XXXIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
A Gestão dos Processos de Produção e as Parcerias Globais para o Desenvolvimento Sustentável dos Sistemas Produtivos
Salvador, BA, Brasil, 08 a 11 de outubro de 2013.
CROWDBUSINESS: INOVAÇÃO EM
MODELO DE NEGÓCIOS NA WEB 2.0
Daniel Thome de Oliveira (UFRGS )
[email protected]
Daniel Quintana Sperb (UFRGS )
[email protected]
Marcelo Nogueira Cortimiglia (UFRGS )
[email protected]
A nova ordem econômica sugere o ativo intangível criatividade como
catalisador do avanço tecnológico e, consequentemente, da inovação.
Dentro desta perspectiva, a partir das novas tecnologias de interação,
a web 2.0 têm hospedado modelos dee negócios inovadores que
usufruem da criatividade das massas na construção de um produto ou
serviço. Este artigo tem como objetivo identificar e compreender o
caráter inovador de modelo de negócios que envolvam co-criação das
massas, a partir da análise de um caso emblemático e representativo
de crowdbusiness - a imobiliária digital AirBnB. Para tanto, utilizou-se
como framework de análise o modelo Canvas, porposto por
Osterwalder & Pigneur (2010). Os resultados esclarecem as
especificidades da gestão destes modelos de negócios e salientam a
complexa dinâmica do processo de inovação.
Palavras-chaves: inovação, modelo de negócio, co-criação, web 2.0
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1. Introdução
Recentemente, assistiu-se à evolução da internet como canal de informações de mão dupla,
caracterizado pela interação entre usuários. Se nos primórdios da rede as empresas se
preocupavam unicamente em disponibilizar informações, a interatividade possibilitada
atualmente permite a construção de novos modelos de negócio nos quais usuários são
simultaneamente consumidores e produtores.
A interação permite a colaboração para construção de valor. Surgem, assim, iniciativas como
a enciclopédia Wikipédia, o sistema operacional Linux e as redes sociais. Este fenômeno é
frequentemente chamado de co-criação. Cada vez mais empresas exploram esta possibilidade
de construção conjunta de valor, inovando na proposição de modelos de negócio. Estratégias
que utilizam o poder das massas (aqui entendida como uma população que passa a interagir na
construção de um produto ou serviço através de uma plataforma interativa proposta a partir de
um modelo de negócios) estão rapidamente se disseminando na Web, ganhando
nomenclaturas como crowdsourcing, crowdfunding e crowdlearning. De forma mais genérica,
modelos de negócios suportados pelas massas têm sido conhecidos como crowdbusiness.
Modelos de negócio de crowdbusiness tendem a utilizar uma abordagem semelhante: incluem
o desenvolvimento de uma plataforma que promove o encontro das massas interessadas em
construir uma solução para um problema comum. Em troca de promover este encontro e
facilitar a interação necessária para a construção da solução é cobrada uma taxa. Esta
inovação em modelo de negócio engloba uma série de especificidades com relação aos
modelos de negócio tradicionais. Crowdbusiness é um fenômeno recente, intimamente ligado
à web 2.0 e ainda muito pouco explorado no mundo acadêmico.
Neste contexto, este artigo tem como objetivo identificar e compreender o caráter inovador de
modelo de negócios que envolvam co-criação a partir da análise de um caso representativo de
crowdbusiness – a imobiliária digital AirBnB. Para tanto, utilizou-se o modelo Canvas,
proposto por Osterwalder & Pigneur (2010).
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2. Web 2.0
Desde a sua criação, a internet vem sofrendo mudanças em seu significado e potencial
enquanto meio digital de troca de informações. Funk (2009) destaca que em sua primeira
geração (web 1.0), o fator mais relevante era a possibilidade de conexão e disponibilização de
informações. Já na segunda geração (web 2.0), paginas dinâmicas puderam ser desenvolvidas,
permitindo aos usuários não só acessarem e consumirem informações, mas também produzilas e submetê-las para a rede.
Assim, existe um componente humano importante na composição da web 2.0: a interação
social. Graças à possibilidade de interação entre os usuários, constrói-se um senso de
comunidade na rede, de forma que pessoas desconhecidas possam compartilhar experiências
na solução de problemas comuns. Esta é a base da chamada inteligência coletiva, um
princípio fundamental para a web 2.0 (O’RILLEY, 2007).
As redes sociais são os exemplos mais característicos da relevância da interação social na web
2.0 (FUNK, 2009; CORTIMIGLIA, 2011). Nestas redes, tais como o Facebook e LinkedIn,
usuários ocupam o tempo trocando mensagens, criando e compartilhando conteúdos e
publicando fotos. O que estas empresas têm em comum é o fato de que seus produtos e
serviços são fruto de co-criação, ou seja, uma construção coletiva das massas em que o valor
está na própria rede que se constitui e não no sistema que intermedia a interação.
3. Co-criação
A co-criação é um conceito abrangente e não restrito aos negócios. Conforme Franco (2010),
ela é fruto da interação social e tem como ingredientes básicos a investigação e seleção de
soluções, a polinização e a aprendizagem. Tais interações formam uma rede, na qual a
polinização pode ser entendida como um processo interativo e aberto de construção de ideias
e soluções, permitindo a qualquer indivíduo tornar-se membro da rede e apropriar-se de tais
construções e seus benefícios.
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Nos negócios, a co-criação vem ganhando importância na medida em que permite reduzir
custos e riscos relativos à determinação de requisitos e condições de uso de produtos e
serviços em um contexto de necessidades e expectativas mutáveis. O conceito de co-criação
apareceu em 2000, provavelmente como desdobramento do conceito de co-produção, surgido
na década de 1970 com o sentido de “participação do cliente na produção” (BENDAPUDI et
al., 2003). Atribui-se a Prahalad e Ramaswamy (2000) a autoria do termo co-creation, bem
como sua popularização (PRAHALAD; RAMASWAMY, 2004).
Ainda que o termo co-criação seja recente, a literatura acadêmica sobre envolvimento dos
clientes, parceiros e fornecedores na inovação é rica, a exemplo do método Lead User (VON
HIPPEL, 1986) e da inovação aberta (CHESBROUGH, 2003), ressaltando a importância da
captação dos sinais do ambiente que apontam para as reais necessidades dos clientes.
Ramaswany e Gouillart (2010) comparam estratégias de inovação tradicionais e co-criativas,
como reportado na Tabela 1.
Tabela 1 – Estratégia de co-criação
Fonte: Adaptado de Ramaswany e Gouillart (2010)
Howe (2006) introduziu o conceito de corwdsourcing, ou seja, co-criação operada pelas
massas. Conforme Franco (2010), crowdsourcing só é co-criação se operado em estruturas de
rede e envolvendo polinização. Segundo Prahalad e Ramaswany (2004), co-criação envolve a
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definição conjunta de problemas e soluções em uma lógica de criação simultânea de valor
pela empresa e cliente, ou seja, não se trata da empresa tentando satisfazer o cliente. Da
mesma forma, co-criação envolve uma variedade de experiências e não de produtos e, em vez
de apoiar-se em pesquisas de mercado, requer experimentação em tempo real.
Apesar das divergências conceituais, é cada vez maior a preocupação em compreender de que
forma pode-se utilizar co-criação em modelos de negócio a fim de obter vantagem estratégica.
Conforme Ramaswamy e Gouillart (2010), as vantagens de usar co-criação estão associadas
ao aumento da produtividade e da criatividade, diminuição dos cursos e rotatividade dos
funcionários, além da possibilidade de estruturação de um modelo de negócios inovador.
4. Inovação em Modelo de Negócios na Web 2.0
Inovação é a implementação de um novo ou significativamente melhorado produto (bens ou
serviços), processo, método de marketing ou métodos organizacionais internos, ou de relações
externas. Inovação de produto e processo são os tipos mais tradicionais de inovação e, por
muito tempo, considerados sinônimos de inovação. Porém, são cada vez mais comuns as
inovações em modelos de negócios, normalmente associadas a inovações organizacionais.
Modelo de negócio é a visão da empresa sobre o que os consumidores desejam e de que forma
ela pode atender estas demandas e ser remunerada atendendo-as (TEECE, 2010). O desenho
de modelos de negócio deve ser iterativo e frequentemente revisado (SAMAVI et al., 2009).
Os modelos de negócio permitem que empresas não apenas lucrem com inovações
tecnológicas, mas também realizem inovações através deles, sendo desta forma uma fonte de
lucro e vantagem competitiva (CHESBROUGH, 2007; SAKO, 2012).
Em mercados nos quais a criação de valor se dá através da conexão de atores através de
tecnologias, modelos de negócio robustos e bem planejados são especialmente necessários.
Nestes casos, chamados por redes de valor (STABELL; FJELDSTAD, 1998), tecnologias
como a Internet são usadas não apenas para comunicação, mas para criar e capturar valor
(KOTHARNDARAMAN, WILSON, 2001).
Segundo Tapscott (2001, p.3), um negócio da internet é “qualquer sistema formado por
fornecedores, distribuidores, provedores de serviços e de infra-estrutura e consumidores que
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usam a internet para comunicações de negócio e transações”. O autor salienta que as
“indústrias transversais” da internet, em que cada negócio foca na sua competência principal,
são mais flexíveis, inovadoras, eficientes em custo e lucrativas do que competidores
tradicionais verticalmente integrados. Adicionalmente, Shin (2001) argumenta que a internet
muda as bases de competição por alterar radicalmente as ofertas de produtos/serviços e a
estrutura de custos das firmas. Ritter e Gemünden (2004) mencionam a importância das
empresas desenvolverem competências de rede nos seus processos de inovação, que no ebusiness se configura como a mais importante fonte de valor (AMIT; ZOTT, 2001).
Combe (2006) cita três tipos de relações de mercado e-business: B2B (business-to-business),
B2C (business-to-consumer) e C2C (consumer-to-consumer). B2B refere-se a negócios
envolvendo duas empresas, enquanto B2C envolve negócios com clientes finais. Já o
segmento C2C caracteriza-se pela intermediação de negócios entre dois ou mais clientes
finais. O C2C é, justamente, o segmento mais propício para modelos envolvendo co-criação,
pois implica na implementação de plataformas interativas que promovem o encontro entre as
partes interessadas, de modo que os clientes estruturam o produto ou serviço por si sós. A
dificuldade de estabelecer um modelo de negócios de sucesso nesse segmento tende a estar
relacionada à incorreta definição da dimensão de apropriação de valor por parte das empresas
e à falta de uma estratégia para ingresso no mercado (CORTIMIGLIA, 2011).
De forma geral, pode-se capturar valor da inovação de três formas: através de licenças ou
patentes, comercializando o direito de exploração da tecnologia criada (viável apenas para
regimes de forte apropriabilidade); através da integração da inovação a um produto e a sua
subsequente comercialização; e modelos híbridos, no qual o inovador licencia parte do
processo de criação de valor e mantêm algumas partes (TEECE, 2010). É justamente nesta
terceira forma que se encaixam os modelos de negócios C2C que utilizam de estratégias de
co-criação e que, neste estudo, são alvo de investigação quanto ao seu caráter inovador.
6. Procedimentos Metodológicos
Osterwalder & Pigneur (2010) propõem uma das mais conhecidas metodologias para criação
de modelos de negócios, tanto para empresas existentes quanto aquelas criadas especialmente
para explorar uma inovação. A metodologia apresenta quatro blocos: a) Inovação do produto;
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b) Relacionamento com o cliente; c) Gerenciamento da infra-estrutura; e d) Aspectos
financeiros. Estes blocos se dividem em nove dimensões, detalhadas na Tabela 2.
Tabela 2 – Modelagem de Negócios Canvas
Fonte: Adaptado de Osterwalder & Pigneur (2010)
O mapa visual utilizado para a elaboração ou análise do modelo de negócios segundo estas
dimensões é conhecido como Canvas. Neste trabalho, esta metodologia será utilizada para
mapear e analisar o modelo de negócios da empresa AirBnB, a fim de identificar e
compreender seu caráter inovador. A abordagem realizada é de estudo de caso e as fontes de
dados são secundárias, compreendendo informações coletadas no site da empresa e veículos
de comunicação e, também, de entrevistas concedidas pelos sócios-fundadores da AirBnB em
diversos canais de comunicação.
7. O Caso AirBnB
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Fundada em 2008 e com sede em São Francisco, a AirBnb é um mercado comunit rio
baseado na confiança para as pessoas anunciarem, descobrirem e reservarem alojamentos em
via Web ou dispositivo móvel. A AirBnb faz a ponte entre pessoas e experiências de viagem
únicas em mais de 33.000 cidades e 192 países. Ao contrário dos tradicionais websites para
hospedagem em hotéis, os alojamentos da AirBnB são casas e apartamentos particulares.
Desde a fundação, a empresa vem crescendo em abrangência global e faturamento. A empresa
arrecadou $120 milhões em investimentos em 2012. Naquele ano, a empresa registrou 10
milhões de reservas, um aumento de 100% em um semestre. No Brasil, entre junho de 2011 e
junho de 2012, o número de reservas aumentou 1180%. Os sócios-fundadores apostam em
crescimento ainda mais intenso graças aos grandes eventos esportivos a serem sediados no
país. A empresa conta com 10 escritórios na América do Norte e Sul, Europa Ocidental e
Oriental, sendo um deles em São Paulo.
O modelo de negócios se baseia em uma plataforma web que permite que locadores
cadastrem imóveis ou quartos individuais para locação. Locadores devem fornecer descrição
detalhada dos imóveis, incluindo fotos e vídeos. Atualmente, existem mais de 230 mil
anúncios no site, sendo que 57% deles são casas ou apartamentos, 41% quartos privados e 2%
quartos compartilhados. A empresa cobra do locador uma taxa de 3% do valor da reserva. Já
do hóspede é cobrada uma taxa que varia entre 6% e 12% do valor da reserva, de acordo com
a faixa de preço.
Assim como no Ebay, a reputação de locadores e locatários é construída a partir de avaliações
mútuas após transações efetivadas mediante depoimentos e outros mecanismos de avaliação
de satisfação. Importante observar que a plataforma basicamente promove o encontro de
pessoas com algo a oferecer com aquelas que desejam algo. A relação é mediada por regras de
segurança e fluxo de informações a fim de garantir o sucesso da transação.
Ao utilizar estratégia de co-criação em seu modelo de negócios, a AirBnB inova na forma de
se posicionar na rede de valor. A fim de mapear seu modelo de negócios e identificar suas
características inovadoras, aplica-se o modelo Canvas, conforme Figura 1. Os grifos azuis se
referem aos locadores, enquanto os grifos vermelhos se referem aos locatários.
Figura 1 – Modelo de negócios da AirBnb
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Fonte: elaborado pelos autores com base em Osterwalder & Pigneur (2010)
Nas subseções seguintes são detalhadas as análises para cada dimensão do modelo de
negócios.
Atividades-chave
Sendo um intermediário virtual, uma das atividades principais do AirBnB é aprimorar
constantemente sua plataforma. Ela deve ser simples, intuitiva e amigável. A experiência de
locar ou anunciar precisa ser fácil, agradável e rápida. Para isto, o AirBnB mantém uma
equipe jovem e qualificada de engenheiros. Outras atividades importantes envolvem a gestão
dos serviços complementares, importante fonte de valor no e-business (AMIT; ZOTT, 2001).
Se por um lado não há preocupação com desenvolvimento de produto (espaço a ser locado) ou
serviço (intermediação da negociação), na medida em que o negócio se expande cresce a
necessidade por serviços complementares. O serviço de fotógrafos profissionais, por exemplo,
resolve dois problemas: melhora a qualidade das fotos dos anunciantes e certifica a veracidade
do espaço anunciado, aumentando a confiabilidade. Outro serviço complementar é o seguro
oferecido aos locatários para os casos de roubo ou quebra de objetos. Ambas as atividades, é
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importante ressaltar, não são conduzidas diretamente pela empresa, mas por parceiros. A
atividade chave neste caso envolve gerenciar a rede de valor.
Recursos
O principal recurso do AirBnB é a comunidade de anunciantes e locatários. Esta é uma
questão delicada e volátil. Dada a baixa barreira de entrada na web, a empresa precisa garantir
que sempre será a plataforma de compartilhamento de imóvel mais atrativa. Usuários só terão
interesse pela plataforma se ela tiver a maior comunidade ativa, conforme a lógica dos efeitos
de rede (networking effects) (AMIT, ZOTT, 2001). Similarmente, a plataforma que promove
encontros entre hospedes e anfitriões é também um recurso fundamental, bem como toda a
infraestrutura de tecnologia da informação. Ainda há de se considerar o valor da marca
AirBnB para formação e manutenção da comunidade.
Proposição de valor
O AirBnB nasceu quando os sócios-fundadores resolveram locar um espaço de seu loft para
viajantes que vinham a São Francisco participar de uma conferência. Sabendo que os hotéis e
pousadas da cidade estariam lotados, os sócios entenderam que muitos participantes da
conferência gostariam apenas de um lugar para dormir e tomar um café da manhã. Ainda, os
ofertantes e os interessados partilhavam de algo em comum: o interesse pelo estudo do design,
o que lhe poderia render boas conversas, além de uma possível carona para a conferência.
A experiência foi positiva e, assim, nasceu a ideia para o modelo de negócios. O objetivo
central era ofertar espaços simples, de baixo custo, mas convenientes tanto para viajantes
quanto para anfitriões. A ideia é promover o encontro entre viajantes procurando um lugar de
baixo custo para ficar por pouco tempo e pessoas com um espaço ocioso, que desejavam uma
renda extra. Entretanto, na medida em que o negócio se expandiu, os sócios perceberam uma
mudança no perfil dos interessados. Ficou cada vez mais óbvio o lado social dos encontros, ao
mesmo tempo em que viajantes com mais poder aquisitivo buscavam espaços inusitados para
locar, mais interessados em experiências únicas do que baixo custo.
Esta facilidade de percepção dos interesses dos clientes parece ser uma grande vantagem dos
modelos de negócio baseados em co-criação. Envolvendo as pessoas diretamente na criação
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do serviço, a identificação das possibilidades de inovação para atendimento das necessidades
dos clientes é muito mais objetiva, facilitada e imediata (CHESBROUGH, 2003). Atualmente,
o AirBnB está redirecionando seus serviços, focando mais nas pessoas e suas experiências de
vida. Isto inclui uma alteração do design e funcionalidades da plataforma. Evidência disso são
as listas de lugares mais inusitados que o site oferece na capa, como casas em árvores,
acomodações em trens e trailers e acomodações associadas a atividades (p.ex., hospedar-se
em um estúdio de música). Ao mesmo tempo, foi disponibilizada a “lista de desejos”, onde os
usuários incluem os lugares que mais lhe chamam a atenção e podem compartilhá-la com
outros usuários ou nas redes sociais.
Ao mesmo tempo, os anfitriões também percebem outros valores do que apenas conseguir
uma renda extra. Cada vez mais é valorizada a experiência de partilhar um espaço seu com
pessoas de interesses comuns, porém de culturas diferentes. No cerne do negócio, o AirBnB
segue promovendo encontros para que pessoas compartilhem não só recursos, mas
experiências de vida. Nos aplicativos móveis, por exemplo, a empresa utiliza o slogan “um
mundo de espaços exclusivos ao alcance de suas mãos”.
Canais de atendimento
O portal AirBnB foca na facilidade de uso, baseado na experiência intuitiva e simplicidade.
Tanto no site como em aplicativos móveis é possível fazer o cadastro de um imóvel para
locação, assim como fazer uma reserva em qualquer cidade do mundo. A lógica é do autoserviço, com mínima intervenção da empresa. Respostas a dúvidas frequentes e tutoriais para
uso do sistema são disponibilizadas no site. O suporte ao usuário funciona em tempo integral
e inclui atendimento online por bate-papo com vídeo, e-mail ou telefone, em diversas línguas.
A sofisticação dos mecanismos de suporte acompanha o novo foco do negócio em locações
exclusivas, inusitadas e de alto luxo.
Canais de venda
A AirBnB utiliza os mais diversos canais web para contato com seus clientes. Além do
próprio site e aplicativos para celular, os canais de venda incluem as redes sociais Facebook e
Twitter, blogs e Youtube. Com isso, cresce a necessidade de gerenciar a presença da empresa
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nestes espaços, garantindo a percepção da unicidade do negócio e a constante integração do
portal com aplicativos e redes sociais.
Segmentos de clientes
Os segmentos de clientes acompanham a evolução da proposta de valor. Se antes os hóspedes
eram viajantes em busca de um espaço de baixo custo, hoje a busca é por espaços únicos,
exclusivos, inusitados, que garantam uma experiência diferenciada. Em consonância, os
locatários não são mais apenas aqueles que desejam uma renda extra a partir da locação de um
espaço ocioso, mas também quem possui um estilo de vida diferenciado, refletido em suas
moradas, a ponto destes verem como interessante a possibilidade de compartilha-las com
estranhos.
Parceiros
Os principais parceiros incluem os investidores, responsáveis pela injeção de mais de 120
milhões de dólares no negócio, além do operador de pagamentos online e da rede de
fotógrafos profissionais. O modelo de negócio precisa não só satisfazer as expectativas dos
clientes diretos, como também investidores e profissionais direta ou indiretamente ligados à
empresa.
Despesas
As principais despesas estão associadas ao desenvolvimento e manutenção da plataforma
web, o que inclui os recursos humanos e investimentos em infraestrutura de tecnologia. No
atual contexto tecnológico, porém, estes custos são relativamente baixos. Os parceiros
(fotógrafos e seguros) também constituem uma fonte de despesas, bem como os gastos com
publicidade e com o sistema online de pagamentos.
Receitas
Como em muito negócios C2C, o AirBnB cobra uma taxa pela intermediação da locação. A
empresa inovou ao cobrar uma taxa dos clientes em ambas as pontas (locador e locatário).
Dependendo da faixa de preço do aluguel, o locador é taxado entre 6% e 12% do valor da
reserva, enquanto o locatário paga 3% do valor cobrado do hóspede.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A web 2.0 é catalisadora de significativo avanço tecnológico, traduzido em novas ferramentas
de interação e consequentes novos modelos de negócios. Em particular, tem-se assistido ao
surgimento de modelos centrados em intermediar encontros entre pessoas interessadas em
construírem soluções para problemas comuns.
Ainda que modelos de negócio que se valem da co-criação deleguem boa parte da construção
do produto ou execução do serviço aos usuários, esforços de gestão aumentam nos serviços
periféricos. No caso estudado, a empresa gradativamente passou a oferecer serviços adicionais
como seguros, fotógrafos profissionais e suporte técnico em várias línguas. Além disso, pôdese perceber que muito do valor do negócio está na comunidade de usuários, sendo a
tecnologia apenas uma commodity. Percebe-se esforço da empresa em manter e ampliar a
comunidade para que o negócio mantenha-se atrativo. Isto inclui o aprimoramento contínuo
da plataforma web e aplicativos móveis, bem como a integração com redes sociais.
O benefício mais interessante do modelo estudado parece ser a oportunidade de rápida
adequação às necessidades das pessoas, uma vez que utilizando sua própria força de trabalho
esse diagnóstico é facilitado. A dinâmica imposta pelo modelo de negócios inovador exige
esta rápida resposta. A empresa está experimentando a alteração em sua proposta de valor em
um momento de expansão de suas atividades. Na medida em que o foco do negócio passa a
incorporar um lado mais social, valorizando a experiência única da hospedagem em lugares
exóticos e/ou luxuosos, cresce também a exigência por segurança, comodidade e sofisticação
dos serviços complementares.
De forma geral, percebe-se que modelos de negócio baseados em co-criação na web 2.0
transferem o foco do desenvolvimento do produto/serviço para uma gestão mais ampla das
relações da rede de valor. Conforme Teece (2010), para que um modelo de negócios seja
fonte de vantagem competitiva, ele precisa ser constantemente aperfeiçoado para o
atendimento das necessidades dos clientes.
Samavi et al (2009) descreve a inovação em modelo de negócios como um processo iterativo
de revisão periódica do modelo atual com vistas à buscar novas formas de gerar e capturar
valor baseadas nas capacidades da empresa e oportunidades de mercado. O caso estudado
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reflete este processo de inovação, no qual a empresa remodela sua proposição de valor
gerando, a partir deste redesenho, uma inovação em modelo de negócios.
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