Formando Leitores na Escola Rosemeri Fraga da Rosa1 Resumo: Este artigo resultou de um estudo sobre a importância da formação de leitores dentro do ambiente escolar. Apresenta sugestões de como a leitura pode ser trabalhada na escola, partindo da realidade do aluno e das características da faixa etária destes. Palavras-chave: aluno, encantamento, escola, leitura e professor. Abstract: This paper resulted from a study on the importance of training of readers within the school environment. Suggests how reading can be taught in regular schools, based on the student's reality and characteristics of these age groups. Keywords: student – enchantment – school – reading - teacher. 1. Introdução O encantamento pela leitura pode ser despertado nos primeiros meses de vida; o bebê lê, claro que não uma leitura através de palavras, mas através de imagens. Desde quando a criança começa a enxergar, ela vê placas, rótulos, outdoors, embalagens, jornais, revistas; através deste contato ela vai identificando as escritas e formando o seu conceito de leitura. “A criança entra em contato com a linguagem das gravuras antes da linguagem das letras. Uma vez que ela já aprendeu a entender o significado das figuras, é necessário que o material de leitura inicial as contenha em grande número. As ilustrações exercem uma atração redobrada sobre os principiantes e os maus leitores: elas ornamentam o texto, estimulam o interesse e dividem o livro de modo que a criança possa virar as páginas com freqüência e ter a impressão de estar lendo depressa. As gravuras ajudam a tornar o texto compreensível.” (BAMBERGER; RICHARD,1977, p.50) Mas, a realidade do nosso país é diferente, pois grande parte da população brasileira é analfabeta e o hábito da leitura não vem de casa. “Fala-se muito em formação de leitores. Nosso país realmente vai ser outro quando sua população for formada por leitores, gente que saiba diferenciar uma obra literária de um texto informativo, gente que leia jornais mas também leia poesia; gente, enfim, que saiba utilizar textos em benefício próprio, seja para receber informações, seja por motivação estética, seja como instrumento para ampliar sua visão de mundo, seja por puro entretenimento. Considerando nosso desequilíbrio social, formar leitores evidentemente é um imenso desafio. A maioria de nossas crianças é filha de pais analfabetos ou semi-analfabetos, ou seja, voltando para casa elas não têm com quem discutir suas lições. E nem mesmo espaço, uma vez 1 Especialista egressa do curso de Pós-graduação em Novas Abordagens em Língua e Literatura em Língua – 2005 Portuguesa - Faculdade Cenecista de Osório – FACOS/ RS- letras @facos.edu.br Orientadora Profa. Dra. Cristina Maria de Oliveira 35 que suas casas, muitas vezes um único cômodo, não costumam possibilitar isolamento mínimo que a leitura requer.” (AZEVEDO, 2004, p.21) Conforme o autor, grande parte dos brasileiros não tem acesso à leitura e por isso não será fácil incentivar as crianças, em idade escolar, a se tornarem leitoras. Cabe, pois, à escola incentivar o hábito de leitura. Nessa expectativa social, o professor tenta buscar e oferecer as melhores situações para que os alunos cresçam e progridam como leitores; ler e escrever são práticas que fazem parte do crescimento de um cidadão, mesmo nesta sociedade com poucos leitores. Até a quarta série, os alunos têm um contato diário com apenas uma professora, que tem como objetivo alfabetizá-los, ensinando-os a ler e escrever. Em decorrência disso, a proposta de leitura é desenvolvida com mais freqüência, pois a educadora faz acompanhamento contínuo no processo de aprendizagem de seus alunos. No entanto, na quinta série, os alunos se deparam com até nove professores, cada um querendo “passar” o conteúdo de sua disciplina e, muitas vezes, esquecendo estes leitores em formação. “Os professores são, freqüentemente, desviados da função de educador para cuidar da papelada, fichas, tabelas, cadernetas, na maioria das vezes irrelevantes ao seu trabalho. Os alunos recebem informações de seis a oito professores que se revezam na classe, cada um tocando uma música particular, sem nenhum ponto de ligação com as outras. O corpo administrativo, os professores e os alunos são grupos completamente distantes uns dos outros, havendo, na maioria das vezes, uma total frieza e impossibilidade no conjunto todo.” (LEITE, 1988, p. 44). Os professores precisam manter, também nestas séries da etapa final do Ensino Fundamental, uma proposta de leitura intensiva, para que os alunos consigam compreender a importância dessa como momentos de interação social com os demais cidadãos/autores do que lêem e possam ir construindo uma concepção de cidadãos críticos, além de, pela leitura, terem acesso à diversidade de cultura. “Ler e escrever são tarefas da escola, questões para todas as áreas, uma vez que são habilidades indispensáveis para a formação de um estudante, que é responsabilidade da escola. Ensinar é dar condições ao aluno para que ele se aproprie do conhecimento historicamente construído e se insira nessa construção como produtor de conhecimento. Ensinar é ensinar a ler para que o aluno se torne capaz dessa apropriação, pois o conhecimento acumulado, está escrito em livros, revistas, jornais, relatórios, arquivos. Ensinar é ensinar a escrever porque a reflexão sobre a produção de conhecimento se expressão por escrito.” (GUEDES, 1998, p. 13). 36 Apesar da atuação dos pais ser fundamental, é para o professor que se concentra a maior responsabilidade, a partir do momento em que a escola passa a ser responsável pela alfabetização; o professor deve incentivar a criança a ler também para que ela desenvolva o gosto e o prazer de ler; precisa indicar e separar material a ser lido, criar diferentes propostas de conquista de um leitor, entre as quais, o desafio à escolha do livro literário ou do assunto informativo a ser lido. “A leitura permite sonhar, enfrentar medos, vencer angústias, desenvolver a imaginação, viver outras vidas, conhecer outras civilizações. Além disso, nos dá acesso a uma parte da herança cultural da humanidade.” (MACHADO, 2001, p.21) Partindo dessa concepção da interatividade do leitor, então em sua ação social e comunicativa, neste artigo, apresenta-se um estudo sobre a importância da escola no incentivo a ler. Destaca-se que, nas séries finais do Ensino Fundamental, a leitura deve ser trabalhada partindo da realidade e faixa etária do aluno; na adolescência, período caracterizado pela busca do eu, o aluno tem a preferência pelo que ele pode relacionar com a sua vivência. Visto que nessa etapa do Ensino Fundamental, as informações recebidas pelos alunos são diversas, é necessário um trabalho direcionado à leitura, partindo de todas as disciplinas e das realidades dos alunos para que se formem cidadãos leitores. Optou-se, neste estudo desenvolvido através de uma pesquisa qualitativa, de aproximação etnográfica, fazer uma pesquisa-ação em que se procurou compreender como, na escola, é possível resgatar o leitor que desperta seu prazer e seu gosto em ler obras literárias. Mesmo que se necessitou trazer alguns aportes de teorias psicossociais, procurou-se manter o enfoque ensino, na possível atuação do professor na organização de propostas de leituras. 2. A importância das propostas de leitura na escola Na escola, deve ser incentivada a ação de ler para se construir a concepção da importância da leitura e do prazer de ler. Segundo Zilberman (1988, p.16) é a escola “que conduz ao ato de ler.” No entanto, a leitura que deveria ser lazer e fonte de informação é considerada, muitas vezes, como uma obrigação, um dever escolar. 37 Muitos adolescentes e jovens não lêem com freqüência, e quando o fazem é por obrigação. É preciso, pois, recuperar o seu prazer e a necessidade de se informar. “A proposta de que a leitura seja reintroduzida na sala de aula significa o resgate de sua função primordial, buscando sobretudo a recuperação do contrato do aluno com a obra de ficção. Pois é deste intercâmbio, respeitando o convívio individualizado que se estabelece entre o texto e o leitor, que emerge a possibilidade de um conhecimento do real ampliando os limites.”(CATTANI e MARQUES, 1988, p. 21). O professor poderá propor atividades interativas que despertem o gosto pela leitura, mostrando que o livro não é uma máquina “chata” que só uma pessoa com habilidades especiais sabe conduzi-la. Também se faz necessário o uso adequado do “arsenal” de materiais escolares, como o livro didático ou o livro de ficção, que poderão se constituir em instrumentos que veiculam o contato do aluno/leitor com os escritores e os demais informantes. O livro didático, com suas inúmeras informações, pode se constituir em fonte de consulta na busca de informações e outros contatos culturais. Já o livro de ficção deve servir como o piloto da viagem pelo mundo da leitura, alimentando a imaginação e desenvolvendo a criatividade. Acredita-se ser essa uma proposta através da qual possam os alunos desenvolver uma visão diferente da escola, da sala de aula, da leitura, construindo sentido em ser estudante. Porém, para orientar a leitura, é preciso que o professor conheça as preferências literárias correspondentes à faixa etária dos seus alunos. De acordo com Bamberger (1977), as preferências literárias são de acordo com a faixa etária do leitor. A seguir, apresenta-se o que o referido autor caracteriza como fase de leitura: 2.1 As Fases Da Leitura 1a. fase - Idade dos livros de gravura e dos versos infantis (de 2 a 5/6 anos) – a criança faz pouca distinção entre o mundo interior e o exterior, é a idade do pensamento mágico. Os livros de gravuras ajudam quando apresentam objetos simples, sozinhos, retirados do meio em que ela vive; o seu primeiro interesse pelo conhecimento é satisfeito pelo mais simples dos livros de gravuras. A criança se interessa mais pelas cenas isoladas do que pelo enredo da história e gosta dos versos infantis por causa do ritmo. As brincadeiras com os livros de gravuras são 38 importantes para incentivá-la a busca de prazer no contato com o livro e poderão ser observados sinais de independência e desafio em que isso se constitui. 2a. fase - Idade do conto de fadas (de 5 a 8/9 anos) – segundo Beinlich (1970, apud Bamberger, 1977, p.37.) é a idade de leitura de realismo mágico e a criança é suscetível à fantasia. No começo desse período, a criança gosta principalmente de contos de fadas que representam um ambiente que lhe é familiar. Quanto menos se identifica com os personagens mais os aprecia; manifesta seu sentimento nas brincadeiras em que poderá imaginar e mostrar sua preferência por personagens e histórias de um mundo distante, de maravilhas, de heróis, etc. 3a. fase - Idade da leitura fatual (de 9 a 12 anos) - caracterizada pela construção de uma fachada prática, realista, ordenada racionalmente. A criança orientar-se no mundo concreto, objetivo. As perguntas “como?” e “por quê?” são cada vez mais freqüentes e são acrescentadas à pergunta “O quê?”. O interesse pelos contos de fadas ainda é marcante, mas também começa a surgir o interesse por ler aventuras. 4a. fase - Idade da história de aventuras (de 12 a 13 anos) – como adolescente, ocorre tomada de consciência da própria personalidade: começa a busca de independência e do desafio; manifesta-se a agressividade como uma das características da fase. O interesse dos leitores pode ser despertado principalmente através do enredo, dos acontecimentos. Em relação às meninas, por influências do convívio, percebe-se um interesse por romances e sentimentalismo. 5a. fase - Anos da maturidade (de 14 a 17 anos) – manifestam-se marcas do descobrimento do próprio mundo interior, do desenvolvimento de planos de vida e de valores. O interesse pelo mundo exterior é substituído pela participação do mundo interior, no mundo dos valores. Os interesses de leitura voltam-se a aventuras de conteúdo mais intelectual, a romances históricos ou livros que se relacionem com preferências e sonhos profissionais. Com base nesse estudo, observa-se que de acordo com a faixa etária, a pessoa tem uma preferência literária, para que se possa desenvolver um trabalho centrado na 39 leitura, o professor pode usar como ponto de partida a motivação a partir das características literárias correspondentes à idade. Observa-se sempre a realidade e características individuais de seus alunos, pois esse estudo é uma orientação e não um modelo a ser seguido; em alguns casos, os alunos poderão não se encontrar nessa divisão. 2.2 Reflexões sobre o papel do professor no processo de leitura É necessário também que o professor conheça os tipos de interesses mais comuns nas etapas escolares e a partir delas estimular a leitura em sala de aula: no período da Educação Infantil – a leitura deve ser estimulada intensamente; a proposta a ser apresentada deve incentivar na criança a expectativa de aprender a ler, mesmo tendo o cuidado de não sobrecarregar a criança. na primeira etapa do Ensino Fundamental – a ajuda do professor no desenvolvimento de interesses e do prazer em ler é extremamente necessária, tendo o cuidado para não romper o interesse da criança por brincadeiras: deve-se criar parcerias entre leitura e brincadeira. O exemplo do professor leitor é essencial, pois o seu exemplo e a sua imagem influenciam a criança, ela se identifica com o seu professor: se o professor mostrar que gosta de ler, o desenvolvimento da leitura será favoravelmente influenciado. entre a quarta e a quinta série – na transição entre a idade do conto de fadas e a idade das aventuras, pode-se perceber se a criança gosta de ler. Caso não se manifeste, inicia-se o período de resgate de um leitor. Também poderá persistir uma variação de interesses: algumas crianças ainda são crianças de contos de fada, outras estão na idade das aventuras. É importante que o professor saiba combinar e trabalhar os diferentes níveis de interesse e gosto da turma para que não haja nenhuma imposição no que será lido; a proposta de escolha será determinante. da sexta até a oitava série – é importante mostrar aos adolescentes que os livros estão à sua espera e são seus amigos, considerando que poderão dialogar de acordo com os seus interesses individuais. A mobilização para a leitura pode surgir a partir de discussões sobre assuntos em geral, profissão, sociedade; por isso, é importante debater sobre diferentes assuntos em aula. 40 no Ensino Médio – se os livros apresentarem o tipo de idéias e valores que preocupam os leitores, certamente o interesse pela leitura será maior; os temas que se referem aos problemas sociais também tem destaque nessa fase em que terão influência sobre a individualidade e sociabilidade de cada um. em todas as idades – a leitura não deve ser concebida como uma atividade imposta pela escola, para que os livros se tornem companheiros eternos. É importante que, em qualquer fase da vida, as pessoas respeitem os gostos de quem cercam. Entre leitores adultos, percebe-se um gosto bem diversificado e depoimentos que comprovam prazer na ação de ler. Com base nessa divisão, pode-se conhecer um pouco mais a faixa etária e o tipo de leitura correspondente a ela, para que se possa desenvolver um trabalho centrado em motivação e interesses de leitura por idade. O educador deve também ter o cuidado de não seguir essa divisão como um modelo, mas apenas como uma sugestão de orientação para um desenvolvimento melhor de um trabalho centrado na prática de leitura, a partir da motivação caracterizada pela faixa etária. 2.3 A leitura em sala de aula – planejando uma proposta Considera-se essencial como ponto de partida, em uma proposta de leitura, conhecer um pouco a realidade dos alunos, inclusive como leitores ou não. Com base nos estudos de Bamberger (1977), o primeiro passo para despertar o gosto pela leitura deve ser a motivação de quem lê, daí considerar a faixa etária e as características do leitor. A leitura deverá impulsionar a fantasia, a vontade, o desenvolvimento do raciocínio, podendo o leitor se tornar crítico e facilitar assim sua compreensão de mundo. Sabe-se que só se gosta daquilo que se conhece: as pessoas não conseguem gostar de algo que não conhecem ou que nunca viram. Também, a partir do momento em que é conhecida e entendida, a leitura começa a fazer parte da vida de quem interage com ela; conseqüentemente se iniciará o processo de formação de leitores. É importante apresentar uma variação de propostas de leitura como 41 entretenimento (em revistas de moda, esporte, contos, gibis...) ou como informação (em jornais, revistas, livros...), ações que poderão despertar interesse e prazer. “A escola deve ajudar a criança a tornar-se leitor de textos que circulam no social e não limitá-la a leitura de um texto pedagógico, destinando apenas a ensiná-lo a ler.”(FONCAMBERT, 1989, p.10 ) Tanto a criança quando lê um conto de fadas, quanto um idoso quando lê um romance podem fazer uma bela viagem pelo imaginário; ou quando a criança lê um gibi e um adulto lê uma revista de moda, podem sentir o mesmo prazer. E por que não utilizar gêneros variados de textos para despertar o gosto e o prazer de ler? “Quando o trabalho é feito com gosto, fica fácil descobrir a melhor forma de envolver a turma. É possível analisar o contexto da história, fazer um júri, uma dramatização, um debate... tudo vai depender da realidade de cada turma.” (MACHADO, 2001, p.22) Quando a leitura é feita com gosto e prazer, envolvendo a realidade dos alunos, ela se torna real e concreta. Facilitando assim o desenvolvimento do trabalho a partir do contexto da leitura, tornado-se possíveis diversas maneiras de abordagem. 2.4. A Leitura em sala de aula – uma proposta de ação As propostas a seguir apresentadas são sugestões que podem ser desenvolvidas com alunos de 7ª série do Ensino Fundamental ao 3º ano do Ensino Médio e uma proposta de ação realizada com alunos de 6ª série, como proposta de pesquisa: uma proposta de aula a partir de um paralelo com duas obras que têm dois adolescentes como personagens. 2.4.1. Leitura na 7a série Aqui seguem algumas sugestões de obra que podem ser desenvolvidas com alunos de 7ª serie ao 3º ano, como, por exemplo, com a obra Dom Casmurro, de Machado de Assis. O personagem Bentinho, que quando jovem é cheio de dúvidas, faz o que a mãe manda e quer, a ponto até de ir para um seminário se preparar para ser padre; quando adulto, se torna uma pessoa ciumenta e possessiva. Pode-se levar a turma ao questionamento se atualmente ainda há um jovem quer faz o que seus pais mandam e até que ponto ciúmes pode tornar uma pessoa infeliz. 42 Com a obra Lucíola, pode-se fazer um trabalho centrado na personagem que se prostitui para poder ajudar a família, levar a turma ao questionamento se hoje há jovens que chegam a esse estremo para pagar uma faculdade e ter uma futura vida melhor. Esses enfoques, que podem ser desenvolvidos entre alunos de 7ª série ao 3º ano do Ensino Médio, abordam a nossa realidade, apesar de ambas as obras terem sido escritas há muitos anos atrás; há muita semelhança com a sociedade atual. Uma outra obra é A Hora da Estrela, de Clarice Lispector, que tem como personagem uma mulher que sofre muito e mantém um relacionamento em que ela é inferiorizada. Esse aspecto pode ser analisado a partir do papel da mulher na sociedade, como ela conseguiu conquistar o seu espaço atualmente. Com alunos de 7ª e 8ª série, ao serem abordados estes temas dos discursos narrativos, pode-se planejar atividades vinculadas à proposta de estudo da disciplina de História sobre a sociedade da época. Já no Ensino Médio, o vínculo pode se estabelecer entre propostas das disciplinas de Literatura, Português e História: na Literatura, a leitura das obras, em Português, produção textual, teatro, etc., e, em História, questões relacionadas à sociedade. 2.4.2 A Leitura na 6ª série –uma prática de ação A proposta de leitura foi desenvolvida com alunos de sexta série, de uma escola pública, no Município do Balneário Pinhal, no ano de 2004, objetivando o resgate de uma prática do hábito de leitura, a partir da motivação e da realidade dos alunos. O estudo foi desenvolvido com as obras Eu, pescador de mim, de Wagner Costa e Martin Pescador, de Emilce Webber, que tem como personagem o menino chamado Martin, um menino pescador que vivia sobre o domínio de uma bruxa, até resolver enfrentá-la para ter uma vida sossegada. A história se passa nos municípios de 43 Palmares do Sul, Praia do Quintão e Balneário Pinhal, local onde os alunos moravam. Foram escolhidas essas obras porque uma fala sobre a “busca do eu” e outra sobre uma criança que é pescadora, uma realidade de muitas crianças do litoral, que ajudam os seus pais no trabalho. A história da obra Eu, pescador de mim foi apenas contada à turma e a história do Martin Pescador foi lida por duas alunas para a turma, por ser um livro que oportuniza a leitura em aula. A obra Eu, pescador de mim, tem como personagem Pepê, um menino de 16 anos, que escreve poemas e quer conhecer o horizonte no mar. Ele resolve largar tudo por um tempo para ir para alto mar descobrir o horizonte. Pepê enfrenta muitas dificuldades ao fazer essa viagem longe de casa, mas não desiste de realizar o seu sonho; porém, com todas as aventuras vividas, ele descobre que o verdadeiro horizonte estava dentro dele. Ou seja, quem vai dar respostas aos nossos questionamentos somos nós mesmos, através da busca do que se quer e do que se quer aprender. Nessa idade o pré-adolescente e o adolescente estão buscando respostas para seus questionamentos e anseios e até, em algumas vezes, o adolescente não sabe quem ele ama e quem odeia. Esta obra foi selecionada porque certamente os alunos se identificaram com os personagens, por serem adolescentes com questionamentos interiores e morarem no litoral, onde crianças trabalham na pesca. Depois de conhecidas as histórias, questionei os alunos sobre a opinião deles sobre as histórias e como elas seriam estudadas. A maioria dos alunos mostrou maior gosto pela história de Pepê e escolheram fazer a reprodução em quadrinhos das duas histórias e criar poemas sobre quem eles eram. Na atividade com poemas, foram criados acrósticos com o nome dos alunos, com a palavra horizonte, mar, adolescência, entre outras. A atividade envolveu as disciplinas de Educação Artística e Língua Portuguesa. Nas aulas de Educação 44 Artística, os alunos produziam as histórias em quadrinhos e confeccionaram o barco onde o personagem Pepê viveu as suas aventuras no mar. As aulas de Língua Portuguesa foram destinadas à correção das histórias e criação dos poemas. Quando prontos, convidei os alunos para irem ao bate-papo com o autor Wagner Costa, na abertura do Espaço Literário em um evento municipal. Como o bate-papo se realizou no sábado, foram apenas doze alunos, aproximadamente a metade da turma. Os alunos presentes mostraram muito interesse na conversa com o autor, por ele falar da sua vida, da sua profissão, de decisões importantes que ele teve que tomar ao final de sua adolescência e falou também da importância do professor na vida de um aluno. Também o fato do autor ser paulista, de um lugar distante chamou a atenção dos participantes, pois eles haviam desenvolvido um trabalho com ele e naquele momento estavam o conhecendo. No decorrer da segunda semana do evento, foi feita a exposição dos trabalhos e contava com a presença da autora Emilce Webber. A sua presença também foi importante para os alunos, pois esta demonstrou grande admiração pelos trabalhos expostos, que eram as histórias em quadrinhos, poesia, o barco onde o personagem Pepê havia vivido as suas aventuras. Para finalizar a prática, já na outra semana após a exposição dos trabalhos, questionei os alunos sobre o que a proposta desenvolvida havia significado para eles e lancei como desafio que eles lessem a obra Eu pescador de mim, a qual eles já conheciam a história, mas não haviam lido. No final do ano, noventa por cento da turma fez a leitura e diziam que queriam ler outros livros parecidos com aquele. Com alunos de 6ª séries, também pode ser desenvolvida, na proposta de resgate aos leitores, a leitura de Tudo depende de como você vê as coisas, de Norton Juster, fazendo um paralelo com a obra Eu pescador de mim, pois ambas enfocam a busca da identidade na adolescência. O que pode se tornar uma ótima proposta aos alunos de sexta ou sétima série. 45 A história do livro Tudo depende de como você vê as coisas narra a trajetória de um menino chamado Milo, que não sabia o que fazer da sua vida. Não tinha interesse na escola, nem nos estudos. Tudo para ele era perda de tempo e sem graça. Se estava na escola queria estar em casa, se estava em casa, queria estar na escola, e assim era a sua vida. Tudo foi assim até o menino ganhar uma cabine de pedágio com apenas um folheto que dizia: “Fácil de armar em casa. Para uso daqueles que nunca viajaram a terras estranhas.” E Milo aceitou fazer essa viagem que o fez despertar para o prazer da vida através do conhecimento. A reflexão pode ser feita sobre o que quer dizer viajar a terras estranhas, fazendo um paralelo entre como se pode viajar através do mundo mágico da leitura. É possível, pois, quando houver um envolvimento de diversas disciplinas, estiverem resgatar o leitor que lê com gosto e prazer, e se estará conquistando o processo de formação de leitores. “Nós professores de todas as áreas, em vez de nos limitarmos a choramingar que nossos alunos não têm o hábito da leitura, devemos nos dedicar a propiciar prazer,diversão, conhecimento, liberdade, uma vida melhor, enfim. E essas oportunidades terão de ser tantas quantas forem necessárias para que o aluno passe a gostar de ler e, por isso, contraria a necessidade da leitura e que esta vire hábito.” (GUEDES, 1998, p.15) Todos os profissionais da educação devem ser conscientes de que todas as disciplinas ministradas na escola são de grande valia e todas elas precisam e devem exercer a leitura. “O peso da escola é muito maior aqui do que nos países mais desenvolvidos, onde as pessoas lêem mais. Como ainda não somos uma sociedade leitora, não podemos esperar que o exemplo venha de casa. Ou acabaremos condenando as futuras gerações a também não ler. A escola tem de entrar para quebrar o ciclo vicioso, criando em seu espaço um ambiente leitor. O mestre tem de dar o exemplo e despertar a curiosidade de jovens. Ler é gostoso demais. Por isso, é natural que as pessoas gostem. Basta dar uma chance para que isso aconteça.” (MACHADO, 2001, p.21) Essas obras também podem se constituir estudos transversais com enfoques de Psicologia ou Relações Humanas, abordando a “busca do eu” e de “quem eu sou”. 46 Considerações Finais O desenvolvimento de interesses em leitura é um processo constante, que começa na família, se aperfeiçoa na escola e continua pela vida em diferentes espaços sociais. Mas quando esse interesse não vem de casa, resta à escola recuperá-lo. Para que isso ocorra da melhor maneira é necessário que todos dentro do ambiente escolar se conscientizem de que todos os educadores são participantes na formação de cidadãos leitores. A leitura deve ser prazerosa e não feita por obrigação ou para ganhar uma nota; deve ser aproveitada como uma atividade gostosa e prazerosa por ser interativa. No entanto, quando desprovida de crítica, pode levar à simples aceitação mecânica, se transforma em rotina mecânica, perde seu prazer e, conseqüentemente, não tem nenhum sentido para quem lê. Sendo assim, não basta apenas incentivar a ler, mas incentivar o gosto e prazer em praticar a leitura. Os professores podem mostrar aos seus alunos que ler não é apenas identificar palavras, mas é viajar sem sair do lugar, romper barreiras e praticar um exercício gostoso e prazeroso. Formar leitores não é moldá-los a um padrão mecânico, mas formar cidadãos críticos, conscientes de que eles podem mudar a sociedade e capazes de se posicionarem perante os seus ideais. Para que isso aconteça, os educadores devem trabalhar com a leitura a partir da realidade dos alunos e, então, desafiá-los a participarem do movimento de uma sociedade letrada através do diálogo com os escritores, mediado pelos discursos lidos. A sociedade então conta com a escola para formar cidadãos leitores. Escolhi estudar este tema, a leitura na escola, porque ao longo desses sete anos que trabalho como educadora, tenho observado uma falta de interesse em relação à leitura partindo dos alunos. É um questionamento muito grande por parte dos professores de como resgatar esse leitor aluno. Quando retornei a estudar, nesse curso de pós-graduação, alguns professores nos apresentaram algumas sugestões 47 de mudança nas propostas de leitura; consiste não em um modelo para ser seguido, o que muitas vezes acaba acontecendo na educação, e que não resulta em mudança, apenas em padrão. Comecei então a compreender o compromisso que temos em mudar essa sociedade em que vivemos, o que pode ser feito pela interação através do que se lê. E concordo que um bom lugar para se começar essa mudança é na escola, formando cidadãos leitores, críticos e conscientes da necessidade de sua participação no discurso social. Referências AZEVEDO,Ricardo. Aspectos da Literatura Infantil no Brasil, hoje. Revista Projeto. POA,Editora Projeto,Maio de 2002, p. 21 BAMBERGER,Richard. Como incentivar o hábito da leitura.Tradução de Octavio Mendes Cajado. SP: Cultrix,1977. COSTA,Wagner. Eu, pescador de mim.SP:Moderna,1995. FOUCAMBERT. Jean. A leitura em questão.Tradução Bruno Charles Magne. POA: Artes Médicas,1994. GUEDES,Paulo Coimbra e outros. Ler e escrever compromisso de todas as áreas. POA.: Editora da Universidade/UFRGS,1999. JUSTER,Norton.Tudo depende de como você vê as coisas.Tradução Jorio Dauster; ilustrações Jules Feiffer. SP: Companhia das Letras,1999. MACHADO,Ana Maria. A literatura deve dar prazer. Revista Nova Escola.Setembro de 2001, p. 21 WEBBER, Emilce. Martin Pescador. Palmares do Sul: s/e, 2002. ZILBERMAN, Regina. A leitura em crise na escola: as alternativas do professor. POA: Mercado Aberto,1988. 48