Leonor Lopes Favero Universidade Examinando-se de Sao Paulo as obras dos primeiros gramaticos por- tugueses (Fernao de Oliveira, Joao de Barros, Pero de Maga- Ihaes de Gandavo e Duarte Nunes do Liao), observa-se que, lado dos problemas gramaticais, se coloca a questao ortografi- ca; esses gramaticos e ortografos nao eram foneticistas fooologos mas predominantemente ao nem ortografos. Como diz Buescu (1978, 31-2): " •••a anarquia ortografica proveniente da ruptura entre as 1Inguas vernaculas e qualquer forma de codifica~ao. durante a Idade Media, tornava-se agora num grande inconvenie~ te, mais sensivel apos 0 aparecimento qUente difusao e mUltiplica~ao da imprensa e a conse- das obras em vulgar~ A escrita pressupoe uma representa~ao grafica da pr£ nuncia. havendo necessidade de se adotar um sistema ortografico capaz de conciliar palavra e escrita e, se ha, no seculo XVI, liberdade ortografica. ha tambem entre os ortografos consenso de que a melhor grafia e a que mais se aproxima 0 da pronuncia". As primeiras tentativas de sistematiza~ao rem, que esse mostram,p£ acordo e apenas teorico, pois a formula~ao regras varia segundo 0 autor que, na maioria das vezes, das fica entre a et1molog1a e a realidade da lIngua. Ass1m, por exemplo, os conceitos de ~ e letra a1n da nao estao bem def1nidos. Para Olive1ra letra e f1gura de voz e sllaba e uma voz formada por uma ou ma1s letras; para Barros, letra e a menor parte da d1c~ao e voz e formada por vogal e consoante;L1ao d1st1ngue voz (=som) de letra (=f1gura) que representa a voz. mas, na questao do ~ confunde esses conce1tos ao d1zer que nao e letra, mas f1gura de aspira~ao. h Em rela\<ao a classlflca\<ao das vogals, tingue aproximadamente dis- oito (8) vogais orais, pois nas "letras" ~ ~ 2 faz distIn\<ao entre ma de grande e pequeno, 0 fonema abarto e interpretando-os, italiana 0 fechado que cha- talvez, longo. Barros usa a me sma terminologla, Buescu, influencia OliveIra como curto e refletindo, (talvez Tolomei), segundo opiniao nao par- tilhada por Coseriu: "Os termos que To 1ollie 1 emprega nos seus trabalhos f2 neticos nao sao 'grande' e 'picolo', mas 'chiaro' e 'fosco'. Joao de Barros tao aberta quanta inescrupulosamente copia Ne- brija, tomando-lhe entre os quais exemplos literalmente numerosos exemplos, do proprio autor, sem entretanto uma unica vez ••• Ele, na verdade, zes como neste caso, Oliveira, cita-lo segue Nebrija, e nos incoerente nem e, algumas ve e incapaz critica e, muitas vezes, nao entende seus modelos". de (p. 44) E mais adiante: "Uma Influencia da gramatica (e, no caso, do usa de ~ so poderia pelo contrario possivel refere aOs termos provad~. isto e, tratar-se sobre OlIveira de TrissImo) - embora nao evldentemente, no que 'grande' e 'pequeno' - mas ela nao pode Alias, Oliveira meio cultural italiana so chega a um contato italiano depois do aparecimento por volta de 1540, quando empreende e, se ser direto com 0 de sua gramatica, t'ma viagem a Ita- lia". (p. 45-6) Note-se, tambem, que NebrIja, se para a grafia etimologica brasao da latinidade fechada), ou historica, (no espanhol incllna- considerando-a 0 nao existe a oposl\<ao aberta/ e no ItalIano ha abertura tambem a ~ por exemplo, e fechamento OliveIra refere-se aberto e fechado; OlIveIra coloca acento nas vogals, provavelmente para ~ 2, mas alem disso, por Influen- cIa arabe. Liao diz que essa distIn\<ao nao e valIda vogais abertas nenhuma diferen\<a temos e que "nas das latlnas". "0 ser grande e e pequeno consiste na longura e espa\<o da pronuncla- c;ao e nao na maneira dela". Coloca-se, etimologica, reivindicando dade; em outros momentos, para 0 portugues ortograf1cos posiC;ao a noc;ao de quantiassume posiC;ao modernos: J e ~ vogais acustica e ~oneticamente ! de J e ~ de ~ - distinguindo - distinguindo - reservando na po rem , esse ortogra~o mais proxima dos criterios ! e ~ portanto, semivogais de 0 ~ so para os vocabulos de origem grega e tambem no usa dos acentos que marcam a tonicidade abertura e 0 uso de ~ (conservando Enquanto 0 ~ e abolindo 0 latim era, para os gramaticos metade do seculo, apenas um instrumento do 0 das linguas wigares, e nao !). da primeira norteador para 0 estu- para os da segunda metade, 10rizaC;ao dessa lingua ~eita pela escolastica, entre as duas linguas deve ser minimizada: a com a va- as di~erenc;as ha, assim, uma pre£ cupac;ao de se ~ixarem as mesmas vogais para as duas. Quanto a plicita do criterio anteriores etimologia, com Gandavo he. a introduc;;ao ex- etimologico usaram 0 criterio gico re~lete um processo na ortogra~ia: ~onetico; telectuais para bem e~ 0 latim e 0 grego. Esta elitizac;ao continua no seculo seguinte Seve rim Faria, Ferreira Franco Barreto), a introduc;ao do etimol£ de elitizac;;ao da escrita: crever e preciso conhecer de Roboredo, os grame.ticos (Amaro de Vera, Bento Pereira pois saber escrever di~erencia os nobres e e in dos incultos: "0 ~allar he cousa de muitos; os que escrevem ~ormac;ao latinista ao criterio etimologico que exigia (nao nos esquec;amos de que estamos gime da Inquisic;ao que combatia um dos instrumentos 0 correc;ao era a semelhanc;a com 0 latim; escrevia latim: a nobreza e definida e sob 0 r~ estudo das linguas wigares, de propagac;ao da Re~orma). A ortogr~ia obrao (Vera) Da-se pre~erencia 0 de poucos: sabem; e os que muito ~allao errao, e pouco, e sabem menos". quem conhecia e 0 escrever 0 0 criterio de bem somente clero. por Vera como "a arte de es- creVer as vozes e as letras divididas a direita pronunciac;ao e segundo sua origem". Ve-se que a ortograf'ia servia a pronUncia e a etimologia. A obra de Vera, cujo primeiro "Que cousa seja orthographia teza", apresenta capitulo se intitula e quanto importa escrever vinte e cincO capitulos dedicados das letras e uma ultima parte estabelecendo com cel: ao estudo vinte e nove regras ortograf'icas. Esse interesse pelas questoes momento historico Imperio, cando 0 estudar as outras estudo do portugues A escrita, ditas"(p. limitado dos principios um instrumento "para grande que consagra da veicula~ao a cultura da verdade e da Igreja: "Devemos escrever mo escrevemos. ortografia. de coisas feitas e palavras Assim, e um elemento laica e religiosa, fi- da vida hUmana, e para tesou- de acontecimentos 63) • a como pronunciamos De outra maneira e pronunciar sera nosso escrever co- mentiroso, porque se mente no falar, quem fala contra 0 que entende, bem mente no escrever, 0 que pronuncia". (Bento Pereira, nua a modalidade quem escreve contra de letra e voz pouco avan~aram: oral mesclada a modalidade letra como a menor unidade Vera e de VOZi continua a entre letra e som, ora com criterios neticos: a silaba e f'ormada por uma ou mais letras. graficos, estudo da silaba ganha novos contornos, se ao estudo da estrutura que podem ser combinadas silabicai prendendo- assim, letras das palavras compostas e das le- Severim Faria af'irma que a beleza do Portugues reside na suavidade soantes mudas. descrevem, ora f2 numa mesma silaba, letras que podem terminar silaba e as divisoes tras dobradas. conti- escrita. confusao o tam- 1666: 26). Os conceitos Barreto definem 0 do areas gramaticais, segundo Vera, foi inventada da religiao e ornamento ro, e custodia ref'lete no qual, apenas do latim, lingua da Fe e se deveriam misterio ortogr8ricas de suas silabas que nao admitem varias co~ Quanto ao acento, confundem-no com que os acentos grave, agudo e circunflexo latim, dizendo 0 bida e descida da voz, porem. como nao conseguem se fenomeno no Portugues. propoem 0 usa a estao ligados explicar sues- do acento como dife- renciador. A obra de Vera (1631), escrita apresenta criticas ao espanhol minador e do dominado), o LL e sob (rivalidade grifo espanhol. 0 entre lIngua do d2 como a superioridade do LH e NH sobre ft. Pereira bom portugues e Barreto mantem a visao elitista era a variedade da lIngua: usada pela classe dominante suas obras eram de grande aux!lio a na~ao portuguesa BARRETO, I. F. (1671). Ortografia Officina e pois en- da Lingua Portugueza. Lisboa, de Ivam da Costa. BARROS. J. (1540). Grammatica da Lingua Portugueza. 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