1966
1967
1968
1970
1971
1972
1973
1975
1977
1978
1980
FILMOGRAFIA
Nelson Pereira dos Santos (1928- )
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1994
1995
2000
2001
“Com Raízes do Brasil, quis mostrar que a vida dele
[Sérgio Buarque] prossegue nos seus
descendentes, como uma árvore com seus vários
ramos.”
apresenta
“Todo o meu cinema tem ligação com a literatura,
mesmo nos filmes não baseados em livros. Por trás
de Rio 40 Graus, por exemplo, você pode ver o
Jorge Amado, principalmente Capitães de Areia.”
“Acredito que o cinema tem uma vocação
educativa muito forte.”
Nelson Pereira dos Santos
17 de Março de 2004 – Ano II – Edição nº 44
EDIÇÃO ESPECIAL NA CINEMATECA DO MAM
20/mar (sáb), às 18h
Paris visto por...
de Claude Chabrol, Jean Douchet,
Jean-Luc Godard, Jean-Daniel Pollet,
Eric Rohmer, Jean Rouch.
79 Primaveras
de Santiago Alvarez.
SESSÃO CINECLUBE
PRÓXIMO FILME
Mediação do Debate:
Eduardo Valente e Ruy Gardnier.
31/mar
RAÍZES DO BRASIL
UMA CINEBIOGRAFIA DE SÉRGIO BUARQUE DE HOLLANDA
Elefante
de Gus Van Sant
de Nelson Pereira dos Santos
Programação e Produção:
Grupo Estação e Contracampo.
colaboração
www.estacaovirtual.com
www.contracampo.com.br
SINOPSE
realização
Documentário sobre o historiador Sérgio Buarque de
Hollanda dividido em 2 capítulos. O primeiro se dedica à
sua vida íntima e através de entrevistas apresenta sua paixão
pela pesquisa e a leitura, a convivência com a família e os
amigos. O segundo traz os apontamentos que ele redigiu
dos fatos mais importantes de sua vida, além de trechos de
"Raízes do Brasil" e outros textos de Sérgio.
FICHA TÉCNICA
1965
Juventude (curta)
Rio 40 Graus
Rio Zona Norte
Soldados do Fogo (curta)
Mandacaru Vermelho
Boca de Ouro
Vidas Secas
Um Moço de 74 Anos (curta)
O Rio de Machado de Assis (curta)
Fala Brasília (curta)
Cruzada ABC (curta)
O Justiceiro
Fome de Amor
Alfabetização (curta)
Azyllo Muito Louco
Como Era Gostoso o Meu Francês
Cidade Laboratório de Humboldt 73
(curta)
Quem é Beta?
O Amuleto de Ogum
Tenda dos Milagres
Nosso Mundo (curta)
Um Ladrão (curta-metragem, parte
do filme "Insônia")
Na Estrada da Vida
Missa do Galo (média-metragem)
A Arte Fantástica de Mário Gruber
(curta)
O Mundo Mágico (TV)
Capiba (TV)
A Música Segundo Tom Jobim (TV)
Memórias do Cárcere
Eu Sou o Samba (TV)
Bahia de Todos os Santos (TV)
La Drôle de Guerre (curta)
Super Gregório (TV)
Jubiabá
A Terceira Margem do Rio
Cinema de Lágrimas
Casa-Grande e Senzala (série de TV)
Meu cumpadre Zé Ketti (curta)
CITAÇÕES
1949
1955
1957
1958
1961
1963
Raízes do Brasil - Uma Cinebiografia de
Sérgio Buarque de Hollanda – Brasil, 2003,
cor, 1a. parte 74', 2a. parte 72'
Direção: Nelson Pereira dos Santos
Roteiro: Miúcha e Nelson Pereira dos
Santos Fotografia: Reynaldo Zangrandi e
Alberto Bellezia Montagem: Alexandre
Saggese e Julio Santos
Produção: Regina Filmes, VideoFilmes e
Riofilme.
de Nelson Pereira dos Santos
RAÍZES DO BRASIL
Todo o sentido de Raízes do Brasil - Uma Cinebiografia de Sérgio
Buarque de Holanda está no diálogo entre suas duas partes. Tomados
em separado, cada um dos dois hemisférios do filme clama por algo
que os complete. Ao contrário, vistos juntos compõem uma tese
curiosa e ousada que dialoga facilmente com a espinha dorsal da obra
que Nelson Pereira dos Santos vem perseguindo desde o Cinema
Novo. Uma obra que quer, de várias formas diferentes, mostrar ao
Brasil um Brasil que, por algum motivo, ele não conhece e que é
importante em si mesmo, não por seu valor de exotismo (como outros
diretores herdeiros da mesma tradição insistiram em fetichizar), mas
justamente por seu valor de oculto. Pois bem, a primeira parte do
documentário mostra uma série de descrições intimistas feitas por
filhos, netos e pela esposa de Sérgio Buarque, historiador que
escreveu uma das obras mais importantes da sociologia brasileira,
Raízes do Brasil, de 1936. Como se sabe, Sérgio Buarque teve uma
prole de valor. Deu ao mundo, por exemplo, os músicos Chico
Buarque e Miúcha. Ao todo, foram sete filhos de considerável sucesso
no que fazem. E das falas deles e de seus filhos - mais do que da
esposa de Sérgio, Maria Amélia - tem-se a imagem que menos se pode
esperar de um Sérgio Buarque de Holanda construído em um filme:
ele, quem diria, não era um homem cordial. Claro, trata-se de um jogo
de palavras. Não era mesmo e nem pretendia sê-lo no sentido
sociológico que ele mesmo propôs. Trata-se, na verdade, da
constatação de que, na intimidade, Sérgio intimidava. “Papai não
gostava muito de criança”, conta Chico. “Não era qualquer um que
podia entrar em seu escritório”, lembra-se Sergito. “Tínhamos um
pouco de medo dele”, lembra-se um neto. “Papyotto”, como era
carinhosamente chamado pelos netos, veja só, construiu uma
burocracia weberiana em família. Aos filhos e netos, um sistema de
méritos em que quase nunca - o filme dá conta apenas do caso de
Silvia, filha de Chico, eleita “a neta favorita” - pesava a cordialidade, o
favorecimento por laços afetivos, justamente o traço que o pensador
enxergava - e criticava - na formação da cultura e sociedade
brasileiras. Mas é só na segunda metade que esse sistema passa a
fazer verdadeiro sentido. Nas falas isoladas, parecem apenas
excentricidades do intelectual em família. Parece apenas curioso ouvir
Chico Buarque contar que só depois que um filho crescia e começava
a mostrar alguma inteligência é que o pai Sérgio lhe dava alguma
atenção. Estruturada como um filme educativo, nos moldes aos quais
Nelson se entregou nos últimos tempos - seu documentário de TV
Casa Grande e Senzala é bastante semelhante -, a segunda parte opera
para espelhar trechos de Raízes do Brasil, o livro, lido por Silvia, a neta
favorita, a narrações da biografia de seu autor, feita por ele mesmo, e
lida por filhos e netos. Em paralelo, imagens de época. Assim, ao
colocar diante do mundo (e de sua história, na acepção mais moderna,
aquela que se faz para o futuro) o modus vivendi sistematizante de
Buarque, o filme fortalece justamente sua figura como um pensador
que é seu próprio pensamento. A porta da biblioteca, transformada
em barreira limite do sistema de meritocracia
doméstica, serve como o símbolo de um sistema de
valores, defendido às últimas conseqüências. Onde
elas são mais difíceis de defender: na mesa do café da
manhã. O cotidiano do mito Sérgio Buarque é o mito
mesmo. Justamente porque não há mito. Só há
coerência. Se ele lia o gibi da Luluzinha, isso só servia
para dialogar ainda mais com sua “visão do paraíso”
doméstico.
Mas não deixa de ser uma questão para a obra de
Nelson Pereira dos Santos a feitura de um filmecelebração, metade de discursos de descrição
subjetiva e metade de discursos de objetividade
científica. Seu cinema vem flertando com o educativo
há algum tempo. Em Cinema de Lágrimas (1995), a
prosa acadêmica do livro de Silvia Oroz se impõe às
situações conflituosas - também de ordem afetiva entre os dois personagens. Isso na forma. No
conteúdo, o tema do diálogo entre o discurso da
intelligentsia sobre o mundo e sobre o discurso da
afetividade sempre esteve presente em seu cinema.
Isso está já em Rio 40 Graus (1955), mas está em sua
inflexão particular para o Tenda dos Milagres (1977) de
Jorge Amado e em sua recorrência ao discurso do
próprio Graciliano Ramos em Memórias do Cárcere
(1984). O mundo se forma entre a descrição
sentimental e a descrição sistemática. Pois assim
também é o mundo do Sérgio Buarque de Nelson. Daí
ser tão útil o tom pedagógico da segunda parte e daí
ser tão adequado o estilo compartimentar da primeira:
cada filho, cada neto, com seu capítulo à parte, com
sua afirmação particular da relação particular com o
avô, cada um com a história de sua inserção quase
estruturalista na “República de Papyotto”. Sérgio
Buarque não é um humano a ser revelado. É uma
descrição de Brasil ele mesmo. É um modelo, no
sentido não de que deva ser seguido, mas de que se
fez paradigma de sua própria visão de mundo. As
leituras obcecadas, a constante lembrança, por todos
os familiares, de sua reclusão, feita pura oposição a
sua vida boêmia de juventude, reapresentada na
biografia da segunda parte, tudo isso compõe mais
uma lógica do que uma personalidade propriamente
dita. Não é, então, uma história de Sérgio Buarque, é
mais uma cartografia.
Alexandre Werneck
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RAÍZES DO BRASIL