O orçamento 2013
a Economia Real e o Outsourcing
“(...)os preços que
pagamos por um
serviço feito por uma
empresa externa
(outsourcing) devem
ser o correspondente a
um serviço excelente,
transparente,
facilmente auditável
e que, acima de tudo,
que não seja possível
fazê-lo com a mesma
qualidade com pessoal
interno. Ora se assim
não for, o produto será
menos especializado,
logo mais perto do
resultante de um
processo de
internalização. ”
André Sardinha
Diretor do Serviço de Operações Hoteleiras do CHSJ,
EPE. Licenciado na Universidade Lusíada do Porto.
56 | Julho - Dezembro 2012 Hotelaria&Saúde 2
N
a altura em que escrevo, não sabe-
estrutura de custos e o seu nível de receitas, não está a
mos ainda qual o orçamento que
criar valor (mais - valias). Basicamente, e numa lingua-
regerá o país no ano 2013. No entanto, e como é público, é intenção
do atual Governo de Portugal atenuar o pagamento
da taxa social única (TSU) às empresas e agravá-la
para os colaboradores das mesmas.
No mercado, o que se espera, pelo menos em
teoria, é uma diminuição dos custos de produção
por parte das empresas, por via da diminuição dos
encargos com o pessoal e também, ainda que indiretamente, por via da diminuição do preço esperado de
alguns fornecimentos e serviços externos. Como tem
sido amplamente veiculado, esta diminuição de custos de produção poderá ser útil para as empresas exportadoras pois, produzindo a preços menores, poderão tornar-se mais competitivas em relação aos seus
concorrentes, podendo, assim, aumentar o volume de
exportações e penetrar em mercados em que o novo
preço de produção o permita. Mas, desenganem-se os
que pensam que esta alteração apenas influenciará as
empresas exportadoras de bens e serviços. De facto,
para as empresas que atuam no mercado nacional e,
sobretudo para aquelas em que o peso do fator trabalho no total de custos é elevado, como por exemplo,
na área da higiene e limpeza e segurança e controlo,
a diminuição da TSU poderá implicar uma diminuição
do preço de venda do bem ou serviço, mantendo a
empresa a sua margem de comercialização. Juntando a diminuição da TSU o facto de, em 2012, o setor
privado ter assegurado o pagamento de 14 salários
aos seus colaboradores e, segundo proposta para orçamento de 2013, ter que assegurar o pagamento de
13 salários mais 1/12 de salário, os preços do próximo
ano poderão ajustar em baixa. A dimensão da queda
de preços será tanto maior quanto maior for o peso da
massa salarial no total dos custos da empresa.
Estes podem ser os efeitos imediatos da medida
orçamental. No entanto, nem sempre o plano teórico
se sobrepõe à economia real e às condicionantes dos
agentes que atuam na economia. A situação atual de
algumas das empresas que atuam no mercado português é de enormes dificuldades económicas e/ou
financeiras. Uma nota para a distinção entre dificuldades económicas e dificuldades financeiras: as primeiras, para uma empresa que o seu objetivo seja o lucro,
são mais críticas, uma vez que a empresa, dada a sua
gem mais ligeira, o negócio não é rentável e para o
ser, teriam que ser revistos os custos de funcionamento e outros, bem como a política de preços. Um mau
desempenho económico sucessivo, por exemplo, três
ou quatro anos a gerar prejuízos, poderá ter como
consequência a existência de dificuldades financeiras
na empresa. Os problemas financeiros começam a ser
verificados ao nível de tesouraria e com a constatação da dificuldade em fazer face aos compromissos
operacionais das empresas, como por exemplo, pagamento a fornecedores de bens e serviços. Embora não
tão graves, mesmo em empresas que não tenham
problemas económicos, ou seja, empresas com viabilidade económica, poderão surgir problemas financeiros, pois estes estão relacionados também com fluxos
de entrada e saída de capital, que nem sempre estão
ajustados às necessidades das empresas.
© Dominik Gwarek
André Sardinha
Gestão
A atual falta de liquidez no mercado, devido à
crescente dificuldade de acesso ao crédito bancário,
agravou seriamente estes problemas nos últimos
dois anos. Assim, perante as dificuldades económico-financeiras das empresas, estas optarão, em vez
de baixar o nível de preços praticados, por manter
o preço e, assim, aumentar um pouco a margem de
comercialização. Esta convicção é reforçada quando
olhamos para o nível dos decisores da maioria das
empresas inseridas no nosso tecido empresarial. A
par dos fatores culturais e históricos, a reduzida dimensão do mercado interno, os condicionalismos
concorrência. Infelizmente, a nossa cultura empresarial nunca foi uma cultura de concorrência, de agressividade perante as outras empresas que operam no
mercado. Mesmo em relação a alguns setores onde
atuam grandes empresas, esta ideia é uma evidência.
Transportando esta linha de pensamento para a
área hoteleira e para os seus prestadores de serviços,
a diminuição dos custos com o pessoal, e dada a
natureza das empresas do setor, poderia originar a
diminuição do preço praticado num intervalo de 5
a 9%, ceteris paribus. Estarão as empresas dispostas
a isso? Qual será a reação do mercado? O que será
expectável é que as empresas que apresentem uma
situação económico-financeira relativamente saudável possam surgir mais competitivas, abordando o
mercado com preços abaixo dos praticados em 2012
e ganhando, assim, quota de mercado. Fora do normal será estas empresas reagirem mantendo os seus
preços, a sua estrutura e não investirem na formação
e inovação. Outras empresas que estejam numa situação mais periclitante aproveitarão a oportunidade
para se recomporem e, se tiverem margem para tal,
efetuar algum ajustamento do preço em função do
novo preço médio de mercado para 2013.
Em resumo, as empresas, com a diminuição dos
custos com pessoal, ou baixarão os preços e/ou
aproveitarão para aplicar a “folga”, formando recursos
humanos e inovando em técnicas ou melhorarão a
sua situação financeira.
A minha convicção é que as empresas não irão
fazer ajustamentos nos preços e que aplicarão essas
verbas em formação e inovação oferecendo, no final,
um produto melhor a igual preço. Recomendaria o
mesmo às empresas prestadoras de serviços na área
hoteleira – limpeza, segurança, ambiente, lavandaria, alimentação – até porque, na minha modesta
opinião, estas empresas estão a ser simplesmente
esforçadas e não competentes em toda a linha. Aliás,
a dicotomia chave da economia atualmente é a prestação de um serviço com a mesma ou maior qualidade pelo mesmo ou menor preço. Honestamente,
não obstante o caráter de imprescindibilidade de
grande parte das tarefas, parece-me óbvio que a
prestação de serviços integrados no setor hoteleiro
(pelo menos, hospitalar) vai acabar por ser preterida
© Vera Reis
legais e a conjuntura económica, não fomentam a
em detrimento de serviços de maior prioridade, pelo
menos a parte relativa aquela que não é, de facto,
imprescindível para a permanência do doente. Será
assim se as empresas o quiserem, se nada fizerem. Se,
no entanto, aquelas atuarem de forma a tornar o seu
produto mais atrativo e eficiente, criarão um produto
que poderá ser imprescindível à atividade hospitalar
garantindo uma excelente relação custo benefício.
Se formos atrás na história, recordamos que as
instituições de saúde começaram a fazer outsourcing
nestas áreas pela incapacidade que tinham em fazer
as coisas bem, e também para transferirem a responsabilidade do fornecimento de refeições, da limpeza
das enfermarias, da vigilância das portas, da higienização de roupa hospitalar e de transporte e tratamento de resíduos, exemplos de atos operacionais
de cada instituição que, sendo simples, precisavam
da consistência que os prestadores de serviço garantiam. No entanto, hoje em dia pede-se mais: pedese que sejam profissionais em todas as suas ações,
pede-se que prestem um serviço às instituições de
saúde que marque a diferença junto dos profissionais e dos utentes, pede-se que saibam medir objetivamente a qualidade, pede-se que quantifiquem a
mais-valia que trazem como prestadores de serviços
especializados e, a par disto, pede-se que o façam
a um preço enquadrável no orçamento disponível.
Ora, todos sabemos que os orçamentos disponíveis
para a Saúde em geral, e para a área hoteleira em
particular, têm tendência a diminuir de ano para ano.
Por isso, creio que os próximos dois/três anos serão
decisivos para as empresas prestadoras de serviços
na área hoteleira: ou serão anos em que apostando
na inovação, na formação e qualificação do pessoal,
na diferenciação e especialização do produto vendido, no controlo de preços praticados através da
minimização do lucro, conseguirão manter ou até
alargar a sua quota de mercado ou, caso contrário,
se nada fizerem, perderão gradualmente quota para
outras empresas do setor ou ainda, no limite, assistirse-á a um processo de internalização destes serviços.
E porque poderá ocorrer uma internalização destes
serviços? Simples a resposta: porque os preços que
pagamos por um serviço feito por uma empresa
externa (outsourcing) devem ser o correspondente
a um serviço excelente, transparente, facilmente
auditável e que, acima de tudo, não seja possível
fazê-lo com a mesma qualidade com pessoal interno. Ora se assim não for, o produto será menos
especializado, logo mais perto do resultante de um
processo de internalização. Resumindo, e tendo em
conta as pressões orçamentais existentes e esperadas nos próximos anos, ou as empresas prestadoras
de serviços apresentam produtos diferenciadores e
que justifiquem o preço pago, ou assistir-se-á a um
processo de internalização dos serviços, utilizando o
Know-how entretanto adquirido pelos colaboradores
ligados a cada um dos setores. Reforço que os produtos diferenciadores só se conseguem com formação e inovação, portanto.
“(...) as empresas, com a diminuição dos
custos com pessoal, ou baixarão os preços e/ou
aproveitarão para aplicar a “folga”, formando
recursos humanos e inovando em técnicas ou
!*
Julho - Dezembro 2012 Hotelaria&Saúde 2 | 57
Download

descarregar documento associado ao artigo