JUSTIÇA NOS AEROPORTOS
Antônio Álvares da Silva
Professor titular da Faculdade de Direito da UFMG
Acabam de ser instaladas duas Varas de juizado especial, cível e federal no
Aeroporto de Confins. Sem dúvida, esta é uma medida de real interesse popular.
Todos sabem das vantagens dos juizados: procedimento simplificado e decisões
rápidas, exatamente o que se espera da justiça, principalmente quando a procura quem
está em viagem. O cidadão não pode ser um joguete nas mãos de grandes empresas
aéreas. Agora, ele sabe a quem se dirigir para cobrar seus direitos.
O juizado federal será competente para as questões institucionais em que se
envolver, principalmente, a Anac que, pela Lei 11.182/05, dispõe de ampla competência,
atuando como fiscal da aviação civil e da infra-estrutura aeronáutica e aeroportuária.
Ao exercer esta competência genérica, a Anac terá, necessariamente, que se
relacionar com os passageiros, principais usuários da aviação civil que ela tem a
obrigação de gerir e fiscalizar. A Vara cível cuidará da parte comum e das relações
contratuais do passageiro com as empresas aéreas, tais como o excesso de reserva
(overbooking), descumprimentos de cláusulas ajustadas, desordem no atendimento,
falha na prestação de serviço, atraso injustificado dos horários de vôos e muita coisa
mais, inerentes ao aspecto privado do tráfego aéreo.
Felizmente, agora a administração do Judiciário acordou para uma realidade há
muito reivindicada pelo nosso tempo: o juiz deve estar onde a sociedade precisa dele.
Não é o povo que deve ir aos tribunais, mas os tribunais é que devem caminhar para o
povo. Era assim na Roma antiga, há 21 séculos. O pretor, eleito pelo povo, vestido com
sua toga pretexta (branca com as bordas douradas) assentava-se junto aos estádios,
mercados e ruas de movimento para atender o cidadão, aconselhar e compor
controvérsias. A partir de agora faremos o mesmo nos aeroportos. Daí o acerto da
medida.
Já ouvimos a crítica de que a prioridade da justiça deve ser dirigida aos mais
necessitados. Por isto, os juizados também deveriam estar na rodoviária e nos bairros.
Está certa a censura. O que temos agora é um bom começo, mas deve ser valorizado e
posteriormente estendido a outros setores públicos.
Espera-se que estes juizados correspondam à esperança que neles o povo deposita.
Se o trabalho for intenso, igualmente intensa deve ser a resposta à demanda. Os
juizados devem contar com assessorias capazes e competentes, que ajudarão a
formular as decisões segundo padrões e orientação dos juízes. Vivemos numa época de
massificação de exigências, que devem ter respostas na mesma proporção.
A criação das duas Varas foi oportuna, porque evitará conflitos de competência que,
na expressão do civilista belga Henri de Page, constituem "a praga do Judiciário". De
fato, para se decidir qual juiz deva tomar conhecimento de uma causa poderá haver um
debate jurídico que dure anos. Enquanto isto, as partes esperam a longa e inútil
discussão ser resolvida para finalmente ser atendida em seus direitos.
Isto agora acabou em Confins. Os próprios servidores e juízes orientarão as partes
sobre o órgão competente para a demanda, evitando assim delongas e perda de tempo.
Espera-se que os dois juizados ajam com absoluta integração e cooperação
segundo prescreve a moderna Ciência do Direito. O Judiciário nunca lucrou com as
divisões internas, que suscitam os tais conflitos de competência. Devemos ter uma
justiça única, com todos os órgãos reunidos num só local e com portas abertas para o
povo. O cidadão será orientado sobre qual seção deverá procurar para resolver sua
controvérsia. Justiça federal, Justiça Cível e Criminal, Justiça do Trabalho, Justiça
Eleitoral e Justiça Militar devem constituir divisões racionais judiciárias, e jamais
compartimentos estanques e separados como são até hoje. A unificação da atividade e
das verbas simplificaria o acesso e facilitaria a vida das pessoas, além de reduzir custos.
Veja o leitor que as justiças do Trabalho e Federal pertencem à União. São pagas por
seus cofres. São, portanto, "federais" em sentido lato. Em muitas cidades do interior,
onde já existem varas trabalhistas, por que não se aproveitar suas dependências para a
criação de varas federais? Assim economizaríamos tempo e dinheiro. As duas justiças
deveriam ser imediatamente unificadas e a distribuição da competência entre elas seria
estabelecida por ato administrativo de um tribunal superior, conforme as necessidades
do momento.
Esta medida, lógica e necessária, deve ser imediatamente cogitada pelo legislador
constitucional, pois trará economia e racionalidade na prestação jurisdicional.
Já se disse que os juizados especiais são o futuro da justiça e a justiça do futuro.
Isto é verdade. Se hoje estão abarrotados de ações e lentos nas decisões, a causa não
se debita às leis que os criaram, mas à falta de administração adequada, carência de
servidores e outras medidas administrativas que podem ser implementadas, caso haja
atenção para os problemas que estes órgãos hoje enfrentam.
O terminal de Confins está bem servido e pode estar nascendo uma experiência de
elevado significado pedagógico para o futuro do Judiciário. Só falta instalar-se ali uma
Vara da Justiça do Trabalho com jurisdição sobre os municípios vizinhos, pois o
aeroporto já é de fato uma ampla cidade, à qual não faltarão conflitos de trabalho. Fica a
sugestão, com a esperança de que em breve se torne realidade.
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