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PRÁTICAS DE LEITURA E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS
MATEMÁTICOS: UMA ABORDAGEM DO RACIOCÍNIO LÓGICO
Adriane Roberta Ribeiro Macedo
Professora do IFMS – Campus Nova Andradina. Doutoranda
[email protected]
André Suehiro Matsumoto
Professor do IFMS – Campus Nova Andradina. Graduado
[email protected]
RESUMO: De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais, é tarefa da escola
formar um indivíduo crítico, transformador e atuante na sociedade em que vive. Mas tal
compromisso não é assim simples de ser contemplado, a disciplina de Matemática pode
oportunizar situações que desenvolvam no educando a competência para resolver
problemas. Entretanto, o educando demonstra certa dificuldade em solucionar situações
problemas. Acredita-se que um dos fatores responsáveis por esta dificuldade é a nãoconstrução de uma competência para interpretação de textos relacionados com a
Matemática. O objetivo deste trabalho é compartilhar a experiência de um projeto de
pesquisa que visa a tal competência, a partir da integração entre a Matemática e a Língua
Portuguesa. A intenção é apresentar os resultados obtidos a partir da elaboração e aplicação
de atividades de interpretação textual que envolva raciocínio lógico.
PALAVRAS-CHAVE: Interpretação de textos, Matemática, Resolução de problemas.
Introdução
A partir da constatação de que a escola está compromissada em formar um
educando capaz de construir estratégias para resolver situações problemas, evidencia-se a
necessidade de uma práxis educativa que ofereça oportunidades de discussões sobre
possíveis problemas que poderão aparecer na vida real. Para que isso aconteça de modo
efetivo é primordial que o processo ensino aprendizagem contemple propostas de
atividades voltadas para a construção de estudos e propostas que visam contribuir para a
superação destas dificuldades. O baixo aproveitamento dos alunos nessas atividades no
decorrer do processo e no sistema de avaliação
tem demonstrado que os educandos
encontram dificuldades em interpretar questões que envolvam a lógica e em exprimir
seus pensamentos. Particularmente, na disciplina de Matemática nota-se que a maioria dos
alunos não solucionam as questões propostas porque não as entenderam, ou seja, não
conseguem interpretá-las.
De acordo com Rabelo (2002) “a
hipótese
de
que
um
dos
elementos
fundamentais que contribuem para esse fracasso é a não-construção de
uma
competência para interpretação de textos relacionados com a Matemática”.
Tendo em vista a afirmação do autor, desenvolveu-se um projeto numa instituição
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pública da cidade de Nova Andradina com alunos de ensino médio, nos quais constatou-se
deficiências em conceitos básicos de interpretação em textos matemáticos e de língua
portuguesa.
O projeto tem como objetivo principal, investigar uma metodologia que contribua
para a construção da competência da interpretação de textos que exijam raciocínio lógico.
Procurou-se desenvolver a competência para interpretação de textos que proponham
problemas, porque acredita-se ser o principal fator que influencia na capacidade de
resolver problemas. Partindo do princípio da ação-reflexão-ação (SHÖUN apud NONO,
2002), os autores elaboraram atividades com textos matemáticos escritos e falados,
priorizando a interpretação e a produção.
Trata-se de uma pesquisa qualitativa, que integra a matemática e a língua escrita,
apoiando-se em Malta (2003), que afirma:
-Em matemática, a capacidade de expressar-se com clareza o raciocínio é equivalente a
capacidade de entender os resultados matemáticos. Em particular, o desenvolvimento
da capacidade de expressão do próprio raciocínio promove o desenvolvimento da
capacidade de compreensão em matemática. -O desenvolvimento da capacidade de
expressão está acoplado ao desenvolvimento da capacidade de leitura, isto é, a
capacidade de aquisição de conhecimentos sem intermediários. (MALTA, 2003, p. 21)
Nesse sentido, a apreensão do conhecimento não acontece de maneira fragmentada
contrariamente se consolida de forma inter e multidisciplinar, salientando que para cada
disciplina emprega-se
conceitos distintos mas que podem ser interligados a outras
disciplinas.
Acredita-se que as dificuldades na apropriação de conceitos
abstratos
da
matemática estão inter-relacionados aos déficits em língua materna, assim como a
ineficiência
relacionada
no desenvolvimento da capacidade
com
a
dificuldade
de solucionar problemas
está
de interpretação de textos. O trabalho com textos
matemáticos objetiva corroborar para o desenvolvimento da habilidade de “ler”,
de compreender as informações nos textos e adquirir conhecimentos a partir desta
leitura. A partir do desenvolvimento da capacidade de leitura e compreensão de textos,
o aluno será capaz de
demonstrar de forma organizada o raciocínio lógico e traçar
estratégias de solução para a situação proposta.
A proposta foi desenvolver a competência da interpretação de problemas e não
utilizar a “Resolução de Problemas” como metodologia, o objetivo não foi
desenvolver os conceitos matemáticos envolvidos nos textos, porém, os problemas foram
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resolvidos e houve a socialização das resoluções.
Textos matemáticos
Entende-se como texto matemático “uma composição de elementos da Língua
Materna e da Matemática, referindo-se, portanto a elementos reais- ou relacionados
com objetos reais- e a entes puramente abstratos” (DEVLIN, 2004 apud COURA,
2006). Dessa forma, compreendeu-se a especificidade da leitura de textos matemáticos, lêlos exige conhecimento de termos específicos para que se construa o sentido.
Para Diniz e Smole apud Coura (2006) :
(...) o texto matemático, escrito na Língua Materna, traz alguns termos pouco utilizados na
fala coloquial- por exemplo: efetue, analise,decomponha- e por vezes retrata situações
artificiais que não fariam pouco sentido se deslocadas para a realidade.(DINIZ e SMOLE
apud COURA, 2006, p. 32 )
Com base nisso, iniciou-se a intervenção com textos que possuíam uma linguagem
mais simples, mais próxima do cotidiano e gradativamente inserir termos mais formais e
específicos.
Adotada esta proposta surgiu a necessidade de se estabelecer quais seriam os
textos utilizados, para tanto, adotou-se primeiramente a classificação feita em
(RABELO, 2002). Ele classifica cinco grupos de “textos matemáticos”, que são:
1) “Histórias Matemáticas” (Histórias fantasiosas que envolvem matemática, como as
de Malba Tahan);
2) “História da Matemática” (textos que comentam a história do conhecimento
envolvendo a pesquisa, a descoberta e a construção do conhecimento no sentido
filogenético);
3) “Personalidades
da
Matemática”,
que
são
textos contando
a
história
de
personalidades envolvidas com a construção do conhecimento matemático;
4) “Curiosidades matemáticas”, que
são
textos mostrando sempre algo curioso
e pitoresco envolvendo a matemática;
5) “Matemática do cotidiano”, que são textos do dia-a-dia, como por exemplo, textos
jornalísticos, listas de preços, etc.
Optou-se a princípio por trabalhar com “Histórias Matemáticas”, “Curiosidades
Matemáticas” e “Matemática do cotidiano” por terem maior relação com os objetivos
estabelecidos.
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O desenvolvimento do projeto
Feita uma avaliação diagnóstica com os alunos envolvidos, esses demonstraram
que a Matemática, bem como, os problemas são vistos de forma estereotipadas, causando
desinteresse pelas atividades. Assim, a primeira intervenção foi o desenvolvimento de
atividades motivadoras.
O primeiro texto foi um problema matemático na forma de história em quadrinhos.
De modo geral não tiveram dificuldades em interpretar o texto,
mas, as apresentaram
quando a proposta foi a de registrar o raciocínio desenvolvido para resolver o desafio.
Posteriormente foi pedido a eles que produzissem um texto em quadrinhos que
se configurasse como
um
desafio
matemático. Essa atividade não surtiu resultado
positivo, já que os educandos, em sua maioria, não conseguiram elaborar um problema.
Uma forma de dinamizar a atividade foi o uso de um software específico para
criação de histórias em quadrinhos, recurso esse que despertou o interesse do educando.
Enfatiza-se então, a importância das tecnologias inovadoras no auxílio da práxis
educacionais na construção um ambiente motivador e autoaprendente.
Encerradas as aulas com histórias em quadrinhos foi proposto um texto do Malba
Tahan, o problema dos 35 Camelos. A dificuldade verificada, nessa ação interventiva,
foi a compreensão da formalidade linguística.
Tendo em vista que a transdisciplinariedade e a motivação
do educando é
primordial para a obtenção dos resultados, introduziu-se gradativamente textos mais
elaborados, mas optou-se por continuar com histórias virtuais, as quais possibilitaram o
desenvolvimento da criatividade na produção de desafios e problemas .
Um fator problemático que foi detectado, é essa relação dos alunos com textos
escritos, pois os alunos, durante o seu processo histórico, não tem contato frequente com
diferentes tipos de leituras, nem demais modalidades textuais o que se reflete na produção
que é limitada. Assim, é necessário priorizar atividades em que os alunos tenham contato
com outras modalidades textuais, dessa forma aprimorando o raciocínio e o repertório
discursivo.
Segundo Moura (1996) apud Andrade e Grando (2006):
(...) a história virtual do conceito são situações-problema colocadas por personagens
de histórias infantis, lendas ou da própria história da matemática como
desencadeadoras do pensamento da criança de forma a envolvê-la na construção da
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solução do problema que faz parte do conteúdo da história.(MOURA, 1996 apud
ANDRADE e GRANDO, 2006, p. 24)
Esclarece-se ainda que o objetivo da utilização de histórias virtuais não foram
calcadas no desenvolvimento de conceitos matemáticos, mas especificamente na
construção da competência de interpretação de textos matemáticos, aproveitando-se
principalmente do caráter lógico que estas histórias proporcionaram.
A atividade de contar, ouvir e produzir histórias envolveu os alunos e nós
professores, colaborando de maneira especial para obtenção dos resultados. A primeira
história virtual utilizada foi a lenda “Negrinho do Pastoreio”. Inspirados no trabalho
de (ANDRADE e GRANDO, 2006) a lenda foi contada aos alunos com o intento de
que eles identificassem o problema que era: O “Negrinho do Pastoreio” não sabia contar e
necessitava de uma forma de controlar a quantidade de animais que voltava para o curral à
noite senão seria castigado. Partindo dessa situação cada um desenvolveu uma maneira de
ajudar o personagem, solucionando o problema.
O fato do texto ter sido exposto oralmente
facilitou a interpretação. Eles
apresentaram diversas soluções como por exemplo, associar a quantidade de animais que
iam para o pasto a objetos como pedrinhas ou que o Negrinho fizesse marcas para
cada animal que saísse, ou ainda agrupá-los em pares. As respostas foram socializadas
oralmente. No entanto, para transpor à parte escrita o raciocínio eles ainda apresentaram
dificuldades.
Outra atividade proposta foi
a partir
história virtual “A caça ao tesouro”,
adaptada do livro “A Carta do Pirata” de Heloísa Prieto e Lídia Chaib. Esta história não
foi contada, os alunos receberam o texto escrito. Tratava da história de dois irmãos que
encontraram, em uma praia, um mapa do tesouro do Pirata Barba Ruiva e resolveram
seguir as orientações para encontrar o tesouro. Ao fazer isso, depararam-se com um
problema: deveriam contar passos e seus pés eram menores, a metade do tamanho
do pé do pirata. Após o texto haviam duas atividades:
1 - O que você faria, se estivesse no lugar das crianças para encontrar o tesouro?
2- Solte sua imaginação e crie uma aventura que contenha desafio matemático.
A maioria dos alunos necessitou da intervenção dos professores para entender
o problema e a relação “metade” e “dobro”. Pós terem entendido apresentaram as
soluções para o problema, salvo a dificuldade da escrita dos argumentos. As
aventuras criadas por eles ficam muito próximas das ideias da história proposta
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inicialmente, inclusive a maioria tenta usar os mesmos conceitos de matemática.
A última história trabalhada foi a “Missão de Valiant”. No intuito de atrair o
interesse dos alunos a atividade foi realizada em três etapas: Primeiramente, os alunos
assistiram a uma parte do filme “Valiant, um herói que vale a pena.” É a história do
pombinho Valiant, que sonhava em fazer parte da „Equipe dos Pombos Correios‟. Ele
consegue ingressar na equipe e faz alguns amigos, que partem para uma importante
missão. Os alunos assistem até esse momento. Um dos autores deste trabalho desenvolveu
um software específico para a missão de Valiant, ele contém desafios em forma de
problemas matemáticos. Para avançar na missão os alunos
precisam
resolver
os
problemas. Este trabalho trouxe ótimos resultados, pois os alunos se empenhavam
em entender e resolver os problemas para prosseguir na missão. A terceira etapa foi a
produção de um novo desafio para a missão, cada um deles propôs o seu e o melhor foi
inserido no software “Missão de Valiant”.
Resultados obtidos e conclusões
Em virtude do desenvolvimento de uma investigação predominantemente
qualitativa, como elementos para avaliação dos resultados utilizou-se os textos
produzidos pelos alunos e os registros dos pesquisadores.
Fazendo um intertexto entre as práticas linguísticas e a pedagogia progressista
crítico-social defendida por Libâneo (2004), percebe-se que uma das raízes do problema é
o fato da ausência da autovalorização dos alunos e da linguagem utilizada por eles. A partir
do momento em que eles percebem que não é “feio” transpor seu raciocínio e que não
serão julgados por isso, eles passam a se comunicar e a deixar as ideias fluírem
verbalizando estas ideias e dessa forma surge o interesse em aprimorar as competências em
interpretação textual. Assim, respeitando as diferenças é que se abre o caminho para o
enriquecimento mútuo e a descoberta do outro.
O trabalho interdisciplinar por meio de histórias em quadrinhos, histórias virtuais e
outros tipos de textos
alcançou resultados satisfatórios. Os alunos mesmo diante de
suas dificuldades se aventuraram em criar histórias e desafios matemáticos. Eles também
prestaram atenção na importância de se organizar o raciocínio e de se transcrever para
a forma escrita o pensamento, verificando o que foi proposto por (PIAGET apud
RABELO,2002), “cada disciplina emprega parâmetros que são variáveis para outras
disciplinas”.
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Com o desenvolvimento das atividades eles mudaram de postura diante de um
texto na aula de Matemática, ao recebê-lo buscavam interpretá-lo e descobrir qual
era o desafio matemático contido. Alguns alunos revelaram uma evolução boa na
capacidade de interpretação e, para a maioria dos envolvidos, houve um avanço sutil.
Ao se considerar as dificuldades iniciais em relação à produção textual
verificou-se que as crianças também avançaram, ficando evidente que a longo prazo
este tipo de intervenção proporcionará resultados significativos.
Conclui-se que a leitura e produção de textos matemáticos contribui para a
construção da competência de resolução de problemas. A familiarização com termos
específicos da linguagem matemática favorece o entendimento dos problemas.
De acordo com (SMOLE e DINIZ apud COURA, 2006), “não basta atribuir as
dificuldades dos alunos em ler textos matemáticos à sua pouca habilidade em ler
nas aulas de língua materna” e de acordo com o que foi observado a partir desta
proposta metodológica, é necessário pensar na formação do aluno como um todo, um
cidadão capaz de ler nas diversas linguagens, de se expressar claramente e agir refletida e
criticamente.
Entende-se que a interpretação e produção de textos matemáticos devem ser
compreendidas de forma acessível, pelo educando, trazendo de uma necessidade prática à
notação, desta forma resgatando as habilidades cognitivas e a importância da matemática
como um todo.
Assim, acredita-se que o professor tem uma função social, ou seja, ele tem o papel
de auxiliar o aluno a construir conceitos, ideologias e contribuir na sua formação, tendo
como foco este objetivo, a leitura e produção de textos devem ir além das aulas de língua
materna, é preciso romper as barreiras das disciplinas e tornar-se uma ação multi e
interdisciplinar.
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em http://www.fae.ufmg.br:8080/ebrapem/comunicacoes.htm, acesso em 09/10/2006.
COURA, F. C. F., GOMES, M. L. M. Matemática e Língua Materna: propostas para
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http://www.fae.ufmg.br:8080/ebrapem/comunicacoes.htm, acesso em 09/10/2006.
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Aprendizagem profissional da docência: saberes, contextos e práticas. São Carlos:
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RABELO,E.H. Textos Matemáticos- Produção, Interpretação e Resolução de
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TAHAN, M. O homem que calculava. Rio de Janeiro: Bloch, 2001.
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