Júlio César Cordeiro do Nascimento Homoerotismo e Psicanálise Mestrado em Psicologia Clínica Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - 1999 Dissertação apresentada ‘a Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Psicologia Clínica sob orientação do Prof. Doutor Manoel Tosta Berlinck. Resumo Esta pesquisa visa investigar o sentido e a função psíquica da categoria identitária homossexualidade no discurso de pacientes em análise. Objetivando a criação de metáforas teórico-clínicas que auxiliem o psicanalista a desobturar sua escuta, permitindo a associação livre destes pacientes. Para alcançar este objetivo o autor acredita ser necessário: explicitar algumas premissas do discurso imaginário social hegemônico acerca da homossexualidade; fazer uma leitura crítica dos principais textos freudianos que abordam o tema, na tentativa de compreender o lugar desta categoria na teoria de Freud; analisar o deslocamento que esta categoria sofreu no discurso de alguns pacientes que se auto denominavam homossexuais durante o processo de análise; faze uma articulação criativa destes três discursos utilizando outros autores de psicanálise. Agradecimentos A Manoel Berlinck, um orientador suficientemente bom, que soube dosar cuidados ternos e cobranças assertivas, me ensinando que escrever pode ser uma tarefa prazerosa, onde transformamos sonhos transferenciais em palavras libertadoras. A Ricardo Goldemberg, o analista que me ouviu falar da angústia de escrever este trabalho, transformando minha inibição em criatividade cotidiana. A Jurandir Freire Costa que me mostrou um mundo de idéias que transformou minha clínica. A todos os meus pacientes, pessoas tão diferentes, mas igualmente corajosas diante de sua própria dor. A inúmeros amigos psicanalistas que foram interlocutores indispensáveis ‘a confecção deste trabalho. Índice Geral I Introdução................................................................... 7 II A Psicopatologia Fundamental................................... 12 III A Inespecificidade Metapsicológica............................. 18 IV O Discurso Imaginário Social..................................... 30 V O Discurso na Clínica................................................. 44 I. Introdução Dois acontecimentos desencadearam o processo que culminou na formulação das questões centrais deste trabalho. O primeiro foi uma foto publicada em uma revista norte-americana (figura 1) e o segundo foi uma estória contada por um amigo psicanalista. A foto de dois adolescentes num beijo apaixonado me chamou a atenção pela semelhança física e estética dos personagens e pelo texto destacado sobre a imagem: “We met at Club USA on Sunday and we are attracted to each other right away, probably because we have identical style – we have the same taste in almost everything. His parents are not very cool with this, they just want to thing that we're friends. But, my moo, is cool with it, she even takes us out for lunch… The most romantic think we is go for a walk with our Pittbull puppy named Sucky”.¹ Imediatamente me veio ‘a mente a idéia de um amor em espelho e em seguida a pergunta: “A homossexualidade tem algo de narcísico? ” Em seguida associei a lembrança da estória contada há meses atrás por um amigo: “Rômulo e Remo, irmãos gêmeos, não costumavam freqüentar os mesmos lugares e nem de relacionar-se com as mesmas pessoas; ambos preferiam sair de casa sem a companhia do outro irmão gêmeo.. Talvez isso se justificasse pelo fato de que, em suas saídas noturnas, eles tinham aventuras sexuais com rapazes. Cada um deles temia que o outro imaginado como heterossexual, descobrisse suas preferências sexuais. Entretanto, como moravam numa capital muito pequena, várias pessoas já conheciam essas estórias e sempre se indagavam sobre o dia em que eles viessem a tomar conhecimento do que de fato lhes acontecia. ______________________________ ¹ “Nós nos conhecemos no 'Club USA' num domingo e nós nos atraímos mutuamente no mesmo instante, provavelmente porque nós temos estilos idênticos - nós temos o mesmo gosto em tudo. Os pais dele não simpatizam muito com isso, eles apenas preferem pensar que nós somos amigos. Mas minha mãe simpatiza com isso, ela até nos leva para almoçar fora... A coisa mais romântica que nós fazemos é sair par andar com nosso cachorrinho Pittbull chamado Sucky.” Um dia ambos foram convidados para uma festa “gay”. Criou-se assim uma grande expectativa entre os convidados sobre o provável encontro dos dois. Quando eles se encontraram na festa, foram tomados por uma estranha sensação, um misto de surpresa, receio, alívio e satisfação. Passaram a conversar entusiasticamente, relembrando juntos as inúmeras desculpas inventadas, na tentativa de esconder suas aventuras. A conversa foi ficando tão empolgante para ambos que não havia espaço para nenhum outro interlocutor e as pessoas da festa se deliciavam com a estória. Aos poucos os dois deixaram de ser o centro das atenções. Quando alguém resolveu observá-los novamente, estavam entregues em um ardente beijo. Rômulo e Remo namoram até hoje.” Diante da fascinação paralisante que este relato me produziu, só pude transformar minha pergunta em afirmação: a homossexualidade tem algo de narcísico. Entretanto algo deste enunciado não me satisfez, a resposta parecia demasiado simplista. Resolvi colocar este incômodo a serviço de uma pesquisa teórica a partir de algumas questões: Será que o texto freudiano sustentaria essa afirmação? O que seria da homossexualidade no entender da psicanálise? Passei, então, a fazer leituras de textos de Freud nos quais ele se referia a “homossexualidade”, visando à elaboração de um trabalho teórico. Entretanto, durante este período inicial da pesquisa fui diversas vezes convidado a falar sobre “homossexualidade” em palestras, congressos, programas de televisão e rádio. A partir deste momento comecei a ser procurado por pessoas que se autodenominavam “homossexuais” e que relatavam acreditar que todo seu sofrimento psíquico era causado por este fato. Neste mesmo período conheci u e passei a fazer parte de um grupo de psicólogos que estudavam textos sobre “homossexualidade”. Mais tarde vim, a saber, que este grupo era ligado a uma instituição chamada Instituto Kaplan, uma clínica que se definia pelo atendimento a pessoas com queixas de “disfunção sexual” (ejaculação precoce, impotência sexual, frigidez, anorgasmia, vaginismo, etc.). Fui convidado, após alguns meses, as ser supervisor e responsável direto por uma área que se chamava “Ambulatório de Sexualidades Alternativas” desta clínica. Estes dois fatos mudaram os rumos da minha pesquisa, uma vez que percebi que a minha prática clínica me ajudava a entender e a deslocar-me de alguns impasses que a leitura teórica me colocava. Um deles era exatamente sobre o conceito de “homossexualidade”. No referido ambulatório, eram atendidos pacientes considerados “homossexuais”, “transexuais”, “travestis”, ou qualquer outra pessoa que, ao procurar a clínica e fazer uma entrevista de triagem, fosse considerado como possuidor de uma prática sexual não convencional, ou seja, “alternativa”. Justamente o que nunca era claro neste encaminhamento eram os critérios através dos quais uma pessoa era considerada “homossexual”, ou ainda, porque este “diagnóstico” devia implicar num atendimento diferenciado, uma vez que havia um ambulatório de sexualidade feminina e um de sexualidade masculina. Processo semelhante ocorria no meu consultório particular, pois freqüentemente era procurado por pessoas que se diziam “homossexuais” e não era claro para mim por que esses pacientes assim se definiam, entretanto me chamava a atenção o fato deles perceberem suas fantasias e/ou práticas sexuais como sendo a causa de todo seu sofrimento. Nesta altura devo introduzir justamente um dos limites deste trabalho de pesquisa: não é meu interesse definir operacionalmente² o que é um “homossexual”. Um dos objetivos deste trabalho é precisamente questionar a utilidade clínica deste conceito e indicar o modo como ele opera na relação transferencial, ou seja, não estou preocupado em saber se meu paciente é ou não homossexual a partir de uma série de critérios externos, quaisquer que eles sejam, mas tomo como suficiente sua auto definição e passo a investigar as relações desta crença imaginária com o processo de análise. Desta forma, os rumos deste trabalho foram redefinidos. A pesquisa passou a ter a pretensão de investigar o sentido e a função psíquica da categoria identitária homossexualidade no discurso queixoso e estereotipado de pacientes em análise, visando a criação de metáforas teórico-clínicas que auxiliem o psicanalista a desobturar sua escuta, permitindo a associação livre destes pacientes. Para alcançar este objetivo o autor acredita ser necessário: explicitar algumas premissas do discurso imaginário social hegemônico acerca da homossexualidade; fazer uma leitura crítica dos principais textos freudianos que abordam o tema, na tentativa de compreender o lugar desta categoria na teoria de Freud; analisar o deslocamento que esta categoria sofreu no discurso de alguns pacientes que se auto denominavam homossexuais, durante o processo de análise; fazer uma articulação criativa destes três universos utilizando outros autores de psicanálise. ___________________ ² Definição operacional é, grosso modo, um conceito behaviorista que significa listar critérios objetivos que permitam a qualquer pessoa reconhecer quando um elemento pertence a uma determinada categoria. A Psicopatologia Fundamental Esta pesquisa foi desenvolvida no interior do Laboratório de Psicopatologia Fundamental e, obviamente, este espaço de interlocução influenciou muito meu trabalho. Como já havia mencionado, minha idéia inicial era fazer um trabalho teórico, uma análise conceitual em Freud acerca da noção de “homossexualidade”. Mesmo quando já possuía material clínico para auxiliar a pesquisa, sentia-me ainda inseguro em utilizar minha experiência a serviço de uma articulação entre prática e teoria. Entretanto, uma reflexão sobre a minha prática clínica sempre foi uma demanda explícita de Manoel Berlinck. A avaliação do meu primeiro trabalho entregue para aquele que viria se futuramente meu orientador foi decisiva na minha trajetória: “Júlio, O seu trabalho está correto. Você leu com entusiasmo o texto do Fédida, de grande importância para uma fenomenologia da clínica psicanalítica. Entretanto, eu pedi mais e acho que você pode dar mais. O Fédida eu já li várias vezes. Você ainda não li. Qual é a sua palavra a respeito da sua experiência clínica? Você fica me devendo essa.” Essas palavras me soaram como um desafio, mas, sobretudo como um estímulo de quem acredita que minha clínica tem valor e é digna de ser pensada. Hoje compreendo que um trabalho “correto” e “inteligente” pode ser uma solução de compromisso que visa mascarar a angústia que as incertezas da prática clínica suscitam. Assim tomamos a palavra de um autor como se fosse “A verdade” sobre a nossa clínica cotidiana, ou até mesmo para não falar dela. De fato pude descobrir que tinha muito o que falar, e que esta nova posição é, por outro lado, libertadora, pois não se trata mais de estar referido a ideais tirânicos de um super eu técnico. A idéia é fazer um discurso próprio, que faça sentido para si e que seja uma narrativa das experiências vividas na própria clínica. Passei a ousar falar das minhas experiências com meus pacientes e deste novo lugar pude reconhecer e questionar alguns impasses das minhas concepções teóricas acerca da noção de “homossexualidade”. Esta nova posição frente a pesquisa em psicanálise e a prática clínica foi sistematizada por Berlinck em seu artigo “O que é Psicopatologia Fundamental”, no qual ele considera que a posição da Psicopatologia Funda,mental encontra suas origens no teatro grego do tempo de Péricles e na medicina de cidadãos praticada em Atenas. Essa metáfora do teatro grego no pensamento de Berlinck é entendida como uma posição em relação a outras duas possibilidades de freqüentar a agora, a saber, orthos e historie. Orthos pretende convencer o interlocutor da irrepreensibilidade de sua posição. Através do discurso lógico e da associação de fatos verificáveis, orthos tenta convencer os críticos desconfiados. Associo esta posição a uma tradição de pesquisa que visa tipificar o comportamento sexual entre as pessoas do mesmo sexo, descobrir a causa ou origem de tais comportamentos. Um exemplo deste tipo de pesquisa é o relatório Kinsey. Esse modelo de pesquisa procura categorizar os indivíduos segundo a lógica de como se usa o corpo e ainda descobrir os motivos pelos quais se usa o corpo de tal ou qual forma. Entretanto, segundo Hopcke, existe uma ligação entre etiologia e cura: “Devido a essa ligação entre etiologia e cura, e também à recente despatologização da homossexualidade, a etiologia da mesma como foco de pesquisa ficou muito atrás da pesquisa do que se pode chamar de fenomenologia da homossexualidade. Na linguagem comum, estamos examinando menos a forma como as pessoas se tornam gays e mais a forma como os gays são individualmente, em casais ou em grupos.” (Hopcke, 1993, p.69). O interessante dessa afirmação é que a preocupação com a “causa da homossexualidade” só faz sentido ’aqueles que visam administrar um tratamento que, ao combater a etiologia da suposta doença, conseguiriam curá-la. A falha deste tipo de posição é que ao se preocupar com a categoria geral e sua causalidade, perde-se de vista o sujeito singular. Quando nomeamos alguém como sujeito “homossexual” engessamos o fenômeno humano como um ortopedista que visa devolver o osso ao seu lugar correto para corrigir as deformidades do corpo. Uma outra posição segundo Berlinck é a do historiador que observa e anota tudo que ocorre visando “garantir aos gregos uma memória que lhes permitisse o reconhecimento de si ameaçado pela crescente presença dos estrangeiros na polis” (Berlinck, 1998, p.50) e “relatar o ocorrido estabelecendo as diferenças entre os gregos e os estrangeiros”. (Berlinck, 1998, p.51) Assim, o Relatório Kinsey afirmaria que 37% da população masculina americana havia tido algum tipo de comportamento homossexual até a ejaculação, após a fase da puberdade. (Kinsey, 1948, p.625) Percebe-se que a preocupação é observar, registrar e estabelecer as diferenças entre o grupo dos que mantiveram “comportamento homossexual” e os “heterossexuais exclusivos” . Ou seja, o investimento do pesquisador resulta em definir quem é “homossexual” e relacionar suas características, para assim poder estabelecer as diferenças entre estes e os “heterossexuais”. Costa denuncia muito bem o risco desse tipo de prática discursiva: “O vocabulário do ‘negro & branco’ revelou-se completamente insuficiente na luta contra o racismo. Do ponto de vista da atenuação do preconceito pouco adiantaram as lutas em torno de palavras de ordem como ‘negro é bonito’, ‘é orgulhoso’ ou afirmações de que ‘o negro é uma mera variação do natural do gênero humano’. A crença da sociedade racista branca de que existem no mundo dois grupos raciais, o dos ‘brancos’ e o dos ‘negros’, ensinou a todos os norte-americanos que ser capaz de reconhecer quem ‘era realmente branco’ e ‘quem era realmente negro’ era uma questão moral fundamental ‘a à sobrevida sociocultural dos Estados Unidos. Como resultado, brancos e negros jamais puderam trocar de olhar e posição nessa montagem cruel e violenta.” (Costa,1992, p.36) Neste sentido, a preocupação em estabelecer as diferenças entre “gregos & bárbaros”, “brancos & negros” ou “heterossexuais & homossexuais”, acaba por transmitir a convicção de que ser capaz de reconhecer essas diferenças é fundamenta, pois essas diferenças seriam fundamentais para as relações humanas. As pessoas passam a ser categorizadas a partir dessas posições e sua singularidade deixa de ser relevante. Essas diferenças tendem a se fixar e o pior se reificar, a montagem imaginária torna-se rígida e passamos a olhar e analisar as pessoas a partir dos predicativos implícitos na definição de cada grupo. Perde-se de vista a noção de indeterminação do objeto, a idéia de que somos algo só a partir de um jogo de posições relativas. A posição do teatro vai justamente se opor a essas outras duas, uma vez que prioriza a escuta da voz singular. De acordo com Berlinck, o discurso do teatro é uma narrativa mito-poética epopéica, ou seja, contar uma história sem pretender convencer o interlocutor da irrepreensibilidade de sua posição. “O orador não é responsável pelo que diz no mito, cuja linguagem está vinculada à crença incorporada no aforismo helênico: ‘não inventei isso, apenas ouvi falar por aí’. A maioria dos mitos, inclusive gregos, narra feitos de entes mágicos ou de deuses, o que leva a crer que tenham sido eles próprios seus autores; homens e mulheres apenas passam adiante.” (Berlinck, 1998, p. 52) Berlinck cita ainda a famosa definição de Aristóteles de que na narrativa mítica haveria “uma suspensão voluntária da descrença”, pois o que sustentaria o mito seria o compromisso social. Considero esta metáfora muito rica para compreender a perspectiva do pesquisador em psicanálise que ouve histórias na clínica, onde a noção verdade por correspondência não se aplica. Desde Freud, o que importa é a realidade psíquica e o sentido daquela fala a partir de uma determinada transferência. Essa história é recontada para o analista do analista, para o supervisor, para o orientador da pesquisa, para os colegas de trabalho, formando uma grande rede de interlocutores ratificando o compromisso social, que de fato, é sustentado pelo conjunto das transferências. Esta pesquisa, que foi gestada no Laboratório de Psicopatologia Fundamental, é, antes de tudo, uma narrativa mito-poética. O Laboratório, neste sentido, é um grande teatro de Dionísio, onde todos os pesquisadores se inclinam para ouvir melhor o discurso do colega pesquisador acerca do sofrimento e da paixão pela sua clínica. Esta pesquisa é antes de tudo, uma narrativa sobre Pathos: “Pathos, então, designa o que é pático, o que é vivido. Aquilo que pode se tornar experiência. ‘Psicopatologia”, literalmente, quer dizer; um sofrimento, uma paixão, uma passividade que porta em si a mesma possibilidade de um ensinamento interno que não ocorre a não ser pela presença de um médico (pois a razão é insuficiente para proporcionar experiência). Como pathos torna-se uma prova e, como tal, sob a condição de que seja ouvida por um médico, traz em si mesma o poder de cura. Isso coloca imediatamente a posição do terapeuta. Pathos nada pode ensinar, pelo contrário, conduz à morte se não for ouvido por aquele que está fora, por aquela que, na condição de espectador no teatro grego do tempo de Péricles, se inclina sobre o paciente e escuta essa voz única de dispondo a ter, assim, junto com o paciente, uma experiência que pertence aos dois.” (Berlinck, 1998, p.55) Assim, o que pretendo com essa pesquisa é, antes de tudo, narrar minhas experiências com meus pacientes e tentar, a partir da minha paixão por Freud e outros autores de psicanálise, pensar metapsicologicamente algumas dificuldades do meu fazer clínico. A Inespecificidade Metapsicológica Justamente, um dos primeiros impasses que pude perceber na forma como articulava teoricamente o que ouvia de meus pacientes era o fato de que a noção de homossexualidade não parecia ser um conceito que me auxiliava na prática clínica cotidiana. Ao refletir se o conceito homossexualidade seria ou não um conceito útil a um psicanalista, ou seja, se este conceito seria um conceito heurístico para a clínica psicanalítica, passei a indagar-me sobre o próprio conceito em questão. É claro que não se pode negar a existência de pessoas que se autodenominam “homossexuais” e que realizam práticas ditas “homossexuais”. \mas o que significa se autoincluir na categoria dos “homossexuais” e que utilidade teria tal classificação para a escuta clínica? Para pensar estas questões utilizo a seguinte metáfora: Existem rosas vermelhas, brancas amarelas e até de cores artificialmente criadas como azul. Se perguntarmos a um botânico, ele nos dirá que a cor de uma rosa não é um critério classificatório importante, grosso modo, para ele, é importante diferenciar a rosa do conjunto de outras inflorescências, pois um botânico está preocupado com o número de pétalas, estames e outras estruturas de uma inflorescência. Ele está preocupado com a anatomia e com a formação das inflorescências. Entretanto, se desejarmos presentear uma pessoa com rosas e estivermos preocupados em seguir as normas de etiqueta, a cor da rosa será um critério classificatório importante fazendo com que um elemento pertença a um grupo e não a outro, tornando dois elementos rosa muito diferentes entre si. Esta analogia nos permite chegar a duas conclusões: Quando desejamos agrupar ou categorizar elementos, este arranjo vai depender de quais critérios são eleitos para fazermos a inclusão categorial. Este critério será outorgado por um outro significativo, lugar que reconhece esse critério como sendo válido ou legítimo. Logo, não se trata de negar a existência das cores rosas, mas simplesmente reconhecermos a sua força relativa como critério classificatório. Obviamente podemos nos perguntar qual ou quais são os critérios para classificarmos uma pessoa como sendo “hetero” ou “homossexual”, e ainda nos perguntarmos se um psicanalista está referido a um lugar onde esses critérios são relevantes, a ponto de constituírem critérios classificatórios para a teoria e a clínica psicanalítica. Imaginemos um interlocutor referido a esses critérios classificatórios. Ele nos diria que homossexual é uma pessoa que sente atração por uma pessoa do mesmo sexo.³ Poderíamos dizer a nosso interlocutor que sentir atração ou desejos sexuais é uma capacidade ou um traço comum de muitas pessoas e que isso não poderia servir de critério diferenciador. Para Freud, o desejo sexual é uma das possíveis manifestações da libido, manifestação presente nos supostos “heterossexuais” e nos “homossexuais” também. Seria o que chamamos de investimento libidinal de objeto. Nosso interlocutor perguntaria se sentir desejos sexuais por uma pessoa do mesmo sexo não seria uma diferença significativa. Lembremos ao nosso interlocutor que Freud, em “Pulsões e Destinos Pulsionais”, afirma que o objeto “é o que há de mais variável na pulsão e, originalmente, não está ligado a ele, só sendo destinado por ser peculiarmente adequado a tornar possível a satisfação... Pode ser modificado quantas vezes for necessário no decorrer dos destinos que a pulsão sofre durante sua existência, sendo que esse deslocamento da pulsão desempenha papéis altamente importantes.” (Freud, 1915. p.143) O que é decisivo aqui é que qualquer coisa pode se constituir em um objeto de satisfação pulsional. O objeto é, na realidade, o que há de mais variável na pulsão. Na mitologia freudiana a pulsão em sua origem não teria objeto, sendo essa uma aquisição tardia relacionada ao declínio do auto-erotismo. Nos “Três Ensaios Sobre a Sexualidade” Freud vai justamente desmistificar a existência de um objeto “adequado” à pulsão. _____________________ ³ Essa questão será mais amplamente discutida quando abordarmos o argumento de Jurandir Freire Costa. “Chamou-nos a atenção que imaginávamos como demasiadamente íntima a ligação entre a pulsão sexual e objeto sexual. A experiência obtida, nos casos considerados anormais nos ensina que, neles, há entre a pulsão sexual e objeto sexual apenas uma solda, que corríamos o risco de não ver em conseqüência da uniformidade do quadro normal, em que a pulsão parece trazer consigo o objeto. Assim somos instruídos a afrouxar o vínculo que existe em nossos pensamentos entre a pulsão e o objeto. É provável que, de início, a pulsão sexual seja, independente de seu objeto e tampouco deve ela sua origem aos encantos deste”. (Freud, 1905, p.138) Freud, desta forma, deixa claro que não há “O” objeto da pulsão, o que há são os múltiplos objetos da pulsão. A ligação entre pulsão sexual e objeto da pulsão para Freud é algo contingencial, eles foram “soldados”, ou seja, sua liga foi construída, não havendo uma ligação “natural” entre eles. E se por vezes, em nosso pensamento, criamos a ilusão de que determinado objeto seria o complemento necessário a uma determinada pulsão sexual, isso se deve a uniformidade do quadro considerado normal. É nessa direção que Freud vai questionar a idéia de que a homossexualidade seria um caso a parte, onde a pulsão sexual estaria ligada a um “objeto inadequado”, afirmando em uma nota de rodapé: “A pesquisa psicanalítica se opõe com máximo de decisão que se destaquem os homossexuais, colocando-os em um grupo a parte do resto da humanidade como possuidores de características especiais. Estudando as excitações sexuais, além das que se manifestam abertamente, descobri que todos os seres humanos são capazes de fazer uma escolha de objeto homossexual e que na realidade o fizera em seu inconsciente... Assim, do ponto de vista da Psicanálise, o interesse sexual exclusivo de homens por mulheres também constitui um problema que precisa ser elucidado, pois não é fato evidente em si mesmo, baseado em uma atração, afinal de natureza química.” (Freud, 1915, p.136) Refletindo sobre este trecho não consigo deixar de me recordar de lições que não se encontram publicadas e que foram transmitidas em aulas de Manoel Berlinck e Luis Cláudio Figueiredo. O primeiro sempre nos dizia: “Um pesquisador da obra freudiana tem que ficar atento às notas de rodapé... Pois nelas, muitas vezes se encontram idéias fundamentais”. Já Luis Cláudio nos alertava para a importância de entender por que um autor acrescentaria uma idéia ao texto usando o recurso da nota de rodapé e qual seria a possível relação entre corpo principal do texto e a nota. Esta nota de rodapé foi acrescentada por Freud posteriormente em 1915, fato que demonstra que não era uma idéia presente (pelo menos não de maneira manifesta) na redação original do texto e obviamente não teria sido acrescentada mais tarde se não fosse considerada fundamental. Duas idéias me parecem realmente fundamentais. A primeira é o fato de Freud “se opor com máximo de decisão” em considerar os “homossexuais” como um grupo do resto da humanidade, o que vem ao encontro com nosso argumento, de que não há este suposto “grupo” com características particulares, que por sua vez estaria em oposição ao suposto grupo de heterossexuais. A segunda idéia é que Freud transforma o interesse sexual exclusivo de homens por mulheres num problema de pesquisa para a psicanálise, num problema a ser investigado, ao contrário do senso comum que só se pergunta pelas causas da homossexualidade, considerando a heterossexualidade um fato auto evidente que não precisa de explicações. 4 Nosso interlocutor poderia nos perguntar por que algumas pessoas escolhem como objeto uma pessoa do mesmo sexo, e questionar se esse tipo de escolha amorosa não seria mais narcísica que as demais, uma vez que nessa perspectiva os ditos homossexuais procurariam sua própria imagem refletida no parceiro amoroso. Freud, ao escrever “Sobre o Narcisismo: Uma Introdução”, afirma: “Descobrimos, especialmente nítido em pessoas cujo desenvolvimento da libido experimentou uma perturbação, como em perversos e homossexuais, que elas não elegem seu posterior objeto de amor segundo o modelo da mãe, mas segundo o da sua própria pessoa. Procuram notoriamente a si mesmos como objeto de amor, mostram o tipo de eleição de objeto a ser chamado de narcísico. Nesta observação deve ser reconhecido o motivo mais forte que nos coagiu à suposição do narcisismo.” (Freud, 1914, p.104) ___________________________________ 4 A clínica mostra claramente esta diferença entre a pesquisa psicanalítica e as preocupações do leigo. Nunca tive a experiência de ouvir um homem se questionar sobre as causas ou origens do seu interesse sexual por mulheres, mas com freqüência pacientes nos procuram querendo “entender” as razões de seu interesse sexual por pessoas do mesmo sexo. Freud, nessa altura do seu desenvolvimento teórico distingue homossexuais de perversos, apesar de que, segundo este parágrafo, ele consideraria que ambos teriam um tipo de escolha de objeto narcísica. Essa idéia já estava presente em “Leonardo da Vinci e uma lembrança da sua Infância”, texto no qual Freud descreve os resultados de suas investigações. Resumidamente, nos casos de homossexualidade masculina uma ligação erótica muito intensa com a mãe, reforçada pelo papel secundário do pai durante a infância.O menino recalcaria seu amor pela mãe, identificar-se-ia com ela e tomaria a si próprio como um modelo ao qual deveriam assemelhar-se os novos objetos de seu amor. “O que de fato aconteceu foi um auto-erotismo, pois os meninos que ele agora ama à medida que cresce, são, apenas figuras substitutivas de si próprio durante sua infância – meninos que ele ama da maneira que sua mãe o amava quando ele era criança. Encontram seus objetos de amor segundo o modelo do narcisismo, pois Narciso, segundo a lenda grega, era um jovem que preferia sua própria imagem a qualquer outra, e foi assim transformado na bela flor do mesmo nome.” (Freud,1910, p.92) Podemos concluir que Freud, em 1910, neste texto sobre Da Vinci, acreditava ser o narcisismo uma particularidade dos homossexuais masculinos. Entretanto, Freud em 1914, no seu estudo mais extenso sobre o narcisismo, vai mostrar que não foi essa a conclusão que ele chegou: “Não concluímos, entretanto, que os seres humanos dividem-se em dois grupos marcadamente separados, conforme eles tenham o tipo de apoio de eleição de objeto ou o tipo narcísico, porém, preferimos a suposição de que a cada ser humano estão abertos ambos os caminhos para a eleição de objeto, onde um ou outro pode ser preferido; dizemos que o ser humano teria dois objetos sexuais originários: ele mesmo e a mulher que o cuida, e pressupomos nisto o narcisismo primário de cada ser humano, o qual eventualmente pode vir a expressar-se de modo dominante em sua eleição de objeto.” (Freud, 1914, p.104) Esses trechos me chamaram a atenção, pelo fato de que percebi através deles como a leitura apressada do texto freudiano pode dar lugar a conclusões precipitadas, sem rigor teórico, escamoteando, ou até mesmo recalcando idéias que não condizem com determinado tipo de crença consciente. Confesso que no início desta pesquisa estava fortemente inclinado a considerar a homossexualidade como uma manifestação necessariamente narcísica. Mas hoje compreendo que a grande mudança no pensamento freudiano, após suas pesquisas sobre o narcisismo, foi justamente que todos nós, em certa medida, fazemos escolhas amorosas baseados no nosso narcisismo primário. Desta maneira, o fato de uma pessoa estar relacionando amorosamente com outra pessoa do mesmo sexo não significa necessariamente que esta relação seja mais narcísica que uma relação heterossexual, ou seja, ‘homossexuais’ e ‘heterossexuais’ são potencialmente influenciados pelo seu narcisismo nas suas escolhas amorosas, e ambos eventualmente podem vir a expressar um modo narcísico dominante nas suas escolhas de objeto. Freud prossegue em “Sobre a Introdução do Narcisismo” desenvolvendo a idéia de que todo enamoramento possui um caráter narcísico. Uma pessoa ama o que ela mesma é, o que ela mesma era, o que ela mesma gostaria de ser, a pessoa que ra uma parte dela própria, a mulher nutriz e o homem protetor. Uma vez que toda escolha amorosa tem como um de seus componentes o narcisismo, este não pode também ser considerado um critério classificatório. A próxima objeção do nosso interlocutor seria que no Édipo “normal” o menino elegeria a mãe como modelo para as suas futuras escolhas de objeto, logo, a heterossexualidade seria o curso normal do desenvolvimento pulsional. Para Freud, a satisfação direta do Édipo seria tomar a mãe em intercurso sexual sobre a forma ativa, ou o pai sobre a forma passiva. Em “A Dissolução do Complexo de Édipo” ele afirma: “O complexo de Édipo ofereceu à criança duas possibilidades de satisfação, uma ativa e outra passiva. Ela poderia colocar-se no lugar de seu pai, à maneira masculina, e ter relações com a mãe; como tinha o pai, caso em que cedo teria sentido o último como estorvo, ou poderia querer assumir o lugar da mãe e ser amado pelo pai, caso em que a mãe se tornaria supérflua.” (Freud,1924, p.27) É importante relembrar que esta é a entrada no Édipo e permanecer acreditando na possibilidade da realização dessas fantasias seria continuar buscando a satisfação amorosa no campo deste complexo, o que custaria à criança o preço de ficar aprisionado eternamente num amor impossível e culturalmente proibido. A dissolução do complexo de Édipo seria justamente a renúncia a essa satisfação direta, abrindo mão destas duas possibilidades em nome de uma terceira: a liberdade de escolher, pelo menos teoricamente, quaisquer outras pessoas para amar. Aqui, é preciso insistir nas duas possibilidades do Édipo, como descreveu Freud em “O Ego e o Id”: “Um estudo mais aprofundado geralmente revela o complexo de Édipo mais completo, o qual é dúplice, positivo e negativo, devido à bissexualidade originalmente presente na criança. Isto equivale a dizer que um menino não tem simplesmente uma atitude ambivalente para com o pai e uma escolha objetal pela mãe, mas que, ao mesmo tempo, também se comporta como ‘uma menina’ e apresenta uma atitude afetuosa feminina para com o pai e um ciúme e uma hostilidade correspondentes em relação à mãe.” (Freud, 1923, p.47) O mais interessante nesta leitura freudiana do mito de Édipo é que a saída deste complexo implica em uma renúncia às relações incestuosas com o pai e com a mãe, uma vez que, ac contrário da versão mais popularizada,ambas relações são desejadas pela criança, mas ao mesmo tempo essa renúncia aos objetos proibidos acena para a possibilidade de buscarmos essa satisfação em qualquer outros objetos que desejarmos e pudermos. Em “Psicologia das Massas e Análise do Eu” Freud resumiria: “É fácil enunciar numa fórmula a distinção entre identificação com o pai e a escolha deste como objeto. No primeiro caso o pai é o que gostaríamos de ser; no segundo, o que gostaríamos de ter, ou seja, a distinção depende do laço se ligar ao sujeito ou ao objeto do ego.” ( Freud, 1921, p.116) Assim, toda criança escolheria um dos pais para ser e o outro para ter, configurando o processo identificatório por um lado e a escolha de objeto por outro. Podemos pensar também que na escolha amorosa há uma mistura de traços que se originam de quem ocupa o lugar do pai e de quem ocupa o lugar da mãe, combinando-se assim muitos traços psicológicos, corporais, estéticos, de modo que, sempre que estamos apaixonados, estamos diante de uma pessoa que representa uma série histórica de traços, significados e significantes quaisquer que não podem ser resumidos por fórmulas do tipo: “ele é o substituto do meu pai ou é o substituto da minha mãe”. Se fosse assim, estaríamos raciocinando como o pequeno Hans: “ele tem pipi, é o substituto do meu pai; ela não tem pipi, é o substituto da minha mãe”. Ora, o que é forte na teoria psicanalítica é que a masculinidade e a feminilidade não estão resumidas a um referente anatômico. Assim não podemos simplesmente fazer uma investigação das relações edipianas de um paciente baseando-se apenas no sexo anatômico de seus parceiros amorosos. Eliana Calligares, em comunicação pessoal, resumiu muito bem aquilo que eu tentava demonstrar por ocasião da apresentação do meu projeto de pesquisa: “Pode haver uma relação amorosa hetero anatômica, mas ao mesmo tempo essa relação pode ser homossexual no sentido psíquico”, por exemplo, um homem pode se relacionar com uma mulher que esteja muito mais associada por traços psíquicos à figura do seu pai, uma mulher pode estar se relacionando com outra mulher que seja mais associada à figura de seu pai, um homem pode estar se relacionando com um homem que seja imaginariamente o substituto de sua mãe, ou seja, podemos deduzir daí uma multiplicidades numa verdadeira análise combinatória de vários elementos: o desejo, o narcisismo, as relações edipianas e os traços de significantes e de significados quaisquer que vão marcando nossa trajetória de identificações e escolhas subjetivas. Contardo Calligares consegue ser mais claro e poético que eu: “Além disso, a psicanálise descobre que o que nos excita sexualmente, de fato e apesar de nossos convencimentos, não é tanto o parceiro ou a parceira com quem nos debruçamos, quanto uma fantasia, consciente ou inconsciente que seja, organizada ao redor de um objeto parcial, qualquer coisa, como vocês sabem, um olhar, um cheiro, um gosto, uma frase, uma gota de sêmen, de saliva ou suor. (...) Em nossa vida sexual não seríamos então, nem homo, nem hetero, pois não seríamos, propriamente, nem homens ou mulheres; desse ponto de vista, seríamos todos fantasiantes segundo uma variedade de cenários e, sobretudo, de objetos.” (Calligaris, 1996, p.8) Considero os textos de Freud citados até agora os mais significativos. Há inúmeras referências sobre a homossexualidade na Obra Freudiana, mas poderíamos resumir suas posições em duas classes: Hipóteses que Freud levanta sobre a origem da homossexualidade, a qual vai considerar sempre um processo particular dentre outros. Assim haveria mais de um tipo de homossexualidade. Para citar um exemplo deste tipo deste tipo de estrutura discursiva: “... o processo particular que destacamos é, talvez, apenas um entre muitos outros e talvez corresponda a um único tipo de ‘homossexualidade’.” (Freud, 1910, p.93) Em vários momentos, Freud insiste em afirmar que os “homossexuais” não devem ser considerados um grupo portador de características especiais. Os traços supostamente característicos da homossexualidade são, em última análise, encontrados em todas as pessoas. “Qualquer pessoa por mais normal que seja, é capaz de fazer uma eleição de objeto homossexual, e mesmo já a terá feito em alguma época de sua vida e, ou ainda a conserva em seu inconsciente, ou, então, defende-se dela com vigorosas contra atitudes.” (Freud, 1919, p.91) Concluímos a partir dos textos de Freud que não existem características psicodinâmicas específicas que poderíamos encontrar em todos os sujeitos denominados “homossexuais”, sendo que as características que Freud considerou em algum momento de sua obra como particularidades destes indivíduos, mais tarde ele próprio as considerou como presentes em todos os seres humanos. Mas por que tendemos a considerar intuitivamente que existem indivíduos que denominamos “homossexuais”? IV. O Discurso Imaginário Social A teoria freudiana apresentou-se para nós como uma possibilidade de romper com a dicotomia “heterossexualidade” X “homossexualidade”. Entretanto, nos parece que o discurso imaginário não só mantém essas categorias, como as reifica. Os fragmentos de discurso que passo a analisar são importantes na medida em que: Fornecem imagens cristalizadas do que é “ser homossexual”. Essas imagens são apropriadas por determinados sujeitos em análise como sendo a única representação psíquica possível de si. Mais do que oferecer predicativos para o sujeito, essas imagens criam uma determinada lógica de construção de significados. Um exemplo deste tipo de discurso é a matéria publicada na Revista da Folha, no dia 26 de março de 1995, que ocupou nove páginas deste veículo de comunicação: “Com o primeiro Festival de Manifestações da Sexualidade, (1993), o designer gráfico André Fischer e a jornalista Susy Capó, 32, levam a atitude gay para dentro de uma instituição pública, o Museu da Imagem e do Som de São Paulo. Tá? Era o que faltava pro povo todo se animar e ganhar espaço. Deu tão certo que nem o olho gordo de sempre atrapalhou a segunda versão do festival (1994). Um sucesso de fila, vendas e mídia. Virou conceito (Mix Brasil), virou revista (Mix Magazine), virou cartão de crédito (Club Mix), virou moda (Mundo Mix), virou consumo (Mercado Mix).” (Fischer, 1995, p.23) De acordo com essa matéria nesse Festival de Cinema, além da mostra de filmes divulgada prioritariamente pela Folha de São Paulo e pela MTV, foi realizada uma pesquisa com o objetivo de traçar um perfil sócio-econômico do público do festival. A grande maioria se definiu como “homossexual”m e ao responder uma série de perguntas como: “você tem microondas?”, “você tem casa própria ou carro?”, esse público definiu-se e foi definido como pertencente a uma privilegiada “classe média alta brasileira”, leia -se consumidores de alto potencial. A divulgação desta pesquisa na mídia, mais ou menos no mesmo período em que algumas matérias foram exibidas pelo Jornal Nacional sobre a descoberta do “Filão Gay de Consumo” pelo mercado norte-americano, e ainda a divulgação do sucesso de empreendimentos semelhantes no Brasil, como por exemplo, a criação da Get Together Travel, uma agência de turismo voltada para o público “Gay”, impulsionou a criação de uma série de empreendimentos comerciais com uma estratégia de marketing voltada à esse “grupo”. Foi isso que apostou José Rosemblit, o distribuidor do filme “Priscila, a Rainha do Deserto”. “Não sei quantos gays existem no Brasil e se conseguisse atingir só eles, já estaria satisfeito”. (Cláudio, 1995, p.45) Apostou e ganhou, pois só na primeira semana em cartaz Priscila foi visto por 19.000 espectadores. Este recorde foi analisado por uma matéria na revista “Isto é”, onde Ivan Cláudio afirma que os filmes como “Banquete de Casamento”, “Morango e Chocolate” e “Priscila”, mostraram que haveria um público antes não imaginado que lota salas de cinema durante semanas, que compra trilhas sonoras e todos os produtos e serviços que vêm a reboque de uma produção cinematográfica. Segundo o jornalista Ivan Cláudio: “O filão está estabelecido há algum tempo no exterior e, aos poucos, vem se configurando nas principais cidades brasileiras”. (Cláudio, 1995, p.45) Ivan passa a descrever uma série de acontecimentos que, segundo ele, demonstrariam que “a cultura alegre” (sic) seria uma das novas tendências no consumo de artes e espetáculos, “o universo gay abandona o gueto e conquista um público maior nas diferentes produções artísticas”. Cita, dentre outros, o investimento de U$ 220.000 na montagem de “Angels in América”, uma peça que discute vários tópicos a partir do surgimento da AIDS; a receptividade do disco de Ranato Russo “The Stonewall Celebriti on Concert” onde, segundo o próprio cantor e compositor, estão “canções de amor , eu cantando para outro cara”, e ainda o sucesso da turnê brasileira do grupo Pet Shop Boys, que se apresentou com casas lotadas no Rio e em São Paulo, cantando músicas que descrevem “situações homossexuais” que no show foram ilustradas por audaciosos efeitos cênicos. Essas seriam algumas evidências, segundo esse jornalista, de que a produção artística que investe na “temática homossexualidade” encontraria hoje, um público mais aberto e receptivo. Este mesmo “grupo” seria alvo das revistas como a Sui Generis, “a primeira revista brasileira a trazer discernimentos sérios e futilidades chiques dirigidas para homens e mulheres gays. Mas sem exclusividade.”, segundo o próprio editor da revista Nelson Feitosa. (Feitosa, 1995, p.4) A revista é uma publicação mensal com publicação nacional e conta com anunciantes como EMI, CD e Cassete. “Nossa intenção é levar a cultura gay de forma vibrante, inteligente, alegre, para fora dos guetos. Dar nossa contribuição, oferecendo um jornalismo de qualidade para que surja em breve uma consciência social mais generalizada de que nossas semelhanças são maiores que nossas diferenças.”, afirma Nelson Feitosa. (Feitosa, 1995, p.4) Poderíamos citar uma série de exemplos, entretanto os fornecidos até aqui são suficientes para fundamentar minha argumentação. Parece-me claro que todos esses fragmentos de discursos têm uma premissa comum, a saber, a existência de “grupo”, um “filai de consumo”, pessoas que teriam características particulares, o que justificaria uma estratégia de marketing voltada para esse “público específico”. Esse tipo de modalidade discursiva visa (ou pelo menos esse é o discurso manifesto dos atores sociais) levar a “cultura gay” para a “sociedade” acreditando que esta “visibilidade” promoveria a percepção de que as semelhanças entre os “homossexuais” e os “heterossexuais” são maiores que as diferenças, o que criaria uma suposta “consciência social” e, consequentemente, a diminuição da intolerância. Entretanto, cada vez que as palavras “gay” e/ou “Homossexual” são empregadas para descrever fenômenos supostamente referentes a uma mesma classe de indivíduos, constitui-se neste momento um lugar para esses indivíduos, uma posição a ser ocupada, uma posição subjetiva. É cedo ainda para sabermos quais as características ou traços que são reservados a este lugar, mas certamente podemos afirmar que a sua construção faz-se a partir da crença axiomática de que estes indivíduos são,de algum nível, iguais. Sendo que esta suposta igualdade é percebida como central na constituição da “identidade” ou “personalidade” destes sujeitos. Reificando-se a noção de que existem “indivíduos homossexuais” em oposição ao seu outro complementar os “indivíduos heterossexuais”. Podemos afirmar também que esta divisão imaginária fazse a partir de uma lógica disjuntiva: ou um ou outro. Assim, existiriam duas posições mutuamente excludentes: ou se é “homossexual” ou se é “heterossexual”. Este discurso produz a ilusão de que seria necessário que todos se definissem como pertencentes ao “grupo dos homossexuais” ou ao “grupo dos heterossexuais”. Recordo-me de um paciente que sentia-se profundamente incomodado com a preocupação de um grupo de amigos “gays” sobre sua definição sexual. Esta preocupação era manifesta todas as vezes que alguém era apresentado ao grupo, no momento em que surgia a famosa pergunta “Ele é gay ou hetero?”. Se a pessoa em questão afirmasse que já teve fantasias ou experiências sexuais com pessoas do mesmo sexo, mas que se recusava a definir-se como “gay” ou “homossexual”, logo era considerado “enrustido”, categoria que incluiria todos aqueles que “no íntimo” seriam “homossexuais”, mas não sabem, não querem ou não podem saber. Este paciente e muitos outros deduziram a partir de cenas como essas, que eles só tinham duas opções: ou eram “homossexuais” (“enrustidos” ou “assumidos”, mas em “essência” “homossexuais”) ou eram “heterossexuais”. O que tento demonstrar é que a premissa de que existe um grupo de pessoas com características particulares acaba por criar aquilo que Freud analisou muito bem em “Psicologia de Grupo e Análise do Ego”. “Um grupo primário desse tipo é um certo número de indivíduos que colocaram um só e mesmo objeto no lugar de seu ideal do ego e, conseqüentemente, se identificaram uns com os outros em seu ego”. (Freud, 1921, p.126) O raciocínio passa a ser o seguinte: Eu tive ou tenho práticas sexuais com pessoas do mesmo sexo, logo sou “homossexual” e todo “homossexual” é... (aqui se inclui quaisquer predicativos que o discurso social atribui aos “homossexuais”). Este processo é consciente, e me parece que o modelo identificatório é o mesmo descrito por Freud no Capítulo VII de “Psicologia de Grupo e Análise do Ego”: “Existe um terceiro caso, particularmente freqüente e importante, de formação de sintomas, no qual a identificação deixa inteiramente fora de consideração qualquer relação de objeto com a pessoas que está sendo copiada. Suponha-se, por exemplo, que uma das moças de um internato receba de alguém que está secretamente enamorada, uma carta que lhe desperta ciúmes e que a ela reaja por uma crise de histeria. Então, algumas de suas amigas que são conhecedoras do assunto pegarão a crise, por assim dizer, através de uma infecção mental. O mecanismo é o da identificação baseada na possibilidade ou desejo de colocar-se na mesma situação. As outras moças também gostariam de ter um caso secreto e, sob a influência do sentimento de culpa, aceitam também o sofrimento envolvido nele.” (Freud, 1921, p.117) O detalhe interessante deste trecho é que a partir da percepção de um traço análogo entre dois Eus produz-se uma identificação construída a partir desse ponto. O sintoma que o psiquismo produziu, devido a influência do sentimento de e culpa, passa a ser agora um fenômeno presente no segundo psiquismo. O detalhe é que não seria possível que o segundo psiquismo produzisse o sintoma se não houvesse nele também um sentimento de culpa inconsciente. Este mecanismo identificatório, a partir de um traço análogo entre dois Eus sobre a influência de um sentimento de culpa inconsciente, explicaria a incorporação inconsciente dos predicativos implícitos na definição do “homossexual”, como por exemplo, a compulsão sexual nos “gays” ou o ciúmes nas “lésbicas”. Tive a oportunidade de acompanhar pacientes que me procuraram logo após uma primeira experiência sexual com uma pessoa do mesmo sexo e havia sempre presente um sentimento de culpa. Alguns passavam a falar das origens remotas e inconscientes deste sentimento de culpa relatando lembranças de cenas vividas nas relações com pessoas significativas, com amigos, com parceiros amorosos e com seus pais. Estes permaneciam sempre angustiados com a impossibilidade de encontrar uma definição de sua “identidade sexual”. Entretanto, esta angústia era o motor da análise, acabavam por descobrir que não definição possível de si (ou mesmo que essa definição não era necessária para sua felicidade cotidiana) e começavam a se preocupar mais com a viabilidade de seus desejos. Outros passavam a se considerar “homossexual” e frequëntemente ao conhecer amigos “gays” relatavam “ter encontrado a sua turma”, sentindo-se tranqüilos e sem culpa consciente acerca da sua sexualidade e em troca, passavam a exibir um discurso pessimista sobre a vida dos “gays”, sobre as dificuldades geradas pelo preconceito, sobre a impossibilidade de arrumar namorados, ou qualquer outro discurso queixoso característico de seu grupo de referência. Estes novos problemas eram percebidos como inerentes à “vida gay” e em certos casos esses impasses da “identidade gay” eram frutos de desânimo quanto à possibilidade de sucesso terapêutico da análise. Parecia-me claro que o sentimento de culpa, agora inconsciente, encontrava satisfação através do sofrimento supostamente inerente ao “mundo gay”. Freud descreve este fenômeno muito claramente: “Ao final, percebemos que estamos tratando com o que pode ser chamado de fator ‘moral’, um sentimento de culpa, que está encontrando sua satisfação na doença e se recusa a abandonar a punição do sofrimento (...) ele não sente culpado mas doente” (Freud,1923, p.66) Assim, estes pacientes não se sentem culpados conscientemente, mas aceitam o sofrimento “inevitável” de ser “gay” numa “sociedade preconceituosa”, e agora passam a lutar contra o “preconceito social”. “Sociedade” e “gays” passam a ser os novos representantes externos do conflito recalcado. Freud acrescenta em uma nota de rodapé: “A luta com o obstáculo de um sentimento inconsciente de culpa não é fácil para o analista. Nada pode ser feito contra ele diretamente, e também nada indiretamente, exceto o lento processo de descobrir suas raízes reprimidas inconscientes e, assim, gradativamente, transformá-lo num sentimento consciente de culpa.” (Freud, 1923, p.66) Talvez por este motivo os pacientes que conseguiam encontrar estas origens no seu passado, em suas relações com seus pais e seus ideais, podiam simultaneamente se verem livres dos impasses e sofrimentos que a “identidade gay” implicava, sem, necessariamente ter que renunciar a sua vida amorosa com pessoas do mesmo sexo anatômico. Mas qual a razão deste distanciamento de si produzido a partir do momento que um indivíduo se define como “gay”? Maria Rita Kehl em seu livro “A Mínima Diferença” discute esta problemática: “As identidades são as próteses subjetivas produzidas nas sociedades de massa e quem vive o século XX, em qualquer período, sabe que a afirmação das diferenças constituídas como formação de grupos identitários, tem tido antes o efeito de produzir a intolerância do que o diálogo e a convivência na diversidade. É inevitável que agrupamentos sociais se diferenciem e se representem segundo traços identificatórios sexuais, raciais, nacionais, étnicos, religiosos e, por que não (embora possa parecer anacrônico), de classes. Mas esperar que a marca identitária dê conta da subjetividade, que a pertinência a um grupo defina, por exemplo, para os indivíduos os caminhos a ser percorridos pelo desejo e o objeto de sua satisfação, é a meu ver um dos modos contemporâneos de alienação.” (Khel, 1996, p. 12) Neste sentido, esses pacientes acreditaram na ilusão de que “assumindo sua identidade homossexual” estariam livres da tarefa de criar os caminhos de sua subjetividade, de inventar seus objetos do desejo e de encontrar soluções viáveis e criativas para sua satisfação. No entanto, encontram o sofrimento “prêt-àporter” característico de quem está alienado dos seus conflitos inconscientes. Mas por que a lógica de constituição de grupos identitários como o grupo dos “homossexuais” não consegue realizar a promessa de conscientização que ela se propõe? Nesta lógica binária narcisista, ou se é escolhido ou se é preterido. Bleichmar, em seu livro “O Narcisismo – Estudo sobre a enunciação e a Gramática Inconsciente”, demonstra como essa lógica é própria do Eu Ideal. “O Eu Ideal é neste sentido um enorme edifício assentado sobre um pilar que ao manter a estrutura total, pode provocar seu desmoronamento no caso de se quebrar.” (Bleichmar, 1985, p.61) Assim, a “orientação sexual” seria o atributo suporte do Eu Ideal contemporâneo, perdendo-se o interesse por toda história inconsciente das identificações para focalizar apenas uma das representações do Eu como sendo a pedra de toque da identidade do sujeito. Desta forma, um dos atributos do sujeito é tomado como sendo a totalidade do Eu, logo o juízo e a reação afetiva que a parte merece passam a ser patrimônio do todo. Bleichmar prossegue: “Mas que significado possui dizer que uma valoração estende-se de uma representação para outra...o tributo suporte do Eu Ideal põe em ação a capacidade do enunciante para classificar segundo a seguinte regra operatória: todo atributo sobre o qual recaia a atenção será avaliado dentro de categorias que implicam aceitação e nelas ficará situado no grau máximo de aceitação.” (Bleichmar, 1985, p.64) O que proponho é que esta lógica funciona também para o discurso da “homossexualidade”. Nesses discursos o pilar de sustentação dos sujeitos é a “orientação sexual”. O discurso do preconceituoso coloca como pilar de sustentação narcísica a “heterossexualidade” e qualquer atributo avaliado sobre essa lógica terá aceitação máxima. Em contrapartida, a “homossexualidade” configuraria o lugar de rejeição máxima, o lugar do estranho ou intolerável. Desta forma, só haveria dois lugares: o bom e o mal, o eu e o outro, o cidadão e o bárbaro. O discurso totalizante do preconceituoso assevera uma diferença imaginária e marca uma valoração, restando um lugar escravizante e desvalorado àqueles que se tomam como destinatários deste discurso. Como bem resumiu Jurandir Freire Costa: Assim a construção de subjetividades ideais implica, ipso facto a figura da anti-norma, ou o desvio do ideal, representado pelos que não podem, não sabem ou não querem seguir as injunções ideais. A esses, diz Freud, é reservada a posição de objeto do desejo de destruição da maioria, que em nome da norma ideal outorga-se o poder de atacar...É o mecanismo da rivalidade em torno do narcisismo das pequenas diferenças.” (Costa, 1992, p.19) Parece ser digno de nota que o discurso da “conscientização gay”, endereçado a essa maioria, vai na direção de dizer mais ou menos assim: “Somos homossexuais, mas somos tão bons quanto você, nem melhores nem piores, apenas diferentes!” Ora, o que é falho nessa estratégia é tentar mudar a valoração sem mudar a regra de enunciação onde só há dois lugares possíveis. Reinveste-se libidinalmente o sistema lingüístico de crenças que deu origem a montagem imaginária na qual a “orientação sexual” é o traço fundante do sujeito, onde repousaria o pilar de sustentação narcísica, a suposta base de diferenciação e separação dos sujeitos em dois grupos distintos e internamente coerentes. Deste modo, mantém-se o critério pelo qual engendra-se a diferença, só que desta vez, com a ilusão de que a mudança da valoração afetiva romperia a lógica da exclusão e do preconceito. Como tentamos demonstrar anteriormente, para Freud não existem esses dois grupos distintos, uma vez que a própria noção de “escolha homossexual” não constitui um conceito na teoria freudiana. Freud não considerava a “homossexualidade” um significante sobre o qual deveriam se render todos os outros atributos de um sujeito, o que justificaria a criação de um grupo de indivíduos portadores de características especiais, idéia que ele explicitamente se opôs. Retomando a metáfora das rosas, poderíamos afirmar que não existe a categoria rosas vermelhas essencialmente diferente das rosas brancas, a não ser nos olhos daquele para o qual a cor das rosas é um traço fundamental; em outras palavras, para aquele que a cor das rosas é o atributo suporte do Eu Ideal. Entretanto, estas categorias são constantemente reificadas pelo discurso da mídia que oferece constantemente imagens para autodescrições, através das quais os sujeitos vão se identificar como pertencentes às “minorias identitárias”. Costa, em seu livro “Sem Fraude nem Favor: Estudos sobre o Amor Romântico” explica este mecanismo: “Na discriminação, o sujeito aprende que nada pode fazer para mudar o predicado que o torna “inferior” ou “desviante” e a única saída é legitimar a diferença, afirmando-a como um valor ideal autônomo”. (Costa, 1998, p.35) Portanto, legitimar a diferença dizendo: “Somos diferentes, mas temos igual valor” é uma estratégia ilusória. É preciso deslocar a questão, saindo da dimensão igualdade X diferença que sustenta imaginariamente a idéia de que haveria uma “escolha homossexual” X “escolha heterossexual”. A propósito disso, Jurandir Freire Costa demonstra, em seu livro sobre homoerotismo, que o “homossexual” é definido como sendo aquele indivíduo com “escolha de objeto homossexual”, isto é, possuiria atração por uma pessoa do mesmo sexo, entendido como mesma realidade anatômica. Costa questiona exatamente o que “mesmo sexo”, uma vez que para a psicanálise não faz sentido falar de feminino e masculino através de uma referência à anatomia. O que Jurandir nos relembra nesta dimensão é que “um mesmo sexo pode ser suporte de diversos investimentos eróticos” e que “o mesmo sexo, anatomicamente descrito, nem sempre é o “mesmo” eroticamente investido. \no que concerne a finalidade do desejo a realidade anatômica é fragmentada na pluralidade dos objetos parciais e são esses objetos que determinam as características de estrutura psíquica”. (Costa, 1992, p.31) Costa demonstra que a lógica do discurso que cria o ”sujeito homossexual” só se sustente no plano anatômico imaginário, logo o discurso do preconceituoso e o discurso da “conscientização gay” só se sustentam a partir de uma lógica que super valoriza a diferença anatômica dos sexos. Mas negar a existência da “homossexualidade” em oposição à “heterossexualidade” não seria a negação da diferença entre os sexos? Neste ponto é preciso relembrar que uma coisa é a diferença anatômica dos sexos, outra é a diferença simbólica dos sexos. Daniela Ropa resumiu esta discussão de maneira pontual: “Com Freud e Lacan, vemos que a questão da sexuação no ser humano não está referida à presença ou ausência do pênis, mas sim à dialética fálica. O falo sendo aqui entendido como o referente simbólico que aponta para uma diferença: não simplesmente para a diferença anatômica, mas para a diferença mais trágica, própria ao ser humano - aquela que fala de sua falta e de sua incompletude. É esta “diferença” que nos lança em nossa eterna busca desejante; nesta procura incessante que só vai se satisfazer parcialmente através do amor – ilusão necessária de completude que move o desejo e vem fazer barreira contra morte e a ausência de sentido”. (in Costa, 1994, p.177) Este trecho ajuda-nos a lembrar que a “diferença” da qual fala a psicanálise, não tem nada a ver com a diferença entre grupos identitários. Mas apesar disto, ouvimos com freqüência na clínica psicanalítica o relato de pessoas que, por se deixarem tomar como destinatários do discurso da homossexualidade e por assumirem essa marca identitária, queixam-se dos mais deferentes sintomas. Como podemos a partir de tudo o que já foi discutido compreender essas experiências na clínica? IV. O Discurso na Clínica Meu primeiro paciente do Instituto Kaplan me foi encaminhado por sua terapeuta que naquele momento estava saindo da instituição. Coincidentemente, dois meses antes, eu havia assistido a uma supervisão deste caso, na qual esta terapeuta, o psiquiatra do grupo e o supervisor discutiram com a equipe a hipótese de este paciente ser psicótico.A terapeuta referia-se ao paciente como um caso “difícil”. Não me recordo de quais seriam os sinais apontados pela terapeuta para diagnosticá-lo como psicótico, mas lembro-me ter questionado a fragilidade do raciocínio clínico, e alertado para o risco de engessarmos o paciente com aquela categoria nosográfica. Exatamente por isso fui para a primeira entrevista esforçando-me em ter um olhar ingênuo para com o paciente. Um homem de aproximadamente 45 anos entra na sala, sentase e diz “Eu sou um homossexual ativo, mas não me aceito. Já fiz várias terapias, gostaria que o senhor me ajudasse a me transformar em heterossexual.” Perguntei para ele o que era homossexualismo; ele ficou surpreso e disse que eu sabia disso muito bem. Eu então disse a ele que gostaria de saber o que ele pensava sobre o assunto e pedi que falasse qualquer coisa que lembrasse a respeito dessas duas palavras. Ele então passou a associar ao homossexualismo: passividade, falta de respeito, doença, loucura, promiscuidade, sofrimento, frustração e internação. Pedi que continuasse relatando o que lhe ocorresse. Ele, então, passou a relatar nessa, e em outras sessões, sua história. Ângelo foi internado aos 7 anos num hospital psiquiátrico com o diagnóstico de “homossexualidade”, lá ficando até pouco depois da adolescência. A representação mais forte que tinha de si mesmo era a de ex-paciente psiquiátrico. Sendo assim, utilizava-se de inúmeros mecanismos psíquicos para controlar seu comportamento a fim de não ser rotulado como “louco”. Por exemplo, se ele era flagrantemente desrespeitado ou agredido verbalmente, não tomava qualquer atitude. Fingia ignorar tais agressões e apesar de ter vontade de gritar e ser agressivo, continha-se pois logo lhe vinha à mente que se assim procedesse seria taxado de “louco”, “débil mental”, “bicha dando escândalo”, “bicha dando show” ou “bicha dando espetáculo”. De tempos em tempos ele tinha “um ataque” de “descontrole e violência” que acabava por confirmar seu diagnóstico imaginário. Percorrendo os caminhos associativos surgiram muitas lembranças de exclusão, hostilidade para com os pais, brincadeiras sexuais infantis e até um saudosismo do hospital psiquiátrico. No início de sua análise, em ressonância ao seu discurso queixoso, sentia-se compelido a pensar na hipótese de um fantasma próprio da homossexualidade, que desse conta de explicar tanto sofrimento. Mas como ele se encontrava muito perseguido pelos seus próprios diagnósticos eu pensei que seria desejável escuta-lo desde em lugar sem rótulos. No decorrer da análise, Ângelo se desinteressou pelo discurso da homossexualidade e passou a manifestar toda a sua hostilidade para com sua mãe “autoritária e recalcada” por tê-lo internado e para com seu pai, “passivo, submisso e bunda mole” por ter permitido a internação. Neste contexto, surge uma lembrança que Ângelo relata com muita dificuldade. Quando tinha aproximadamente 4 ou 5 anos, um rapaz morador da sua rua brincava com ele e atirou propositadamente um “discofly” no mato. Ângelo foi buscar o brinquedo e o rapaz foi atrás; pediu para que ele tirasse a roupa e tentou penetra-lo; não conseguindo, uma vez que ele “era muito grande”, pediu que Ângelo o masturbasse. Ao voltar para a rua, Ângelo viu o seu pai na entrada do caminho que dava acesso ao local da cena e pensou: “Por que ele não fez nada? Ele sabia o que estava acontecendo. Ele tinha que tomar uma atitude”. Falando a partir dessa lembrança, Ângelo queixa-se muito do pai e diz: “Ele tinha que ter tido um papel mais ativo”. Neste momento encerro a sessão. Ângelo, a partir dessa sessão, parece mais implicado no seu discurso, não se queixa tanto do outro e se engaja em projetos pessoais, onde se sente mais próximo dos outros: “Me surpreendi com o que me contaram; as pessoas têm dificuldades tão sérias quanto as minhas, não sou o centro do universo.” Ângelo parecia mais tranqüilo e o psiquiatra da instituição relata muita surpresa em sua “transformação”. Entretanto seu discurso era muito amargo quando se referia a seu pai e a sua mãe, a decisão pela internação era algo difícil para ele perdoar. Ele fora internado, pois às vezes imitava Carmem Miranda, Emilinha Borba e outras vedetes da época, não gostava de ir para a escola e era “agressivo”. Falamos muito a respeito do período de internação, e só depois de muito tempo ele me confessou que foi um período que também aconteceram coisas boas na sua vida. Ângelo conheceu outro interno, se apaixonou e eles conseguiram até dividir o mesmo quarto. Esse relacionamento durou vários anos e Ângelo contava lembranças deste período com muita ternura. Estimulava Ângelo a falar deste romance, pois não compreendia como uma pessoa que foi tão feliz com outra pessoa durante tanto tempo, tinha ao mesmo tempo um pedido para “transformar-se em heterossexual”. Foi nesse período que Ângelo me contou sobre o término da relação e o quanto sofreu, por isso não queria mais namorar e agora se contentava com relações sexuais com homens que conhecia em saunas e praças. Poderíamos discutir uma série de questões pertinentes a este caso, mas o que me interessa em particular é enfocar o fato de que a partir do momento em que analista e analisando se desprendem do discurso queixoso da “homossexualidade”, abre-se um espaço onde um sujeito pode narrar sua história, rememorar e se implicar naquilo que fala. Outro fato digno de nota é que, se por um lado o discurso queixoso sobre a homossexualidade soa um grande dejá-vu, algo muito uniformizável para os homossexuais, a fala de si revela-se singular, não generalizável sob a forma de uma oposição entre heteros e homos. As questões que emergem são questões humanas que não se restringem a grupos categorizados a partir de supostas “opções sexuais”. Ângelo passou a falar de sua história, do pai doente e conseguiu apaziguar-se com ele antes de sua morte, momento em que Ângelo descobriu um enorme amor pelo seus pais, sentimentos que pareciam estar encobertos por tanta mágoa e por uma preocupação excessiva com sua “homossexualidade”. Neste dia, Ângelo chorou muito, e me agradeceu por poder se aperceber disso a tempo. Outro caso que ilustra essa mudança é o de Caio que me procurou dizendo “aceitar muito bem a sua homossexualidade” e que seu problema era que “esse mundo gay é muito promíscuo” e que “as pessoas não querem relacionamentos muito sério”. Em seu discurso queixoso melancólico relatava não ter coragem para dizer às pessoas o que ele realmente queria, sempre inventava desculpas ao invés de simplesmente dizer que não queria fazer algo. Neste contexto, lembrase de quando criança escutou uma briga entre seu pai e sua mãe e em seguida ouviu um jarro se quebrar. Sua mãe saiu chorando do quarto e disse: “não está acontecendo nana”. No outro dia a empregada viria para fazer uma faxina e a mãe teria inventado uma história mirabolante para explicar o objeto quebrado. Ele associou que até hoje se percebe inventando histórias mirabolantes (do tipo obsessivo) para não se haver com o seu desejo e a sua agressividade. Quando deixou a mãe para se “casar” com um rapaz não disse por que realmente estava saindo de casa. Supostamente, ele não podia dizer por que é homossexual, mas está claro que ele não pôde dizer para sua mãe do seu desejo, pois falar do seu desejo implicaria em tirá-lo do lugar do “bom menino”. Um lugar que, se por um lado garante um ganho narcísico, por outro lado é sentido como “uma faca sobre a minha cabeça”, uma faca que a qualquer momento pode cair matando-o. A distância entre seu Eu e este eu ideal exige esta punição. Caio passou a falar de como sempre se percebeu distante daquilo que seus pais esperavam dele, sentia-se constantemente comparado ao irmão que era mais interessado no comércio da família. Seu pai havia falecido há alguns anos e deixado de herança a casa onde Caio morava, esta casa era alvo de inúmeras preocupações obsessivas: “Tenho sempre uma lista enorme de coisas para consertar na casa, essa lista nunca acaba e estou sempre culpado por não terminar as tarefas que eu mesmo inventei.” Associando a partir da lista de tarefas e de sua casa, Caio recordou-se que quando soube da morte do pai, por um segundo pensou em como seria bom receber a casa de herança. A mesma casa que foi morar com o namorado e que também era fonte de tortura pelas lembranças que a relação de anos deixou. Caio tomou, aos poucos, consciência da culpa pela morte do pai e da destruição imaginária do objeto amado. A partir do momento em que se abre especo para a livre associação., esse paciente resignifica a história da separação do seu namorado, amor perdido do qual nunca pôde fazer um luto. Isto o impede de se aproximar e de se envolver com outras pessoas, o que poderia trazer à consciência a culpa pelo objeto perdido e ainda associações desse objeto com o pai morto. Assim, a teoria do “mundo gay promíscuo” era uma forma de mantê-lo afastado de novos envolvimentos amorosos e conseqüentemente de suas angústias depressivas. Podemos dizer que se o analista não se preocupa em saber a causa da “homossexualidade”, curar o paciente ou fazê-lo a todo custo aceitar a “homossexualidade”., e ainda, se o analista não se gruda nesta categoria que é externa ao dispositivo analítico e se livra desses a priori, o analisando passa a revelar-se não muito diferente dos supostos “heterossexuais”, debatendo-se com questões próprias do ser humano: O que é a morte?, O que é um pai para seu filho, culpa, amor, castração, etc.? Ora, se os elementos que compõem a categoria “X” apresentam características que também estão presentes nos elementos que compõem a categoria “Y” e se nenhuma característica relevante é encontrada em uma das categorias e ausentes na outra, essas duas categorias são totalmente inúteis. Elas descrevem fenômenos sem nenhuma particularidade. Logo, a categoria “homossexual” é dispensável para ouvirmos um paciente. Uma categoria ou conceito deveria nos auxiliar no sentido de ampliar nossa escuta permitindo a emergência de novos significados. No caso de Caio, por exemplo, noções como ambivalência paterna e parricídio, me ajudaram a pensar em sentimento de culpa inconsciente e essa construção foi confirmada pelas associações do paciente. De outro lado, falar das características peculiares do “mundo gay” não nos levou a nada. Foi esta posição que Paulo parecia exigir de mim como analista. Disse-me em sua primeira entrevista: “Eu sou um homossexual e não quero falar de homossexualismo como problema, quero ser ouvido como uma pessoa normal”, como se fosse possível falar em normalidade do desejo. Mais tarde, esse paciente percebeu por que havia me procurado. Uma vez que ele me rotulava como homossexual, garantia assim, a possibilidade de um enamoramento. “Quando eu te procurei eu achava que era porque você, sendo gay, poderia me entender melhor, agora eu me pergunto se não é porque estava aí garantida a possibilidade de eu me apaixonar”. “Eu só consigo confiar em alguém por quem eu estou apaixonado ou que esteja apaixonado por mim.” No decorrer de sua análise, esse paciente começa a perceber seu modo bastante simbiótico, onde se sente sufocado, porém protegido. Relacionava seus namorados com as lembranças de um pai protetor que, no entanto, sustentava uma ilusão de um mundo paradisíaco. Seu pai era muito amoroso, um homem importante na cidade, sua mão era uma mulher distante: “Ela só ficava comigo depois que eu estava limpo e trocado pelas babás.” Mas Paulo tinha o carinho do pai, sempre tão compreensivo e presente. Foi esse tipo de amor que Paulo encontrou no seu namorado, logo já moravam juntos em outra cidade., faziam projetos juntos e viveram bem por alguns anos. Após o término dessa relação, Paulo não conseguia se recuperar e passou a usar cocaína, num modelo tão adicto como o de seu namoro. A análise fazia progressos em mostrar as ralações de sua compulsão com seu antigo relacionamento. Suas lembranças infantis acerca do relacionamento com seus pais eram numerosas quando Paulo relatou estar apaixonado por seu analista e por isso achava necessário parar o tratamento. Este período foi difícil de manejar, mas utilizei as fantasias que Paulo tinha sobre meu suposto “caso” com um rapaz “sério e atencioso” para mostrar-lhe que este casal perfeito nada mais era que eu sonho de uma dupla amorosa que magicamente eliminaria as angústias de viver. O que desejo ilustrar com esses três casos é que para uma mesma temática queixosa, de pessoas que supostamente pertenciam a uma mesma categoria nosográfica, surgem três sujeitos diferente, singulares. Seus discursos sobre a homossexualidade estavam lá mais para esconder do que para revelar, pois quando tomados pela linguagem, falavam de um lugar livre de injunções defensivas, irrompendo com freqüência a percepção interna da dor, da ausência de sentido e da falta do amor. É nesses momentos deslizantes que se vislumbra a falta para ser, que leva o sujeito a fazer um pedido legítimo de análise, para relembrar sua história, recontar suas mazelas e se posicionar frente a suas fantasias, lançando-se para o infinito da linguagem onde aspira-se uma nova construção narrativa de si e dos outros, uma mitologia poética de sua própria história, uma tentativa de suportar seu próprio desejo. É bem verdade que o discurso queixoso é bastante uniforme para este suposto grupo de indivíduos. Dos inúmeros pacientes que atendi, todos poderiam ser divididos em basicamente 3 grupos: ● Aqueles que querem se curar da homossexualidade. ● Aqueles que sabem que são homossexuais, mas sofrem com isso. ● Aqueles que aceitam, estão tranqüilos, mas precisam de um analista que “não vá se ater a isso”. Mas para que serve fazermos um agrupamento a partir do discurso queixoso e do sintoma? Seria como dizer: quem tem ejaculação precoce é um ejaculador precoce, quem tem impotência é um impotente. Ora, procedendo assim, estaríamos esquecendo toda a teoria de sobredeterminação do sintoma, e tomando a queixa como a verdade sobre o sujeito. Não me parece fazer sentido construir uma metapsicologia em ressonância a um discurso queixoso. É nesta direção que acredito que a reificação de uma categoria psicopatológica homossexual é muito próxima da metáfora de Manuel Tosta Berlinck de “modelos prêt-à-porter”, modelos psicopatológicos prontos para enquadrar nossos pacientes, obturarem nossa escuta e aliviar nossa angústia diante do outro estranho que aponta para nossa falta de saber. De acordo com Berlinck, a clínica psicanalítica solicita um modelo de “alta costura” para cada cliente: “Essa solicitação pelo clínico, pelo clinicar, envolve seguramente em debruçar-se, um inclinar-se sobre o sujeito para escutar sua fala,aquilo que diz na relação transferencial desde um lugar sem rótulos, que resiste a própria classificação psicopatológica em direção a uma “veste” feita com exclusividade para ele, que lhe sirva bem e que lhe dê toda a liberdade possível em relação às classes que não lhe são próprias e que lhe dificulta o movimento psíquico.”5 Assim, afirmar que um cliente é homossexual não diz nada da sua posição subjetiva, só diz da resistência do analista de se “desvestir das vestes psicológicas existentes para escutar o sujeito, o que deixaria o psicoterapeuta com uma sensação de nudez, de nada saber, de fragilidade, de confusão” conclui Berlinck. _______________________________________ 5 Extraído do texto do Laboratório de Psicopatologia Fundamental (não publicado), Programa Estudos Pós Graduados em Psicologia Clínica, PUC/SP. Jurandir Freire Costa, em A Inocência do Vício, afirma que o “emprego freqüente do termo (homossexual) leva-nos a crer que realmente existe um tipo humano específico designado por este substantivo comum...A particularidade do homoerotismo em nossa cultura não se deve à pretensa uniformidade psíquica da estrutura do desejo comum a todos os homossexuais, deve-se sugiro, ao fato de ser uma experiência subjetiva moralmente desaprovada pelo ideal sexual da maioria”. (Costa, 1991,p.22) O que Jurandir relembra de Freud é que não há essa “substância” ou “essência” comum a todos os indivíduos que se representam ou são definidos como homossexuais. Essas classificações nada dizem das vivências, das dores, e das produções simbólicas dos sujeitos particulares. Qual é a função dessas classificações? Não posso responder melhor que Daniel Ropa: “A que servem, e aqui penso em termos éticos e morais, todas estas classificações a partir das quais pensamos pode resumir e definir de vez a identidade das pessoas? Sendo que as classificações em “espécimes sexuais” parecem valer mais ainda para os que divergem das normas. Estas, então, serão interpeladas quase que unicamente em nome de seus gostos, inclinações ou escolhas sexuais. Deixarão de ser bons trabalhadores, amigos, cidadãos, maridos ou esposas, pais ou mães, para se tornarem, quase única ou exclusivamente homossexuais, bissexuais, travestis, etc., e toda a longa lista dos que se encontram no limbo, acusados de algum desvio moral ou patológico. Nessa sexualidade poderia representar um potencial para a escolha, para a mudança e para a diversidade. No entanto, nós a transformamos num desvio, naquilo que mais nos aprisiona. Num destino para “nós” e num inferno para os “outros”, para os que ousaram questionar os limites da prisão”. (Costa, 1994,p.175) Minha leitura do texto de Daniela não vai na direção de uma clínica da vitimização, uma vez que as piores prisões são aquelas que construímos através das teias e tramas inconscientes, ao nos deixarmos tomar como destinatários do discurso totalizante do outro. Em meu artigo “Entrevista com Vampiro” analiso o caso de um paciente que estava tomado por esta prisão do discurso da homossexualidade e concluo: “A clínica tem me feito pensar que a homossexualidade é um hífen. Meus pacientes se narram professores-homossexuais, vendedores-homossexuais, amigos-homossexuais, ou seja, sua definição de Eu obedece a função F(S) = x – h, onde se lê a função de um sujeito F(S) é definida por qualquer atributo ou representação do Eu (x) que estará sempre colada ao discurso hegemônico sobre a homossexualidade”. (Nascimento,1998,p.115) O sujeito nesse tipo de narrativa fica colado a um predicativo que o impossibilita fazer uma narrativa criativa e transformadora de si. Rubens Volich numa discussão deste texto no Laboratório de Psicopatologia Fundamental considerou que esta metáfora do hífen pode ser associada ao cordão umbilical. Bem sabemos que o esforço no sentido de construirmos uma narrativa própria depende de uma certa separação do corpo do outro, separação angustiante, porém libertadora. A questão é que a sexualidade “poderia representar um potencial para a sua escolha, para a mudança e para a diversidade”, como Ronaldo Pamplona deixa entrever em seu livro Os Onze Sexos usando a metáfora do “caleidoscópio”, no qual basta um novo giro para “fazer surgir as mais diversas imagens da sexualidade humana”. (Costa, 1994,p.205) Uma pergunta persiste: o que fazemos com os sujeitos filhos dessas práticas lingüísticas? Sujeitos que encontram “resposta” para o seu sofrimento na cultura do discurso parental hegemônico e na miséria da auto-rotulação. Passei a indagar qual seria o efeito transferencial do discurso da homossexualidade sobre o analista. Penso que o analista se vê induzido na transferência a questionar a igualdade dos sexos, a diferença dos sexos, o que é ser igual, o que é ser diferente. O analista fica angustiado por não saber onde reside a diferença entre masculino e feminino. Assim, se há algo de narcísico na homossexualidade, é o desequilíbrio narcísico produzido no analista pela escuta de histórias que o colocam diante do enigma da diferença dos sexos, como a de Rômulo e Remo. Parece possuir um valor heurístico o conceito de identidade de gênero nuclear de Stoller. Segundo este autor: “A identidade de gênero nuclear resulta, em minha opinião, do seguinte: Uma “força” biológica: originando-se na vida fetal e comumente genética em sua origem, este efeito – tanto quanto se sabe – emerge da organização neurofisiológica (sistema nervoso central) do cérebro fetal; A designação do sexo no nascimento: a mensagem que a aparência dos genitais externos do bebê leva àquelas que podem designar os sexos – o médico que está atendendo e os pais – e os efeitos inequívocos subseqüentes desta designação para convence-los do sexo da criança; A influência incessante das atitudes dos pais, especialmente das mães, sobre o sexo daquele bebê, e a interpretação destas percepções por parte do bebê – pela sua capacidade crescente de fantasiar – como acontecimentos, isto é, experiências motivadas, significativas; Fenômenos “bio-psíquicos”, efeitos pós-natais precoces causados por padrões habituais de manejo do bebê – condicionamento, “imprinting” ou outras tantas formas de aprendizagem que, nós imaginamos, modificam permanentemente o cérebro do bebê e o comportamento resultante, sem que os processos mentais do bebê o protejam deste “imput” sensorial. Esta categoria está relacionada ao item 3; ela é listada separadamente por uma questão de ênfase, e para distingui-la dos processos mentais (também resultado das influências dos pais) com os quais nós estamos mais familiarizados, tais como a ansiedade de castração (Freud, 1909); O desenvolvimento do ego corporal: a miríade de qualidades e quantidades de sensações, especialmente dos genitais, que definem o físico e ajudam a definir as dimensões psíquicas do sexo da pessoa, confirmando, assim, para o bebê as convicções dos pais a respeito do sexo de seu filho”. (Stoller, 1993,p.29) Podemos dizer que salvo nos casos onde há ambigüidade genital, o médico e os pais designam – a partir dos genitais – o sexo da criança. Nesse sentido, somente o primeiro item tem uma relação direta com questões propriamente biológicas, genéticas ou anatômicas, os quatro restantes referem-se a fatores externos e são da ordem propriamente significante, são efeito da palavra dos pais. Essa primeira nomeação tem uma força imaginária que forma a identidade de gênero nuclear. /sobre a influência dos pais o bebê interpreta suas percepções e constrói sua imagem do corpo a partir dessa primeira diferenciação imaginária, que inclui o gênero em que o bebê é categorizado e o gênero dos pais em contrapartida. A identidade de gênero nuclear nada mais é do que o sentimento de ser homem ou ser mulher. Segundo Calligaris: “Na verdade, quem leu Stoller lembra muito bem que ele sempre insistiu em que a distinção por ele proposta entre sexo biológico e identidade de gênero não tem nenhuma implicação do lado da escolha dos objetos sexuais dos indivíduos. A única conduta “ qual podem dar lugar distúrbios de identidade de gênero, ou seja, essa discordância entre sexo biológico e identidade de gênero, é a aspiração transsexual, o desejo de acabar transformando seu próprio sexo biológico de tal forma que corresponda à identidade de gênero”. (Calligaris, 1996,p.6) Nesta direção, podemos pensar que o que determina o interesse de alguns indivíduos por pessoas da mesma identidade de gênero é obviamente o Édipo. Ou seja, o Édipo determina quaisquer escolhas amorosas ou preferências sexuais subseqüentes do adulto. Assim, se existisse uma “causa da homossexualidade” esta seria a mesma causa da “heterossexualidade”, a saber, se quisermos compreender por que gostamos de pessoas que possuem tais e tais características, vamos vislumbrar um pouco dessas respostas rememorando nossa história edípica, história de escolhas e de identificações. Mas por que persiste na clínica a fala de algumas pessoas que se deixam tomar por destinatários do discurso da homossexualidade, aceitam essa denominação, sentem-se diferentes das outras, consideram sua sexualidade desviante ou anormal ao olhar de um outro significativo e, em função disso, formulam a hipótese de que estes são os motivos do seu sofrimento? Podemos dizer que ninguém nunca deixou que elas pensassem diferente, que isto é efeito de uma prática lingüística. Esta é uma hipótese provável, mas poderíamos nos perguntar também se esse discurso cultural não encontra seu eco ou ressonância em algum lugar do psiquismo. A minha hipótese é a seguinte: nos dois ou três primeiros anos de vida, a criança é ensinada a acreditar que gênero e sexo anatômico são a mesma coisa, é esta convicção que Stoller denominou identidade nuclear de gênero. Nesse período, a criança também aprende a ver seus pais, figuras altamente significativas para ela, como um casal formado por uma pessoa do gênero masculino que mantém um relacionamento amoroso com uma pessoa do gênero feminino. Produz-se um deslocamento que torna a anatomia o pilar de sustentação narcísica do eu ideal, há um superinvestimento no anatômico, que escamoteia a questão das diferenças sexuais. Essa imagem de si e do casal parental, estrutura sustentada pelo imaginário sexual de nosso século, é atualizada na vivência particular da criança e outorgada pelos outros significativos, seus pais. Ora, mais tarde, a noção de masculinidade e feminilidade se ampliam, se misturam e se complexificam a partir dos percursos mais idiossincráticos possíveis. Entretanto, quando um indivíduo que mantém relações amorosas com outro do seu mesmo sexo anatômico, ao ser interpelado pelo discurso preconceituoso da homossexualidade com sua lógica disjuntiva sente ressonância desse discurso a partir daquelas primeiras nomeações primitivas e a representação de sua relação amorosa, entra em conflito com a representação primeira do casal parental. \o Eu se identifica com a lógica do eu ideal do nosso século e acaba por se aprisionar numa posição narcísica de máxima desvaloração. A angústia mobilizada força o Eu a procurar respostas no discurso parental hegemônico. Na clínica, isto é o que os pacientes relatam como sento “eu descobri naquele momento que era homossexual”. Leandro, aos 12 anos, costumava ter brincadeiras sexuais com um rapaz mais velho. Isso não lhe angustiava até o dia que ouviu sua mãe dizer, a propósito de um vizinho que tinha uma vida conjugal com outro homem, que eles eram bichas. “Naquele momento descobri que o que eu fazia era homossexualismo, que era errado e que maus pais jamais poderiam saber disso; o mundo desabou na minha cabeça e eu passei a evitar esses encontros” diz Leandro. No decorrer de sua análise, Leandro pôde associar sua angústia com as forças pulsionais quer na sua adolescência deixavam-no em uma posição de desamparo , pôde também, rememorar seus desejos proibidos para com seus pais. O que pretendo ilustrar é que a fixação ego-narcísica no sistema de nomeação visa defender o sujeito de seu desamparo frente ao amor e à morte, ou seja, o discurso queixoso sobre a “homossexualidade” nada mais é do que uma forma para evitar falar sobre as diferenças sexuais, na tentativa de driblar a castração. Pois sair da lógica do eu ideal significa abrir mão do olhar parental que nos coloca no lugar de “senhores do castelo”, seria sair da fascinação do espelho que já aprisionou algum dia todos nós, e é por isso que imagens como as de Rômulo e Remo nos incomodam constratransferencialmente. Aqui é importante ainda acrescentar que o discurso sobre a “homossexualidade” pode ser defensivo não só em relação à angústia do Eu provocada por um colapso narcísico. Na clínica, percebo que recitar o discurso imaginário social sobre a “homossexualidade” pode estar a serviço de defender o Eu de vários tipos de angústia. Poderíamos resumir a função da queixa sobre a “homossexualidade” da seguinte forma: ● Um conflito inconsciente gera angústia no Eu; ● Uma impossibilidade do Eu em suportar esta angústia exige uma estratégia defensiva, a saber, falar de outro tema que não o conflito; ● Discurso imaginário social sobre a “homossexualidade” entra nesta dinâmica com a mesma função que os restos diurnos num sonho, ou seja, oferece imagens que alo mesmo tempo podem transportar a angústia e distanciá-la do conflito original, oferecendo-lhe um disfarce; ● Inicia-se o processo identificatório e sobre a influência do sentimento de culpa provocado pela distância entre o Eu e o Eu Ideal, o sujeito passa a identificar-se com todas as premissas e predicativos validos para o discurso sobre a “homossexualidade”, incluindo sofrimentos e impasses característicos da “identidade homossexual”. Essa nova identidade entra em conflito com aquela nomeação primitiva. Ou seja, de que só pessoas com identidade de gênero nuclear diferentes podem ser parceiros sexuais passa do imaginário sexual da cultura, é filtrada pela personalidade dos pais e alcança o imaginário infantil que por imprinting, por “osmose” e mais tarde na vida adulta entraria em conflito cm a diversidade que é própria da sexualidade. Não se trata de uma militância politicamente correta, de coibir o uso de termos gay ou homossexual, mas questionar a suposição de que estas palavras designam uma psicodinâmica específica, o que justificaria hipóteses defensivas do sujeito, do tipo “todo meu sofrimento é devido ao fato de ser homossexual”. Na medida em que o analista é investido da mesma força pulsional que outrora era dirigida aos pais, abre-se um espaço para resignificar os conceitos de masculino e feminino na sua base mais primitiva, irracional e inconsciente. A palavra dita na transferência estaria na interface entre dois universos lingüísticos, o discurso social e o discurso psicanalítico, na realidade é o afeto que reconstrói essas significações. O analista teria a função de fazer um corte entre a percepção da angústia sinal e a recitação sobre a “homossexualidade”, para dar a oportunidade de o paciente entrar em contato com o conflito inconsciente e consequentemente dar um novo destino par a angústia. Neste ponto o analista exigiria do analisando um esforço de fazer sua própria narrativa. Em “Construções em Análise” Freud descreve que a tarefa do analista seria a de “...completar aquilo que foi esquecido a partir dos traços que deixou atrás de si, ou mais corretamente, construí-lo” (Freud, 1937,p.293) Minha hipótese é que diante da ausência de um fragmento de sua história o paciente ao invés de construir uma narrativa própria ele adere ao discurso queixoso sobre a “homossexualidade”, ele se cola a este discurso com o hífen. O analista, portanto, teria que cortar o hífen e estimular o paciente a recuperar as lembranças perdidas, tentar fazer a conexão com seus sintomas, repetições e inibições, e ainda na ausência destas conexões fazer suas próprias construções. Retomando a idéia de discurso mito poético, exige-se do paciente que ao invés de preencher as lacunas da sua história rememorada com “narrativas prêt à porter” e “identidades pré-fabricadas”, que ele passe a construir seu próprio mito de origem. Oferece-se ao analisando a oportunidade de construir novos sentidos para a sua forma de amar, que é tão singular e universal como todas as outras, deixando-o livre para entrar em contato com outros conflitos e questões de sua história, convidando-o para uma nova construção narrativa mitopoética, sustentada por uma fala mais próxima da sua verdade subjetiva. Permanecem, entretanto, duas perguntas: Qual o papel da transferência do analista nesta construção mítica? Como saber que estas construções são corretas? Joyce Mcdougall ao relatar um de seus casos conclui: “Minha surdez contratransferencial, juntamente com minhas fantasias recalcadas, tinham funcionado como uma tela opaca, impedindo que a “luz” analítica iluminasse não somente a vida sexual adulta insatisfatória de Marie-josée, mas também um elemento fantasístico predominante de sua frigidez parcial: a saber, seus desejos homossexuais nãoreconhecidos”. Com o relato desse caso, Joyce deixa claro que o analista precisa estar igualmente livre de injunções defensivas a respeito de suas próprias fantasias sexuais com pessoas do mesmo sexo anatômico, para poder ouvir seu paciente. O que gostaria de acrescentar é que isto implica não somente em reconhecer suas próprias fantasias e angústias, mas também em não aderir a narrativas pré-fabricadas. Recordo-me de ter sido procurado por uma terapeuta para que eu passasse a atender uma paciente que ela acreditava precisar “assumir sua homossexualidade”, ficou claro na supervisão que a idéia do encaminhamento era muito sintomática em ralação a dificuldades outras na condução do caso; tão logo foram percebidas tais angústias, a terapeuta percebeu quão defensiva era sua proposta. O interessante é que ela fez uso de um jargão da mídia “assumir a homossexualidade” quando a questão era simplesmente dela assumir o tratamento da sua paciente e suportar as incertezas que esse caso lhe trazia. Quanto a como saber sobre a validade de nossas construções, Freud em “Construções em Análise” escreve: “O ‘sim’ não possui valor, a menos que seja seguido por confirmações indiretas, a menos que o paciente, imediatamente após o ‘sim’, produza novas lembranças que completem e ampliem a construção”. (Freud, 1937,p.297) Freud continua afirmando o texto que somente quando o paciente produz associações que dão continuidade as nossas proposições, ou seja, somente quando o paciente completa nossa mitologia com seus sonhos, atos falhos, lembranças, podemos considerar que nossas “viagens” têm algum sentido e possuem valor analítico e terapêutico. A metáfora analítica é então uma co-elaboração de paciente e analista, e a interpretação é uma resposta criativa do analista frente ao conjunto das transferências. Fédida acredita haver três termos nesta equação: “...a transferência do paciente sobre o analista, a transferência do analista sobre o paciente e a possibilidade disjuntiva – que define a posição do analista – de poder apreciar esse funcionamento inter-transferencial. Ser analista é estar nessa condição de disjunção”. (Fedida,1988,p.61) O que tentei demonstrar com essa pesquisa é que a transferência do paciente que se cola ao discurso queixoso imaginário sobre a “homossexualidade”, pode ser respondida por uma atitude transferencial do analista adesiva a este discurso. O risco neste caso é de que paciente, analista e discurso sobre “homossexualidade”, tornem-se uma unidade fusional como um gás nobre, elemento da tabela periódica que por possuir um número de elétrons estáveis na última camada não consegue se associar a nenhum outro elemento. Seria preciso produzir uma instabilidade nas camadas discursivas para fazer emergir novas associações. Isso só é possível se o analista pode estar também numa posição disjuntiva, e produzir um corte na “fusão atômica”. É interessante lembrar que a representação de um átomo livre para se ligar a outro, em virtude de sua instabilidade de elétrons, é exatamente feita com uma letra e um hífen, lembram-se? Assim, a representação da “molécula fusional” poderia ser: P-H-A, onde se lê paciente (P) e analista (A) transferencialmente grudados no discurso da “homossexualidade” (H). Minha proposição é que a partir da posição disjuntiva do analista, surgiria o S-, onde se lê, sujeito livre associativo, o que lhe permitiria uma oportunidade para entrar em contato com seus conflitos inconscientes, suas culpas (misto de pulsão de vida e de morte), suas exigências ideais, suas lembranças e angústias, o que possibilitaria a emergência de suas próprias metáforas mito poéticas. Na realidade, toda esta pesquisa é uma grande construção mito poética em resposta ao conjunto das transferências suscitadas pela minha experiência clínica, uma tentativa de criar uma narrativa criativa e metafórica que possa fazer sentido para algum outro. Se essa construção produzir associações em outros analista, completando minha viagem metapsicologia e criando novos sentidos que auxiliem a reflexão clínica, estão esta pesquisa terá produzido um efeito analítico. Figuras BIBLIOGRAFIA Berlinck, M.T. (1998). O que é Psicopatologia Fundamental, Revista Latino americana de Psicopatologia Fundamental, vol. I,n.1. Bleichmar, H. (1987) O Narcisismo – Estudos sobre a enunciação e a Gramática Inconsciente -, Porto Alegre, Artes Médicas. Calligaris, C.(1996) – As Diferenças Sexuais -, Boletim de Novidades, Ano IX, nº 86, São Paulo. Cláudio, I (1995) – Cultura Alegre – in: Insto é, nº 1324, Editora Três, São Paulo. Costa, J.F. (1992) – A inocência e o Vício: estudos sobre o Homoerotismo -, Rio de Janeiro, Relume Dumará. ________.(1998) Sem Fraude nen Favor: Estudos sobre o Amor Romântico, Rio de Janeiro, Rocco. Costa, R.P. (1994) Os Onze Sexos. São Paulo, Editora Gente. Fedida, P. (1998) – Clínica Psicanalítica: Estudos- São Paulo Editora Escuta Feitosa, N. (1995), Sui Generis nº 1, Rio de Janeiros, Gráfica JB. Freud, S. (1910). Leonardo Da Vinci e uma lembrança da sua Infância In Edição Standart Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, Rio de Janeiro, Imago. ________ (1914). Sobre o Narcisismo: Uma Introdução – In Edição Standart Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, Rio De Janeiro, Imago. ________ (1915). Os Instintos e suas Vicissitudes – In Edição Standart Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, Rio de Janeiro, Imago. _________ (1923). - O Ego e o ID in Edição Standart Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, Rio de Janeiro, Imago _________ (1924) - A Dissolução do Complexo de Édipo – In Edição Standart Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, Rio de Janeiro, Imago. _________ (1937) - Construções em Análise – In Edição Standart Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, Rio de Janeiro, Imago. Hopcke, R. H. (1993) - Jung, Junguianos e a Homossexualidade, São Paulo, Siciliano. Jackson, A. (1995) – Gay – Um Roteirão para quem Freqüenta -, in: Revista da Folha, nº 135. Encarte da edição de domingo da Folha de São Paulo, 26 de março de 1995. Kehl, M.R. (1996) – A Mínima Diferença: Masculino e Feminino na Cultura. Rio de Janeiro, Imago. Mcdougall, J. (1997) – As Múltiplas Faces de Eros: Uma Exploração Psicoanalítica da Sexualidade Humana. São Paulo, Martins Fontes. Mix, Magasine. A Revista do Clube Mix. Ano 1, nº 0 e 1. São Paulo Arte Digital. Nascimento, J.C.C. (1998) Entrevista com um Vampiro, Revista Latino Americana de Psicopatologia Fundamental, vol I, n.1 Ropa, D. (1994) – Ela é ... o que você quiser – in Redescrição da Psicanálise, Costa, J.F. (org), Rio de Janeiro, Relume Dumará. Sá, X. (1995) – Kátia, a Rainha da Caatinga- in Folha de São Paulo, 26 de março, p.1-14. Stoller, RJ (1993) – Masculinidade e Feminilidade: Apresentção do Gênero. Porto Alegre, Artes Médicas.