buscando suplantar o egoísmo e a inveja tão maléficos nos nossos dias. Deixamos aqui o nosso abraço fraterno e, do fundo do coração, o nosso muito obrigado, apenas sentido em não poder encerrar os nossos trabalhos repetindo, até amanhã se Deus assim o permitir. (Madureira, 1980). O texto faz referência a uma “onda amiga da RS”, ou seja, os locutores resumem nessa mensagem final que havia um clima harmônico entre os ouvintes da emissora e esse processo terminaria com o fim das transmissões da Rádio Siderúrgica. O que pode ter impactado ainda mais a todos aqueles que estavam envolvidos com a emissora foi o período em que aconteceu o término das transmissões, justamente no último dia do ano, R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 111 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres uma quarta-feira, que tinha o clima de renovação com a chegada do novo. O radialista Mauro Tanury estava no momento em que a emissora foi fechada, enfatizou: “Eu estou perplexo, tenso e até decepcionado com esse presente de fim de ano, presente de grego” , a CSN havia dado um presente de mau gosto para um grupo extenso formado por metalúrgicos-ouvintes, locutores e, principalmente, o público em geral. A edição do jornal Diário do Vale, de 8 de agosto de 2010, tenta explicar um dos motivos para o fechamento da emissora que seria a inicialização do processo de privatização da empresa: José Madureira teve uma carreira repleta de episódios notórios. Na última transmissão da Rádio Siderúrgica, que acabou desativada em 1980, quando a CSN iniciava o processo para sua privatização, Madureira chegou a chorar durante sua locução. (Diário do Vale, 8 ago. 2010). Mauro Tanury, radialista que também trabalhou na emissora, expõe sua revolta com a desativação da rádio da CSN: Parece mentira, é duro de acreditar, depois de 17 anos como radialista, 10 anos na Rádio Siderúrgica Nacional eu tenha que ocupar esse microfone agora, para o último contato com você ouvinte, e, o que é pior, por força da desativação desse veículo. Não sou eu que estou lhes deixando, ouvintes, é a rádio que depois de 27 anos de prestação de serviços à comunidade, é que está nos deixando, a mim e a você. (Tanury, 1980). Mauro Tanury estava certo. Ele, os ouvintes e os demais componentes da emissora não aceitavam o término das transmissões da Rádio Siderúrgica. Mas, mesmo com toda a revolta por aquele episódio, eles não conseguiram convencer a direção da empresa a voltar e rever a decisão de finalizar as transmissões. A ouvinte Neiva Carvalho, hoje com 70 anos, fala sobre o fim das transmissões da Rádio Siderúrgica Nacional: Foi uma mudança muito radical quando acabou essa rádio, foi muito triste principalmente para os ouvintes, nós tínhamos hábito de ligar na rádio. Sempre gostei muito de ouvir, porque naquele tempo tinha aqueles discos, e ali a Rádio não, você vai direto, você vai trabalhando, tudo que você vai fazendo e a rádio vai anunciando, dando notícia, e também entrando com as músicas, que é muito bom para gente. (Carvalho, 2011) A decisão da CSN em fechar à emissora gerou um sentimento de indignação dos locutores, como não poderia ser diferente, eles que não entendiam porque a empresa deveria extinguir a rádio. Edward de Carlos fala sobre a lembrança que tem de como surgiram os boatos sobre o fechamento da Rádio Siderúrgica Nacional: R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 112 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres Essas coisas começam de zum-zum-zum. Estão falando que vão fechar a rádio. Vão fechar, não é de interesse mais, a rádio agora, a CSN não se interessa mais, o futuro da CSN é produzir aço. E começou assim até que chegou a época, se não me engano o presidente da CSN era o Jorge Leonardo, se não me falha a memória. E ai foi nesse período que falaram, vai fechar mesmo, não há o interesse mais, e outras emissoras estão aí. A companhia está sendo preparada para mudar completamente. Apesar dos apelos ninguém... ouviu. (Carlos, 2011). Além do conceito de “família siderúrgica”, a rádio divulgava também que os ouvintes faziam parte da “família RS”, que era possivelmente composta pelos integrantes da equipe da Rádio Siderúrgica. Para analisar essa idéia temos a citação de Mauro Tanury, que destacou “você, ouvinte, também membro dessa família, família RS, tenho certeza de que também não se conforma com essa triste realidade. A Rádio Siderúrgica Nacional vai nos deixar”. No dia 1 de janeiro de 1981, a emissora iniciou uma programação sem intervenção de locutores, apenas transmitindo músicas. Se realmente o fim da emissora estiver ligado ao processo de privatização da CSN, os políticos e demais autoridades da cidade e região que apoiavam a ideia não iriam se envolver para evitar o fim da Rádio Siderúrgica. Esse ponto também foi apresentado por Mauro Tanury: Outra grande decepção, poucas foram as pessoas, autoridades principalmente e políticos da região que poderiam fazer alguma coisa, que lutaram em favor da permanência desse prefixo, poucas foram as pessoas que realmente demonstraram essa vontade, a maioria assistiu de braços cruzados o fim de uma rádio que, dentro desses 27 anos, procurou informar veiculando notícias, músicas e prestando serviços. Assistiram de braços cruzados e friamente, a cidade perder sua voz. (Tanury, 1980). As manifestações dos ouvintes contra o fechamento da rádio aconteceram, mas não conseguiram fazer a CSN recuar na decisão de terminar com os serviços da emissora. Edward de Carlos, afirma que: Quando a rádio saiu do ar em 80, se não me falha a memória, nós tivemos assim muitas manifestações de pessoas que ligaram para lá, puxa vida. Pessoas que tentaram interceder junto à direção da empresa para que mudasse, não fechasse a rádio. Porque a rádio tinha audiência ainda até no último dia. A rádio competia de igual para igual com as outras emissoras. (Carlos, 2011). Outro motivo sobre o fim da Rádio Siderúrgica foi apresentado pelo radialista Edward de Carlos, chefe da equipe de esportes da rádio. Para o radialista, a rádio havia perdido a sua finalidade, por isso, foi fechada: A finalidade da rádio siderúrgica era entretenimento. Foi por esta razão que depois ela veio a ser desativada. Vieram outras emissoras, vieram televisões, então ela perdeu a sua finalidade. Ela não tinha fins lucrativos. Ela tinha fins e finalidades sociais. Então acabou a finalidade social, a empresa passou a se interessar mais pelo lado financeiro, porque ia ser privatizada. E ela foi finalizada. (Carlos, 2011). R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 113 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres O depoimento de Edward de Carlos é coerente já que a emissora, em 1955, não disputava audiência com outros veículos. Com o passar dos anos, foram surgindo outros meios. A televisão, principalmente na década de 1980, tinha uma audiência muito forte, por isso, a Rádio da CSN pode ter perdido eficácia e não havia mais motivos para a empresa manter em funcionamento um veículo sem expressão, junto à direção da empresa e ao público. O ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional, Manuel Alves comenta como foi o processo que levou o fim das transmissões da emissora: Até que a CSN iniciou o processo de privatização na década de 1980, e assim começaram a definhar o fim da rádio. O fim da rádio tem um nome, General Odir, esse general veio para a empresa na época, porque se iniciava um enxugamento da empresa. Então o que ele fez. Fez um trabalho dentro da Companhia Siderúrgica Nacional, extinguindo todos os departamentos deficitários e deixando apenas aqueles produtivos, para que a empresa começasse a ser enxugada para futuramente ser privatizada. Então, quando ele viu lá, DRD, era o departamento que não tinha lucro, apenas gastava. Ele sem saber, não sei se ele não sabia,. ele resolver extinguir o DRD, só que o era o Departamento de Rádio Difusão. Então acabou-se a rádio. (Alves, 1980). Uma das indagações que podemos fazer sobre o fim da radio é a questão levantada pelo ex-funcionário Manuel Alves de que a rádio foi fechada porque não dava lucro. Será que o DRD – Departamento de Rádio Difusão foi fechado pela direção da empresa, sem o conhecimento prévio de que se tratava da emissora de rádio da CSN? É bem provável que não, já que para uma emissora ser fechada, era necessário ter a autorização do DENTEL, Departamento Nacional de Telecomunicações. Mas mesmo assim a CSN, no dia 31 de dezembro de 1980, neutralizou as ações do DRD, impossibilitando o funcionamento da emissora. Desprestigiada pela direção da CSN, a partir de meados da década de 1970, a Rádio Siderúrgica - constituída como um departamento dentro da empresa - entrou em declínio. Deficitária, acabou sendo fechada pela CSN estatal. A empresa se ressentiria da medida, justamente na época da privatização da companhia, por não dispor de um canal direto com seus empregados. Roberto Procópio Lima Netto, presidente que conduziu a empresa na passagem do estado para a iniciativa privada, certa vez chegou a declarar: “O fechamento da rádio foi uma das maiores burrices já cometidas na CSN”. (Jornal Foco Regional, 10 abr. 2006) Em 31 de dezembro de 1980, a cidade do aço se transforma em uma cidade emudecida. Em um depoimento marcante Mauro Tanury define o sentimento de como ficaria Volta Redonda, a partir daquele momento triste para a história do município: Eu vou ficando por aqui para evitar as lágrimas. Como diz o compositor João Donato, numa uma de suas composições “Até um dia não é, até talvez, até quem sabe, gente bacana de Volta Redonda, que passa ser, a partir desse dia 31, uma cidade emudecida. Vejam só uma cidade emudecida. Tchau. (Tanury, 1980). R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 114 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres Vemos claramente a revolta do funcionário Mauro Tanury e sua preocupação com a questão do esquecimento que a emissora enfrentaria por ter saido do ar. Mais uma vez recorrendo a Ricoeur, (2000), Marialva Barbosa apresenta a questão da memória: A questão da memória mostra que o esquecimento é um dever da memória e, portanto, a categoria memória só existe no esquecimento. Ao lembrar algo, tira-se esse algo do esquecimento para a memória. Só há memória porque há esquecimento. Enquanto a memória é sempre apresentada como ambição à fidedignidade, o esquecimento, em contrapartida, apresenta-se como uma espécie de defeito. Portanto, o que está em foco no jogo memorável é o grau de profundidade do esquecimento e o seu estatuto epistemológico. (Barbosa, 2008, p. 94) Não poderia ser diferente o depoimento dos funcionários que haviam recebido a notícia sobre a desativação da emissora. Dalmir que trabalhou na secretaria da rádio fez da seguinte forma a sua despedida: Boa noite, meus amigos ouvintes da RS, aqui eu deixo a minha despedida, a última despedida, no caso. Queria desejar a vocês um feliz ano novo. Que estiveram aqui conosco durante esse tempo todo. E agradeço a vocês, enfim foi assim, né, não teve outro jeito, a desativação da rádio, encerrou ontem. Então o que eu posso desejar a vocês é um feliz natal e próspero ano novo. (Dalmir, 1980). Gilson responsável pelos contratos de publicidade da emissora também deixou a sua mensagem para o público: Bom o que eu tenho a dizer é que essa rádio marcou muito a minha vida. Evidentemente, eu entrei na Rádio Siderúrgica como porteiro, logo a seguir passei, a auxiliar de escritório, e, logo a seguir, assumi o cargo aqui de controlador, de chefe de propaganda e publicidade. Então com essa oportunidade, realmente eu tive que me integrar com a nossa equipe, tive que participar diretamente de toda a parte comercial da rádio. É lamentável que hoje a rádio é desativada, ainda não sei para onde eu devo ir, provavelmente devo voltar para o departamento de origem que é o departamento de visita, não sei, não tem nada acertado. E aproveitando o ensejo, quero deixar uma mensagem, a todos àqueles colegas meus que colaboraram, me entenderam, me compreenderam embora saindo de porteiro, depois tive que é, praticamente, é, orientar e exigir um pouco dos meus colegas. Mas, o que eu tenho que agradecer a eles, que eles participaram comigo, colaboraram e aceitaram todo o meu ponto de vista. Por mais é só isso, que numa situação dessas a gente não tem condições de falar muito, é só isso o que eu tenho a dizer. (Gilson, 1980). O operador de áudio Flávio Botelho trabalhou durante 25 anos na emissora registrou como foi o fim da rádio siderúrgica: R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 115 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres Realmente durante 25 anos e 8 meses, eu labuto aqui na Rádio Siderúrgica Nacional diante de nossos amigos aqui, todos eles, muito bons amigos. E eu quero dizer que só conquistei amigos aqui. E é realmente lamentável o desaparecimento de nossa RS. Mas isso, o barco vai para frente. De forma que eu só quero agradecer, a presença dos nossos amigos, de ter trabalhado durante esse tempo todo com todo vocês. E de forma que realmente é lamentável o que está acontecendo, o que aconteceu, né. Mas, no mais vamos esperar 81, com toda a felicidade para todos, é o que eu espero que 81 aguarde a todos da mesma forma. (Botelho, 1980). O depoimento do radialista Edward de Carlos mostra que a emissora marcou a vida da cidade de Volta Redonda, porque fazia uma programação diferenciada, por isso, ela ainda continua presente na memória dos locutores: A Rádio Siderúrgica acabou? Não! A Rádio Siderúrgica não acabou, ela continua na memória daqueles que a vivenciaram, que a conheceram. Hoje nós temos outras emissoras, não querendo desfazer ou nem fazendo comparação. Mas igual à Rádio Siderúrgica, não. Porque a Rádio Siderúrgica era um tipo de rádio, as rádios de hoje são outro tipo. (Carlos, 2011). O ex-prefeito de Volta Redonda, Iran Natividade Pinto fez uma afirmação de como a CSN poderia ter mantido a emissora no ar, assim como fez com o seu hotel, cuja instalação manteve em funcionamento, apesar da privatização. Ela podia até fazer um trabalho igual ao que fez com o Hotel Bela Vista, a rádio podia estar aqui na mão de terceiros, porque era uma rádio excelente, local muito bom, tudo bom naquela rádio. Eu tenho saudade das coisas boas que acabaram em Volta Redonda, entre elas a Rádio Siderúrgica Nacional que pra mim ela já era patrimônio da cidade. (Pinto, 2011). Para o ex-funcionário da emissora Edward de Carlos existem dois fatores que podem ter levado ao fim da emissora, a privatização da empresa e o surgimento de novas emissoras. Para o radialista, diversas mudanças estavam ocorrendo na empresa que queria manter o foco na produção de aço, e a emissora ficou ultrapassada. Edward explica que: Primeiro porque aí ela já estava vendo o lado financeiro, a companhia começou a mudar. Essa é uma das causas que fez com que a rádio viesse a fechar. Já se pensava em privatização, a companhia já estava eliminando tudo que não fosse ligado à siderurgia. Já havia outras emissoras de rádio, como a rádio de Barra Mansa, que já tinha e outras que foram surgindo. A rádio não perdeu o seu valor. Mas ela não poderia competir com as outras emissoras, que iam evoluindo e a rádio não. Já não havia muito interesse da companhia em investir muito em rádio. (Carlos, 2011). Uma parcela dos moradores de Volta Redonda possivelmente era a favor da privatização, por desconhecer as suas consequências. A ouvinte a Rádio Siderúrgica, Neiva Carvalho destacou em depoimento que era: R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 116 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres [...] também muito leiga no assunto, era muito a favor da privatização, eu achava, porque tinha conhecidos que iam para a CSN abriam o ponto domingo, só para ganhar hora extra e ficavam na feira, na Vila, em frente ao Escritório Central, papeando. No final do mês vinha aquele pagamento gordo, entendeu? Então eu achava que tinha que privatizar, mas eu achei péssima coisa, hoje eu acho que foi um mau negócio. (Carvalho, 2011) Edward de Carlos em depoimento gravado um dia depois do fechamento da emissora, tenta explicar porque a rádio foi fechada: Porque a rádio não tinha fins lucrativos. Quando ela foi criada, a finalidade era entretenimento e lazer. Então ela foi nesse segmento até muitos anos. Porque a rádio não era para dar lucro. Era para proporcionar alegria, proporcionar satisfação aos seus funcionários. E, para a nossa surpresa, essa emissora foi desativada, de uma maneira até triste, com os homens dizendo, aqueles que dirigem que comandam que são superiores, dizendo que a emissora não cumpriu a evolução, que a emissora não acompanhou o progresso e que estava superada, isso pra gente foi uma punhalada no coração, porque não era a realidade dos fatos, a emissora não estava superada, ela estava em dia, a emissora estava acompanhando a evolução dentro de sua capacidade de interior. Além de perder aquilo de que a gente mais gostava, nós saimos praticamente desmoralizados, porque estávamos realizando um trabalho bonito, um trabalho correto e sério, atual. Enfim aqueles que não entendem de rádio, aqueles que não acompanham o rádio, não sabiam o que era o rádio local, anunciar que a rádio estava superada. Mas, de qualquer maneira, a luta continua, essa porta, essa janela se fecha, mas muitas outras portas se abrirão, E muitos outros companheiros que aqui conosco estiveram, lutando, trabalhando, tentando fazer o rádio verdadeiro, o rádio para a coletividade, infelizmente esse trabalho foi encerrado no dia 30 de dezembro. A família volta-redondense neste meio de comunicação, um dos mais eficientes do mundo ainda, que é o rádio. Nem a televisão quando veio, que todos pensaram que iria suplantar o rádio, não conseguiu, porque o rádio é o momento. O rádio é aquilo que acontece. A televisão vem sempre depois do rádio. O rádio nunca será superado. Em qualquer lugar onde houver uma pessoa, estará um rádio presente, porque o rádio de pilha, hoje acompanha todo mundo. (Carlos, 1980). O empresário tabelião Dauro Peixoto Aragão, de 80 anos, participou de um grupo que tinha o interesse de comprar a emissora da CSN, sobre o fato afirma que: Quando começaram os boatos de que ela ia fechar, vários grupos se propuseram a comprá-la, inclusive eu mesmo fiz parte de um, que não foi a frente depois. Éramos eu, Wandir Carvalho, Benevenuto dos Santos Neto, que foi prefeito depois, mais outras pessoas, nós estávamos formando um grupo para comprar a rádio, mas depois entrou o Leonardo Mollica, que sempre foi uma potência financeira econômica de Volta Redonda, eu acho que ficou com o Leonardo, não me lembro mais como foi o negócio. A siderúrgica depois privatizou, então acabou né, virou um emagrecimento total com grande prejuízo para a cidade. (Aragão, 2011). A programação musical continuou tocando já que a outorga de funcionamento da emissora ainda estava válida. Sobre esse fato o ex-funcionário da RS, revelou: R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 117 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres A rádio ficou, na época, em 1980, ela saiu do ar e permaneceu quase um ano só tocando a música. Porque na época, o ministério das comunicações, que, na época, era DENTEL, não permitiu que a rádio saísse do ar, porque a rádio tinha a função social, ela não era uma emissora rentável, não era usada para gerar recurso (Alves, 2011). O Jornal do Brasil publica uma reportagem destacando o acervo musical da Rádio Siderúrgica. Podemos ver o descaso da CSN em relação a tudo o que tem a ver com a emissora, já que a empresa iria leiloar os discos da extinta emissora. Apesar de a CSN, ainda como estatal, ter o interesse de resgatar o acervo da emissora, foi somente em 2006, já como organização privada, que os discos foram catalogados. A reportagem do Jornal do Brasil registra que: Os boleros, foxtrotes, tangos, sambas e canções italianas que embalaram os sonhos dos arigós – migrantes atraídos nos anos 40 à Cidade do Aço – vão voltar às vitrolas. Postos à venda em leilão, em agosto, 12 mil discos remanescentes da extinta emissora de rádio da Companhia Siderúrgica Nacional, desativada em 1980, serão preservados no arquivo sonoro que a empresa instalará em Volta Redonda, no Médio Vale do Paraíba. Da condição de sucata, o acervo passou a status de relíquia, por causa de muitas raridades de 78 rotações. (Jornal do Brasil, 26 dez. 1991) O fim da rádio Siderúrgica marca também um período de mudanças no rádio da região Sul Fluminense, os profissionais que trabalharam na emissora buscaram espaço em rádios de cidades como: Barra Mansa, Resende e Barra do Piraí. Em 15 de junho de 1982, com a presença do Ministro das Comunicações – Haroldo Corrêa de Mattos, dos diretores da RADIOBRÁS, das autoridades públicas e dos representantes do empresariado local foi inaugurada a Rádio Nacional de Volta Redonda que veio a funcionar nas antigas instalações da Rádio Siderúrgica. O acervo da Rádio Siderúrgica era extenso, após o encerramento da Rádio Siderúrgica Nacional, em 1980, sua discoteca ficou indisponível. Depois de alguns anos, parte desse acervo foi resgatado, higienizado e preservado para o acesso da comunidade. Através da Lei de Incentivo à Cultura, em 11 de abril de 2006, foi inaugurada a Fonoteca do Centro Cultural da Fundação CSN. Segundo os dados da Fonoteca da Fundação CSN aproximadamente 16 mil discos e os estilos musicais estão à disposição da população: São diversos estilos: Carmem Mirada, Emilinha Borba, Carlos Galhardo, Francisco Alves, Ademilde Fonseca, Barros de Alencar, LyrioPanicali, e seus internacionais de Cole Porter, Duke Ellington, Frank Sinatra, Doris Day, Elvis Presley, Rolling Stones, The Who e outros. Esse acervo da Fundação CSN conta ainda com 3 mil partituras históricas da Banda de Música da Companhia Siderúrgica Nacional, sendo a maioria em manuscritos e cópias raras de obras de grandes nomes do cenário musical brasileiro, como Carlos Gomes, VillaLobos, Ernesto Nazareth, Chiquinha Gonzaga e Radamés Gnatalli. No ano de 2008, foi inaugurada a Rádio Web Fundação CSN, com o objetivo de divulgar o acervo da Fonoteca e disponibilizar o catálogo para a comunidade. (Fundação CSN, 2009). R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 118 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres Mesmo com a criação do catálogo de alguns discos há ainda muito que ser feito, já que grande parte dos vinis, que tem discursos, programas e comerciais ainda não foram catalogados. Buscamos apresentar com os depoimentos o olhar dos radialistas, ouvintes, políticos sobre as questões que levaram ao fechamento da emissora. Vimos que é uma tarefa árdua tentar definir porque a emissora foi desativada, por isso, ainda é importante haver outras pesquisas, para que possamos percorrer outros caminhos e buscar novas respostas. Considerações Finais A realização desse artigo permitiu uma busca por fontes que revelassem como a emissora da CSN realizou os seus trabalhos durante os seus 25 anos de existência. Sem o aporte teórico, era muito complexo construir análises sobre a trajetória da emissora na cidade de Volta Redonda. Com a pesquisa em História, isso foi possível, porque ela prevê um embate entre as fontes e a historiografia sobre o período analisado e, com isso, possivelmente, conseguimos reunir um material de pesquisa mais completo sobre a emissora. O veículo de comunicação da CSN agregava à sua volta diferentes manifestações culturais e colaborou para uma formação do gosto musical dos operários. A emissora conseguiu, através da divulgação das informações, transmissão de eventos, divulgação de inaugurações da empresa, participar do cotidiano dos operários da CSN e promover o trabalhismo durante o período democrático. Formou-se assim uma comunidade de ouvintes, dentro de casa, no comércio e dentro da usina siderúrgica. A Rádio Siderúrgica foi assim companhia marcante e referência cultural para os milhares de moradores de Volta Redonda, a sociabilidade mediada pelo rádio, mencionado como um companheiro que instituiu vínculos de afetividade entre público e a emissora da CSN. A Rádio Siderúrgica Nacional (figura 1) foi desativada no dia 30 de dezembro de 1980, um veículo que de alguma forma contribuiu para o crescimento cultural e social da cidade de Volta Redonda. Concluímos que ela foi fechada porque realmente perdeu o seu intuito, que era formar a imagem de um trabalhador modelo para a CSN. Figura 1. Sede da Rádio Siderúrgica Nacional – (Arquivo da Fonoteca da Fundação CSN. Não há referência de ano e de quem foi o autor da fotografia) R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 119 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres Ao fim desta pesquisa, ainda há diversas questões que devem ser exploradas e esperamos que outros pesquisadores possam contemplar, com outros olhares, a trajetória dessa emissora. Para finalizar, ficamos com duas frases: a primeira é a do ex-funcionário Edward de Carlos “A Rádio Siderúrgica acabou? Não! A Rádio Siderúrgica não acabou, ela continua na memória daqueles que a vivenciaram, que a conheceram”. (Carlos, 2011). A segunda frase é de Mauro Tanury: Eu vou ficando por aqui para evitar as lágrimas. Como diz o compositor João Donato, numa uma de suas composições “Até um dia não é, até talvez, até quem sabe, gente bacana de Volta Redonda, que passa a ser, a partir desse dia 31, uma cidade emudecida. Vejam só, uma cidade emudecida. Tchau. (Tanury, 1980). Apesar de a Rádio Siderúrgica ter ficado emudecida no dia 30 de dezembro de 1980, foi possível, com essa pesquisa, explorar as fontes, para se fazer uma análise da trajetória de comunicação social. R. Mest. Hist., Vassouras, v. 13, n. 2, p. 107-124, jul./dez., 2011 120 O Fim da Rádio Siderúrgica Nacional Douglas Baltazar Gonçalves Artigos Livres Fontes Alves, Manuel. Manuel Alves. Depoimento [25 de maio de 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Alves, Manuel. Manuel Alves. Depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Aragão, Dauro. Depoimento [12 de dezembro de 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo empresário tabelião aposentado nomeado em 1953 pelo governador Amaral Peixoto. Botelho, Flávio. Depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Carlos, Edward. Depoimento [29 de maio de 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Carlos, Edward. Depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda. CARLOS, Edward. Depoimento [4 de dezembro de 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda Carvalho, Neiva. Depoimento [14 de dezembro de 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pela ouvinte Neiva de 70 anos, da Rádio Siderúrgica Nacional. CD com depoimentos dos ex-funcionários da emissora [31 de dezembro de 1980]. 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