PESQUISAS / RESEARCH / INVESTIGACIÓN
Prevalência da hipertensão arterial sistêmica (HAS) e dos fatores de
risco para doenças cardiovasculares (DCV) em policiais militares
Prevelence of hypertension (HBP) and risck factores for cardiovascular disesse (CVD) in mililary police
La prevalencia de la hipertención arterial (HTA) y factores de riesgo para enfermedad cardiovascular
(ECV) en la policía militar
Samara Cristina Leite Pinheiro
Monteiro
Graduada no Curso de
Medicina da Faculdade NOVAFAPI
[email protected]
Eucário Leite Monteiro Alves
Doutor em Ciências - Cirurgia Torácica e
Cardiovascular. Professora da Graduação e do
Programa de Mestrado Profissional em Saúde da
Família da Faculdade NOVAFAPI
[email protected]
Maria Eliete Batista Moura
Pós-Doutora pela Universidade Aberta de Lisboa
– Portugal. Doutora em Enfermagem pela Escola
de Enfermagem da UFRJ. Professora da Graduação
e do Programa de Mestrado Profissional em Saúde
da Família da Faculdade NOVAFAPI. Professora da
Graduação e
do Programa de Mestrado em Enfermagem da UFPI.
[email protected]
RESUMO
As pesquisas têm demonstrado aumento significativo da HAS e DCV na morbidade/mortalidade
global nas últimas décadas, com custos exorbitantes aos sistemas de saúde, sendo a principal causa
de morte no Brasil (30% de todos os óbitos). Objetivo: Investigar a prevalência de HAS e fatores de
risco para o desenvolvimento de DCV em policiais militares. Métodos: Realizou-se um estudo retrospectivo e transversal através da análise das condições socioeconômicas, hábitos de vida, exames
laboratoriais e eletrocardiograma de 23 policiais de um grupo de elite da Polícia Militar do Piauí.
Resultados: o perfil dos policiais caracteriza-se por pessoas maiores de 30 anos, casados, bom nível
de instrução, consumidores de álcool, baixa satisfação salarial, com trabalho extra e relato de fadiga.
A avaliação física, exames laboratoriais e ECG revelaram elevados níveis de normalidade para a população de estudo. Na comparação entre os fatores de risco e de proteção para HAS e DCV ocorreu
sobreposição do somatório dos fatores de proteção em relação aos fatores de risco. Conclusão: Conclui-se que os policiais possuem um bom nível de condicionamento físico e mental, provavelmente
decorrente do processo rigoroso de seleção que a Polícia Militar exige para as tropas de elite, padrão
que difere de outras pesquisas.
Descritores: Hipertensão. Prevenção. Doenças cardiovasculares.
ABSTRACT
Research has shown significant increase in hypertension and CVD morbidity/mortality overall in
recent decades, with exorbitant costs to health systems. It is the leading cause of death in Brazil (30%
of all deaths). Objective: To investigate the prevalence of hypertension and risk factors for developing
CVD in the military police. Methods: We conducted a retrospective and cross through the analysis of
socioeconomic, lifestyle, laboratory tests and electrocardiograms of 23 officers from an elite group
of Military Police of Piauí. Results: The profile of the police is characterized by people over 30 years,
married, well educated, drinkers, low pay satisfaction, with extra work and report of fatigue. Physical
examination, laboratory tests and ECG revealed high levels of normality for the study population.
Comparing the risk factors and protective for hypertension and CVD was the sum of overlapping
protective factors in relation to risk factors. Conclusion: We conclude that the police have a good
level of physical and mental conditioning, probably due to the rigorous process of selection requires
that the Military Police for the elite troops, a pattern that differs from other research.
Descriptors: Hypertension. Prevention. PreveCardiovascular disease.
RESUMEN
Submissão: 31.05.2011
Aprovação: 29.06.2011
Las investigaciones han demostrado aumento significativo de la morbilidad por hipertensión y enfermedades cardiovasculares y mortalidad general en las últimas décadas, con costos exorbitantes a
los sistemas de salud, es la principal causa de muerte en Brasil (30% de todas las muertes). Objetivo:
Revista Interdisciplinar NOVAFAPI, Teresina. v.4, n.3, p.25-30, Jul-Ago-Set. 2011.
25
Monteiro, S. C. L. P.; Alves, E. L. M.
Investigar la prevalencia de factores de hipertensión y riesgo de desarrollar
enfermedades cardiovasculares en la policía militar. Métodos: Se realizó un
estudio retrospectivo y transversal a través del análisis del estilo de vida
socioeconómica, el análisis de laboratorio y electrocardiogramas de 23
funcionarios de un grupo de élite de la Policía Militar de Piauí. Resultados:
El perfil de la policía se caracteriza por las personas mayores de 30 años,
casadas, bien educadas, los bebedores, la satisfacción de los bajos salarios,
con trabajo extra y el informe de la fatiga. El examen físico, pruebas de
laboratorio y electrocardiograma reveló altos niveles de normalidad para
la población de estudio. Al comparar los factores de riesgo y de protección
para la hipertensión y la ECV es la suma de la superposición de los factores de protección en relación con los factores de riesgo. Conclusión: Se
concluye que la policía tiene un buen nivel de acondicionamiento físico y
mental, probablemente debido al riguroso proceso de selección requiere
que la policía militar para las tropas de élite, un patrón que se diferencia
de otras investigaciones.
Descriptores: Hipertensión. Prevención. Enfermedades cardiovasculares.
1
INTRODUÇÃO
A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é uma condição clínica
multifatorial caracterizada por níveis elevados e sustentados de pressão
arterial (PA). Associa-se frequentemente as alterações funcionais e/ou estruturais dos órgãos-alvo (coração, encéfalo, rins e vasos sanguíneos) e as
alterações metabólicas, com conseqüente aumento do risco de eventos
cardiovasculares fatais e não fatais (BRANDÃO, 2006).
A HAS tem alta prevalência e baixas taxas de controle, sendo considerada o principal fator de risco modificável para o desenvolvimento de
Doenças Cardiovasculares (DCV), de modo que a elevação da PA a partir de 115/75 mmHg de forma linear, contínua e independente aumenta
progressivamente o risco de mortalidade por DCV (GIORDI; LOPES, 2005).
O estudo epidemiológico das doenças crônicas não transmissíveis
tem demonstrado um aumento significativo da HAS e DCV na morbidade
e mortalidade global nas últimas décadas, com custos exorbitantes aos
sistemas de saúde. Em 2001, cerca de 7,6 milhões de mortes no mundo
foram atribuídas à elevação da PA (54% por acidente vascular encefálico
(AVE) e 47% por doença isquêmica do coração (DIC), sendo a maioria em
países de baixo e médio desenvolvimento econômico e mais da metade
em indivíduos entre 45 e 69 anos (MALTA et al., 2009).
Segundo Batista e Silva (2005), no Brasil, em 2003 as mortes por
doença cardiovascular foram 27,4% de todos os óbitos. Excluindo-se as
mortes violentas e de origem não definida o índice sobe para 37%. A HAS
está envolvida em 40% das mortes por doença cerebrovascular e em 25%
das mortes por doença coronariana. Em 2005 foram 1.180.184 internações
relacionadas com a doença cardiovascular com um custo global superior
a U$575.000.000,00 aos Sistema Único de Saúde (SUS).
As VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial apontam como
principais fatores de risco para desenvolvimento de HAS e DCV ou piora
do quadro: idade, gênero e etnia, excesso de peso e obesidade, ingestão
excessiva de sal, ingestão de álcool, sedentarismo, fatores sócioeconômicos, genética e outros (SCHERR, 2009).
Neste contexto, sabe-se que a profissão de Policial Militar está sujeita à vários fatores potencialmente estressantes, como escalas de serviços sem as respectivas folgas, salários abaixo de suas responsabilidades
institucionais, assim como fatores sociais inerentes a todos os cidadãos de
26
uma comunidade. A soma desses fatores, associados a outros intrínsecos e
extrínsecos poderão ajudar na gênese de várias patologias, notadamente
àquelas relacionadas à saúde mental e ao sistema cardiovascular, especialmente no que se refere à PA.
Assim, considerando-se o grande impacto socioeconômico da HAS
e das DCV e a carência de estudos epidemiológicos nessa área no estado
do Piauí, resolveu-se realizar esta pesquisa com o objetivo de investigar a
prevalência de HAS e fatores de risco para o desenvolvimento de DCV em
policiais militares de um grupo de elite da Polícia Militar do Piauí.
Procurou-se verificar especificamente os hábitos de vida, avaliação
física, exames laboratoriais e eletrocardiograma (ECG), buscando-se a determinação de fatores relacionados com o risco aumentado/diminuído
para o desenvolvimento atual ou futuro de HAS e DCV.
2 METODOLOGIA
Realizou-se um estudo descritivo, quali-quantitativo e transversal
que teve como população alvo os componentes do gênero masculino em
serviço ativo pertencentes ao Grupamento Tático Aeropolicial (GTAP), grupo de elite da Polícia Militar do Piauí (PM-PI).
Os dados necessários à pesquisa foram colhidos no mês de maio
de 2011 por meio de um questionário semi-estruturado composto por
perguntas objetivas e abertas, divididas em quatro grupos: identificação,
dados sobre qualidade de vida, hábitos de vida e avaliação física e laboratorial.
Realizou-se aferição da pressão arterial de acordo com as VI Diretrizes de Hipertensão, mensurou-se estatura e peso para cálculo de Índice
de Massa Corporal (IMC), verificou-se perímetros da cintura e do quadril
para obter a Relação cintura-quadril (RCQ), foi realizada coleta de material
biológico (sangue) para obtenção de dados laboratoriais (Glicemia de jejum, Colesterol total, Triglicerídeos, Lipídeos totais) e realizado o exame de
eletrocardiograma (ECG).
Por fim aplicou-se a versão brasileira do inventário de Beck (Questionário Beck Depression Inventory – BDI) que corresponde ao principal
instrumento validado para o português para rastreamento de sintomas
depressivos em grupos populacionais.
Os dados finais foram tabulados e processados no programa Statistical Package for the Social Sciences-SPSS for Windows® versão 17.0 (Chicago-USA) e os resultados apresentados na forma de tabelas e gráficos.
Para a inicio do estudo foi necessária a aprovação do projeto de
pesquisa pela banca examinadora do trabalho de conclusão de curso e
em seguida a autorização pelo Comitê de Ética e Pesquisa da faculdade
NOVAFAPI, através do processo CAAE de nº 0401.0.043.000-10, de acordo
com a resolução 196-96 do Conselho Nacional de Saúde.
3
RESULTADOS
Os resultados apresentados são referentes a criteriosa avaliação dos
fatores de riscos cardiovasculares de 23 policiais militares componentes do
Grupamento Tático Aeropolicial (GTAP), grupo de elite da Polícia Militar do
Piauí (PM-PI). A avaliação da população de estudo considerou aspectos sociais, hábitos de vida, avaliação física, exames laboratoriais e Eletrocardiograma (ECG) coletados em um único momento no mês de maio de 2011.
3.1 Análise descritiva e exploratória dos dados
Revista Interdisciplinar NOVAFAPI, Teresina. v.4, n.3, p.25-30, Jul-Ago-Set. 2011.
Prevalência da hipertensão arterial sistêmica (HAS) e dos fatores de risco para doenças cardiovasculares (DCV) em policiais militares
A idade média dos participantes do estudo foi de 37,5 anos (dp=
6,74 anos), sendo todos do gênero masculino. A idade mínima encontrada
no estudo foi 25 anos e a idade máxima foi de 48 anos.
As principais características sociais e hábitos de vida dos policiais
avaliados são mostradas na tabela 01, de onde é possível traçar um perfil que se caracteriza por pessoas com idade entre 30 e 48 anos (87%),
predominantemente casados ou em união estável (87%), em sua maioria
apresentando ensino médio ou superior (91%). Com relação à atividade
profissional observou-se elevado percentual de policiais com atividade
laboral extra (60,2%), provavelmente como reflexo da insatisfação salarial
apontada pela maioria (91,4%) e no elevado percentual de policiais que
relataram fadiga na sua rotina diária (52,2%).
Com relação a história patológica pregressa, apenas 17,4% relataram histórico de depressão e 8,6% relataram descontrole emocional.
Quanto ao consumo de tabaco 100% dos participantes negaram o hábito,
enquanto que o consumo de álcool foi observado em 78,3% dos entrevistados, com destaque para o percentual significativo de policiais que se
negaram a responder o questionário que avalia o nível de dependência
ao álcool (30,4%).
Por fim realizou-se um levantamento sobre a prática de atividade
física, observando-se que 95,7% dos participantes fazem atividade física
regularmente, o que representa um bom fator de proteção para doenças
cardiovasculares, em contraste aos elevados percentuais de história positiva para HAS (60,8%) e para DCV (69,5%).
Tabela 01- Distribuição de frequência das características sociais e hábitos
de vida dos policiais do GTAP da PM-PI.
N
%
Faixa etária (anos)
20 |---- 30
3
13
30 |---- 40
11
47,8
40 ou mais
9
39,2
Estado Civil
Casado/união estável
20
87
Solteiro3 13
Grau de instrução
Ensino fundamental
2
9
Ensino médio 11
47,8
Ensino superior 10
43,2
Trabalho extra
Sim
14
60,2
Não 939,2
Satisfação salarial
Sim
2
8,6
Não
21
91,4
Fadiga
Sim
12
52,2
Não
11
47,8
Histórico de depressão
Sim
4
17,4
Não 1982,6
Histórico de descontrole emocional
Sim
2
8,6
Não
21
91,4
Tabagismo
Sim 00
Não 23100
Consumo de álcool
Sim
18
78,3
Não
5
21,7
Continuação.
Tabela 01- Distribuição de frequência das características sociais e hábitos de
Revista Interdisciplinar NOVAFAPI, Teresina. v.4, n.3, p.25-30, Jul-Ago-Set. 2011.
vida dos policiais do GTAP da PM-PI.
N
%
Nível de dependência (CAGE)
ao álcool
Dependente
0
0
Não dependente
11
47,8
Não respondeu
7
30,4
Não se aplica
5
21,8
Prática de atividade física
Sim
22
95,7
Não
1
4,3
História familiar HAS
Sim
14
60,8
Não 939,2
História familiar DCV
Sim
16
69,5
Não
7
30,5
Total 23100,0
Fonte: Entrevista com os participantes, 2011.
Os resultados decorrentes da avaliação física, exames laboratoriais e
ECG são apresentados na tabela 02, sendo possível observar que os níveis
pressóricos foram normais para a maioria dos policiais avaliados (56,5%),
assim como o Índice de Massa Corporal-IMC (56,5%), embora o sobrepeso
tenha sido observado em parte significativa da população (39,1%). O risco
avaliado pela relação da medida cintura/quadril foi baixo ou moderado
para 91,3% dos participantes.
Com relação aos exames laboratoriais a glicemia de jejum foi normal em 100% da população de estudo, o colesterol total também apresentou bons níveis de normalidade (86,9% em nível desejável), assim
como os triglicerídeos (86,9% em nível desejável) e lipídeos totais com
60,9% dos participantes em nível desejável.
Os dados eletrocardiográficos revelam um percentual de normalidade em 60,9% dos participantes, em contrapartida observou-se 39,1%
de alterações inespecíficas, representadas, sobretudo, por Alteração Inespecífica da Repolarização Ventricular. Quanto ao questionário que avalia
a presença de sintomas depressivos, observou-se que apesar do baixo
percentual de episódios depressivos relatados na história patológica pregressa, 21,7% dos participantes revelou depressão leve a moderada e 4,4%
de depressão moderada a grave.
Tabela 02- Distribuição de frequência dos dados resultantes da avaliação
física, exames laboratoriais e ECG dos policiais do GTAP da PM-PI.
N
%
Níveis pressóricos
Normal
13
56,5
Limítrofe
6
26
Alto
4
17,5
IMC
Normal
13
56,5
Sobrepeso 939,1
Obeso grau I
1
4,4
Risco RC/Q
Baixo
2
8,7
Moderado 1982,6
Alto 00
Muito Alto
2
8,7
Glicemia de jejum
Normal
23
100
Alterado 00
Colesterol total
Desejável
20
86,9
Limítrofe 313,1
Alto 00
27
Monteiro, S. C. L. P.; Alves, E. L. M.
Triglicerídeos Normal
20
86,9
Limítrofe
1
4,4
Alto
2
8,7
Lipídeos totais
Baixo
9
39,1
Desejável
14
60,9
Alto0
ECG
Normal
14
60,9
Rit. Sinusal/BAV 1GRAU
1
4,4
Rit. Sinusal/AIRV
5
21,5
Rit. Sinusal/Onda Q em D3
1
4,4
Rit. Sinusal/PR curto
1
4,4
Bradicardia Sinusal
1
4,4
Inventário de depressão BDI Sem depressão
17
73,9
Depressão leve a moderada
5
21,7
Depressão moderada a grave
1
4,4
Total 23100,0
Fonte: Avaliação física, laboratorial e ECG, 2011.
3.2 Comparação dos grupos.
A comparação entre os grupos é uma parte importante da análise
estatística que permite verificar as diferenças/semelhanças dentro de uma
mesma população na busca de relações de dependência entre variáveis
que possam indicar quais os fatores estão relacionadas com a proteção ou
risco aumentado para o desenvolvimento de HAS e DCV.
Desta forma foi realizada uma triagem de todos os participantes e
enumerados os fatores relacionados com o risco ou proteção à temática de
estudo. Assim, consideraram-se como fatores de risco, conforme a literatura mais atual para o desenvolvimento de HAS e DCV: raça negra; tabagismo; consumo de álcool; história familiar positiva para HAS; história familiar
positiva para DCV; PA alta; IMC classificado como sobrepeso ou obeso; risco
da relação C/Q de moderado até muito alto; sedentarismo; glicemia maior
que 110mg/dl; taxas elevadas de colesterol total, triglicerídeos e lipídeos
totais; por fim, qualquer nível de depressão detectado pelo BDI.
Por outro lado, foram considerados como fatores de proteção para
HAS e DCV: demais raças; não-tabagismo; não consumo de álcool; história
familiar negativa para HAS; história familiar negativa para DCV; PA normal;
IMC classificado como normal; risco da relação C/Q baixo; atividade física
regular; glicemia menor que 110mg/dl; taxas normais de colesterol total,
triglicerídeos e lipídeos totais; por fim, os participantes sem depressão detectada pelo BDI.
O gráfico 01 apresenta a comparação entre os fatores de risco e de
proteção para HAS e DCV, sendo possível observar que 02 dos 23 participantes da pesquisa apresentaram quantidade maior de fatores de risco
em relação aos fatores de proteção.
Gráfico 01: Comparação entre fatores de risco e de proteção para HAS e DCV entre os policiais militares do GTAP-PMPI. Fonte: Dados da pesquisa, 2011.
4
DISCUSSÃO
A discussão que ora se inicia é baseada nos resultados obtidos a
partir das informações colhidas com os 23 policiais militares pertencentes
ao GTAP da Polícia Militar do Piauí. De modo que as implicações decorrentes deste trabalho são representativas destas pessoas, uma vez que se
28
entende que há riscos e limitações para a generalização dos resultados
para outros grupos. Entretanto, acredita-se que este estudo possa trazer
contribuições importantes na busca de medidas preventivas do estabelecimento da HAS e mesmo na diminuição dos riscos às DCV.
O estudo das características socioeconômicas e hábitos de vida
dos participantes da pesquisa (tabela 01) permitiu observar que o perfil
Revista Interdisciplinar NOVAFAPI, Teresina. v.4, n.3, p.25-30, Jul-Ago-Set. 2011.
Prevalência da hipertensão arterial sistêmica (HAS) e dos fatores de risco para doenças cardiovasculares (DCV) em policiais militares
dos policiais do GTAP se caracteriza por pessoas com idade entre 30 e 48
anos (87%), casados/união estável, com um bom nível de instrução, baixa
satisfação salarial e que recorrem a trabalhos extras para complemento da
renda familiar. Com relação a este aspecto cabe destacar que essa faixa
etária apresenta risco aumentado para a ocorrência de HAS e DCV, fato
que aliado à carga horária extra somada à jornada de 40 horas semanais
realizada em turnos pode resultar em estresse emocional e justificar o elevado percentual de policiais com relato de fadiga.
Este quadro encontra-se em conformidade com a literatura que
aponta a hipertensão essencial (primária) surgindo com freqüência entre
os 25 e 55 anos de idade, faixa etária que também está relacionada à incidência de obesidade (BRASIL, 2007). Em 1988, no Brasil, as DCV foram
responsáveis pela maior proporção de óbitos no país: 31% das mortes em
homens e 39% nas mulheres, sendo a principal causa mortis a partir dos
40 anos de idade e contabilizando 33% dos óbitos na faixa de 40 a 49 anos
de idade (RIQUE, SOARES E MEIRELLES, 2002).
No Brasil, um fato que agrava esse quadro é que aproximadamente
um terço dos óbitos por DCV ocorrem precocemente em adultos na faixa
etária de 35 a 64 anos. Nesta faixa etária, as principais causas de óbito por
doenças do aparelho circulatório são as doenças isquêmicas do coração,
as doenças cerebrovasculares e as doenças hipertensivas. Ressalte-se que
essas causas são em grande parte evitáveis, diante da probabilidade de
diminuição da ocorrência dessas mortes, se houver assistência ou prevenção oportunas (NOLTE; McKEE 2004).
O estresse físico e emocional, segundo Soares, Costa e Mesquita
(2006) resulta em alterações importantes para aumentar a vulnerabilidade
de um paciente deprimido a uma doença cardiovascular. Entre os fatores
incluem alterações no eixo hipotalâmico-pituitário-adrenocortical, hiperreatividade simpático-adrenal, alterações nos receptores plaquetários e
aumento na secreção de citocinas pró-inflamatórias além da instabilidade
e isquemia miocárdica relacionada ao estresse mental e fadiga muscular.
Com relação a história patológica pregressa para depressão e descontrole emocional, os baixos percentuais indicados entre os policiais
militares podem estar relacionados à dificuldade dos entrevistados em se
auto-perceber como clinicamente afetados, contrastando com os percentuais de depressão observados com a aplicação do BDI (26,1%) de depressão leve a moderado ou moderado a grave, estabelecida pelo mecanismo
descrito acima.
O BDI que consiste em um questionário de auto-relato com 21
itens de múltipla escolha relacionados aos sintomas depressivos como
desesperança, irritabilidade, cognições, culpa ou sentimentos de estar
sendo punido, assim como sintomas físicos como fadiga, perda de peso
e diminuição da libido (Beck et al., 1961). Desta forma, a aplicação do BDI
pode ser um recurso útil na detecção de sintomas depressivos e, conseqüentemente, na prevenção de fatores de risco para HAS e DCV.
Quanto à ausência de consumo de tabaco entre os participantes
acredita-se está relacionado ao processo rigoroso de seleção para composição do GTAP. Por outro lado, o fato da coleta de dados ter sido realizada
na unidade militar pode ter sido um viés à livre manifestação do consumo
de tabaco e álcool. Apesar do consumo de álcool ter sido relatado por
grande parte dos militares, observou-se resistência ao preenchimento do
questionário que avalia o grau de dependência (CAGE) mesmo tendo sido
explicado todo o processo de garantia de sigilo das informações.
Na ausência de evidências concretas deste viés, considerou-se o
não consumo de tabaco como fator protetor ao desenvolvimento de HAS
e DCV, enquanto que o consumo de álcool foi considerado como fator
Revista Interdisciplinar NOVAFAPI, Teresina. v.4, n.3, p.25-30, Jul-Ago-Set. 2011.
de risco, conforme relata a literatura pertinente ao tema. Neste sentido,
Wenzel, Souza e Souza (2009) incluem como fatores de risco para o desenvolvimento de HAS e DCV o fumo, estresse oxidativo, consumo de álcool,
entre outros.
Entre os hábitos de vida relatados pelos participantes da pesquisa
cabe destacar os elevados percentuais de prática de atividade física regular, representando um dos principais fatores de proteção ao surgimento
de HAS e DCV. Para Kyle et al., (2006) a atividade física, em níveis altos e
regulares, tende a reduzir os valores da pressão arterial e, conseqüentemente, os riscos para DCV. Rique, Soares e Meirelles (2002) defendem que
a prática de atividade física e as mudanças no hábito alimentar têm sido
os principais fatores envolvidos na prevenção ou na melhora dos fatores
de risco das doenças cardiovasculares.
Os resultados decorrentes da avaliação física, exames laboratoriais
e ECG apresentados na tabela 02 revelaram elevados níveis de normalidade para a população de estudo, embora o sobrepeso tenha sido observado como o fator de risco mais prevalente.
O aumento da massa corporal está associado à pressão arterial elevada, e a perda de peso em indivíduos hipertensos é geralmente acompanhada por uma redução na pressão arterial (WHO, 1998).
Entre outros fatores de risco para a doença hipertensiva e DCV, cabe
destacar os constitucionais, que compreendem a idade, gênero, genética
(raça e historia familiar) e ainda os ambientais, que incluem a ingestão
excessiva de sal e de álcool, gordura, tabagismo, sedentarismo, fatores ambientais ligados ao trabalho e à classe social (GIORDI; LOPES, 2005).
Entre os fatores de risco de maior probabilidade para o desenvolvimento das doenças cardiovasculares (DCV) estabelecidos desde o estudo
de Framinghan, destacam-se o fumo, a hipertensão arterial, as dislipidemias e o diabetes mellitus. A obesidade e a inatividade física foram positivamente associados com o risco de desenvolver DCV, constituindo-se nos
fatores de risco mais significativos (GRUNDY et al., 1998).
Assim os parâmetros da avaliação física e exames laboratoriais
revelam baixos riscos para o desenvolvimento de HAS e DCV conforme
observado na literatura, este padrão pode está mais uma vez associado ao
processo rigoroso de seleção dos grupos de elite da Polícia Militar, resultando em um perfil físico condizentes ao encontrado no estudo, embora
a triagem não considere aspectos familiares associados à HAS e DCV que
apresentaram percentuais relevantes, conforme tabela 02.
O último elemento da avaliação com os participantes da pesquisa
foi a realização do ECG que revelou percentual elevado de alterações inespecíficas que representam baixo risco para o desenvolvimento de HAS e
DCV, reforçando o bom condicionamento físico e emocional dos policiais
de GTAP.
A comparação entre os fatores de risco e de proteção para HAS
e DCV apresentado no gráfico 01 traz uma visão geral dos resultados da
pesquisa, apesar deste tipo de comparação apresentar limitações, principalmente porque os fatores de risco/proteção se manifestam de maneira
diferente em cada indivíduo e apresentam força diferente na manifestação/inibição de HAS e DCV. Entretanto, o padrão encontrado reforça mais
uma vez o bom nível de parâmetros físicos e laboratoriais encontrado na
pesquisa. Apesar do somatório entre fatores de risco e de proteção não
resultarem em uma equação matemática exata, podemos sugerir que
quanto mais a conta pesar para os fatores de proteção melhor serão as
condições de saúde física, mental e social do indivíduo.
Este padrão de condicionamento físico e mental observado entre
os participantes da pesquisa difere do padrão encontrado na literatura
para outros grupos de policiais militares. No estudo de Leite e Silva (2007)
29
Monteiro, S. C. L. P.; Alves, E. L. M.
com 101 policiais de Novo Gama-GO, para avaliação de níveis pressóricos
e auto-percepção de saúde, observou-se que os níveis pressóricos e os
fatores de risco para desenvolvimento de HAS encontravam-se em níveis
preocupantes.
No estudo de Frutuoso (2008) com 15 policiais militares da cidade
de Matipó-MG para a avaliação de riscos coronarianos através da relação
C/Q, observou-se 80% dos policiais apresentaram risco de moderado à
muito alto para desenvolvimento de problemas cardíacos.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Através deste estudo foi possível concluir que o perfil socioeconômico e hábitos de vida dos policiais do GTAP se caracteriza por pessoas
com idade entre 30 e 48 anos (87%), casados/união estável, com um bom
nível de instrução, relatando consumo moderado de álcool, baixa satisfação salarial e que recorrem a trabalhos extras para complemento da renda
familiar, resultando em sobrecarga laboral, fadiga e risco aumentado para
a ocorrência de HAS e DCV.
Por outro lado, o bom nível de escolaridade, a prática regular de
atividade física e o não uso de tabaco foram considerados como fatores
protetores ao desenvolvimento de HAS e DCV, fato que aliado ao processo
rigoroso de seleção para composição das tropas de elite da Polícia Militar
resultam em um bom nível de condicionamento físico e mental encontrado no estudo.
Observaram-se baixos percentuais de história patológica pregressa
para depressão e descontrole emocional, indicando dificuldade dos entrevistados em se auto-perceber como clinicamente afetados, pois houve
contraste com os percentuais de depressão observados com a aplicação
do BDI.
Os resultados decorrentes da avaliação física, exames laboratoriais
e ECG revelaram elevados níveis de normalidade para a população de estudo, embora o sobrepeso tenha sido observado como o fator de risco
mais prevalente.
A comparação entre os fatores de risco e de proteção para HAS e
DCV para os participantes da pesquisa revelou um sobreposição do somatório dos fatores de proteção em relação aos fatores de risco, reforçando
o bom nível de parâmetros físicos e laboratoriais encontrado na pesquisa.
Este padrão difere das pesquisas com policiais militares encontradas na
literatura, entretanto, acredita-se que o processo de seleção rigoroso realizado para seleção das tropas de elite explique este padrão mais saudável.
Espera-se com este estudo contribuir para uma melhor compreensão dos fatores de risco/proteção para o desenvolvimento de HAS e
DCV entre policiais militares, assim como estimular novos estudos para o
desenvolvimento de medidas preventivas cada vez mais eficazes ao enfrentamento desta verdadeira epidemia de HAS e doenças do aparelho
circulatório.
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