A GUERRA ALÉM DOS LIMITES CONJECTURAS SOBRE A GUERRA E A TÁTICA NA ERA DA GLOBALIZAÇÃO QIAO LIANG E WANG XIANGSUI BEIJING: PLA LITERATURE AND ARTS PUBLISHING HOUSE, FEVEREIRO, 1999 NOTA DO EDITOR O texto constitui uma seleção do livro “A Guerra Além dos Limites: Conjecturas sobre a Guerra e a Tática na Era da Globalização”, publicado na China, em Fevereiro de 1999, incluindo o Índice, Prefácio, Palavras Finais, e as Informações Bibliográficas dos autores do livro. A obra propõe atitudes e procedimentos que transcendem as táticas militares, a serem implementadas por países em desenvolvimento, como a China em particular, visando compensar a sua inferioridade militar em relação aos EUA, em um conflito envolvendo meios de alta-tecnologia. O livro foi escrito por dois Coronéis da nova geração de oficiais chineses, integrantes do PLA (People´s Liberation Army), e publicado pela editora oficial “PLA Literature and Arts Publishing House”, em Pequim, sugerindo, desta forma, que a sua publicação tenha sido endossada por autoridades no comando do PLA. Esta sugestão foi reforçada por uma entrevista com Qiao Liang além de uma crítica louvável ao livro, publicada em 28 de junho de 1999, pelo periódico oficial da Liga Jovem do Partido o “Zhongguo Quignian Bao”. Tendo sido publicado antes do bombardeio da Embaixada chinesa em Belgrado, este livro, recentemente, chamou a atenção, tanto da imprensa ocidental, quanto da chinesa, por advogar o emprego de uma multiplicidade de meios, militares e, particularmente não-militares, para um ataque aos EUA na eventualidade de um conflito. A violação de sites da Internet, a o ataque a instituições financeiras, o terrorismo, a exploração da mídia, e a guerrilha urbana, estão entre os métodos propostos. Na entrevista concedida ao periódico “Zhongguo Quignian Bao”, Qiao Liang declarou que: “a primeira regra na guerra irrestrita é a de que não existem regras, nada é proibido”. Estendendo-se, ele declarou que países poderosos não adotariam esta abordagem contra países fracos porque “os países fortes fazem as regras, enquanto que os países emergentes às violam e exploram aspectos não previstos... os Estados Unidos violam (regras da ONU), e criam novas regras, quando aquelas regras não se adaptam (aos seus propósitos), mas eles têm de observar as suas próprias regras, pois ao contrário, perderão a confiança mundial”. 2 ÍNDICE A TECNOLOGIA É O TOTEM DO HOMEM MODERNO................................................. 8 NÃO SERÁ MAIS POSSÍVEL ROTULAR A GUERRA................................................... 17 DOIS PENSAMENTOS DOUTRINÁRIOS — “GUERREAR COM AS ARMAS EXISTENTES OU ARMAS ESPECÍFICAS PARA GUERREAR”...................................22 ARMAS DE EMPREGO NEOCONCEPCIONAL E ARMAS NEOCONCEPCIONAIS......27 A TENDÊNCIA PARA AS ARMAS SUAVES................................................................. 32 POR QUE E POR QUEM LUTAR?...............................................................................38 ONDE LUTAR?.......................................................................................................... 44 QUEM SÃO OS GUERREIROS?................................................................................. 49 QUAIS MEIOS E MÉTODOS SERÃO USADOS NA GUERRA?..................................... 56 UMA ALIANÇA REPENTINA....................................................................................... 70 A OPORTUNA LEI DE REORGANIZAÇÃO................................................................. 74 INDO ALÉM DO COMBATE INTEGRADO AR-TERRA................................................. 77 QUEM É O REI NAS AÇÕES DE GUERRA TERRESTRE?........................................... 80 UM OUTRO JOGADOR ESCONDIDO POR TRÁS DA VITÓRIA.................................... 85 UMA MAÇÃ COM MUITAS FATIAS ........................................................................... 89 A MÃO ESTENDIDA ATRAVÉS DA CERCA — CADA FORÇA VÊ A GUERRA DE FORMA DIFERENTE.............................................................................................................. 94 O MAL DA EXTRAVAGÂNCIA E O “NÍVEL ZERO DE PERDAS”...............................106 GRUPO DE BATALHA FORÇA EXPEDICIONÁRIA FORÇA INTEGRADA ......... 112 DAS CAMPANHAS COMBINADAS ATÉ A GUERRA ONIDIMENSIONAL — UM PASSO PARA O COMPLETO ENTENDIMENTO .................................................................. 119 REMOVENDO A COBERTURA DAS NUVENS DA GUERRA...................................... 139 A DESTRUIÇÃO DAS REGRAS E A AMBIÊNCIA DE PERDA DE EFICÁCIA...............146 COQUETEL NA TAÇA DOS GRANDES MESTRES ................................................... 156 USANDO A ADIÇÃO PARA VENCER O JOGO.......................................................... 162 TIPOS DE GUERRA ................................................................................................ 168 CONFORMANDO-SE À REGRA DA PROPORÇÃO ÁUREA......................................... 173 A GRAMÁTICA DA VITÓRIA — A REGRA COLATERAL-PRINCIPAL........................... 180 O ELEMENTO DOMINANTE E O CONJUNTO TODO — A ESSÊNCIA DA ESTRUTURA COLATERAL-PRINCIPAL......................................................................................... 191 UMA REGRA E NÃO UMA FORMULA PREESTABELECIDA...................................... 196 COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS ....................................................................... 205 SUPRACOMBINAÇÃO DE AMBIÊNCIAS.................................................................. 214 SUPRACOMBINAÇÃO DE MEIOS .......................................................................... 220 SUPRACOMBINAÇÃO DE NÍVEIS ........................................................................... 227 ONIDIRECIONALIDADE ......................................................................................... 234 SINCRONIA ........................................................................................................... 236 OBJETIVOS LIMITADOS ........................................................................................ 237 MEDIDAS ILIMITADAS ........................................................................................... 239 DESEQUILÍBRIO .................................................................................................... 241 CONSUMO MÍNIMO ............................................................................................... 242 COORDENAÇÃO MULTIDIMENSIONAL .................................................................. 244 AJUSTE E CONTROLE DE TODO O PROCESSO ....................................................246 APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS NA GUERRA ALÉM DOS LIMITES............................ 247 3 INTRODUÇÃO Todos que viveram a última década do século XX têm uma grande percepção das mudanças ocorridas no mundo. Não acreditamos que exista alguém que possa alegar a existência de uma outra década na História, em que tenha ocorrido um maior número de mudanças. É evidente, que as causas por traz dessas enormes mudanças são inúmeras, para serem citadas, não obstante, existem algumas que são sistematicamente mencionadas, e uma delas é a 2ª Guerra do Golfo (1990-91). A 2ª Guerra no Golfo foi a guerra que mudou o mundo. Associar esta conclusão a uma guerra limitada, tanto no tempo (durou apenas 42 dias), quanto à área de operações, parece um pouco de exagero. Não obstante, os fatos corroboram essa assertiva, bastando citar, todos os novos termos e conceitos que começaram a surgir após 17 de janeiro de 1991, tais como: a antiga União Soviética, BósniaHerzegovina, Kosovo, clonagem, Microsoft, hackers, Internet, a crise financeira do Sudeste Asiático, o Euro, bem como a única superpotência remanescente, os Estados Unidos. Pode-se alegar que estes termos e conceitos seriam suficientes e constituíram, em grande parte, os principais temas na década de 80. No entanto, o que nos propomos a afirmar, é que todos esses termos e conceitos estão relacionados àquela guerra, quer direta, quer indiretamente. Não temos a intenção de mitificar a guerra, e em particular, uma guerra desbalanceada, na qual havia uma significativa diferença no poder efetivo dos contendores. Muito pelo contrário, em nossa análise desta guerra, que em 15 dias praticamente mudou o mundo inteiro, notamos um outro fato, qual seja, o de que a guerra em si também havia mudado. Percebemos que a guerra como nós a conhecíamos, descrita em termos gloriosos e dominantes, até a conclusão do recente conflito, marcando um ápice na História Militar, deixou de ser considerada um dos mais importantes eventos no cenário mundial, e passou a ter, a importância de um ator secundário. Uma guerra que mudou o mundo, e em última análise, transformou a própria natureza da guerra. Este fenômeno é realmente fantástico, e ao mesmo tempo, estimula profundas ponderações. Não nos referimos às mudanças nos instrumentos da guerra, na tecnologia dos meios empregados, nos modelos de condução da guerra, ou nos tipos de guerra. Estamos nos referindo, isto sim, à 4 natureza da guerra. Quem poderia imaginar que um ator intolerável e arrogante, cuja aparição provocou uma completa mudança de enredo, subitamente dar-se-á conta de que, é o último capaz de encenar aquele personagem singular. E mais ainda, que mesmo antes mesmo dele deixar o palco, já lhe foi dito que ele não vai exercer, novamente, o papel de protagonista, ou pelo menos um papel central, no qual ocuparia sozinho o centro do palco. Que tipo de sentimento isso despertaria? Possivelmente, aqueles que sentem tal condição mais profundamente são os norteamericanos os quais, provavelmente, pensam dever ser incluídos entre aqueles poucos que querem assumir todos os papéis, compreendendo o de salvadores, o de bombeiros, o de polícia mundial, o de emissários da paz, etc. Ao final da “Tempestade no Deserto” o “Tio Sam”, novamente, não foi capaz de alcançar uma vitória convincente; e tanto na Somália, quanto na Bósnia-Herzegovina, o desfecho foi, invariavelmente, o mesmo. Particularmente, nas ações mais recentes, nas quais os EUA e a Grã-Bretanha juntaram-se para realizar ataques aéreos ao Iraque, tratava-se do mesmo palco, do mesmo método, e dos mesmos atores; não havia, porém, maneira de se reeditar a bem sucedida atuação que causou, oito anos antes, uma impressão tão marcante. Diante das atuais questões políticas, econômicas, culturais, diplomáticas, étnicas e religiosas, e etc., cujas complexidades são bem maiores do que as vislumbradas pela maioria dos militares no mundo, as limitações quanto aos meios bélicos, que até agora constituíam um fator de sucesso, subitamente tornaram-se evidentes. No entanto, numa era em que “o poder é a razão” e grande parte da história deste século está contida neste período estes temas não constituíram entraves. A questão é que as forças multinacionais lideradas pelos EUA, operando na região desértica do Kuwait, marcaram o fim de um período, inaugurando, assim, uma nova era. Na atualidade, ainda é difícil vislumbrar se esta nova era irá redundar no desemprego de grandes efetivos militares, ou se irá abolir a guerra da face da Terra. Tudo isso ainda é indeterminado. A única conclusão certa é a de que, a partir de agora, a guerra não será mais como sempre foi. Em outras palavras, se no futuro, a humanidade não tiver alternativas que não a de engajarem-se em guerras, estas não serão mais conduzidas dentro dos moldes que nos eram familiares. 5 É impossível negar o profundo impacto exercido sobre a sociedade pelas novas motivações representadas pela liberdade econômica, concepção dos direitos humanos e percepção da importância da proteção ambiental. Mas é certo que a metamorfose da guerra provocará um cenário ainda mais complexo, caso contrário, o imortal pássaro da guerra, na eminência de seu declínio, não será capaz de atingir o seu nirvana. Quando as pessoas começarem a aceitar e regozijar-se com a redução do uso da força militar para a resolução de conflitos, a guerra renascerá sob outro formato, em outro cenário, tornando-se um instrumento de enorme poder nas mãos dos que nutrem a intenção de controlar outros países e regiões. O ataque financeiro realizados por George Soros no Sudeste Asiático, os ataques terroristas conduzidos por Osama Bin Laden às embaixadas norte-americanas, o ataque com gás sarin no metrô de Tókio, realizado pelos discípulos de Aum Shinri Kyo, e a devastação causada por Morris Jr. na Internet, são eventos cujos graus de destruição são comparáveis aos de uma guerra. São eventos que representam uma forma embrionária de um novo tipo de guerra. Seja qual for o nome atribuído a estas evoluções na ambiência da guerra, elas não nos tornam mais otimistas, e isto porque a redução da natureza da guerra, em sua essência, não significa o seu fim. Mesmo na chamada era pós-moderna, ou pósindustrial, a guerra não deixará de existir. Ela apenas irá permear a sociedade humana, de uma forma mais complexa, mais penetrante, encoberta e sutil. É como Byron citou em seu poema “Mourning Shelley” “Nada aconteceu, ele apenas passou para um outro nível de vida”. A guerra, que se submeteu às mudanças da moderna tecnologia e do sistema de mercado, será desencadeada de formas ainda mais atípicas. Em outras palavras, enquanto presenciamos uma relativa redução na violência militar, estamos evidenciando, definitivamente, um aumento na violência política, econômica e tecnológica. No entanto, a despeito das formas que a violência possa assumir, a guerra continua sendo a guerra, e as mudanças, em sua aparência externa não impedem que ela continue a ser regida pelos Princípios da Guerra. Os novos princípios de guerra não prescrevem mais “o emprego da força armada para compelir um inimigo a submeter-se à nossa vontade”, e sim, “a utilização de 6 todos os meios, militares e não-militares, letais e não-letais, para compelir um inimigo a submeter-se aos nossos interesses”. Isto representa uma mudança, tanto na guerra em si, quanto no modelo de guerra provocado por essa transformação. Se estas mudanças existem que ou o que as determinou? Que tipos de mudanças são estas? Que novos rumos estas mudanças estão determinando? E como encarar estas mudanças? Estes são os tópicos que este livro procura abordar, constituindo, também, nossa motivação para escrevê-lo. Qiao Liang e Wang Xiangsui Em 17 de janeiro de 1999, 8º aniversário do início da Guerra no Golfo. 7 1ª PARTE – EM UM NOVO TIPO DE GUERRA “Apesar de Estados antigos terem sido grandes, eles, inevitavelmente, pereceram quando se tornaram adeptos da guerra.” Sima Rangju A TECNOLOGIA É O TOTEM DO HOMEM MODERNO0 A TECNOLOGIA — UM PAR DE SAPATILHAS MÁGICAS Impulsionada pela morna brisa do utilitarismo, não é uma surpresa que a tecnologia tenha sido mais favorável ao homem do que a ciência. A era das grandes descobertas científicas já estava ultrapassada, antes mesmo da época de Einstein, no entanto, ainda hoje, o homem se inclina, cada vez mais, para realização de todos os seus sonhos, em seu próprio tempo de vida. Esta perspectiva levou o homem esperar o seu próprio futuro, adotando uma atitude de prostração e de expectativa quanto às maravilhas que lhe podem ser proporcionadas pela tecnologia, vislumbradas através de uma lente côncava, com magnitude elevada à potencia de 1000. Desta forma, a tecnologia produziu desenvolvimentos surpreendentes e magníficos, num período de tempo relativamente curto, resultando em inúmeros benefícios para uma humanidade que estava ávida por um sucesso rápido e a correspondente recompensa. Não obstante, ao enaltecermos orgulhosamente este progresso, não nos damos conta de que ao abrigo desta benigna era da tecnologia nos abstraímos dos nossos melhores sentimentos. 0 No livro “In Man and Technology”, O. Spengler afirma: “como Deus, nosso Pai, a tecnologia é eterna e imutável, e como o Filho de Deus, irá salvar a humanidade, e como o Espírito Santo, brilha sobre nós”. A adoração do filósofo Spengler pela tecnologia, semelhante à de um teólogo por Deus, não era nada mais do que uma manifestação de um outro tipo de ignorância, na medida em que o homem entrava na grande era do industrialismo, que florescia de forma intensa na era pósindustrial. 8 A este respeito, o filósofo e cientista francês Jean Ladrihre tem um ponto de vista específico. Ele acredita que ciência e a tecnologia têm um efeito, tanto destrutivo quanto orientador sobre a cultura. Sob a combinação destes dois efeitos é muito difícil para a humanidade manter uma correta avaliação sobre a tecnologia, e assim estamos constantemente oscilando entre dois extremos, o do fanatismo técnico e o dos movimentos “anticientíficos”. Munir-se da disposição para ler a obra “The Challange Presented to Cultures by Science and Technology”, um texto obscuro, mas com uma linha de raciocínio conciliadora, pode ser útil para percebermos o impacto da tecnologia sobre os diversos aspectos da sociedade humana, a partir de uma ampla perspectiva. Atualmente, a tecnologia está se tornando cada vez mais fascinante e incontrolável. Os laboratórios da Bell e da Sony desenvolvem continuamente novos “brinquedos”; Bill Gates lança uma nova versão do “Windows” a cada ano; e a “Dolly”, uma ovelha gerada por clonagem, é a prova de que o homem está, agora, planejando tomar o lugar de Deus, como Criador. Dentro do ritmo alucinante em que a tecnologia se desenvolve, o surpreendente caça russo SU-27 Flanker, nem chegou a ser empregado em combate, e o SU-35 Super-Flanker já se apresenta como o seu sucessor0. A tecnologia, portanto, é como um “par de sapatilhas mágicas” que após serem calçadas e firmemente presas pelos interesses comerciais, não nos deixa alternativas que não a de dançar de acordo com o ritmo por elas estabelecido0. A TECNOLOGIA NÃO PODE MAIS ROTULAR ERAS Adotar nomes como Watt e Edison, que quase sinônimos de grandes invenções tecnológicas, para designar as eras em que viveram, até que poderia ser considerado lógico. No entanto, a partir deles a situação mudou, e as incontáveis e variadas descobertas tecnológicas, ocorridas no último século, tornaram difícil a identificação de um simples desenvolvimento, que possa ter assumido uma importância magna no âmbito da humanidade. 0 Apesar do armamento como capacidade “BVH” (beyond visual range) ter incorporado significativas mudanças nos conceitos básicos de combate aéreo, e mesmo após tudo o que já foi dito e feito a respeito, os conceitos de combate à curta distância ainda não foram completamente invalidados. Ambos, o SU-27 e o SU-35, dotados de extraordinária manobrabilidade, constituem as melhores aeronaves de interceptação na atualidade. 0 [N.T.] A alusão é feita a um balé criado por Peter Ilich Tchakovisky, compositor russo. Ao calçar as sapatilhas de balé, a bailarina não consegue mais controlar a sua dança, e ao final, morre de exaustão. 9 Expressões como “era da máquina a vapor” e “era da eletricidade” podem ser consideradas formulações que refletiam a realidade de suas épocas. Porém, na atualidade, com o progresso acelerado da tecnologia, as pessoas praticamente não dispõem do tempo necessário para reconhecer aclamar os desenvolvimentos tecnológicos, antes que estes sejam sucedidos por tecnologias mais avançadas ou por novas ondas tecnológicas. Assim, a possibilidade de se batizar uma nova era, a partir de um desenvolvimento tecnológico específico ou, a partir de um único invento, tornou-se um aforismo do passado. É por este motivo, que se alguém chamar a época atual de “era nuclear”, ou, “era da cibernética”, podemos dizer que ela estará enfocando um aspecto particular do desenvolvimento humano, para tipificar uma situação genérica. A TECNOLOGIA CIBERNÉTICA Indubitavelmente o aparecimento da tecnologia cibernética0 foi uma novidade benéfica para a civilização. Isto se deve ao fato de na atualidade ela ser o único recurso, capaz de amplificar a epidemia tecnológica, que parece ter sido liberada de uma “Caixa de Pandora”, e simultaneamente, incorporar o encantamento mágico de representar um meio de controlar essa tecnologia. A questão que permanece, no entanto, é: Quem terá o “encantamento mágico” para controlar a tecnologia cibernética? O ponto de vista pessimista quanto a essa questão é que, se a tecnologia cibernética desenvolver-se a ponto de não poder mais ser controlada pelo homem, e em última análise, transformará a humanidade em sua vítima. 0 [N.T.] Usamos a expressão “tecnologia cibernética” como tradução para “information technology” porque a palavra cibernética — cujo significado é: “ciência que estuda as comunicações e o sistema de controle não só nos organismos vivos, mas também nas máquinas” — é a que tem o significado mais próximo do atual conceito de “information”. 10 F.G.Ronge é o mais contundente dos pessimistas da tecnologia. Desde 1939, Ronge identificou uma série de problemas que a moderna tecnologia traz embutida em si, incluindo o crescimento do controle tecnológico, e a ameaça de problemas ambientais. Em seu ponto de vista, a tecnologia já se tornou uma força diabólica inalcançável. Ela não só suplantou a natureza, como também eliminou a liberdade do homem. Na obra “Being and Time”, Martin Heidegger denominou a tecnologia como um “destacado absurdo”, conclamando os homens a se voltarem para a natureza, de modo a evitar a tecnologia, a qual representava a sua maior ameaça. Os mais famosos otimistas em relação à tecnologia foram Norbert Wainer e Steinbuck. Nas obra de Weiner - “Cybernetics, God and Robots”, e de Steinbuck “The Human use of Human Beings” de Wiener, e “The Information Society, Philosophy and Cybernetics”, e outros trabalhos semelhantes, pode-se identificar as brilhantes perspectivas que eles descrevem para sociedade humana, motivadas pela tecnologia. Por outro lado, as perspectivas otimistas que a tecnologia cibernética apresenta são significantemente sedutoras, para uma humanidade ávida de progresso tecnológico. Afinal de contas, suas características singulares de facultar a troca e o compartilhamento entre diferentes áreas da tecnologia, representam um facho de inteligência, que esperamos, oriente a humanidade no seu afastamento do barbarismo tecnológico, muito embora, esta perspectiva ainda não seja suficiente para nos compararmos aos futuristas, que ao verem algumas árvores não vislumbram a floresta a que elas pertencem, e assim, usam o enunciado tecnologia cibernética para rotular toda uma era. Não obstante, este predomínio tende a não ocorrer, porque característica intrínseca da tecnologia cibernética, que é proporcionar a inteiração entre outras tecnologias é, precisamente, o fator que a impede de substituir as diversas tecnologias que já existem, estão emergindo, ou estão ainda por surgir. Ou seja, por ser um elemento de ligação ela não subsiste isolada. Por exemplo, a biotecnologia, a tecnologia de materiais, e a nanotecnologia, têm uma intensa relação de simbiose promovida pela tecnologia cibernética, da qual dependem para promover umas às outras. A RAMIFICAÇÃO TECNOLÓGICA Nos últimos 300 anos, as pessoas vêm adquirindo o hábito de aderir cegamente às novas tecnologias, descartando-se do que é velho. A interminável busca por uma 11 outros problemas0. Como por exemplo, o automóvel, que foi desenvolvido para tornar-se um meio de transporte mais conveniente. No entanto, na esteira deste desenvolvimento, surgiu uma longa lista de problemas: a mineração e a fundição; o processamento mecânico; a prospecção e refino de petróleo; a industrialização da borracha e dos sintéticos; a construção e pavimentação de estradas; e assim por diante. Estes problemas, por sua vez, demandaram a adoção de métodos e técnicas as quais, em última análise, produziram a poluição ambiental, o esgotamento de recursos, a ocupação de áreas rurais, o aparecimento de acidentes de trânsito, além de uma série de outros problemas intrincados. Apesar disso, e sob uma ampla perspectiva, se comparados à meta original, que era o de desenvolver um meio de transporte, esses problemas decorrentes praticamente perderam significado. Desta forma, a expansão irracional da tecnologia tem continuamente levado a humanidade a não só, perder de vista seus objetivos no complexo emaranhado da árvore do desenvolvimento tecnológico, como também, a perder a possibilidade de reverter o processo. Podemos, inclusive, apelidar esse fenômeno como o “efeito de ramificação”. A TECNOLOGIA DEVE SER APENAS UMA FERRAMENTA Afortunadamente, surgiu a tecnologia cibernética, e podemos dizer, com certeza, que esta representa a mais importante revolução na história da tecnologia. A sua relevância não está apenas no fato de ser uma inovação, e sim, por se tratar de uma espécie de agente agregador, dispondo da capacidade de penetrar fluidicamente através das barreiras existentes entre diferentes tecnologias, interligando aquelas que pareciam ser totalmente dissociadas. O poder agregador da tecnologia cibernética também permite o desenvolvimento de novas tecnologias, que mesmo sendo distintas daquelas que as originaram retêm, simultaneamente, semelhanças às tecnologias originais; e mais do que isso, proporciona um novo modelo de relacionamento entre o homem e a tecnologia. 0 Em seu livro “The Arrogance of Humanism”, David Ehrenfeld cita numerosos exemplos desta afirmativa. Em “To Clever” Schwartz declara que “a resolução de um problema pode gerar uma série de novos problemas, e estes problemas podem, em última instância, inviabilizar a solução do problema original.” Rene Dibo em sua obra “Rational Consciousness”, também aborda este fenômeno particular. 12 No processo de resolução dos difíceis problemas com os quais a humanidade se depara ao longo de sua existência, somente a partir da perspectiva da tecnologia cibernética, poderá a humanidade perceber a essência do que é a tecnologia uma ferramenta e somente então, poderá evitar escravização pela tecnologia. A FUSÃO DE DIFERENTES GERAÇÕES DE TECNOLOGIAS A humanidade é plenamente capaz de desenvolver plenamente a sua engenhosidade e imaginação, de modo usar todo o potencial de uma tecnologia específica, até a sua exaustão, ao invés de simplesmente utilizá-la e substituí-la quando surge uma tecnologia mais avançada. Na atualidade, é inimaginável o uso de uma tecnologia de forma independente ou isolada, e a emergência da tecnologia cibernética tem apresentado possibilidades ilimitadas de casamento de novas e velhas tecnologias, bem como, entre as novas e as tecnologias mais avançadas. Inúmeros fatos têm demonstrado que o uso integrado de tecnologias é capaz de promover mais progresso social que o desenvolvimento de novas tecnologias0. Os desempenhos solos estão no processo de sua substituição pela manifestação conjunta de múltiplas partes, como num coro. A fusão de tecnologias, em caráter geral, está orientando, de modo irreversível, a tendência para a globalização. Em contrapartida, a globalização acelera o processo de fusão geral das tecnologias, e este processo de realimentação é a característica básica da nossa era, e que irá, inevitavelmente, projetar seus efeitos em todas as direções, e naturalmente, a ambiência da guerra não será uma exceção. Nenhuma força militar que aspire por modernização pode ser bem sucedida, sem desenvolver novas tecnologias, sendo que, neste sentido, a guerra tem sido o berço destas novas tecnologias. Durante a 2ª Guerra do Golfo, mais de 500 itens representativos da nova e avançada tecnologia da década de 80 estiveram em cena, 0 Em sua obra “In The Age of Science and the Future of Mankind” E. Shulman enfatiza que “no dinâmico desenvolvimento da cultura moderna, o qual é baseado no explosivo desenvolvimento da moderna tecnologia, nós estamos continuamente nos deparando com a cooperação multidisciplinar... é impossível para um ramo específico da ciência, guiar nossa prática científica de uma forma suficiente“. 13 e marcaram a sua presença, transformando a guerra num painel de demonstração dos novos sistemas de armas. No entanto, o aspecto que chamou a atenção de forma mais contundente, não foi o novo armamento em si, e sim, a tendência à sistematização no desenvolvimento e emprego dos sistemas de armas. Como exemplo tem o sistema “Patriot”, empregado para interceptar os mísseis “Scud”. O que parecia uma ação local de tiro ao alvo, na realidade, envolvia um conjunto de sistemas interligados, cobrindo praticamente metade do globo terrestre, ou seja: um satélite DSP0 identificava o alvo, enviava um sinal de alarme para uma estação receptora na Austrália; esta por sua vez retransmitia o sinal para um Posto de Comando localizado em território norte-americano, e a partir deste, o sinal era enviado para o Comando das forças norte-americanas em Ryadh, deste Posto é que saia o comando de disparo para as baterias de mísseis “Patriot”. Somente após este trâmite, que durava apenas 90 segundos, os mísseis “Patriot” eram lançados configurando o que se poderia dizer “um disparo ouvido no mundo inteiro”. A coordenação à longa distância, e em tempo real, de inúmeros sistemas de armas, criou uma capacidade de combate sem precedentes, e este é um exemplo preciso, de algo inimaginável antes do surgimento da tecnologia cibernética. Enquanto que o desenvolvimento de armas singulares, antes da 2ª Guerra Mundial, ainda era capaz de gerar uma revolução militar, na atualidade, ninguém é capaz de dominar, sozinho, toda uma ambiência. Na era atual, a integração e globalização tecnológica eliminaram a possibilidade das armas rotularem as guerras, e com relação a esta nova realidade, as armas para novas concepções, e em particular, as novas concepções de armas, obscureceram a face da guerra. O ataque de um hacker pode ser considerado um ato hostil? A utilização de instrumentos financeiros para destruir a economia de um país pode ser vista como uma batalha? Será que a reportagem da rede CNN, mostrando os corpos de soldados norte-americanos nas ruas de Mogadishu, despertou a determinação 0 Os Satélites DSP (Defense Support Program), desenvolvidos na década de 70, em sua configuração original eram posicionados em órbitas geoestacionárias, sendo dotados de sensores para prover alarme contra mísseis além do horizonte. 14 norte-americana em atuar como uma “polícia mundial” e, portanto, alterou a configuração estratégica mundial? Deveriam as análises das ações em uma guerra enfocarem os meios? Ou os resultados? É óbvio, que raciocinando com a definição tradicional de guerra, não há mais como responder estas questões. Ao nos darmos conta, de que todas essas ações de nãoguerra podem tornar-se os elementos constituintes de uma guerra no futuro, concluímos que devemos criar uma nova designação para este novo tipo de guerra: uma guerra que transcenda todas as fronteiras e limites, em resumo a Guerra Além dos Limites. Por este novo conceito, a guerra prescreve a prontidão de todos os meios disponíveis, a onipresença da informação, e presença do campo de batalha em todos os lugares. Significa a fusão de todas as armas com a tecnologia disponível, como for desejado; a eliminação de todas as fronteiras entre as duas ambiências, a da guerra e da paz; dos militares e dos não-militares; a mudança de todos os princípios de guerra, e até mesmo, as regras da guerra poderão ter que ser reformuladas. No entanto, é difícil medir o pulso do Deus da Guerra. Se quisermos discutir a guerra, e particularmente a guerra que irá ocorrer amanhã à noite, ou depois de amanhã, só existe uma maneira, qual seja, determinando, tranqüilidade, a sua natureza e medindo, cuidadosamente, o pulso com toda a do Deus da Guerra no momento atual. 15 CAP. 1 — A REVOLUÇÃO NOS ARMAMENTOS INVARIAVELMENTE A PRIMEIRA A OCORRER “Tão logo os avanços tecnológicos possam ser aplicados às metas militares, ou já estejam em uso para fins militares, quase que imediatamente, tornam-se obrigatórios, e freqüentemente, contrariam a vontade dos Comandantes no sentido de provocar mudanças ou até mesmo revoluções nos modos de combate.” Engels A revolução nos armamentos invariavelmente antecede as revoluções nos assuntos militares. Seguindo-se ao surgimento de uma arma revolucionária, o aparecimento de uma revolução em assuntos militares é simplesmente uma questão de tempo. A história da guerra tem proporcionado contínuas evidências dessa assertiva: as lanças de bronze ou de aço permitiram o desenvolvimento da temida falange da infantaria0. O arco e flecha e os estribos proporcionaram novas táticas para a cavalaria. Segundo Engels, “Na época do barbarismo o arco e flecha ainda era uma arma decisiva, assim como a espada de aço numa era não civilizada e as armas de fogo na era da civilização.” (Collected Works de Marx e Engels, Vol. 4, People’s Press, 1972, p.19) Com relação a como o estribo modificou o modo de combate, citamos o comentário e tradução de Gu Zhun de um artigo intitulado “Stirrrups and Feudalism Does Technology Create History?”. “Os estribos....tornaram imediatamente possível o combate direto “mão a mão” e este era um modo revolucionário de combate....freqüentemente apareciam invenções tão simples quanto o estribo, mas raramente, elas tiveram um papel tão catalisador na história quanto esta”.”O estribo provocou uma série de revoluções militares e sociais na Europa” (Collected Works of Gu Zhun, Guizhou People’s Press, 1994, p293-309). Os canhões usando a pólvora negra que foram o berço de uma completa gama de novas táticas de guerra; e quando as balas e os fuzis0 chegaram aos campos de batalha, como a vanguarda da uma nova era tecnológica, as armas passaram, a 0 O autor se refere á Falange Macedônica, desenvolvida por Felipe II da Macedônia e aperfeiçoada e consagrada por seu filho Alexandre “O Grande”. 0 Comparado ao desenvolvimento de qualquer tecnologia avançada de armamento, a invenção do fuzil e da bala cônica, entre os anos de 1850 e 1860, teve o maior e mais profundo e imediato impacto revolucionário. O impacto causado pelos desenvolvimentos das bombas de alto-explosivo, do avião, e do tanque, todos ocorridos no século XX, certamente não se compara ao que foi causado pelo desenvolvimento do fuzil à sua época. identificar e designar ações de guerra e a própria guerra em si. Inicialmente, foram os enormes navios dotados de couraças de aço que comandavam os mares, inaugurando a era dos encouraçados; em seguida seus irmãos terrestres, os tanques, que passaram a comandar a guerra terrestre, e na seqüência os aviões dominariam os céus, e assim, até o nascimento da bomba atômica, que anunciava a proximidade da era nuclear. Atualmente, uma grande quantidade de armamentos de tecnologia avançada continua a ser desenvolvida, e as armas, formalmente, tornaram-se o principal elemento representativo da guerra. Quando tratamos da guerra na atualidade, já é costume adotar a designação de determinadas armas ou tecnologias para rotulá-la, como por exemplo: a guerra eletrônica, o ataque de precisão, a guerra de minas, a guerra anti-submarino, os ataques cirúrgicos e a guerra cibernética0. No entanto, embora os indícios já existam, ainda não foi percebido claramente que uma mudança muito importante está cada vez mais próxima. NÃO SERÁ MAIS POSSÍVEL ROTULAR A GUERRA O PARADOXO ENTRE AS ARMAS E A GUERRA As revoluções nos assuntos militares não serão mais deflagradas pelo surgimento de uma ou duas armas singulares. O dinamismo e o nível de difusão da evolução tecnológica, além de estimular a ansiedade e o deslumbramento por novas armas, contribuíram para desvendar seus mistérios, laicizando-as. No passado, a invenção de uma nova arma, ou de partes de um equipamento, tais como o estribo ou a metralhadora Maxim0, era o suficiente para alterar a face da 0 [N.T.] Expressão usada na tradução de “information warfare”. 0 Na Batalha do Rio Somme, durante a 1ª Guerra Mundial, no dia 1º de julho de 1916, as forças inglesas lançaram uma ofensiva contra as forças alemãs, e os alemães utilizaram as metralhadoras Maxim contra as tropas inglesas, que adotando uma formação cerrada, tiveram 60.000 baixas em um só dia. A partir desta ocorrência, as táticas de ataque empregando formações maciças foram gradualmente sendo eliminadas dos campos de batalha. (Weapons and War The guerra. Ao passo que, atualmente, é necessário o desenvolvimento de diversos tipos de armas, que vão interagir para compor sistemas que possam produzir um efeito sensível numa guerra, criando assim, um paradoxo, inerente ao relacionamento entre as armas e a guerra, qual seja: quanto maior o número de armas inventadas, e quanto maior a tecnologia envolvida, menor tem sido sua importância relativa numa guerra. guerra A TECNOLOGIA NÃO PODE MAIS ROTULAR A GUERRA Desta forma, com a exceção das armas nucleares, (cujo emprego improvável poderia designar uma guerra nuclear), nenhuma arma atual por si só, mesmo aquelas consideradas as mais revolucionárias, possui a magnitude e a perenidade para rotular uma guerra do futuro. Possivelmente, este seja o motivo para que se tenham desenvolvido novas formas de identificação, tais como “guerra guerra de alta-tecnológia” guerra cibernética,” alta-tecnológia ou “guerra cibernética, com a intenção de utilizar designações tecnológicas ou científicas, de natureza ampla e vaga, ao invés de designações específicas, baseadas em armamentos. Se não considerarmos as opiniões de Wiener a respeito das máquinas de jogos de guerra, como as primeiras referências às “armas cibernéticas”. Um comentário feito por Tom Luona em 1976, descrevendo a “guerra cibernética” como “uma luta entre sistemas de tomadas de decisão”, torna-o o primeiro a mencionar “guerra cibernética” (Douglas Dearth “Implications, Characteristics and Impact of Informations Warfare”). Através de pesquisa independente, em 1990, Shen Weiguang, um jovem estudioso chinês, com mais de dez anos no serviço militar ativo, publicou um trabalho denominado “Information Warfare”, o qual pode ser considerado, provavelmente, a mais antiga monografia sobre “guerra cibernética”. No bojo de sua Terceira Onda, em um outro “best-seller” intitulado “Power Shift”, Tofler conferiu à “guerra cibernética” um caráter global, enquanto que a 2ª Guerra no Golfo, ocorrendo em paralelo, tornou-se a propaganda perfeita para esta nova concepção de combate. À época, a discussão em torno do tema “guerra cibernética” tornou-se um modismo. No entanto, o que se pode constatar é que a complexidade inerente à utilização de conceitos genéricos ou abstratos indica não ser esta, ainda, a forma de resolver o problema. Por exemplo, a expressão “alta-tecnologia alta-tecnologia”, surgiu nos Estados Unidos no âmbito da arquitetura, com um significado um tanto vago. O que é alta-tecnologia? A que ela se refere? Sob o ponto de vista da lógica, o termo “alta” é relativo e, portanto, impreciso, por depender de uma avaliação por vezes subjetiva. Este aspecto, por si só, não o credencia para designar um fenômeno como a guerra, cujo próprio dinamismo já se Historical Evolution of Military Technology, Liu Jifeng, University of Science and Technology for National Defense Publishing House, 1992, pp172-173). constitui num considerável problema, que é inerente às tecnologias passíveis de evolução, qual seja, a fixação de um conceito no tempo. A dinâmica das inovações gera um difícil processo de classificação e reclassificação sucessivas do que poderia ser enquadrado como “alta-tecnologia”. De mesma forma, fica difícil a distinção entre o que é mais, ou menos novo, além da necessidade do estabelecimento do referencial para esta determinação. Deve-se considerar, também, que cada tecnologia por si mesma, possui aspectos e parâmetros de desenvolvimento próprios, o que significa dizer, que cada uma tem os seus próprios limites temporais, e em decorrência, comparar tecnologias diferentes é um processo extremamente relativo. Por exemplo: o tanque M-60, o helicóptero AH-1 “Cobra”, e o bombardeiro B-52, armamentos oriundos dos anos 60 e 70, são considerados de “baixa-tecnologia baixa-tecnologia” se comparados ao tanque M1A1 “Abrams”, ao helicóptero AH-64 “Apache”, ao caça “invisível” F-117, ou aos mísseis “Patriot” e “Tomahawk”. Porém, estes últimos também seriam de “baixa-tecnologia baixa-tecnologia” se comparados ao bombardeiro B-2, ao caça F-22, ao helicóptero RAH-64 “Comanche”, ou ao sistema de radar combinado de vigilância e ataque “J-Star”. Pode-se dizer que o conceito de alta-tecnologia é como a título de “miss”, concedido periodicamente determinadas a jovens, em diversos pontos do mundo, e que tal título, inevitavelmente, será transferido para outras jovens algum tempo depois. Porem as jovens, mesmo tendo passado o cetro da beleza, guardam para si a faixa de misse referente ao ano em que foram eleitas0. Portanto, no processo dinâmico que caracteriza a guerra, cada arma pode passar da condição de ponta para a condição de obsoleta, a qualquer momento e em qualquer lugar. E como, independentemente de local, a marcha do tempo não se deterá, nenhuma arma poderá ocupar, por muito tempo, o trono da “altaaltatecnologia”. tecnologia Aceitando-se essa premissa como verdadeira, a que tipo de tecnologia a designação “guerra guerra de alta-tecnologia” alta-tecnologia poderia se referir? Desta forma, a expressão “alta-tecnologia alta-tecnologia” não poderia ser considerada como um rótulo para a um tipo de guerra do futuro, assim como qualquer expressão 0 [N.T.] A metáfora empregada neste parágrafo pelo tradutor é diferente da empregada pelo autor, e na adaptação procurou-se ser o mais fiel possível a idéia do autor. A mera tradução literal cultura. não teria um significado preciso em nossa derivada de “tecnologia tecnologia cibernética” cibernética — uma das formas de alta-tecnologia da atualidade, ocupando uma posição de destaque no projeto de todos os sistemas de armas atuais. Mesmo considerando que numa guerra do futuro, todos os sistemas de armas incorporem componentes derivados da tecnologia cibernética, ainda assim não poderíamos rotular tal guerra como “guerra cibernética”. Com relação à definição de guerra cibernética até os dias de hoje (1999) ainda não há um consenso. De acordo com a definição adotada pelo Departamento de Defesa dos EUA— “são as ações tomadas para interferir com a capacidade cibernética de um inimigo compreendendo o processamento de informações, os sistemas de informações, as redes de computadores, visando obter a superioridade cibernética sobre o inimigo, ao mesmo tempo em que visam, também, à proteção das nossas informações, sistemas associados e redes de computadores". “De acordo com o manual do Exército norte-americano FM-106, o entendimento do Departamento de Defesa relativo à guerra cibernética enfoca os efeitos da cibernética no âmbito dos conflitos atuais, ao passo que o entendimento do Exército é de a cibernética já permeia todos os aspectos, desde a situação de paz até a situação de uma ação militar numa guerra global” (Military Science Publishing House, tradução chinesa, pp. 24-25). George Stein, um professor da Universidade da Força Aérea dos EUA, propõe a definição a seguir para “guerra cibernética”: “Num sentido genérico, a guerra cibernética compreende ações que utilizam a informação para a consecução dos objetivos nacionais.”, e esta definição reflete uma opinião de alguma forma mais ampla que a do Exército. Em artigo na edição do verão 1997 do periódico “Joint Forces Quarterly,” o Coronel Brian Fredericks propôs que: “a ‘guerra cibernética’ é um assunto em nível nacional, que está além da abrangência da defesa nacional, e provavelmente, esta seja a descrição mais precisa de ‘guerra cibernética’ num sentido amplo”. Na melhor das computadorizada”0, hipóteses, poderíamos considerar a designação “guerra e essa consideração deve-se ao fato de que, a despeito da importância da tecnologia cibernética, ela não consegue suplantar todas as funções e atribuições de cada tecnologia de per si. Por exemplo, uma aeronave F-22, que incorpora de forma predominante, dispositivos e sistemas de tecnologia cibernética, não deixa de ser um caça, da mesma forma o míssil “Tomahawk”, que apesar de toda a sua sofisticação, incorporando da mesma forma sistemas de tecnologia cibernética, ainda é um míssil, e não é possível reuni-los sob um só conceito de armas, como, por exemplo — armas cibernéticas — assim como não se poderia designar a guerra que os emprega como sendo uma “guerra cibernética”. 0 A guerra computadorizada num sentido genérico e a guerra cibernética num sentido mais restrito, são conceitos completamente diferentes, o primeiro referindose às ações que são aprimoradas e acompanhadas pela tecnologia cibernética, e o segundo, de uma forma resumida, referindo-se às ações de na qual a tecnologia cibernética é utilizada para obter, explorar, negar e proteger a informação. Contrariando a tendência de uma abordagem cada vez mais genérica dos conceitos relativos à “guerra cibernética”, alguns oficiais mais jovens nas forças armadas dos EUA questionam, cada vez mais, o conceito de “guerra cibernética”. O Tenente-Coronel da Força Aérea James Rogers frisa que “a ‘guerra cibernética’, na realidade, não é uma novidade... ...queira ou não, aqueles que afirmam que as técnicas e estratégias associadas à ‘guerra cibernética,’ inevitavelmente, substituirão a guerra com armas , estão com uma autoconfiança um pouco exagerada.” (revista U.S. Marines, abril, 1997). O Capitão-Tenente da Marinha Robert Guerli propôs que “as sete áreas de mal entendimento com relação à ‘guerra cibernética’ são: (1) o uso excessivo de métodos análogos; (2) o exagero na ameaça; (3) superestimar a própria força; (4) a relevância histórica e a precisão; (5) evitar a crítica relativa a tentativas anômalas; (6) conjecturas completamente infundadas; e (7) definições não padronizadas.” (revista U.S. Events, edição de Setembro de 1997). O major da Força Aérea Yulin Whitehead escreveu na edição de outono de 1997 da revista Air Power Journal que a cibernética não à a toda poderosa, e que as “armas cibernéticas” não são “armas mágicas”. Os questionamentos quanto à guerra cibernética não se restringem a opiniões de caráter pessoal, na medida em que um documento oficial da Força Aérea dos EUA intitulado “The Foundations of Information Warfare” apresenta uma estrita diferença entre a “guerra na era da cibernética” e a “guerra cibernética.” Este documento atesta que a “guerra na era da cibernética” e a guerra em que se empregam armas computadorizadas, tais como o emprego de um míssil de cruzeiro para atacar um alvo, enquanto que a “guerra cibernética” trata a informação como uma ambiência independente e uma arma poderosa. De forma semelhante, conhecidos estudiosos também emitiram suas opiniões. O professor Eliot Cohen da Universidade John Hopkins nos relembra que “assim como a arma nuclear não resultou na eliminação das forças convencionais, a revolução cibernética, não eliminará as táticas de guerrilha, o terrorismo, ou as armas de destruição em massa”. Adicionalmente, a cibernética tornou-se um mito contemporâneo, gerando a crença de que ela é a única tecnologia em desenvolvimento, e que as demais já encontraram o seu ocaso. Este tipo de mito pode engordar a conta bancária de Bill Gates, porém, não pode alterar o fato de que o desenvolvimento da tecnologia cibernética também se apóia no desenvolvimento de outras tecnologias, assim como o desenvolvimento da tecnologia de materiais relacionados constitui um limitador direto dos avanços da tecnologia cibernética. Por exemplo, o desenvolvimento da biotecnologia é um fator determinante do destino da tecnologia cibernética. Sistemas macromoleculares projetados e produzidos usando a biotecnologia constituem a fonte de materiais para componentes eletrônicos da mais alta-tecnologia. Por exemplo, computadores utilizando moléculas de proteína têm capacidade de processamento e memória centenas de milhões de vezes maiores que os computadores de tecnologia atual. (New Military Perspectives for the Next Century, Military Science Publishing House, Edição de 1997, pp142-145). Para que possamos avaliar a complexidade, atual e futura, de se rotular guerras, podemos fazer uma pequena suposição, usando a biotecnologia como um exemplo: Se usarmos armas biotecnológicas equipadas com sistemas de orientação cibernéticos, como se poderiam designar as ações de guerra relacionada à utilização dessas armas: guerra biotecnológica, guerra cibernética, ou guerra digital? Ainda que ninguém esteja capacitado a responder esta questão, de uma forma sumária, este é um cenário perfeitamente passível de ocorrer. De fato, em termos básicos, não há uma necessidade das pessoas se preocuparem quanto à questão atual da tecnologia cibernética crescer de maneira forte e descontrolada, devido a sua característica de ser uma síntese de outras tecnologias. Desde o seu aparecimento, e cada passo do seu desenvolvimento, sempre foi um processo de mesclagem com outras tecnologias, tendo se tornado parte integrante das mesmas e vice e versa. E esta síntese tornou-se a característica mais fundamental da era da integração tecnológica e da globalização, e naturalmente, assim como um selo identificador de uma peça de aço, esta característica de integração tecnológica deixará suas impressões em cada sistema de armas moderno. Ao discorrermos sobre as dificuldades atuais, para se rotular a guerra a partir de armas específicas, não estamos negando a possibilidade de que em guerras futuras, determinadas armas possam exercer um papel preponderante, e até mesmo decisivo, ocupando, assim, uma posição de prestígio incontestável. O que afirmamos, é que esta posição de liderança não será mais ocupada de forma isolada e permanente, ou, em outras palavras, não há tecnologia que possa, de forma independente, rotular uma guerra moderna. DOIS PENSAMENTOS DOUTRINÁRIOS — “GUERREAR COM AS ARMAS EXISTENTES OU ARMAS ESPECÍFICAS PARA GUERREAR” Esses dois pensamentos marcam, de forma clara, a linha divisória entre a guerra tradicional e a guerra do futuro, e dão o contorno do relacionamento entre as armas e a tática, nestas duas modalidades temporais de guerra. O primeiro pensamento reflete a adaptação passiva ou involuntária do homem ao armamento e à tática, no âmbito de uma guerra, enquanto que a segunda, sugere uma opção livre, ativa e consciente. GUERREAR COM AS ARMAS EXISTENTES Historicamente, uma regra geral não escrita tem sido a maior adesão ao pensamento “guerrear guerrear com as armas existentes”. existentes Na maioria dos casos, verificouse que somente após o desenvolvimento das armas é que se criaram as táticas para o seu emprego, e assim, o desenvolvimento das armas sempre teve um efeito condicionador na evolução das táticas. Coma as armas aparecendo em primeiro lugar, sendo então acompanhadas pela evolução tática, vemos que a evolução das armas teve um efeito decisivo sobre a evolução da tática. Na evolução das armas é evidente que a tecnologia e a idade são fatores significativos, mas não há como negar a relação linear pela qual, a motivação dos especialistas em armamentos, no desenvolvimento de novas gerações de armas seja, apenas, a busca de um desempenho melhor e mais avançado, sem considerar qualquer outro aspecto. Possivelmente, seja esse o motivo para que a revolução nas armas, invariavelmente, preceda as revoluções nos assuntos militares. A SINERGIA ENTRE DIFERENTES GERAÇÕES DE ARMAS Embora o pensamento de “guerrear guerrear com as armas existentes” existentes tenha uma natureza essencialmente negativa, por refletir em espécie de impotência, não podemos nos esquecer do significado positivo deste pensamento nos dias de hoje. Este significado positivo é a busca da melhor tática para o armamento que se tem, ou em outras palavras, buscar o melhor modo de combate representado pelo melhor casamento com as armas existentes, e desta forma, fazer com que as armas que se tem tenham o seu desempenho máximo. Atualmente, aqueles que estão envolvidos em guerras, já evoluíram, consciente ou inconscientemente, de uma visão negativa do pensamento de “guerrear guerrear com as armas existentes”, existentes para a sua atual visão positiva. No entanto, ainda existem aqueles que acreditam que esta seja uma alternativa exclusiva de países considerados atrasados devido à sua impotência, sem levar em conta de que os EUA, a maior potência no mundo, também enfrenta este tipo de impotência. Mesmo sendo o país mais rico do mundo, os EUA não conseguem arcar com o emprego exclusivo, do seu arsenal de ponta, utilizando e adaptando, também, o seu armamento já obsoleto, de acordo com as necessidades das guerras atuais0. O que diferencia, no caso do EUA, é a sua maior capacidade para a seleção do casamento ideal entre o armamento moderno e o antigo. A prática de mesclar o armamento novo com o antigo, se resultar em um perfeito casamento com a tática, além de eliminar as deficiências originadas por uma excessiva uniformidade do armamento, pode atuar como um fator multiplicador da 0 Mesmo na Guerra do Golfo, que foi considerada um campo de testes para os novos armamentos, verificou-se que um grande número de armas e munições consideradas antigas e convencionais, teve um emprego importante. (Para maiores detalhes ver “The Gulf War U.S. Department of Defense Final Report to Congress Appendix”). sua eficácia. A título de exemplo, o bombardeiro B-52, que de acordo com muitas previsões já deveria ter sido desativado, teve o seu emprego operativo revigorado, após ser adaptado para o lançamento de mísseis de cruzeiro e de armas de precisão. O avião ataque A-10, após a incorporação de mísseis com sistemas de orientação infravermelha, passou a dispor da capacidade para realizar operações noturnas, (capacidade inexistente em sua versão original). O seu emprego com o helicóptero “Apache” além de formou um eficiente binômio de ataque, passando a ser uma importante plataforma de combate, apesar de projetada nos anos 70. Desta forma, o pensamento de “guerrear guerrear com as armas existentes” existentes não constitui, de forma alguma, uma atitude de passividade ou de inação. Na atualidade, mais do que em qualquer era no passado, o crescente mercado de armamentos, e os seus múltiplos canais de suprimento, têm proporcionado um variado leque de opções, para a seleção de armamentos, e a coexistência de várias gerações de diversos sistemas de armas, tem proporcionado uma base mais ampla e funcional para a realização de hibridismos entre gerações de armamentos. Assim sendo, a única necessidade real é a do rompimento com a mentalidade de que as gerações de armas, seus empregos e combinações são parâmetros fixos no tempo, adquirindose, assim, a capacidade de transformar sistemas tidos como ultrapassados em algo significativo. Se confiarmos apenas em armamentos avançados, para engajar numa guerra moderna, assumindo uma convicção cega com relação a sua eficácia, podemos nos deparar com a transformação daquilo que era miraculoso em algo inútil. Estamos vivendo numa era em que um salto revolucionário está ocorrendo no âmbito dos armamentos, passando dos sistemas baseados no poder da pólvora para aqueles baseados no poder da informação, e este salto pode demandar um longo período de maturação, situação em que ocorrerão alternâncias entre sistemas de armas. Na atualidade, não temos como prever qual será a duração deste período de transição, o que temos certeza é que, enquanto durarem essas alternâncias, o pensamento de se “guerrear guerrear em função das armas” armas será a abordagem básica para qualquer país, incluindo os EUA e seu arsenal de ponta. ARMAS ESPECÍFICAS PARA GUERREAR No relacionamento entre as armas e a guerra, deve-se sempre enfatizar — que um fato, por mais básico que seja na atualidade, não é necessariamente uma verdade no futuro. Iniciativas intempestivas, tomadas sob condições adversas, podem constituir linhas de ação aceitáveis para um determinado período, mas de forma alguma podem ser tomadas como regra. O progresso científico há muito, passou de um processo passivo de descoberta para o de uma ação ativa de invenção, e quando os norte-americanos propuseram a concepção doutrinária de “armas armas específicas para guerrear” guerrear deflagraram a maior mudança singular no relacionamento entre armas e táticas, desde o advento da guerra. Nesta nova linha de pensamento, primeiro determina-se o modo de combater, e em decorrência, desenvolve-se o armamento, e o primeiro passo dado pelos norteamericanos foi o desenvolvimento do conceito de “Air-Land Battle” em 1982. Daquele conceito, as atuais concepções de “Teatro Informatizado” e “Unidades Informatizadas”, (que têm gerado muita controvérsia), constituem seu estágio mais avançado. Partindo do conceito de “Air-Land Battle” o processo de desenvolvimento de armamentos empregado pelos militares norte-americanos pode ser dividido, basicamente, em 5 estágios: especificação de requisitos; esboço de projeto; avaliação da concepção; desenvolvimento técnico e produção; e dotação das unidades. O desenvolvimento relativo às unidades informatizadas segue o mesmo padrão. (U.S. Army Times, Out 1995). Em Março de 1997, o Exército Americano realizou um exercício de combate ao nível de brigada, testando um total de 58 tipos de equipamentos digitais. (U.S. Army Times, 31 March, 7 April, 28 April 1997). Segundo John E. Wilson, Comandante do U.S. Army’s Material Command, sua missão é a de colaborar com o Training and Doctrine Command, na idealização e desenvolvimento de novos equipamentos, com tecnologias avançadas e que atendam as suas necessidades. (U.S. Army magazine, October 1997). Esta nova abordagem é uma indicação de que a condição dos armamentos, como precursores das revoluções em assuntos militares, foi abalada. Agora, a definição tática vem em primeiro lugar, e dela decorrem as armas, e na seqüência, uma promove a outra, num processo de desenvolvimento baseado numa realimentação, que se tornou a nova forma de relacionamento entre armas e tática. Sistemas de armas, isoladamente, já provocaram mudanças que marcaram época, mas na atualidade, no desenvolvimento de um sistema de armas considera-se, além da melhoria no desempenho, a sua capacidade de integração e compatibilidade com outros sistemas de armas já existentes, evitando casos como o da aeronave F-111, que ao ser desenvolvida representava um modelo único de aeronave, cujo avanço tecnológico a tornava incompatível com qualquer outro sistema de armas existente, restrição essa que acabou por antecipar a sua retirada de serviço. Esta lição foi aprendida, e a idéia de se basear no desenvolvimento de sistemas de armas tecnologicamente estanques e que poderiam isoladamente derrotar um inimigo já está ultrapassada. O pensamento de se “armas armas específicas para guerrear” guerrear é uma abordagem que possui as características da era atual, da prática e da pesquisa laboratorial, não significando, apenas, uma opção que privilegie a inventiva ou a inovação, mas também, a ação de se copiar e alterar eventos, com base em princípios fundamentais. Adicionalmente, além de ser um avanço na história da preparação para a guerra, este pensamento incorpora, também, um potencial de crise na guerra moderna: configurar armamentos sob medida, para executar táticas que ainda estão sendo desenvolvidas, é como se preparar um banquete sem saber quem são os convidados, uma situação em que um pequeno erro pode gerar um grande desvio do objetivo. Neste sentido, pode-se citar o desastroso desempenho de forças de elite norteamericanas na Somália, quando se defrontaram com as milícias de rua de Hussein Mohammed Aidid. Do que ocorreu naquele confronto podemos concluir que a mais moderna força militar do mundo não teve a habilidade para controlar o clamor público, e, muito menos, para lidar com um inimigo que empreendia ações não convencionais. Decorre deste fato a possibilidade de, num teatro de operações do futuro, forças informatizadas encontre-se na situação de um “chef de cousine”, excelente no preparo de lagostas, mas diante da guerrilha, — um freguês que come “arroz com feijão”0 — não tenha alternativa, que não seja a de suspirar em desespero. O hiato entre gerações de armamentos0 e de forças militares constitui um tema que talvez exija uma atenção especial. Quanto menor for o hiato no desenvolvimento tecnológico, entre forças oponentes em um teatro, maiores serão as probabilidades de sucesso para a força mais sofisticada; na medida em que o hiato se expande, mais difícil fica a interação entre as forças oponentes, chegando0 [N.T.] A tradução não foi feita de forma literal, visando o emprego de uma imagem brasileira que resguardasse a idéia original que o autor pretendeu dar na versão em inglês. 0 Slipchenko, Chefe do Departamento de Pesquisa Científica da Academia de Estado-Maior da Rússia, acredita que tanto a guerra, quanto os armamentos já passaram por cinco eras, e que agora estamos indo para a sexta era. (Zhu Xiaoli, Zhao Xiaozhuo, “The New U.S. and Russian Military Revolution”, Military Science Publishing House, Edição de 1996, p6). se a ponto de nenhuma ser capaz de eliminar a outra. Examinando exemplos específicos de batalhas passadas, verifica-se a dificuldade que tiveram as tropas de alta-tecnologia para lidar com a guerra não convencional ou de tecnologia rudimentar, e neste sentido, talvez, até exista um paradoxo, mas pelo menos é um fenômeno interessante, e que vale a pena ser estudado. A edição nº. 11 de 1998 do “Journal of the National Defense University” traz um artigo sobre a entrevista concedida por Philip Odeen, Chefe do ‘U.S. National Defense Panel’ a Chen Bojiang, na qual Odeen cita a expressão “guerra assimétrica” diversas vezes, acreditando-a como sendo a nova ameaça aos Estados Unidos. Antulio Echeverria publicou um artigo na revista “Parameters” no qual ele propõe que “na era pós-industrial, aquilo com o que será mais difícil de lidar será guerra do povo”. ARMAS DE EMPREGO NEOCONCEPCIONAL E ARMAS NEOCONCEPCIONAIS Se comparadas às “armas armas de emprego neoconcepcional”, neoconcepcional todas as armas que conhecemos podem ser consideradas antiquadas, pelo fato de suas características básicas de emprego ainda serem: mobilidade e poder letal. Até mesmo as atuais bombas inteligentes (dotadas de sistemas de planeio e de guiagem de precisão) e outras armas semelhantes ditas de “alta-tecnologia”, não acrescentaram inovações concepcionais, ou seja, apenas os seus elementos de arquitetura estrutural e de inteligência foram inovados ou aprimorados. Sob a perspectiva de emprego, nenhuma mudança na configuração externa destas armas alterou o fato de serem armas tradicionais, ou seja, de serem usadas e controladas por soldados profissionais em teatros específicos. Nenhuma dessas armas, ou suas respectivas plataformas, desenvolvidas segundo a linha de pensamento tradicional, está em condições de evoluir visando à sua adaptação às guerras futuras. O desejo de se usar o poder mágico da alta-tecnologia como num processo de alquimia, para que pudéssemos refazer completamente os armamentos, caiu na chamada armadilha da alta-tecnologia, resultando num infindável desperdício de recursos limitados e numa corrida armamentista. E este é o paradoxo que, inevitavelmente, deve ser encarado no processo de desenvolvimento do armamento tradicional. A ARMADILHA DA ALTA-TECNOLOGIA Para assegurar a liderança no campo dos armamentos, é necessário que seja previsto o crescimento dos custos de desenvolvimento; o resultado da contínua elevação no investimento é que nenhum país tem recursos suficientes para manter-se na liderança. O resultado final deste processo é que as armas idealizadas para defender o país poderão ser as causas de sua falência. Neste sentido, exemplos recentes são os mais convincentes. A URSS NA ARMADILHA DA ALTA-TECNOLOGIA Na antiga URSS, na ambiência da corrida armamentista da era nuclear, o Marechal Nikolai Orgakov, então Chefe do Estado-Maior do Exército Soviético, adotando uma visão prospectiva, relativa ao desenvolvimento de armamentos na era nuclear, programou o que seria uma revolução em assuntos militares. A adoção desse projeto demandou o redirecionamento de recursos, já escassos, para este propósito, e ao contrário dos benefícios vislumbrados, contribuiu significativamente para a derrocada e o colapso do seu país. Orgakov prevendo que o desenvolvimento de tecnologia não-nuclear iria causar uma nova revolução no campo militar iniciou o desenvolvimento da incorporação da tecnologia cibernética aos sistemas de armas enfocando a aquisição de alvos de guiagem de precisão. A presunção era a de que um Exército equipado com esta tecnologia — a qual ainda estava em seus estágios iniciais de desenvolvimento — estaria em condições de produzir armas com capacidade destrutiva consideravelmente maior do que as armas nucleares. No entanto, a antevisão de Orgakov, com relação a uma revolução nos assuntos militares foi por terra devido a problemas estruturais. “Se no processo de manutenção de uma revolução em assuntos militares a um custo elevado, um país exceder os limites do que pode ser gerado pelas condições de seus sistemas e material, e mesmo assim manter-se engajado numa disputa pelo poder militar com os seus oponentes, o único resultado possível é que este país irá cair numa posição secundária com relação à disponibilidade de forças militares que poderá empregar. Esta foi a sina da Rússia, tanto na era czarista, quanto na era soviética. A União Soviética assumiu uma carga militar difícil de suportar e os militares não estavam dispostos a aceitar a necessidade de uma nova redução estratégica.” (Steven Blank, “Preparing for the Next War: Some Views on the Revolution in Military Affairs”, Strategic Review, primavera 1996). Desta forma, corroborando com o paradoxo do desenvolvimento bélico, a implementação da concepção de Orgakov, inicialmente vista por seus pares como um ajuste no ritmo de crescimento militar, provocou um incremento da corrida armamentista, fato este que, fugindo a qualquer previsão, iria redundar na ruptura da União Soviética e sua completa eliminação na disputa entre as superpotências. Um poderoso império entrava em colapso, sem que um único disparo tivesse sido feito, confirmando os versos do famoso poema de Kipling: “Quando um império sucumbe, ele não o faz com um estrondo, mas em silêncio”. OS EUA NA ARMADILHA DA ALTA-TECNOLOGIA No entanto, este fato parece não ser uma verdade somente para a antiga União Soviética. Atualmente, os EUA parecem estar seguindo os mesmos passos de seu antigo adversário, apresentando novas evidencias da validade do paradoxo do desenvolvimento bélico. Na medida em que a integração tecnológica alcança uma dimensão cada vez maior, os EUA investem, cada vez mais, no decorrente desenvolvimento de armas, há um custo, em termos absolutos, cada vez mais elevado. O desenvolvimento do F-14 e do F-15, que nos anos 60 e 70 custou um bilhão de dólares, enquanto que o desenvolvimento do B-2 nos anos 80 custou cerca de dez bilhões de dólares, e o desenvolvimento do F-22 nos anos 90 excedeu a cifra dos 20 bilhões de dólares. Se estabelecermos uma relação matemática entre o peso do B-20 (≈ 71.688 Kg) e o seu custo (considerado a aeronave em operação mais cara jamais produzida), conclui-se que ele corresponde a três vezes o seu peso em ouro0 (ouro = US$30,00/grama) , e o arsenal norte-americano está repleto de outros sistemas de armas tão caros quanto o B-2, como é o caso do F-117-A, do F-22 e do helicóptero RAH-64 “Comanche”. O preço de cada um destes sistemas de armas excede US$ 100 milhões, e este investimento, tem imposto uma carga cada vez mais pesada ao orçamento norte-americano, levando os EUA, passo a passo, na direção da armadilha da alta-tecnologia0, onde investimentos geram desenvolvimentos tecnológicos que descortinam horizontes para novos investimentos. Se este fato é 0 Em 1981, a Força Aérea americana estimou que poderia produzir 132 aeronaves B-2 com um investimento de 22 bilhões de dólares. No entanto, oito anos após, com este montante de capital só havia conseguido produzir uma unidade de B-2. Tendo-se por base o seu valor por unidade de peso, o B-2 vale três vezes o seu peso em ouro. (Ver Modern Military Technology, Nº 8, 1998, p33; e “Analysis of U.S. Stealth Technology Policy” por Zhu Zhihao) 0 O Departamento de Defesa dos EUA analisou o ataque aéreo realizado em 13 de janeiro de 1993 sobre o Iraque, e considera que existam inúmeras limitações ás armas de alta-tecnologia, e que a eficácia das bombas de efeito combinado, em alguns casos, foi superior à das bombas de precisão. (Aviation Week and Space Technology, 25 de Janeiro de 1993). 0 [N.T.] Devido aos gastos militares com a Guerra do Iraque (2003) os EUA enfrentam, na atualidade, o maior déficit orçamentário de sua história. real para um país rico e determinado como os EUA, até onde poderão ir os demais países, com limitados recursos financeiros? ARMAS DE EMPREGO NEOCONCEPCIONAL Obviamente, será difícil, para qualquer outro país manter-se nesse dispendioso processo, e a via para se libertar desse caminho tem sido o desenvolvimento de uma nova abordagem, dando origem ao conceito de “armas armas de emprego neoconcepcional”. neoconcepcional No entanto, até mesmo nesta vertente, considerada como a alternativa dos países com recursos limitados, aparentemente, são os EUA que está na liderança. Na Guerra do Vietnã, por exemplo, a pulverização da região da “Trilha Ho Chi Min” com iodeto de prata, resultando em chuvas torrenciais, e o emprego de agentes desfolhantes sobre as florestas subtropicais, colocaram os “diabólicos norteamericanos”0 na liderança isolada, tanto em relação ao método, quanto à forma impiedosa de emprego dessas armas neoconcepcionais. E atualmente, 30 anos após, com a dupla vantagem de dispor de recursos e tecnologia, ninguém consegue superá-los nesta área. As armas de emprego neoconcepcional incluem, basicamente, as armas de energia-cinética, armas de ação energética, armas subsônicas, armas geofísicas, armas meteorológicas, armas de energia solar, armas genéticas, armas de energia cinética, armas de energia dirigida, armas subsônicas, armas geofísicas, armas meteorológicas, armas de energia solar, armas genéticas, etc. (“New Military Perspectives for the next Century”, Military Science Publishing House, Ed de 1999, p3). ARMAS NEOCONCEPCIONAIS Apesar de tudo, os norte-americanos não detêm a liderança isolada em tudo. As “armas armas neoconcepcionais” armas neoconcepcionais que sucedem e decorrem do desenvolvimento de “armas de emprego neoconcepcional”, neoconcepcional conferem uma maior abrangência ao conceito de armas. Contudo é justamente neste campo onde os norte-americanos não têm tido muito sucesso. O desenvolvimento de “armas armas neoconcepcionais” neoconcepcionais não depende, apenas, do aporte de recursos e de novas tecnologias, e sim, de um raciocínio abstrato, lúcido e perspicaz, não sendo este o ponto forte dos norte-americanos, cujo raciocínio é condicionado e circunscrito à metodologia tecnológica. 0 Tanto as aspas, quanto a expressão, foram originalmente colocadas pelo autor no texto original. É inegável o fato de alguns fenômenos, que atualmente podem ser induzidos pelo homem, podem ser classificado como “armas de emprego neoconcepcional”, e que estas apresentam enormes diferenças em relação aos artefatos que formalmente designamos como “armas”; mesmo assim, continuam sendo “armas”, cujos propósitos imediatos são o de matar e destruir, estando ainda relacionadas aos assuntos militares, como estão os soldados e diferentes tipos de munição. Desta forma, não constituem nada além do que armas dotadas de características e mecanismos não-tradicionais e cujos poderes de destruição foram ampliados muitas vezes. No entanto o conceito de “arma arma neoconcepcional” neoconcepcional é diferente, sendo completamente distinto do que denominamos “ama ama de emprego neoconcepcional.” neoconcepcional Na medida em que podemos dizer que as “armas armas de emprego neoconcepcional” neoconcepcional transcendem o conceito tradicional de armas, por poderem ser controladas e manipuladas em um nível tecnológico, sendo capazes de infligir danos tanto materiais, quanto psicológicos, tais sistemas ainda são armas num sentido estrito da palavra. Já as “armas armas neoconcepcionais” neoconcepcionais têm uma perspectiva mais genérica, englobando todos os meios, inclusive aqueles que transcendem a ambiência militar, mas que podem ser empregados em operações de guerra. Na perspectiva de “armas armas neoconcepcionais,” neoconcepcionais qualquer coisa que possa beneficiar o ser humano também pode prejudicá-lo, ou seja, qualquer coisa neste mundo pode ser transformada numa arma, e esta possibilidade requer que o nosso entendimento e percepção, do que vem a ser uma arma, ultrapasse todas as fronteiras. Neste sentido, o desenvolvimento tecnológico, impulsionando o processo de diversificação de armas, proporcionará uma abertura ao nosso raciocínio, permitindo o entendimento e a percepção dessa nova realidade, rompendo de uma vez por todas, o campo de domínio do conceito tradicional das armas. Desta forma, a indução de um colapso de um mercado acionário, a contaminação de uma rede de computadores por um vírus, um rumor ou escândalo que resulte na flutuação do cambio ou, a exposição comprometedora de lideres de um país, constituem ações que podem ser enquadradas como “armas armas neoconcepcionais”. neoconcepcionais As “armas armas neoconcepcionais” neoconcepcionais têm proporcionado uma orientação para o desenvolvimento das “armas armas de emprego neoconcepcional”, neoconcepcional enquanto que estas proporcionam uma forma de materialização das primeiras. Com relação ao continuado desenvolvimento de “armas armas de emprego neoconcepcional”, neoconcepcional é importante assinalar, que a tecnologia já não é mais o fator preponderante, e que o fator comum em relação a estas armas é o caráter inédito da sua concepção de emprego. O que deve ser bem entendido, e de maneira bastante clara, é que o processo de desenvolvimento das “armas armas neoconcepcionais” neoconcepcionais está intimamente ligado à vida comum das pessoas. Com relação às “armas armas neoconcepcionais” neoconcepcionais podemos inferir que: em primeiro lugar elas colocarão a guerra num patamar difícil de ser vislumbrado, tanto por leigos, quanto pelos militares; e em segundo lugar, algo que nos deixa atônitos, que as coisas que considerávamos comuns do dia-a-dia, e que estão ao nosso alcance, podem ser transformadas em armas de guerra. Neste sentido, acreditamos que um dia, as pessoas irão acordar, e surpreender-se com a descoberta de que algumas daquelas coisas que consideravam delicadas e simples começaram a ter características ofensivas e letais. A TENDÊNCIA PARA AS ARMAS SUAVES O PARADOXO DO ARMAMENTO NUCLEAR Antes do advento da bomba atômica, a guerra sempre apresentou uma característica de escassez em relação ao poder de destruição. Os esforços para o aprimoramento das armas sempre foram no sentido de incrementar o seu poder de destruição, e desde o armamento leve, até o armamento pesado, a trajetória do seu desenvolvimento tem sido sempre no sentido de incrementar o seu poder letal. Assim sendo, um desempenho aquém do esperado sempre alimentou, por um longo tempo, uma insaciável sede dos militares por armas que incorporassem uma crescente capacidade de poder letal. Até que um dia, uma singular nuvem vermelha, em forma de cogumelo, ao se formar na região desértica do Novo México EUA, sinalizou que os militares, finalmente, haviam desenvolvido a capacidade para produzir uma arma de destruição em massa, a qual atendia a todas as suas expectativas. Agora, além da capacidade de aniquilar instantânea e completamente um inimigo, poderia continuar matando 100 ou até 1000 vezes mais, depois de seu emprego inicial. Isso conferia à humanidade uma capacidade letal que excedia ao que era demandado, e pela primeira vez na história, havia excesso de poder letal. Princípios filosóficos dão conta de que, sempre que algo atingir o seu ponto máximo, voltar-se-á na direção oposta. Nesse sentido, a invenção do armamento nuclear, esta arma “ultra-letal ultra-letal”0 que pode aniquilar toda a humanidade, colocou a própria humanidade numa espécie de armadilha existencial criada por ela mesma. As armas nucleares tornaram-se a espada de Damócles, pendendo sobre a cabeça da humanidade, forçando-a a ponderar: Será que nós realmente precisamos de armas “ultra-letais ultra-letais”? Qual é a diferença entre matar um inimigo uma vez, e continuar matando-o 100 vezes mais? Qual é o propósito em destruir um inimigo, se isto significar a destruição do mundo? Como podemos evitar uma guerra que resultará na ruína de todos nós? O “equilíbrio do terror” introduzido pela “possibilidade assegurada de destruição mútua” foi a resposta imediata a esses questionamentos, e como uma decorrência, abriu uma via expressa para uma nova abordagem, privilegiando o crescente aprimoramento do controle do poder letal das demais armas, associando a sua eficácia a uma possibilidade aceitável de emprego. A TENDÊNCIA DE HUMANIZAÇÃO CONTEMPORÂNEA Atualmente, qualquer invenção tecnológica de porte tem uma profunda ingerência de aspectos humanísticos. A “Declaração Universal de Direitos do Homem”, sancionada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 1948, e os mais de 50 pactos e acordos relacionados, estabeleceram um conjunto de normas internacionais relativas aos direitos humanos. Por estas normas é reconhecido que o uso de armas de destruição em massa, e em particular, armamentos nucleares, constitui uma séria violação do “direito à vida”, e representa um “crime contra a humanidade”. Aspectos como os direitos humanos e outras novas concepções políticas; a tendência de integração da economia mundial; o entrelaçamento de interesses e 0 A substituição o conceito de “arma ultra-letal” pelo conceito de “arma de destruição em massa” deve-se à necessidade de realçar o fato de que o poder letal destas armas excede as necessidades da guerra, sendo o produto do pensamento extremista do homem. posições políticas, envolvendo as diversas forças políticas e sociais; a concepção da “derradeira preocupação” com a ecologia e meio-ambiente; e em particular a valorização da vida humana; têm influenciado preocupações relativas à matança e à destruição, dando berço a uma nova concepção de guerra e a uma nova ética na condução da guerra. AS ARMAS SUAVES — DE PRECISÃO — NÃO-LETAIS A tendência para as “armas armas suaves” suaves 0 não é nada mais do que um reflexo dessa grande mudança na base da cultura humana, no desenvolvimento e produção de armas. Em decorrência desta tendência, tem havido o desenvolvimento de meios para atacar direta e especificamente um centro nervoso de um inimigo, sem danificar as áreas circundantes. Desta forma têm-se novas opções para obtenção da vitória, gerando a crença de que a melhor forma de se obter a vitória é através de um maior exercício de controle e não através da imposição da morte. Ocorreram mudanças no conceito de guerra e no conceito dos armamentos, e o recurso à matança descontrolada, para forçar o inimigo a uma rendição incondicional, tornou-se uma relíquia de uma era passada. Atualmente, a guerra se distancia das eras de carnificina caracterizadas por campanhas como a de Verdun. O aparecimento das armas de precisão e das armas não-letais tornou-se um ponto de inflexão no desenvolvimento de sistemas de armas, evidenciando, pela primeira vez, que este desenvolvimento se dá numa direção mais “suave” e não numa direção de maior “força”. As armas de precisão podem atingir um alvo específico de forma precisa, reduzindo os danos e vítimas colaterais, da mesma forma que um bisturi a raios gama, pode extrair um tumor com praticamente nenhum sangramento, dando origem assim, ao conceito de “ataques cirúrgicos”0. Desta forma, ações de guerra sem grande envergadura podem proporcionar resultados estratégicos notáveis. Por exemplo, 0 O termo “suave” refere-se ao fato de que estas armas reduzem o grau da matança e o nº de vítimas colaterais. 0 [N.T.] Neste sentido é interessante o comentário de Bernard Shaw (repórter da CNN) ao irradia, diretamente de Bagdá, durante o 1º ataque norte-americano no 2º Conflito do Iraque: “...se isto é um ataque cirúrgico, eu não queria estar nessa mesa de operações...”. através do emprego de um míssil, rastreando o sinal de um telefone celular, os russos conseguiram calar o incomodo e ameaçador discurso de Dudayev de forma permanente, e ao mesmo tempo, eliminar um enorme problema que havia sido desenvolvido pela minúscula Chechenia. As armas não-letais podem eficazmente eliminar a capacidade de combate tanto do pessoal, quanto do armamento, sem a perda de vidas. A edição de Abril de 1993 do periódico britânico “International Defense Review” revelou que os EUA estavam empreendendo intensas pesquisas em uma grande variedade de armamentos não-letais, compreendendo: armas ópticas; armas de microondas de alta energia; armas de raios acústicos; e armas a laser. A edição de 6 de março do periódico “Jane´s Defense Weekly” relata que um comitê de alto nível relacionado a armas não-letais, no âmbito de Departamento de Defesa, já formulou uma política regulando a demanda, o desenvolvimento e o emprego de tais tipos de armas. Além disso, de acordo com as p521-522 da edição de 1997 do “World Military Yearbook” o departamento de Defesa dos EUA formou um grupo pioneiro para pesquisa de armamentos não-letais, cujo propósito é o de providenciar para que as armas não-letais sejam incorporadas, o mais breve possível, no inventário de armamentos. A tendência incorporada nestas armas demonstra que a humanidade está no processo de suplantar seu próprio modo extremado de pensar, começando a aprender a controlar o poder letal de que já dispõe, e cujo excesso cresce continuamente. No bombardeio maciço que durou mais de um mês na Guerra do 0 Golfo, a perda de vidas iraquianas permaneceu na casa dos milhares , um valor muito inferior ao verificado em decorrência do bombardeio de Dresden durante a 2ª Guerra Mundial. As “armas suaves” representam a mais recente opção consciente da humanidade entre as várias opções no campo das armas, à qual, após a introdução de uma nova tecnologia no desenvolvimento da arma, a componente humana é então incorporada, conferindo, desta forma, à guerra, um inédito matiz de clemência. Não obstante, “armas suaves” continuam sendo armas, e o requisito de serem “suaves” não irá reduzir a sua eficácia num campo de batalha. A EFICÁCIA DAS “ARMAS SUAVES” Para neutralizar a capacidade de combate de um tanque, podemos atingi-lo com canhões ou mísseis, ou podemos, através de um feixe laser neutralizá-lo, destruindo os 0 seus equipamentos ópticos ou cegando a sua tripulação. Num Ver “Military Science Publishing House Foreign Military Data”, 26 de Março de 1993; nº 27; p3. campo de batalha, alguém que esteja ferido demanda maior cuidado que outro que esteja morto, e neste sentido, armas não tripuladas, progressivamente, prescindem de blindagem e estruturas de proteção. Certamente, aqueles que se dedicam ao desenvolvimento de “armas armas suaves” suaves já contabilizaram o custo e benefício relativo a estes aspectos. A ocorrência de vítimas pode eliminar a capacidade de combate de um inimigo, levando-o ao pânico e perda da vontade de lutar, e isto pode ser considerado como um meio extremamente válido de se alcançar a vitória. Atualmente, já dispomos de tecnologia suficiente, e podemos desenvolver muitos métodos para causar medo e que são eficazes, tais como o emprego de feixes laser para projetar no céu a imagem de companheiros feridos, o que seria suficiente para amedrontar aqueles soldados impressionáveis. Não existem mais obstáculos para o desenvolvimento destes tipos de armas; só é necessária a adição de alguma imaginação adicional ao elemento técnico. As “armas armas suaves” suaves representam uma derivação das “armas armas neoconcepcionais”, armas cibernéticas” neoconcepcionais enquanto que e as “armas cibernéticas constituem um exemplo proeminente de “arma arma suave”. suave Quer sejam armas de energia eletromagnética, para emprego em “hard-kill”, quer sejam para “soft-kill”, como as “bombas lógicas”0 e os vírus, ou as armas de mídia, todas estas “armas armas suaves” suaves visam impor a paralisação e a deterioração, e não vitimar seres humanos. As “armas armas suaves”, suaves que só poderiam nascer numa era de integração tecnológica, podem constituir a tendência mais promissora no desenvolvimento de armas, e ao mesmo tempo, desvendar formas de guerra e revoluções em assuntos militares, inimagináveis ou imprevisíveis nos dias de hoje. Estas armas representam uma mudança com profundas implicações sobre a história da guerra, constituindo o divisor de águas entre as antigas e as novas formas de guerra. E isto se deve ao fato de sua aparição ter sido suficiente para relegar as guerras das armas frias e quentes à era “antiga”. De qualquer forma, não podemos nos deixar levar por fantasias românticas a respeito de tecnologia, acreditando que a partir de agora a guerra tornar-se-á um confronto semelhante a um jogo eletrônico. Até nas guerras simuladas, realizadas 0 Uma bomba lógica é um programa que foi deliberadamente escrito ou modificado, sem autorização para produzir resultados específicos quando determinadas condições são preenchidas, resultados estes inesperadas ou não autorizados pelo proprietário legal do programa. em complexos informatizados, há que haver como premissa, a capacidade real dos países envolvidos, pois mesmo que se desenvolvam dez planos para uma guerra simulada, ainda assim, não será o suficiente para deter um inimigo real, que seja mais poderoso em termos de força. A guerra ainda é uma arena de vida e morte, uma área de destruição e sobrevivência, que não comporta uma ação cometida de forma inocente. Mesmo que no futuro todas as armas tenham sido completamente humanizadas, uma guerra por mais suave que seja, na qual se evite o derramamento de sangue, ainda será uma guerra. Pode ser que o processo cruel da guerra seja alterado, mas não há como se mudar a sua essência, que por derivar de uma compulsão terá sempre, como uma fatalidade, um final cruel. CAP. 2 — A FACE DO DEUS DA GUERRA TORNOU-SE INDISTINTA “Através de todo o curso da história, a Guerra sempre tem mudado.” André Beaufre O homem, desde o tempo em que caçava animais, até os dias de hoje, em que pratica a matança de sua própria espécie, tem equipado o gigantesco monstro da guerra para entrar em ação, e o desejo de atingir objetivos diversos têm mantido os militares envolvidos em conflitos sangrentos. Tem sido universalmente aceito, por milhares de anos, que a guerra é um assunto restrito aos militares e que os três elementos básicos de hardware da guerra são: o soldado, o armamento e o campo de batalha. E permeando estes três elementos o quarto elemento básico de software, o propósito. Até agora, não se havia questionado que estes constituíam os elementos básicos da guerra. No entanto, os problemas começam a surgir, quando se descobre que aqueles elementos básicos, aparentemente inflexíveis e perenes, começaram a mudar de tal forma, que chegará o dia em que será impossível fixá-los de forma efetiva. Quando este dia chegar, será que ainda conseguiremos distinguir a face do deus da guerra? POR QUE E POR QUEM LUTAR? OS PROPÓSITOS CLAROS DAS GUERRAS ATÉ A ERA MODERNA Na Grécia antiga, se o épico de Homero for realmente verdadeiro, o propósito da Guerra de Tróia era claro e simples: valia a pena empreender uma luta de dez anos, pela bela Helena. As guerras empreendidas por nossos ancestrais eram relativamente simples em termos de propósitos e objetivos, e discorrer sobre eles não é muito difícil; isto se deve ao fato de que nossos ancestrais tinham horizontes e áreas de atuação limitadas, necessidades de subsistência modestas, e suas armas não eram suficientemente letais. Somente quando algo não podia ser obtido por meios normais, é que os nossos ancestrais recorriam a medidas extraordinárias, e neste caso, sem a menor hesitação. Foi neste sentido, que Clausewitz estabeleceu o seu famoso adágio, o qual se tornou uma profissão de fé para gerações de militares e estadistas: “A guerra é a continuação da política...”. Nossos ancestrais talvez lutassem pelo status ortodoxo de uma seita religiosa, ou por um espaço de terra pleno de água e de pastagem. Pode-se dizer que eles não teriam, inclusive, escrúpulos de ir para guerra, por exemplo, por causa de especiarias, bebidas ou um caso de amor entre um rei e uma rainha. As páginas da história estão repletas de eventos desta natureza, e constituem fatos em relação aos quais não sabemos se devemos rir ou chorar. É o caso, por exemplo, das Guerras do Ópio, travadas entre o Império Britânico e a Dinastia Quing (ou Dinastia Manchu) no século XIX, em torno do que pode ser considerado na história, o maior comércio de drogas patrocinado por um Estado. Portanto, em épocas anteriores às atuais, só havia um tipo de guerra no que tange ao tipo de motivação e ações subseqüentes. A Guerra do Ópio, também conhecida como a Guerra Anglo-Chinesa, é considerada a derrota mais humilhante sofrida pela China em toda a sua história. Em resumo, nas primeiras décadas do século XIX a Inglaterra praticava intensamente o tráfico de ópio, o qual era produzido na Índia e comercializado para a China na cidade de Canton (Guangzhou) em troca de chá e bens manufaturados. Este tráfico de ópio produziu milhares de viciados em toda a China, com conseqüências devastadoras para o país, sendo que e as autoridades chinesas em Canton eram subornadas pelos ingleses para que facilitassem a entrada da droga. Em face disso, o Governo Chinês tornou o tráfico de ópio ilegal em 1836, iniciando uma intensa política de repressão a essa atividade, e já em 1839, toda a atividade dos traficantes fora sensivelmente reduzida. Não obstante, desentendimentos entre os governos chinês e inglês com relação ao tratamento dado aos comerciantes ingleses envolvidos no tráfico de ópio precipitou uma crise e em decorrência a guerra entre os dois países. A 1ª Guerra do Ópio ocorreu entre 1839 e 1842. Em 24 de agosto de 1842 foi assinado o tratado de Nanking, pelo qual a China cedeu Hong-Kong para os ingleses; abriu o comércio através dos portos de Canton, Amou, Fuochow, Ningpo e Shangai. Pagou ainda uma indenização de 20 milhões de dólares. A 2ª Guerra do Ópio ocorreu entre 1856 e 1860, onde novamente os chineses foram derrotados e pelo Tratado de Pequim, (18/10/1860), houve a cessão de Kowloon (território continental, fronteiro a Hong Kong assim como outra pesada indenização). O INÍCIO DA AMBIGÜIDADE NA ERA CONTEMPORÂNEA Com o decorrer da história começa a surgir a ambigüidade nos propósitos. Hitler apresentando o seu slogan de “a conquista do espaço vital para o povo alemão”, e os japoneses com o ideal de construir a chamada “Grande Esfera Asiático-Oriental de Prosperidade”. Numa primeira análise, estes ideais sugerem propósitos mais complexos que os das guerras do passado. Mas na realidade, a essência por de trás destes slogans era o desejo destas novas potências pela redefinição das áreas de influência das antigas potências, arrebatando para si os benefícios da conquista de suas colônias. Atualmente, não é tão fácil de identificar o porquê de se ir à guerra. Há algum tempo atrás, numa ambiência bipolar, os ideais de “exportar a revolução”, de um lado, e o de “conter a expansão do comunismo”, de outro, constituíam chamamentos à ação, que evocaram inúmeras respostas. Mas com o término da Guerra Fria, e o decorrente colapso da “Cortina de Ferro” que dividia o mundo em campos opostos, aqueles apelos perderam a sua razão de ser e eficácia. A era em que havia dois lados perfeitamente definidos estava terminada. Quem seriam os nossos inimigos? Quem seriam os nossos amigos? Estas questões que eram fundamentais no âmbito da revolução e da contrarevolução, subitamente, ficaram com as suas respostas complicadas, confusas, e difíceis de serem percebidas. Um país que ontem era um adversário, hoje se encontra no processo de se tornar um parceiro, ao mesmo tempo em que, um país que foi nosso aliado, talvez seja o nosso oponente num campo de batalha da próxima guerra. A COMPLETA AMBIGÜIDADE DE PROPÓSITOS DA ATUALIDADE O Iraque, que em determinado momento na Guerra Irã-Iraque, atacava o Irã em favor dos EUA, tornou-se o alvo de um feroz ataque conduzido pelos norteamericanos pouco tempo depois0. Um grupo guerrilheiro afegão, treinado pela CIA, tornou-se o mais recente alvo de um ataque noturno realizado pelos EUA com mísseis de cruzeiro. A Grécia e a Turquia, países membros da OTAN, quase que chegaram a situações de conflito na disputa sobre a ilha de Chipre, e o Japão e a Coréia do Sul, ligados por um tratado de aliança, estiveram a ponto de entrar em conflito, na disputa de uma pequena ilha. Todos esses exemplos servem para, 0 Para maiores informações sobre o relacionamento entre o Iraque e os EUA, o leitor pode consultar a obra “Desert Warrior: A Personal View of the Gulf War” escrito pelo Comandante das Forças Combinadas Junshi Yiwen; Publishing House; p.212; “Iraq had established extremely close relations with United States. Iraq had received weapons and valuable intelligence regarding Iranian movements from the U.S., as well as U.S. military support for attacks on Iran´s navy”. novamente, confirmar um antigo provérbio: “toda a amizade é fluida; o interesse pessoal é a única constante”. O caleidoscópio da guerra é girado pelas mãos do interesse pessoal, apresentando ao observador mudanças constantes de imagem. Os avanços extraordinários na tecnologia moderna têm servido para promover a globalização, intensificando ainda mais a incerteza resultante da dissolução de alguns interesses conhecidos, simultaneamente com a emergência de outros. A razão para iniciar-se uma guerra pode ser qualquer uma: a disputa por um território, ou por recursos; diferentes crenças religiosas; rancor derivado de divergências tribais; diferenças ideológicas; disputa sobre participação nos mercados financeiros; distribuição de poder e autoridade; sanções comerciais; ou, uma disputa decorrente de um desequilíbrio financeiro. Os objetivos da guerra se tornaram nebulosos devido à diversidade de interesses convergentes a serem atendidos. Portanto, é cada vez mais difícil dizer-se, claramente, o porquê de estarmos engajados em um conflito. Em artigo publicado na edição de Fevereiro de 1993, da revista “The Officer”, intitulado “On the Sea Change in the Security Environment”o então Secretário de Defesa Les Aspin, apresenta a comparação a seguir com relação à antiga e a nova ambiência de segurança. EM RELAÇÃO À AMBIÊNCIA GEOPOLÍTICA ANTIGA AMBIÊNCIA DE NOVA AMBIÊNCIA DE SEGURANÇA SEGURANÇA Bipolar (rígida) Previsível Comunismo e Nacionalismo EUA potencia militar ocidental nº 1 Alianças permanentes ONU paralisada Multipolar (incerta) Incerta Extremismo religioso EUA potencia militar isolada no mundo Alianças temporárias ONU dinâmica EM RELAÇÃO ÀS AMEAÇAS ENFRENTADAS PELOS EUA ANTIGA AMBIÊNCIA DE NOVA AMBIÊNCIA DE SEGURANÇA SEGURANÇA Única (URSS) Ameaça à Sobrevivência dos EUA Diversificada Ameaça aos Interesses dos EUA Clara Passível de Deterrência Centrada na Europa Alto risco de Escalar Ostensiva Não Clara Não Passível de Deterrência De outras regiões Baixo risco de escalar Encoberta EM RELAÇÃO AO EMPREGO DA FORÇA MILITAR ANTIGA AMBIÊNCIA DE NOVA AMBIÊNCIA DE SEGURANÇA SEGURANÇA Guerra de Atrição A Guerra realizada por terceiros Baseada principalmente em altatecnologia Posicionamento Avançado Bases Avançadas Apoio do País Hospedeiro Ataques decisivos a alvos capitais A participação direta Uso integrado de alta, média e baixa tecnologia Projeção de Poder Bases Domésticas Baseada na própria Força Das tabelas acima, pode-se notar a sensibilidade norte-americana às mudanças em sua ambiência de segurança, bem como, os diversos tipos de forças e fatores que estão limitando e influenciando o estabelecimento de um novo arranjo mundial, desde o término da Guerra Fria. A PREVALÊNCIA DOS PROPÓSITOS E INTERESSES NACIONAIS Qualquer jovem que participou da Guerra do Golfo poderá dizer, sem hesitar, que lutou para restaurar a justiça em proveito do minúsculo e fraco Kuwait. No entanto, o motivo real da guerra talvez tenha sido outro, bem diferente da razão tão filantrópica que foi oficialmente divulgada. Os países formadores da coalizão no 2º Conflito do Golfo, escondidos ao abrigo de um pretenso propósito altruísta, não temiam o constrangimento de ter que encarar os seus verdadeiros propósitos naquele conflito de frente. Na realidade, todos os países que participaram da Guerra do Golfo, assim optaram, após uma cuidadosa análise relativa às suas intenções e objetivos nacionais. As potências ocidentais envolvidas lutavam pela preservação de suas linhas de suprimento de petróleo. A este objetivo básico, os EUA acrescentaram a sua aspiração de construir uma nova ordem mundial sob a insígnia “USA”, comprovando a sua origem, e talvez tenha até havido, também, um pouco do zelo missionário de preservação da justiça. Os árabe-sauditas se engajaram visando anular uma incomoda ameaça de um poder hegemônico iraquiano, e neste sentido, dispuseram-se até a superar tabus e preconceitos muçulmanos, aliando-se aos ocidentais como em “Dança com Lobos”0. Os ingleses sempre reagiram entusiasticamente a cada movimento feito pelo Presidente Bush, como uma forma de recompensar o “Tio Sam” pelos problemas que lhe haviam causado com a Guerra das Malvinas; E até os franceses, tardiamente, enviaram tropas para o Golfo, visando a preservar um pouco de sua tradicional influência no Oriente Médio. Desta forma, com esta diversidade de interesses condicionantes, não há como uma guerra possa ser conduzida sob um único propósito. O agregado de interesses dos inúmeros países participando de uma guerra transformou a guerra moderna, como no caso da “Tempestade no Deserto”, numa inserção oportuna de interesses nacionais prospectivos, todos sob a chancela de um interesse comum. O assim chamado “interesse comum” assumiu a condição de um denominador comum de uma coalizão na equação da guerra — o fator que tornou aceitável, para cada partido aliado, integrar o esforço de guerra. Não obstante, ampliando esta perspectiva, se quisermos desenvolver um esforço combinado, é necessário que se considerem, além de interesses e objetivos nacionais, as condicionantes internas de cada país aliado, identificando as intenções e objetivos dos vários grupos de interesses particulares de cada nação, em relação à guerra. Desta forma, o complexo inter-relacionamento de interesses nacionais e privados torna impossível enquadrar a Guerra do Golfo, apenas, como tendo sido travada por causa do petróleo, ou visando uma nova ordem mundial, ou para expulsar os invasores. Somente um número restrito de militares consegue compreender um princípio que qualquer estadista já conhece: que a maior diferença entre as guerras contemporâneas e as do passado é de que nas guerras contemporâneas, os propósitos declarados são, freqüentemente, diferentes dos propósitos ocultos. 0 [N.T.] Uma alusão ao premiado filme “Dança com Lobos” em que um soldado do exercito norte-americano se tornou amigo e aliado de uma tribo indígena, na época, tradicionais inimigos do Exército norte-americano. ONDE LUTAR? “Avante jovens! Aos campos de batalha!”. Sob um fundo musical heróico, um jovem com uma mochila nas costas, deixa para traz sua família, filhos e parentes, e todos o vêem partir com lágrimas nos olhos. Esta é uma cena clássica dos filmes de guerra. O jovem pode estar partindo montado a cavalo, num trem, num navio ou num avião; isto não é relevante, o que importa, é que o seu destino é sempre o mesmo — um campo de batalha envolto pelas chamas da guerra. CAMPOS DE BATALHA DA ANTIGUIDADE ATÉ A IDADE MODERNA Durante um longo tempo, antes do advento das armas de fogo, os campos de batalha eram pequenos e compactos. O enfrentamento a curta distância entre dois Exércitos poderia ser executado em uma pequena área de terreno plano, podendo desdobrar-se por trilhas entre montanhas ou, para dentro dos limites de uma cidade. Na perspectiva militar atual, aquele campo de batalha que extasiava nossos antepassados, representa uma locação pontual no âmbito de um mapa militar, sem ter muita relevância. Os campos de batalha da Antigüidade até a idade Moderna não teriam capacidade de acomodar o espetáculo que a guerra atual apresenta em escala grandiosa. O advento das armas de fogo determinou o desenvolvimento das formações dispersas, e o campo de batalha “pontual” foi gradativamente ampliado para uma região onde ocorriam seqüências de escaramuças. CAMPOS DE BATALHA NA IDADE CONTEMPORÂNEA Durante a 1ª Guerra Mundial, a guerra de trincheiras, com suas linhas estendendo-se por centenas de milhas, representaram o apogeu do conceito de campo de batalha bidimensional, e ao mesmo tempo, ampliou suas dimensões para uma “área” (teatro de operações0), com profundidade de dúzias0 de milhas. Para os participantes daquele conflito, o novo campo de batalha configurado por trincheiras, obstáculos de concreto, metralhadoras e crateras, tornou-se emaranhados de arame farpado, um verdadeiro matadouro, gerando um número incontável de vítimas. A TECNOLOGIA REDIMENSIONANDO O CAMPO DE BATALHA O constante processo de desenvolvimento tecnológico tem criado as condições para novas e contínuas expansões do conceito de campo de batalha. A transição do campo de batalha pontual para o linear, bem como, de sua dimensão bidimensional para a tridimensional não levou tanto tempo para ocorrer, como pode ser suposto. Pode-se dizer que, em cada caso, um determinado estágio na evolução já trazia consigo o seu sucessor. Quando o ronco dos motores inaugurava a era dos tanques passando sobre as trincheiras, já apareciam nos céus os primeiros aviões equipados com metralhadoras, e já era possível o lançamento de bombas por dirigíveis. O desenvolvimento de armas não pode, por si só, e automaticamente, introduzir mudanças nas características dos campos de batalha. Na história da guerra, qualquer avanço significativo sempre dependeu, em parte, de uma iniciativa inovadora por parte dos estrategistas militares. O campo de batalha, que esteve restrito ao nível terrestre por milhares de anos, foi subitamente erguido à categoria de tridimensional. Isto se deve, em parte, às obras “Tanks in the Great War, 19141918” do Major-General John Frederick Charles, e “The Command of the Air” de Giulio Douhet, bem como à profundidade das operações propostas e praticadas sob o comando do Marechal Mikhail N. Tukhachevsky. Erich Lunderdoff foi outro estrategista que tentou mudar radicalmente a natureza do campo de batalha, idealizando o conceito de “guerra total”, que combinava os elementos do campo de batalha a outros não pertencentes a este cenário, integrando-os num só conjunto orgânico. Não obstante, ele não conseguiu 0 [N.T.] A expressão “Teatro de Operações” é o conceito atual, que corresponde ao que o autor define como sendo Área de Batalha. 0 [N.T.] Acreditamos que o autor se referiu a “dezenas” de milhas, porém, para manter fidelidade ao texto original, “dozens”, utilizamos a tradução literal – dúzias. implantar sua concepção ou testemunhar o seu sucesso, pois estava predestinado a travar as batalhas do seu tempo, em teatros como o de Verdun e dos Lagos Masurios. Ainda assim, ele foi o precursor de uma doutrina militar que lhe sucedeu por mais de meio século. Neste sentido, o destino de um soldado é determinado pela era em que ele vive. Naquele tempo, a amplitude das asas do Deus da guerra estava limitada ao alcance de uma peça de artilharia fabricada pela Krupp, o que tornava impossível o disparo de um projétil, cuja trajetória parabólica atingisse o inimigo, além de suas linhas de frente e de retaguarda. Hitler teve mais sorte que Lunderdoff. Passados 20 anos, ele tinha armas de longo alcance à sua disposição. Empregando bombardeiros propulsados por motores Mercedes, e os foguetes V1 e V2, ele conseguiu quebrar a tradição das Ilhas Britânicas, de nunca terem sido constrangidas por qualquer invasor0. Hitler, que não era um estrategista e tão pouco um tático, confiando apenas em sua intuição, conseguiu ultrapassar os espaços que demarcavam a linha de frente e a retaguarda; ele jamais entendeu, realmente, o significado revolucionário do rompimento da configuração espacial que separava os elementos integrantes e não integrantes do campo de batalha. Provavelmente, este conceito estava além do alcance da percepção de um completo maníaco quanto à guerra, além de ser um estrategista simplório. TECNOLÓGICA E A DIMENSÃO ATUAL DO CAMPO DE BATALHA Essa revolução, todavia, logo estará entre nós com sua força máxima. No momento, a tecnologia novamente está avançada em relação ao pensamento militar. Ainda que nenhum estudioso militar tenha apresentado qualquer conceito novo e extremamente amplo sobre o campo de batalha, a tecnologia está se esforçando para expandir o campo de batalha para uma dimensão que é virtualmente ilimitada; existem satélites no ar, submarinos nas profundezas dos mares, mísseis balísticos que podem atingir qualquer ponto do globo, e a guerra eletrônica, que explora o invisível espectro eletromagnético. Até mesmo o último refúgio da raça humana — o mundo interior do ser humano — não está livre dos ataques da guerra psicológica. 0 Existem redes integrando [N.T.] Não foi considerada a invasão das Ilhas Britânicas em 1066 por Guilherme o Conquistador, Duque da Normandia (região ao norte da França),. sistemas nos cercando por cima e por baixo, de modo que uma pessoa não tem mais como escapar. Toda a conceituação atual relativa à amplitude, profundidade e altitude da ambiência operacional já aparece como antiquada e obsoleta. Como um resultado da expansão da capacidade de imaginação da humanidade e do seu domínio da tecnologia, o campo de batalha está sendo ampliado ao seu limite máximo. A despeito da situação delineada, o pensamento militar ainda tende a manter-se estático. Embora a tecnologia tenha criado maiores perspectivas para o pensamento militar, certamente isso não foi suficiente para provocar a expansão do campo de batalha convencional de sua dimensão “mesoscópica” convencional (isto é entre a microscópica e a macroscópica). Já é evidente, que os desenvolvimentos na área da tecnologia mecânica não serão determinantes em futuras ampliações do campo de batalha. A assertiva de que “uma futura expansão do campo de batalha refletir-se-á nas ações conduzidas nas áreas mais profundas dos oceanos, e nas altitudes mais elevadas do espaço cósmico”, constitui meramente um ponto de vista superficial, e uma conclusão que se auto-restringe à física geral. A NOVA DIMENSÃO — O ESPAÇO TECNOLÓGICO A verdadeira mudança revolucionária no campo de batalha decorre do que poderíamos chamar de “espaço não natural”. Por exemplo, não há como se considerar que o espectro eletromagnético seja um campo de batalha em termos convencionais. Ele constitui um tipo diferente de campo de batalha, que deriva e depende da criatividade tecnológica. Neste tipo de “espaço criado pelo homem”, ou “espaço tecnológico”0, os conceitos de dimensão, peso, terra, mar e ar e espaço cósmico perderam os seus significados. Isso devido às propriedades específicas das ondas eletromagnéticas, que permeiam e podem exercer controle no espaço convencional sem, no entanto, ocupar qualquer parcela desse espaço. Podemos até antecipar que, qualquer alteração ou expansão significativa em um futuro campo de batalha estará condicionada à possibilidade de uma determinada inovação 0 “Ambiência tecnológica” é um novo conceito que estamos propondo, de modo a distinguí-lo do espaço físico. tecnológica, ou à combinação de várias inovações tecnológicas poderem criar um novo “espaço tecnológico”. O espaço das redes interativas0 (ou ciberespaço)0 atualmente desperta uma ampla atenção entre os militares modernos. Este “espaço tecnológico” foi criado por uma singular interação entre a tecnologia eletrônica, a cibernética e sua aplicação em projetos específicos. Considerando que uma guerra dentro deste espaço tecnológico ainda pode ter os seus resultados controlados pelo homem, então, o “espaço nanométrico”, que já se manifesta no rastro das redes interativas, pode representar um claro indício da completa realização do sonho humano — a guerra sem o envolvimento direto de seres humanos. Atualmente, alguns militares imaginativos e criativos já estão tentando documentar e explicar estes novos campos de batalha, repletos de novas tecnologias, visando às guerras do futuro, e, portanto, uma mudança fundamental na “ambiência da guerra” não está muito longe de ocorrer. Mais cedo do que se pensa “guerras em redes interativas” ou as “guerras nanométricas” podem se tornar uma realidade em nosso meio. Uma realidade que ninguém no passado jamais imaginou. Aparentemente serão guerras intensas, com praticamente nenhum derramamento de sangue, e mesmo assim, configurarse-ão vencedores e vencidos no cômputo geral da guerra. Em um número cada vez maior de situações, estas guerras irão ocorrer em paralelo às guerras tradicionais. Ambos os campos de batalha, o tecnológico e o convencional, irão sobrepor-se e interagir de forma mutuamente complementar, na medida em que cada um se desenvolve da sua própria maneira. Portanto, uma guerra do futuro irá desenvolver-se, simultaneamente, tanto no espaço macroscópico, como também no espaço mesoscópico e no espaço microscópico, cada qual definido por suas propriedades físicas específicas, e que no seu todo configurarão um extraordinário campo de batalha, sem precedentes nos anais da história da guerra. 0 [N.T.] Expressão empregada como tradução para o termo “network”. 0 [N.T.] Dimensão ou domínio virtual da realidade, constituído por entidades e ações puramente informacionais; meio, conceitualmente análogo a um espaço físico, em que seres humanos, máquinas e programas computacionais interagem. (Dicionário Aurélio – Sec. 20I). Simultaneamente, com o progressivo esmaecimento da distinção entre tecnologia militar e civil, entre o militar profissional e o não-militar, ocorrerá uma superposição cada vez maior entre o campo de batalha e as áreas de paz ou neutras, tornando cada vez menos definida a linha divisória previamente existente. Áreas que eram formalmente eram isoladas umas das outras e agora estão sendo conectadas. A humanidade está incorporando, a todos os espaços e dimensões, um significado bélico. Tudo o que é necessário é a capacidade para lançar um ataque em um determinado lugar, usando determinados meios, visando a consecução de determinados propósitos. Assim sendo, o campo de batalha é uma entidade onipresente, ou seja, é possível iniciar-se uma guerra, que irá destruir um inimigo, a partir de uma central de processamento de dados, ou do recinto de uma bolsa de valores. Assim, haverá algum espaço que não seja um campo de batalha? Se àquele jovem soldado com a mochila nas costas, a que nos referimos no início deste capítulo, fosse perguntado, hoje: Onde é o campo de batalha? A provável resposta seria: Em todos os lugares. QUEM SÃO OS GUERREIROS? OS EFEITOS A TECNOLOGIA CIBERNÉTICA Em 1985, a China realizou uma significativa redução de efetivos em suas forças armadas fato que, no transcurso do decênio que se seguiu, serviu de prelúdio, para iniciativas semelhantes nas principais potências do mundo. Segundo diversos analistas militares, o fator motivador desta tendência mundial foi a situação pós-Guerra Fria, na qual nações que anteriormente se defrontavam , agora estavam ansiosas por usufruir os dividendos da paz. Na realidade, estes analistas não se deram conta de que este fato é apenas a ponta de um iceberg, e que os verdadeiros determinantes desta redução de efetivos não estão limitados a esse aspecto em particular. Uma razão mais profunda para essas reduções de efetivos refere-se ao fato de que o incessante crescimento da tecnologia cibernética exige um significativo esforço de readaptação, numa escala grandiosa, de militares que foram criados e formados dentro de uma concepção da guerra mecanizada. É precisamente por este motivo, que algumas nações com visão prospectiva, ao invés de única e simplesmente priorizarem os cortes de efetivos, estão enfatizando: a elevação da qualificação técnica do seu pessoal; o incremento do nível de tecnologia avançada e semiavançada incorporada ao seu armamento; e a atualização do pensamento militar e doutrinário. De acordo com o “U.S. Department of Defense – National Defense Report for the fiscal year of 1998” , o número de militares norte-americanos sofreu um corte de 32% desde 1989. Adicionalmente, os EUA desativaram uma grande quantidade de equipamentos obsoletos, e, portanto, aumentaram a sua capacidade de combate até um determinado nível, mesmo considerando a redução nos efetivos. O Departamento de Defesa dos EUA, na edição de maio de 1997 do “Quadrennial Defense Review” (QDR), ao enfatizar “considerar o futuro e reformular as Forças Armadas americana” advoga a continuidade dos cortes de pessoal, concomitantemente à capacitação dos militares norte-americanos, de acordo com as novas teorias em assuntos militares. Além disso, também propugna por gastos comparativamente maiores na obtenção de equipamentos. O BIÓTIPO CONTEMPORÂNEO DE UM SOLDADO A era dos “fortes e valentes soldados defensores da nação” já está ultrapassada. Num mundo em que até mesmo a guerra nuclear talvez se torne um jargão militar obsoleto é bem provável que um jovem pálido e franzino, usando um par de óculos de grau, esteja mais bem preparado para ser um soldado moderno do que um jovem forte e musculoso. A maior evidência desta assertiva, talvez seja o relato de uma ocorrência que circula nos meios militares ocidentais. Como parte de um exercício de segurança, um tenente da Força Aérea dos EUA, utilizando um computador doméstico ligado à Internet através de uma linha discada comum, conseguiu penetrar na rede de computadores do Comando Combinado do Atlântico, colocando uma divisão naval inteira de joelhos. Este fato apareceu, pela primeira vez, no jornal “British Sunday Telegraph”. De acordo com a reportagem, os militares norte-americanos realizaram um exercício combinado do tipo “Joint Warrior” no período de 18/09/1995 até 25/09/1995, com o propósito de testar a segurança dos seus sistemas eletrônicos de defesa nacional. Durante este exercício, um oficial da Força Aérea conseguiu penetrar com sucesso no sistema naval de comando. Existem muitas ocorrências similares, mas existem, também, alguns estudiosos militares que acreditam que estas ocorrências constituem o caso de “jogar areia para cima para ofuscar a visão dos outros”. O contraste entre os militares de hoje e os de gerações passadas é tão claro, quanto a diferença entre o armamento moderno e seus precursores, e isto se deve ao fato de que os militares modernos tiveram de submeter-se a um severo esforço de capacitação, provocado por uma ininterrupta expansão tecnológica durante todo o século XX, corroborada, talvez, pela salutar influência dos diversos elementos da cultura pop mundial, isto significando o “rock and roll”, as discotecas, o Campeonato Mundial, a NBA, Hollywood, e assim por diante. O contraste é evidente, quer estejamos falando de capacidade física, quer da capacidade intelectual. Mesmo considerando que a geração de militares nascidos nas décadas de 70 e 80 foi treinada dentro de um estilo rigoroso chamado “beast barracks”0, preconizado pela Academia Militar de West Point, é difícil para eles ignorar a natureza gentil e delicada, que está enraizada nos fundamentos da moderna sociedade. Além disso, os sistemas de controle modernos permitem que eles controlem o disparo e a precisão dos seus armamentos a partir de posições afastadas de qualquer campo de batalha. Esta capacidade possibilita atacar um inimigo que esteja muito além do alcance visual, evita a interação com o ambiente sangrento que decorre de um confronto frente a frente. Consequentemente, estes aspectos transformaram cada soldado em um tímido cavalheiro, o qual, preferencialmente, evitará a visão de sangue derramado. O guerreiro forjado em aço e sangue, personagem que nunca foi questionado por milhares de anos, está tendo o seu papel assumido por um novo modelo — o guerreiro digital. O ADVENTO DE GUERREIROS NÃO-MILITARES A guerra na atualidade tornou obsoleta a tradicional divisão social do trabalho, que prevalecia nas sociedades caracterizadas pelo alto índice de industrialização, não sendo mais um “jardim imperial” privativo de soldados profissionais. A tendência civilista0 da guerra começou a tornar-se evidente, e a teoria de Mao Zedong0 prescrevendo “cada cidadão um soldado”, de modo algum pode ser considerada responsável por esta tendência. 0 Forma de treinamento desenvolvido na Academia Militar de West Point, em que o militar é submetido às rigorosas condições de aprisionamento, praticadas durante a Guerra do Vietnam nos campos de prisioneiros controlados pelos Vietnamitas do Norte, visando desenvolver a resistência física e psicológica dos militares norteamericanos aos rigores deste tipo de confinamento. 0 [N.T.] O termo “civilista” é empregado no sentido de extensão da prática da guerra às esferas civis, ou seja, fora do exclusivo âmbito militar. 0 [N.T.] Conhecido no mundo ocidental por Mao Tse Tung. Na obra “War and Anti-War”, Alvin e Heidi Toffler escreveram: “Se as ferramentas da guerra não são mais tanques e artilharia, e sim vírus de computador e microrobótica, então não podemos mais dizer que as nações constituem as únicas entidades armadas, ou que os soldados são os únicos a terem a posse dos instrumentos da guerra. “ Em seu artigo, intitulado “What the Revolution in Military Affairs is Bringing ― The Form War Will Take in 2020”, o Coronel Shoichi Takama das Forças Japonesas de Auto-Defesa frisa que a tendência civilista será uma característica importante nas guerras do século XXI. Esta tendência civilista atual não se refere a uma extensiva mobilização da população. Ao contrário, ela simplesmente sugere que uma elite tecnológica, no âmbito da comunidade nacional, sem ser convidada, derrubou os portais de acesso e penetrou naquele “jardim imperial”, tornando impossível para os militares HACKER — O PRIMEIRO GUERREIRO NÃO-MILITAR O primeiro candidato que aparece, e também o mais notório, é o hacker. Este indivíduo que, em termos genéricos, não recebeu qualquer tipo de treinamento militar, ou esteve ligado a qualquer atividade militar pode, com extrema facilidade, interferir nos sistemas de segurança de um Exército ou de uma nação, baseandose simplesmente em sua perícia técnica. Um exemplo clássico da atuação de um hacker nos é fornecido pela publicação norte-americana — “FM100-6 — Information Operations Regulations”, segundo a qual, em 1994, um hacker, a partir da Inglaterra, conseguiu violar a segurança da rede do “U.S. Home Air Development Center”, localizado em Nova Iorque, comprometendo assim, a segurança de mais de 30 sistemas. Este mesmo hacker, em ações adicionais, conseguiu violar a segurança de mais de uma centena de outros sistemas e redes, entre os quais, cita-se: o “Korea Atomic Energy Research Institute (KAERI)”; e a NASA. Com relação a este fato, o que causou maior assombro, não foi a magnitude do ataque ou dos danos causados, e sim, que o hacker era um jovem, com apenas dezesseis anos de idade. É claro que uma violação de sistemas de segurança, praticada por um jovem através de um jogo de computador, não pode ser considerada como um ato de guerra. Não obstante, as dúvidas que permanecem são: Até que ponto as violações 0 [N.T.] “Terra Incógnita” — o autor refere-se ao ímpeto que surgiu no final do século XV, como conseqüência do progresso dos meios marítimos para o descobrimento de novas terras. Portugal foi um ator significativo neste processo. de segurança foram praticadas sem dolo, e quais foram praticadas de forma intencional, como seriam no caso de uma ação de guerra? Quais são os atos que podem ser considerados como de natureza individual e quais são os que podem ser considerados como ações hostis, praticadas por “guerreiros não-profissionais” patrocinados por um Estado através de hackers? Só no ano de 1994, foram reportadas 230.000 violações dos sistemas de segurança das redes de computadores do Departamento de Defesa dos EUA. Deste total, quantos ataques podem ser considerados atos intencionalmente destrutivos, praticados pelos chamados “guerreiros não-profissionais”? Possivelmente, nunca haverá uma maneira de se saber ao certo0. Da mesma forma que existem todos os tipos de pessoas no âmbito de uma sociedade, os hackers também existem com as mais diversas índoles e raças. Todos os hackers, independentemente de seus antecedentes e valores, camuflam-se nas redes interativas, e podem ser: estudantes de nível médio; “vasculhadores da Internet0”; elementos membros frustrados e ressentidos na administração de empresas internacionais; terroristas experientes ou mercenários. Tanto em suas ações quanto em suas idéias, os hackers constituem pólos independentes uns dos outros, e que se encontram na mesma rede interativa mundial, uns atuando de acordo com critérios e julgamentos de valor próprios ou específicos, e outros, de forma confusa sem qualquer objetivo ou critérios específicos. Em decorrência do caráter abstrato e genérico que caracteriza um hacker, não há uma especificação precisa da natureza boa ou má de suas ações, e, desta forma, eles não se sentem cerceados pelas mesmas regras que regem as sociedades como um todo. Utilizando computadores eles podem obter informações de outras pessoas como suas contas bancárias, ou podem apagar dados preciosos, tudo a título de uma mera brincadeira ou, ao contrário, como legendários cavaleiros errantes da noite, eles podem colocar suas habilidades excepcionais a serviço de poderes diabólicos. 0 Muitos hackers estão adotando uma nova tática que pode ser rotulada como “guerrilha em redes de dados”. 0 [N.T.] Na gíria popular brasileira na área de informática, são conhecidos por “vasculhadores de bits”. Na Indonésia, durante o governo de Suharto0, foi imposta uma rigorosa censura às notícias relativas às agressões organizadas contra as etnias chinesas que habitavam aquele país. No entanto, essas ações foram tornadas públicas em caráter inédito através da Internet, por testemunhas dotadas de senso de justiça. Em decorrência, houve uma consternação e pressão em âmbito mundial, em função do que, tanto o governo da Indonésia, quanto o seu aparato militar opressor, foram levados a julgamento para responder por questões relativas à moral e à justiça. Antes deste fato, um outro grupo de hackers que se autodenominava “Milworm” também teve uma atuação significativa no âmbito da Internet. Neste caso, como forma de protesto aos testes nucleares, eles violaram os sistemas de proteção das redes internas de computadores do “India´s Atomic Research Center”, alterando a página de acesso à Internet da empresa, danificando mais de 5 MB0 de dados. Estes hackers poderiam, de fato, ser considerados como “educados”, visto que eles foram somente até um determinado ponto, não causando muitos problemas às suas vítimas. Mas a despeito da magnitude dos resultados da ação dos hackers, há uma conseqüência que incorpora um grande significado simbólico, qual seja: na era da informação, a influência exercida por uma bomba nuclear talvez seja menos significativa do que aquela exercida por um hacker. AS ORGANIZAÇÕES TERRORISTAS 0 Presidente da Indonésia no período de 1966 a 1988. 0 [N.T.] Sigla adotada para “megabyte”, uma unidade de armazenagem de dados que corresponde a, aproximadamente, 1 milhão de bytes. Mais incisivos que os hackers — e uma ameaça mais presente no mundo real — são as organizações não-estatais, cuja mera menção é suficiente para abalar o mundo ocidental. Estas organizações, que em maior ou menor grau possuem uma determinada índole militar, são normalmente motivadas por alguma causa ou credo extremista, tais como: as organizações islâmicas que visam à Guerra Santa; as milícias caucasianas nos EUA; a seita japonesa “Aum Shinrikyo”; e mais recentemente, os grupos terroristas como aquele liderado por Osama bin Laden, o qual provocou a explosão das embaixadas norte-americanas no Quênia e na Tanzânia. Os vários e diversificados atos de natureza monstruosa e virtualmente insana, praticados por estes tipos de grupos, parecem sedimentar-se com maior firmeza, do que a solitária ação dos hackers, no solo fértil das guerras contemporâneas. Além disso, no confronto das forças armadas de um país, (atuando sob regras fixas, com efetivos ilimitados e objetivos limitados), contra um destes tipos de organização, (que não observam quaisquer regras, empregando meios limitados numa guerra sem limitações), será muito difícil para os primeiros lograrem a obtenção de superioridade ou vitória. UM NOVO GUERREIRO NÃO-MILITAR DE ALTO NÍVEL Durante a década de 90, concomitantemente a uma série de ações militares deslanchadas por guerreiros não-profissionais e organizações não-estatais, começamos a perceber o surgimento de um novo tipo de guerra “não-militar”, conduzida por um outro tipo de guerreiro. Este indivíduo não é um hacker no sentido genérico do termo, e muito menos um membro de uma destas organizações não-estatais. Talvez, ela ou ele seja um analista de sistemas, um engenheiro de software, um especialista em finanças com uma grande quantidade de capital mobilizável, ou um especulador da Bolsa de Valores. Pode ser uma personalidade expoente com um grande controle sobre a mídia, um colunista famoso, ou um animador de programas de TV. Embora possuam uma filosofia de vida diferente daquela de determinados terroristas fanáticos e desumanos, eles freqüentemente têm uma sólida filosofia de vida, à qual se apegam com uma fé de intensidade semelhante ao apego que Osama bin Laden demonstra em seu fanatismo. E mais do ainda, não carecem de motivação ou coragem para engajar-se numa luta, se necessária for. Com este entendimento, quem poderá negar que George Soros seja um terrorista financeiro? Da mesma forma como a tecnologia moderna está provocando mudanças nos sistemas de armas e nos campos de batalha, ela está, simultaneamente, tornando indistinta a caracterização de quais são os participantes da guerra. Porém, uma coisa é certa: os militares não detêm mais o monopólio da prática da guerra. O terrorismo em nível global é um dos subprodutos do processo de globalização deflagrado pela integração tecnológica. Guerreiros “não-profissionais” e organizações não-estatais passam a representar um perigo cada vez maior para as nações soberanas, além de sérios adversários para qualquer Exército profissional. Comparados a tais adversários, os Exércitos profissionais da atualidade parecem gigantescos dinossauros, que carecem de uma força adequada à era em que vivemos, que seja proporcional ao seu tamanho. Seus adversários são como pequenos roedores, com grande capacidade de sobrevivência, e que usam seus dentes afiados para atormentar grande parte do mundo. QUAIS MEIOS E MÉTODOS SERÃO USADOS NA GUERRA? Não há como se contestar o ponto de vista norte-americano, quando se trata da discussão sobre meios e métodos que serão utilizados nas guerras do futuro, e isto não é porque os norte-americanos sejam os atuais “senhores do mundo”0; ocorre que a opinião dos norte-americanos, no que tange a estas questões, é realmente superior, se comparada às opiniões que prevalecem entre os militares de outras nações. AS FUTURAS MODALIDADES DE GUERRA 0 [N.T.] A tradução literal da expressão “king of the mountain” seria “rei da montanha” empregada para designar a pessoa que se encontra no topo da pirâmide do prestígio ou do poder, num determinado âmbito. Porém, para os chineses, segundo Sun Am, a expressão representa o ser humano que exercia o domínio sobre todos à sua volta. Assim sendo, a expressão “senhor do mundo” foi utilizada para manter maior fidelidade com a cultura nacional do autor da obra. Os norte-americanos resumiram as quatro formas de guerra que poderão ocorrer no futuro como sendo: 1) guerra cibernética 2) guerra de precisão0; 3) operações combinadas0; e 4) “Military Operations Other Than War – MOOTW”0. Esta classificação, por si só, é repleta de significado. Através dela, podemos constatar que a abordagem adotada pelos norte-americanos é significativamente imaginativa e ao mesmo tempo extremamente prática, permitindo-nos, também, um sólido entendimento da ótica norte-americana relativa à guerra do futuro. Com exceção das operações combinadas, que se desenvolveram a partir de outras concepções anteriores, as outras três formas de guerra podem ser consideradas como o produto de um novo pensamento militar. O General Gordon R. Sullivan, ex-Chefe do Estado-Maior do Exército norteamericano, sustenta que a guerra cibernética será a forma básica de uma guerra futura, e em função desta percepção, desenvolveu uma força militar com o maior nível de informatização possível, tanto no âmbito das Forças Armadas norteamericanas, quanto em âmbito mundial. Ele ainda propôs o conceito de guerra de precisão, baseado na previsão de que “haverá uma guinada nos fundamentos básicos da guerra do futuro, no sentido de sistemas e processos digitais e os ataques invisíveis a longa distância”. Para os norte-americanos, é possível que o advento de novas armas e sistemas de alta-tecnologia tais como: as armas de precisão, o Sistema de Posicionamento Global (GPS), os sistemas C4I0 e os aviões invisíveis pouparão os seus soldados dos pesadelos da guerra de atrição. 0 Guerra de Precisão (“precision warfare”) constitui um novo modo de guerrear, resultante da combinação do crescente grau de precisão do armamento, com o crescente nível de transparência do campo de batalha. (Ver “From Gettysburg to the Gulf and Beyond”, pelo Coronel Richard J. Dunn III [McNair Paper 13, 1992], citado no “World Military Affairs Yearbook for 1997”). 0 “Joint Vision 2010”, um documento elaborado pelo Comando do Estado Maior Conjunto dos EUA. Ver “Joint Force Quaterly, Summer 1996”. 0 Ver a edição de 1993 do periódico do Exército norte-americano “Operations Essentials”. [o teor do contido nesta referência está contido na publicação FM 1005 – “Operations” – Departamento do Exército – Junho de 1993]. A guerra de precisão, chamada pelos norte-americanos de — guerra sem contato, ou pelos russos0 de — combate remoto, caracteriza-se pela dissimulação, velocidade, precisão, alto grau de eficácia e poucas perdas colaterais. Nas guerras do futuro, cujos desfechos talvez ocorram pouco tempo depois dos seus inícios, esta doutrina, que já demonstrou alguma eficácia na 2ª Guerra do Golfo, talvez se torne o procedimento mais aceito e adotado pelos generais norte-americanos. A CARACTERÍSTICA INOVADORA DAS MOOTW No entanto, a concepção que realmente incorpora uma característica criativa, não é a da guerra cibernética ou da guerra de precisão e sim, a concepção das MOOTW. Esta concepção está claramente vinculada à idéia “do interesse comunitário global”, que os norte-americanos constantemente invocam, implicando num temerário excesso de autoridade por parte dos EUA — um caso clássico da atitude norte-americana que pode ser representada pela frase — “eu sou responsável por todos os lugares banhados pela luz do sol”. Apesar deste ideal de prepotência, ainda assim, consideramos que as MOOTW sejam uma concepção válida, porque afinal de contas, pela primeira vez, dispõe-se de uma grande diversidade de medidas para lidar-se, de forma inteligente, com os problemas dos séculos 200 e 21, e que podem ser, todos, colocadas sob o grande invólucro de um mesmo tipo de guerra, de modo que os militares não estarão perdidos e às escuras por estarem atuando em cenários diferentes dos campos de batalha, e a sua compreensão e percepção encontrará limites mais amplos para o conceito de guerra. 0 [N.T.] A sigla C4I corresponde a definição de uma ambiência ou sistema que integra sistemas ou subsistemas de Comando, Controle, Comunicações, Computadores e Inteligência. 0 Após realizar pesquisa sobre a Guerra no Golfo, o especialista russo em tática, I.N. Vorobyev, salientou que o “combate remoto” é um método de combate que tem um grande potencial. (“Military Thought”, Rússia, 1992, p11). 0 [N.T.] O livro foi escrito em 1996, por essa razão o autor ainda se referiu ai século XX. As ações ou medidas que podem ser classificadas como MOOTW compreendem: manutenção da paz; combate ao tráfico de drogas; supressão de levantes, ajuda militar; o controle de armas; apoio humanitário; a evacuação de cidadãos residindo em outros países, e o combate ao terrorismo. AS OPERAÇÕES DE GUERRA NÃO-MILITARES O contato dos militares com conceitos mais amplos de guerra poderá, a princípio, reduzir a sua adesão ao contexto das MOOTW. Em outras palavras, eles não serão capazes de incorporar o recém criado conceito de “Operações de Guerra NãoMilitares” ao contexto das MOOTW. No entanto, quando isto ocorrer, irá representar um entendimento que tem um significado genuinamente revolucionário em termos da percepção que a humanidade tem quanto à guerra. A diferença entre as concepções de “Operações de Guerra Não-Militares” e as MOOTW vai muito mais além da diferença semântica, ou da mera inversão de palavras como nas frases de um “quebra cabeça”. O conceito de MOOTW pode ser considerado, simplesmente, como uma designação para um conjunto de missões e operações realizadas por Forças Armadas quando não há um estado de guerra declarado. O conceito de “Operações de Guerra Não-Militares” expande o entendimento de guerra a todos os campos da atividade humana, com uma abrangência muito maior que o significado da expressão operações militares, expansão esta, resultante do fato de que os seres humanos utilizarão quaisquer meios concebíveis, para alcançar os seus objetivos. Embora pareça que os norte-americanos estejam na dianteira, em todos os campos da teoria militar, eles não têm capacidade para assumir a liderança na proposição desta nova concepção de guerra. Apesar disso, não podemos deixar de reconhecer que o afluxo do pragmatismo de estilo norte-americano em todo o mundo, bem como das ilimitadas possibilidades oferecidas pela alta-tecnologia, foram forças sustentando o surgimento desta nova concepção de guerra. Com o aparecimento concepção de “Operações de Guerra Não-Militares”, quais serão os meios que, estando atualmente desvinculados da guerra, tornar-se-ão as novas armas e meios, e que se evidenciam, com uma freqüência cada vez maior, em todo o mundo? A GUERRA COMERCIAL Se a expressão guerra comercial, a cerca de doze anos atrás era apenas uma expressão descritiva, na atualidade ela se tornou um instrumento disponível a diversas nações, para empreenderem Operações de Guerra Não-Militares. Este instrumento tem sido usado com habilidade pelos norte-americanos, que o aperfeiçoaram até o nível de uma arte, compreendendo em seu bojo: a aplicação da legislação comercial interna no âmbito internacional; o estabelecimento ou eliminação arbitrária de barreiras tarifárias; a adoção intempestiva de sanções comerciais; a imposição de embargos à exportação de tecnologias consideradas críticas; a adoção do capítulo específico da Lei Especial 3010 ; e a adoção do conceito de “país mais favorecido”; e etc. Qualquer um destes instrumentos tem um efeito destrutivo semelhante ao de uma operação militar, e neste sentido, o embargo de oito anos imposto pelos EUA contra o Iraque constitui um exemplo clássico. A GUERRA FINANCEIRA A crise financeira ocorrida no Sudeste Asiático evidenciou em relação aos países asiáticos, os efeitos da guerra financeira. De fato, não se trata, apenas, deles terem sido simplesmente surpreendidos, e sim, atingidos de uma forma avassaladora e completa. Uma guerra financeira deliberadamente planejada pelos proprietários do capital internacional, e desencadeada por intermédio da transferência rápida de valores, desmantelou, um após outro, países que, pouco tempo antes, eram saudados como “pequenos-tigres” e “pequenos-dragões” da economia internacional. A prosperidade econômica que tinha despertado a admiração do mundo ocidental transformou-se em depressão, como as árvores que, da noite para o dia, perdem suas folhas, devido ao vento do outono. 0 A Lei Especial 301 constitui um mecanismo adotado pelos representantes comerciais dos EUA, para identificar práticas comerciais injustas em relação aos comerciantes norte-americanos, demandando a imposição de sua reformulação mediante a adoção de sanções comerciais. Depois de apenas um assalto na competição, as economias de diversos países regrediram dez anos, e mais do que isso, uma derrota como esta na frente econômica deflagrou um quase colapso da ordem político-social. As perdas decorrentes deste caos continuado são tão numerosas quanto as que seriam decorrentes de uma guerra regional, e o prejuízo causado para a organização social existente, até mesmo excede os prejuízos que poderiam ser provocados por qualquer guerra regional. As organizações não-estatais, em sua primeira guerra da atualidade, sem o emprego de forças militares, estão usando meios não-militares para enfrentar paises soberanos. Desta forma, a guerra financeira é uma forma de guerra nãomilitar, tão destrutiva quanto um combate sangrento, sendo que, na realidade, sem o derramamento de sangue. A guerra financeira ocupa agora, indiscutivelmente, a função de protagonista no cenário da guerra, posição essa que, por milhares de anos, era privativa dos militares e dos armamentos, com sangue e morte por todos os lados. E no futuro, quando as pessoas consultarem as páginas da história do século XX e início do século XXI, os capítulos referentes às guerras financeiras serão os tópicos que despertarão maior atenção dos leitores0. Os protagonistas nestes capítulos da história não serão estadistas ou estrategistas militares, ao contrário, serão homens como George Soros. É evidente que Soros não detêm o monopólio do uso da arma financeira para aplicação nas guerras. Antes dele, Helmut Kohl usou o marco alemão para derrubar o Muro de Berlim — um muro que, anteriormente, ninguém conseguiu derrubar empregando projéteis de artilharia0. Num outro exemplo de guerra financeira o Presidente de Taiwan, Li Denghui, aproveitou-se da crise financeira no Sudeste Asiático para desvalorizar a moeda de 0 Na edição de 23 de agosto de 1998 do jornal Los Angeles Times havia uma artigo intitulado “Os Mercados Financeiros são a Maior Ameaça à Paz”. Este artigo mencionava que na atualidade os mercados financeiros, e não os campos de treinamento de terroristas, é que constituem a maior ameaça à paz mundial. 0 Wang Jiannan; “Who Has Joined the Fray? Helmut Kohl”; China Broadcasting Publishing House; 1997; pp. 275, 232, 357. Taiwan, visando atacar a moeda e o mercado de ações de Hong Kong, e em particular, as ações de empresas controladas por interesses na China Continental. Esta crise no Sudeste Asiático configurou-se como um grande jantar ao qual compareceram especuladores famintos por dinheiro, como as empresas de consultoria financeira Morgan Stanley e a Moody, famosas pelos relatórios de taxas de juros assinalando alvos promissores de ataques para os grandes investidores do mercado financeiro mundial0. Estas duas empresas são entidades típicas que, mesmo participando indiretamente do grande festim, arrecadam todos os seus lucros. No verão de 1998, após quase um ano de duração, a guerra financeira no Sudeste Asiático entrou no seu segundo assalto, e agora com uma amplitude maior, e as batalhas decorrentes se prolongam até os dias de hoje, incluindo, além daquela região, dois titãs mundiais, o Japão e a Rússia. Disto resultou uma economia global mais austera e difícil de ser controlada, e as chamas ofuscantes das batalhas financeiras atingiram, também, aqueles que se aventuraram a iniciar este incêndio. Sabe-se, por exemplo, que George Soros e o seu Fundo de Investimento “Quantum” perderam alguns bilhões de dólares somente na Rússia e em Hong Kong0. Temos desta forma, pelo menos, uma indicação da magnitude do poder destrutivo da guerra financeira. Atualmente, quando as armas nucleares tornam-se elementos decorativos de alta periculosidade, perdendo diariamente o seu valor operativo real, a guerra financeira torna-se uma arma “hiperestratégica”, captando a atenção mundial, por este novo tipo de guerra ser: facilmente manipulado, deflagrado de forma sigilosa, e altamente destrutivo. Analisando o caos ocorrido na Albânia há pouco tempo atrás, pode-se identificar, claramente, o papel desempenhado por diversos tipos de fundações criadas por 0 O artigo intitulado “A New York Corporation that Affects Economies”, constante da edição de 29 de julho de 1998 do periódico “The Christian Science Monitor”, desvendou como os relatórios de taxas de juros de Moody influenciaram e até manipularam tendências econômicas na Itália, Coréia do Sul, Japão e Malásia. 0 George Soros expõe toda a sua amargura em seu livro “A Crise do Capitalismo Global”, onde, com base numa superficial análise de seus investimentos no ano de 1988, analisa as lições que devem ser aprendidas desta crise econômica. grupos transnacionais e por milionários, cujos ativos igualavam-se a riquezas de diversos Estados-Nação. Estas fundações controlam a mídia, subsidiam organizações políticas, e limitam a capacidade de atuação de autoridades nacionais, provocando o colapso na ordem nacional, bem como a queda de governos legalmente estabelecidos. Talvez nós pudéssemos intitular este tipo de guerra como de guerra financeira baseada em fundações. Deste modo, a crescente freqüência e intensidade de opção pela guerra financeira, e a constatação de que um número cada vez maior de paises e organizações nãoestatais estarem deliberadamente utilizando-a como linha de ação, são fatos preocupantes e que devem ser encarados de forma direta. O NOVO TERRORISMO COMPARADO AO TRADICIONAL Devido à limitada amplitude do terrorismo tradicional, as vítimas decorrentes de suas ações são em número bem menor do que aquele resultante das guerras convencionais, mesmo assim o terrorismo tradicional incorpora um conteúdo mais intenso de violência. Além disso, em termos operacionais, as organizações terroristas tradicionais nunca estiveram cerceadas pelas regras convencionais da sociedade em geral, e assim, do ponto de vista militar, o terrorismo tradicional tem se caracterizado pelo uso de recursos limitados0 em ações de guerra ilimitada0. Esta característica sempre colocou as Forças Armadas numa posição extremamente desfavorável, mesmo antes do início da guerra, visto que estas forças devem conduzir-se, sempre, de acordo com determinadas regras, só podendo usar seus recursos ilimitados para a execução de uma guerra limitada. Esta contradição explica o motivo das organizações terroristas, mesmo sendo compostas por jovens relativamente inexperientes, tenham o poder de provocar 0 [N.T.] O uso dos qualificativos “limitado” e “ilimitado” pelo autor, no contexto do livro, não corresponde às conceituações doutrinárias adotadas pelos norte- americanos de acordo com o Dicionário de Termos Militares do departamento de Defesa. Neste caso o qualificativo “limitado” refere-se aos meios empregados. 0 [N.T.] Neste caso o qualificativo “ilimitado” refere-se à ambiência em que os meios são empregados. dores de cabeça em nações poderosas como os EUA, como que justificando a ineficácia do emprego de uma marreta para matar uma formiga. As comprovações mais recentes0 desta assertiva foram as duas explosões ocorridas, simultaneamente, nas embaixadas americanas em Nairobi e Dar es Salaam. O advento do terrorismo estilo “bin-Laden” consubstanciou a impressão de que uma força armada, a despeito do seu poderio, encontrará muita dificuldade para estabelecer uma superioridade, num jogo em que não existem regras. Mesmo que um país se transforme em uma força terrorista, linha de ação que está sendo agora adotada pelos norte-americanos, isso não assegurará, necessariamente, a capacitação para obter sucesso. Seja como for, se todos os terroristas restringissem suas ações aos padrões tradicionais, como o emprego de bombas, os raptos, os assassinatos e o seqüestro de aeronaves, isso representaria, apenas, um nível um pouco abaixo do máximo que o terror pode atingir. O que realmente infunde terror no coração das pessoas é o casamento do terrorismo com os diversos tipos de alta-tecnologia0, que propiciará o desenvolvimento de novas “super-armas”. Neste sentido, nós já temos uma pista do que nos espera no futuro um indício que pode causar preocupação. Quando os asseclas da Aum Shinriko lançaram gás tóxico Sarin no metrô de Tókio, o número de vitimas representou, apenas, uma pequena parcela da dimensão do novo terrorismo. Este acontecimento alertou as pessoas para o fato de que a moderna tecnologia bioquímica já conseguiu forjar uma arma mortal para emprego pelos terroristas que venham a tentar promover a destruição em massa da humanidade0. Contrariamente aos assassinos mascarados, que baseiam suas ações no massacre indiscriminado de pessoas inocentes, visando produzir terror, o grupo italiano “Falanges Armadas” constitui uma classe completamente diferente de organização 0 [N.T.] Deve-se considerar o ano em que a obra foi escrita, 1999. 0 [N.T.] neste sentido as palavras do autor foram proféticas, a se constatar pela constatação idêntica que foi feita pelo governo norte-americano através da sua edição de 2002 da Estratégia de Segurança Nacional. 0 Alguns especialistas em segurança nos EUA sugeririam que o governo deveria manter em estoque grandes quantidades de antídotos, de modo a prevenir contra a possibilidade de um ataque químico de surpresa por uma organização terrorista. terrorista de alta-tecnologia. Seus propósitos são específicos, e os meios que empregam são extraordinários. Sua especialização é a violação de redes de computadores de bancos e organizações de mídia, visando roubar informações armazenadas, deletar programas e disseminar desinformação, constituindo, assim, ações terroristas clássicas, executadas contra redes interativas e a mídia, empregando a tecnologia mais atual, visando a atingir a humanidade como um todo. Podemos denominar este tipo de ação como sendo o “novo terrorismo”. GUERRA ECOLÓGICA A guerra ecológica constitui um novo tipo de Operação de Guerra Não-Militar onde a moderna tecnologia é empregada para influenciar o estado natural dos rios, dos oceanos, da crosta terrestre, das coberturas de gelo glaciais, da circulação do ar atmosférico, e da camada de ozônio. O emprego de métodos para provocar terremotos, mudanças nos níveis de precipitação, na temperatura e composição da atmosfera, nos níveis dos mares, ou nos padrões de irradiação solar, irá acarretar prejuízos para a ambiência física ou criar uma ambiência ecológica local adulterada. Talvez, em muito pouco tempo, um fenômeno do tipo “El Nino”, produzido pelo homem, venha a representar um novo tipo de super-arma nas mãos de determinadas nações ou organizações terroristas. É mais provável que uma organização terrorista seja o primeiro agente a iniciar uma guerra ecológica devido à própria natureza de sua forma de atuação, ou pelo fato de não se sentir responsável pelas pessoas ou pela sociedade como um todo; como também, porque estas organizações têm demonstrado, de forma consistente, a sua não disposição em obedecer as regras do jogo. Além disso, visto que o equilíbrio ecológico já está no limiar de uma catástrofe, pela ação dos países na busca do desenvolvimento pela via mais rápida possível, existe o perigo de que, uma pequena variação em qualquer das variáveis da equação ambiental, seja o suficiente para deflagrar um holocausto ecológico. OUTRAS FORMAS DE OPERAÇÕES DE GUERRA NÃO-MILITARES Além do que já foi citado, podemos apontar um grande número de outros meios e métodos que podem ser utilizados para a execução de “Operações de Guerra NãoMilitares”, alguns dos quais já existem, e outros podem vir a existir no futuro. Tais meios e métodos incluem: a guerra psicológica, (divulgação de rumores visando a intimidar um inimigo e neutralizar sua vontade), a guerra de contrabando (gerando confusão em mercados de consumo e atacando o ordenamento econômico), a guerra de mídia (manipulando o que as pessoas vêm e ouvem visando a influenciar a opinião pública), a guerra de drogas (obtendo elevados lucros ilegais de forma rápida, difundindo o desastre em outros países), a guerra em redes interativas (comprometendo o segredo e a identidade de pessoas, num tipo de guerra em relação à qual que é virtualmente impossível a proteção), a guerra tecnológica (criando monopólios através do estabelecimento de padrões independentes), a guerra de maquinação (criando uma falsa aparência de poder real aos olhos de um inimigo), a guerra de recursos (apoderando-se de riquezas através da pilhagem de estoques de recursos), a guerra de ajuda econômica (concedendo favores de forma ostensiva, encobrindo condicionantes secretas de controle), a guerra cultural (liderando e difundindo tendências culturais, de modo a cooptar aqueles que têm pontos de vista divergentes), a guerra de legislação internacional (aproveitando as ocasiões mais oportunas para interpor novas regras e normas de interesse particular), além de diversos outros tipos de guerra nãomilitar, num número muito grande para serem citados. Numa era em que a abundância de novas tecnologias permite a geração de novos meios e métodos de execução de uma guerra, (para não mencionar a possibilidade de utilização combinada destes meios e métodos), não faz sentido, e seria um desperdício de energia, listar todos os meios e métodos possíveis. O que é significativo é que todos estes meios de guerra, assim como os processos para a sua aplicação já foram, estão sendo, ou, serão incluídos no inventário de meios de guerra. Tal fato está modificando, de forma sub-reptícia, o entendimento da humanidade quanto ao significado da guerra. Tendo diante de si uma diversidade infinita de opções para escolher, por que as pessoas procuram embrenhar-se numa rede, por elas mesmas criada, para selecionar e usar meios de guerra que estão limitados ao universo da força das armas e do poder militar? Os métodos que não se caracterizam pelo uso da força das armas ou do poder militar, ou sequer pela existência de vítimas e derramamento de sangue, oferecem a mesma, ou, até mesmo, uma maior facilidade para a consecução dos objetivos da guerra. A propósito, esta possibilidade tem determinado uma revisão daquela afirmação de que “a guerra é a política com derramamento de sangue”, bem como na visão, até hoje existente, de que a guerra executada com o emprego da força das armas é a derradeira forma de resolução de conflitos. Está claro que é precisamente a diversidade de meios empregados, que tem ampliado o conceito de guerra. Além disso, essa ampliação produziu como resultado, a expansão da ambiência das atividades relacionadas com a guerra. Se nos restringirmos, no momento atual, a um conceito de guerra, limitado à dimensão tradicional de um campo de batalha, será muito difícil que consigamos recuperar no futuro o tempo perdido. Qualquer guerra que seja iniciada amanhã, ou mais além, será caracterizada como num sentido amplo — misturando, como num coquetel, a guerra pela força das armas com a guerra executada por outros meios, que não a força das armas. O propósito deste tipo de guerra ira englobar muito mais do que simplesmente “o uso da força das armas, para obrigar o inimigo a aceitar a nossa vontade”, e sim: “usar todos os meios disponíveis ou seja, a força das armas e outros meios não envolvendo a força das armas, ligados ou não poder militar e que provocam ou não vítimas visando obrigar o inimigo a atender os nossos interesses”. CAP. 3 — UM CLÁSSICO QUE DIVERGE DOS CLÁSSICOS “A natureza especial da Guerra do Golfo... deflagrou uma revolução nos assuntos militares, ou não? Definitivamente esta tem sido uma questão de perspectiva”. Anthony H. Cordesmam, Abraham R. Wagner A 2ª Guerra do Golfo, quando comparada a qualquer outra na história, pode ser considerada como uma guerra de grande envergadura. Mais de 300 navios integrando 6 “Carrier Battle Groups”, 4.000 aeronaves, 12.000 tanques, 12.000 veículos blindados, e aproximadamente 2 milhões de soldados de mais de 30 nações tomaram parte nesta guerra. [N.T.] Os “Carrier Battle Groups” (CBG) compreendem esquadras nucleadas em um porta-aviões da classe. Estes grupamentos operativos não têm uma composição fixa, sendo estabelecida de acordo com a missão em perspectiva. Não obstante, a composição típica de um CBG compreende: um porta-aviões normalmente da classe “Nimitz”; dois cruzadores com mísseis sup/sup da classe “Ticonderoga”; um destróier com mísseis sup/sup da classe “Arleigh Burke”; um destróier da classe “Spruance” e uma fragata da classe “Oliver Hazard Perry” para tarefas anti-submarino; dois submarinos de ataque da classe “Los Angeles”; e um navio combinado de apoio logístico, suprimentos e de reabastecimento da classe “Sacramento”. Dos 42 dias de guerra, 38 foram dedicados, exclusivamente, a ataques aéreos, enquanto que as ações terrestres duraram apenas 100 horas. A força multinacional liderada pelos EUA destruiu 42 divisões iraquianas, daí resultando 30.000 perdas de vidas humanas e 80.000 prisioneiros; destruiu 3.847 tanques, 1.450 veículos blindados e 2.917 peças de artilharia, enquanto que as forças norte-americanas tiveram apenas 184 baixas. O custo total da guerra, porém, foi de 61 bilhões de dólares0. Provavelmente, porque a vitória foi alcançada de maneira tão fácil, é que até hoje, muito poucas pessoas, que integravam o alegre grupo do “Tio Sam”, avaliaram, de forma precisa, o significado desta guerra. 0 Ver “The Gulf War Final Report of the Department of Defense to Congress” ; “Defense in the New Age: Experiences and Lessons from the Gulf War” e outros relatórios de pesquisa. Alguns mais exaltados usaram este evento para reforçar o mito da invencibilidade dos EUA. Outros, considerados mais moderados, e na maioria analistas e generais que não participaram da “Tempestade no Deserto”, adotando um raciocínio complexo e sutil, consideram que este não foi um exemplo típico, e que uma guerra conduzida naquelas condições ideais não poderia servir como modelo. O primeiro capítulo (“A Unique War”) do relatório de pesquisa “Military Experiences and Lessons of the Gulf War” editado pelo “U.S. Center for Strategic and International Studies” estabelece que: “em grande parte, a singularidade da Guerra do Golfo, não nos permite extrair lições e experiências... e de fato, exatamente o quanto, no que tange a experiências importantes e de longo alcance, pode ser extraído da Guerra do Golfo é um tema capital.” (“The Gulf War”, Vol. 2, Military Science Publishing House, 1992, p 155). Logo após a Guerra no Golfo, militares chineses que foram intensamente abalados, inicialmente aceitaram o ponto de vista dos círculos militares ocidentais quase que completamente, e atualmente alguns deles começam a reavaliar as lições e experiências da Guerra no Golfo (Conmilit, Nov. 1998, Nº. 262). Este tipo de comentário tem um sabor amargo, talvez desdenhoso, e de fato, sob uma perspectiva tradicional, a “Tempestade no Deserto” não foi, em seu sentido estrito, uma guerra clássica. Entretanto, por ter sido uma guerra que ocorreu no momento em que atingimos o limiar da maior revolução nos assuntos militares até os dias atuais, ela não pode ser avaliada por padrões tradicionais ou, até mesmo, padrões já obsoletos. Quando um novo modelo de guerra exigiu uma redefinição da concepção do que significa “clássico”, as forças lideradas pelos EUA estabeleceram tal redefinição no Golfo. Somente aqueles que estavam presos às convenções tradicionais não conseguiram vislumbrar esta redefinição de modelos clássicos, no tocante ao futuro da guerra, e isto se explica pelo fato de que tais modelos só podem surgir se abandonarmos os modelos tradicionais. Não pretendemos corroborar com os norte-americanos na criação de um mito. Porem há que se considerar que: com o desenrolar transparente da “Tempestade no Deserto” evidenciando: as inúmeras nações envolvidas nos combates; a escala grandiosa; a curta duração do conflito; o reduzido número de perdas humanas; e os resultados gloriosos que surpreenderam o mundo; quem poderia negar que aquele conflito clássico, anunciando a entrada da guerra na era de integração e globalização tecnológica, tenha conseguido abrir dos grandes portais da misteriosa e estranha história da guerra mesmo que se tratasse, apenas, de um modelo criado pela tecnologia norte-americana e pela forma norte-americana de guerrear? Quando tentamos utilizar exemplos de guerras que já ocorreram, para discutir o que representa a guerra na era da integração e globalização tecnológica, a “Tempestade no Deserto” é a única que pode fornecer exemplos e modelos já testados. Na atualidade, ela constitui, em todos os sentidos, não somente o único exemplo como também um exemplo clássico e, portanto, a única “maçã” que merece um cuidadoso escrutínio. UMA ALIANÇA REPENTINA Na perspectiva de Sadam Hussein, a anexação do Kuwait, quando comparada à tomada de reféns norte-americanos, durante a revolução iraniana, parecia ser um assunto doméstico, no âmbito da grande família árabe, e além do mais, ele tinha avisado com antecedência de suas intenções. No entanto, Sadam deixou de considerar a diferença entre estes dois eventos. Quando os iranianos capturaram os reféns, este fato foi, certamente, uma tapa na face dos norte-americanos, mas a anexação do Kuwait significava o estrangulamento de todo o mundo ocidental. Certamente, linhas de suprimento vitais são mais importantes do que uma levar uma bofetada, e os EUA não tiveram alternativas que não a de encarar esta ação com a devida seriedade, o mesmo ocorrendo com outras nações, que também se sentiram ameaçadas pelo Iraque. Mas o que tinham em mente a maioria dos países árabes, ao se aliarem aos EUA, era extirpar a heresia islâmica representada por Sadam, evitando com isso o seu fortalecimento desimpedido, o que poderia prejudicar os interesses daqueles países. É muito difícil admitir que na realidade suas motivações fosse o restabelecimento da justiça para o Kuwait. A aliança anti-Saddam no mundo árabe estava centrada em torno da Arábia Saudita, Egito e Síria. De acordo com o General Khalid, um comandante das forças aliadas na “Tempestade do Deserto”, o Iraque representava uma enorme ameaça para eles, de modo que “nós não tínhamos nenhuma outra opção que não fosse a solicitação de apoio de forças amigas, em particular dos Estados Unidos” (ver “Desert Warrior”; Military Translations Publishing House, p 227). Os Norte-americanos assumiram a aliança de forma muito séria. Para maiores detalhes ver “Attachments to the Final Report of the Department of Defense to Congress – Nº. 9 – Alliance Construction, Coordenation, and Combat”. Uma comunhão internacional de interesses permitiu aos EUA interligá-los numa coalizão de aliados para atingir rapidamente o Iraque. As potências ocidentais estão suficientemente familiarizadas com as características modernas da política internacional, e assim, a aliança anti-Iraque foi montada sob os auspícios das Nações Unidas. A auréola de justiça de que se revestiu esta aliança obteve sucesso ao desarticular os preconceitos religiosos do povo árabe, de modo que Sadam foi transformado em um Saladin0 moderno, cujos planos de desencadear uma Guerra Santa contra os cristãos representaram um fracasso. Diversas nações assumiram voluntariamente a responsabilidade por tarefas vitais nesta aliança. Ainda que de má vontade, a Alemanha e o Japão, finalmente, pareciam satisfeitos em abrirem os seus cofres, e o que é mais importante, além do provimento de recursos financeiros, nenhum deles perdeu a oportunidade de enviar os seus próprios contingentes militares. Isto pode ter significado uma atitude sub-reptícia e simbólica no sentido de tornarem-se, novamente, potências globais. O Egito persuadiu a Líbia e a Jordânia a manterem-se neutros na guerra, deixando de prestar apoio ao Iraque, de modo que Sadam ficou completamente isolado. Até Gorbatchev, que necessitava do apoio norte-americano para melhorar a sua fraca posição política no âmbito doméstico, finalmente concordou tacitamente com os ataques militares conduzidos por forças multinacionais contra o seu antigo aliado. Mesmo potências como os EUA devem buscar o apoio de seus aliados, e este apoio manifestou-se, basicamente, pela concessão de legitimidade às suas ações e em termos de apoio logístico, não tendo havido um acréscimo substantivo de forças militares. A razão pela qual as diretrizes do Presidente Bush tenham conseguido obter uma ampla aprovação do público norte-americano decorreu, em grande parte, do fato dele ter estabelecido uma aliança internacional, fazendo com que o público norteamericano acreditasse nas premissas de não se tratar, apenas, da resolução problemas de outras nações, e de não serem apenas os norte-americanos a financiarem a guerra, ou que somente eles sofreriam perdas de vidas humanas. A mobilização chegou a ponto de os EUA deslocarem o seu 7º Corpo de Exército, sediado na Alemanha para a Arábia Saudita, utilizando 465 trens, 312 chatas, e 119 unidades navais pertencentes a 4 nações da OTAN. Simultaneamente, o Japão forneceu os sobressalentes eletrônicos que eram necessários, com urgência, para 0 [N.T.] Nascido em Tikrit no ano de 1138, Saladin foi o primeiro Sultão dos Ayyubid e se tornou famoso por ter recapturado Jerusalem dos Cruzados. Saladin era de origem Kurda, e durante toda a sua carreira, só admitia entre os seus acessores mais próximos, os que fossem de origem Kurda. diversos equipamentos militares norte-americanos. Todo este esforço demonstrou a crescente dependência dos EUA de seus aliados. Nesta nova era, agir isoladamente, além de ser insensato, não é uma opção realística0. Por exemplo, a aliança criou a idéia de uma necessidade comunitária. A partir da Resolução nº. 660 do Conselho de Segurança, que determinava a retirada iraquiana do Kuwait, e até a Resolução nº. 678 que autorizou os países membros a adotarem quaisquer ações necessárias, a sociedade internacional, de uma forma genérica, identificou-se com a aliança que havia sido temporariamente instituída. Cento e dez países participaram do embargo que foi estabelecido contra o Iraque, e mais do que trinta nações participaram da aplicação da força militar, e entre eles, várias nações árabes! É óbvio que cada uma destas nações já havia avaliado, antecipadamente, os seus interesses, antes de adotarem tal atitude. O ESFORÇO PARA INTEGRAR A ALIANÇA A participação dos EUA numa escala total não dói suficiente para que a frágil rede que constituía a aliança, formada num espaço de tempo muito curto, suportasse com facilidade o impacto de uma guerra. Pode-se dizer que no que tange aos políticos, esta aliança representava, apenas, o resultado de um encontro de alto 0 Cap 2 (“U.S. Military Reliance”) do relatório de pesquisa “Military Experiences and Lessons of the Gulf War” emitido pelo “U.S. Center for Strategic and International Studies” assinala que “esta guerra demonstrou, acima de qualquer dúvida, que tanto em relação à política, quanto ao apoio logístico, os militares Norteamericanos devem confiar em Estados amigos e aliados. Sem a considerável ajuda de outros países, os Estados Unidos não tem como conduzir qualquer tipo de operação de emergência de grande porte. Com a exceção de operações de pequeno porte, a opção de prosseguir isoladamente é inconcebível, e todas as decisões políticas nas áreas de defesa e diplomática devem basear-se neste entendimento.” nível, seguido de uma cuidadosa avaliação de interesses, da mera assinatura de um contrato, ou de um simples compromisso verbal assumido em contato telefônico direto. No entanto, no que tange às tropas que desenvolveriam as ações de guerra, nenhum detalhe poderia deixar de ser observado. De modo a evitar que soldados norte-americanos violassem as postulações ou mandamentos islâmicos, além de ser estipulado que deveriam submeter-se estritamente aos costumes dos países em que estivessem aquartelados. As forças armadas norte-americanas chegaram até a alugar o iate “Cunard Princess”, mantendo-o fundeado ao largo, para prover recreação no estilo ocidental para as tropas norte-americanas. Para impedir a animosidade entre as forças aliadas, que poderia ser gerada por uma retaliação de Israel contra os ataques de mísseis “Scud”, os Estados Unidos providenciaram meios de defesa antiaérea aos israelenses, em um grande esforço para preservar a integridade da aliança. NASCE UM NOVO TIPO DE ALIANÇA Um dos aspectos mais significativos da rápida formação desta aliança foi que ela representou o fim de uma era. Aquela das alianças que tinham uma composição tradicional preestabelecida, iniciada em 1879 com a assinatura da aliança militar entre os impérios germânico e austro-húngaro. Com o término da Guerra Fria, o período em que a formação de alianças tendo como base a ideologia deixou de existir; enquanto que o princípio de formação de alianças tendo como base os interesses foi elevado à primazia. Sob a legenda da “realpolitik”, onde os interesses do Estado são prioritários, o enfoque de qualquer aliança reflete claramente esses interesses, e por vezes, tal prioridade pretere até mesmo considerações de caráter moral. Sem dúvida alguma, o fenômeno das alianças continuará a existir, mas na maioria dos casos elas irão representar coalizões baseadas em interesses variados e de curta duração, o que significa dizer, que não haverá mais alianças formadas, basicamente, por questões morais, sem a presença de interesses plenamente caracterizados. Diferentes períodos correspondem a diferentes interesses e objetivos, e estes serão os fatores que determinarão a formação ou não de alianças. Um crescente pragmatismo, e uma desvinculação de condicionantes morais, são as características das modernas alianças. As relações baseadas em interesses mútuos entre os Estados modernos, da mesma forma como entre organizações transnacionais, ou, até mesmo entre forças regionais estão se tornando, portanto, cada vez mais efêmeras. Como entoado pelo cantor de rock Cui Jiang: “Não é que eu não esteja compreendendo, é que este mundo está mudando rapidamente”. Na atualidade, as constantes mudanças nas combinações de forças, em paralelo à era da permanente mudança no processo de integração e globalização tecnológica, deram origem a determinadas alianças tácitas, que não são, de forma alguma, acidentais. Portanto, a aliança que foi formada, repentinamente, para a Guerra do Golfo, abriu, formalmente, as cortinas de uma nova era de alianças. A OPORTUNA LEI DE REORGANIZAÇÃO Freqüentemente, os arrogantes norte-americanos, engajam-se em ações que os levam a refletir posteriormente quanto aos seus erros. Esta atitude, aparentemente contraditória, sempre provoca assombro naqueles que desejam testemunhar os presunçosos norte-americanos sofrendo. Ao mesmo tempo, tal atitude permite que os norte-americanos, seguidamente, obtenham consideráveis benefícios. Parece, na realidade, que os norte-americanos sempre são capazes de encontrar uma solução para dar início a uma nova ação militar, baseados nas lições que foram aprendidas em ações militares anteriores. As disputas relativas a diferentes pontos de vista e interesses entre as diversas facções no âmbito das forças armadas norte-americanas existem já há algum tempo, e isto também é uma verdade em qualquer país. A competição entre as forças singulares norte-americanas, visando à proteção de seus próprios interesses e obtenção de prestígio, é bem conhecida, e neste aspecto eles são inigualáveis. A esse respeito, um fato marcante ocorreu 60 anos atrás, na guerra contra o Japão, quando na busca de priorizar e valorizar a participação de suas respectivas forças singulares, tanto MacArthur quanto Nimitz propuseram estratégias específicas e diferentes, para as ações no Pacífico. Até mesmo o presidente Roosevelt, com toda a sua sagacidade e circunspeção, teve problemas para estabelecer um equilíbrio entre estes dois líderes militares. Um outro fato que ilustra essa disputa interna ocorreu durante a Guerra do Vietnã. missões de bombardeio, tinham As esquadrilhas formadas para executar por reunirem aviões de diferentes forças singulares, que receber instruções de diversos comandos diferentes e ao mesmo tempo. Até aproximadamente 15 anos atrás, existiam alguns sistemas de comando separados e independentes, sem uma definição clara de subordinação, e isto teve conseqüências desastrosas para as tropas norte-americanas aquarteladas em Beirute, provocando a morte de aproximadamente 200 fuzileiros navais. Quando o General Norman Schwarzkopf foi nomeado Comandante-em-Chefe das forças aliadas para a operação “Tempestade no Deserto”, ele ainda guardava na memória, os problemas pelos quais passou em Granada, quando era o segundo em comando da Força-Tarefa Combinada. Nesta operação, cada uma das forças singulares norte-americanas participou de forma independente. O questionamento que surgiu, em decorrência deste fato foi: em Operações de Forças Combinadas, quem é que comanda quem? Chega a ser irônico, que este tipo de problema, que incomodou as Forças Armadas norte-americanas por tantas décadas, não tenha sido solucionado por generais com grande experiência de combate ou especialistas com profundos conhecimentos em organização administrativa e militar, e sim, por dois congressistas chamados Goldwater e Nichols. A Lei de Reorganização do Departamento de Defesa, proposta por estes dois congressistas em 1986, criou um instrumento legislativo para resolver o problema do comando unificado de forças singulares, quando empregadas de forma combinada em combate. No relatório de pesquisa sobre a Guerra do Golfo, elaborado para a Câmara dos Deputados por L. Aspin e W. Dickinson, a “Lei de Reorganização do Departamento de Defesa” é bastante elogiada, sendo citado que “esta Lei assegurou que as três Forças Singulares norte-americanas iriam unir-se para lutar a mesma guerra”. O mencionado Relatório também citou o Secretário de Defesa Cheney quando este declarou que “é a legislação que tem o impacto de maior alcance no âmbito do Departamento de Defesa, desde a “Lei de Segurança Nacional”“. Os oficiais generais, no âmbito das Forças Armadas, também elogiaram bastante o a “Lei de Reorganização do Departamento de Defesa”, tendo o Almirante Owens, que tinha exercido o cargo Vice-Chefe da Junta de Chefes do Estado-Maior declarado: “a Lei de Reorganização do Departamento de Defesa de Goldwater e Nichols é uma das três grandes revoluções em assuntos militares ocorridas nos Estados Unidos”; “esta lei estipulava que em qualquer conflito, a guerra seria conduzida por Forças Combinadas”, e “os Chefes de Estado-Maior das Forças Singulares não eram mais Comandantes Operativos”. Os Comandantes Operativos são os 5 Comandantes-em-Chefe de Teatros (Journal of the National Defense University; Nº. 11, 1998, p 46-47. Conmilit; Nº. 12, 1998; p 24). O coroamento da Lei Goldwater e Nichols viria em seguida, quando questões não resolvidas no Oriente Médio provocaram uma guerra. Numa ocasião extremamente oportuna para os norte-americanos testarem a eficácia da Lei de Reorganização, Saddam insensatamente invadiu o Kuwait e esta ação representou uma oportunidade única. Neste sentido, em vez de dizer que a Lei de Reorganização foi criada no momento oportuno, seria melhor considerar que foi a Guerra do Golfo que teve início em um momento oportuno. Powell e Schwarzkopf tiveram a sorte de ser os primeiros beneficiários da Lei de Reorganização, e ao mesmo tempo, tornaram-se os dois mais poderosos generais da história militar norte-americana. Na condição de Chefe da Junta de Chefes de Estado-Maior, Powell, pela primeira vez, assumia, de forma clara, o cargo de principal assessor militar do Presidente dos Estados Unidos, e desta forma, recebia suas ordens diretamente do Presidente da República e do Secretário de Defesa. Por sua vez, Powell transmitia suas ordens, (baseadas nas diretrizes superiores), diretamente às três Forças Singulares, não tendo mais que atuar como coordenador e mediador de intermináveis disputas entre os respectivos Chefes de Estado-Maior. Do outro lado do mundo, na condição de Comandante Operativo, Schwarzkopf era poupado das intrigas do Pentágono, e tinha o poder real em suas mãos. No tocante aos rumores e conversas oriundas do Pentágono, ele tinha a liberdade de ouvir o que lhe interessasse e aplicar o que julgasse adequado, distante de seu país, atuando como um General, fora do alcance do seu monarca, e que tinha sob as suas ordens, um grande Exército que se espalhava pelo Golfo, satélites no espaço, mergulhadores agindo sob a superfície do mar, e até navios roll-on/roll-off. Esta condição permitiu que ele exercesse a plena autoridade, que lhe foi conferida pela Lei de Reorganização do Departamento de Defesa, sobre todas as Forças Singulares, sempre que necessário e sem quaisquer dúvidas. Por exemplo, quando os Comandantes de Unidades de Fuzileiros Navais na linha de contato0 solicitaram a realização de um desembarque anfíbio nas costas do Kuwait, Schwarzkopf examinou a situação como um todo, e de forma decidida, exerceu o seu poder de veto. Na ocasião, optou por prosseguir na concentração de meios para a operação “Left Hook” que integrava o seu plano de ação geral desde o início das ações. A aplicação inconteste de uma lei, que ainda não havia sido aplicada, decorridos cinco anos de sua criação, em uma guerra que ocorreu na mesma época, só pode 0 [N.T.] Tradução adotada na Marinha do Brasil (Corpo de Fuzileiros Navais) para o termo “front line”. ser explicada pela mentalidade de comprometimento de uma sociedade, estabelecida em bases legais, como é a norte-americana. A nova estruturação de comando, que derivou da aplicação desta legislação, tornou-se, além disso, o mais bem sucedido e lógico sistema de comando militar, desde a criação de Forças Singulares independentes. O seu resultado direto foi a redução dos níveis de comando, o incremento da confiabilidade no comando, e a transformação da antiga e profundamente enraizada estrutura militar de comando em uma estrutura em rede interativa, permitindo, como efeito colateral, que um maior número de unidades de combate, pela primeira vez, compartilhasse as informações do teatro de operações. Examinando a Lei de Reorganização sob uma perspectiva mais ampla, vemos que esta reestruturação não se deu por uma coincidência fortuita, e sim, em conformidade às exigências naturais de uma nova era impondo-se às antigas relações militares de comando. Uma revisão no comando da estrutura militar, que se encontrava disperso entre as várias forças. Uma revisão, implicando na criação de uma “superautoridade”, englobando a autoridade das Forças Singulares, e que estaria empenhada na consecução de determinados propósitos temporários, e assim sendo, compatibilizaria as diversas tarefas a serem executadas em qualquer Teatro de Operações. O estabelecimento da Lei de Reorganização nos Estados Unidos, e os efeitos que produziu no âmbito das Forças Armadas norte-americanas constituem um tema para análise, e qualquer nação que pretenda vencer as guerras no século XXI deverá, inevitavelmente, encarar as opções de se “reorganizar”, ou, ser derrotada. Não existe alternativa. INDO ALÉM DO COMBATE INTEGRADO AR-TERRA Originalmente, o “Combate Integrado Ar-Terra” era uma estratégia idealizada pelos militares norte-americanos para enfrentar do enorme número de tanques pertencentes ao Pacto de Varsóvia, e que poderiam praticamente inundar as planícies européias a qualquer momento. Os idealizadores desta estratégia, todavia, amargaram o fato de jamais terem podido demonstrar a sua eficácia. O Combate Integrado Ar-Terra foi incorporado pelo Exército dos EUA em 1982, e tem sido a principal doutrina militar nos últimos 20 anos. Esta doutrina prescreve o emprego de uma força combinada com meios aéreos e terrestres, com uma grande ênfase na cooperação interforças. O propósito desta doutrina é o de impedir que as forças de segundo escalão reforcem a frente de combate de um inimigo, atacando-as em pontos de passagem obrigatórios como pontes e túneis. Neste contexto, as forças terrestres engajam o primeiro escalão das forças inimigas, e as unidades aéreas engajam as forças de segundo escalão do inimigo, por traz das linhas inimigas. Durante a 2ª Guerra do Golfo a cidade de Basra foi considerada como um ponto de passagem obrigatório para os reforços iraquianos. A Guerra do Golfo, todavia, proporcionou o palco ideal para uma completa demonstração por parte dos militares norte-americanos, que eram plenos de criatividade e ansiosos por uma ação de guerra. No entanto, as características físicas do teatro de operações, [bem como a força inimiga], eram um pouco diferentes daquelas para as quais a concepção do “Combate Integrado Ar-Terra” havia sido desenvolvida. A “Tempestade no Deserto” era uma campanha eminentemente aérea, e que durou algumas dezenas de dias, tendo restado muito pouco a fazer na fase terrestre da campanha — a Operação “Espada do Deserto” — desencadeada no último momento, compreendendo um brilhante envolvimento pela ala esquerda, e que durou apenas 100 horas. A ação terrestre não foi o elemento decisivo final, como pretendido pelo Exército, e o término das ações soou mais como um final brusco de um concerto, após o seu primeiro movimento. O General Merrill McPeak, Chefe do Estado-Maior da Força Aérea durante a Guerra do Golfo, declarou: “esta foi uma guerra que envolveu um massivo emprego do poder aéreo, e uma vitória das unidades das Forças Aéreas dos EUA e demais países”, e que “tratava-se, também, da primeira guerra na história na qual o poder aéreo fora empregado para derrotar forças terrestres” (Air Force Journal (U.S.) Maio, 1991). Em uma declaração anterior à Guerra do Golfo, o seu antecessor, Michael J. Dugan observou que “a única maneira de evitar muito derramamento de sangue numa guerra terrestre e utilizando-se a Força Aérea”. Embora tenha sido considerado que Dugan se excedeu eu sua autoridade, tendo por isso sido removido de seu cargo, suas observações não estavam de todo erradas. A previsão de Douhet de que “o teatro de operações aéreo será o decisivo” pareceu ter obtido uma confirmação tardia. No entanto, o que aconteceu no espaço aéreo sobre o Golfo excedeu, em muito, a proposição de obtenção da vitória através da ação aérea. Quer sobre o Kuwait, quer sobre o Iraque, nenhuma ação aérea configurou os galantes duelos pela supremacia aérea, mas sim, uma campanha aérea que combinou todas as formas de emprego do poder aéreo, tais como: reconhecimento, alarme aéreo 0 antecipado, bombardeio, “dogfight”0, comunicações, ataques [N.T.] A expressão “dogfight” designa o combate aéreo à curta distância, travado diretamente entre dois aviões. eletrônicos, ações de comando e controle, etc., incluindo, também, a luta pela ocupação do espaço cósmico e do ciberespaço. Como resultado destas ações os norte-americanos, criadores do conceito do “Combate Integrado Ar-Terra”, foram um pouco além do idealizado por Douhet. Mesmo assim, terão de esperar vários anos, até perceberem que ao empregarem a teoria de operações integradas num combate real, o alcance deste processo irá muito além daquilo que foi inicialmente imaginado, e que inclui as ambiências terrestre, marítima, aérea, e do ciberespaço. ORDENS DE MISSÃO AÉREA — A CHAVE COMBATE OMNIDIMENSIONAL Embora ainda seja necessário algum tempo para que os resultados da Guerra do Golfo sejam assimilados, este conflito já está destinado a tornar-se o ponto de partida para a teoria do “combate combate omnidimensional”, omnidimensional proposta pela elite do Exército norte-americano, quando esta subitamente passou a encarar a realidade. O mais interessante é que, embora pareça que os norte-americanos chegaram tardiamente a esta conclusão, isto não teve qualquer efeito na antecipação que demonstraram ao utilizarem a chave “combate combate omnidimensional”, ordens de missão omnidimensional as famosas “ordens aérea 0”. As “ordens ordens de missão aérea” aérea constituíam um documento diário de quase 300 páginas, elaborado de forma combinada pelo Exército, Marinha e Aeronáutica, [e Corpo de Fuzileiros]. Este documento permitia que Schwarzkopf, o comandante supremo das forças aliadas, mesmo sendo um Oficial do Exército, a emitisse ordens de comando para toda a Força Aérea aliada. As “ordens ordens de missão aérea” aérea foram a alma de toda a campanha aérea, e diariamente selecionavam os melhores alvos para serem atacados por todas as aeronaves, em obediência a um planejamento operacional geral de ataque. De acordo com previsto nas “ordens ordens de missão aérea”, aérea processadas por meios digitais, diariamente, mais de 1000 aeronaves, isoladas ou integrando grupos interforças, decolavam da Península Árabe, da Espanha, da Inglaterra e da 0 Tanto no relatório do Departamento de Defesa, quanto no relatório de L. Aspin, enviados à Câmara dos Deputados, relação às “ordens ambos fazem elevadas considerações com de missão aérea”, assegurando que este instrumento “orquestrou uma batalha aérea integrada e planejada de forma precisa”. Turquia, para o cumprimento de missões de ataque com alcances transnacionais, de forma precisa e coordenada. Na visão da Marinha dos EUA, este sistema de comando estava sob forte influência da Força Aérea, e devido a isso, adotou o procedimento de manter algumas aeronaves sob seu controle direto e exclusivo de modo a poder empregá-las, quando surgisse uma oportunidade de realçar a atuação isolada da Marinha. Esta oportunidade nunca ocorreu. Em última análise, o sistema de “ordens ordens de missão aérea” aérea organizou a maior e mais complexa campanha aérea na história da guerra. Além do que foi mencionado, as “ordens ordens de missão aérea” aérea serviram como modelo organizacional de comando, para todas as demais operações de combate. Uma única “ordem” representou a melhor forma de combinar os efetivos de combate das forças singulares, e a complexidade e o sucesso na combinação de forças multinacionais, foi realmente algo espetacular. Quanto a apenas este último aspecto, foi excedido tudo aquilo que havia sido vislumbrado pelos arquitetos do conceito de “Combate Integrado Ar-Terra”. Em outras palavras, os militares norteamericanos, sem querer, proporcionaram ao Deus da guerra uma nova área na qual ele nunca havia penetrado. QUEM É O REI NAS AÇÕES DE GUERRA TERRESTRE? Isoroku Iamamoto foi, sem dúvida, o mais inovador e extraordinariamente talentoso militar de sua era; o emprego de porta-aviões no ataque a Pearl Harbor e a grande vitória que alcançou, representou um lance de gênio na história das batalhas navais. O que é difícil de entender é que o mesmo Yamamoto foi incapaz de perceber o significado historicamente marcante de suas próprias táticas. Após comandar a Esquadra Combinada, aplicando um severo golpe na Marinha norte-americana, ele ainda mantinha-se preso à crença de que somente os encouraçados representavam a força decisiva no mar, e assim, mais uma vez, jogava a chave que abriria os portais da vitória, e que já estava em seu poder, na vastidão das ondas do Oceano Pacífico. Enquanto que uma pessoa que cometa um erro pela primeira vez seja digna de pena, uma segunda pessoa, que cometa o mesmo erro, é simplesmente inacreditavelmente estúpida, principalmente se for o caso de cometer um mesmo tipo de erro por falta de previsão. O que é lamentável é que na história da guerra existam exemplos freqüentes deste tipo de falha, ou seja, agir sem pensar. Como aconteceu com Isoroku Yamamoto ao seu tempo, na atualidade, o Exército norte-americano, através do emprego de helicópteros, esmagou as unidades blindadas e mecanizadas iraquianas. Não obstante, assim que a fumaça dos canhões no Golfo dissipou-se, ocorreu um retrocesso no pensamento militar ao seu nível anterior à guerra, com a colocação dos helicópteros num segundo plano. quando deveriam, por todos os motivos, emergir daquela guerra como o sistema de armas em evidência. Comenta-se que, durante toda a fase terrestre da guerra, a não ser por uma desesperada ação desencadeada pela Divisão Blindada “Medina”, pertencente à Guarda Republicana, quando se viu cercada, ao sul de Basra pelo 7º Corpo de Exército norte-americano, praticamente não houve nenhuma interação entre tanques digna de menção. No entanto, os norte-americanos que de maneira ampla e clara empregaram helicópteros, inaugurando uma nova era em ações de guerra terrestre, passaram a ampliar os investimentos em outras armas, incluindo tanques, enquanto que, alocações de verbas para helicópteros foram as primeiras a sofrer reduções. Desta forma, mantendo-se presos a hábitos obsoletos, os norte-americanos ainda estão considerando o tanque como a arma decisiva nas ações de guerra terrestre do futuro. De acordo com previsões de especialistas militares russos e ocidentais, “a expectativa de sobrevivência de um tanque como um alvo individual, em um campo de batalha é de, no máximo, 2 a 3 minutos, e sua expectativa de sobrevivência, estando integrado a uma unidade blindada do porte de Batalhão ou Companhia é de 30 a 50 minutos”. Esta é a estimativa de especialistas, apesar de a maioria dos países ainda terem nos tanques suas armas principais. (Soldier (Rússia) Nº. 2, 1996). Em um artigo titulado “The Future of Armored Warfare”, Ralph Peter declara que “tanques voadores constituem algo que se tem desejado há muito tempo, mas quando se considera o uso racional de combustível, além dos fatores físicos e psicológicos em uma batalha, a necessidade do futuro ainda é por sistemas terrestres. Tendo em vista que os helicópteros de ataque já são uma concentração de várias características que foram vislumbradas para os tanques voadores, nós acreditamos que os helicópteros de ataque possam complementar os veículos blindados, mas não substituí-los.” (Parameters; Outono; 1997). Desde a Guerra do Vietnã os helicópteros vêm demonstrando sua capacidade nas mãos dos norte-americanos, e pouco tempo depois foi a vez da União Soviética demonstrar essas capacidades excepcionais nas regiões montanhosas do Afeganistão, da mesma forma como os britânicos nas Ilhas Malvinas. No entanto, como os oponentes eram, em grande parte, elementos de guerrilha e efetivos de infantaria não blindados, o desafio que os helicópteros iriam representar contra os tanques teve que esperar por mais 20 anos. A 2ª Guerra no Golfo, finalmente, proporcionou aos helicópteros a oportunidade de mostrar a sua capacidade. Neste conflito, sem levar em conta os helicópteros pertencentes às demais forças aliadas, os norte-americanos deslocaram 1600 unidades de vários modelos para o Golfo, e este enorme grupo já seria suficiente para constituir um Exército formado exclusivamente de helicópteros. No entanto os norte-americanos, que até então tinham dado vazão a todo o seu espírito criativo, não demonstraram qualquer originalidade quanto ao emprego de seus helicópteros. Do mesmo modo que os franceses procederam na Segunda Guerra Mundial ao dispersarem seus tanques entre as unidades de infantaria, os norte-americanos empregaram os seus helicópteros como um elemento subordinado e de apoio às unidades mecanizadas e outros elementos da Força Terrestre. Felizmente, os helicópteros, que estavam destinados a marcar a sua presença nesta guerra, não permitiram que o seu posicionamento secundário cerceasse o seu magnífico desempenho. Ao mesmo tempo em que os norte-americanos enalteciam o “Patriot”, o F-117, os mísseis “Tomahawk” e outros astros dos campos de batalha via CNN, os helicópteros foram esquecidos, (com exceção do “Apache” que era o preferido quando da divulgação de acertos). Além do que consta no “Relatório Final ao Congresso”, elaborado pelo Departamento de Defesa, após a guerra, poucas pessoas ainda se recordam de que foram os helicópteros, e não qualquer das novas armas eleitas como as preferidas, que executaram as missões de maior significado na “Tempestade do Deserto”. Nos 20 minutos que antecederam o início do bombardeio contínuo, e que durou mais de um mês, os helicópteros MH-53J e AH-64, após um traslado de varias horas de vôo em perfil rasante, cumpriram a vital missão de destruição antecipada dos radares do sistema de alarme aéreo antecipado iraquiano, empregando mísseis “Hellfire”, proporcionando assim, uma rota segura para os grupos de bombardeio e demonstrando a incomparável capacidade de penetração dos helicópteros. Na qualidade de plataforma aérea mais flexível no campo de batalha, os helicópteros também cumpriram inúmeras missões de transporte de suprimentos, evacuação aeromédica, busca e resgate, reconhecimento, missões de contramedidas eletrônicas, e etc. Há que se ressaltar, ainda, que durante a Batalha de Khafji, os helicópteros constituíram a força principal que enfrentou a ofensiva iraquiana forçando-os, finalmente, a recuar. Durante a guerra, o fato que realmente causou uma impressão marcante e demonstrou o enorme potencial do helicóptero foi a “Operação Cobra”. Nesta operação a 101ª Divisão Aerotransportada empregou mais de 300 helicópteros numa operação de apoio logístico do tipo “leapfrog0”, cobrindo o maior alcance na história da guerra, estabelecendo uma base de operações avançada para os helicópteros “Cobra”(AH-1H), a mais de 100 km no interior do território iraquiano. Subsequentemente, a partir desta base avançada, foi possível interromper a única rota de fuga para as tropas iraquianas, que estavam dispersas na região do vale do Rio Eufrates, bem como, interceptar as tropas iraquianas que fugiam pela estrada Hamal. Esta foi, definitivamente, a mais importante operação tática da fase terrestre de toda a guerra, tornando-se a constatação de que, a partir daquele momento, os helicópteros eram perfeitamente capazes de conduzir, de forma independente, operações de grande envergadura. Quando enormes grupos de soldados iraquianos correram de suas fortificações, destruídas pelos helicópteros, e ajoelharam-se implorando pela rendição, eles foram reunidos em um único grupo pelos helicópteros, da mesma forma que se arrebanha o gado nas planícies do oeste norte-americano. Desta forma, a impressão de que somente a infantaria poderia, em última instância, definir a batalha terrestre, foi radicalmente modificada por esses “vaqueiros voadores”. Originalmente, no entanto, o propósito imaginado da operação “leapfrog” por helicópteros era somente o de prover apoio para as unidades blindadas, as quais seriam responsáveis pelas ações ofensivas principais. Mas o inesperado sucesso das unidades de helicópteros fez com que o plano original fosse relegado em função do desenvolvimento das ações no campo de batalha. Devido a esta evolução nas ações no campo de batalha, Schwarzkopf teve que antecipar a ofensiva do 5º Corpo do Exército em 15 horas. No entanto, ainda que sob o comando do General Franks, a velocidade de avanço através do deserto tenha sido superior àquela alcançada por Guderian, que se notabilizou em sua época, ao lançar a “blitzkrieg”, Franks não obteve o mesmo reconhecimento 0 [N.T.] A designação “leapfrog” significando “pulo de sapo” é empregada porque os helicópteros ficam se deslocando entre dois pontos, efetuando sucessivos transportes de cargas, assemelhando-se a sapos pulando de um lado para outro. histórico ou reputação. De fato, ele foi repreendido por “mover-se lentamente, passo a passo, como uma senhora idosa”. Após a guerra, o general Franks contestou as críticas oriundas do Quartel General em Rhiadh, baseando-se no argumento de que os iraquianos ainda tinham capacidade de combate0. Na verdade, nem aqueles que criticaram, ou os que refutaram as críticas, tinham percebido da verdadeira essência do problema. A razão pela qual a mobilidade dos tanques sob o comando do General Franks foi criticada decorre, precisamente, de uma comparação com os helicópteros. Até os dias de hoje, não ocorreu um exemplo de combate, em que qualquer tipo de tanque tenha conseguido igualar a velocidade de engajamento em combate de um helicóptero. Na verdade, não se trata, apenas, de uma competição quanto à mobilidade. Tendo sido os antigos “reis das ações de guerra terrestre”, os tanques, estão sendo desafiados pelos helicópteros em todas as áreas de atuação. Enquanto que os tanques têm que sofrer um significado desgaste para sobrepujar o coeficiente de fricção com o terreno, a área de atuação do helicóptero, acima do tope das árvores, os torna imunes a quaisquer obstáculos terrestres. Adicionalmente, esta excepcional mobilidade é suficiente para compensar a deficiência de não disporem de uma blindagem pesada. Como plataformas móveis de tiro, o poder de fogo dos helicópteros, em nenhum aspecto, é inferior ao dos tanques, e este fator é o mais importante no tocante aos tanques, visto que foi esta, a principal característica que determinou a sua ascensão no âmbito das ações de guerra com a denominação “tanque”. O que é ainda pior para os tanques é o esforço necessário para se organizar um razoável grupo de assalto, (só a faina de deslocar um determinado número de tanques para uma área de concentração já se constitui um imenso problema), e o risco daí decorrente, (quando um grande número de tanques é reunido eles se tornam extremamente vulneráveis a ações de iniciativa de defesa por parte de um inimigo), de modo que eles não têm nenhuma vantagem que se possa mencionar, quando comparados aos 0 helicópteros, os quais apresentam um excelente “Into the Storm: A Study in Command” é o livro que o General Franks escreveu depois de ter ido para a reserva, no qual ele menciona que a velocidade com que o VIIº Corpo de Exército se deslocou não se constituiu num erro, e que as críticas oriundas de Rhiadh não eram justas. (Ver Army Times (U.S.), 18 de agosto de 1997). desempenho tanto no emprego massificado em ações de guerra convencional, quanto de forma dispersa, engajando em ações antiguerrilha. De fato, tanques e helicópteros são inimigos naturais, mas o tanque está muito longe de ser um competidor do mesmo nível que um helicóptero. Até mesmo o obsoleto AH-1H “Cobra”, (para não mencionar o AH-64 “destruidor de tanques”) destruiu mais de cem tanques durante a Guerra no Golfo, sem sofrer nenhuma perda. Diante da poderosa capacidade de ataque dos helicópteros, quem ainda poderia afirmar que “a melhor arma para se encarar um tanque é um tanque?”0. Agora, nós podemos proclamar que os helicópteros são os verdadeiros exterminadores de tanques. Este novo astro, que gradualmente elevou-se sobre as ondas no Golfo, está no processo de alcançar sua própria coroação, como conseqüência de suas ilustres conquistas durante a Guerra do Golfo. Não há dúvidas que é só uma questão de tempo, até que ele provoque a retirada do tanque do campo de batalha. Em muito pouco tempo o slogan, “vencer uma batalha terrestre a partir do ar”, tornar-se-à, cada vez mais, uma realidade, e um crescente número de Comandantes de forças terrestres estão atingindo um consenso quanto a este aspecto. Mais ainda, as novas concepções de “Exército aéreo” e da “guerra terrestre aérea”, nas quais o helicóptero é a arma principal, poderão vir a ser jargões militares comuns, constantes em qualquer glossário de termos militares. UM OUTRO JOGADOR ESCONDIDO POR TRÁS DA VITÓRIA Deixando de lado a consideração de que o Presidente Bush, na qualidade de Comandante-em-Chefe das Forças Armadas conhecia, antecipadamente, a hora do início das ações no Golfo, quando analisamos este conhecimento do ponto de vista da CNN, poder-se-ia dizer que o mundo inteiro, juntamente com o Presidente Bush, tomou conhecimento do início da guerra, no exato momento em que ele ocorreu, e evidenciou os seus primeiros impressionantes eventos. Numa era da informação compartilhada, um Presidente não tem, na realidade, muitos privilégios especiais além daqueles de um cidadão comum. 0 Ver Apêndice ao “Relatório Final do Departamento de Defesa ao Congresso”; p 52. E é neste ponto que as ações de guerra modernas diferem de quaisquer ações de guerras no passado, porque os eventos, ao serem informados em tempo real ou quase real pela mídia, transformam-se num programa de televisão, que todas as pessoas comuns podem assistir. Desta forma, a mídia de forma imediata, passou a ser parte integrante da guerra, não sendo mais um mero veículo que proporcionava apenas informações oriundas de um distante campo de batalha. Diferente da transmissão de um jogo de futebol numa Copa do Mundo, tudo o que as pessoas viram, não considerando o que foi filtrado pela subjetividade dos repórteres0, também tinha que passar por uma revisão de segurança nos escritórios conjuntos de imprensa estabelecidos em Dhahran e Rhiyadh. Possivelmente, tanto os militares norte-americanos, quanto os representantes da mídia aprenderam as lições da Guerra do Vietnam, onde a discórdia entre eles foi muito grande. Desta feita, o relacionamento entre as agências de notícias e os militares transcorreu de uma forma muito boa. Há um fato que ilustra perfeitamente este tema. De um total superior a 1300 notícias, que foram liberadas durante o período da guerra, somente 5 foram previamente remetidas a Washington para revisão, e destas, 4 foram aprovadas numa questão de horas, enquanto que a única remanescente foi cancelada pela própria imprensa. Contando com o apoio previamente acertado com os novos repórteres, os Comandantes no campo de batalha puderam influenciar, com sucesso, o mundo inteiro, fazendo com que as pessoas vissem aquilo que os militares desejavam que fosse visto, ao mesmo tempo em que, ninguém conseguiu ver aquilo que eles não queriam que fosse visto. A imprensa norte-americana, de maneira geral, abandonou a sua ostensiva neutralidade, integrando-se entusiasticamente à causa anti-Iraque, atuando de forma coordenada com os militares norte-americanos, como se num perfeito ato de comédia entre dois atores, adotando de forma tácita e decidida um mesmo enredo para a guerra. Desta forma, a força da mídia e a do Exército aliado atuaram como uma força combinada em relação ao ataque ao Iraque0. 0 Os 1300 repórteres enviados à frente de combate estavam todos a par das “Revised Regulations Regarding Gulf War News Reports”, emanadas pelo Pentágono, de modo que cada repórter exerceu uma autocensura com relação ao que podia e não podia ser informado Imediatamente após a invasão do Kuwait pelo Iraque, rapidamente surgiram notícias, nos diversos canais de mídia, dando conta de que uma imponente força norte-americana estava sendo enviada para a Arábia Saudita. Estas notícias criaram hesitação entre as forças iraquianas que estavam posicionadas na fronteira entre o Kuwait e a Arábia Saudita, provocando o seu recuo. Um dia antes do início da operação “Tempestade no Deserto”, a mídia ocidental, novamente, divulgou amplamente a notícia de que uma Força Naval norteamericana, nucleada em porta-aviões, estava cruzando o canal de Suez. Esta informação confundiu Saddam Hussein, levando-o a acreditar que as forças norteamericanas ainda não haviam completado o seu traslado. Do mesmo modo, sem o realce proporcionado pela mídia, nenhuma das chamadas armas de alta-tecnologia, enviadas para a 2ª Guerra do Golfo, seriam tão maravilhosas como as pessoas foram levadas a crer. Ao longo das 98 conferências com a imprensa, realizadas durante todo o curso da guerra, as pessoas viam imagens de mísseis de precisão penetrando em edifícios através de aberturas de ventilação para explodir em seu interior; mísseis “Patriot” interceptando mísseis “Scud”; além de inúmeras outras imagens que causaram uma profunda impressão favorável. Tudo isso representou um imenso choque visual para o mundo inteiro, incluindo para os iraquianos. Esta ação da mídia gerou um mito no tocante aos poderes inigualáveis das armas norte-americanas, gerando, desta forma, a crença de que o “Iraque iria inevitavelmente perder a guerra, e que os Estados Unidos estava destinados a serem os vencedores”. É óbvio, que a mídia ajudou os norte-americanos de forma significativa. Poderia até ser dito que, intencionalmente ou não, os militares norte-americanos e a mídia ocidental associaram-se para criar o laço que iria ser usado para enforcar no cadafalso o Iraque de Saddam. No “Resumo Operacional” revisto após a guerra, os norte-americanos tiveram que se esforçar para sugerir que “o impacto das notícias da mídia foi capaz de exercer um efeito dramático no direcionamento estratégico e nos propósitos das operações militares”. No recém editado manual operativo FM100-6 (“Information Operations”) 0 Ver Apêndice ao “Relatório Final do Departamento de Defesa ao Congresso”; Seção 19, “News Reports”. o tema ainda é mais explicitado ao citar o exemplo da “guerra da mídia” durante a Guerra do Golfo. Parece que nos conflitos do futuro, além das ações militares básicas, a mídia tende a representar um ator a mais na guerra, e irá desempenhar um papel comparável ao das operações militares, na determinação do curso das guerras. Ao contrário da propaganda de guerra, que é dotada de uma característica excessivamente subjetiva, sendo facilmente rejeitada pelos oponentes ou neutros, a mídia por ser habilmente camuflada como uma informação objetiva tem um impacto silencioso e que é difícil de ser avaliado. No Golfo, da mesma forma que as forças aliadas lideradas pelos EUA privaram o Iraque de seu direito de falar em termos militares, a poderosa mídia ocidental privou-o, também, politicamente, do direito de falar, de se defender, e, até mesmo, do seu direito de merecer manifestações de simpatia e apoio. Se comparada à fraca voz da propaganda iraquiana, que retratava Bush como o “grande Satan”, dotado de uma maldade além da possibilidade de perdão, a imagem de Saddam, como um agressor ensandecido pela guerra, foi difundida de uma forma mais convincente. Foi precisamente a assimetria de força da mídia adicionada à assimetria de força militar que, como numa seqüência rápida de golpes de boxe, atingiu o Iraque, tanto no campo de batalha, quanto moralmente, com isso determinando a derrota de Saddam. No entanto, os efeitos da ação da mídia têm sempre representado uma faca de dois gumes. Isso significa que, na medida em que ela é direcionada contra um inimigo, simultaneamente, em outra frente, ela pode se tornar uma espada afiada apontando para você mesmo. Com base nas informações obtidas após a guerra, a razão pela qual a ação terrestre foi abruptamente interrompida depois de 100 horas, decorreu do fato de Bush ter sido influenciado por análises precipitadas, divulgadas na televisão por um oficial de assessoria do controle de imprensa no campo de batalha. Com base naquelas informações, Bush foi levado a tomar uma decisão, também precipitada, “encurtando dramaticamente o processo de tomada da decisão estratégica com vistas à conclusão da guerra”0. 0 O manual operativo do Exército Americano FM100-6, “Information Operations”, revela os detalhes deste evento dramático (Ver p 68-69). As notícias da televisão sobre a “via expressa da morte” também exerceu um efeito na excessiva antecipação na conclusão da guerra. (“Joint Force Quaterly”; edição de OutonoInverno; 1997-98). Em decorrência desta decisão, Saddam, que estava com os seus dias contados, escapou da morte certa, e também ficou um rastilho de operações inacabadas vieram a constituir bombas de efeito retardado para Clinton, que posteriormente assumiu o governo. O impacto da mídia na guerra é cada vez mais amplo e direto, a ponto de até as decisões de alto nível, tomadas pelo Presidente de uma superpotência, tal como os EUA, e que determinou a cessação de hostilidades, serem, em grande parte, originadas da reação a um simples programa de televisão. A partir deste fato, podese perceber o quanto de significado que a mídia tem na vida social de hoje. A partir desta constatação, pode-se dizer, sem qualquer exagero, que um rei sem coroa tornou-se, agora, a principal força para se vencer qualquer batalha. Depois que a “Tempestade no Deserto” varreu o Golfo, não será mais possível confiar apenas na força militar, sem que ocorra o envolvimento da mídia, para se obter a vitória em uma guerra. UMA MAÇÃ COM MUITAS FATIAS Na qualidade de conflito, que se caracterizou pela integração tecnológica, encerrando uma era e inaugurando uma nova era, a “Tempestade no Deserto” representou uma guerra clássica que pode proporcionar uma inspiração abrangente aos militares em todas as nações. Qualquer estudioso de temas militares poderá, indubitavelmente, extrair esclarecimentos ou lições desta guerra, independentemente do enfoque adotado. Com base nesta premissa, identificamos guerra, com seus múltiplos significados, em função da multiplicidade de experiências e lições que ela oferece, como sendo “uma maçã com muitas fatias”. Além disso, o número de perspectivas sob a forma de fatias, possíveis de serem identificadas nesta maçã, é muito superior aos aspectos já abordados, e basta a qualquer pessoa, dotada de uma inteligência acurada, examinar essa maçã, para e perceberá, a qualquer momento, novas e inusitadas fatias, como por exemplo: LUTANDO JUNTOS E DIVIDINDO A CONTA Quando o Presidente Bush falou com justificada indignação, sobre a responsabilidade moral que estava sendo assumida em relação ao Kuwait, nenhum economista sério poderia imaginar que para arcar com os custos necessários às despesas militares da guerra, os Estados Unidos proporiam um programa de “responsabilidade compartilhada”. Criava-se, assim, uma nova forma de repartição dos custos de uma guerra internacional lutando juntos e dividindo a conta. Mesmo que não sejamos homens de negócio, temos que admirar este espírito de “Wall Street”. A Seção 16 do “Apêndice ao Relatório Final do Departamento de Defesa ao Congresso”, contem uma análise relativa ao tema “responsabilidade compartilhada”. Ao contrário da crença geral, a principal razão que levou os EUA repartir com seus aliados, os custos da guerra, não foi um fator econômico, e sim, considerações de ordem política. No livro “21st Century Rivalries” Lester Thurow observa que, em relação aos 61 bilhões de dólares correspondentes ao custo da guerra, “se comparados com o seu PIB anual de 6 trilhões de dólares, esta despesa nem vale ser mencionada. O motivo para eles quererem que aqueles países que não enviaram forças de combate para a guerra provessem assistência financeira era exclusivamente o de convencer o público Americano de que a guerra não era apenas americana, e sim uma operação combinada”. O IMPACTO DA GUERRA PSICOLÓGICA As ações de guerra psicológica não constituem, na realidade, uma nova tática, mas o que impressionou na “Tempestade no Deserto” foi a sua criatividade. Após o lançamento de uma bomba extremamente devastadora, os norteamericanos utilizavam aeronaves para lançar panfletos de propaganda sobre tropas iraquianas, localizadas a quilômetros de distância da área bombardeada, e que ainda estavam sob o impacto do medo daquele bombardeio, informando que eles seriam o alvo da próxima bomba! Essa ação, isoladamente, foi suficiente para provocar o colapso de Divisões iraquianas. Já na condição de prisioneiro de guerra, um Comandante de Divisão iraquiano admitiu que o impacto da guerra psicológica no moral do Iraque só foi superado pelo efeito resultante do bombardeio executado pelas forças aliadas0. 0 Na revista “Special Operations” o Major Jake Sam (como foi publicado) revê as circunstancias que determinaram a condução das ações de guerra psicológica pelo “4th Psyops Group” durante a Guerra do Golfo (Ver “Special Operations”. Outubro 1992). Na edição de Dezembro de 1991 do periódico Americano “Journal of Eastern Europe and Middle Eastern Military Affairs” há, também, um artigo dirigido às ações de guerra psicológica durante a Guerra no Golfo. A COMBINAÇÃO DE DIFERENTES GERAÇÕES DE ARMAS Quando a guerra começou, o A-10 era visto pelos norte-americanos como uma aeronave de ataque obsoleta. Mas o seu emprego combinado com o helicóptero “Apache”, formando a chamada “união letal”, não só provocou a eliminação, em larga escala, de tanques iraquianos, como também, protelou a desativação do A-10, que chegou a alcançar a condição de um dos astros da guerra. Ao combinarem um sistema de armas, que estava longe de ser avançado, com outros sistemas de armas, os norte-americanos conseguiram um resultado miraculoso, sendo que o projeto e emprego desta combinação de armamentos constituem uma inspiração difícil de ser traduzida em poucas palavras. UMA NOVA ORGANIZAÇÃO OPERATIVA PARA A FORÇA AÉREA O General McPeak, apressadamente nomeado para o cargo de Chefe do EstadoMaior da Força Aérea antes do início da guerra, também deixou as marcas dos seus dentes na “maçã”. Durante o transcurso da guerra, conseguiu materializar o seu sonho de quebrar as barreiras entre os componentes estratégicos e táticos das forças aéreas, estabelecendo alas aéreas mistas. Logo após a guerra, a aplicação de sua abordagem “menos 7 mais 4” estabeleceu a mais original reforma estrutural no comando da Força Aérea norte-americana em toda a sua história; qual seja, a desativação dos 7 Comandos então existentes — incluindo suas unidades estratégicas, táticas, de transporte, logísticas, de sistemas, comunicações e de segurança — reestruturando a força em 4 comandos de que integravam meios de combate, de mobilidade, de material e inteligência. McPeak como Chefe do Estado-Maior da Força Aérea advogou o emprego de “alas aéreas mistas”, formadas por diversos tipos de aeronaves, para substituir as alas aéreas formadas por um único tipo de aeronave. Em suas palavras, “se tivéssemos que fazer alguma coisa a mais na Arábia Saudita hoje, não empregaríamos mais alas aéreas obsoletas, integradas por 72 aeronaves F-16, mas sim, uma ala aérea integrada por alguns aviões de ataque, aviões de defesa aérea, e aviões de bloqueio eletrônico voando fora da zona de defesa aérea. “Wild Weasels”(designação operacional dada aos aviões empregados para localizar e destruir sistemas de defesa anti-aérea inimigas, atualmente atribuída aos F-16C), aviões de reabastecimento, e etc. Esta disposição tática pode ser útil quando um conflito armado irromper em alguma região do mundo.” (Air Force Journal, Fevereiro 1991). É difícil de imaginar, como os colegas do General McPeak iriam encarar uma mudança de tal magnitude, se não tivesse havido uma Guerra no Golfo. O Secretário da Força Aérea, Donald Rice, afirma que “a Guerra no Golfo explicou este ponto (experiência) de forma completa: o Poder Aéreo pode representar a maior contribuição durante um planejamento integrado e unificado de operações de combate.”. O General Michael Lowe (como publicado), comandante do Comando Aéreo Tático, salientou que “o uso de terminologias tais como “estratégia” e “tática” para limitar os tipos de aeronaves e suas missões, está ameaçando os esforços para o desenvolvimento do Poder Aéreo, e em relação a este aspecto, nos temos que realizar reformulações organizacionais e estruturais”. (Ver o Manual da Força Aérea AFM1-1 “Basic Aerospace Theories of the US Air Force” , p329, Nota de Rodapé n 8). O Vice-Chefe de Estado-Maior para Programas e Operações, Jenny V. Adams (como publicado) acredita que a lição a ser extraída da Guerra do Golfo é a de “modificar, ao contrário de rever, nossos regulamentos de combate”. O Vice-Chefe de Estado-Maior da USAF para Logística e Engenharia, Henry Weiqiliao (como publicado) também aprova a realização de reformas para reduzir os elos fracos na área de apoio. Ver Jane´s Defense Weekly, 9 de Março de 1991. Se prosseguirmos nesta abordagem até o seu limite, veremos que existem ainda inúmeras fatias nesta maçã, mas nem todos os aspectos que elas apresentam poderão ser realçados ou circunscritos de forma específica. Para falar a verdade, os pontos fracos e aspectos questionáveis são praticamente tão numerosos quanto os pontos fortes. Embora esta tenha sido uma guerra rica em implicações, ela não pode ser tratada como a enciclopédia da guerra moderna. Pelo menos ela não nos fornece qualquer resposta imediata ou completa com relação ao futuro da guerra. No entanto, e afinal de contas, ela representa a primeira e mais concentrada ocorrência do emprego de um grande número de armas novas e avançadas recém desenvolvidas, bem como um palco para testes das decorrentes revoluções em assuntos militares. Este aspecto, isoladamente, já é suficiente para conceder a este conflito a posição de um clássico na história da guerra, além de representar um berço para o desenvolvimento de idéias. CAP. 4 - O QUE OS NORTE-AMERICANOS GANHAM AO APALPAR O ELEFANTE “O combate aéreo foi o fator decisivo para a vitória na guerra contra o Iraque. Armamentos de alta-tecnologia foram eficazmente empregados, e alem de serem o elemento chave para o notável desempenho das forças aéreas e terrestres, representam também o principal motivo para que as baixas entre as forças das Nações Unidas fossem mantidas em nível tão baixo.”. L. Aspen. A 2ª Guerra do Golfo proporcionou aos Estados Unidos, os maiores dividendos militares das últimas décadas. Assim que a guerra terminou, os militares, os membros do Congresso e diversas organizações civis, engajaram-se em estudos detalhados, relativos a estes dividendos, sob diversos enfoques. De cada um dos relatórios decorrentes destes estudos, e das ações subseqüentes empreendidas pelos militares norte-americanos, resultados extraordinários podem ser evidenciados, e estes resultados são extremamente valiosos para os militares em todo o mundo, razão pela qual, devemos examiná-los o quanto antes possível. Os sentimentos nacionalistas dos norte-americanos, os quais eu particularmente admiro, se manifestam de forma evidente no sectarismo, de longa data, existente entre as suas forças singulares. Em função desta separação entre as forças, é possível a ocorrência hiatos nas análises decorrentes dos estudos citados, assim como, erros doutrinários e de formulação de pensamentos e raciocínio. Estas deficiências acabaram por transformar, o que seria uma grande investigação sobre uma guerra, em algo comparável à parábola dos cegos, tentando descrever um elefante através do tato. Este é um tema que requer um minucioso reexame, e não deve ser usado como desculpa para negar o seu valor e pertinência dos estudos e relatórios em pauta. Desta forma, inicialmente, vamos responder à questão: O que é que os norteamericanos, afinal de contas, identificaram ao apalpar esse Inicialmente, vamos examiná-lo. grande elefante? A MÃO ESTENDIDA ATRAVÉS DA CERCA — CADA FORÇA VÊ A GUERRA DE FORMA DIFERENTE. Nos EUA a cerca erguida entre o Exército e a Marinha, desde os tempos da Guerra da Secessão0, ao invés de ser eliminada com a criação da Força Aérea, passou a separar estas três forças singulares. Tornou-se um mal crônico, provocando muitas dores de cabeça, tanto para a presidência, quanto para o Pentágono. O processo de reorganização das forças armadas0, cujo batismo de fogo ocorreu durante a 2ª Guerra do Golfo, não foi um instrumento eficaz para atingir o cerne do problema, tendo sido, quando muito, um paliativo, uma solução temporária, para este obstáculo invisível que existe entre as forças norte-americanas. Assim que a situação voltou à normalidade, e as tropas retornaram para casa, as cercas se restabeleceram e, como antes, todos voltaram a seguir suas próprias orientações. Não obstante, os chefes militares das três [quatro] forças, certamente, não são uma geração de Comandantes de Força medíocres e obstinadamente imutáveis. A forma pela qual a 2ª Guerra do Golfo se desenvolveu e chegou à sua conclusão, chocou o mundo inteiro, assim como a estes líderes militares, que tinham sido os formuladores das estratégias da operação “Tempestade no Deserto”. 0 [N.T.] Não foi adotada a tradução literal de “Civil War” que seria Guerra Civil, porque não se tratou de uma guerra no âmbito civil. Foi uma guerra estritamente militar, provocada por profundas desavenças culturais entre o Norte e o Sul dos EUA, (o Norte anglo-saxônico e o Sul latino com descendências francesas e hispânicas), bem como, por diferenças econômicas, (o Norte progressista, industrial, com o trabalho remunerado e o Sul conservador, agrícola e com mão de obra escrava).A guerra visava a definição de uma hegemonia. 0 [N.T.] Estabelecida pela Lei Goldwater-Nichols de 1986. No âmbito das forças armadas norte-americanas, o desaparecimento do seu principal adversário, em decorrência à dissolução da União Soviética, e a motivação resultante do novo posicionamento dos EUA na vanguarda de uma nova ordem mundial, despertava sentimentos de incerteza e dúvida. Com efeito, os Comandantes de Força norte-americanos compreenderam a urgência com que eles deveriam tratar a reformulação de suas forças, mesmo que ainda não tivessem a intenção de abandonar suas velhas e preconcebidas idéias. Esta compreensão ficou evidente em cada uma das normas operativas, emitidas nos anos 1990, e que tinham seus tópicos iniciais já baseados nas novas e recentes experiências e lições extraídas da 2ª Guerra do Golfo. Assim como “aos olhos de mil pessoas haverá mil pontos de vista” aos olhos das três [quatro] forças armadas norte-americanas ocorreram três guerras diferentes no Golfo Pérsico. Na análise deste conflito, que estabeleceu um ponto de inflexão na história da guerra, cada uma das forças norte-americanas ateve-se às suas próprias perspectivas e argumentos, esforçando-se para encontrar evidências que lhes fossem mais favoráveis, não se dando conta de que, uma única mão estendida por de trás da cerca militar, jamais poderia identificar uma parte, ou o todo, daquele grande elefante. A PERCEPÇÃO DO EXÉRCITO NORTE-AMERICANO — A FORÇA DIGITALIZADA O General Gordon Sullivan0 percebeu o que poderia ser uma perna daquele elefante. Sob o seu ponto de vista, o desempenho do Exército norte-americano na operação “Tempestade no Deserto”, ainda que pudesse ser considerado irretocável, certamente não poderia ser classificado como excepcional. Se comparados aos 38 dias de um avassalador e indiscriminado bombardeio praticado pela Força Aérea, os quatro dias de uma campanha terrestre sem obstruções, não angariaram a tão esperada glória para as suas forças. Como um profundo conhecedor de cada elo vital na estrutura do Exército, o General Sullivan sabia, melhor do que ninguém, onde se situavam os problemas que afetaram a participação desta venerável força nesta, que foi uma guerra tão marcante. 0 O General Gordon Sullivan, durante a Guerra do Golfo exerceu o cargo de Subchefe do Estado-Maior do Exército, e foi nomeado Chefe do Estado-Maior somente dois meses após o término daquele conflito, tendo ocupado este cargo até o ano de 1995. Mesmo considerando que ao se engajar na “Tempestade do Deserto” o Exército norte-americano estava no auge do seu prestígio, esta posição ficava mais evidenciada pela falta de um oponente, em face do já evidente e inegável declínio do Exército soviético. No entanto, o General Sullivan, com uma visão prospectiva, manifestava uma apreensão em relação à opinião pública. Em sua opinião, com o súbito fim das tensões da Guerra Fria, a estrutura do Exército começaria a exibir sinais de envelhecimento, e nesta situação, políticos ávidos para colher os dividendos da paz, restringiriam os recursos orçamentários para as forças armadas, deixando o Exército sem os recursos necessários, para assegurar uma liderança mundial, no início do século XXI. [N.T.] Com relação a este aspecto é interessante relembrar a passagem histórica em que Cipião “o Africano”, chorou ao ver, após a sua vitória sobre os cartagineses, Cartago sendo destruída por suas legiões. A tristeza de Cipião deviase ao fato de que, eliminado o seu principal inimigo, as legiões romanas iriam envelhecer e Roma perderia sua primazia como força militar. Para encetar uma nova dinâmica de crescimento para o Exército, seria necessário um remédio muito forte, além de uma ampla reforma estrutural. Neste sentido, o General Sullivan apresentou um planejamento tentativo que consistia na a organização de um novo Exército, o — “Exército Exército do Século XXI”, XXI — que resultaria da reestruturação do Exército norte-americano em todos os seus segmentos, “desde as mais simples trincheiras até as mais sofisticadas fabricas de armamentos”. O livro “The 21st Century Army” foi escrito pelo General Sullivan. Em toda a sua gestão como Chefe do Estado-Maior do Exército ele foi um entusiasta deste tema. Mesmo que muitos tenham relacionado o “Exército do Século XXI” com a “Força Digitalizada”, certamente o General Sullivan não tinha esta perspectiva. Ele acreditava que o Exército nortenorte-americano deveria promover, continuamente, reformas visando um processo integrativo, e que o “Exército do Século XXI” deveria representar uma postura e um direcionamento e não um plano finito. De acordo com Sullivan, “O processo integrativo do ‘Exército do Século XXI’ englobaria temas como: teoria da batalha, sistema organizacional, adestramento, formação de oficiais para comando, temas relacionados a soldados e equipamentos, instalações de bases, etc.” (“United States Military Theory”, Maio-Junho, 1995). De acordo com a visão geral corrente do Exército “O ‘Exército do século XXI’ é o Exército atual dos EUA, que está realizando experiências com operações baseadas em recursos informatizados, pesquisa teórica e planejamento de aquisição de equipamentos, de modo a permitir que as tropas possam ser preparadas para o cumprimento de missões de agora até 2010”. (Coronel Robert Jilibuer, “Armed Forces Journal”, Outubro 1996). Com o propósito de reduzir ao máximo possível os efeitos de práticas perniciosas, existentes nos diversos escalões do Exército, ele iniciou o processo de transformação criando uma força-tarefa experimental, a “Força-Tarefa Força-Tarefa Experimental de Louisiana”, Louisiana contando com um efetivo de somente, 1100 homens sob o seu comando direto. Essa força experimental passou modelar-se com bases nas experiências e lições decorrentes da Guerra do Golfo, e freqüentemente era chamada de “força força digitalizada”. digitalizada Em seguida, o General Sullivan através de hábeis manobras políticas, conseguiu levar o Exército ao limiar da guerra cibernética, e com isso, assumindo a dianteira no âmbito das forças armadas, conduzindo o Exército através do arrojado caminho da inovação e das difíceis expectativas em relação ao futuro. No entanto, o que General Sullivan não deixou transparecer foi o fato de que, em paralelo esse processo de transformação, havia uma motivação egoísta, comum no âmbito das forças armadas, qual seja, a disputa por recursos orçamentários. Este era um aspecto importante visto que, nas últimas décadas, o orçamento para as forças armadas vinha sofrendo reduções, e a parcela de redução para o Exército fora maior do que aquelas das demais forças. O sucessor do General Sullivan, foi o General Dennis J. Reimer0, que também conhecia toda essa sistemática de demanda por recursos orçamentários, e neste sentido aprofundou as reformas com base no planejamento desenvolvido pelo seu antecessor. O General Reimer declarou que: “A Concepção do Exército de 2010 era o elo teórico entre o ‘Exército do Século 21’ e o ‘Exército do Amanhã’. O ‘Exército do Século XXI’ é o planejamento que o Exército está seguindo agora... ‘O Exército do Amanhã’ é um planejamento de longo prazo, e que se encontra, atualmente, e fase de deliberação... a coordenação mutua entre os três tem determinado um conjunto completo de mudanças ordenadas e contínuas, de modo a garantir que o Exército possa desenvolver-se de forma metódica numa direção.”(Ver o relatório “The 2010 Army Concept”, 1997). Todos sabem que há um custo considerável para a implantação de uma força digitalizada, digitalizada mas a grande esperteza, tanto por parte do General Sullivan quanto de seu sucessor o General Reimer, baseava-se na premissa de que — investimentos geram a justificativa para a obtenção de mais investimentos. investimentos Partindo da concepção do “Exército Exército do Século 21”, 21 passando pela concepção do “Exército Exército Pós 2010” Exército do Amanhã” 2010 e desta para a do “Exército Amanhã foram dados dois passos que redundaram em três saltos. Desta forma, adotando um objetivo de desenvolvimento convincente como isca, o Exército conseguiu captar, além do 0 [N.T.] O General Dennis J. Reimer tornou-se o 33º Chefe do Estado-Maior do exército norte-americano em junho de 1995, permanecendo no cargo até agosto de 1999, quando se aposentou. apoio político de “Capitol Hill0”, mais verbas militares para a reestruturação do Exército. Os políticos, totalmente ignorantes em relação a assuntos militares, não tinham condições de contestar as conclusões ou propor novos métodos de vitória para os generais. Além disso, eles temiam fazer o papel de tolos, e assim sendo, nenhum ousava fazer observações irresponsáveis a um homem que poderia vir a ser o futuro presidente. Não importa, realmente, o nível de tumulto, que o conceito da “força força digitalizada” digitalizada provocou, visto que, quando houver alguma conclusão no tocante à validade deste conceito, ele ainda estará longe de sua conclusão. Esta proposição diz respeito a um outro aspecto, relativo ao prazo de desenvolvimento deste projeto de força, e não exposto de forma ostensiva, que é o fato dele ser conduzido de acordo com uma determinada sistemática adotada pelo Exército. Trata-se de um processo semelhante ao de aquisição de um novo sistema de armas, onde uma proposta de especificações é encaminhada para fabricação pelo setor industrial, e quando o produto é prontificado, ele é submetido a avaliações e testes, podendo retornando às linhas de fabricação para correções, num processo de idas e vindas que pode levar até 10 anos. Ainda com relação ao tempo de desenvolvimento da força digitalizada, digitalizada há que se considerar outro fenômeno que é associado aos processos de desenvolvimento de “hardware” e da tecnologia de redes. Ocorre que estes dois processos têm ciclos diferentes, não sendo possível fazer com que caminhem paralelamente. Trata-se da regra dos 18 meses (Lei de Moore)0 para o desenvolvimento de “hardware” e “da regra de 60 dias” para o desenvolvimento da tecnologia de redes. Deste 0 Às vezes a referência ao Congresso norte-americano é feita em relação ao nome do acidente geográfico onde foi erguido o prédio do Congresso Norte-norte-americano. 0 A Lei de Moore descreve o princípio dinâmico de renovação no mercado de fabricação de semicondutores. Após realizar diversos estudos e pesquisas entre os anos de 1959 e 1975 Gordon E. Moore, que ocupou os cargos de Diretor de Pesquisa de Desenvolvimento da “Fairchild Semiconductor” e mais recentemente, Diretor Emérito da Intel Corporation, observou que os fabricantes de semicondutores, em média, à cada 18 meses, dobravam a densidade de componentes por unidade de circuito integrado, e esta razão de variação tem se mantido até os dias de hoje. descompasso de ciclos tecnológicos, resulta ser muito difícil para a “força força digitalizada” digitalizada concluir um projeto tecnológico, que apresente o mesmo nível de desenvolvimento tecnológico em todos os seus componentes. Assim, a “força força digitalizada” digitalizada torna-se uma entidade em constante mutação, devido ao contínuo processo de mudanças para novas tecnologias. No processo de lidar com essa dinâmica, não só o rumo a ser seguido é desconhecido, assim como nada de concreto alcançado, porém a demanda justificada por recursos orçamentários se mantém perene. A renovação tecnológica é um fenômeno muito mais rápido que a evolução dos armamentos, ocultando disparidades mais profundas. “É mais fácil que corredores de ponta fiquem para trás”. (Este aspecto pode ser verificado a partir do desenvolvimento da indústria de telecomunicações e mudanças na área de computadores). Esta, talvez, seja, isoladamente, a mais difícil disparidade que pode existir entre o militar profissional e a tecnologia da área cibernética implementada nas linhas de fabricação das indústrias de grande porte. É por esta razão que os norte-americanos têm uma sensibilidade mórbida á difusão de qualquer inovação de alta-tecnologia, tanto na área militar, quanto na área civil. Considerando este aspecto, isoladamente, relacionar o destino de uma força à popularidade de uma determinada tecnologia ou de um plano audacioso e com características inovadoras, representa um enfoque que dificilmente poderá se transformar, no único orientador do desenvolvimento futuro do Exército. Além disso, quem ousaria, atualmente, afirmar com convicção, que nas guerras do futuro este significativo investimento poderá se transformar em uma “Linha de Maginot” eletrônica, cuja fraqueza se deve à excessiva dependência numa única tecnologia? Existe muita gente nos Estados Unidos com este mesmo questionamento. O Coronel Allen Campen acredita que “adotando de forma intempestivas novas táticas das quais não se tem um completo entendimento e que não foram testadas é muito arriscado” e “possivelmente transformará uma revolução militar benéfica num jogo de aposta com a segurança nacional”. ( revista “United States Signal”, Julho 1995). A PERCEPÇÃO DA FORÇA AÉREA NORTE-AMERICANA Com relação à Força Aérea, o contundente General Michael J. Dugan foi exonerado de seu cargo, e embora a Força Aérea tenha ficado sob o comando de um general do Exército durante toda a operação “Tempestade no Deserto”, isto não impediu que ela se transformasse na grande vencedora da 2ª Guerra no Golfo. [N.T.] O General Michael J. Dugan foi exonerado do cargo de Chefe do Estado-Maior da Aeronáutica em setembro de 1990 ao expor em entrevista ao Washington Post (16/09/1990) o plano de empregar poder aéreo ilimitado para destruir, não só Saddam Hussein e sua família, como também, todo e qualquer alvo no Iraque que os militares, e em particular a Força Aérea, achassem necessários, de modo a vencer a guerra num curto espaço de tempo. Esta declaração foi feita exatamente uma semana antes da cerimônia de abertura da Assembléia Geral das Nações Unidas. Em função desta declaração, o General Dugan foi exonerado pelo então Secretário de Defesa Cheney. Durante a 2ª Guerra do Golfo, o plano básico da Força Aérea — “Presença global Poder global” — foi submetido ao seu batismo de fogo. E a Força Aérea demonstrou que pode, isoladamente, ter sucesso em qualquer missão de natureza estratégica ou tática, em qualquer frente de batalha, e sua posição nunca foi tão prestigiada quanto é no momento atual. “Presença Global e Poder Global” constituiu o plano estratégico adotado pela Força Aérea norte-norte-americana após a Guerra Fria, publicado através de em documentação oficial em Junho de 1990. Seis meses depois, os princípios básicos deste plano foram testados e verificados na Guerra do Golfo. Este sucesso aumentou a determinação do presunçoso General McPeak0 e de seu sucessor, de irem mais longe ainda. Eles consideravam que uma única vitória era o suficiente para que a Força Aérea assumisse a liderança entre as forças armadas a partir daquele ponto. A Força Aérea que foi criada 50 anos antes, a partir de um apêndice do Exército, não era mais inexperiente e subitamente, ao tocar no “elefante” ela tinha criado asas. Ainda que o General Fogleman0 na Força Aérea e o General Reimer0 no Exército possuíssem idéias semelhantes, e tivessem ambos participado da 2ª Guerra do Golfo, “as duas forças singulares em questão, tinham um arraigado entendimento próprio e independente quanto ao tipo de operações militares para o século XXI”, e “as relações entre o Exército e a Força Aérea tornaram-se tensas, quando estas 0 [N.T.] General. Merrill A. McPeak sucedeu o General Dugan no cargo de Chefe do Estado-Maior da Força Aérea de Outubro de 1990 a Outubro de 1994. 0 [N.T.] General Ronald R. Fogleman, Chefe do Estado-Maior da Força Aérea de outubro de 1994 a setembro de 1997. 0 [N.T.] General Dennis J. Reimer, Chefe do Estado-Maior do Exército de junho de 1995 a 1999. duas forças tentaram analisar, em conjunto, os detalhes e empregos decorrentes das lições aprendidas na 2ª Guerra do Golfo”0. A razão destes desentendimentos é bastante simples nem a Força Aérea, cujas asas tornavam-se cada vez mais poderosas, nem o Exército, que se considerava a autoridade número um abaixo dos céus, estavam dispostos a transferir para o outro o direito de exercer o controle operacional. A adoção dessas posturas intransigentes era, aparentemente, justificável, mas numa avaliação global, pode-se constatar que esta postura representou uma disputa sem qualquer benefício, tendo como resultado, que as reuniões entre as cúpulas destas forças para o estudo de operações combinadas, tornaram-se meras formalidades, e nenhuma das novas experiências obtidas na Guerra do Golfo foi efetiva e completamente compartilhada entre eles. Basta examinar os sucessivos manuais e regulamentos emitidos pela Força Aérea e pelo Exército, logo após a guerra, para compreender este aspecto. O que deve ser ressaltado, é que após a guerra, a atitude e ações da Força Aérea não ficaram limitadas a uma corrida pelo poder e vantagens em relação às demais forças singulares. Para a Força Aérea, o reconhecimento de ter sido a protagonista da operação “Tempestade no Deserto”, foi uma resposta à bem sucedida experiência das campanhas aéreas de ataque. Esta força havia reorganizado suas unidades e meios em alas aéreas mistas, segundo modelos previamente comprovados. Em seguida, iniciou um amplo processo de reestruturação que ficou conhecido pelo lema — “subtrair subtrair sete e adicionar quatro” quatro — reorganizando completamente a sua estrutura de comando. Atualmente 0, a Força Aérea está no meio de um processo de testes para a formação de uma Força Aérea Expedicionária, Expedicionária estruturada para atingir qualquer zona de guerra no mundo, num prazo de 48 horas, e manter a capacidade de combate durante todo o período de qualquer crise ou conflito. 0 Ver “United States Army Magazine”, dezembro de 1996, “Army and Air Force Joint War”. 0 [N.T.] Deve ser considerada a época em que a obra foi escrita, 1999. A Força Aérea que sempre demonstrou um grande entusiasmo pela guerra eletrônica, e até mesmo pela guerra cibernética, assumiu a liderança neste último campo, ao criar um centro de guerra cibernética0, antes mesmo que o General Sullivan [no Exército] tivesse organizado a “força força digitalizada”. digitalizada Todas estas ações, evidentemente, estão diretamente relacionadas aos resultados da Guerra no Golfo. O que é lamentável, no entanto, é que uma iniciativa tão boa, não tenha sido capaz de romper com as antigas barreiras militares, resultando que o antigo pleito por “operações combinadas” continuava a ser, como antes, apenas um slogan. Em contrapartida, isto não evitou que os generais da Força Aérea, assim como seus colegas no Exército, utilizassem as mudanças positivas no âmbito das forças armadas, e as disputas, também positivas, fora do âmbito das forças armadas, como as alavancas para levar adiante, os interesses específicos de sua própria força. Uma força estagnada, sem qualquer plano de renovação, é uma força que não conseguiria captar uma boa parcela de recursos orçamentários dos congressistas. Neste sentido, a Força Aérea dispunha de sua própria tábua de multiplicação. Em 1997 os Estados Unidos, novamente, propuseram uma nova estratégia de desenvolvimento: Participação Global — O Plano para a Força Aérea dos Estados Unidos no Século 21. “O nosso plano estratégico pode ser resumido em uma frase: ‘a Força Aérea dos Estados Unidos tornar-se-á a excelência em termos de força aérea e espacial no mundo... será uma força global, assegurando aos Estados Unidos a capacidade de mostrar-se em todos os lugares’”. ( Ver “Global Participation ▬ The Plan for the United States Air Force in de 21st Century”). Na disputa cada vez mais intensa por recursos orçamentários, o projeto de plataformas espaciais dotadas de sistemas de armas, armas constituía um valioso trunfo nas mãos da Força Aérea. Mesmo que o projeto “Guerra nas Estrelas” promovido pelo Presidente Reagan, parecesse um blefe0 desde o início, e dois Presidentes mais tarde, ainda não tenha 0 [N.T.] O “Air Force Information Warfare Centre” foi ativado em setembro de 1993, aproveitando a estrutura já montada do “Air Force Electronic warfare Center” criado em 1975. 0 [N.T.] Na realidade foi um blefe, calcado em documentos pré-fabricados nos centros tecnológicos norte-americanos, tão lógicos e convincentes, que Gorbatchev chegou à conclusão de que não tinha saída no confronto com os norte-americanos. atingido sua completa operacionalização, o entusiasmo dos norte-americanos pelo estabelecimento de um poder de combate espacial nunca arrefeceu. Mesmo tendo o Presidente Clinton anunciado o cancelamento do plano de Guerra nas Estrelas, na realidade os militares norte-americanos nunca reduziram o avanço do processo de militarização do espaço. A concepção da Força Aérea norte-norte-americana — “Global Participation – 21st Century” — em particular assinala que “o primeiro passo dessa mudança revolucionária é transformar a Força Aérea Norte-norte-americana numa força espacial, a partir daí, remodelá-la para uma Força Aérea e espacial”. A consecução destas mudanças, obviamente, incorporaram revisões de nível básico. O comando aeroespacial está dando uma ênfase cada vez maior no emprego de meios de vôo espacial (ver, especificamente, Meios Militares de Vôo Espacial dos Estados Unidos e Teoria Unificada de Vôo Espacial). Em abril de 1998, o comando aeroespacial divulgou um plano de longo alcance denominado “Tentative Plan for 2020”, no qual antecipou quatro cenários de guerra no âmbito militar aeroespacial — controle espacial; guerra global; consolidação de força total; e cooperação global. Até 2020, o exercício do controle espacial deve alcançar os seguintes cinco propósitos: assegurar a penetração no espaço; manter a vigilância espacial; proteção do sistema espacial dos estados Unidos e de seus aliados; impedir a utilização, por parte de inimigos, dos sistemas espaciais dos Estados Unidos e seus aliados; e bloquear a utilização, pelos inimigos, dos sistemas espaciais. (Ver “Modern Military Affairs”, 1998, Nº 10, p. 10-11). Com base nesse entusiasmo, muitos Chefes de Estado-Maior da Força Aérea têm lutado para obter a maior parcela possível de recursos orçamentários em proveito de sua força. Provavelmente, e só Deus sabe quando, o poder aeroespacial norteamericano irá corresponder ao que profetizou o General Howell M. Estes Jr. — “Aquilo que os meios da força espacial demonstraram na Guerra do Golfo comprova que eles têm o potencial para constituir uma força independente”, A PERCEPÇÃO DA MARINHA NORTE-AMERICANA Se a Guerra do Golfo pode ser vista como elefante da parábola, neste caso a Marinha norte-americana sequer conseguiu tocar nos pêlos desse elefante. Isto significa dizer, que a Marinha, nem conseguiu perceber a existência do elefante. Talvez seja exatamente por essa razão que, historicamente, a Marinha dos EUA passou pela mais sofrida transformação estratégica em toda a sua história. Esta transformação teve o seu início, já no retorno para casa daqueles orgulhosos e arrogantes homens do mar, constrangidos que estavam por uma participação periférica no cenário da Guerra do Golfo. Esse constrangimento atormentou por um ano e meio o sentimento marinheiro daqueles militares, e em setembro de 1992, um documento oficial com o título “... From The Sea ”, desenvolvido no âmbito da oficialidade superior da Marinha e dos Fuzileiros Navais, foi colocado na mesa do Comandante de Operações Navais. Este documento afastava-se nitidamente das crenças e antigos ditames estabelecidos por Mahan, o mentor espiritual da Marinha norte-americana. As batalhas navais decisivas na disputa pelo domínio do mar não seriam mais tratadas como o propósito eterno, sagrado e imutável da Marinha. Pela primeira vez, o enfoque das ações navais movia-se das operações em alto mar para a projeção de poder e o emprego de forças navais a partir do mar, para influenciar eventos nas regiões litorâneas. Esta mudança pode ser comparada à de se retirar um tubarão de seu ambiente marítimo, onde ele se prevalece de sua mobilidade, colocando-os em pântanos, junto a crocodilos. O mais surpreendente, é que opiniões não-ortodoxas como esta, progrediram a ponto de obter a chancela dos principais líderes da Marinha, dos comandantes de força combinadas e de líderes dos Fuzileiros Navais, tornando-se o mais significativo documento doutrinário naval, desde a obra de Mahan “The Influence of Sea Power Upon History”. Tais mudanças estratégicas repentinas, e de grande envergadura, representaram um importante ponto de inflexão para a Marinha, que estava na busca de um caminho de recuperação, em face de um cenário de grandes mudanças na estrutura mundial. Ainda que os objetivos que a Marinha estabeleceu para si não sejam tão radicais quanto os do Exército, nem tão ambiciosos quanto os da Força Aérea, a sua transformação, obviamente, era de caráter mais fundamental e mais completo. Ao avaliar os seus próprios objetivos, a Marinha, que não é nem um pouco inferior ao Exército ou Força Aérea, pretende, evidentemente, “atingir dois pássaros com uma pedrada só”, ou seja, realizar a transformação, e garantir a captação de recursos orçamentários. Todavia, uma força que não teve um desempenho significativo numa guerra de grande porte, tem que ter um plano bastante atraente e concretizar reformas profundas, caso deseje assegurar uma fatia significativa do bolo de benefícios do pós-guerra, assim como, ambiciosamente, almejar pela maior fatia possível. Assim é que, dois anos após apresentar a concepção “... From The Sea”, Sea a Marinha divulgou outro documento doutrinário intitulado “Forward... Forward... From The Sea”. Sea [N.T.] Esta nova concepção atualizava e expandia o conceito anterior, acrescentando a contribuição de “Forças Navais Expedicionárias” em operações em tempos de paz, como uma resposta à emergência de crises e conflitos regionais. Este novo documento acrescentava conceitos com forte apelo motivacional — como por exemplo “a a existência do Posicionamento Avançado”; o desdobramento para o Avançado “o Posicionamento Avançado”; o combate a partir do Posicionamento Avançado” Avançado e “o Avançado — ao conceito estratégico da Marinha. “O documento ‘... From The Sea’, divulgado em 1992, pela Marinha e Corpo de Fuzileiros Navais, determinava mudanças marcantes no corpo e ênfase da estratégia destas forças...; ...a ênfase na implementação do ‘posicionamento avançado’ é a principal diferença observada entre a doutrinas ‘Forward... From The Sea’ e a doutrina ‘… From The Sea’”. (Almirante J.M. Boorda, “Marine Corps Magazine”, Março 1995). Dois anos mais tarde, o Comandante de Operações Navais, o Almirante Jeremy Michael Boorda, divulgou uma nova concepção estratégica titulada “Naval Naval Concepts for the Year 2020”. 2020 Depois que o Almirante Boorda cometeu suicídio [em maio de 1996], para redimir a honra dos militares que ele havia prejudicado, o seu sucessor, o Almirante Jay L. Johnson, regulamentou e promoveu as reformas idealizadas e iniciadas por ele iniciadas. Ele prescrevia a “deterrência, a prevenção de conflitos em tempo de paz, e a obtenção de vitórias na guerra”, como as três maiores responsabilidades da Marinha norte-americana no século XXI. O que não mudava era que, da mesma forma como os seus predecessores, todos os planos que o Almirante Johnson propôs consideravam a Marinha como o ator principal, não admitindo exceções. Sua argumentação era a de que, para atender às diversas tarefas de combate no exterior, e cujas responsabilidades cabiam às forças armadas norte-americanas, o Exército precisava obter o apoio de diversas origens para poder executar um desdobramento, e a Força Aérea era extremamente dependente de bases aéreas em outras nações. Somente a Marinha dispunha da liberdade para transitar em qualquer espaço marítimo, empregando múltiplos meios de inserção num teatro de operações, e a conclusão natural era de que a Marinha deveria ser o coração de uma força de combate conjunta. O raciocínio deste almirante é extremamente claro. Pressupondo existir um consenso de todos os comandantes de forças singulares, como também, do Departamento de Defesa, no tocante a essa posição teórica, o resultado lógico e provável deste consenso seria a priorização de sua força, quanto à alocação de recursos orçamentários. De acordo com os orçamentos de defesa norte-americanos, até o ano de 1998, verifica-se que durante os últimos dez anos, mesmo prevalecendo uma tendência constante de redução de despesas militares, a Marinha e o Corpo de Fuzileiros Navais foram as duas forças que tiveram os menores cortes em despesas. Os Comandantes da Marinha sempre receberam o que eles queriam0. APESAR DAS PERCEPÇÕES DE CADA FORÇA - AS CERCAS PERMANECEM Vimos, portanto, de forma genérica, a trajetória assumida pelas forças armadas norte-americanas, desde o fim da Guerra no Golfo, e a influência do sectarismo existente entre estas forças, praticamente bloqueando qualquer iniciativa comum. Talvez, até fiquemos impressionados com todo o esforço desenvolvido pelos militares norte-americanos para sintetizar a 2ª Guerra do Golfo, e talvez possamos até ser influenciados pelos diferentes métodos por eles adotados, na defesa dos interesses de suas respectivas forças singulares. Ao mesmo tempo, no entanto, poderemos sentir uma profunda consternação, ao verificar que excelentes oficiais e estudiosos em diversas áreas, indivíduos possuindo um raciocínio excepcional, só conseguiram chegar à condição de manterem as forças isoladas entre si, no interior de suas próprias esferas de ação, cada uma tentando sobrepujar a outra, reagindo obstinadamente aos pontos de vista das demais, e com percepções extremamente introvertidas. E no final, eles ainda constituem o poder militar norte-americano, que desta forma teve o seu desenvolvimento prejudicado pelo soar de clarins ambíguos. O MAL DA EXTRAVAGÂNCIA E O “NÍVEL ZERO DE PERDAS” O emprego indiscriminado de armas visando à consecução de propósitos, concomitantemente com a redução de vítimas, sem levar em conta os custos envolvidos representa um modelo de guerra que só pode ser executada por quem dispõe de fartos recursos financeiros. Este é um tipo de jogo para o qual os militares norte-americanos têm demonstrado capacitação e uma convincente atuação. A operação “Tempestade no Deserto” evidenciou, mais uma vez, a 0 Ver o “National Defense Report” para o ano fiscal de 1998, promulgado pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos. ilimitada extravagância na guerra por parte dos norte-americanos, e que já se transformou em um vício. Aviões que custam, em média, 25 milhões de dólares cada, realizaram 11.000 ataques indiscriminados, num período de 42 dias. Nesta campanha, destruíram a sede do renovado Partido Socialista, empregando mísseis Tomahawk que custam, individualmente, US$ 1,3 milhões, e atingiram posições entrincheiradas com bombas de precisão que custam dezenas de milhares de dólares a unidade. Mesmo que os generais norte-americanos soubessem, ao início do conflito, que não precisariam gastar tanto, neste que foi um irrestrito banquete bélico de conquista, orçado em 61 bilhões de dólares, comparável a se matar pássaros com projeteis de ouro, ainda assim a extravagância não seria evitada. Um avião de bombardeio norte-americano assemelha-se a uma montanha de ouro voadora, mais cara do que muitos de seus alvos. Será que atingir alvos possivelmente insignificantes, com toneladas de dólares norte-americanos, não causa nenhuma perplexidade nas pessoas? Em paralelo, durante o longo período de 161 dias, um efetivo superior a 500.000 homens e mais de 8 milhões de toneladas de suprimentos e materiais foi trazido diuturnamente dos EUA para a linha de frente, cruzando toda Europa, incluindo milhares de bonés de praia, há tempo largados em algum depósito, assim como caixotes de frutas norte-americanas, que iriam apodrecer em Riyadh. O General de Divisão William G. Pagonis, Comandante do Apoio Logístico, rotulou estas atividades de apoio, executadas numa escala caótica e extravagante e, “possivelmente, sem comparação na história”, sob o título de “operações navais”. No entanto, segundo declarações claras do Departamento de Defesa, essas operações correspondiam ao transporte de todas as comodidades proporcionadas por uma metrópole como Jackson, a capital do Estado de Mississipi, para a Arábia Saudita. Dentre todos os militares do mundo, provavelmente, somente os norte-americanos poderiam considerar esse procedimento como uma extravagância necessária para vencer uma guerra0. 0 Ver o Apêndice F do Relatório Final do Departamento de Defesa sobre a Guerra no Golfo enviado ao Congresso Norte-norte-americano. [N.T.] Trecho do Apêndice F do Relatório Final sobre a Guerra no Golfo: Ainda que tenha havido alguns problemas, o esforço logístico dos EUA e de seus aliados situa-se entre os mais bem sucedidos da história. Deslocar uma força de combate por metade do globo, interligar linhas de suprimento que se estendiam por todo o globo, e manter níveis de prontidão sem precedentes, constituem um tributo aquelas pessoas que fizeram o sistema logístico funcionar. O pessoal de logística de todas as forças apoiou mais de meio milhão de militares norte-americanos com suprimentos, serviços, facilidades, equipamentos manutenção e transporte. Um levantamento das marcas alcançadas pelo pessoal de logística mostra que, entre outras coisas, eles: - Mantiveram muitos dos principais sistemas de armas nos mesmos padrões ou até acima do que é previsto em tempo de paz; - Movimentaram mais de 1,3 bilhões de tonelada/milha de carga entre os portos e as unidades de combate; -Embarcaram e receberam mais de 112.500 veículos com rodas e lagartas; - Municiaram sistemas de armas com mais de US$ 2.5 bilhões em munição; - Construíram instalações de apoio totalizando um US$ 615 milhões; e - No pique da fase operacional, distribuíram mais de 19 milhões de galões de querosene de aviação por dia. McNamara que foi de presidente da Ford Motor Company para a chefia do Departamento de Defesa, introduziu o sistema de contabilidade gerencial das empresas privadas e o conceito de custo comparativo no âmbito militar dos Estados Unidos. Ele fez com que as forças aprendessem a gastar menos dinheiro na aquisição de armas, e em contrapartida incorporando outros padrões na forma de conduzir a guerra. “O Departamento de Defesa deve alcançar o seguinte objetivo: alcançar a segurança da nossa nação com a menor taxa de risco, ao menor custo possível e, na eventualidade de entrar em guerra, com o menor número de vítimas”. (McNamara, “Looking Back on the Tragedy and the Lessons of the Vietnam War, pp 27-29). Até mesmo o Comitê para as Forças Armadas na Câmara dos Deputados, onde freqüentemente estabeleciam-se acalorados debates com o alto comando das forças armadas em temas relacionados a custos, sequer expressou uma opinião em relação às extraordinárias despesas desta guerra. Nos relatórios relativos à Guerra no Golfo, os resultados substantivos obtidos pelos armamentos de alta-tecnologia receberam uma apreciação bastante elogiosa. O Secretário de Defesa Cheney declarou: “nós lideramos, de forma completa, uma nova geração na área da tecnologia de armamentos”, ao que o Congressista Aspen respondeu: “os benefícios demonstrados pelo armamento de alta-tecnologia excederam às nossas previsões mais otimistas”. Sem considerar um possível exagero nos elogios assinalados, pode-se concluir que são manifestações de orgulho em relação aos militares norte-americanos que, ao derrotarem o Iraque, atingiram de forma completa, e com a ajuda das armas de alta-tecnologia, os seus objetivos. Ou então, são baboseiras típicas, ditas por dois indivíduos que têm opiniões categóricas relativas à capacidade da tecnologia em produzir um sucesso. Em todo caso, essas referências não nos dão qualquer indicação do real significado do estilo norte-americano de fazer guerra. Em resumo, o que deve ser entendido é que falamos de um sentimento nacional, que incorporou, como condicionante intrínseco, a característica inegociável da vida humana. humana Isto significa não medir custos para alcançar a vitória, sem sofrer perdas de vidas humanas. O aparecimento de armamentos de alta-tecnologia pode, agora, satisfazer estas esperanças extravagantes do povo norte-americano. Durante a Guerra no Golfo, dos 500.000 militares que participaram do conflito, houve somente 148 vítimas fatais e 458 feridos. As metas que há eles vinham sonhando, quase que foram atingidas a obtenção com “o nível zero de perdas de vida”. Desde a Guerra do Vietnam, tanto os militares quanto a sociedade norteamericana, têm sido bastante sensíveis, até um nível que poderia ser considerado mórbido, quanto a perdas de vidas em operações militares. A redução no número de baixas e a consecução dos propósitos da guerra tornaram-se metas de mesmo valor para os militares norte-americanos. O soldado norte-americano comum que deveria estar nos campos de batalha arriscando sua vida, transformou-se no bem mais valioso da guerra, semelhantes aos preciosos vasos chineses que as pessoas têm medo de quebrar. Todos que já travaram guerra contra os norte-americanos, provavelmente já visualizaram o segredo do sucesso se não existem meios para derrotar essa força militar, então se deve procurar atingir os seus soldados0. Este aspecto pode ainda ser evidenciado, de forma inequívoca, nos relatórios do Congresso norte-americano, enfatizando que “a redução do número de vítimas é o propósito mais elevado na formulação do plano de guerra”. A persistência na meta do “nível zero de perdas” um slogan simples e pleno de compaixão — tornou-se, na realidade, o principal motivador da criação de um estilo extravagante norte-americano de fazer guerra. guerra Deste modo, o uso indiscriminado de aeronaves invisíveis ao radar, de armas de precisão, de novos tanques e helicópteros, juntamente com os sistemas de armas para ataques a longa distância e bombardeios maciços, se justificam para validar a 0 O Coronel Xiaochaersi Denglapu frisa que “causar vítimas é uma forma eficaz de enfraquecer o poder norte-americano... Por esta razão, inimigos podem nos impor vítimas lançando-se ofensivamente de forma imprudente, sem importar-se com perdas, ou pela obtenção de uma vitória tática inútil”. (“Análise do Ponto de Vista do Inimigo ‘Conceito de Unificação para 2010’”, “Joint Force Quaterly”, 19971998, Outono/Inverno). existência de um duplo objetivo que não incorpore contradições a vitória tem que ser alcançadas sem vítimas. Uma guerra encarada sob esta perspectiva só pode ser comparada a matar-se uma galinha usando-se um enorme machado. A alta-tecnologia empregada, os altos investimentos, os gastos elevados e os transformam a estratégia militar e às menor importância, quando significativos resultados pretendidos, capacidades de combate, em aspectos de comparados aos requisitos tecnológicos de desempenho dos sistemas de armas. As guerras que se enquadram nessas características, mesmo que bem sucedidas, não apresentarão nenhuma batalha significativa. Em comparação com a avançada tecnologia que dispõem, os militares norteamericanos estão nitidamente numa condição de estagnação em seu raciocínio doutrinário, e não tiveram a capacidade de transformar as oportunidades proporcionadas por essa nova tecnologia em proveito de novas táticas militares. Sem levar em conta o emprego eficaz do armamento de alta-tecnologia, não podemos especificar de maneira segura a defasagem existente entre o pensamento militar norte-americano revelado nessa guerra, e aquele em outras nações. Pelo menos, essa diferença não pode ser maior do que a existente entre os respectivos armamentos. Talvez, esse tenha sido, exatamente, o motivo pelo qual essa guerra não representou uma obra prima da capacidade militar, tornando-se, ao invés, numa suntuosa feira internacional de armamentos de alta-tecnologia, tendo os Estados Unidos como seu principal negociante. Como decorrência, iniciou-se a disseminação do mal da extravagância, representado pelo estilo extravagante dos norte-americanos de fazer a guerra numa escala global. Ao mesmo tempo em que enormes somas de dólares norteamericanos estavam esmagando o Iraque, tal fato, por algum tempo, também confundiu os militares em todo o mundo. Na condição de líderes mundiais na venda de armamentos os norte-americanos naturalmente regozijaram-se. No contexto de uma guerra típica, os norte-americanos transformaram um combate monótono com a sua avançada tecnologia, e um elevado dispêndio de recursos financeiros, num grande espetáculo, muito semelhante às magníficas produções de Holywood, que se baseiam em um roteiro simples, porém plenas de efeitos especiais e cenários complexos de custos elevados. Os norte-americanos conseguiram, desta forma, fazer com que por um longo tempo após a guerra, não fosse possível perceber as principais nuances deste tema complicado e, ao mesmo tempo, induziram a crença de que a guerra moderna deveria ser conduzida seguindo, exclusivamente, este modelo, e desta forma, deixando aqueles que não têm a possibilidade de empenhar-se em uma guerra tão extravagante, com a sensação de impotência. É por esta razão que desde a Guerra do Golfo, observa-se nos círculos militares, em todas as nações, o crescente interesse por armamentos de alta-tecnologia, além de uma adesão às concepções de guerras de alta-tecnologia. Ao comentar os feitos do talentoso inventor norte-americano Thomas Edison, o poeta Robinson Jeffers cita: “Nós... ...somos habilidosos com máquinas e encantados com a luxúria”. Os norte-americanos têm uma predileção nata por essas duas coisas, além de uma tendência para transformar a sua busca pela altatecnologia e o seu aperfeiçoamento numa luxúria, incluindo neste contexto, também, os armamentos e os artefatos mecânicos. O General Patton, que gostava de usar revolveres com as coronhas revestidas de marfim, é um exemplo típico desta mentalidade. Esta tendência deixa os norteamericanos completamente obcecados e, portanto, imbuídos de uma fé cega tanto na tecnologia quanto nos armamentos, sempre imaginando que a solução para a vitória em uma guerra somente será encontrada através da tecnologia e das armas. Esta tendência faz, também, que eles estejam permanentemente ansiosos, temendo que a sua liderança no campo dos armamentos possa estar sendo ameaçada e, assim sendo, procuram continuamente minorar essa preocupação, através da fabricação de novos armamentos, cada vez mais complexos. Como resultado desta atitude, quando os sistemas de armas, cada dia mais pesados e complexos, passam a conflitar com os princípios concisos que regem a guerra atual, os norte-americanos, invariavelmente, adotem uma atitude em favor das armas. Eles preferem tratar a guerra como competidores numa maratona de tecnologia militar, e não estão mais dispostos a encará-la como um teste de moral, de coragem, de sabedoria e de estratégia. Eles acreditam que, enquanto os “Thomas Edson” de hoje não adormecerem, os portões da vitória estarão sempre abertos para os norte-americanos. Este tipo de sentimento de autoconfiança levou os norte-americanos a esquecerem um fato muito simples a guerra não é uma corrida linear preestabelecida entre tecnologias e sistemas de armas, e sim, um jogo multidimensional, com mudanças contínuas de direção, e com a concorrência de muitos fatores imprevistos. Usar Adidas ou Nike não significa a garantia de que uma vitória será obtida. A impressão que se tem, no entanto, é que os norte-americanos não pretendem dar atenção a este aspecto. Eles capitalizaram o benefício da vitória tecnológica na Guerra do Golfo, e obviamente não têm poupado esforços para resguardar sua posição de liderança no âmbito da alta-tecnologia. Mesmo que diversas dificuldades no tocante a financiamentos tenham criado uma situação embaraçosa no tocante ao prosseguimento de seus empreendimentos, tal condição não foi capaz de alterar a sua paixão por novas tecnologias e novos armamentos. A lista de armas extravagantes que são constantemente projetadas pelos militares norte-americanos e aprovadas pelo seu Congresso tornar-se-á, certamente, cada vez mais longa, mas a lista de vítimas norte-americanas em guerras futuras não será necessariamente igual a “zero”, só porque eles alimentam essa ilusão. De acordo com o Relatório Nacional de Defesa, do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, no ano fiscal de 1997, mais de 20 itens de tecnologia avançada foram aprovados pelo Congresso — “(1) Rapid Force Delivery System; 2) Precision Multi-barrel launch system; 3) High altitude maximum range unmanned vehicles; 4) Médium altitude maximum range unmanned vehicles; 5) Precision target capture signal system; 6) Cruise missile defense; 7) Simulated batlefields; 8) Joint counter (submarine) mines; 9) Ballistic missile interception with kinetic energy weapon; 10) Advanced technology utilized to formulate a high-level joint plan; 11) batlefront understanding and data transmission; 12) Anti large escale destruction weapons; 13) Air Bases (ports) for biological weapons defense”. 14) Advanced Navigational systems; 15) Combat discernment; 16) Joint rear service; 17) Combat Vehicles survivability; 18) Short life expectancy and low cost medium-scale transport helicopters; 19) Semi-automatic image handling; 20) smallscale air-fired false targets.” GRUPO DE BATALHA FORÇA EXPEDICIONÁRIA FORÇA INTEGRADA AS REFORMAS NO EXÉRCITO – GRUPOS DE BATALHA “Que tipo de Exército os Estados Unidos necessita no século XXI?” Esta é uma questão que intrigou o Exército norte-americano nos últimos dez anos do século XX.0 O fato que persistia era o de que, durante a Guerra do Golfo, a atuação do Exército em comparação ao desempenho dos sistemas de armas de alta-tecnologia 0 “What Kind of Army Does the US Army Need in the 21st Century?”, Xiao’en Neile, “Army Times” , 16/10/1995, apresenta uma revisão detalhada deste assunto. foi medíocre. Desta forma, o Exército norte-americano que sempre foi mais conservador do que a Marinha e a Força Aérea, finalmente conscientizou-se quanto à necessidade de desenvolver um programa para empreender as reformas a que se propunha [Ver pág 88 - A Percepção do Exército Norte-americano — A Força Digitalizada] . O interessante, é que a maior resistência a este programa não ocorreu nos escalões mais altos do Exército, e sim, no nível dos Generais de Brigada que deixavam seus Comandos para ascenderam a cargos mais elevados e dos novos Comandantes que os substituíam. Já os pontos de vista dos Coronéis e Tenentes-Coronéis, que integravam a corrente reformista “pró-Brigadas”, eram contraditórios relação ao pensamento do General Sullivan, no que tange ao tipo de reforma a ser empreendida. Eles acreditam que o problema, ao invés de estrutural ou organizacional, residia na própria tropa. Em sua acepção, foram os soldados, e não a instituição Exército, que não conseguiram passar no teste da guerra e, portanto, eles é que deveriam submeter-se a uma significativa transformação. Os programas idealizados por essa corrente, quais sejam: de “tropas de choque”0, de “tropas de elite”0, e de “brigadas de pronto uso”0, foram encaminhados ao General Sullivan que, entusiasticamente, considerou o terceiro programa como sendo o “novo pensamento relativo às operações futuras”, mesmo assim, ele não foi capaz de persuadir a maioria dos generais a aceitá-lo. Após o General Sullivan ter passado o cargo, e como uma conseqüência, ocorreu uma mudança de posição, com os conservadores voltando a prevalecer sobre os reformistas, e o Exército, em Janeiro de 1996, transformou a Quarta Unidade Mecanizada, na base para a organização de uma nova brigada experimental de 15.800 homens. De acordo com o periódico “United States Army Times”, “Após cinco anos de estudos, análises e discussão militar interna, as autoridades do Exército finalmente formularam um novo conceito para unidades blindadas e unidades mecanizadas. O novo plano é chamado ‘The 21st Century Stablishment’... compreendendo um quartel general, unidades de tropa, uma divisão blindada, duas unidades mecanizadas, unidades de artilharia (ao nível de brigada), uma unidade de aviação, e uma unidade para serviços de retaguarda, administração e apoio. A Divisão inteira contava com um efetivo de 15.719 homens, (incluindo 417 elementos da reserva)”. O pessoal envolvido na organização deste empreendimento explica que: “esta recém planejada estrutura não é considerada um empreendimento extraordinário... ...ao contrário, ele é visto como um empreendimento conservador”. (Ver Army Times, Ed de 22 de Junho de 1998) 0 [N.T.] Tradução adotada para a expressão “crack troop”. 0 [N.T.] Tradução adotada para a expressão “model troop”. 0 [N.T.] Tradução adotada para a expressão “primary brigade” O ponto de vista da corrente conservadora “pró-Divisão” prevaleceu de forma clara, mas os integrantes da corrente “pró-Brigada” não estavam dispostos a aceitar tal decisão. Eles acreditavam, de forma convicta, que “uma força militar que fosse excessivamente grande e lerda dificilmente adaptar-se-ia aos requisitos de combate do século XXI”. Esta corrente considerava que a organização da tropa para combate em grandes Divisões, e que vigorava durante o período em que prevaleciam os armamentos individuais de curto alcance, e também na fase de evolução destes tipos de armamentos, para os armamentos complexos de longo alcance e elevada precisão, deveria ser completamente descontinuada. Um novo modelo de unidade com cinco a seis mil homens constituiria a formação básica das unidades de combate, com uma maior flexibilidade. De modo a contornar os sentimentos de desgosto de um grande número de generais, a facção “pró-Brigada” demonstrando habilidade no processo de negociação, captou o apoio de membros dos altos escalões, incluindo aqueles considerados da “antiga” escola do Exército, em prol do novo programa0. No momento crítico do incessante debate entre as facções “pró-Divisão” e “pró- Brigada”, o Diretor do “U.S. Army Battle Command Laboratory”, o Tenente-Coronel Maigeleige, surgiu com uma novidade. Em seu livro “Break Break the Factional Position” Position ele postulava o abandono simultâneo das concepções, da Divisão e da Brigada, substituindo-as pela concepção de 12 Grupos de Batalha, Batalha com um efetivo de 5000 homens cada. Sua posição inovadora previa o abandono dos conceitos preestabelecidos de “grande” e “pequeno”, ou de “muitos” ou “poucos”. Propunha a adoção de métodos de estruturação modular, de acordo com as necessidades da guerra, colocando em prática um método de organização orientado para a missão. Os reflexos que este ponto de vista provocaram no seio do Exército excederam, de alguma forma as expectativas, a ponto de o General Denis J. Reimer ter determinado que todos os Generais lessem o citado livro.0 Talvez o atual Chefe do Estado-Maior (General Reimer) possua uma intuição excepcional e reconheça que mesmo que os pontos chave da proposta do Tenente-Coronel Maigeleige talvez não sejam um bálsamo miraculoso para todos os difíceis problemas do exército, mas eles podem ser considerados remédios capazes de, como num passe de mágica, 0 Ver John R Brinkerhoff, “The Brigade-based New Army”, ”Parameter Quaterly”, Inverno 1997. 0 Para um ponto de vista detalhado relativo ao livro “Break Localized Fronts” ver artigo de Xiao’em Neile, no periódico “United States Army Times”, ed de Junho de 1997. erradicar as mentalidades obsoletas daqueles velhos soldados que usam os uniformes e as insígnias de general. Originalmente, a concepção de uma organização em “Grupos Grupos de Batalha” Batalha não é nova para o Exército. Nos anos 1950 e 1960 concepção apareceu sob a forma de “cinco grupos de tropas nucleares”. De modo a adequar-se às necessidades de uma guerra nuclear, e permitir que as tropas possam, além de combater num campo de batalha nuclear, assegurar a sua sobrevivência, no ano de 1957 o Exército Norte-norte-americano reorganizou as Divisões Atômicas em grupos. A Divisão inteira, com um efetivo entre 11.000 e 14.600 homens, foi dividida em 5 grupos fortemente motorizados, e todos equipados com armamento nuclear tático. No entanto, a capacidade de ataque da Divisão com esta organização, em um campo de batalha convencional, era relativamente baixa. Esta idéia de reforma foi considerada, em termos genéricos, como uma tentativa inútil, sendo inclusive apontada como uma causa indireta do fraco desempenho militar norte-americano na Guerra do Vietnam. No entanto, na visão de Maigeleige, um nascimento prematuro, por vezes, pode impedir que uma criança atinja a idade adulta. Da mesma forma que se considera não ter sido afortunado o nascimento do “grupo”, há trinta anos atrás, o momento atual pode ser considerado como sendo o ideal. O armamento moderno tornou-se um fator determinante para que qualquer efetivo de força, mesmo tendo um tamanho relativamente menor que as unidades do passado, não sejam inferiores no que tange a poder de fogo e mobilidade. Em particular, o desenvolvimento da capacidade C4I, conferiu às unidades a vantagem da superioridade, proporcionada por sua integração, criando-se, assim, um crescente poder de combate. Pode-se considerar que as pesadas estruturas de divisão e de brigada, com 18 tipos diferentes de armas, são incompatíveis com as necessidades atuais. No entanto, mesmo que um desenvolvimento tecnológico militar seja fruto de uma nova alta-tecnologia, constitui-se, também, num ponto de inflexão, não é certo que acarrete num avanço correspondente na doutrina militar ou no ordenamento e estruturação institucional. Um fato auspicioso pode ocultar uma centena de fatos ruins — em outras palavras, a posição de liderança na tecnologia militar e nos sistemas de armas tem ofuscado a visão do seguinte fato: o pensamento militar norte-americano é o mesmo, quer no âmbito institucional, quer no universo doutrinário, e está nitidamente defasado em relação à avançada tecnologia militar de que dispõe. Neste sentido, usando a concepção de “Grupos Grupos de Batalha” Batalha para derrubar as concepções pró-Divisões e próBrigadas, representa a sistemática mais prejudicial para a estruturação institucional do Exército norte-americano, desde a Guerra do Golfo, pois ainda que represente a nova mentalidade institucional, esta evolução não é acompanhada da correspondente evolução doutrinária no âmbito do Exército norte-americano. A IMPLEMENTAÇÃO DAS REFORMAS NA FORÇA AÉREA – FORÇA EXPEDICIONÁRIA Diferentemente do Exército, a Força Aérea e a Marinha não têm tradições formais profundamente enraizadas, e a implementação de seus reajustes é nitidamente bem mais tranqüila. A Força Aérea usou de forma oportuna o clima otimista proporcionado pela “Tempestade no Deserto”, para eliminar, de uma só vez, o sistema de organização por Divisão, e para transformar todas as alas aéreas de combate em alas aéreas integradas (ou mistas), assumindo desta forma a liderança na primeira rodada de reformas sistêmicas. [N.T.] A origem da concepção de uma Força Aérea expedicionária data de outubro de 1994, quando forças iraquianas sob a direção de Saddam Hussein fizeram novos movimentos ameaçadores em direção ao Kuwait. Os EUA já haviam retirado daquele teatro, há muito tempo, a maior parte dos seus meios que haviam sido empregados na Operação Tempestade no Deserto, e se viram obrigados a empreender um rápido reenvio de forças para o Golfo Pérsico, em quantidade suficiente, para que, com credibilidade, pudessem deter uma intenção iraquiana de reprisar sua invasão de 1990 ao pequeno, porém rico Kuwait. O reenvio de forças, num espaço de tempo tão curto, demonstrou ser um grande desafio, não tendo ocorrido com a agilidade e eficiência que seriam ideais. Motivado por este evento, e aproveitando a onda de transformação em curso no âmbito da força, o General Fogleman, Chefe do Estado-Maior da Força Aérea, atribuiu ao General Joseph W. Ralston, então Comandante do Comando Aéreo de Combate, a tarefa de desenvolver a concepção de uma força aérea expedicionária, que possuísse “a capacidade de projetar um poder de combate de longo alcance, letal e auto-sustentável, dentro do prazo normal de planejamento de um plano de guerra.” Foram oficiais da 9ª Força Aérea que deram forma à concepção pretendida, divulgando-a aos comandantes de teatros. O oficial que esteve à testa deste esforço foi o então Comandante da 9ª Força Aérea, Vice-Chefe de Estado-Maior para Operações Aéreas e Espaciais, o Lt. Gen John P. Jumper. Após a definição da concepção “Presença Global, Poder Global” como o novo objetivo estratégico da Força Aérea, as reformas continuaram sendo processadas e foi dado início à experimentação de um plano para a criação de uma “Força Força Aérea Expedicionária”. Expedicionária De acordo com a concepção desenvolvida, a chamada “Força Força Aérea Expedicionária” Expedicionária seria uma força capaz e poderosa, composta por aproximadamente 1175 homens e com 34 a 40 aeronaves, integrando três ou quatro alas aéreas. Teria como atribuições: a disputa da superioridade aérea; a realização ataques aéreos; a supressão da capacidade de defesa aérea e antiaérea do inimigo; a capacitação para reabastecimento em vôo, e etc. Esta força teria a capacidade de se desdobrar para um Teatro de Operações em qualquer ponto do globo, num período de 48 horas a partir do seu acionamento, e de manter a capacidade de combate aéreo durante todo o curso do conflito. A este respeito, pode-se dizer que as ações da Força Aérea norte-americana são supersônicas. Atualmente os norte-americanos já organizaram três Forças Aéreas Expedicionárias, e realizaram uma completa mobilização e desdobramento. Quando a quarta e a quinta Força Aérea Expedicionária começaram a ser organizadas, as três primeiras já tinham alcançado um desempenho excepcional em operações tais como: “Southern Watch” e “Desert Thunder”0. A IMPLEMENTAÇÃO DAS TRANSFORMAÇÕES NA MARINHA Com relação à Marinha, uma vez que já havia sido definida a nova estratégia “Forward... Forward... From the Sea”, Sea a formação de uma força expedicionária, combinando meios navais e de fuzileiros navais, era um caminho lógico. Ao contrário do Exército que se encontra numa trilha cheia de dificuldades, e da Força Aérea que mais parece um furacão em deslocamento, a Marinha está mais propensa refinar à concepção de uma “Força Força Naval Expedicionária”, Expedicionária através de repetidas manobras e operações de combate. Desde Maio de 1992, com as operações “Ocean Risk”, conduzida pelo Comando da Esquadra do Atlântico; “Double Assault”, conduzida pelo Comando da Esquadra do Mediterrâneo; “Silent Killer”, conduzida pelo Comando da Esquadra do Pacífico; e “Sea Dragon”, do Comando de Forças de Fuzileiros Navais; até as operações atuais como a “Southern Watch” para interdição de espaço aéreo ao sul do Iraque; a “Vigilant Warrior” para deter o ataque Iraquiano; a “Hope Renewal”, na Somália; a “Capable Guard” em Bohei e a “Preservation of Democracy” no Haiti; em cada uma destas operações a Marinha tem testado, de forma diligente, a sua nova organização. 0 Para maiores detalhes relativos à concepção de “Força Expedicionária da Força Aérea”, ver artigo escrito pelo Air Force Brigadier General (patente sem equivalência no Brasil, correspondendo ao Brigadeiro de uma estrela) William Looney no periódico Air Power Journal, edição Inverno 1996. [N.T.] A “Força Naval Expedicionária” é uma concepção modular, segundo a qual forças navais norte-americanas podem ser organizadas “sob medida”, com capacitações específicas. A força naval expedicionária, resultante desta organização — constituída por forças navais operativas e por uma Unidade Expedicionária Anfíbia — constitui uma força altamente flexível, aplicável em uma ampla variedade de missões, incluindo operações de ataque de longo alcance e pré-incursões a força visando facilitar ou assegurar a vinda de forças complementares. (“Forward... From the Sea”, Department of the Navy, Washington 19/09/1994, http://www.nwdc.navy.mil/Library/Documents/ffts.aspx) A missão que foi atribuída a esta “Força Força Naval Expedicionária”, Expedicionária integrada por meios navais e de fuzileiros navais, compreende a rápida obtenção do controle de áreas marítimas, em paralelo à condução de operações de combate em terra em regiões costeiras. O que impressiona e surpreende a Marinha de forma mais agradável, é que a verba para a aquisição do equipamento de desembarque anfíbio, necessário para a Força Naval Expedicionária, Expedicionária na prática, já obteve a aprovação do Congresso norteamericano. Ver edição de Novembro de 1995 da revista “Sea Power”, “From Over the Horizon to Over the Beach: More than Expected Budget Funds” — O Congresso Norte-norte-americano aprovou, recentemente, a alocação de recursos no orçamento do ano fiscal de 1996 para a construção de sete unidades de ataque e múltiplo emprego anfíbio, deixando a Marinha bastante satisfeita. Devido a limitações orçamentárias a Marinha Norte-norte-americana planeja esperar até 2001 para propor alocação para este navio.... a Marinha decidiu encaminhar a requisição orçamentária para a construção do primeiro Navio-Desembarque Doca - LPD-17 até 1998 ao invés de 1996. No entanto, o que excedeu às expectativas foi que o Congresso aprovou a alocação de US$ 974 milhões para este navio”. A parcialidade que os políticos norte-americanos têm em relação à Marinha contribuiu para que essa força, e em especial os Fuzileiros Navais, fossem tratados com frieza quando do seu retorno da Guerra do Golfo. Além disso, após o estabelecimento de uma nova organização naval, a Marinha estava completamente confiante em voltar a ocupar a posição de liderança entre as Forças Armadas norteamericanas. FORÇAS EXPEDICIONÁRIAS — UM INSTRUMENTO DE POLÍTICA EXTERNA As reformas institucionais iniciadas após a Guerra no Golfo, não só ajustaram a estrutura interna das Forças Armadas norte-americanas, como também, proporcionaram ímpeto para as mudanças no desenvolvimento de armas e táticas, tendo inclusive um efeito de longo alcance na estratégia nacional norte-americana. Uma força expedicionária de pequeno porte, flexível e rápida, empregada não só para missões de ataque, como também para cumprir missões em tempo de paz, tornou-se, além de um novo modelo de organização, almejado por cada um dos componentes militares, uma ferramenta eficaz nas mãos do governo norteamericano. Nossa conclusão é que a existência dessas forças devastadoras, perigosas e altamente eficientes, deu origem uma tendência preocupante quanto ao trato dos assuntos internacionais, e o governo dos Estados Unidos estão cada vez mais inclinados a empregar a força, executar mais rapidamente as ações militares e vingar-se, até mesmo quando ocorrem os menores ressentimentos. Essas interações entre o governo norte-americano e suas forças armadas, envolvendo políticos e militares, estão gerando entre os militares norte-americanos um processo sub-reptício, e ao mesmo tempo profundo e possivelmente desastroso, que vai desde a organização básica das forças até o pensamento estratégico. Atualmente, o Departamento de Defesa norte-americano está tentando combinar as forças expedicionárias aéreas, navais e terrestres numa “Força-Tarefa Força-Tarefa Aliada” Aliada integrada, sendo esta a mais nova etapa neste processo de transformação. Ainda é difícil de prever se esta força completamente integrada irá arrastar os militares norte-americanos, e até mesmo os Estados Unidos com as mesmas características especiais, para um atoleiro incomodo, ainda que, de maneira expedita, estejam cumprindo a missão global atribuída ao Governo norteamericano. DAS CAMPANHAS COMBINADAS ATÉ A GUERRA ONIDIMENSIONAL — UM PASSO PARA O COMPLETO ENTENDIMENTO A CONCEPÇÃO DE OPERAÇÕES COMBINADAS Quando dizemos que a doutrina militar norte-americana está atrasada, este atraso é relativo, apenas, à sua avançada tecnologia. Quando comparado ao pensamento dos militares de outras nações, a característica inteiramente tecnológica do pensamento militar norte-americano lhe confere uma incontestável posição de liderança para os combates de alta-tecnologia, que ocorrerão nas hipotéticas guerras do futuro. Fora do âmbito dos Estados Unidos, a antiga União Soviética, que foi a primeira a propor o conceito de uma “nova revolução militar”, seja a única evidência de manifestação dessa tendência revolucionária. A “nova revolução militar” é nitidamente retratada como produto forjado na bigorna da Guerra do Golfo. Este slogan irracionalmente popular e ridículo foi aceito, não somente pelos os militares norte-americanos, como também, pelas forças armadas de outras nações. É muito fácil desejar a tecnologia dos outros, adotando determinados slogans. Neste processo, os únicos a desenvolverem um esforço maior seriam os próprios norte-americanos. Se os norte-americanos pretendem garantir a sua posição de liderança no campo das reformas militares, que já foram iniciadas e que se completarão em pouco tempo, então a primeira coisa a ser feita é eliminar o vazio existente entre a sua doutrina a sua tecnologia militar, porque na realidade, a poeira da guerra apenas assentou. As forças armadas norte-americanas mal haviam completado a retirada de seus efetivos do Golfo Pérsico, e já havia sido iniciado um processo de transformação tecnológica, de cima para baixo, desde os escalões superiores até os inferiores, envolvendo uma mudança radical de concepções. Isso significa que o processo de reformas tecnológicas militares foi iniciado sem ter sido acompanhado por uma evolução sincronizada do pensamento doutrinmilitar. Em última análise, os norteamericanos são incapazes de romper completamente com a sua predileção por tecnologia, eles continuam presos a este círculo vicioso do qual não são capazes de se desprender. Ainda assim, eles já obtiveram alguns resultados que são igualmente benéficos para as suas forças, assim como, para aquelas de outros países. O primeiro destes resultados é a concepção de “operação operação combinada”, combinada e o segundo é consolidação da teoria do “combate combate onidimensional”. onidimensional A concepção da “operação operação combinada” combinada foi apresentada na publicação “Joint Warfare of the Armed Forces of the United States — JP-1”, em Novembro de 1991, em decorrência às instruções emanadas no documento “United States Armed Forces Joint Operations”, emitido pela “U.S. Military Joint Conference”. Esta concepção, plena de novos conceitos oriundos da Guerra no Golfo, rompeu com as fronteiras das já conhecidas e desatualizadas concepções de “Guerra Guerra Contratual” Guerra Cooperativa” Combate Contratual 0 e “Guerra Cooperativa 0 , indo além, inclusive, da teoria do “Combate Integrado Ar Terra”, Terra que era considerada pelos norte-americanos como uma arma miraculosa. A regulamentação desta nova concepção apresentava os quatro elementos básicos para uma Operação Combinada: comando centralizado; igualdade entre as forças singulares; integração completa; e o envolvimento integral na condução da batalha. Ela definia claramente, e em caráter inédito, a autoridade de comando e controle do Comandante da Zona de Batalha unificada; estipulava que, dependendo da situação corrente, qualquer uma das forças singulares poderia assumir a ação prioritária na batalha; expandia a teoria do “Combate Integrado Ar Terra” para o conceito de “Ação Integrada Ar, Terra, Mar e Espaço”; e enfatizava o envolvimento integral na condução da batalha em todas as frentes de combate. Com o estabelecimento da doutrina, e sob uma forte pressão da Junta de Chefes de Estado-Maior, as Forças Singulares estão empenhadas em reformular e unificar regulamentos militares coincidentes ou complementares, a fim de tornar pública a implementação desta nova orientação tática representativa do direcionamento das futuras guerras. Ainda que as Forças Singulares tenham formalmente aceito este novo conceito, cada uma delas ainda se apega, de forma prioritária, às suas respectivas missões básicas, e pretende realizar uma unificação claramente delimitada, ou seja, uma unificação que expresse com nitidez a ambiência de atuação de cada força e da autoridade a ela relacionada, incluindo nesta demarcação regulamentos, leis, e procedimentos específicos de honras militares. O Chefe da Junta de Chefes de Estado-Maior, o General John Shalikashvili, imaginava que esta nova concepção não deveria significar, simplesmente, um compromisso formal assumido por cada um dos então Chefes de Estado-Maior. Ao adotar a publicação “The Plan for Joint Force in 2010 — ‘O Modelo’ para a 0 [N.T.] A Guerra Contratual significa que, de comum acordo, através de documentos oficialmente firmados, a cada Força Singular competiam tarefas e ações específicas. 0 [N.T.] A Guerra Cooperativa, era algo mais vago que a Guerra Contratual, sendo definida em uma linguagem não comprometedora, utilizando expressões como: “A Marinha procurará apoiar o Exército...”. Orientação das Forças Armadas para as Operações Combinadas”0, o General Shalikashvili assumiu o papel de um moderno Moisés, orientando as forças armadas norte-americanas para o desmantelamento das cercas que as separavam, singrando pelo difícil caminho da efetiva concretização das operações integradas e unificadas, tudo isso envolto numa penumbra que desperta dúvidas. Ainda que se trate dos Estados Unidos, um país que aceita e propaga, facilmente, tudo aquilo que constitui novidade, a realidade é bem mais difícil do que o General Shalikashvili imaginava. Após a sua passagem para a reserva as críticas ao “planejamento combinado” para as forças armadas norte-americanas intensificaram-se gradualmente, e o ceticismo começou a ganhar um novo alento. O Corpo Fuzileiros Navais0 acredita que “não se deveria fazer a apologia da concepção de operação combinada, reprimindo-se discussões futuras relativas à organização de combate das tropas”, visto que, “a uniformidade da concepção combinada provocaria a perda da distinção entre as forças singulares”, e que “isto seria contrário ao espírito norte-americano de enfatizar a competição e diversificação”. A Força Aérea, diplomaticamente, opinou que “o plano de unificação para 2010 deve ser desenvolvido em termos práticos, e que deve estimular a emulação entre as forças singulares”, e que, “nesta era de mudanças e experimentações, o nosso pensamento deve ser flexível, não podendo tornar-se rígido”0. Quanto a este aspecto, os pontos de vista da Marinha e do Exército são semelhantes, e têm poder 0 Para conhecer a publicação “Doutrina Combinada para 2010” concebida em 1996 na reunião militar combinada, consultar a edição Verão de 1996 do periódico “Joint Force Quarterly” . Na edição de Inverno do mesmo periódico, tanto o Comandante de Operações Navais Johnson, quanto o Chefe de Estado-Maior da Força Aérea Fogleman, manifestaram o seu apoio pela “Doutrina Conjunta de 2010”. O Chefe do Estado-Maior do Exército Reimer da mesma forma, em resposta divulgou, imediatamente, a “Concepção do Exército para 2010”. 0 [N.T.] Algo que os autores não mencionam ou comentam é que na estruturação da expressão militar norte-americana, o Corpo de Fuzileiros Navais constitui uma quarta Força Singular, independente das demais. 0 Ver artigo titulado “Reform Will Not Be Smooth Sailing” escrito pelo Capitão de Fragata Huofuman, publicado no “United States Naval Institute Journal” em Janeiro de 1998. suficiente para destruir, instantaneamente, os diligentes esforços do General Shalikashvili. Assim, constata-se que as indesejáveis mudanças em processos, decorrentes de mudanças na chefia, não é um fenômeno característico do mundo Oriental. Na qualidade de observadores, podemos, é claro, sacrificar uma ideologia válida em função do estreito benefício de um grupo. A essência das “operações e planos combinados”, certamente, não é a concessão ou eliminação de vantagens específicas e de caráter militar para as forças; ao contrário, seus propósitos visam a possibilitar que as forças singulares alcancem a unificação operacional no contexto de uma ambiência de batalha centralizada, reduzindo ao máximo, os efeitos negativos decorrentes de cada força seguir um curso de ação próprio e independente. A implementação de normas para condução de operações e planos combinados constitui uma etapa tática de alta importância, até que um caminho seja encontrado para a integração completa das forças singulares. No entanto, a limitação ainda existente quanto a este processo de integração, reside no fato de que sua origem e seu objetivo repousam, ambos, no âmbito das forças singulares, as quais ainda não foram capazes de expandir suas percepções do significado da concepção “combinado”, para todas as ambiências nas quais os seres humanos podem gerar comportamentos de confronto. O que se constata neste final de século XX, como ponto fraco da concepção de Operações Combinadas, Combinadas é o pouco interesse que esta concepção despertou, mesmo numa era em que já emergiram insinuações quanto ao significado amplo e genérico da guerra. Neste sentido, se a concepção de “Combate Combate Onidimensional” Onidimensional não tivesse sido lançada em 1993 pela publicação do Exército norte-americano “The Essentials of War”, nós estaríamos simplesmente estarrecidos com o conteúdo “anêmico” quanto ao tema na ambiência do pensamento militar norte-americano. O COMBATE ONIDIMENSIONAL A décima terceira revisão da publicação “The Essentials of War”, apresenta uma abordagem profunda quanto aos vários desafios que as forças armadas norte- americanas poderão enfrentar nos próximos anos, e pela primeira vez, foi proposto um conceito completamente novo de “operações operações militares não-combate”. não-combate Foi graças a esta concepção que os norte-americanos vislumbraram a possibilidade de praticar a “total total positional warfare” warfare 0, levando assim o Exército norte-americano a encontrar uma denominação extremamente significativa para a sua nova teoria sobre a guerra — “Combate Combate Onidimensional”. Onidimensional O que é interessante é o fato de que a pessoa encarregada de revisar a edição de 1993 da publicação “The Essentials of War”, e que demonstrou um surpreendente espírito inovador, foi o General Tommy R. Franks, que era criticado por ter uma mentalidade operacional conservadora, quando comandava o 7º Exército no Golfo. Não fossem as circunstâncias posteriores, que mudaram a direção do pensamento norte-americano, este Oficial, Comandante do Quartel-General de Adestramento e Doutrina do Exército dos Estados Unidos, e que foi o primeiro a assumir este cargo logo após a guerra, teria levado a história do pensamento militar norte-americano a uma inovação inédita. O General Franks e o grupo que o auxiliou na compilação de suas instruções foram incapazes de conciliar a grande discrepância existente entre as duas sentenças: “implementação implementação e apoio centralizado de operações navais, aéreas e terrestres em todo o Teatro de Operações” mobilização de todos os possíveis métodos em todos Operações e “mobilização os tipos de operações, quer de combate ou não, de modo a, de forma resoluta, executar de maneira absoluta, qualquer missão atribuída” atribuída que constam da publicação “The Essentials of War”, e eles foram ainda menos capazes de perceber que, além da considerar a guerra como uma operação militar, existe ainda a possibilidade da ocorrência de um amplo espectro de operações não-militares. não-militares No entanto, a publicação, pelo menos, assinalou que o “Combate Combate Onidimensional” Onidimensional deveria possuir características especiais de “profundidade total, altitude total, frente total, tempo total, freqüência total e multiplicidade de métodos”, e tal consideração representa, precisamente, o aspecto mais revolucionário deste modelo de combate, que nunca foi visto na história da guerra0. 0 [N.T.] “Positional Warfare” constitui um modelo de guerra baseada na adoção de uma estratégia defensiva compreendendo o emprego de linhas, ou, rede de posições fortificadas, guarnecidas de forma estática por forças ou unidade de tropa com pouca mobilidade. A “Positional Warfare” tem um caráter preventivo, tendo como propósito impedir uma penetração de forças inimigas, não visando o enfraquecimento do inimigo. 0 Há uma introdução detalhada à “Combate Onidimensional” na edição de 1997 do “World Military Almanac” É uma pena que os norte-americanos, e mais especificamente, o Exército, tenha descontinuado demasiadamente cedo esta revolução. Uma das divergências ao trabalho de Franks foi apresentada pelo General Holder, um ex-Comandante de regimento subordinado ao General Franks, o qual posteriormente assumiu o cargo de Comandante do Setor de Armas Combinadas do Quartel-General de Doutrina e Adestramento do Exército, e que analisou minuciosamente as idéias de seu superior. O então General de Divisão Holder já não era mais um altivo e vigoroso coronel nos campos de batalha, agora ele desempenhava a função de porta-voz do Exército no contexto de uma tradição conservadora. O seu ponto de vista era de que a “crença de que as ‘operações operações militares de nãocombate’0 teriam o seu conjunto específico de princípios não era bem aceita entre os militares, e que muitos oficiais em comando opunham-se à diferenciação entre os significados de ‘operações operações militares de não-combate’ e o de operações militares de combate”. combate Após o falecimento do General Holder, “o Exército desenvolveu um consenso quanto ao erro de considerar uma diferenciação conceitual para as ‘operações operações militares não-combate’, não-combate por entenderem que, em assim procedendo, estariam considerando uma nova e indesejada modalidade de operação nos regulamentos básicos, enfraquecendo, assim, a característica das forças armadas que seria a de enfatizar os assuntos militares, podendo, também, gerar confusão na condução das operações por essas forças”. Com a situação indo por esta vertente, a revolução proposta pelo General Frank acabou como num aborto inevitável. Sob a inspiração do novo Comandante do Quartel-General de Doutrina e Adestramento do Exército, o General William W. Hartzog, o grupo que editou em 1998 a publicação “The Essentials of War” finalmente introduziu uma profunda correção à nova edição desta publicação, estabelecendo “um único princípio, que 0 Esta classificação engloba um grupo de ações militares, que integram o conceito de “Military Operations Other than War - MOOTW” e que se caracterizam por não preverem a entrada em combate. Não obstante, a doutrina norte-americana prevê que alguns riscos são inevitáveis, e em decorrência, vítimas poderão ocorrer. Desta forma é prescrito a adoção de medidas defensivas, tanto a nível pessoal (autodefesa), como a nível de unidade, a cargo dos respectivos Comandantes. cobria todos os tipos de operações militares conduzidas pelo Exército”, como um elemento definidor fundamental. De acordo com esse princípio, não haveria mais a distinção entre operações militares de combate e as “operações operações militares de não-combate”, não-combate e sim, a definição de quatro tipos básicos de operações, quais sejam: Ataque, Defesa, Estabilização e Apoio. Além disso, a conceituação de “operações operações militares de não-combate” não-combate restringir-se-ia ao enquadramento de determinadas ações tais como, resgate e proteção; e, ao mesmo tempo, restabelecia-se o antigo conjunto de operações típicas de guerra, assegurando, assim, o posicionamento prioritário dos princípios de guerra centralizada na direção correta, ao mesmo tempo em que se descartava a concepção de “Combate Combate Onidimensional” Onidimensional 0. Aparentemente, este era um movimento radical de reforma e simplificação, compreendendo o mero corte do supérfluo. Mas na realidade, tratava-se de uma demonstração norte-americana de um julgamento insatisfatório. E simultaneamente, na medida em que a confusão teórica causada pelo prematuro conceito de “operações operações militares de não-combate” não-combate foi dirimida, os frutos ideológicos que acidentalmente foram colhidos, também foram abandonados por conta da nova versão da citada publicação. Tudo faz crer que, na dança em que se dá um passo a frente e dois para trás, todos os seres humanos são autodidatas. Todavia, realçar a falta de visão do Exército norte-americano não significa dizer que a concepção de “Combate Combate Onidimensional” Onidimensional é isenta de críticas. Muito pelo contrário, existem falhas conceituais evidentes nesta teoria, tanto em sua denotação 0, quanto na sua conotação.0 Na realidade, o entendimento do que é a batalha sob ponto de vista do “Combate Combate Onidimensional ” é muito mais genérico em relação àquele que existia em teorias militares anteriores; todavia no que concerne à sua característica congênita, o conceito de batalha ainda não se libertou da categoria “militar”. 0 De acordo com o artigo “Changes to the Newly Published Draft of ‘Essentials of War’” escrito por Xiaoen Neile; “United States Army Times”; 18 de agosto de 1997. 0 [N.T.] Significado específico ou direto, diferente de uma idéia implícita ou associada. 0 [N.T.] uma sugestão de significado por uma palavra, aparte daquilo que ela explicitamente nomeia ou descreve. Por exemplo, o já citado conceito de “operações operações de guerra não-militares” não-militares [ver pág. 51], tem um significado muito mais amplo do que o conceito de operações militares de combate, combate podendo, pelo menos, ocupar uma posição no mesmo patamar das outras ambiências de guerra, que estão fora do campo de visão dos militares norteamericanos — e esta é, precisamente, a grande ambiência na qual os futuros militares e políticos devem desenvolver sua imaginação e criatividade — e mesmo assim não se terá alcançado o significado rela do termo “onidimensional”. Isto sem mencionar que a expressão “onidimensional”, no âmbito do Exército norte-americano, no final das contas, ainda não teve a sua abrangência definida, ou seja, não há definição de quantas ambiências ela se refere, e se estas ambiências interagem com a guerra de forma isolada ou de forma simultânea. Em outras palavras, isto que dizer que ainda não se elaborou em detalhe este conceito, e que, portanto, persiste uma situação caótica. E assim, se o real significado da expressão “onidimensional” não puder ser definido, então esta concepção original com o seu rico potencial, evidentemente, não poderá ser completamente implementada. Na realidade, não há quem possa conduzir uma guerra nos 360 graus de uma ambiência tridimensional, com o tempo e outros elementos não-físicos de uma dimensionalidade total adicionados, e da mesma forma, qualquer guerra terá sempre uma ênfase particular, e será deflagrada e encerrada dentro de uma dimensão também limitada. A única diferença é que, num futuro previsível, as operações militares não constituirão mais a totalidade da guerra, e ao contrário, formarão uma das dimensões de um espectro multidimensional. Mesmo incorporando as “operações operações militares de não-combate” não-combate como proposto pelo General Franks, ainda assim não teríamos a característica onidimensional total. Somente incorporando todas as “operações operações de guerra não-militares” não-militares em paralelo às operações militares, o significado onidimensional da guerra pode ser atingido. O que deve ser frisado é que, desde a Guerra do Golfo, esta ideologia não conseguiu emergir de forma completa nas pesquisas teóricas realizadas pelos militares norteamericanos. Provavelmente só há um artigo, “A Military Theoretical Revolution: The Various Mutually Active Dimensions of War”, escrito por Antuli’ao Aiquieweiliya, que assinalou que as “várias dimensões” da guerra não deveriam ser entidades como comprimento, largura e profundidade, inerentes à teoria da geometria e espaço; e que, ao invés, deveriam ser considerados fatores como a política, sociedade, tecnologia, combate e logística que estão intimamente relacionados com a guerra. É uma pena, no entanto, que a visão da guerra deste autor ainda se concentre no eixo militar, não tendo rompido com a denotação da guerra. Mesmo que estas concepções de “operações operações militares não-combate” guerra não-combate e de “guerra onidimensional” onidimensional possuam inúmeras idéias originais e estejam bem próximas de uma revolução na ideologia militar, que teve origem a partir da revolução tecnológica militar, pode-se dizer que, ao longo da árdua trilha em que se encontram, os norte-americanos chegaram à beira de um precipício, e o pico da montanha, que significa a grande revelação, ainda está muito longe. Neste ponto os norte-americanos pararam, e as “lebres” norte-americanas que sempre estiveram na dianteira em relação a qualquer outra nação, nos campos da tecnologia e ideologia militares, começaram a perder o fôlego. De nada adiante que Sullivan ou Franks tenham proporcionado algum fôlego para as “lebres da competição”, por meio das muitas proposições que apresentaram após a Guerra do Golfo, pois a realidade é que eles não podem permitir que as tartarugas, que integram o mesmo time, sejam deixadas para trás. Talvez esta seja a hora apropriada para que o Tenente-Coronel Lonnie Henley0 e aqueles norte-americanos que questionaram a capacidade de implantação de revoluções militares em outras nações, façam um exame de consciência. Por que é que não ocorreu uma revolução? 0 Na Conferência sobre Estratégia, realizada pela Escola de Guerra do Exército dos estados Unidos em Abril de 1996, o Tenente-Coronel do Exército Lonnie Henley escreveu um trabalho titulado “21st Century China: Strategic Partner... or Opponent”, no qual concluía que: “Pelo menos, nos primeiros 25 anos do próximo século, a China não será capaz de desenvolver uma revolução militar.” (Ver “Foreign Military Data” do Departamento de Pesquisa Militar Estrangeira Academia de Ciência Militar, Junho de 1997) da PARTE 2 — UMA DISCUSSÃO SOBRE NOVOS MÉTODOS DE OPERAÇÃO Um exército não tem um dispositivo rígido, tanto quanto a água não tem uma forma fixa. Aquele que obtém a vitória, sabendo aproveitar as manobras do adversário possui uma arte realmente divina. Sun Zi A condução da guerra é uma arte, semelhante a de um médico examinando um paciente, Fu Li O PENSAMENTO NORTE-AMERICANO ENFOCA A ALTA-TECNOLOGIA E RELEGA A TÁTICA A expressão “revolução militar” é um modismo assim como a NBA (National Basketball Association) e Michael Jordan. O fato de que, ao aparecimento de cada coisa nova correspondem necessidades específicas, no caso dos norte-americanos, isto é significativo pelo fato deles serem adeptos da criação de modismos. Os norteamericanos, que sempre apreciaram ostentar uma posição de liderança no mundo no que concerne a diversas questões, são reconhecidamente eficientes quanto à apresentação de um excelente pacote, tratando de qualquer tema novo de acordo com o seu pensamento, disseminando-o, em seguida, para todo o mundo. Ainda que diversas nações tenham demonstrado ansiedade e resistência à invasão da cultura norte-americana, ainda assim, adaptaram-se, e imitaram de forma completa os pontos de vista norte-americanos no que tange aos temas relacionados com a revolução militar. Os resultados não são difíceis de serem previstos, e desta forma, quando os norte-americanos ficam resfriados o mundo inteiro começa a espirrar. Pelo fato de William J. Perry, o ex-Secretário de Defesa dos Estados Unidos, ter priorizado a tecnologia “stealth”, tendo sido denominado o “pai do stealth”, ao ser perguntado por um professor chinês sobre “quais seriam as realizações importantes e avanços teóricos na revolução militar dos Estados Unidos”, ele respondeu sem hesitar: “logicamente que foram a tecnologia ‘stealth’ e a tecnologia cibernética. A resposta de Perry traduzia o ponto de vista predominante nos círculos militares norte-americanos — a revolução militar era uma revolução da tecnologia militar. De acordo com ponto de vista daqueles que pensavam como Perry, seria apenas necessária a resolução do problema do ponto de vista tecnológico, possibilitando que os soldados, diante de uma montanha, possam saber “o que existe do outro lado daquela montanha” e isto seria o equivalente a realizar esta revolução militar. Quando o Coronel Chen Bojiang, um colega de pesquisas do Instituto de Ciência Militar visitava estudiosos nos Estados Unidos, ele conheceu um grupo de pessoas muito importantes no âmbito militar Americano. Chen Bojiang, então, perguntou a Perry: “Quais foram as realizações e desenvolvimentos mais importantes que foram produzidos pela Revolução Militar Norte-americana?” A resposta de Perry foi: “O desenvolvimento mais importante foi, é claro, a tecnologia “stealth”, constituindo um avanço extraordinário. No entanto, eu gostaria de dizer que numa área completamente diferente, algo de igual importância foi a invenção da “information technology”, que resolveu o problema que tinha que ser resolvido pelo soldados por vários séculos, qual seja: o que é que existe além da próxima montanha? O progresso para solucionar este problema tem sido muito vagaroso por diversos séculos. O progresso da tecnologia tem sido extremamente rápido nos últimos dez anos, nos quais apareceram métodos revolucionários para resolver este problema. (National Defense University Journal, 1998, Nº 11, p.44). Na qualidade de professor na Faculdade de Engenharia da Universidade de Stanford, é natural que Perry tenha maior tendência para observar e entender a revolução militar do ponto de vista técnico. Ele é, sem dúvida, um dos proponentes de tecnologia na revolução militar. A observação, análise e resolução de problemas sob o ponto de vista tecnológico é um aspecto típico do pensamento norte-americano, e as vantagens e desvantagens deste processo, são ambas bem evidentes, assim como o é o caráter dos norteamericanos. Este tipo de raciocínio, que iguala a revolução tecnológica com a revolução militar foi apresentado pelo modelo adotado para a Guerra do Golfo e exerceu um poderoso impacto com o conseqüente efeito sobre os militares em todo o mundo. Poucas pessoas puderam manter suficiente calma e discernimento com esta situação, e naturalmente não poderiam perceber o equívoco provocado pelos norteamericanos e que provoca, agora, um desentendimento global em relação ao que se tornou uma ampla revolução global. O slogan “estruturar a expressão militar com alta-tecnologia” assemelha-se a um tufão no Oceano Pacífico, atingindo um número cada vez maior de países, e até mesmo a China, situada no litoral ocidental do Pacífico, parece ter sido atingida, durante algum tempo, por esse equívoco. Foi assinalado no “Sumário da Situação Militar” no “1997 World Military Yearbook” que: um avanço especial na situação militar, no período de 1995-1996, foi que algumas das nações mais poderosas começaram a priorizar “o uso de alta-tecnologia para a construção do Poder Militar” tendo como arcabouço a qualidade da formação do militar. Os Estados Unidos implementaram o campo de batalha digital como um objetivo da política de emprego da alta-tecnologia para a formação do militar. O Japão formulou uma reorganização de suas tropas de autodefesa, redimensionando programas e requisitos para o estabelecimento de uma “tropa de choque de altamente tecnológica”. A Alemanha apresentou o Relatório Deerpei propondo avanços significativos em oito tecnologias sofisticadas. A França propôs um novo plano de reforma, visando elevar a “qualidade técnica” de suas tropas. A Inglaterra e a Rússia também empreenderam ações neste sentido; algumas nações de médio e pequeno portes, também adquiriram sistemas de armas avançados, numa tentativa de reposicionar, de uma só vez, o nível técnico de seu pessoal, num nível mais elevado. (1997 “World Military Affairs Yearbook”; “People's Liberation Army Press”, 1997, p. 2). O significado mais importante, e o formato derradeiro da revolução militar concretizam-se com a revolução do pensamento militar, visto que a revolução militar não pode permanecer no nível mundano das transformações de tecnologia militar e da formulação de sistemas. A revolução no pensamento militar é, em última análise, uma revolução nos modelos e métodos de combate. A revolução da tecnologia militar é tão importante quanto a reforma na formulação de sistemas, mas os seus resultados finais baseiam-se nas mudanças dos modelos e métodos de combate. Somente a conclusão dessas mudanças será capaz de refletir a maturação da revolução militar. Parte da perspectiva que equipara a revolução da tecnologia militar com a revolução militar, muitas pessoas estão ainda mais desejosas de ver a revolução militar como o produto da combinação de uma nova tecnologia, com uma nova estruturação da expressão militar, e com um novo pensamento militar. A título de exemplo, Steven Maizi e Thomas Kaiweit declararam em ser relatório intitulado “Strategy and the Military Revolution: From Theory to Policy”: a chamada revolução militar é composta por mudanças simultâneas e mutuamente promotoras de mudanças nas áreas de tecnologia militar, sistemas de armas, métodos de combate, sistemas de organização de tropa, resultando na ocorrência de um salto (ou mudança repentina) na eficiência de combate dos militares. (Relatório de pesquisa do Instituto de Estratégia da Escola Militar do Exercito Norte-americano intitulado: “Strategy and the Military Revolution: From Theory to Policy”). Em outro relatório de pesquisa relacionado ao tema revolução militar, produzido pelo do Centro Norte-americano de Pesquisa em Estratégia e Assuntos Internacionais, é citado que a revolução militar é o resultado da combinação de uma série de fatores. Toffler iguala a revolução militar a uma substituição de civilização, algo bastante amplo e inexeqüível. Caso a revolução da tecnologia militar seja considerada como representando a primeira etapa na revolução militar, estamos então, agora, no início de uma segunda etapa, essencialmente importante dessa revolução. A aproximação da conclusão da revolução da tecnologia militar significa um pressagio do início de uma nova etapa, que apresenta também, em grande parte, os revolução da tecnologia militar tenha possibilitado que se selecionem maiores possibilidades, dentro de uma faixa mais ampla, essas possibilidades transformamse também, ameaças para os seus autores. E nas mesmas proporções0 (e isto ocorre porque, a monopolização de um tipo de tecnologia é muito mais difícil que a de inventar um novo tipo de tecnologia). Tais ameaças nunca se manifestaram como nos dias atuais, porque hoje as possibilidades são distintas e estão num processo permanente de mudanças, e isto, na realidade, cria a impressão de estarmos vendo um inimigo escondido por trás de cada árvore. Qualquer orientação, possibilidade, ou pessoa, tornar-se-á, possivelmente, uma ameaça em potencial para a segurança de um país e, ainda que possa ser possível perceber a existência da ameaça, será muito difícil sabermos, claramente, de onde está vindo essa ameaça. FORÇAS ARMADAS DE OUTROS PAÍSES NÃO SÃO MAIS A PRINCIPAL AMEAÇA À SEGURANÇA Tanto os militares quanto os políticos acostumaram-se raciocinar que o principal fator de ameaça à Segurança Nacional é representado pela Expressão Militar de um Estado inimigo, ou, por um Estado inimigo em potencial. No entanto, as guerras e os principais incidentes que ocorreram no século XX nos proporcionaram, de forma clara e coerente, a idéia de que o oposto é que é o verdadeiro; freqüentemente, as ameaças militares já não são mais os principais fatores que afetam a Segurança Nacional. Ainda que continuem existindo as mesmas disputas territoriais da Antiguidade, os conflitos de nacionalidade, os entrechoques religiosos a delineação das esferas de Poder, e dirigentes deflagrando guerras. Estes fatores tradicionais estão ficando cada vez mais interligados com a apropriação indébita de recursos, a disputa por mercados, o controle de capitais, as sanções comerciais e outros fatores econômicos, a ponto de os fatores tradicionais estarem assumindo um papel secundário. Esses novos fatores passaram a representar um novo modelo de ameaça às seguranças políticas, econômicas, e militares de um, ou, vários países. Este modelo de ameaça, possivelmente, não tem qualquer nuance militar, quando observado à 0 [N.T.] Uma versão mais rebuscada do adágio popular — “quem com ferro fere, com ferro também poderá ser ferido”. distancia e, assim sendo, ele tem sido denominado por alguns analistas como “guerras guerras secundárias” guerras análogas” secundárias ou “guerras análogas 0. No entanto, a destruição que estes novos modelos provocam nas áreas em que atacam, absolutamente não são secundários em relação às guerras exclusivamente militares. Quanto a isto, basta a menção dos nomes de lunáticos como George Soros, bin Laden, Escobar, Matsumoto e Kevin Mitnick.0 É possível que já não possamos mais determinar, com precisão, o momento em que os principais atores, responsáveis pela deflagração de guerras, deixaram de ser os Estados soberanos e passaram a ser as organizações criminosas, as organizações terroristas, os indivíduos do submundo com intenções malévolas, os financistas que controlam enormes quantidades de recursos, ou indivíduos psicologicamente desequilibrados que têm fixação por determinados alvos, personalidades obstinadas, e de caráter resoluto, e todos dotados das possibilidades de iniciar uma guerra militar, ou, não-militar. As armas que eles empregam podem ser representadas por aeronaves, bioquímicos, assim como canhões, gazes venenosos, bombas, vírus de computador, navegadores de agentes redes, e ferramentas de ordem financeira. Em resumo, todos os métodos da nova modalidade de guerra, bem como as medidas estratégicas que podem ser proporcionadas pela nova tecnologia, poderão ser utilizados por esses fanáticos, para desencadear todas as formas de ataques financeiros, ataques em redes interativas de dados, ataques de mídia ou ataques terroristas. A maioria desses ataques não são ações militares, mesmo assim, podem ser encaradas como ações de guerra, que obrigam países a satisfazerem seus próprios interesses ou exigências. Esses ataques têm uma força destrutiva idêntica, e até mesmo superior à das guerras militares, e já criaram sérias ameaças a nossa Segurança Nacional, diferentes daquelas do passado. Tendo em vista este cenário, basta ampliarmos, ligeiramente, nosso campo de visão, e entenderemos que o conceito de Segurança Nacional baseada no regionalismo já está obsoleto. A principal ameaça à Segurança Nacional está muito 0 Ver a obra de Zhao Ying “The New View of National Security” 0 George Soros é um especulador financeiro; bin Laden é um terrorista islâmico; Escobar é um famoso e longínquo traficante de drogas; Matsumoto é o fundador da heterodoxa organização “Aum Shinriko” no Japão; e Kevin Mitnick é um renomado hacker de computador. longe de se limitar, apenas, à agressão militar por forças hostis contra o território de um país. Em termos de valor da redução no índice de Segurança Nacional, se compararmos Tailândia e Indonésia, (que por diversos meses sofreram a desvalorização de suas moedas em várias dezenas de pontos percentuais, alem de terem suas economias próximas á falência) com o Iraque, (que sofreu duplo contingenciamento de ataques militares e boicote econômico), parece-nos não ter havido muita diferença. Até mesmo os Estados Unidos, que é a única superpotência que sobreviveu à Guerra Fria, já constatou a realidade de que a nação mais poderosa do planeta é freqüentemente aquela que se defronta com o maior número de inimigos e a que sofre o maior número de ameaças. Nos “Relatórios de Defesa Nacional” dos Estados Unidos, relativos a vários exercícios fiscais consecutivos, alem de serem relacionados, em ordem decrescente de magnitude, as dez nações “consideradas potências regionais, e que são hostis aos interesses norte-americanos”, são incluídas, também, “o terrorismo; as atividades subversivas e as condições anarquistas que ameaçam a estabilidade do governo federal, a prosperidade e o crescimento econômico norte-americanos; o tráfico ilegal de drogas; e a criminalidade internacional”, como ameaças aos Estados Unidos. Como conseqüência, eles têm ampliado a faixa de busca multiespacial para possíveis ameaças à sua segurança. O Secretário de Defesa dos Estados Unidos mencionou as diversas ameaças com as quais defronta-se os Estados Unidos, em cada um dos Relatórios de Defesa Nacional relativos aos anos fiscais de 1996, 1997 e 1998. No entanto, este tipo de visão ampla não se constitui, de fato, num padrão de observação que os norte-americanos podem manter em termos de consciência própria. Em Maio de 1997, foi frisado no “The Global Security Environment”,— a primeira parte do Relatório de Investigação Quadrienal da Defesa, publicado pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos — que a segurança dos Estados Unidos iria defrontar-se com uma série de desafios. Primeiro seria as ameaças vindas do Iraque, Iran, Oriente Médio e da Península Coreana; em segundo lugar seria a difusão da tecnologia de sensores, como o radar; armamentos biológicos e químicos; assim como a tecnologia de projeção, a tecnologia cibernética a tecnologia “stealth”, e etc; em terceiro lugar seria a atividade terrorista, comércio ilegal de drogas, organizações criminosas internacionais, e falta de controle de imigração; em quarto lugar seria a ameaça de armamentos antipessoal de grande poder. “Nações que estejam capacitadas a rivalizar com os Estados Unidos não têm possibilidade de aparecer antes do ano de 2015, e após 2015, possivelmente aparecerá uma potencia regional ou um inimigo a nível global bem dotado em termos de poder. Alguns consideram que mesmo não se conhecendo os prognósticos relativos à Rússia e à China, mesmo assim, é possível que eles se tornem esse tipo de inimigo”. Este Relatório que corresponde a um esforço conjunto, desenvolvido entre o Gabinete do Secretário do Departamento de Defesa e a Junta de Chefes de Estado-Maior, evidentemente ainda está transitando no âmbito do conceito de ameaça militar, sendo considerado em parte real, em parte imaginário. Ao analisar as ameaças especificadas na edição de 1997 do relatório “United States National Military Strategy” , observa-se que existe uma seção especial que se refere a “fatores desconhecidos” e evidencia que os norte-americanos estão ansiosos e receosos com relação a futuras ameaças. A GLOBALIZAÇÃO GERA UM CONCEITO DE SEGURANÇA NACIONAL AMPLIADO Na realidade, não apenas os Estados Unidos, mas todas as nações que veneram o conceito moderno de soberania, inconscientemente já deram início à ampliação das fronteiras da segurança, estendendo-as a múltiplas ambiências, compreendendo a política, a economia, os recursos materiais, a nacionalidade, a religião, a cultura, as redes interativas, a geografia, o meio ambiente, o espaço sideral e etc. O australiano Xiaomohan Malikev assinalou que as sete tendências que irão influenciar a segurança nacional durante o século XXI são: globalização da economia; globalização de difusão tecnológica; a maré globalizadora da democracia; a polarização da política internacional; mudanças na configuração dos sistemas internacionais; mudanças nas concepções de segurança; e mudanças nos pontos focais de conflitos. Os efeitos combinados dessas tendências constituem as origens das duas categorias de conflitos que ameaçam a segurança na região pacífico-asiática. A primeira categoria é a fonte de conflitos tradicionais: a disputa pela hegemonia pelas grandes nações; a expansão do nacionalismo por nações bem sucedidas; disputas em relação a interesses e direitos territoriais e marítimos; competição econômica; e proliferação de armas com alto poder de destruição. A segunda categoria é constituída pelas novas fontes de futuros conflitos: nacionalismo (racismo) nas nações em declínio; conflitos culturais entre crenças religiosas; a difusão de armas leves letais; disputas em torno da explotação de petróleo, da pesca e de recursos marítimos; as ondas de deslocamento de populações e refugiados; desastres ecológicos e o terrorismo. Todas essas situações interpõem ameaças múltiplas às nações no decorrer do século 21. A visão deste australiano, com relação à segurança nacional é um pouco mais ampla que a das autoridades norte-americanas. (Ver a publicação “United States' Comparative Strategies”, 1997, No. 16, para maiores detalhes). Este tipo de “visão ampliada de soberania” constitui uma premissa para a sobrevivência e desenvolvimento dos paises modernos, assim como, para os seus esforços visando alcançar uma posição de influência no cenário mundial. E desta forma, em contraste, a idéia de que a defesa nacional representa o principal objetivo da segurança de um país, parece estar, no momento, um pouco desatualizada, ou, pelo menos, um tanto o quanto insuficiente. Em correspondência à nova “visão ampliada de soberania”, deveria haver uma nova concepção de segurança, que incluísse a totalidade generalizada dos interesses nacionais. O que este conceito deveria realmente significar, certamente, não está limitado ao tema da Segurança Nacional, mas, ao invés, deve reunir as exigências de segurança do país em diversas áreas, compreendendo a segurança política, a segurança econômica, a segurança cultural e a segurança das informações, em um único conjunto de objetivos nacionais. Isto define uma “visão ampliada de segurança”, ampliando o tradicional conceito de domínio territorial para incorporar, também, os interesses nacionais. O acréscimo de responsabilidades inerente a essa “visão ampla de segurança” acarreta dificuldades em relação ao seu objetivo, bem como, quanto aos métodos e meios necessários para a consecução desse objetivo. Daí decorre que a estratégia nacional capaz de garantir a consecução dos objetivos da Segurança Nacional — isto é, aquilo que, de modo geral, é denominado Grande Estratégia — também necessita de ajustes que se situam além das estratégias militares e até mesmo das estratégias políticas. [N.T.] Os autores, neste ponto da obra, apresentam um conhecimento diverso do corrente, quanto aos significados de “Estratégia Nacional” e de “Grande Estratégia”. “Grande Estratégia” é um termo criado na Europa, no decorrer do século 20, e que tinha em última análise o mesmo significado de “Estratégia Nacional”, considerando a nação voltada para a consecução de uma grande guerra. Na obra, os autores insinuam que ambos os termos teriam o mesmo significado. Tudo o que os autores prescrevem no que tange à segurança nacional refere-se, segundo o entendimento brasileiro, exclusivamente ao conceito de Estratégia Nacional. Tal estratégia deve levar em conta tudo o que se refere a cada aspecto da lista de segurança dos interesses nacionais, assim como, interligar os fatores políticos (vontade nacional, valores nacionais e a coesão nacional) e os fatores militares, aos parâmetros da economia, cultura, relações internacionais, tecnologia, meio ambiente, recursos nacionais, nacionalidades e outros, antes que se possa definir uma completa “soberania ampliada” que reúna os interesses nacionais e a Segurança Nacional, formando um grande mapa da situação estratégica. A CHAVE ESTRATÉGICA — A COMBINAÇÃO CRIATIVA DE DIVERSOS ELEMENTOS Qualquer um que se defrontar com este mapa de situação experimentará, subitamente, um sentimento de pequenez, devido à sua insignificância diante de tão vasto oceano. Como será possível desenvolver um conjunto uniforme e singular de meios e métodos que seja aplicável a uma área tão ampla e volumosa, tão complexa e repleta de interesses autoconflitantes, e com alvos tão complexos e até mesmo reciprocamente antagônicos? Por exemplo, como poderão ser empregados os meio militares, no contexto da opinião de Clausewitz — “o derramamento de sangue ajudando a política” — para solucionar a crise financeira do Sudeste Asiático? Ou então, de que forma poderemos enfrentar os hackers — que circulam feito sombras pelos meandros da Internet — utilizando o mesmo tipo de método? A conclusão evidente é que dispor apenas de uma espada, para o trato da Segurança Nacional, no amplo nível da segurança a que nos referimos, não é mais o suficiente. Uma única viga de madeira não é suficiente para sustentar um prédio que está ameaçando desmoronar. O grande átrio da segurança de um moderno edifício nacional está muito além de poder ser sustentado pela resistência isolada de um único pilar. A solução para que ele se mantenha íntegro, e não colapse, reside em sua sustentação ser composta por uma resultante da composição de forças inerentes a todos os aspectos do interesse nacional. Alem disso, identificado este tipo de força resultante, também é necessário materializar essa força em termos de meios que possam ser utilizados operacionalmente. Isto deveria ser um “grande método de guerra” que combinasse todas as dimensões e métodos constantes das duas grandes ambiências, a militar e a não militar, e assim conduzir a guerra. Isto representa o oposto da formulação de métodos de guerra que foram utilizados em guerras do passado. Tão logo surgiu este “grande método de guerra”, foi vislumbrado a necessidade de criação de um modelo de guerra totalmente novo, que simultaneamente englobasse e se superpusesse a todas as dimensões que influenciam a Segurança Nacional. No entanto, quando analisamos os princípios deste “grande método de guerra” constatamos que, ao contrário de ser complexo, é uma simples questão de combinação. “O Caminho criou o uno, o uno criou o dois, o dois criou o três, e o três criou dez mil coisas”0. Não importa que sejam dois ou três ou dez mil coisas, tudo resulta da combinação. Com a combinação existirá abundância e com a combinação haverá uma miríade de mudanças, e com combinação haverá diversidade. A combinação praticamente ampliou, a um valor infinito, os meios da guerra moderna, e praticamente mudou a conceituação de guerra moderna elaborada no passado: a guerra executada com armas e métodos de operações modernos. Isto significa que embora a ampliação das medidas reduza o efeito das armas, o conceito da guerra moderna também é ampliado. Receamos que a maioria das antigas aspirações de alcançar a vitória numa guerra, exclusivamente através de meios militares, numa situação em que a seleção de meios necessária para cobrir toda a extensão do campo de batalha sofreu uma 0 [N.T.] Ainda que o autor não faça qualquer menção, esta citação corresponde a um antigo adágio chinês. grande expansão, tornou aquelas aspirações inócuas, como que “nadar e morrer na praia”0. O que deve ser feito por todos aqueles militares e políticos, imbuídos da ambição pela vitória, é ampliar o seu campo visual, escolher o momento oportuno, avaliar a situação, confiar na adoção de um método de guerra significativo, e livrarem-se do miasma que representa a visão tradicional da guerra. Escalar a montanha e apreciar o nascer do sol. 0 [N.T.] Utilizamos esta adaptação, por entendermos quer a versão em português do adágio chinês utilizado pelo autor — “and be marginally within the mountain " — não faria qualquer sentido. CAP 5 - NOVA METODOLOGIA DOS JOGOS DE GUERRA “Os grandes mestres da arte da guerra do século 21 serão aqueles que empregarem métodos inovadores para possibilitar o reagrupamento de diversas capacidades de modo a permitir a consecução dos objetivos táticos, operacionais e estratégicos”. Yier Tierfude Tudo está em transformação. Considerando as mudanças decorrentes da explosão da tecnologia; da substituição dos armamentos; do desenvolvimento de novos conceitos de segurança; da redefinição quanto a alvos estratégicos; da falta de clareza no tocante aos limites do campo de batalha; da expansão da esfera de atuação e da dimensão dos meios não-militares, como, também, do pessoal civil envolvido na guerra; vemos que tudo está enfocando um único objetivo, o início de uma nova era de revolução dos métodos operativos. Esta revolução não está em busca de métodos operativos que se coadunem com cada tipo de mudança, mas em vez disso, está procurando um método operativo comum que leve em conta todas essas mudanças. Em outras palavras, está procurando uma nova metodologia que utilize um método para o trato das inúmeras alterações das guerras futuras. A Guerra é o jogo mais típico, e ainda assim, freqüentemente não é suscetível às teorias clássicas dos jogos. A guerra é, intrinsecamente, o comportamento irritado do homem, e baseando-se em diversas conjecturas do “homem racional” irá naturalmente e facilmente falhar. Os temidos efeitos decorrentes do uso de armas nucleares têm levado a humanidade a gradualmente encontrar o seu caminho de volta, do comportamento mais irracional à racionalidade há muito tempo perdida. Além disso, a direção da globalização tem levado a humanidade a concordar com o pensamento do “homem racional” no processo de busca da segurança nacional, aprendendo a libertar-se da “condição de vítima”, e não mais participar de jogos hegemônicos de “briga de galo” como entre os Estados Unidos e a União Soviética. O jogo econômico compreendendo tanto a cooperação quanto a competição, já começou a infiltra-se na esfera militar e a influenciar a guerra nesta nova era. (Referências podem ser encontradas na abordagem feita na obra de Zhang Weiying — “Game Theory and Information Economics”; Livraria Sanlian de Shanghai; Shanghai People’s Press; 1996). REMOVENDO A COBERTURA DAS NUVENS DA GUERRA Quem já visualizou a guerra do futuro? Ninguém. A despeito disso, os seus diversos cenários já foram propagados por muitos profetas e ficaram gravados em nossas mentes como se fossem desenhos animados vulgares. Desde a sufocante guerra de satélites em órbitas espaciais até as perseguições angulares por submarinos nucleares nas profundezas dos oceanos; desde as bombas de precisão lançadas por bombardeiros “stealth0” até os mísseis lançados de um cruzador equipado com o “Escudo de Zeus0” aqueles cenários cobrem céus e terra e são muitos para serem enumerados. O exemplo mais representativo destes cenários é a descrição de um exercício de manobra de campo, realizado pelas unidades digitalizadas norte-americanas, no complexo do Centro Nacional de Treinamento de Fort Irwin (Califórnia, EUA). Com as unidades digitalizadas como “Forças Azuis”, o sistema de computadores estava permanentemente recebendo e processando as informações transmitidas pelos satélites e pelas aeronaves “Joint Star0”. Aviões de alarme aéreo antecipado (AEW) monitoravam todo o espaço aéreo. Caça-bombardeiros, orientados pelos satélites e aviões AEW, atacavam seus alvos com mísseis de precisão. Forças terrestres e helicópteros blindados alternavam-se nos ataques ao inimigo num padrão tridimensional. Soldados de infantaria dispunham de “laptops” para receber ordens e estavam equipados com armas automáticas, dotadas de visores óticos integrados aos capacetes individuais. Neste contexto, a cena mais espetacular, na realidade, foi a de um soldado que, movimentando o “mouse” em seu laptop, atacou sucessivamente cinco alvos e orientou o fogo de sua própria artilharia e da aviação sobre um grupo de tanques posicionado do outro lado de uma linha de elevações. A tela do seu computador mostrou (os resultados): os tanques inimigos tinham sido destruídos. 0 [N.T.] Adotada a expressão original por falta de uma versão doutrinaria oficial em português. Ainda que no texto o tradutor tenha oferecido uma proposta de versão para algumas dessas expressões. 0 [N.T.] “Zeus Shield” é a denominação dada ao sistema AEGIS de controle de tiro, que equipou pela primeira vez os Cruzadores da Classe “Ticonderoga”. 0 [N.T.] Adotada a expressão original por falta de uma versão doutrinaria oficial em português. Ainda que no texto o tradutor tenha oferecido uma proposta de versão para algumas outras dessas expressões. Nestes exercícios, conduzidos no deserto de Mojave, as unidades digitalizadas, conhecidas como o “Exército do Século XXI” integravam as “tropas azuis”, equipadas com uma completa gama de equipamentos digitais. No entanto, os resultados finais apresentaram uma vitória, um empate e seis derrotas. Na realidade, o “Exército do Século XXI”, ou as “tropas azuis” perderam para as “tropas vermelhas” que dispunham de equipamentos tradicionais. Isto, todavia, não impediu o Secretário de Defesa William Cohen de afirmar, numa reunião com a imprensa após a conclusão do exercício que: “Eu considero que todos nós estamos presenciando, aqui, uma revolução militar...” A partir de 15 de março de 1997, o Exército dos Estados Unidos conduziu, durante 14 dias, exercícios operacionais de alto nível com Brigadas digitalizadas na área do Centro Nacional de Treinamento do Forte Irwin, na Califórnia. De acordo com as observações feitas pelo Chefe do Estado-Maior do Exército, o General Rymer, o propósito deste teste era o de determinar ou não se o soldado tecnológico do século XXI estaria capacitado a responder, instantaneamente, a três questões cruciais da guerra atual: Onde estou? Onde estão os meus companheiros? Onde está o inimigo? Em face das condições em que os testes foram conduzidos, as tropas que foram reestruturadas e empregaram novos armamentos com tecnologia digital tiveram uma velocidade operativa muito maior, um maior poder de destruição, e maior capacidade de sobrevivência que o exército atual. Ver os relatórios no periódico norte-americano “Defense News”, edição de 17-23 de Março de 1997, para os detalhes relativos a este exercício. É obvio que a revolução militar mencionada por Cohen é idêntica àquelas visões proféticas a que nos referimos na abertura desta seção. O ERRO DE USAR O PODER COMO ELEMENTO BALIZADOR — UM VÍCIO DA GUERRA FRIA O vencedor sempre deseja persistir num caminho de vitória. Da mesma forma como as forças terrestres francesas que dependeram das trincheiras em Verdun para vencer a Primeira Guerra Mundial, e que esperavam vencer a próxima guerra da mesma forma, através da Linha Maginot, os militares norte-americanos que obtiveram uma vitória na Guerra do Golfo, mantêm a esperança de continuar praticando os tipos de ações empreendidas na Tempestade do Deserto no decorrer do século XXI. Ainda que todos os generais norte-americanos desejem se cobrir de glórias, como ocorreu com o general Schwartzkopf, todos sabem, perfeitamente, que as guerras do século XXI não terão possibilidade de ser uma simples réplica da Guerra do Golfo. Foi por este motivo, que eles começaram a substituir os armamentos das forças armadas norte-americanas, antes mesmo que a fumaça da guerra se dissipasse, assim como, fizeram ajustes nas teorias originais de combate e na organização de suas forças. As forças armadas, em todo o mundo, tomaram conhecimento da futura estrutura do poder militar norte-americano, e da sua concepção de um estilo próprio de guerrear, através dos documentos “The The Concept of Joint Forces in the Year 2010” 2010 e “The The Army of the Future”. Future Levando em consideração a imponência do poder militar norte-americano, suas proposições não têm nada tem de extraordinário. Ninguém poderia imaginar, no entanto, que um ponto cego no campo de visão dos norteamericanos estava localizado exatamente no âmbito nestas proposições. Até o momento, as tendências quanto ao desenvolvimento de armamentos nas forças armadas norte-americanas, as mudanças nas diretrizes da defesa, a evolução das teorias de combate, a renovação das práticas e de regulamentos, assim como, o pensamento das autoridades militares de maior patente, todos esses fatores estão evoluindo rapidamente e segundo uma única trajetória. Eles sustentam a idéia de que os meios militares são os meios definitivos para a resolução dos conflitos futuros, e que as disputas entre países irão resumir-se, ao final, no confronto entre dois grandes exércitos num campo de batalha. Dada essa premissa, as forças armadas norte-americanas se propõe a estar preparadas, para vencer guerras em dois teatros diferentes, e neste sentido, eles têm empreendido um grande esforço de preparação. Foi novamente enfatizado no documento norte-americano “1997 National Army Strategy” que a missão e capacitação do Exército dos Estados Unidos visava a, simultaneamente, vencer dois conflitos regionais de larga escala. Esta diretiva, de fato, deu prosseguimento à política estratégica de crescimento do Exército predominante na era da Guerra Fria. James R. Blaker frisa em seu artigo titulado “Building a Military Revolution –Type United States Army – A Troop Reform Plan Different From the ‘Four Year Military Examination Report’”, que esta política — “foi um plano militar projetado há 20 anos atrás e implementado durante um período que terminou há 10 anos atrás. (“Strategy Review”, Ed Summer 1997). No entanto, dentro do próprio Pentágono existem correntes contrárias a esta concepção de dois teatros, como no caso do General Powell, alegando que os Estados Unidos estavam, novamente, orientando a maior parcela de suas energias para engajar-se “num num tipo de Guerra Fria que nunca mais irá ocorrer”, e ocorrer possivelmente estava utilizando suas próprias capacidades numa direção errada0. Esta contradição é conseqüência do fato de que a tendência internacional, no final do século XX, é claramente perceptível. Em termos práticos, a era das guerras consistindo num processo de movimentação de armas e soldados ainda não foi 0 Ver relatório de pesquisa do Instituto de Pesquisa Estratégica da Escola de Guerra do Exército dos Estados Unidos — “Strategy and Military Revolution: From Theory to Policy” — Seção 8. transposta para as páginas da História, mas em termos conceituais é notório que já começou a ficar para trás. GLOBALIZAÇÃO E ALTA-TECNOLOGIA SUBSTITUEM AS AMEAÇAS MILITARES POR NOVAS AMEAÇAS Como conseqüência do aumento do número de tratados internacionais, limitando a corrida armamentista e a proliferação dos armamentos, as Nações Unidas e as organizações regionais internacionais ampliaram os seus poderes de intervenção nas guerras localizadas e nos conflitos regionais e, em termos relativos, reduziram a ameaça militar à segurança nacional. E por outro lado, o surgimento em larga escala de uma nova e sofisticada tecnologia provocou a ampliação da possibilidade de que ações não-militares ameacem a segurança nacional; e a comunidade internacional que não sabe o que fazer, quando confrontada com ameaças nãomilitares dotadas de uma capacidade de destruição igual à de uma guerra, também não dispõe de uma capacidade para impor restrições adequadas que seriam necessárias e eficazes. Objetivamente, isto tem acelerado a ocorrência de guerras não-militares, e ao mesmo tempo, faz com que os antigos conceitos e sistemas de segurança nacional estejam a ponto de um colapso. AS FORÇAS ARMADAS NORTE-AMERICANAS SE AFASTAM DAS CONCEPÇÕES MULTIFACETADAS DE GUERRA Em paralelo aos ataques terroristas, cada vez mais intensos; as guerras dos hackers; as guerras financeiras; e as guerras de vírus nos computadores; que irão dominar o futuro, existem atualmente, as novas concepções de guerra, para as quais é difícil estabelecer uma designação, e que já são suficientes para que a percepção de segurança, de que — “resistir ao ataque de um inimigo além das fronteiras nacionais” — passe a ser, da noite para o dia, algo do passado. Não é o caso que os círculos militares norte-americanos não tenham percebido o que significa eliminar as ameaças inimigas militares e não-militares, (já nos referimos, anteriormente, a uma série de relatórios publicados durante vários anos pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos); na realidade, eles têm “empurrado” o enfrentamento das ameaças não-militares para os políticos e para a Agência Central de Informações (CIA) e, com isso, eximiram-se das “guerras em outras dimensões”, das operações não-militares e de todas as outras novas concepções de guerra. Os militares norte-americanos recolheram-se cada vez mais, concentrando-se numa árvore frondosa e atenta, tendo como frutos vários tipos de armas sofisticadas, aguardando, isoladamente, pela passagem de um coelho idiota e trapalhão que inadvertidamente nela esbarrasse. No entanto, depois de Saddan, que ficou nocauteado após esbarrar com o tronco dessa árvore, quem será o próximo coelho desavisado? OPERAÇÕES MILITARES DE NÃO-COMBATE EM KOSOVO SÃO VÁLIDAS — GUERRA NÃO-MILITAR NÃO É VÁLIDA. MAS UMA Levando em consideração a sua predisposição de “ficar a espreita na escuridão empunhando uma faca” os militares norte-americanos, que perderam o seu oponente devido ao colapso da União Soviética, estão procurando, fervorosamente, uma justificativa que os impeça de se transformarem em “desempregados”. Isto decorre do fato de que, desde os generais até os soldados; desde a lança de ataque ao escudo de defesa; desde as principais estratégias aos métodos simples de uma operação, todas as ações das forças armadas norte-americanas sempre estiveram direcionadas para a obtenção da vitória em uma grande guerra. Não deveria ser o caso, mas militares norte-americanos, e até mesmo o Congresso, ao perceberem que não existiam mais dois exércitos em oposição, tenham passado a sentir uma sensação de vazio por terem perdido os seus propósitos0. A conseqüência foi que, na inexistência de um inimigo, um outro deveria ser criado. Em decorrência, até mesmo numa inexpressiva área de atuação, como foi o caso de Kosovo, eles não poderiam perder a oportunidade de brandir suas espadas enferrujadas. Os militares norte-americanos, cada vez mais envolvidos no insolúvel problema de aplicação ou não da força, depois de distenderem seus próprios tentáculos, desde a ambiência da guerra até a ambiência das ações militares de não-combate, parecem não estar mais dispostos a estenderem sua atuação a grandes distâncias ou ao 0 [N.T.] Instrutores e estudiosos de estratégia no Naval War College costumam referir-se a este sentimento com a citação de que “os militares norte-americanos sentem falta, ao acordar, de terem aquele grande urso branco para abraçar”. universo da guerra não-militar. Isto se deve, possivelmente, a uma falta de sensibilidade quanto a novos fatos, e também, possivelmente, em função de um conservadorismo, ou até mesmo devido a limitações de raciocínio. Independentemente de qual seja a causa, e isto é um fato indiscutível, o militar norte-americano sempre teve o seu campo de visão limitado pelas nuvens da guerra. OS EUA ESTÃO MAL ORGANIZADOS E MAL PREPARADOS PARA AMEAÇAS NÃO- MILITARES Ainda que os Estados Unidos tenha enfrentado o impacto da confrontação com este tipo de guerra não-militar, e tenha sido o lado continuamente afetado, ainda assim o que é surpreendente é que uma nação tão poderosa não possua uma estratégia e uma estrutura de comando unificado para o enfrentamento desta ameaça. O que poderia nos deixar sem saber se devemos “rir ou chorar” é que de maneira inédita, eles dispõe de quarenta e nove departamentos e repartições responsáveis pelas atividades antiterroristas, e que na realidade, existe muito pouca coordenação e cooperação entre eles. Quanto a esse aspecto, outros países não estão em melhores condições em relação aos Estados Unidos. Os recursos financeiros e as diretrizes básicas de investimento de muitos países, quanto ao atendimento das necessidades da segurança ainda estão limitados aos setores militares, políticos e de informações, havendo poucos e ínfimos investimentos em outros setores de atividades. Utilizando novamente os Estados Unidos como um exemplo, sabe-se que eles investem sete bilhões de dólares nas atividades de antiterrorismo, o que significa apenas 1/25 avos dos 250 bilhões de dólares alocados às despesas militares. Independentemente do modo pelo qual cada país deixa de levar em consideração a crescente ameaça da guerra não-militar, este fato real está progressivamente afetando a existência da humanidade, expandindo-se e disseminando-se com o seu próprio modelo e velocidade. Não é necessário chamar a atenção para este fato porque as pessoas irão descobrir que, na medida em que a humanidade concentra maiores atenções em seu apelo à paz e à limitação das guerras, muitas das origens das guerras estão em aspectos e coisas que constituem a nossa vida pacífica, e que se tornarão, uma após outra, armas letais que destruirão a paz. Até mesmo aquelas regras de valor consagrado e os preceitos valiosos que sempre apoiamos começam também a transformar-se em um recurso para que alguns países possam atacar outros, ou para determinadas organizações e indivíduos, atacarem toda uma sociedade. É algo semelhante aos cenários que são apresentados a seguir: quando existe um computador, passa também a existir um vírus de computador; quando existe a moeda surge a especulação monetária; a liberdade de crença versus o extremismo religioso e o herético; os direitos humanos comuns e a soberania nacional; liberdade econômica e proteção comercial; autonomia nacional versus corporações transnacionais; liberdade de informação e barreiras às informações, assim como o compartilhamento do conhecimento e o monopólio da tecnologia. É possível que em qualquer uma dessas áreas surja, em determinado momento no futuro, uma guerra entre grupos distintos de seres humanos competindo corpo a corpo. O campo de batalha está próximo a você, e o inimigo está numa rede de dados. Apenas não existem o cheiro da pólvora e o odor do sangue. A GUERRA SEM A PÓLVORA É DIFÍCIL DE SER ACEITA PELOS MILITARES No entanto, é uma guerra como ela sempre foi caracterizada, porquanto ela se enquadra na definição de guerra moderna: obrigar o inimigo a satisfazer nossos próprios interesses. É bastante obvio, que nenhum dos militares, de qualquer país, possui um preparo mental suficiente para enfrentar esse novo tipo de guerra, que se localiza completamente fora da ambiência militar. Trata-se, porém, de uma difícil realidade que todos os militares têm de enfrentar. As novas ameaças exigem novas visões quanto à segurança nacional, e as novas visões necessitam, portanto, que os militares, em primeiro lugar, ampliem o seu campo de percepção, antes de multiplicar suas vitórias. Isto é uma questão de eliminar a longa e estreita nuvem encobrindo o alcance da guerra na nossa visão. A DESTRUIÇÃO DAS REGRAS E A AMBIÊNCIA DE PERDA DE EFICÁCIA REGRAS DIFERENTES ENTRE PAÍSES GRANDES E PEQUENOS Como um recurso extremo para a solução de conflitos de sobrevivência e de interesses a guerra tem sido sempre um monstro domesticado pela raça humana. De um lado, a guerra é o limpador de ruas da cadeia ecológica da sociedade, e por outro lado, é a ameaça constituída de forma direta à sobrevivência da raça humana. Como poderemos controlá-la sem que sejamos consumidos por ela? Ao longo dos últimos milhares de anos, e especialmente no século XX, durante os intervalos entre as chamas da guerra, sempre existiu um objetivo a ser alcançado: desenvolver esforços para aprisionar o monstro em sua jaula. É por essa razão que foram formulados inúmeros tratados e convenções. Desde a famosa Convenção de Genebra, passando pelas Nações Unidas e até ao momento presente, tem ocorrido uma contínua elaboração de diversos mecanismos relativos à guerra, buscando criar barreiras, uma após outra, para impedir o desenvolvimento de guerras irracionais e sanguinárias, e ao mesmo tempo, tem-se procurado utilizar as leis e regulamentos internacionais, visando manter os prejuízos da guerra à humanidade em seu nível mais baixo, especificamente. desde a proibição do uso de arma bioquímicas, da matança indiscriminada de civis, do mau trato de prisioneiros de guerra, da limitação o uso de minas terrestres e etc, até a ampla oposição do uso da força para a resolução de problemas relativos às relações internacionais. Todos estes regulamentos têm sido progressivamente aceitos por cada país. Dentre os mecanismos mais elogiáveis poderíamos citar uma série de tratados concernentes à não-proliferação nuclear, à proibição de testes nucleares, à redução bilateral e multilateral de armamentos nucleares, etc., os quais, até a presente data, que evitaram quer a humanidade ingressasse num inverno nuclear. Ao término da Guerra Fria o mundo inteiro ficou eufórico, e considerava que como resultado deste evento estávamos dando início a uma “paz extraordinária”. Depois que Schwartzkopf usou o punho de uma “tempestade” para derrubar Saddam, no ringue do Golfo, o Presidente Bush, exultante com o sucesso declarou: “A nova ordem mundial já passou pelo seu primeiro teste”. Nesta passagem, ele se pareceu com Chamberlain ao retornar de Munique anunciando que a humanidade ia “reunir-se em torno de um mundo dotado de uma esperança de paz”. E qual foi o resultado? De forma semelhante a Chamberlain, Bush também “cantou vitória” cedo demais.0 0 De fato, este foi um problema iraquiano o qual Bush também foi incapaz de resolver de forma completa. Saddam, gradativamente, tornou-se uma ferida difícil de ser curada para os norte-americanos. A despeito de considerarmos se foi o fim da Guerra Fria ou a Guerra do Golfo, nenhum destes fatos foi capaz de materializar as promessas feitas para o mundo pelos políticos, ou de concretizar a nova ordem internacional que havia sido antecipada por toda a humanidade. O colapso do mundo polarizado libertou, um a um, de suas jaulas, os monstros das guerras localizadas, afogando em um mar de sangue países e regiões como Ruanda, Somália, Chechenia, Congo e Kosovo. Descobre-se agora, novamente, como os esforços para a paz, desenvolvidos durante milhares de anos, podem ser destruídos com um simples golpe! O desenvolvimento deste tipo de situação está relacionado à atitude comum adotada por todos os países no tocante às regras internacionais. O reconhecimento destas regras, por parte de cada país, depende de elas serem ou não benéficas, para os seus próprios interesses. Os países pequenos procuram utilizar as regras internacionais para protegerem os seus interesses, ao passo que os países grandes utilizam essas regras para exercer um controle sobre outros países. Quando as regras não coincidem com os interesses de um determinado país, e se ele for um país pequeno, o não cumprimento das regras pode ser imposto pelos grandes países, sob o título de mantenedores da lei. No entanto, as grandes nações quebram as regras, como, por exemplo, os Estados Unidos, que impondo leis supranacionais ao Panamá, onde um Chefe de Estado foi aprisionado e levando a julgamento em outro país. Um outro exemplo é o desrespeito por parte da Índia, quanto ao tratado de proibição de testes nucleares, ou quando ela se apoderou da nação Sikkim no Himalaia, fato semelhante ao do Iraque ao ocupar o Kuait. Em ambos os casos a comunidade internacional, como sempre, apenas ficou desolada, sem sequer saber o que fazer.0 No entanto, para qualquer fato, existe sempre a contraposição imbatível, um inimigo natural e que é adequadamente descrito em um adágio popular chinês: “A salmoura coagula o sangue de uma ferida e um fato sempre se sobrepõe a outro”. outro” Na comunidade internacional, as nações mais poderosas, quando confrontando os fracos e impotentes, quer na formulação e utilização das regras, quer no seu descumprimento e até mesmo anulação, quando não lhes são vantajosas, possibilitam o surgimento de sua contraposição, através de forças não-estatais, que 0 A ação militar “Raposa do Deserto”, recentemente implementada pelos Estados Unidos e Inglaterra, constitui, também, uma óbvia séria ofensa de uma grande nação, em violação à Carta das Nações Unidas. não reconhecem quaisquer regras, e se especializam em considerar a ordem nacional reinante como o seu objetivo de destruição. OS ATORES NÃO-ESTATAIS NÃO SÃO CONSTRANGIDOS POR FRONTEIRAS Constituindo-se no inimigo natural da comunidade internacional, e especialmente das grandes nações, ao mesmo tempo em que elas ameaçam a sobrevivência humana, produzem também efeitos circunstanciais no equilíbrio da sociedade e da ecologia. Em outras palavras, essas forças não-estatais, servem como um tipo de agente destrutivo social que destrói, tanto a ordem internacional costumeira, como também limita a capacidade de destruição daquelas nações poderosas face à comunidade internacional. Por exemplo, ocorreram diversos alertas de incursões de inúmeros hackers0 ao site do Ministério da Defesa da Índia, depois que os hindus realizaram testes nucleares, e ocorreu, também, o ato terrorista praticado pelo rico muçulmano Osama bin Laden, devido à sua insatisfação com a presença dos Estados Unidos no Oriente Médio. Embora nos seja difícil delinear os efeitos positivos e negativos dessas ações, ainda assim, é possível concluir que todas elas possuem características destrutivas e irresponsáveis, que ignoram as regras. O resultado direto da eliminação das regras é que as áreas limitadas por fronteiras visíveis ou, invisíveis, e que eram reconhecidas pela comunidade internacional, perderam a sua efetividade. Isto se deve ao fato de que os principais agentes que não dispõem do Poder Nacional e que empregam ações de guerra não-militar para atacar a comunidade internacional, todos utilizam meios que vão além daqueles circunscritos a nações, regiões, regras ou normas. Fronteiras nacionais visíveis, o espaço invisível da Internet, a legislação internacional, a legislação nacional, as normas de conduta e os princípios éticos não tem qualquer efeito restritivo em suas ações. 0 O significado original da expressão “hacker” tinha um significado neutro, sem qualquer sentido denegridor. Os primeiros hackers usavam a sua obsessão tecnológica com boas intenções, visando o desenvolvimento de uma nova ambiência do conhecimento na área de lógica, e com este propósito, muitos aderiram a este grupo, formando diversas gerações de hackers. Contudo, no universo das redes de hoje, onde a degeneração moral aumente diariamente, não há mais condutas cavalheirescas. Eles não são responsáveis perante quem quer que seja, não são limitados por quaisquer regras, e não existe nenhum impedimento quando se trata da seleção de alvos, como também não existe qualquer limitação quanto à escolha de meios a serem utilizados. Devido à natureza sub-reptícia de suas manobras, eles dispõem de um grau de ocultamento significativo, criam prejuízos consideráveis devido ao seu proceder extremado e normalmente parecem cruéis em decorrência de seus ataques indiscriminados contra a população civil. Tudo isso é propagado em tempo real, através a cobertura contínua da mídia moderna, o que contribui significativamente para o fortalecimento dos efeitos do terrorismo. Ao travar uma guerra com esse tipo de inimigo, não haverá uma declaração prévia ou formal de guerra; nenhum campo de batalha claramente definido; nenhum combate corpo a corpo ou a decorrente matança, e na maioria das vezes, nem haverá a fumaça dos canhões, disparos de armas de fogo e derramamento de sangue. No entanto, a destruição e os danos sofridos pela comunidade internacional não serão, de forma alguma inferiores àqueles de uma guerra militar. AS BOMBAS DOS TERRORISTAS SÃO MUITO MAIS PERIGOSAS QUE AS BOMBAS MILITARES Seguindo-se ao desaparecimento gradual dos antigos terroristas, que se especializaram no seqüestro, no assassinato, e nos assaltos, surgiram, de um dia para o outro, novas forças do terrorismo, que muito rapidamente preencheram o vácuo deixado por seus antecessores. Durante um curto período de quase dez anos, eles se transformaram de pessoas com origens desconhecidas em pessoas incômodas para o público mundial, e dentre eles os hackers são os principais. A popularização dos computadores pessoais, e em particular o advento da internet, redundou em que os atos maliciosos praticados pelos hackers passaram a representar um perigo crescente à ordem social existente. Os hackers aos quais nos referimos são aqueles destruidores de redes interativas de dados, que roubam informações, que apagam ou alteram arquivos de dados, que disseminam vírus de computador, transferem capitais e destroem programas existentes em redes. No sentido de diferenciá-los daqueles hackers não-maliciosos deveríamos talvez denominá-los como “bandidos de rede” ou “tiranos de rede”, o que seria muito mais correto. Suas potencialidades quanto a prejudicar o mundo atual são chocantes. No início de 1988, quando os hackers estavam iniciando suas atividades, e o público em geral nada sabia quanto ao perigo que eles representavam, um pequeno vírus criado por Robert Morris paralisou, totalmente, 6000 computadores de sistemas militares e civis em rede através dos Estados Unidos, incluindo o Escritório de Planejamento de Longo Prazo do Departamento de Defesa norteamericano, os Centros de Pesquisa das Organizações Rand e a Universidade de Harvard. Mais tarde, este tipo de ocorrência começou a aparecer, sucessivamente, nas redes interativas de outras nações e regiões. A partir de 1990, quando o governo norte-americano começou a combater rigorosamente os crimes de ataques a redes interativas, as atividades dos hackers além de não evidenciarem qualquer diminuição, muito pelo contrário, espalharam-se em nível global com a força de um incêndio florestal. Vale a pena registrar que após a regulamentação da “guerra cibernética” pelos militares norte-americanos, posicionando as forças armadas de nações inimigas ou oponentes globais, no mesmo patamar dos usuários não autorizados, do pessoal da administração interna, dos terroristas, das organizações não-nacionais, das organizações estrangeiras de Inteligência, representando as seis fontes de ameaças às redes interativas, os hackers de origem nacional ou militar começaram a revelar pistas. Em 1996, o Escritório do Sistema de Informações do Departamento de Defesa dos Estados Unidos foi implantado de modo a reforçar a proteção dos sistemas militares de informação. No mesmo ano, a criação do Comitê Presidencial para Proteção de Infra-estruturas Vitais dos Estados Unidos também foi anunciada. Este Comitê é responsável pela proteção dos sistemas de telecomunicações, dos sistemas financeiros, dos sistemas de distribuição de energia elétrica, dos sistemas de abastecimento de água e dos sistemas de transporte. Todo este empreendimento estava direcionado contra ameaças reais, e o manual militar norte-americano “FM100-6 — Field Command Information Operations” estabelece de forma clara que “as ameaças às infra-estruturas de informações são reais, suas fontes têm amplitude global, manifestam-se em diversas áreas da tecnologia, e acima de tudo, essas ameaças estão aumentando. Essas ameaças têm origem em indivíduos e grupos, e sua motivação são os benefícios de ordem militar, política, social, cultural, religiosa comercial ou individual. Essas ameaças também têm origem em maníacos na área de informação.” Isto, não só reforçou sobremaneira a ação coletiva dos hackers, pela concentração de suas ações isoladas e dispersas, projetando-as rapidamente a um âmbito nacional (tiranos de rede), como também, resultou numa crescente ampliação das ameaças às redes interativas de dados de todas as nações (inclusive para aquelas nações que empregam oficialmente hackers nacionais e militares), tornando-se cada vez mais difícil de serem previstas ou evitadas. A única previsão que poderia ser feita era a de que o prejuízo causado por esse tipo de ameaça, em uma nação dispondo de uma grande rede de dados, como é o caso dos Estados Unidos, certamente seria maior do que em qualquer outra nação. Diante desta perspectiva, até mesmo J. Saiteerdou, responsável no âmbito do “Federal Bureau of Investigation” (FBI) pela investigação de crimes na área de informática, afirmou manifestando ao mesmo tempo preocupação e autoconfiança: “Coloquem ao meu dispor dez hackers, cuidadosamente escolhidos, e em noventa dias eu serei capaz da fazer esta nação baixar suas armas e render-se”. Quando comparados a estes “bandidos de redes interativas” ou “terroristas de redes interativas”, o terror provocado pelas bombas de bin Laden assemelha-se ao que poderia ser considerado como um legado do terrorismo tradicional. Isto, no entanto, não nos impede de incluí-lo nas fileiras do novo terrorismo, porque mesmo não considerando suas origens religiosas ou sua formação intelectual heterodoxa e a tendência a opor-se ao controle exercido por grandes nações, podemos perceber na própria personalidade de bin Laden um reflexo daqueles antigos guerreiros, que propagavam bazófias ruidosas, ainda que vazias de conteúdo, que adoravam a publicidade, e utilizavam armamentos leves e um único método de ação. Em outras áreas de atuação do terrorismo, todavia, é impossível estabelecer comparações. Antes dos sérios ataques com bombas às embaixadas norte-americanas em Nairobi e Dares Salaam, os quais chocaram a opinião publica mundial, o nome de bin Laden ainda não constava da lista das trinta organizações terroristas publicada pela Organização Internacional Antiterrorista, e mesmo que já tivessem lhe atribuído, diversos casos de assassinato, ele era apenas um “herói anônimo” no mundo islâmico, uma vez que não havia se vangloriado de suas ações. Até mesmo depois que os norte-americanos lançaram mísseis de cruzeiro contra ele e emitiram sua ordem de prisão, bin Laden, repetidamente, negou que estivesse, pessoalmente, envolvido com aqueles ataques. A ocultação e o disfarce, produzindo resultados mais significativos, e de maneira imprevista proporcionando uma reputação não merecida representam, talvez, as primeiras dentre as principais características das organizações terroristas do tipo bin Laden. Alem disso, tendo aprendido a utilizar recursos financeiros e aproveitando-se das brechas da liberdade econômica, iniciada pelo Ocidente, tais organizações criaram empresas de administração assim como Bancos, e engajaram-se no contrabando e tráfico de drogas em larga escala; na revenda de armamentos; na emissão de grandes quantidades de moeda falsa, como também, passaram a contar, com as contribuições de seguidores religiosos para a obtenção de recursos financeiros estáveis0. Deste modo, os tentáculos dessas novas organizações terroristas atingem áreas cada vez mais amplas, e os seus meios também são diversificados como, por exemplo, utilizando organizações religiosas e hereges para desenvolver o seu próprio material de propaganda, organizando milícias antigovernamentais e assim por diante. A fácil captação de recursos financeiros possibilita que eles adquiram e controlem quantidades significativas de meios de alta-tecnologia e, por via de conseqüência, passem a dispor da capacidade de infligir com mais facilidade ainda maiores perdas de vidas humanas. Embora a grande maioria dos ataques desfechados por essas organizações tenha sido, até agora, contra as nações ricas e as nações ocidentais, especialmente as grandes nações que possuem a capacidade de controlar outras nações, elas representam uma ameaça comum para a ordem existente; representam a destruição das regras comumente reconhecidas, como também representam uma ameaça à comunidade internacional. Pode-se observar, a partir de condições preestabelecidas, que estas novas organizações terroristas, ainda em desenvolvimento, constituem, meramente, algumas marés negras resultantes das novas atividades terroristas globais. Pode ser até constatado a existência de densas correntes, das quais nada sabemos, surgindo abaixo da superfície da águas. Com uma participação recente nesta contracorrente estão os especuladores financeiros internacionais. Ainda que até o momento estes garbosos e bem vestidos indivíduos não estejam sendo incluídos na categoria de terroristas, suas ações e as conseqüências calamitosas provocadas na Inglaterra, no México e no Sudeste Asiático foram de tal ordem, que nem os “bandidos” ou bin Laden poderiam oferecer sugestões quanto ao seu modo de agir. Analisando-se os grandes “crocodilos” financeiros, como Soros, por exemplo, e o potencial do volume de negociações diárias, que excede a cifra de US$ 120 bilhões em capital de giro, ele se valeu de artifícios e métodos financeiros alternativos e das 0 O que é mais satírico é que a firma de construção pertencente à família de bin Laden foi a responsável pela construção dos alojamentos do Exército norteamericano na Arábia Saudita. normas da economia livre, para repetidamente modificar os seus posicionamentos, executando jogadas que visavam criar problemas os quais, um após outro, viriam a provocar uma série de débâcles financeiras. Como conseqüência a área das nações atingidas ampliou-se gradativamente, desde o Sudeste Asiático até a Rússia; em seguida até o Japão e, finalmente, à Europa e Estados Unidos, os quais, embora às margens do processo também foram incapazes de fugir do problema criado por um golpe de sorte, e assim sendo, todo o sistema financeiro e a ordem econômica mundial em vigor foram basicamente abalados, um evento que significa um novo desastre, ameaçando a sociedade humana e a segurança internacional.0 As características típicas desse terrorismo, compreendendo sua condição transnacional, sua ocultação, a inexistência de regras, e sua capacidade tremendamente destrutiva, permite-nos classificá-lo como “terrorismo terrorismo financeiro”. financeiro Diante da dimensão extraordinária do aparato estatal, talvez os terroristas e suas organizações não devessem ser levados em conta, quando se considera o número de pessoas envolvidas e seus métodos. Mas, na realidade, não existe nenhum país que não se preocupe com eles. Isto decorre do fato deles constituírem um grupo de maníacos que não age de acordo com as regras. Uma organização terrorista que possua armas nucleares é certamente muito mais perigosa do que uma nação que possua as mesmas armas nucleares. O credo de bin Laden estipula que: “Se eu posso morrer então eu também não deixarei que os outros vivam”. Assim sendo, nada constitui empecilho para ele, e por via de conseqüência, para matar dez norte-americanos, ele também afogará vários milhares de inocentes em um mar de sangue. A lógica de Soros explicita que: “Eu entrei no quarto para roubar o dinheiro porque a porta estava aberta”, deste modo, ele não terá que se sentir responsável pela destruição da economia de outras nações e pelo desordenamento de suas estruturas políticas. Para bin Laden, que se esconde à sombra das colinas do fundamentalismo islâmico, para Soros, que se oculta no interior da floresta da economia livre, e para os hackers que se escondem por trás das cortinas das redes interativas de dados, para todos eles não existem fronteiras nacionais, e quaisquer fronteiras não têm o menor valor. O que eles pretendem conseguir é a destruição inconsciente de uma 0 O aspecto mais perturbador do terrorismo financeiro é o “dinheiro quente” que possibilita o lançamento de ataques destrutivos às economias das nações numa questão de dias, e os alvos variam desde os bancos centrais até as pessoas pobres. ambiência organizada, e agir de forma selvagem e desvairada em ambiências que não possuam regras estabelecidas. ALGUMAS VEZES É NECESSÁRIO QUEBRAR AS REGRAS PARA COMBATER O TERRORISMO Estas novas forças terroristas criaram, para a ordem mundial atual, um sério desafio que é sem precedentes ao mesmo tempo fizeram com que, até certo ponto, tenhamos dúvidas quanto ao significado lógico de uma ordem estabelecida. Talvez, aqueles que impedem a destruição das regras, e aqueles que promovem a revisão das regras vigentes sejam ambos necessários. Isto se deve ao fato de que qualquer destruição das regras sempre cria novos problemas que necessitam serem resolvidos com todo o rigor. Numa era em que uma ordem antiga está prestes a ser anulada, aqueles na liderança freqüentemente são os primeiros a destruir as regras, ou então, os primeiros a se adaptarem a esta nova situação. Logicamente, quanto a este ponto, os novos terroristas já evoluíram para a vanguarda da comunidade internacional. O método ideal de operação para enfrentar um inimigo que não obedece a regras será, com toda a certeza, dispor da capacidade de abrir caminho através de regras. Recentemente, desaparecem ao na ocorrer o ambiência enfrentamento da guerra de inimigos não-militar, os que aparecem e norte-americanos empregaram mísseis de cruzeiro; o governo de Hong Kong usou suas reservas em moeda estrangeira e adotou providências administrativas; e o governo britânico violou convenções de modo a permitir que suas organizações do Serviço Secreto, “legalmente” exterminassem os líderes de nações estrangeiras, que eles consideravam ser terroristas. Isto revela uma atualização das regras e uma mudança nos métodos de operação. No entanto, demonstra, também, a fraqueza decorrente de um raciocínio embotado e a carência de sutileza quanto ao método de ação. Foi mencionado que os norte-americanos já teriam decidido adotar os procedimentos de hackers para rastrear e bloquear as contas bancárias de bin Laden em diversas nações, de modo a basicamente cortar suas fontes de recursos. Sem dúvida, isto representa uma ruptura em termos de método de operação, e que vai além da ambiência militar. Quanto a isso, no entanto, deveremos também considerar que nesta área, os novos e velhos terroristas — os quais consistentemente apoiaram o princípio do recurso a qualquer meio concebível — continuam sendo os melhores professores para qualquer governo nacional. COQUETEL NA TAÇA DOS GRANDES MESTRES GÊNIOS MILITARES DO PASSADO COMBINAVAM OS ELEMENTOS PARA VENCER O Rei Wu da dinastia Zhou, há três mil anos atrás, e Alexandre o Grande há mais de dois mil anos, certamente não saberiam o que é um coquetel e, no entanto, foram mestres no preparo de coquetéis no campo de batalha. Isto ocorreu porque, semelhantemente ao preparo de um coquetel, eles adotaram uma engenhosa combinação de dois ou mais fatores inerentes ao campo de batalha, projetando-os no combate e obtendo a vitória. “1 + 1” é o método de combinação mais elementar como também o mais antigo. Longas lanças e escudos redondos podem equipar um soldado, tanto para o ataque, quanto para a defesa, estabelecendo uma base, para o avanço ou para o recuo; dois homens compõem uma unidade na qual “os soldados com armas de longo alcance são usados para a defesa, enquanto que aqueles com armas de curto alcance são utilizados para a manutenção de posição”, um par de soldados que se coordenam entre si, constituem assim a menor unidade tática.0 O cavaleiro Don Quixote e seu escudeiro Sancho Pança demonstraram que a separação de tarefas entre o Nobre e o seu Escudeiro já haviam sido instituídas e assim a equipe poderia dar início a uma longa jornada para enfrentar os infortúnios que afetavam a princesa imaginaria. Uma combinação como estas, tão simples, incorpora a profunda teoria das infinitas mudanças que ocorrem num campo de batalha. Desde as armas brancas às armas de fogo e, em seguida, às armas nucleares, e até à combinação das chamadas armas de alta-tecnologia atuais, todas representaram o instrumento musical nas mãos mágicas dos 0 Ver “The History of Warfare in China”; Military Translations Press; Vol. 1, p.78, Seção Wilderness Wars. vitoriosos, e essa combinação sempre esteve presente em toda a História da humanidade, influenciando secretamente o resultado de cada guerra. Quando o Rei Wu (primeiro rei da Dinastia Zhuo) atacou Shang Zhuo (último rei da Dinastia Shang), com um exército composto por 300 carruagens, 3.000 bravos guerreiros e 45.000 soldados com armaduras, dispunha efetivo muito menor que as centenas de milhares de soldados a pé que integravam o exército do Rei Zhou0 da Dinastia Shang, no entanto, naquele pequeno exército, a combinação de carruagens e soldados, tornou-se um fundamento da organização dos exércitos durante a Dinastia Zhou, visto que esta combinação aumentou, enormemente, o poder de combate em áreas descampadas, evidenciando, pela primeira vez, a importância da combinação de meios numa guerra, fator este que ainda pode ser evidenciado, decorridos 3.120 anos. Dado que este foi o exemplo no Oriente, o Ocidente não seria exceção. A razão pela qual Alexandre foi capaz de derrotar um grande exército no decorrer de uma única e decisiva batalha em Arbela (em 331 AC) foi porque ele fez adaptações imediatamente antes de entrar em combate, mudando a tradicional formação de uma matriz quadrangular que avançava com uma frente linear, homogênea, surpreendendo o seu inimigo. O seu método foi muito simples. Dispôs a sua cavalaria, fortemente armada e treinada, em dois grupos, flanqueando um corpo central formado pela falange0. Ao contrário do que sempre fazia, e contrariando as expectativas de seu oponente Dario III, Alexandre foi desbalanciou a sua frente de combate, reforçando mais sua ala esquerda, onde ele se posicionou. Quando Dario resolveu atacar a posição em que Alexandre estava provocou abriu uma brecha sua linha, que era exatamente o que Alexandre esperava para investir com a ala esquerda (que estava reforçada), provocando uma completa ruptura nas linhas persas. Deste modo, a flexibilidade da cavalaria e a estabilidade de um corpo central composto pela falange, constituíam uma combinação ideal, um dispositivo de combate exemplar, onde cada componente podia desenvolver o seu potencial de maneira mais incisiva. O resultado em Arbela foi que, naturalmente, Alexandre, 0 [N.T.]Os vocábulos Zhou, designando a Dinastia do rei Wu, e como o nome do rei da Dinastia Shang, são homógrafos, sendo que diferença de significado é percebida em sua grafia original, por terem ideogramas diferentes. Ver: http://www3.la.psu.edu/textbooks/PM-China/ch2_main.htm. 0 [N.T.] O corpo central era constituído pela famosa Falange Macedônica, idealizada por Felipe II, pai de Alexandre o Grande. cuja força militar estava comparativamente em desvantagem, pode ao final beber, fervorosamente, da taça da vitória0. Examinando com atenção a história militar, tanto do Ocidente, quanto do Oriente, jamais encontramos menção ao termo “combinação” em quaisquer das descrições relacionadas aos métodos de operação. No entanto, através dos tempos, aparentemente, todos os grandes mestres da arte da guerra conheciam este princípio. O Rei Gustavo Adolfo da Suécia foi o reformador militar mais aclamado no início do período das armas de fogo. Todas as transformações que ele introduziu, tanto no tocante à formação para a batalha, quanto no posicionamento dos armamentos, basearam-se no método da combinação. Muito cedo ele idealizou que o retraimento dos lanceiros e seu posicionamento em conjunto com os soldados com armas de fogo, permitia a formação de um dispositivo de batalha onde os lanceiros proviam cobertura aos atiradores nos intervalos entre salvas de tiro; tal condição ampliava o poderio de cada componente até o seu limite máximo. Ele também, freqüentemente, combinava elementos da cavalaria ligeira, da cavalaria pesada e dos soldados com armas de fogo, os quais em seqüência atacavam a vanguarda do inimigo, sob a proteção de uma densa camada de fumaça, criada pelo fogo de artilharia. Este Rei, mais tarde considerado a “primeira grande autoridade em artilharia de campanha”, compreendia como ninguém, os efeitos e o emprego da artilharia, como elemento básico para o engajamento em batalhas. Ele concebeu as unidades artilharia ligeira, formadas da combinação de elementos da artilharia de regimento com elementos de infantaria, permitindo assim a formação de unidades independentes de artilharia pesada, e o aparente emprego dissociado de unidades de artilharia leve e de artilharia pesada, na realidade, formavam combinações perfeitamente integradas em toda a extensão do campo de batalha0. Seria justo afirmar que os efeitos do emprego da artilharia foram desenvolvidos ao seu nível máximo durante este período.0 0 Ver “Military History of the Western World” escrito por J.F.C. Fuller, traduzido por Niu Xianshong. 0 [N.T.] Em outras palavras o rei Gustavo Adolfo dividiu o que era uma unidade, criando assim a possibilidade de combinar. 0 Ver “The Evolution of Weapons and Warfare”, T. N. Dupuit p.169-176. Todavia, tudo isto ocorreu antes da aparição de Napoleão, um perito nas técnicas de emprego da artilharia. Quando comparado ao pequeno corso, que chegou a colocar mais de 20.000 canhões num campo de batalha, Gustavo Adolfo que dispunha apenas de 200 canhões pode, quando muito, ser visto como um “aprendiz de feiticeiro na presença de um mestre da feitiçaria”. De 1793 a 1814 transcorreu um período de 20 anos, no qual ninguém entendeu os canhões, de modo tão completo como Napoleão. Ninguém foi capaz de entender com maior precisão tal fato, mesmo aqueles que estavam sob seu comando. Logicamente, não havia quem pudesse combinar, de forma tão completa a força letal da artilharia, a mobilidade da cavalaria, assim como, a lealdade e a bravura do Comandante Davout e a impetuosidade do Comandante Murat, para forjar uma força ofensiva, que iria provocar a debandada de todos os seus inimigos, pela sua mera presença, transformando o exército francês numa máquina de guerra sem competidores na Europa. Esta máquina, desde Austerlitz até Borodino, criou o mito de que Napoleão venceu quase todas as batalhas0. O General Schwartzkopf, autor do milagre de ter perdido apenas cerca de uma centena de soldados em uma grande batalha, não pode ser incluído no nível dos grandes mestres. Sua sorte, no entanto, parece ter sido tão boa quanto a dos mestres das técnicas militares. Na realidade, o que é verdadeiramente importante é que não se trata de sorte, e sim, que este Chefe comandou um grande e moderno exército, onde, como seus antecessores, e com maior ênfase, atribuiu importância à combinação de elementos significativos para a condução da guerra. Isto se deve ao fato de que, nos anos noventa, as cartas que Schwartzkopf tinha nas mãos eram em maior quantidade em relação àquelas de seus antecessores. Para ele, a solução do problema de expulsar o exército iraquiano do Kuait, restabelecendo o fluxo de petróleo para o Ocidente e recuperando a influência norte-americana no Oriente Médio, estava associado, também, a inúmeras combinações bem sucedidas. Dependia do emprego engenhoso da Aliança, da manipulação da mídia, do uso de bloqueios econômicos e outros métodos relacionados, como também do desenvolvimento e reunião dos diversos elementos dos exércitos, forças navais, forças aéreas, além de meios espaciais e eletrônicos e etc, compreendendo os militares de mais de 30 nações combinadas, de modo a tornarem-se um punho de aço para golpear Saddan. Schwartzkopf conseguiu 0 Ver “Biography of Napoleon”, Taerli; e “Biography of Napoleon I”, Jonh Roland Ross. realizar este feito, e ainda assim, o seu oponente, de forma espantosa, não tinha conhecimento de tudo isso. Um grande exército iraquiano, com centenas de milhares de homens, milhares de tanques e centenas de aeronaves parecia uma massa não misturada de cimento, areia e aço reforçado, dispersos ao longo de uma linha de batalha, com uma profundidade de centenas de quilômetros, sendo basicamente incapazes de enfrentar os severos golpes dos norte-americanos que, ao contrário, combinavam integralmente seus componentes estruturais, para tornarem-se tão resistentes quanto o concreto armado. Alem disso houve, inicialmente, por parte do Iraque, a detenção seguida da libertação dos reféns ocidentais, e na seqüência, um erro após outro, como também respostas inadequadas no tocante aos problemas de isolamento político e bloqueios econômicos. Portanto, independentemente de uma guerra ter ocorrido a 3.000 anos atrás ou, no final do século XX, parece que todas as vitórias refletem um fenômeno comum: o vencedor foi aquele que soube criar uma combinação adequada. A ALTA-TECNOLOGIA PROPORCIONA MUITOS ELEMENTOS NOVOS PARA SEREM MISTURADOS NO COCKTAIL DA GUERRA Na medida em que for possível aumentar a gama de meios utilizados na guerra nos dias atuais, assim como, introduzir contínuos melhoramentos, o significado específico de guerra estará sendo rapidamente ampliado, o seu teor subjetivo, em paralelo à acepção em que é empregada, também se aprofundará. Muitos fatores, que nunca foram cogitados nas guerras do passado, passaram a estar presentes na ambiência da guerra atual através da combinação de vários e diferentes métodos. A adição de cada elemento novo, possivelmente, provoca mudanças na modalidade e tipo de guerra, até chegar a ponto da deflagração daquilo que consideramos ser a Revolução Militar. Revendo a história da guerra, não importando se considerarmos estribos, rifles, armas de carregamento pela culatra, pólvora sem fumaça, telefones de campanha, telégrafo sem fio, submarinos, tanques, aviões, mísseis, bombas atômicas, computadores, armas não-letais, organização de tropa por Divisões, sistema de Estado-Maior, táticas de “Matilha de Lobos”0, campanhas militares de alta intensidade, bombardeio de saturação, contramedidas eletrônicas e as batalhas ArTerra, o surgimento de cada um desses elementos sempre esteve associado a elementos chaves anteriores, de modo a produzir vantagens híbridas e, ao mesmo tempo, enriquecer a ambiência da guerra em diferentes aspectos. Ocorre que nos últimos 20 anos, a tecnologia cibernética, os vírus de computador, a internet, os instrumentos de atuação no mercado financeiro, e outras fontes, assim como as tecnologias associadas aos meios não-militares, demonstram, ainda mais, as dificuldades no tocante à previsão de perspectivas quanto ao resultado das guerras do futuro. Contudo, para a grande maioria dos militares de alta patente da atualidade, o emprego do método de combinação dos elementos para a condução da guerra, freqüentemente, tem sido um processo inconsciente, ou seja, suas combinações, na maioria dos casos, resumem-se ao nível dos armamentos, dos métodos de posicionamento de forças e em relação ao campo de batalha. As perspectivas quanto às conseqüências da guerra são também, em sua maioria, limitadas ao campo militar, e isto parece ser considerado o suficiente0. Somente os gênios militares pioneiros têm a capacidade de tornarem-se uma exceção desfazendo-se de hábitos costumeiros, rompendo com as limitações e conscientemente combinando todos os meios disponíveis, num determinado momento, para criar uma obra prima eterna, através da modificação das tonalidades da guerra. 0 Consistia numa técnica utilizada por submarinos, para atacar navios mercantes, durante a Primeira Guerra Mundial, inventada por Dönitz, Comandante da Força de Submarinos da Marinha Alemã. O método consistia em que após a descoberta de um navio mercante por um submarino, este, imediatamente, notificava outros submarinos, e após aguardar a reunião de vários submarinos, estes desencadeavam um ataque em conjunto, da mesma forma que uma matilha de lobos age contra a sua presa. 0 [N.T.] Em recente curso feito no Naval War College (2001-2002), pode-se constatar a propriedade da opinião do autor, visto que uma das grandes preocupações que os estudiosos e catedráticos daquela instituição manifestavam era a busca da resposta á pergunta: “Por que é que nós (norte-americanos) continuamos a ganhar as guerras e perder a paz?”. Se for considerado que o método de combinação representou, apenas, uma fórmula secreta vitoriosa de uns poucos gênios, sua utilização como uma orientação para um método de operações está se tornando cada vez mais evidente nos dias atuais, e a prática da guerra está ocorrendo em uma ambiência cada vez mais ampla e com maior alcance. No entanto, tudo aquilo gerado pela era da integração tecnológica proporciona para a combinação um campo de possibilidades aparentemente ilimitado. Pode-se afirmar, que quem quer que seja, que for capaz de preparar um coquetel saboroso e excepcional para o futuro banquete da guerra, estará predestinado, em última análise, a coroar-se com os lauréis do sucesso. USANDO A ADIÇÃO PARA VENCER O JOGO O TODO É MAIOR QUE A SOMA DAS PARTES — ESCOLHENDO OS ELEMENTOS PARA COMBINAR Todas as cartas já foram mostradas. Sabemos que a guerra não será mais caracterizada pelo seu modelo original. Em grande parte, a guerra nem mesmo é mais a guerra, mas ao invés, passa a ser um enfrentamento na Internet, uma competição na mídia das grandes massas, a interferência e defesa nas transações financeiras futuras, juntamente com outros ingredientes que nunca tínhamos entendido como partícipes da guerra, o que nos obriga, agora, a parar e raciocinar. É como dizer que o inimigo não será mais o inimigo original significativo; os armamentos, possivelmente, não serão aqueles originais, e o campo de batalha, possivelmente, não será o campo de batalha original. Nada é definitivo. Aquilo que pode ser avaliado, também não é definitivo. Na realidade, mudaram as regras do jogo, e o que precisamos continuar a fazer é investigar um novo método de luta, em uma ambiência plena de incertezas. Não é o caso de uma simples prescrição para o tratamento dos sintomas de uma doença, e sim, um processo híbrido de aprendizagem dos pontos fortes de outros processos, concentrando todos aspectos vantajosos, permitindo, assim, que uma mesma árvore produza, ao mesmo tempo, frutas diferentes. Isto, então, seria combinação, e este processo, em particular, já apresentamos anteriormente. Aquilo que nós ainda não falamos é de um outro termo: adição, um método de combinação. Em um ringue de luta de boxe, aquele que, desde o início e até o fim do embate usa apenas um método de luta para enfrentar o seu oponente, logicamente, não é aquele lutador combina socos diretos, “jabs”, jogo de corpo, e ganchos para atacar o seu oponente como uma tempestade. O ensinamento daí decorrente pode ser considerado como extremamente simples: um mais um representa um valor maior do que um. O problema é que este preceito, tão simples que até um principiante pode compreender, surpreendentemente, não tem sido entendido por muitas pessoas responsáveis pelo sucesso ou fracasso da segurança e da guerra em âmbito nacional. Essas pessoas apresentam desculpas, alegam que estão aplicando a combinação de golpes para atacar os seus oponentes, que nunca se esqueceram da adição de tecnologia com tecnologia, de táticas com táticas, de armas com armas, de processos com processos; e podem até, com uma atitude insolente, considerar que as combinações por eles idealizadas podem ser consideradas como algo de novo. Isto tem ocorrido desde Alexandre, passando por Napoleão, e chegando a Shwartzkopf. Eles não perceberam que sua capacidade de compreender, ou não, as combinações, não representa a solução para o problema. O que realmente importa é o entendimento de quais são os elementos a combinar e como combiná-los. Finalmente, mas certamente não o ponto mais importante, é se houve ou não a idéia de se a combinar as ambiências do campo de batalho com outras que não sejam campos de batalha, a situação de guerra com uma situação de não-guerra, elementos militares com elementos não-militares, o que em termos mais específicos significaria combinar aeronaves “stealth” e mísseis de cruzeiro com destruidores de redes interativas, combinar deterrência nuclear, guerras financeiras e ataques terroristas ou, simplesmente, combinar Schwartzkopf + Soros + Xiaomolisi + bin Laden. Estas são, na realidade, as cartas que temos na mão. A CHAVE PARA UMA REVOLUÇÃO EM ASSUNTOS MILITARES É UM PENSAMENTO CLARO Seja uma combinação ou uma adição as duas formas representam nada além do que molduras vazias. Apenas quando o sangue e a crueldade são adicionados a esta situação, ela se torna critica e começa a ser assustadora. Confrontados por este inédito conceito de guerra, não há a menor dúvida de que aquela imagem da guerra, com a qual já tínhamos nos acostumado, será abalada. Alguns dos modelos tradicionais da guerra, assim como a lógica e as leis a ela relacionadas serão também contestadas. O resultado da disputa não é o desmoronamento da mansão tradicional, mas, em vez disso, uma parte do novo canteiro de obras é que ficará desorganizado. Sob o ponto de vista legal, muitos de nós iremos considerar como sendo um colapso. Até este ponto, nós já encontramos a razão pela qual, a partir do surgimento em cena da alta-tecnologia, essa revolução militar tornou-se, paulatinamente, incapaz de ser completada. Levando-se em conta uma perspectiva histórica da humanidade e da história da guerra, nunca houve uma revolução militar que tenha sido declarada como completada, imediatamente após a ocorrência de uma revolução tecnológica ou organizacional. Somente após a ocorrência significativa de uma revolução no pensamento militar, e o entendimento do que isso significa, é que todo o processo de uma revolução militar chega ao seu término. O momento atual não constitui exceção, de modo que, se a nova revolução militar, desencadeada pela alta-tecnologia, poderá chegar a uma conclusão, ou não, vai depender de sua capacidade em progredir ao longo da estrada da revolução no pensamento militar. Este é o único caso em que será necessário abandonar-se as raízes criadas pelo espírito da guerra, e que têm persistido por milhares de anos. Para alcançar este propósito, é necessária, apenas, a capacidade em buscar ajuda no processo de adição. No entanto, antes de utilizar a adição, torna-se imprescindível romper todos os grilhões impostos pela política, pela história, pela cultura, assim como pela ética, e utilizar um raciocínio claro e completo. Sem um total processo de raciocínio não poderá haver uma total revolução. Em épocas anteriores, até mesmo Sun Zi e Clausewitz encerraram-se dentro das barreiras da ambiência militar, e apenas Machiavel se aproximou da essência deste pensamento livre e completo. Por um longo período, devido ao fato de que o pensamento contido tanto no “Príncipe”, quanto o seu autor, estavam ambos muito adiante do seu tempo, eles foram desprezados por nobres e governantes. Naturalmente, eles não possuíam a capacidade para entender que ir além de todos os limites e fronteiras representava uma revolução ideológica, a qual incluía a premissa de uma revolução do pensamento militar. Da mesma forma, no momento atual, aqueles que apenas vislumbram uma formação imponente de tropas num campo de batalha, e que julgam que a guerra consiste apenas em matar pessoas, e que os métodos operacionais constituem, unicamente, métodos para, também, matar seres humanos, e que não há nada mais além disso que mereça atenção, eles também não possuem a capacidade de entender a proposição de um pensamento completo e abrangente. METZ E KIEVIT EVIDENCIARAM O HIATO EXISTENTE ENTRE O PENSAMENTO MILITAR E AS AMEAÇAS Na realidade, os norte-americanos não foram tão insensíveis a ponto de não terem ainda esboçado, mesmo que de maneira limitada, uma reação a este problema. Steven Metz e Thomas Kievit, do Instituto Estratégico da Escola de Estado-Maior do Exército dos Estados Unidos que apresentaram o problema da “largura da faixa de freqüência da nova revolução militar”, demonstraram sensibilidade quanto ao tema. Eles descobriram o hiato existente entre o pensamento militar norteamericano vigente e a ameaça real à segurança nacional. O retardo no pensamento militar, defasando-se da realidade, não constitui, somente, numa deficiência dos militares norte-americanos, como também, uma de suas características típicas. Quando “um militar enfoca, excessivamente, um determinado tipo de inimigo, isto provavelmente poderá resultar em que ele seja atacado e derrotado por um inimigo que esteja fora do seu campo de visão”. Steven Metz e Thomas Kievit expressaram corretamente suas preocupações quanto a esse ponto. Estes autores frisaram ainda que “...embora os documentos oficiais enfatizem o Exército, (podemos entender sendo a todas as forças armadas norte-americanas — nota introduzida pelos autores Metz e Kievit), é necessário que o Ocidente rompa com o seu atual pensamento estático, de modo a ampliar a concepção de como serão os conflitos do futuro. No entanto, a maioria das descrições de como as tropas digitalizadas do século XXI irão atuar na guerra, soam como uma ação de blindados, empregando a nova tecnologia para combater as nações do Pacto de Varsóvia.” Devido ao fato dos militares norte-americanos estarem se preparando para a guerra guiados por esse tipo de raciocínio, naturalmente, eles esperam que a guerra ocorra como eles imaginam, e essas são as suas expectativas. Tal raciocínio, ilusório e ridículo, só pode gerar um único tipo de perspectiva para o futuro: “A grande maioria dos atuais planos de desenvolvimento das forças armadas norte-americanas como, por exemplo, aqueles relacionados ao “Exército do Século XXI”, estão todos orientados para o enfrentamento de um inimigo que disponha de blindados pesados convencionais; e caso os Estados Unidos, no início do século XXI, defronte-se com um inimigo que disponha somente de um baixo nível de tecnologia, um oponente de nível tecnológico intermediário, ou, um adversário com poder equivalente, então o problema decorrente de uma amplitude de freqüência insuficiente provavelmente irá ocorrer”.0 A ESTREITEZA DE RACIOCÍNIO EXPOSTA PELO ATAQUE AO WORLD TRADE CENTER Na realidade, às vésperas de um novo século0, os militares norte-americanos já enfrentaram problemas decorrentes da insuficiência de amplitude da faixa de freqüência0, desencadeados pelos três tipos de inimigos anteriormente citados. Seja através do ataque de hackers, ou pela grande explosão no “World Trade Center”, ou um ataque com bombas por bin Laden, todos esses eventos excederam muito a amplitude da faixa de freqüências conhecidas pelos militares norte-americanos. As forças armadas norte-americanas não estão adequadamente preparadas para lidar com este tipo de inimigo, quer em termos psicológicos, quer em termos de medidas e, especialmente, no que concerne ao pensamento militar e métodos operacionais decorrentes deste pensamento. Isto ocorre porque eles nunca levaram em consideração, e até mesmo se recusaram a considerar, procedimentos que não reflitam a tradição, ou o emprego de outras medidas operacionais que não fossem as militares. Isto, logicamente, não permite que eles somem esses dois aspectos, (procedimentos e medidas operacionais) gerando novas medidas e novos métodos operacionais. Na realidade, é apenas necessário que se amplie um pouco mais o campo de visão e, simultaneamente, que desapareçam as inibições quanto ao raciocínio, para que se tire vantagem dos instrumentos proporcionados pela grande quantidade de novas tecnologias e de novos fatores emergentes da era da 0 Relatório de Pesquisa do Instituto de Estratégia da Escola de Guerra do Exército dos Estados Unidos; “Strategy and the Military Revolution: From Theory to Policy”. 0 [N.T.] O livro foi escrito no ano de 1996. 0 [N.T.] O autor se refere à falta de alternativas. tecnologia integrada, destravando, deste modo, a engrenagem da revolução militar que está enferrujada como conseqüência do atraso em termos de raciocínio. Neste ponto poderíamos apreciar o profundo significado do antigo adágio: “uma pedra de outras colinas poderá servir para polir o jade desta colina.” Seria muito bom se, de alguma forma, fossemos audaciosos e embaralhássemos completamente as cartas que temos nas mãos, recombinado-as, para vermos quais seriam os resultados. MÉTODOS NÃO MILITARES PODEM PROPORCIONAR A VITÓRIA SEM GUERRA Supondo-se a eclosão de uma guerra entre duas nações desenvolvidas, já detentoras, de forma completa, da tecnologia cibernética, e adotando métodos operacionais tradicionais, o lado atacante empreenderia modalidades de ações compreendendo: ataque em profundidade, amplas frentes de combate, elevado poder de fogo e tridimensionalidade para empreender uma campanha ofensiva contra o seu inimigo. Os métodos operacionais empregados não iriam além do reconhecimento por satélite, das contramedidas eletrônicas, dos ataques aéreos maciços e de precisão, do desdobramento terrestre, dos desembarques anfíbios, lançamentos aéreos por trás das linhas inimigas... e o resultado não seria a declaração de derrota por parte do inimigo, mas em vez disso, o seu próprio retorno para casa com todas as suas penas e esporões0. No entanto, pela utilização do método de combinação, poderão ocorrer cenário e confrontação completamente diferentes. No caso de o lado atacante, secretamente, reunir grandes volumes de capital, sem qualquer conhecimento por parte da nação inimiga, e desfechar um ataque sorrateiro ao mercado financeiro do adversário e, após ter provocado uma crise financeira, infectar o sistema de computadores do inimigo com vírus combinado com ações por parte de um destacamento de hackers, ao mesmo tempo em que empreende ataques às redes interativas de dados do inimigo, paralisando completamente suas redes de distribuição de eletricidade, de 0 [N.T.] A comparação chinesa refere-se à briga de galos (rinha). controle do tráfego de cargas, de controle de transações financeiras, de telefonia, de rádio e de televisão, tudo isso irá levar a nação inimiga a um completo pânico social, provocando levantes, desordem civil e crises políticas. Finalmente, viria a derrubada pela força, e os meios militares seriam utilizados em estágios graduais, até que o inimigo fosse forçado a assinar um tratado de paz de forma desonrosa. Deve-se considerar que este cenário não corresponde àquele preconizado por Sun Zi, no qual “o outro exército é subjugado sem a ocorrência de luta armada”; no entanto, pode-se considerar como sendo o caso de “subjugar o outro exército através de operações astutas”. Fica bem clara a determinação de quem foi superior e de quem foi inferior ao comparar os dois métodos operacionais descritos. Mas isso é, no entanto, apenas uma idéia, embora seja uma idéia factível. Com base nesta idéia, o que precisamos é somente sacudir o caleidoscópio da adição, para que sejamos capazes de gerar uma variedade inesgotável de métodos de operação. TIPOS DE GUERRA MILITAR TRANSMILITAR NÃO-MILITAR Guerra Nuclear Guerra Diplomática Guerra Financeira Guerra Convencional Guerra em Redes Interativas Guerra Comercial Guerra Bioquímica Guerra de Informações Guerra de Recursos Guerra Ecológica Guerra Psicológica Guerra de Ajuda Econômicas Guerra Espacial Guerra Tática Guerra de Imposição Legal Guerra Eletrônica Guerra de Contrabando Guerra de Sanções Guerra de Guerrilha Guerra ao Tráfico de Drogas Guerra de Mídia Guerra Antiterrorismo Quaisquer métodos Guerra Virtual operacionais, combinados entre si, constantes Guerra Ideológica da tabela acima, podem ser de modo a constituir um método operacional totalmente novo. Em nosso ponto de vista, os três tipos genéricos de guerra definidos, resultam de uma abordagem pragmática, e não alegórica ou descritiva. As guerras militares são sempre clássicas ou tradicionais, as quais empregam armamentos. Os diversos tipos de guerras não-militares constituem confrontos sem qualquer conotação anormal; mesmo assim, apresentam uma característica de guerra e todas constituem novidades. As guerras transmilitares estão situadas entre as duas anteriores, baseando-se em métodos já previamente estabelecidos tais como a guerra psicológica e a guerra de informações, e outras baseiam-se em métodos completamente novos, tais como “network warfare” e a “virtual warfare” (esta última referindo-se a métodos eletrônicos virtuais empregados na obstrução de Gong Shu Ban imposta por Mozi. (Ver o capitulo intitulado — “Gong Shu Ban Sets Up Machinery for the State of Chu to Attack the State of Song na obra “Strategies of the Warring States, Prospective Strategy of Song). Independentemente de ser ou não intencional, o emprego de métodos operacionais combinados, utilizando diferentes tipos de operações, que vão além das atuais ambiências e categorias, já foi implementado por diversas nações na condução da guerra. Por exemplo, as contramedidas adotadas pelos norte-americanos contra bin Laden compreendem: Guerra Antiterrorismo + Guerra de Informações + Guerra Financeira + Guerra de Redes Interativas + Guerra de Imposição Legal. Um outro exemplo foi o método adotado pelas nações da OTAN na solução da crise do Kosovo: Deterrência (pela ameaça de emprego da força) + Guerra Diplomática + Guerra de Imposição Legal. Em outro exemplo anterior a esse, os Estados Unidos adotou os seguintes métodos operacionais contra o Iraque: Guerra Convencional + Guerra Diplomática + Guerra de Sanções + Guerra de Mídia + Guerra Psicológica + Guerras de Informações, etc. Observamos também que os meios adotados pelo governo de Hong Kong durante a guerra financeira de Agosto de 1998, para lidar com os especuladores financeiros foram: Guerra Financeira + Guerra de Imposição Legal + Guerra Psicológica + Guerra de Mídia, e embora eles tenham pago um preço bastante alto, ainda assim os resultados da guerra foram muito bons. Alem disso, os métodos utilizados para o trato de problemas como, por exemplo, a emissão de grandes quantidades de papel moeda falso em Taiwan, foi resolvido facilmente com uma combinação de Guerra Financeira + Guerra de Contrabando. Podemos ver através desses exemplos os efeitos miraculosos da aplicação do processo de adição - combinação nos métodos operacionais. Se for considerado que devido às limitações de meios e condições tecnológicas, aqueles que estiveram engajados em guerras no passado não tiveram a capacidade para combinar livremente todos os fatores para obter vitórias nas guerras, esta não é a situação atual, onde a grande explosão da tecnologia, liderada pela tecnologia cibernética, já nos proporciona esta possibilidade. Desde que estejamos interessados e não deixemos que aspectos subjetivos nos desviem das leis objetivas poderemos, então, arrumar as cartas em nossas mãos, em diversas combinações, conforme as necessidades do momento, até que finalmente vençamos o jogo. Não existe, no entanto, alguém que possa prescrever uma fórmula vitoriosa e garantida para todas as guerras do futuro. Diversos tipos de métodos operacionais surgiram ao longo da história da guerra, e a maioria foi esquecida com o passar do tempo. Ao analisarmos as razões para esse esquecimento, observa-se que todos esses métodos operacionais foram estabelecidos visando a em um alvo específico, e quando este alvo desapareceu, o método operacional para o qual era destinado também perdia o seu valor. Um método operacional, para ter uma real validade, tem que ser como uma “cesta vazia”. Esta cesta vazia deve ser constituída apenas por princípios e pensamentos que sejam imutáveis, para poderem acomodar uma miríade de mudanças. O processo de combinação do qual falamos é este tipo de cesta vazia, uma cesta vazia do pensamento militar. Não se assemelha a quaisquer dos poderosos e direcionados métodos operacionais do passado, posto que, somente quando esta cesta é preenchida com um conteúdo lógico ou alvos específicos é que ela passa a ter uma direcionalidade e um propósito. O elemento fundamental para determinar se a vitória será ou não alcançada em uma guerra, não será outro que não — o que você for capaz de colocar dentro desta cesta. Yue Fei0, estrategista militar durante a Dinastia Song, afirmou ao comentar o emprego de métodos operacionais, que — “a excelência da sutileza de sua aplicação repousa na capacidade mental do indivíduo”. Embora esta afirmação seja um tanto abstrata, ainda assim, é a única e precisa explicação para a correta aplicação do processo de combinação. Somente pela compreensão desta colocação é que seremos capazes de elaborar um método operacional que transcenda a multiplicidade de métodos operacionais existentes. Isto significaria convergir a 0 [N.T.] Yue Fei foi um Marechal de Campo que serviu ao imperador Chinês durante a dinastia Song. Ele se tornou famoso por seu patriotismo e lealdade. Ver http://www.colorq.org/Articles/2003/ahistory.htm. miríade de métodos operacionais em um único. Poderia ser, inclusive, um estágio evolutivo final dos métodos operacionais. Sem considerar a necessidade de combinar-se algo que transcende quaisquer limitações, não há como se imaginar um outro método operacional que possa superar o da combinação. A conclusão é, portanto, bastante simples, e ainda assim, definitivamente, ela não emergirá de um único raciocínio. CAP 6 — A BUSCA DA REGRA DA VITÓRIA A FORÇA SE AFASTA DO PONTO DE ATAQUE DO INIMIGO “Quando eu adoto como regra a execução de movimentos explorando a surpresa; o inimigo espera movimentos explorando a surpresa; neste caso, eu ataco o inimigo sem usar o elemento surpresa. Quando eu adoto como regra a execução de movimentos sem usar o elemento surpresa; o inimigo espera os movimentos sem o uso da surpresa; mas neste caso eu uso a surpresa em minha movimentação para atacar o inimigo.” Li Shih-min 0 Apesar de tudo que já foi dito sobre combinação, ainda é necessário enfatizar que não basta simplesmente, enfocar a teoria da combinação. É necessário concentrar ainda mais este enfoque, de modo a nos certificarmos se existe, ou não, algum segredo que esteja próximo ao núcleo desta concepção. Se não entendermos o segredo de como programar a combinação será inútil aplicá-la por 100 vezes de forma incompetente. Na história da guerra, nunca ocorreu uma vitória obtida sem muito esforço. Portanto, em todas as suas versões, a obra intitulada “Jun Yu” (Conversa Militar) contém expressões tais como: direção do ataque principal; alvos prioritários; fintas de ataque, fintas de deslocamento; assim como, envolvimento pelo flanco, as quais descrevem táticas ou estratégias operacionais, onde podemos identificar uma distinção entre ações principais e ações secundárias. O que está implícito nesses conceitos táticos ou operacionais, não é apenas a necessidade de iludir o inimigo, ou o emprego correto da força, algo mais deve existir no significado destes conceitos. Por exemplo, quanto à intuição, todos aqueles famosos generais que obtiveram inúmeras vitórias, ou até mesmo personagens pouco conhecidos, todos perceberam a existência de algo que talvez 0 [N.T.] No começo do século VII, a China, após quatro séculos de guerras internas, ressurgiu como uma grande nação. O grande responsável por esse ressurgimento foi Li Shih-Min, reconhecido como um gênio militar. Depois de alcançar diversas vitórias, tanto internas quanto externas, principalmente contra os Turcos no leste, em 626 DC, tornou-se Imperador com o nome de T’ai Tsung. pudesse ser denominado de “regra regra da vitória”, e freqüentemente, eles até vitória aproximaram-se de tal regra. Não obstante, até hoje, nenhum líder militar ou filósofo teve a ousadia de anunciar: eu descobri as regras da vitória! Nem mesmo a tarefa de atribuir nomes a essas regras foi completada. Na realidade, porém, essas regras estão escondidas no bojo das diversas empreitadas militares praticadas pela raça humana. É correto afirmar, inclusive, que cada uma das vitórias clássicas na guerra comprovou tais regras. Todavia, em todos os eventos os participantes, ou não querem admitir, ou não têm a coragem de afirmar, a sua interação coma as regras da vitória e em vez disso, freqüentemente, atribuem os efeitos dessas regras a algum destino misterioso. Muitas “declarações tardias”, contidas em obras sobre a história militar, apresentam argumentos argumentos descrevem que os são difíceis efeitos das de serem regras da entendidos, vitória de pois uma tais forma excessivamente enigmática. Mas as regras da vitória existem, elas estão lá. Como uma entidade invisível, elas acompanham cada guerra da humanidade. O lado que for apontado por seus dedos dourados, irá passar pelo arco do triunfo, pisoteando o infortúnio dos vencidos. Ainda assim, nem mesmo os vitoriosos na guerra chegaram a realmente a vislumbrar a sua face verdadeira. CONFORMANDO-SE À REGRA DA PROPORÇÃO ÁUREA “Tudo é uma questão de números”. Seguindo esta linha de raciocínio o antigo filósofo Pitágoras, inesperadamente, encontrou um conjunto misterioso de dígitos: 0,618. Em decorrência ele descobriu a regra, da secção de ouro! Pitágoras foi um filósofo e matemático da antiga Grécia, autor do famoso axioma: “Tudo é uma questão de números”. Isto significa que todas as coisas existentes podem, em uma analise conclusiva, serem entendidas como um relacionamento de números. De acordo com a teoria de Pitágoras, as coisas racionais e as coisas irracionais estavam mescladas, mas ainda assim, sua teoria exerceu profunda influência no desenvolvimento da antiga filosofia grega e do pensamento europeu medieval. Copérnico aceitou os conceitos astronômicos de Pitágoras. Galileu também foi considerado um advogado da teoria de Pitágoras. A utilidade da Regra Áurea, ou, PROPORÇÃO ÁUREA para demonstrar o relacionamento harmonioso no mundo foi apenas uma das aplicações especificas do pensar de Pitágoras. Ver Enciclopédia Britânica Vol 1, p 715. Divida uma linha reta de comprimento “d” em duas partes de tamanhos diferentes “u” e “d-u”, de modo tal modo que a razão proporção é chamada de u PROPORÇÃO ÁUREA. d d u = u ≈ 0,618 seja verdadeira. Tal u d d-u Nos 2.500 anos que se seguiram, tal proporção tem sido considerada pelos criadores da arte como a regra dourada da estética. Conforme demonstrado história das artes, quase todas as obras artísticas tidas como obras primas, quer por casualidade, quer por uma vontade intencional, todas elas estão próximas ou concordantes com esse percentual no tocante às suas dimensões. [N.T.] Muitas são as propriedades desta relação chamada áurea. O campo de visão dos dois olhos do ser humano, independente da distância dos olhos até o objeto observado, forma um retângulo na relação áurea. Quase todos os quadros pintados a partir da Idade Média, guardam a relação áurea em suas dimensões. Todas as partes do corpo humano guardam entre si a relação áurea. Assim, os comprimentos do braço e do antebraço estão nesta relação; a altura de uma pessoa e altura que se encontra o coração também guardam a relação áurea. Aparelhos de TV e monitores de computador têm aproximadamente a relação áurea entre altura e largura da tela. Todas as pessoas, através dos tempos, ficaram maravilhadas com a beleza do templo do Parthenon da Grécia antiga, chegando-se a supor que se tratava de uma criação divina. Através a medição e de cálculos foi constatado que o relacionamento entre suas dimensões verticais e horizontais estava inteiramente de acordo com a razão 1: 0,618. Em seu livro “Vers une Architeture” o grande arquiteto moderno Le Corbusier estabeleceu a sua mais importante teoria quanto à “escala básica de um projeto” com base na PROPORÇÃO ÁUREA. Essa teoria tem exercido uma ampla e profunda influência nos arquitetos e na arquitetura em âmbito mundial0. Infelizmente, este percentual que talvez o Criador pretendesse usar para revelar à raça humana sua aplicação em todas as ambiências, jamais se propagou muito além da ambiência artística. Excetuando-se talvez aquelas musas com atributos extraordinários, praticamente ninguém percebeu que esta PROPORÇÃO ÁUREA da estética poderia se transformar, ou se constituir, numa regra que deveria ser aplicada em todas as ambiências. Foi somente em 1953, que J. Kieffer, um norte-americano, descobriu que a seleção de pontos experimentais em pesquisas, utilizando a PROPORÇÃO ÁUREA, permitia atingir, de maneira mais rápida, a condição mais satisfatória. Sua descoberta foi 0 Ver Summerson, “Linguagem Clássica da Arquitetura”, p.90. aperfeiçoada pelo matemático chinês Hua Luogeng e passou a ser conhecida como o “método de investigação mais favorável”, ou, o “método 0,618”. Este método durante algum tempo foi popular na China. Até onde sabemos, uma campanha como esta, tentando laicizar uma teoria não produziu efeitos significativos, mas esse episódio permitiu demonstrar a possibilidade da PROPORÇÃO ÁUREA aplicação da regra da em outras ambiências que não apenas aquela das artes. Desde a antiga Grécia até o século XIX acreditava-se que esta razão era um valor estético na arte criativa. Nos dias atuais, adotam-se aproximações mais simplificadas, tais como as razões 2:3, 3:5, 5:8 e 8:13 retiradas da progressão numérica 2,3,5 8, 13, 21 desenvolvida pelo matemático italiano Leonardo Pisano, cujo apelido era Fibonacci, De fato, antes de surgir a consciente exploração sistemática da regra da PROPORÇÃO ÁUREA, as pessoas aplicaram-na, repetidamente, em suas próprias esferas de atuação de forma instintiva. E logicamente, a ambiência militar não se constituiria em uma exceção. Podemos facilmente perceber as pegadas efêmeras das garras dessa fera misteriosa nas famosas e surpreendentes campanhas e batalhas ao longo da história da guerra. Sem nos aprofundarmos no tema, é possível constatar a conformação a essa regra em toda a ambiência militar. A sombra do número 0,618 pode ser percebida em coisas que vão desde a curvatura da espada do cavalariano ao ápice da trajetória de vôo de uma bala, projétil, ou, míssil balístico. Desde a altitude e distância ideais para o lançamento de uma bomba por um avião em vôo de mergulho até o relacionamento entre a extensão da linha de suprimentos e o ponto de inflexão de uma guerra. O bombardeio de mergulho é o método principal usado por aviões de ataque para lançar mísseis de curto alcance, foguetes e bombas com, ou sem sistemas de guiagem. Durante um ataque, o avião desloca-se a baixa altitude, até alcançar o “ponto de combate” (na distância de 40 a 50 km do alvo), e neste ponto ascende para 2.000 - 4.000 metros adotando a direção final de ataque. Entre 5 e 10 km do alvo inicia o mergulho e as armas são lançadas entre 1300 e 1600 metros ou entre 600 a 1000 metros de altitude dependendo da arma com um ângulo de mergulho entre 30 e 50 graus. Nos ataques de mergulho a precisão destrutiva das armas é mais elevada. Ver o periódico russo “Foreign Military Peviews” nº. 10 (1992). Da leitura casual dos registros da história da guerra, é certo que ficaremos silenciosamente surpreendidos com o fato de que o número 0,618, como se fosse um elo de ouro, pode ser vislumbrado nas guerras antigas, nas guerras modernas, nas guerras chinesas e em guerras estrangeiras. Na batalha de Yanling (575 AC) entre os estados de Jin e Chu, durante o Período da Primavera e Outono, o Duque Li de Jin comandou uma força terrestre no ataque a Zheng0. As forças de Jin travaram uma batalha decisiva contra a força Chu em Yanling. Aceitando as recomendações de um desertor de Chu chamado Miro Penghuam, o Duque Li, como sua ação principal, utilizou a maior parte de sua força principal para investir sobre um determinado ponto da ala esquerda das forças de Chu, e o restante de sua força principal para atacar, o centro das forças Chu; Como ação secundária, usou suas demais forças para atacar o flanco direito do inimigo. O ponto de ataque selecionado (na ala esquerda das forças de Chu) correspondia, exatamente, à posição que dividia a linha inimiga segundo a PROPORÇÃO ÁUREA. Já na Batalha de Arbela0 entre Alexandre e Dario0, os macedônios escolheram um ponto do flanco esquerdo com o corpo central do exército persa como o seu ponto de ataque. Surpreendentemente este ponto correspondia, exatamente, à posição que dividia a frente persa segundo a PROPORÇÃO ÁUREA. Durante centenas de anos, achou-se difícil entender porque a cavalaria mongol de Gengis Khan assemelhava-se a um furacão, capaz de deslocar-se através de todo o continente eurasiano. Fatores como a truculência dos bárbaros, a sua crueldade e a sua sagacidade ou a mobilidade da cavalaria, não proporcionavam argumentos convincentes. Será que existiram outras explicações mais lógicas? Dentro das expectativas, a regra áurea demonstrou, novamente, todo o seu poder milagroso. É possível verificar-se que a formação de batalha da cavalaria mongol era diferente daquela da falange tradicional ocidental. Na sua disposição, em cinco colunas, a proporção entre a cavalaria pesada e a cavalaria ligeira era de 2 para 3; cabendo o valor 2 à cavalaria pesada com armadura, e o valor 3 à cavalaria leve, 0 Ver “The History or War of China”, Military Translation Press, Vol. 1, pp. 253-273 e as ilustrações 1-26 do anexo. 0 [N.T.] Para um melhor entendimento desta batalha, consultar a obra “The Enciclopédia of Military History” de Dupuy and Dupuy; p.49-50; Ed 1970. 0 Ver Fuller, “Uma história militar do mundo Ocidental”, vol. 1, p. 117. Este livro contém uma ótima análise da Batalha de Arbela como também ilustrações que graficamente mostram as diferentes situações do campo de batalha. veloz e com mobilidade. Esta divisão representa um outro exemplo da aplicação da proporção áurea! Nós temos que reverenciar o entendimento, ao nível de gênio, daquele pensador montado! Seria lógico, que a força, dispondo de um líder como ele, teria um poder mais contundente do que as forças européias que a ele se opunham. Parece que, embora altamente talentosos quanto à aplicação da regra áurea às artes, os cristãos europeus tardaram a reconhecer a aplicação dessa regra em outras ambiências. Maurício, general holandês0, que foi o primeiro a alterar a constituição da falange original, misturando um número semelhante de soldados armados com mosquetes e de soldados armados com lanças, não chegou a visualizar a importância da PROPORÇÃO ÁUREA, até mesmo no período da pólvora negra, quando os mosquetes estavam gradualmente substituindo as lanças. Foi o Rei Gustavo Adolfo0, da Suécia, redimensionou a estrutura desta formação, reforçando o poder de fogo e flexibilidade da parte central de suas forças, transformando, desse modo, o exército sueco no exército que dispunha do maior poder de combate daquela época na Europa. [N.T.] Na realidade o que Gustavo II Adolfo fez foi alterar a disposição do dispositivo chamado “tertius” que era uma evolução da falange macedônica, aumentando a sua linha de frente e reduzindo a sua profundidade, alterando, também, a forma de abertura de fogo, que era originalmente seqüencial, uma fileira de cada vez, para uma salva única com todas as armas disponíveis. Outro empreendimento seu foi criar unidades menores com maior flexibilidade, intercalando infantaria, artilharia e cavalaria. 0 [N.T.] O autor refere-se a Maurice, o Conde de Nasssau, Príncipe de Orange, que em 10 de julho de 1584, então com 17 anos de idade, assumiu o Principado devido ao assassinato de seu pai, tendo uma atuação destacada nas guerras em que procurou preservar a independência da Holanda. 0 [N.T.] Gustavo Adolfo da Suécia foi o responsável por diversas das transformações ocorridas no início do século XVII, na área militar. Dentre os seus feitos, além do mencionado no texto, seria possível citar: a transformação dos mosquetes dos modelos de 15 a 20 lbs, e que eram disparados com o apoio de uma forquilha, em uma arma mais leve, pesando apenas 11 lbs; adotou o emprego de cartuchos nos mosquetes; criou a moderna artilharia de campanha e o moderno conceito de bombardeio maciço. A alteração feita por Gustavo Adolfo consistiu em acrescentar mais 96 soldados armados com mosquetes ao efetivo do esquadrão composto por 216 soldados armados com lanças e 198 soldados dispondo de mosquetes.0 Esta transformação proporcionou uma superioridade instantânea para as armas de fogo, passando a representar o divisor de águas entre os períodos das armas brancas e das armas de fogo. É desnecessário chamar a atenção para o fato de que, novamente, resplandeceu o brilho da PROPORÇÃO ÁUREA, identificável ao considerarmos a proporcionalidade de 198 + 96 soldados armados com mosquetes em relação a 216 soldados armados com lanças. Existem ainda teimosamente, outros exemplos. Vejamos como regra da PROPORÇÃO ÁUREA, tem procurado se “manifestar” de modo a nos proporcionar um embasamento, antes que a reconheçamos como algo mais do que uma regra aplicável às artes. Napoleão invadiu a Rússia em junho de 1812. Em setembro, após ter fracassado na eliminação das principais forças russas na Batalha de Borodino, ele ocupou Moscou. Naquele momento ele não percebeu do fato de que o seu gênio e sua sorte estavam progressivamente abandonando-o, e que tanto o cume, como o ponto de declínio de sua prolongada carreira estavam simultaneamente sendo atingidos. Um mês mais tarde, as forças francesas abandonavam Moscou sob uma forte nevasca. Foram três meses de uma ofensiva vitoriosa, seguida por dois meses de um continuado declínio. Parece até que o Imperador francês estava posicionado, ao longo da linha do tempo, no ponto fixado pela PROPORÇÃO ÁUREA, que marcava o limite entre dois segmentos distintos, enquanto contemplava a cidade de Moscou sendo destruída pelo incêndio. Em um outro mês de junho, 130 anos depois, a Alemanha Nazista deu início ao Plano Barbarosa contra a União Soviética. Durante dois anos as forças alemãs mantiveram o seu ímpeto ofensivo. E foi em agosto de 1943 que as forças germânicas passaram a adotar uma postura defensiva após o evento de “Kursk” e nunca mais foram capazes de lançar uma ofensiva contra as forças soviéticas. 0 [N.T.] Efetuando-se as contas com os valores informados pelo autor obtém-se um valor que não corresponde ao número áureo. Em Dupuy and Dupuy, citado anteriormente, os valores de efetivos divergem dos citados pelo aproximando-se um pouco mas do valor áureo, sem no entanto igualá-lo. autor, Talvez tenhamos também que considerar o exemplo seguinte como uma coincidência0. [N.T.] Na versão inglesa da obra foi adotada a palavra “Castle”, porque provavelmente a palavra “Kursk” foi literalmente traduzida para o inglês. Por tratar-se de uma referência histórica, optamos por utilizar sua forma original. Durante a 2ª Guerra Mundial, a batalha de Kursk (julho de 1943) travada entre alemães e russos foi uma das batalhas mais importantes na frente oriental, mantendo-se, até hoje, como um dos maiores conflitos envolvendo blindados de toda a história da guerra. Nesta os alemães planejaram uma ação ofensiva que foi contida pelas forças soviéticas, que lançara, em resposta, uma contra-ofensiva que se estendeu até às portas de Berlim. A Batalha de Stalingrado, que foi considerada por todos os analistas militares como o ponto de inflexão da Guerra Patriótica dos Soviéticos, ocorreu exatamente no décimo sétimo mês da guerra, isto é, novembro de 1942. Este é o ponto fixado pela PROPORÇÃO ÁUREA, no eixo da linha de tempo, que demarca o início do período de vinte e seis meses, no decorrer dos quais as forças alemãs passaram do sucesso ao declínio. Examinemos, também, a Guerra do Golfo. Antes da guerra, os especialistas militares estimavam que os equipamentos e os componentes das Guardas Republicanas perderiam, em termos práticos, a sua eficácia em combate, quando as suas perdas, resultantes dos ataques aéreos, excedessem o valor de 30%. Visando impor perdas às forças iraquianas até que esse nível crítico fosse atingido, as forças norte-americanas, estenderam, repetidamente, o tempo de bombardeio. Quando terminou a operação “Espada do Deserto” as forças iraquianas tinham perdido 38% de seu efetivo de 4.280 tanques, 32% de seus 2.280 veículos blindados, e 47% de suas 3.100 peças de artilharia. Sobrou apenas, em média, 60% de seu poderio militar. A despeito de dados tão impiedosos, o fulgor misterioso do número 0,618 aparecia novamente na manhã de 24 de janeiro de 1991. A guerra terrestre da “Tempestade no Deserto” terminou 100 horas mais tarde. Tais episódios, espalhados ao longo da História, representam algo verdadeiramente surpreendente. Quando analisados isoladamente, podem até parecer uma seqüência de ocorrências acidentais, mas para o Criador não existe o acaso. Se um demasiado número de ocorrências vem a comprovar um mesmo fenômeno poderia ainda um leitor, tranqüilamente, considerá-los como obra do acaso? A nosso ver a resposta é não. Temos que admitir a existência de uma regra. 0 Masaier Bodug (França) autor de “A Enciclopédia da Segunda Guerra Mundial”, (Pla Press, 1989); “The Soviet Union’s War Against Germany” pp 684.694 A GRAMÁTICA DA VITÓRIA — A REGRA COLATERAL-PRINCIPAL Na gramática chinesa, a sentença possui uma estrutura básica. Esta estrutura divide a sentença, ou a frase, em duas partes: o termo central e o modificador. O relacionamento entre eles é aquele de ser alterado e de alterar, isto é, o modificador altera o significado do termo central, determinando a tendência e característica desse termo. De maneira mais clara, o modificador representa a aparência e o termo central representa o ser. Normalmente, nós não definimos a diferença entre pessoas ou entre objetos em função de sua constituição (orgânica ou física) e, sim, em função de suas aparências ou formas. Sob esta perspectiva, o modificador deveria ser considerado, praticamente, como o núcleo de uma sentença ou frase. Por exemplo, tomemos a expressão: “pano de linho”. Antes de ser modificado pelo qualificativo (adjetivo) “linho” o vocábulo “pano” refere-se, genericamente, a um tipo de tecido ou fazenda. O qualitativo “linho”, todavia, atribui ao pano uma especificidade que o classifica. Obviamente o qualitativo “linho” desempenha uma função importante nessa expressão. Consideremos, também, a expressão “zona econômica especial”. Sem a qualificação “econômica”, uma “zona especial” representa apenas um conceito de divisão geográfica. Quando modificada pelo termo “econômica”, a “zona especial” adquire nova característica e significado, tornando-se, por exemplo, o componente básico de suporte para a reforma da China efetuada por Deng Xiaoping. Esta estrutura representa um modelo básico na gramática chinesa: a ESTRUTURA COLATERAL-PRINCIPAL A estrutura de uma frase ou expressão na qual o elemento principal é modificado pelo elemento colateral é amplamente disseminada na língua chinesa até o ponto em que, sem o seu uso, não é possível a um chinês expressar-se adequadamente. Na língua chinesa, se numa frase houver somente sujeitos, sem quaisquer modificadores, a sentença carecerá de clareza, devido à ausência de tais elementos indicadores de gradação, localização e modo, e que permitem a compreensão de forma concreta. Por exemplo, se os modificadores em frases tais como: “pessoa boa”, “coisa boa”, “edifício alto”, e “bandeira vermelha”, forem removidos, os termos centrais passarão a ser palavras neutras, sem qualquer significado ou referência específica. Assim, na ESTRUTURA COLATERAL-PRINCIPAL o elemento “colateral”, tem a função de determinar, qualitativamente, a sentença ou expressão. Em outras palavras podemos perceber a palavra central (elemento principal ou o sujeito) representa a entidade principal e o modificador (colateral ou qualitativo) serve como elemento orientador. Isto é, o elemento principal é o corpo do elemento colateral, enquanto que o elemento colateral é a alma do elemento principal. Aceitando-se esta premissa quanto à existência de um corpo, parece ser óbvio que a função da alma é de importância decisiva. O relacionamento da entidade principal implicando em uma subordinação ao elemento orientador constitui o fundamento básico para a existência da ESTRUTURA COLATERAL-PRINCIPAL. Ao mesmo tempo, sendo um dos modelos de estrutura do sistema de símbolos que corresponde ao mundo objetivo, parece nos sugerir algo normativo que vai além da abrangência do idioma. Seguindo-se o curso desse raciocínio, iremos observar que o relacionamento na ESTRUTURA COLATERAL-PRINCIPAL tem uma aplicação bastante ampla, não se limitando a expressões do tipo “boa pessoa”, “coisa ruim”, “edifício alto” e “bandeira vermelha”, ou, ainda, termos militares como navio-aeródromo, míssil de cruzeiro, aeronave invisível, veículo blindado de transporte de pessoal, artilharia autopropulsada, bombas de precisão, força de resposta rápida, guerra terra-ar e operações conjuntas. Este relacionamento existe, também, de inúmeras formas, fora da ambiência da linguagem, numa miríade de maneiras. É por esta característica genérica que podemos utilizar por empréstimo — e apenas como empréstimo e não como cópia — esta relação da retórica, e que de acordo com a nossa teoria, é encontrado, somente, nos sistemas de linguagem dos seres humanos. Não pretendemos justapor, arbitrariamente, a guerra às normas da retórica, mas apenas tomar emprestado a expressão “colateral-principal” para enunciar o elemento mais profundo da nossa teoria. Pois acreditamos que esse relacionamento colateral-principal existe de maneira amplamente significativa, tanto no movimento quanto no desenvolvimento de muitas coisas e que, em tal relacionamento, o elemento colateral, em vez do elemento principal, freqüentemente desempenha as funções de elemento orientador. Por hora, vamos descrever este relacionamento como sendo “a modificação do elemento principal pelo elemento colateral”. (Obs: este não é o significado original da ESTRUTURA COLATERAL-PRINCIPAL, no contexto de sua utilização como um expediente de retórica, mas sim, um significado ampliado que adotaremos). Por exemplo, em um país, o povo representa a entidade principal, enquanto que o governo representa o elemento orientador; numa força armada, os soldados e os oficiais de nível subalterno e intermediário constituem a entidade principal e os Quartéis-Generais de Comando representam o elemento orientador dessa força armada; em uma explosão nuclear, o urânio, ou, o plutônio constitui a entidade principal, ao passo que os meios diretamente relacionados com seu lançamento representam o elemento orientador, para dar início ao ciclo de reações em cadeia; numa crise financeira do tipo ocorrido no Sudeste Asiático, os países vitimados são as entidades principais, enquanto que os especuladores financeiros representam o elemento orientador, para o desencadeamento da crise. Sem uma orientação proporcionada pelo governo, o povo passa a representar um monte aleatório de areia; sem a orientação proporcionada pelo Comando, os soldados passarão a constituir uma turba; sem os meios para bombardear o urânio e o plutônio, estes se tornam, apenas, um monte de minérios; sem as ações dos especuladores financeiros, criando distúrbios, os mecanismos reguladores das nações vítimas deveriam capacitá-las a evitar a ocorrência de catástrofes financeiras. Em tal tipo de relacionamento, se deixarmos de lado as interações bidirecionais, torna-se evidente qual é o elemento colateral, qual é o elemento principal, e quem modifica quem. Queremos crer que ficou demonstrado, no decorrer desta apresentação, que a ESTRUTURA COLATERAL-PRINCIPAL é assimétrica. Assim sendo, o relacionamento entre o componente e colateral o componente principal é um relacionamento desequilibrado. Neste ponto, a situação assemelha-se àquela relativa a regra da PROPORÇÃO ÁUREA onde 0,618 e 1 também formam uma estrutura assimétrica e um relacionamento desequilibrado. Nós estamos plenamente justificados em considerar esta relação como uma nova maneira de propor a relação colateral-principal, visto que, na PRINCIPAL, ESTRUTURA COLATERAL- aquilo que é importante é o elemento colateral e não o elemento principal. E da mesma forma, isto também é verdadeiro na regra da PROPORÇÃO ÁUREA, onde o que é importante é o 0,618 e não o 1. Isto representa a característica comum às duas relações. Leis naturais comprovam que duas coisas com características semelhantes devem obedecer a regras semelhantes. Portanto, se existir alguma regra comum, governando a regra da PROPORÇÃO ÁUREA e a regra da ESTRUTURA COLATERAL-PRINCIPAL, ela poderia ser enunciada como: 0,618 = PREDOMINÂNCIA PROGRESSIVA DO ELEMENTO COLATERAL. O melhor exemplo para ilustrar esta proposição está, talvez, na história da corrida de cavalos conforme descrita por Tien Chi0. Em uma situação de inferioridade quanto a um poderio global, o grande estrategista militar Sun Pin realizou a sua jogada clássica, que representou um exemplo adequado da sabedoria chinesa no tocante a jogos. Numa competição de corrida de cavalos, Sun Pin escalou para o 1º páreo pior cavalo de Tien Chi contra o melhor cavalo do Rei de Qi. Depois de inevitavelmente ter perdido esse páreo, ele colocou, nos dois páreos seguintes, os seus melhores e médios cavalos para vencer os médios e piores cavalos de seu adversário obtendo dessa maneira uma dupla vitória, obtendo, assim, a vantagem necessária para a vitória geral. Este método em que é aplicada a estratégia de perder uma disputa e, em seguida, vencer duas disputas (o elemento orientador) para vencer a disputa de forma geral (o elemento principal), pode ser visualizada como uma representação típica da ESTRUTURA COLATERAL-PRINCIPAL. O resultado de vencer dois dos três páreos, também está totalmente de acordo com a PROPORÇÃO ÁUREA, isto é, 2:3. Aqui podemos constatar a convergência perfeita e a unicidade das duas regras: a regra da PROPORÇÃO ÁUREA = a regra da ESTRUTURA COLATERAL- PRINCIPAL. 0 Ver “Biographies of Sun Zi and We Q’i” em Shi Ji (Records of History) A descoberta de uma regra significa, ao mesmo tempo, o fim e o início da análise de um tema. Enquanto acreditarmos que algo denominado REGRA COLATERAL-PRINCIPAL pode ser percebido como influindo na evolução de todos os acontecimentos, deveremos, também, acreditar que essa regra do mesmo modo que a REGRA DA PROPORÇÃO ÁUREA, não deixaria imune a ambiência militar. Os fatos demonstram essa capacidade. Por exemplo, a batalha de Ch´ang-Sha0 entre Chi e Chu. Quando as duas forças defrontaram-se no campo de batalha, o exército de Chi tinha uma atitude bastante agressiva enquanto que o exército de Chu permaneceu imóvel. As forças de Chi atacaram três vezes, impulsionadas por três seqüências de rufar dos tambores, mas não obtiveram êxito quanto a desordenar a vanguarda do exército de Chu, daí resultando um declínio óbvio no ímpeto atacante. O exército de Chu, então, aproveitou-se da oportunidade e desfechou um contra-ataque, daí resultando uma total vitória. Após a batalha, o conselheiro Kao Ying0 explicou as razões da derrota de Chi e da vitória de Chu nesta batalha: “O exército inimigo teve um grande ímpeto com a primeira seqüência do rufar dos tambores; teve um ímpeto menor no segundo momento do rufar dos tambores e estava exausto quando os tambores rufaram pela terceira vez, na medida em que nossas forças dispunham de pleno vigor, ocorreu nossa prevalência”. Todo o desenrolar da batalha pode ser dividido em cinco etapas: o primeiro rufar dos tambores das forças de Chi; o segundo rufar dos tambores das forças de Chi; o terceiro rufar dos tambores das forças de Chi; o contra-ataque das forças de Chu; e a perseguição ao inimigo empreendida por Chu. Da primeira à terceira etapa, Kao adotou a estratégia de evitar um sucesso do ataque inimigo e, assim sendo, o exército de Chi rapidamente ultrapassou o ponto áureo de sua ofensiva, sem que tivesse obtido quaisquer resultados significativos. Enquanto isso, o exército de Chu escolheu com precisão aquele momento, como sendo o do início do contra-ataque, e deste modo demonstrou, efetivamente, num campo de batalha, há 2.700 anos, o valor da regra da PROPORÇÃO ÁUREA, (3:5 é aproximadamente igual a 0,618)0. 0 [N.T.] Este corresponde o antigo nome da atual cidade de Xangai. 0 [N.T.] No texto em inglês consta o nome “Cao Gui”, que no entender do tradutor não é o nome correto. Podemos ter certeza de que, naquela época, Kao Ying não poderia ter conhecido Pitágoras e a sua teoria da PROPORÇÃO ÁUREA, um fato que só viria a ocorrer 200 anos mais tarde. Além disso, mesmo que Kao Ying tivesse conhecimento dessa teoria, não teria sido possível determinar com precisão, no decorrer de uma batalha, onde se situava o ponto, que corresponderia á proporção de 0,618 em relação à extensão total da batalha, cuja duração não seria possível prever. Por instinto, acreditamos que ele tenha conseguido visualizar o momento do contra-ataque, através de um lampejo de sua inteligência. Esta é uma dádiva comum de todos os militares talentosos. Aníbal, na batalha de Cannae, raciocinou da mesma maneira que Kao Ying. [N.T.] A Batalha de Cannae, travada em agosto de 216 AC foi uma batalha decisiva da Segunda Guerra Púnica, e que se tornou um clássico pela tática empregada por Aníbal, paras derrotar um exército romano amplamente superior em termos numéricos. Da mesma forma que Kao Ying, ele entendeu o segredo da seqüência de declínio do poder de ataque das forças inimigas. Assim sendo, de maneira inusitada, ele posicionou seu componente mais fraco, composto pelas infantarias espanhola e gaulesa, no centro de sua vanguarda, onde, normalmente, deveriam estar seus elementos mais poderosos. Com isso, suas forças mais fracas deveriam enfrentar as fortes forças romanas. Na medida em que tal enfrentamento proporcionou uma superioridade romana, ocorreu um recuo do centro da frente de Aníbal, estabelecendo-se uma nova frente de combate com um formato convexo. Não importa se essa curvatura tenha sido criada intencionalmente por Aníbal ou que tenha surgido como conseqüência do engajamento. Na realidade, ela se transformou em um gigantesco amortecedor que absorveu o poder de ataque das legiões romanas. Na medida em que esse poder foi sendo gradualmente enfraquecido, devido à profundidade do corpo central, o ímpeto do ataque chegou ao seu ponto mais baixo, quando a retaguarda dos romanos estavam se aproximando das extremidades da frente cartaginesa na forma convexa. Deste ponto em diante, as forças cartaginesas eram inferiores em termos globais, mas 0 Ver “Kao Ying Analysys of War” . Mais tarde, quando participando da reunião de Chi e Chu na localidade de Ke, Kao Ying capturou o Duque Heng de Chi usando uma faca e deste modo obrigou que Chi devolvesse as terras de Chu que haviam sido ocupadas. Ele foi um bom general demonstrando ao mesmo tempo coragem e sabedoria; ver “Biographies of Assassins” em Shi Ji. superiores em termos de cavalaria, que posicionadas nos flancos, rapidamente lançaram seus ataques envolvendo completamente as forças romanas, e desta forma, transformando Cannae em um campo de extermínio para 70.000 homens. As duas batalhas (Ch´ang-Sha e Cannae) foram diferentes, mas o seu desenvolvimento foi idêntico. Em ambas, a estratégia dominante foi de minimizar os efeitos dos ataques frontais do inimigo e enfraquecer a impetuosidade adversária. Foi adotado um enfoque operacional compreendendo o óbvio desvio de um engajamento frontal com o inimigo, e a seleção apropriada do ponto de declínio do poder ofensivo inimigo, como sendo o momento ideal para o início do contraataque pelas forças principais, até então resguardadas. O método operacional utilizado, obviamente, obedeceu aos mandamentos da REGRA COLATERAL-PRINCIPAL. REGRA DA PROPORÇÃO ÁUREA e da Caso os dois exemplos apresentados não sejam entendidos como uma mera coincidência ou um fenômeno isolado, estaremos, então, percebendo o brilho da luz que representa a regra da PROPORÇÃO ÁUREA, iluminando uma grande parte da História da Guerra. E esta condição tornou-se, talvez, mais evidente no período da guerra moderna. Durante a Segunda Guerra Mundial toda a operação alemã de ataque à França foi baseada na essência das duas regras que discutimos. Em 1937-1938 Manstein era o primeiro Subchefe do Estado-Maior do Exército Alemão. Em decorrência de conflitos internos do Alto Comando e assumiu o comando da 18ª Divisão. Em 1939, o Alto Comando Alemão publicou um plano operacional no tocante à frente ocidental denominado Plano de Operações “Amarelo”. Tal plano indicava a intenção de realizar ataques frontais a serem executados por forças poderosas no flanco direito de modo a derrotar as forças franco-britânicas que se supunha estarem concentradas na Bélgica, enquanto que usando forças de menor poder para cobrir as demais frentes. Obviamente este plano era uma versão modificada do plano Schliffen de 1914. Manstein, então Chefe do Estado-Maior do Grupo de Exército “A” formulou o seu próprio plano de operações para aquele Grupo de Exército. Submeteu, repetidamente, tal plano ao Alto Comando quer sob a forma de um memorando, ou, como a minuta de um Plano de Operações. Sua proposição, todavia, foi rejeitada seguidamente pelo Alto Comando. Desgostoso do proceder de Manstein o Alto Comando o transferiu para as funções de Comandante do 38º Exército. Manstein conseguiu transmitir a Hitler suas idéias usando da oportunidade que teve em um encontro pessoal com o líder nazista. Hitler, que era um leigo no tocante a assuntos militares possuía, todavia, uma elevada capacidade de percepção. O ponto mais importante daquele plano pessoal, chamado Plano Manstein por Liddell Hart, depois da guerra, era o de desencadear um ataque de surpresa através das florestas das Ardenas, executando ataques concentrados no flanco esquerdo e utilizando as forças blindadas também concentradas. Ver Manstein “Lost Victory”, The Academy of Military Science of the Chinese People’s Liberation Army, 1980. Guderian era o Comandante do 19º Exército Blindado e o melhor agente implementador do Plano Manstein; “Guderian-Blitzkrieg Heroes”, Zhanshi Press, 1981. Decisões que foram tomadas, como por exemplo: a não subordinação dos tanques à infantaria, transformando-os na força principal de ataque; a utilização da “blitzkrieg” com principal doutrina operacional, descartando as práticas da Primeira Guerra Mundial; e a escolha das florestas das Ardenas como o eixo principal do ataque das forças alemães; surpreenderam, não só o inimigo, como também aos velhos generais do alto comando alemão, e poderiam ser consideradas não-ortodoxas, dotadas de uma nítida característica de desvio para o elemento colateral. Foi esse desvio que deu origem a uma transformação radical de pensamento de todos os militares alemães, e fez também, com que o sonho de Schlieffen de “lançar-se sobre Canal da Mancha” se transformasse em um pesadelo para os ingleses em Dunquerque. Antes daquele tempo, quem poderia ter imaginado que a documentação deste planejamento milagroso seria produzida por dois oficiais relativamente modernos0 na hierarquia militar alemã, Manstein e Guderian? Durante a mesma Guerra Mundial ocorreu também o ataque japonês a Pearl Harbor, o qual se assemelha à operação de ataque à França. Uma operação que demonstra uma tendência colateral-principal muito significativa. Depois que assumiu o Comando da Esquadra Conjunta, Yamamoto rejeitou a idéia do Estado-Maior da Marinha Japonesa quanto a, inicialmente, atacar as Filipinas. Segundo ele seria necessário realizar inicialmente um ataque de surpresa à Esquadra norte-americana no Pacífico de modo a imobilizá-la. No dia 7 de Dezembro de 1941, sob o comando do Almirante Nagumo, seis navios-aeródromos com 423 aviões embarcados atacaram Pearl Harbor de acordo com o plano de Yamamoto, afundando o encouraçado “Arizona” e três outros encouraçados, e destruindo 188 aviões causando assim grandes perdas para a Marinha norte-americana. Ver Liddell Hart, “História da Segunda Guerra Mundial”, pp 276-335. Isoroko Yamamoto utilizou navios-aeródromos da mesma maneira que Guderian utilizou seus tanques. Conceitualmente, Yamamoto ainda considerava os encouraçados como o elemento principal para as batalhas navais decisivas do futuro, mas, prudentemente e de maneira correta escolheu os navios-aeródromos, com os seus aviões embarcados, como as armas principais para as operações contra a Marinha norte-americana. O mais interessante é que, para atacar os Estados Unidos, ele não idealizou ataques frontais ao longo do litoral norteamericano no Pacífico, considerando, de forma prioritária, o raio de ação de sua força combinada para o ataque, isto é, o ponto ideal para que pudesse aplicar o seu golpe. Deste modo ele selecionou como o alvo para o ataque as ilhas havaianas, que além de terem importância crítica para o controle de todo o Oceano Pacífico, não eram consideradas, pelos norte-americanos, como o alvo inicial japonês0. Os 0 [N.T.] Conotação usada no âmbito militar brasileiro para designar oficiais com pouca antiguidade, quer na sua patente (no caso de recém promovido), quer dentro do quadro de Oficiais a que pertencem, em função de sua patente ser relativamente inferior. norte-americanos se recusavam a admitir esta hipótese, até mesmo depois de terem recebido informações dos serviços de inteligência de que isso ocorreria. Deve ser enfatizado que este entusiasta das batalhas navais decisivas optou por realizar um ataque furtivo a Pearl Harbor, como o primeiro engajamento que determinaria os rumos futuros da guerra, ao invés de ser através do método por ele sempre sonhado, uma batalha naval. Conseqüentemente, ele obteve uma vitória por meio de surpresa tática, atingindo alvos colaterais. Em decorrência das análises que fizemos, deve ser entendido PROPORÇÃO ÁUREA e A REGRA COLATERAL-PRINCIPAL que a REGRA DA não devem ser empregadas em seu sentido literal, pelo contrário, é necessário compreender a sua essência. Um campo de batalha em constante evolução não irá proporcionar a qualquer líder ou comandante militar tempo suficiente e informações adequadas, para que ele possa, cuidadosamente, determinar o ponto que corresponda à PROPORÇÃO ÁUREA, ou o grau de desvio no sentido do elemento colateral. Até mesmo os elementos básicos das duas regras, ou seja, o valor 0,618 e o “desvio para o elemento colateral” não são constantes em termos matemáticos. Ao contrário, elas representam as milhares formas de manifestações do Deus da vitória, ao longo das diversas mudanças no curso das guerras, nos campos de batalha e nas situações de conflito. Algumas vezes tais manifestações se apresentam quando da seleção de meios. Por exemplo, durante a Guerra do Golfo, Schwartzkopf utilizou o bombardeio aéreo como o elemento predominante, empregando o Exército e a Marinha como elementos de apoio, forças estas que sempre constituíram os elementos principais de combate. Outras vezes essas manifestações ocorrem na seleção das táticas. Dönitz, por exemplo, alterou o modelo de guerra naval de “navio – contra – navio” para o modelo “submarino – contra - navios mercantes”; esta nova tática denominada “matilha de lobos” representou para a Grã-Bretanha uma ameaça muito maior que a representada pelas batalhas navais. Algumas vezes, aquele Deus da vitória manifesta-se na seleção de armamentos. Por exemplo, a artilharia de Napoleão, os tanques de Guderian, os navios-aeródromos de Yamamoto, e as munições de precisão usadas na Operação “Gold Coast”, todas 0 [N.T.] Esta afirmação do autor é discutível, visto que a marinha norte-americana, desde a década de 30, estudava no Naval War College, as hipóteses de ações ofensivas por parte do Japão, através de jogos de guerra. E o cenário de Pearl Harbor, já fora diversas vezes treinado. constituíram armas principais que tiveram a capacidade de alterar o equilíbrio da guerra. Algumas vezes tais manifestações ocorrem na seleção do ponto de ataque. Por exemplo, durante a batalha naval de Trafalgar, Nelson inteligentemente, escolheu a retaguarda em vez da vanguarda da linha de batalha franco-espanhola como o ponto do ataque principal, conseguindo, com isso, uma vitória naval decisiva, que determinaria o nascimento de um Império Marítimo. Antes da batalha naval de Trafalgar, Nelson apresentou aos seus Comandantes subordinados um novo dispositivo para o engajamento com o inimigo. Em vez de a tradicional formatura em coluna ele dividiu os seus navios em dois grupos. Um grupo interceptaria o centro da esquadra inimiga com um ângulo de aproximação de 90º deste modo separando a retaguarda inimiga de seu centro. Em seguida, os navios concentrados atacariam a retaguarda inimiga. O outro grupo de navios deveria obter a separação do centro inimigo de sua vanguarda e também desfecharia um ataque concentrado ao centro do inimigo. Seria muito tarde para que os navios da vanguarda inimiga tentassem inverter seu rumo de modo a vir apoiar o centro, ou, a retaguarda. A batalha de Trafalgar transcorreu quase exatamente conforme previu Nelson. Embora ele tivesse falecido devido a um ferimento recebido, a Marinha Inglesa obteve uma vitória total. Ver o livro de Ding Chaobi “The History of Modern Naval Wars of the World”, Haiyang Press, 1944 pp 143155. Algumas vezes tais manifestações ocorrem na escolha das oportunidades para o engajamento. Por exemplo, na 4ª Guerra do Oriente Médio, Sadat escolheu o dia 6 de outubro, durante o mês do Ramadam, , como o dia “D” para as forças egípcias atravessarem o Canal de Suez e, assim, desfechou o ataque no período da tarde, com a luz solar vindo de oeste para o leste, incidindo diretamente nas pupilas dos olhos israelenses e, assim, destruindo o mito da invencibilidade israelense0. Algumas vezes elas se configuram nos posicionamentos desiguais das forças. Por exemplo, antes da Primeira Guerra Mundial, o Alto Comando Alemão elaborou o Plano Schlieffen para a invasão da França. De acordo com esse Plano, haveria um audacioso movimento compreendendo o emprego de 53 das 72 divisões alemães no flanco direito, como a força de ataque principal. As 19 divisões restantes seriam posicionadas ao longo da extensa frente de combate, no centro e flanco esquerdo. Deste modo, um exercício de jogo de guerra transformou-se no mais famoso Plano de Guerra que jamais foi implementado. Manifestam-se, algumas vezes, no uso de estratagemas. Por exemplo, no ano de 260 AC, havia uma rivalidade entre Chi e Chao. O Rei Zhaoxiang de Chi não tinha urgência em travar uma batalha decisiva contra o seu inimigo, e adotou o conselho de Fan Sei de atacar inicialmente Shangdang em Han, de modo a privar Chao do 0 Ver “The Fourth Middle East War”, Shangai Translation Press, 1975; “Middle East Wars”, Shangai Translation Press, 1979. seu apoio. Em seguida, Zhauxiang fingiu estar disposto a negociar uma paz e, em decorrência, os Lordes deixaram de apoiar Chao. Ele também usou o estratagema de disseminar discórdia e, como resultado, o Rei de Chao dispensou o General Lian Po e nomeou para o seu lugar o estrategista acadêmico Chao Kuo como Comandante. Conseqüentemente, a força de Chao foi derrotada em Chang Ping. A vitória de Chi e a derrota de apropriadamente, atribuídas Chao nesta batalha deveriam ser, mais ao estratagema de Fan Sei do que ao poderio das forças de Chi0. Deveríamos enfocar de forma especial, bem como analisar, também, um outro fenômeno, qual seja, que um número cada vez maior de países está com uma visão além da ambiência militar, quando tratando de temas importantes como os de natureza política, econômica e da segurança nacional. Estes países têm empregado outros meios para suplementar, fortalecer e, até mesmo, substituir os meios militares, de modo a conquistar objetivos que não poderiam ser alcançados, apenas, pelo poder militar. Esta tem sido a ocorrência mais importante, em que o elemento colateral modifica o elemento principal no tocante à guerra, no contexto daquilo que é uma concepção de guerra. Ao mesmo tempo, isto também indica que nas guerras futuras haverá a ocorrência cada vez maior da formação da estrutura colateral-principal, constituída pelos meios militares em conjunto com outros meios. Todos os exemplos acima apresentados demonstraram a característica do “desvio no sentido do elemento colateral”. Semelhantemente à REGRA COLATERAL-PRINCIPAl REGRA DA PROPORÇÃO ÁUREA, a é contrária às formas de posicionamentos paralelos, equilíbrio, simetria, abrangência e uniformidade. Ao invés disso, ela propõe o uso da espada para provocar o corte no ponto certo. Somente pelo não engajamento em colisões frontais será possível que sua espada produza o corte desejado, sem que ela seja avariada. Esta é a gramática básica da vitória, na interpretação de um antigo texto sobre a guerra. Se nós empregamos a REGRA DA PROPORÇÃO ÁUREA na ambiência das artes, como uma regra de estética, porque não poderíamos também considerar que a REGRA PRINCIPAL COLATERAL- – através de sua projeção na ambiência militar – como sendo a regra da vitória? 0 Ver the “The History of War in China”, Military Translation Press, vol 2, p.197. O ELEMENTO DOMINANTE E O CONJUNTO TODO — A ESSÊNCIA DA ESTRUTURA COLATERAL-PRINCIPAL Entre os vários elementos que integram alguma coisa, deverá existir um determinado elemento que assume um papel proeminente ou predominante entre todos os demais. Se o relacionamento entre esse elemento e os demais for harmonioso e perfeito estará de acordo com a fórmula 0,618:1 em determinadas áreas e, também, de acordo com a REGRA COLATERAL-PRINCIPAL, visto que, neste caso, “todos os elementos” compõem o corpo principal, isto é, o elemento principal; e o “elemento específico” atua como elemento orientador, e portanto é o elemento orientador. Uma vez que um determinado objeto adquire um propósito significativo, o elemento colateral e o elemento principal formarão uma relação “dominante subordinado”. Em uma luta entre dois touros, estes representam o elemento principal enquanto que os chifres são o elemento colateral. Quando duas espadas se defrontam as espadas representam o elemento principal, enquanto que os fios das lâminas representam o elemento colateral. Torna-se bastante evidente qual é o elemento predominante e qual o elemento subordinado. Quando a finalidade do objeto é alterada, irá surgir um novo elemento dominante, substituindo o anterior, que irá estabelecer um novo relacionamento colateral- principal com os demais elementos existentes. O entendimento do relacionamento entre o elemento dominante e os demais elementos que compõem um objeto é equivalente ao entendimento da regra da PROPORÇÃO ÁUREA, e da REGRA COLATERAL-PRINCIPAL. Tendo como base esse entendimento nós poderemos rapidamente estabelecer os cinco relacionamentos mais importantes dentre todos os relacionamentos complexos da guerra: as armas dominantes e todas as demais armas; os meios dominantes e todos os demais meios; a força dominante e todas as demais forças; a diretriz dominante e todas as demais diretrizes; e a ambiência dominante e todas as demais ambiências. O relacionamento entre os cinco elementos dominantes e todos os demais elementos das cinco áreas mencionadas representa, basicamente, o relacionamento colateral-principal que existe de maneira generalizada nas guerras. Consideremos, novamente, o exemplo da Guerra do “Tempestade no Deserto”, as armas dominantes utilizadas Golfo. Na operação pelas forças aliadas foram os aviões “invisíveis”, os mísseis de cruzeiro, e as bombas de precisão. Os demais armamentos tiveram um papel suplementar. Os meios dominantes foram representados por 38 dias consecutivos de bombardeios aéreos com os outros meios desempenhando um papel suplementar. A força dominante foi o componente aéreo, com as demais forças tendo a missão de apoio. A diretriz dominante foi atingir os efetivos da Guarda Republicana por meio de ataques concentrados, ficando os demais objetivos do campo de batalha como alvos secundários. A ambiência dominante foi a militar com todas as demais ambiências proporcionando um amplo apoio através das sanções econômicas, do isolamento diplomático e das ações ofensivas na mídia. Não obstante, não é nosso objetivo a mera explicação desses relacionamentos. Para aqueles engajados em uma guerra o que é mais importante não é a explicação de tais relacionamentos e, sim, o seu entendimento e aplicação. Como sabemos, os recursos para a guerra são limitados para todos os países. Até mesmo uma nação tão poderosa como os Estados Unidos tem que raciocinar continuamente em termos de custo-benefício (o princípio do “mínimo consumo de energia”), e de como lutar em guerras de uma forma mais glamourosa, obtendo um maior número de resultados esplêndidos. É imprescindível, portanto, que qualquer nação destine e aplique os seus recursos para a guerra de maneira lógica e estratégica. Isto exige a adoção de um método correto, isto é, de como aplicar conscientemente a REGRA COLATERAL-PRINCIPAL. Na realidade, muitos países, de uma forma não intencional, já aplicam tais regras. Depois do colapso União Soviética a capacidade militar russa entrou em um continuado declínio; não apenas ela perdeu sua posição como superpotência no confronto com os Estados Unidos como, também, no momento atual, tem dificuldades para atender as demandas impostas pela segurança nacional. Sob tais circunstâncias, o alto comando russo adaptou sua estratégia futura a um cronograma adequado, a despeito de se encontrar em uma posição delicada, considerando suas armas nucleares táticas e até mesmo estratégicas como as armas dominantes, que seriam empregadas, prioritariamente, no caso de uma guerra que fosse desfechada contra a Rússia. Tendo como base essa decisão, foi também definida, de maneira geral, a proporcionalidade entre armas convencionais e nucleares. Ao contrário do procedimento da Rússia, e na condição de única superpotência no mundo, os Estados Unidos estabeleceram como os seus novos objetivos estratégicos para as suas forças amadas: um “Exército com superioridade completa”;0 uma “Marinha projetando-se do mar para terra” e “uma Força Aérea com a capacidade de engajar-se em âmbito global”. “Engajamento global” representou a estratégia para o desenvolvimento da Força Aérea do século 20I proposta por essa Força no final de 1997 visando substituir a doutrina estratégica de “força global com alcance global” que havia sido instituída para o trato dos problemas pós-Guerra Fria. Nessa doutrina eram enfatizadas as seis áreas básicas da capacitação da Força Aérea: superioridade aérea e espacial; ataque global; rápida mobilidade global; ataque de precisão; superioridade quanto à informação; e apoio operacional flexível. Ver o documento “Global Engagement and the Conception of the U.S. Air Force in the 21st Century”. Neste contexto, equipamentos digitais, novos tipos de navios para o assalto anfíbio e aeronaves invisíveis com grande raio de ação foram selecionados como sendo representativos de uma nova geração de armamentos, os quais parecem ser os sucessores dos atuais “azes” como, por exemplo, os tanques da série M-1, os navios-aeródromos, os aviões de caça F-16, na posição de armas dominantes do arsenal norte-americano. Conforme pode ser percebido dos ajustes estratégicos feitos pelos Estados Unidos e pela Rússia quanto às suas respectivas armas dominantes, parece que a prática de selecionar armas dominantes tendo por base a magnitude do seu poder destrutivo tornou-se obsoleto. No tocante à seleção das armas dominantes, o seu poder destrutivo é apenas um dos itens do desempenho dessas armas. Mais importante que o desempenho técnica é a consideração básica quanto a: propósito da guerra, objetivos operacionais e ambiência da segurança. Assim, as armas dominantes deverão ser aquelas que atendem a estes três propósitos mencionados. Mas, além disso, é necessário que elas sejam organicamente combinadas com outras armas, de modo a constituírem o elemento dominante de um completo sistema de armas. Na ambiência da moderna tecnologia, as armas dominantes não são mais armas isoladas, e sim, “sistemas de armas” que por sua vez, são componentes de sistemas mais amplos. O conceito do “Sistema dos Sistemas” representou o resultado de uma pesquisa conjunta dirigida pelo Almirante Owens, ex Vice Chefe do Estado Maior Conjunto e de seu assessor mais graduado, Black De acordo com Owens a revolução tecnológica militar contemporânea não se trata de uma revolução relacionada a navios de guerra, aeronaves, tanques e outras plataformas de armas. O que ocorreu, na realidade, foi o aparecimento de outros elementos como, por exemplo, os sistemas de sensoriamento, os sistemas de comunicações e os sistemas de armas orientadas com precisão. O aparecimento desses sistemas irá gerar uma revolução fundamental na estrutura das forças e nos modelos operativos das Forças Armadas. Talvez no futuro não irá mais existir a divisão em Exército, Marinha e Força Aérea e em vês disso uma “força móvel de ataque”, uma “força de sensoriamento”, uma “força de apoio ágil”. Ver a entrevista de Owens com Chen Bojiang, Guofang Daxue Xuebao, Xiandai Junshi e Shijie Junshi. 0 A “superioridade completa” era o objetivo estratégico proposto pelo Exército dos Estados Unidos no seu documento “Conception of the Army in 2010” O surgimento de uma grande variedade de novas e sofisticadas tecnologias, e o continuado reajuste dos objetivos da guerra proporcionaram um espaço suficiente para a seleção das armas dominantes, assim como para a combinação dessas armas dominantes com outros tipos de armamentos e, ao mesmo tempo, transformaram o relacionamento dominante, subordinado entre armas dominantes 0 e outros tipos de armas em algo ainda mais complexo . Os mesmos fatores estão, também, influenciando a utilização dos meios de guerra. Está se tornando obsoleto considerar, automaticamente, que a ação militar representa o meio dominante e que os outros meios representariam apenas meios de apoio para a guerra. Talvez, num futuro não muito distante, os meios militares representem apenas um entre todos os meios disponíveis para guerras como a de enfrentar organizações terroristas da categoria de bin Laden. Talvez, o meio mais eficaz para atingir bin Laden de maneira letal não seja o míssil de cruzeiro e, sim, uma guerra de estrangulamento financeiro, executada através da internet. Na medida em que os meios se tornaram mais complexos surgiu uma conseqüência que é inédita para os militares: a civilização da guerra. Devido a isso, o problema do relacionamento entre a força dominante e as demais forças que analisamos, inclui, também, o tema do grau de participação de toda a população na guerra, somando-se ao deslocamento, alocação e emprego das forças militares em operações de combate. Para os militares profissionais, nas situações de guerra ou quase-guerra, têm se tornado um fator de importância cada vez maior para a segurança nacional, a questão relativa a quem constitui a força dominante nas guerras do futuro. Um tema que jamais foi questionado adquiriu âmbito mundial. Por exemplo, os ataques dos “bandidos da rede” às redes interativas do Departamento de Defesa dos Estados Unidos e do Ministério da Defesa da Índia constituem uma evidência desse fato. Seja numa ação de guerra, numa ação militar de não-combate ou numa ação de guerra não-militar, em qualquer ação de natureza bélica, surge o tema da precisão 0 Não aceitamos o ponto de vista otimista dos defensores da tecnologia no tocante a revolução militar. Não acreditamos que a tecnologia possa penetrar no nevoeiro da “incerteza” da guerra uma vês que essa incerteza não decorre de obstáculos físicos, ou, geográficos mas sim da mente dos indivíduos. na seleção da natureza principal da operação e do ponto de ataque principal, isto é, determinar uma orientação principal levando em conta todos os fatores da guerra em vista, os campos de batalha e as frentes de combate. Este é o problema mais difícil, até mesmo para aqueles Comandantes que dispõem de armamentos adequados, uma multiplicidade de meios e um suficiente potencial humano. No entanto, Alexandre, Aníbal, Nelson e Nimitz, assim como Sun Tzu e Sun Pin, da China antiga, todos foram eficientes em termos de selecionar as principais direções de ataque, que surpreenderam completamente as forças inimigas. Liddell Hart também observou esse fato. Ele recomendou o método de seleção da linha de menor resistência e a direção da ação menos esperada pelo inimigo como sendo a “estratégia de aproximação indireta”. Na medida em que a ambiência da guerra se ampliou, passando a incorporar as ambiências política, econômica, diplomática, cultural e psicológica, além das ambiências terrestre, marítima, aérea, espacial e eletrônica, a interação entre todos esses fatores tornou difícil para a expressão militar atuar, automaticamente, como a ambiência dominante em qualquer guerra. A guerra será praticada em ambiências não-militares. Esta noção parece estranha e difícil de ser aceita. Todavia, cada vez mais, surgem indícios de que essa é a tendência. De fato, mesmo nos tempos antigos, a guerra nem sempre esteve contida em uma única ambiência. A batalha diplomática de Lian Xiangru quanto “ao retorno do jade sem qualquer dano para Chao” e a guerra virtual conduzida por Mo Zi e Gongshu Ban representam exemplos clássicos de como vencer ou evitar uma guerra através ações não-militares. Este método para a solução do problema da guerra, por meio de ações em múltiplas ambiências, poderia nos proporcionar no momento atual algumas idéias. A era do emprego inteligente da tecnologia altamente sofisticada proporcionou um campo muito mais amplo para agir com sabedoria e utilizar meios, do que era disponível aos povos antigos. Assim, o sonho de obter vitórias militares em ambiência não-militares, e vencer as guerras usando meios não-militares, pode se transformar em uma realidade. Se quisermos ser os vitoriosos nas guerras do futuro deveremos estar plenamente capacitados intelectualmente para este cenário, isto é, estarmos preparados para travar uma guerra que, afetando todas as áreas de atividades dos países envolvidos no conflito, poderá ser conduzida em uma ambiência em que as ações militares não predominem. Ainda não se sabe quais as armas, quais os meios e que pessoal serão utilizados em tais guerras, e em que direção e ambiência essas guerras serão travadas. Sabemos apenas de uma coisa: independentemente do tipo de guerra, a vitória sempre irá pertencer àquele partido que saiba empregar, corretamente, a REGRA COLATERAL-PRINCIPAL, de modo a perceber o relacionamento entre o “elemento dominante” e o “conjunto”. UMA REGRA E NÃO UMA FORMULA PREESTABELECIDA É extremamente difícil entender e explicar a Guerra. A guerra necessita do apoio da tecnologia, mas a tecnologia não substitui a moral e os estratagemas; a guerra exige uma inspiração artística, mas rejeita o romantismo e o sentimentalismo; exige uma precisão matemática, mas essa precisão pode algumas vezes torná-la rígida e sem espontaneidade; ela necessita de uma abstração filosófica, mas o raciocínio puro não permite que sejam aproveitadas as pequenas oportunidades que aparecem em alguns hiatos nos entrechoques de aço e fogo. Não existe uma fórmula para vencer uma guerra. Ninguém ousa proclamar, de forma arrogante, ter descoberto o método perfeito no âmbito da guerra. Ninguém foi capaz, até agora, de utilizar um único método para vencer todas as guerras. Isto, porém, não significa que não existam regras no tocante à guerra. Alguns poucos tiveram os seus nomes incluídos no rol dos generais sempre vitoriosos, e isto ocorreu porque eles descobriram e aplicaram as regras da vitória. Esses nomes representam um testemunho da existência das regras da vitória ainda que nenhum deles tenha revelado tal segredo. Por um longo período de tempo — tão longo quanto a história da guerra — considerava-se que tais regras assemelhavam-se a lampejos que ocorriam nos cérebros de comandantes privilegiados, porém poucos perceberam que tais lampejos estão ocultos nos combates sangrentos, caracterizados pelo entrechoque das espadas e pela fumaça da pólvora dos canhões. Na realidade, qualquer regra assemelha-se a um “papel de janela”0. O que é importante é saber se temos a capacidade de fazer um furo nessa folha de papel. A REGRA COLATERAL-PRINCIPAL pode ser considerada como sendo essa folha de papel. Ele é, ao mesmo tempo, simples e complexa e também estável e variável. Como já ocorreu 0 [N.T.] Um tipo de papel que substituía o vidro na China tradicional. muitas vezes, uma pessoa com a ponta de uma unha pode, ocasionalmente e de forma não intencional, fazer um furo na folha de papel, e então, os portais da vitória abrir-se-ão imediatamente para ela. É um processo tão simples que pode ser expresso por um conjunto de dígitos ou, uma regra da gramática, e ao mesmo tempo, tão complicado, que pode ser impossível encontrarmos uma resposta, ainda que sejamos peritos em matemática e gramática. Assemelha-se à fumaça e é difícil de ser percebida. É tão constante como uma sombra e acompanha cada alvorecer de vitória. Em função disso, consideramos que a REGRA COLATERAL-PRINCIPAL seja um preceito e não um teorema, e sob este enfoque, realçamos o caráter de relatividade de um preceito, ou seja, sua aplicação não deve ser feita de forma mecânica, exigindo, antes, uma avaliação precisa. A relatividade não representa uma verdade absoluta, e devido a isso admite o contraditório0. Todavia, através do estudo da história da guerra, concluímos que a REGRA PRINCIPAL COLATERAL- constitui-se numa regra para a vitória, mas como usá-la corretamente será um assunto a ser determinado, individualmente, por cada operador, em face das circunstâncias específicas. Uma vez que o fenômeno da contradição na guerra sempre provocou perplexidade em todos aqueles que se empenham na busca pela vitória — aqueles que desrespeitam as leis, sem a menor dúvida irão fracassar, no entanto, aqueles que seguem estritamente os procedimentos já consagrados provavelmente, também não serão os vitoriosos. “Seis multiplicado por seis é igual a 36”. Existem estratagemas intrínsecos aos números, assim como existem números nos estratagemas. O “yin” e o “yang” estão em coordenação. As oportunidades existem, não é possível fabricar oportunidades. O processo de fabricação não irá funcionar”. A obra Os “36 Estratagemas” constitui uma revelação de como as coisas funcionam. 0 A regra colateral-principal não representa uma espécie de teorema que se assemelhe a afirmação do tipo “todas as pessoas morrem” ou “todos os cisnes são brancos”. Em vês disso, trata-se de uma regra que orienta para a vitória na guerra. [N.T.] Entre o final da Dinastia Ming e o início da Dinastia Ch’ing, um anônimo estudioso decidiu compilar 36 estratagemas de guerra em um pequeno livro intitulado — A Arte Secreta da Guerra – Os 36 Estratagemas. Sua versão inicial difundiu-se e sobreviveu na forma de manuscritos. Foi editado pela primeira vez em 1941 pela Editora “Xinghua Printing House”. Desde então, diversas edições foram lançadas, tanto em chinês, quanto nos outros idiomas da Ásia Oriental. A obra “36 Estratagemas” está incluída entre os clássicos militares da China antiga, por sua ênfase no despistamento como uma arte militar; a maioria dos demais clássicos militares aborda táticas para campos de batalha. Diferentemente de outras obras do gênero, o livro “Os 36 Estratagemas” enfoca o emprego de despistamento, de subterfúgios ou táticas secretas na consecução de objetivos militares, e desta abordagem específica resulta o título da obra: A Arte Secreta da Guerra – Os 36 Estratagemas. Ou seja, não importa quantos exemplos de guerra possamos encontrar, para demonstrar que as causas das vitórias consideradas estavam relacionadas à proporção de 0,618, o próximo indivíduo que planeje uma guerra, uma batalha, ou, um engajamento, rigorosamente de acordo com a regra da PROPORÇÃO ÁUREA, [N.T.] Dong Shi era uma mulher feia; ouviu falarem que Xi Shi era tão linda quanto uma fada. Num determinado dia, Dong Shi foi verificar por si mesma esta beleza. No entanto, Xi Shi estava doente naquele dia, com problemas estomacais. Ela contraia as suas sobrancelhas e estava com uma expressão de dor, mas mesmo assim, ela era surpreendentemente linda. Dong Shi, erradamente, deduziu que a beleza de Xi Shi era derivada da expressão de dor em seu rosto. E na intenção de tornar-se bela, Dong Shi passou a contrair suas sobrancelhas imitando Xi Shi, e é claro, ficou ainda mais feia. Nas famosas batalhas de Rossbach e de Leuthen que fazem parte da história européia os partidos atacantes usaram em ambos os eventos a “formação de ataque em diagonal” conforme preconizado por Alexandre. Os resultados, todavia, foram totalmente diferentes. [N.T.] A batalha de Rossbach ocorreu durante a Guerra dos 7 Anos, em 5/11/1757. U exército combinado franco austríaco que avançava sobre Leipzig, defrontou-se com Frederico o Grande bloqueando sua passagem na localidade de Rossbach. Frederico simulou um movimento de retirada, e o exército combinado lançou-se na perseguição, perdendo sua formação de batalha. Então, Frederico lançou um ataque de cavalaria sobre a infantaria austríaca, espalhando-a, seguido de uma carga geral da infantaria que parecia estar em retirada, e que acabou por dizimar o que havia sobrado da força franco-austríaca, que teve 3000 baixas entre mortos e feridos, 5000 homens feitos prisioneiros, tendo sido força a recuar para a Bavária. Ver: http://www.rickard.karoo.net/articles/battles_rossbach.html. A batalha de Leuthen ocorreu durante a Guerra dos 7 Anos, em 5/12/1757. Esta batalha desenvolveu-se nas proximidades de Breslau tendo sido travada entre Frederico o Grande da Prússia, e os Austríacos liderados pelo conde Leopold von Daun. Frederico iniciou a batalha com uma finta contra a ala direita das forças austríacas. Então, os austríacos deslocaram reforços de seu flanco esquerdo, posição esta que foi, efetivamente, onde Frederico atacou com a sua força principal, destruindo completamente o flanco esquerdo austríaco. O flanco direito austríaco ameaçou mudar o balanço da batalha, tendo destruído o fraco efetivo prussiano com que se deparava, mas Frederico havia deixado um efetivo de cavalaria em reserva, o que conseguiu restabelecer a situação. Assim os austríacos foram obrigados a recuar até o Rio Oder, cujas pontes não foram suficientes para assimilar o o fluxo da tropa, deixando assim 21.000 homens para serem capturados pelos prussianos. Do efetivo inicial de 90.000 homens, somente 37.000 retornaram à Áustria. Os prussianos perderam somente 1440 homens. Na batalha de Rossbach, os comandantes do exército franco-austríaco seguiram, fielmente, os ensinamentos da História da Guerra. Eles movimentaram suas tropas e estabeleceram formações de batalha, diretamente sob as vistas de Frederico o Grande. O exército franco-austríaco tentou usar uma formação em diagonal para atacar o flanco esquerdo do exército prussiano. O resultado foi de que, graças aos ajustamentos feitos pelo exército prussiano no tempo certo, os franco-austríacos foram completamente derrotados. Um mês mais tarde, em Leuthen, Frederico novamente defrontou-se com uma força austríaca que era três vezes superior a sua em números. Mas desta vez ele teve um desempenho brilhante. Ele também utilizou a formação de ataque diagonal, mas conseguiu aniquilar o exército austríaco. É de despertar questionamento, que um mesmo método operacional tenha produzido resultado tão diferentes.0 Estes eventos nos ensinam que não existe um método de guerra que possa ser sempre considerado como o método correto. Existem apenas as regras que sempre serão corretas. Os eventos também nos mostram que a mera existência de regras, e sua aplicação indiscriminada, nem sempre irá garantir vitórias; o segredo da vitória reside na aplicação correta das regras. De mesma forma quanto à REGRA COLATERAL-PRINCIPAL, a ênfase a ser atribuída refere-se ao emprego do elemento colateral para modificar o elemento principal. Isto, porém, não significa que o desvio no sentido do elemento colateral irá sempre produzir uma vitória. O desvio no sentido do elemento colateral significa principalmente um desvio em termos de linha de pensamento e aspectos essenciais, em vês de um desvio no tocante ao modelo. Por exemplo, na guerra na atualidade não exige que o ponto de ataque deva estar sempre relacionado à proporção 0,618 para que estejamos em concordância com as regras da vitória. É possível, que na atualidade, seja necessária uma completa transformação nas regras da vitória. Assim sendo, o elemento “principal” passaria a ser o elemento “colateral”. Esta é a natureza da guerra enquanto arte. Esta característica de ser uma arte0 não pode ser substituída pela matemática, filosofia, 0 Ver Fuluer, “Uma História Militar do Mundo Ocidental”, volume 2, p.201; ver “A Concise History of War”, p.86 0 [N.T.] Na opinião do tradutor a arte sempre se caracterizou como uma manifestação de criação do ser humano, e que portanto não seria correto classificar a guerra como uma arte, pois a guerra sempre foi um instrumento usado pelo ser ou outras áreas da ciência e da tecnologia. Assim, acreditamos uma revolução na tecnológica militar não pode substituir a revolução na arte dos assuntos militares. Não rejeitamos e nem omitimos o significado da análise matemática, especialmente numa época do emprego amplo dos computadores, inclusive em nossa nação onde existe uma tradição no sentido de propor a incerteza e uma aversão quanto a precisão. Em seu livro “Several Methods of Quantitative Analysis of International Politics and Military Issues”, Li Hongzhi menciona o emprego do “Método Beiyete” por Nigula Shiweite, para analisar a Guerra do Vietnã, o conflito sino-soviético e as guerras Árabe-Israelenses. Em 1993, Li Hongzhi e outros analistas apresentaram previsões acuradas quanto à guerra Bósnia – Herzegovina, usando esse método. Ver Guoji Zhengzhi e outros na publicação da Military Science Press. Deve-se observasr, também, que a TEORIA COLATERAL-PRINCIPAL é semelhante à teoria das ações “ortodoxas-heterodoxas” proposta pelos antigos estrategistas chineses, mas ainda assim elas não são inteiramente idênticas. Os antigos estrategistas propunham o emprego das ações ortodoxas e das ações heterodoxas em momentos diferentes. De acordo com Sun Zi: “no combate é necessário utilizar ações ortodoxas para adquirir força e utilizar ações heterodoxas para alcançar a vitória. O combate implica em apenas ações ortodoxas e heterodoxas. Existe uma troca interminável no emprego das ações ortodoxas e heterodoxas”. A citação de Sun Zi é do tema “Momentum” no livro de Sun Tzu “Art of War”. O princípio do “heterodoxo” representa um conceito importante utilizado pelos antigos estrategistas militares no tocante aos métodos da guerra. A execução imprevista de manobras que não são esperadas pelo inimigo representa o método heterodoxo. Enfrentar o inimigo no campo de batalha de maneira clara representa o método ortodoxo. O Imperador T’ai Tsung de Tang estava perfeitamente familiarizado com o “princípio ortodoxo-heterodoxo”. O engajamento de Weiqing é um bom exemplo quanto a esse ponto. A publicação “A dialogue between Emperor T’ai Tsung of Tang and Li Weigong” registrou as opiniões de Li Shimin e Li Jong quanto ao “princípio ortodoxo-heterodoxo”. Diferentemente do princípio ortodoxo-heterodoxo, na TEORIA COLATERAL-PRINCIPAL o elemento colateral e o elemento principal não representam dois métodos que possam ser aplicados isoladamente, mas ambos representam uma expressão de uma lei objetiva. A principal distinção que poderia apresentar quanto ao ortodoxo-heterodoxo e o principal colateral é a seguinte: é certo que na História da Guerra os exemplos das vitórias com o emprego de ações heterodoxas foram excepcionais, devido a sua excelente execução, mas nem todas as vitórias foram conseguidas através a aplicação de ações heterodoxas. Existem também muitos exemplos de vitórias que humano para impor morte e destruição. foram conseguidas por ações ortodoxas. No caso da REGRA COLATERAL-PRINCIPAL a consideração é diferente. Através uma analise correta, é possível perceber os vestígios das regras da vitória em cada exemplo de vitória tenha ela sido obtida quer através ações ortodoxas, ou, quer ações heterodoxas; isto significa que a vitória foi obtida como uma conseqüência da aplicação DA REGRA COLATERAL-PRINCIPAL usando o modelo ortodoxo, ou, heterodoxo. A despeito de nossos melhores esforços para formular a REGRA COLATERAL-PRINCIPAL ou as regras de da vitória, só nos é possível prosseguir em termos da aplicação da regra de uma maneira imprecisa. Ser impreciso, algumas vezes, representa o melhor processo para que se obtenha clareza. Julgamos, de uma maneira geral, que a imprecisão tem a possibilidade de ser entendida. Este é o procedimento oriental de raciocínio; mas, de uma maneira inusitada, ele defrontou-se com a sabedoria ocidental da PROPORÇÃO ÁUREA do número 0,618. Como resultado, a lógica, o raciocínio e a precisão dos Ocidentais e o instinto, o entendimento e a obscuridade Oriental criaram uma base de raciocínio gerando então as regras da vitória que discutimos neste Capitulo. Elas refulgem com brilho, possuem quer o mistério do Oriente como a inflexibilidade do Ocidente, como se as cimalhas do Palácio de Taihe fossem instaladas em uma coluna do Templo de Paternon, de forma majestosa e vibrante. CAP. 7 - DEZ MIL MÉTODOS COMBINADOS EM UM ÚNICO COMBINAÇÕES QUE TRANSCENDEM LIMITES “As guerras atuais irão afetar o preço da gasolina nos postos de abastecimento, o preço dos alimentos nos supermercados e o valor das ações nas bolsas de valores. Elas também irão afetar o equilíbrio ecológico e irão intrometer-se em todas as nossas residências por intermédio da tela da televisão”. Alvin Toffler O entendimento das regras para a conquista da vitória (o tema do capítulo anterior) certamente não significa que já equacionamos a sua obtenção, do mesmo modo que o conhecimento das técnicas da corrida de longas distâncias não significa que seremos os vencedores de uma maratona. O entendimento das regras através das quais a vitória é alcançada pode aprofundar o conhecimento humano quanto às leis da guerra, e aperfeiçoar os níveis de aplicação das artes militares. No campo de batalha, no entanto, a vitória não será daquele que tiver um melhor conhecimento das regras da vitória e, sim, daquele que realmente entender a essência das regras da vitória. Em uma possível guerra do futuro, as regras da vitória irão estabelecer severas exigências para o vencedor. Elas não irão somente, como no passado, exigir que sejam perfeitamente bem conhecidas as engenhosas maneiras para disputar-se a vitória no campo de batalha; elas irão, também, impor exigências, em relação às quais a maioria dos combatentes estará inadequadamente preparada para atender ou, então, terá a impressão de estar envolta na escuridão. A guerra será travada e vencida em uma outra guerra, além do campo de batalha; a luta pela vitória irá ocorrer em um campo de batalha além do campo de batalha. No contexto deste conceito especifico os militares atuais como Powell, Schwartzkopf e até mesmo ou, Schalikashvili, não podem ser considerados como “modernos”. Ao contrário, eles parecem mais um grupo de militares tradicionais. Isto ocorre porque já surgiu uma lacuna entre os militares tradicionais e aqueles que denominamos militares modernos. Embora esta lacuna possa ser eliminada, isto exige uma transição em termos de uma reavaliação militar abrangente. Para muitos militares profissionais, a exigência desta transição representa algo que virtualmente eles não podem pretender alcançar, mesmo que empenhem o restante de suas vidas nesta tarefa. Mas a realidade é muito simples. O que é necessário é criar um Machiavel militar completo. A consecução de objetivos, através de processos honestos ou desonestos, representou o mais importante legado espiritual provido por aquele pensador político italiano da era da Renascença. Bertrand Russell assim se manifestou quanto a Machiavel: as pessoas sempre se sentiram ofendidas por ele, e, algumas vezes ele foi na verdade chocante. Mas se as pessoas pudessem se liberar de sua hipocrisia como ele fez, então muitas delas iriam pensar como ele... (de acordo com a visão de Machiavel) se um objetivo é considerado satisfatório deveremos então selecionar os meios suficientes para atingi-lo. “No tocante aos meios isto pode ser tratado com um enfoque puramente científico, sem levar em conta se o objetivo é bom ou mau. Ver “On Monarchs”, Human Peoples´s Publishing House, 1987. Pp. 115-123. Na Idade Média tal legado representou um rompimento com o cavalheirismo romântico e a declinante tradição da nobreza. Significou a utilização de meios, alguns dos quais possivelmente lógicos, que não estabeleciam restrições, para a conquista de um objetivo, isto também se aplicando à guerra. Embora Machiavel não tenha sido a primeira fonte da “ideologia de prosseguir além dos limites” (foi precedido pelo chinês Han Feizi) na realidade ele foi o mais lúcido expoente dessa ideologia. Nascido durante o período dos Estados Guerreiros (475-221 AC) Hans Feizi foi o grande expoente da Escola de Pensamento Legalista. Tanto em seu discurso, quanto nas suas ações, ele enfatizava a conseqüência real, como por exemplo, em “o alvo ao qual as palavras e feitos se destinam são os resultados”. Não existiriam outros objetivos ou restrições. (Ver “A Comprehensive History of Chinese Thought”; Ed. Hunan People’s Publishing House; 1987; p.115-123) A existência de contornos é um pré-requisito para estabelecer a diferença entre dois objetos, e num mundo em que tudo é interdependente o significado do contorno é meramente relativo. A expressão “exceder exceder os limites” limites significa ir além do que é denominado ou entendido por — contorno. Não importa se estamos tratando de contornos físicos, espirituais ou técnicos, ou se eles recebem a denominação de “limites”, “limites definidos”, “restrições”, “fronteiras”, “regras”, “leis”, “limites máximos” ou, até mesmo “tabus”. Em termos da guerra estamos nos referindo ao que constitui a fronteira entre o campo de batalha e o que não é o campo de batalha; entre o que é uma arma e o que não é uma arma; entre um militar e o não-militar; entre o Estado e o nãoestatal, ou, supra-estatal. Possivelmente, incluirá, também, outros tipos de fronteiras tais como as tecnológicas, teóricas, psicológicas, éticas, tradicionais, costumeiras, e assim por diante. Em resumo, estamos nos referindo a todos os contornos que podem restringir a guerra a determinados limites. O verdadeiro significado do conceito de exceder limites que estamos propondo é, em primeiro lugar, transcender a ideologia. Apenas, secundariamente, esse conceito significa que ao praticar ações, devamos ultrapassar limites e fronteiras, quando necessário e possível, ou, selecionar os meios mais adequados, mesmo que incluam aqueles considerados radicais, o que não significa que devamos selecionar os meios radicais a qualquer hora ou em qualquer situação. Quando falamos de militares, nesta era tecnologicamente integrada, passam a surgir muitos aspectos que devem ser considerados, e uma abundância de recursos utilizáveis (materiais e não-materiais), de modo que não importa com quais limites ou fronteiras os militares defrontar-se-ão; sempre irão existir meios de romper essas fronteiras, e em maior número do que na ambiência que deu origem a Machiavel. Assim, entre as exigências para os militares modernos, no que se refere a transcender o seu modo de pensar, inclui-se, também, uma maior consistência de raciocínio. Mencionamos em páginas anteriores que as combinações eram coquetéis nas taças dos grandes mestres da guerra (Alexandre o Grande e os reis militares da dinastia Chu nunca ouviram falar de coquetéis, mas eles reconheciam o valor do emprego combinado de meios). Nas guerras da Antigüidade, todavia, a combinação de armas, meios, formações para a batalha e estratagemas, era efetuada apenas dentro dos limites da ambiência militar. Este entendimento limitado do conceito das combinações, logicamente, é inadequado nos dias atuais. Aquele que pretende vencer as guerras atuais ou aquelas do futuro, quer dizer, ter a vitória firmemente segura em suas mãos, deverá “combinar” todos os recursos de guerra à sua disposição e utilizá-los como meios para a condução da guerra. E até mesmo isso não será suficiente. Ele terá de combinar aqueles recursos de acordo com as exigências das regras da vitória. E ainda assim, tal condição não será suficiente, porquanto as regras da vitória não podem garantir que a vitória irá “cair cair como uma fruta madura na cesta de colheita”. colheita Ainda será necessária uma mão hábil para colhê-la da árvore. Esta mão hábil representa o conceito de “ir ir além dos limites”, limites ultrapassando todos os contornos e fronteiras, em consonância com as regras da vitória quando travando uma guerra com o auxílio das combinações. Assim, obtivemos um conceito completo, um método de guerra totalmente novo e que se intitula “guerra guerra de combinação modificada para exceder os limites” GUERRA EM SUPRACOMBINAÇÃO”0. limites ou “G COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS COMBINAÇÕES DE ORGANIZAÇÕES NACIONAIS, INTERNACIONAIS E NÃOESTATAIS. Parece que nos defrontamos com um outro paradoxo: em termos teóricos, “ir ir além dos limites” deveria significar a inexistência de restrições de qualquer tipo, ou li seja, ultrapassar tudo. Mas na verdade, a ultrapassagem ilimitada de limites é impossível de ser conseguida. Qualquer ultrapassagem de limites, somente poderá ser efetivada atendendo a determinadas restrições, ou seja, “ir ir além dos limites” limites não significa “nenhum limite” e sim a ampliação daquilo que era “limitado”. Em outras palavras, isto significa ir além das fronteiras intrínsecas de uma determinada ambiência ou, orientação, e assim combinar oportunidades e meios criando um maior número de ambiências e orientações, visando alcançar o objetivo pretendido, e esta é a nossa definição de “GUERRA DE COMBINAÇÃO MODIFICADA PARA EXCEDER OS LIMITES” 0 ou “G GUERRA EM SUPRACOMBINAÇÃO”. [N.T.] O termo “supracombinação”, inexistente no vernáculo, foi introduzido pelo tradutor de modo a, sem perder a conotação dada pelo autor, permitir, na tradução, o emprego de termos com uma semântica mais compreensível. Constituindo-se num método de guerra em que “ir ir além dos limites” limites representa sua característica principal, o seu princípio básico consiste na reunião e combinação do maior número de meios para solucionar um problema, constituindo uma ambiência mais ampla que a do problema em si. Por exemplo, quando a segurança nacional é ameaçada, a resposta não consiste em, simplesmente, selecionar meios para enfrentar militarmente a outra nação, mas em vez disso, trata-se de dissipar a crise através o emprego de “C COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS”. Constatamos através da história que o Estado-nação é o mais alto patamar da idéia de segurança. Para o povo chinês, o Estado-nação até mesmo se iguala ao conceito magno de “tudo o que existe sob o firmamento”. Atualmente, o significado da palavra “país” em termos de nacionalidade ou de território, nada mais é do que um grande ou pequeno elo na sociedade humana da “aldeia global”. Os países modernos são cada vez mais afetados pelas organizações regionais ou globais tais como a Comunidade Européia ([sic] agora União Européia), a ASEAN, OPEP, APEC, o FMI, o Banco Mundial, a OMC e a maior de todas elas, as Nações Unidas. Além dessas, existe um grande número de organizações multinacionais e nãoestatais de todos os modelos e tamanhos, tais como as corporações multinacionais, as associações de comércio, as organizações para a paz e preservação do meio ambiente, o Comitê Olímpico Internacional, as organizações religiosas, as organizações terroristas, pequenos grupos de hackers, e assim por diante, projetando-se da direita e da esquerda, sobre a singradura seguida por um país. Estas organizações multinacionais, não-estatais e supranacionais representam um ativo e emergente sistema de poder global. Em seu livro “Powershift: Knowledge, Wealth, and Violence at the at the Edge of the 21st Century” Alvin Toffler dedica uma pequena seção à discussão dos “novos tipos de organizações de âmbito mundial:”, citando: “Nós estamos vendo agora uma mudança de poder extremamente significativa, especificamente, de países isolados ou blocos de países, para lutadores de nível ‘mundial’”. Ao referir-se a lutadores de nível mundial ele quer dizer corporações não-estatais, grandes ou pequenas, desde o âmbito da Comunidade Européia até às corporações multinacionais. De acordo com estatísticas constantes do Relatório de Investimentos das Nações Unidas de 1997, o mundo, então, tinha 44.000 corporações filiadas a multinacionais, e 280.000 companhias subsidiárias ou subordinadas a grandes empresas. Estas multinacionais controlam um terço da produção mundial, têm sob seu poder 70% do volume mundial de investimento externo direto, dois terços do volume de comércio mundial, e mais de 70% das patentes e outras transferências de tecnologia. (Ver “Guangming Daily, 27/12/1998, p.3, artigo assinado por Li Dalun, intitulado “The Duality of Economic Globalization). Talvez não tenha sido percebido por muitas pessoas, mas os fatores acima descritos estão nos levando a um período de transformações em que as diretrizes políticas das grandes potências estão sendo suplantadas pelas diretrizes políticas das organizações supranacionais. A principal característica deste período é a de que ele representa um período de transição; muitas indicações desta característica começam a surgir, assim como muitos processos estão se iniciando. O poder nacional constitui um elemento capital, e o poder supranacional, ou, multinacional e não-estatal também constitui outro elemento capital, e a definição final, de qual deles irá desempenhar o papel principal no cenário internacional, ainda está para ser estabelecida. De um lado, as grandes potências ainda desempenham um papel proeminente no cenário internacional. Em particular, a superpotência onipresente, os Estados Unidos, e as grandes potências econômicas como o Japão, a Alemanha, a China (como potência emergente), e a Rússia (como potência em declínio), todos continuam tentando exercer sua própria influência na ambiência mundial. Por outro lado, existem as grandes potências com visão prospectiva que já começaram, claramente, a utilizar o poder dos atores supranacionais, multinacionais e não-estatais, reforçando e expandindo sua própria influência. Elas perceberam que não podem conseguir os seus objetivos dependendo apenas do seu próprio poder. O exemplo mais recente, como também o mais típico, é da integração da Comunidade Européia (através a implantação de uma moeda única — o Euro). Este vigoroso processo continua em andamento, estando em recuperação após um período conturbado. Ainda falta muito para que este processo seja concluído. Sua atual orientação e perspectivas de longo prazo não são suficientemente claras, por constituírem fatores que decorrem do próprio curso dos acontecimentos0. Ainda assim, são evidentes alguns sinais que indicam uma tendência; isto é, uma cortina está lentamente cerrando-se sobre uma era em que a decisão quanto à 0 [N.T.] O livro original foi escrito no ano de 1999. vitória ou derrota decorria de competições de poder entre Estados. E outra cortina está lentamente sendo descerrada, apresentando uma era em que os problemas serão resolvidos e os objetivos serão alcançados, através o emprego de meios supranacionais em uma ambiência maior do que a área de um Estado-nação. De acordo com o ponto de vista de Brzezinski irão surgir no século 21 grupos de nações como, por exemplo, um grupo de norte-americanos, um grupo de europeus, um grupo de leste asiático, um grupo do sul da Ásia, um grupo islâmico e um grupo da Europa Oriental. A disputa entre esses grupos representará a ambiência do conflito do futuro. (Ver a tradução de “Out of Control: Global Turmoil on the Eve of the Twenty First Century”, China Social Sciences Publishing House, p. 221). A utilidade das Nações Unidas irá crescer continuadamente, uma tendência que já é evidente. Ver “The United Nations Toward the Last Century”, “World Knowledge Publishing House”. Assim sendo, nós consideramos que as “C COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS” fazem parte da relação daqueles fatores essenciais da guerra que excede os limites. Em um mundo em que há uma íntima interação de influências políticas, econômicas, ideológicas, técnicas e culturais com redes interativas, clones, Hollywood, sexo explícito na televisão e na Internet, e o campeonato mundial de futebol, e tudo isso facilmente ultrapassando os marcos dos limites territoriais, é muito difícil conceber a existência de esperanças no provimento de segurança e na busca pela consecução de interesses dentro de um contexto meramente nacional. Somente um louco, como Saddam Hussein, poderia tentar satisfazer suas desvairadas ambições pela ocupação ilegal de outro território. Os fatos demonstram, claramente, que agir dessa maneira, no final do século XX, significa estar nitidamente desatualizado e certamente provocará uma derrota como resultado. Os Estados Unidos, também procurando garantir a sua segurança nacional, e a consecução dos seus interesses nacionais, atuando como uma grande potência madura, demonstrando ser mais sagaz do que o Iraque. Desde o momento em que os norte-americanos passaram a ter uma presença significativa no cenário mundial, eles vêm alcançando os seus objetivos através da força ou fraude, e os benefícios que eles obtiveram, à custa de outras nações, foram muito maiores do que aqueles que poderiam ser obtidos pelo Iraque na invasão do Kuwait. As razões desse acerto na política externa norte-americana não podem ser explicadas simplesmente pelo adágio “o poder estabelece a verdade”, assim como elas não representam apenas um mero problema de descumprimento de “vetos” ou normas internacionais. Isto ocorre porque, em todas as suas intervenções externas, os Estados Unidos procuram sempre, conseguir tantos adeptos quanto possível, de maneira a não representar uma liderança sem apoio, e agindo isoladamente. Excetuando-se os casos de pequenas nações como Granada e o Panamá, onde os norte-americanos empreenderam uma ação direta, estritamente militar, na maioria dos casos os Estados Unidos buscam a consecução de seus interesses utilizando meios supranacionais. No trato do problema com o Iraque, o método utilizado pelos norte-americanos representou uma típica “C COMBINAÇÃO SUPRANACIONAL”. Durante todo o desenrolar dos eventos, os norte-americanos agiram em conluio com outras nações, manipulando vários grupos políticos e obtendo o apoio de, praticamente, todos os membros nas Nações Unidas. Os Estados Unidos conseguiram, inclusive, que a organização mais importante a nível mundial emitisse uma resolução, autorizando o uso de força militar, sob um pretexto criado pelos Estados Unidos e, com isso, conseguiu reunir mais de trinta nações em uma força combinada que atacou o Iraque. Depois da guerra, novamente os Estados Unidos foram bem sucedidos ao organizarem um embargo econômico contra o Iraque, e que se manteve nos oito anos seguintes, como também utilizou as inspeções de armamentos de modo a manter uma contínua pressão, política e militar, sobre o Iraque. Isto deixou o Iraque em um isolamento político de longa duração e com terríveis dificuldades econômicas. Desde a Guerra do Golfo, esta tendência no sentido da aplicação de “C COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS” na guerra ou em outros tipos de conflito, tem sido cada vez mais óbvia. Quanto mais recente é o evento, mais proeminente se torna essa característica, e com maior freqüência passa a ser o recurso usado por um número crescente de nações. Nos últimos dez anos esta tendência passou a constituir o pano de fundo para o trato de drásticas turbulências sociais no âmbito internacional. A integração econômica global, a internacionalização das políticas internas, a interatividade em rede dos recursos de informações, o crescente ritmo de surgimento de novas tecnologias, a dissimulação dos conflitos culturais e a crescente ameaça das organizações não-estatais, tudo isso gera para a sociedade humana, numa mesma proporção, conveniências e problemas. Esta é a razão pela qual as grandes potências e, até mesmo, algumas médias e pequenas nações, agem em conjunto sem necessidade de uma coordenação prévia, e visualizam as “C COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS” como um meio para resolver os seus problemas0 . É apenas por esse motivo, que as ameaças ás nações modernas decorrem, cada vez mais, de poderes também supranacionais, e não especificamente de uma ou duas nações, não havendo nenhum meio melhor para enfrentar tais ameaças, do que o emprego das “C COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS”. De fato, não existe nada de novo sob o sol, e as “C COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS” não constituem um território recém descoberto. Desde o Período Primavera-Outono (722 - 476 AC), dos Estados Guerreiros (403 - 201 AC) e da Guerra de Peloponeso (431 - 404 AC) as “C COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS” já representavam o mais antigo e clássico dos métodos empregados pelos antigos estrategistas tanto no Oriente, quanto no Ocidente0. Tal idéia não perdeu o seu fascínio nos dias atuais. A “C COMBINAÇÃO SUPRANACIONAL” de Schwartzkopf na Guerra do Golfo pode ser considerada como uma versão moderna da clássica fórmula — “aliança + forças combinadas”. “Se formos evidenciar a lacuna entre gerações, desde a Antigüidade até os dias de hoje, e identificar as diferenças existentes entre essas gerações, constataremos, então, que para os antigos, a idéia era apenas a combinação entre Estados, e na atualidade, elas são verticais, horizontais, supranacionais, transnacionais e não-estatais”0. Os povos envolvidos nos três períodos históricos mencionados não poderiam ter imaginado que o princípio por eles aplicado iria permanecer inalterado até os dias 0 Por exemplo, um fato que não pode ser ignorado é que organizações como a ASEAN, a ONU e outras, transformaram-se ou estão se transformando em organizações supranacionais para a resolução de problemas regionais. 0 O eixo “norte-sul” (seis Estados reunidos em oposição à Q’in) e o eixo “leste-oeste” (Q’in integrado ou uma aliança de alguns Estados para atacar um outro Estado) que surgiram no período dos Estados Guerreiros representam exemplos de alianças entre nações. (Ver “Warring States Strategy Explained), China Press, 1990, p.4. 0 Nos dias atuais as combinações supranacionais não ocorrem apenas entre nações. Elas também incluem combinações entre nações e organizações transnacionais e até mesmo organizações não-estatais. Na crise financeira do Sudeste Asiático pudemos observar uma cooperação tática entre países, o FMI e fundos agressivos. atuais, como também, não poderiam imaginar as mudanças revolucionárias que ocorreram, desde os meios técnicos até a sua aplicação prática. O novo modelo “Estado + supranacional + transnacional + não-estatal” irá provocar alterações fundamentais nas características e no resultado final da guerra, modificando até mesmo a natureza essencialmente militar da guerra, que tem representado uma verdade inquestionável, desde os tempos antigos. Este método para a resolução de conflitos ou a realização da guerra, que incorpora não apenas o Poder Nacional, como também as combinações de poderes supranacionais, transnacionais e não-estatais é o que entendemos, de um modo geral, como sendo “C COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS”. Através de uma análise de alguns exemplos anteriores, bem sucedidos, podemos prever que, daqui por diante, as “C COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS” irão representar a arma mais poderosa para a consecução dos objetivos de Segurança Nacional e garantia dos interesses nacionais, com uma abrangência maior que a da própria nação . Em seu novo livro, “The Grand Chessboard: American Primacy and its Geostrategic Imperatives” Brzezinski cria uma nova prescrição para a segurança mundial: o estabelecimento de um sistema de segurança trans-eurasiano. O centro do sistema é composto pelos Estados Unidos, Europa, China, Japão, Rússia, Índia e outras nações. Não importa se a prescrição de Brzezinski é válida ou não. Pelo menos ela indica claramente uma linha de pensamento idêntica à nossa, quer seja solucionar os problemas de Segurança Nacional em uma ambiência mais ampla. Segundo Carl Doe “As organizações internacionais freqüentemente tem representado uma ótima solução através da qual é possível orientar a raça humana além da ambiência étnica nacional”; e que a principal tarefa da integração é “manter a paz”. (Ver “Analysis of International Relations”, Worlds Knowledge Publishing House, p. 332) Na qualidade de única superpotência no mundo, os Estados Unidos é quem melhor utiliza as “C COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS” como uma arma. Os Estados Unidos nunca perdem qualquer oportunidade de estar presente nas organizações internacionais que possam afetar seus próprios interesses. Dito de outra maneira, os Estados Unidos, de forma consistente, consideram as ações de todas as organizações internacionais como intimamente relacionadas aos interesses norteamericanos. Não importa se a origem da organização internacional é européia, americana, asiática, de outras regiões ou até mesmo global, os Estados Unidos sempre se esforça em participar e manipular essas organizações. O relatório do Departamento de Defesa norte-americano de 1996 expõe esse fato de modo evidente: “para proteger e alcançar os interesses dos Estados Unidos, o governo norte-americano deve ter a capacidade de influir nas diretrizes e ações de outras nações. Isto obriga que os Estados Unidos mantenha o seu envolvimento no exterior, especialmente naquelas regiões em que os interesses mais importantes dos Estados Unidos são ameaçados”0. Por exemplo, em relação à criação da Organização de Cooperação Econômica Pacífico-Asiática, a idéia inicial de seu idealizador, o Primeiro Ministro da Austrália Hawke, previa a inclusão, unicamente, dos países da Ásia, da Austrália e da Nova Zelândia. No entanto, tal idéia defrontou-se imediatamente, com uma forte oposição do Presidente Bush e, posteriormente, a organização ampliou-se, para incluir os Estados Unidos e o Canadá. Ao mesmo tempo, de modo a obstaculizar o impulso da cooperação econômica Pacífico-Asiática, os Estados Unidos não poupou esforços quanto a instigar algumas nações asiáticas em assinar acordos independentes com a Área de Livre Comércio Norte-americana0. Não apenas os Estados Unidos forçaram a sua admissão, como também conseguiu atrasar a entrada de outras nações na Organização. Poder-se-ía dizer que os norteamericanos usaram uma tática de dupla combinação. O que se percebe, como sendo um segredo rigorosamente protegido, é a atitude e os métodos norte-americanos no trato da crise financeira asiática. Quando surgiu o problema, os Estados Unidos, imediatamente, opuseram-se a uma proposta japonesa no sentido da criação de um fundo monetário asiático. Em vês disso, os norte-americanos propuseram a implementação de um plano de recuperação, patrocinado e vinculado ao Fundo Monetário Internacional, do qual a nação norteamericana é um sócio majoritário. Esta proposta implicaria em que os países asiáticos seriam forçados a aceitar as diretrizes para liberação de recursos, que fossem estipuladas pelo governo norte-americano. Por exemplo, quando o FMI liberou um empréstimo de 57 bilhões de dólares para a Coréia do Sul, isto ocorreu sob a condição de que a Coréia do Sul abrisse totalmente o seu mercado e proporcionasse ao capital norte-americano a oportunidade de aquisição de empresas sul-coreanas a preços irracionalmente reduzidos. 0 0 Relatório Anual do Secretário de Defesa; ano fiscal de 1996. [N.T.] Não estaríamos evidenciando a mesma linha de ação com relação ao eixo EUAMercosul-ALCA-Nações Sul-americanas? Uma exigência como essa representa um assalto a mão armada. Proporciona aos países desenvolvidos, tendo os Estados Unidos como líder, a oportunidade de acesso irrestrito aos mercados de outra nação, ou entrar e esvaziar, completamente, setores inteiros do mercado interno de outras nações. Existe muito pouca diferença deste processo, em relação a um processo disfarçado de ocupação econômica 0. Se nós interligarmos os fatos relacionados a seguir, quais sejam: - os tipos de métodos utilizados pelos norte-americanos; - os ataques furtivos praticados por indivíduos como Soros, contra as finanças das nações asiáticas; - o aumento nos últimos dez anos dos fundos de investimentos norte-americanos que evoluíram de 810 bilhões para 5 trilhões e continuam crescendo num ritmo de 30 bilhões por mês0; - as firmas Moody´s Standard & Poor’s e Morgan Stanley aumentando os índices de risco do Japão, Hong Kong e Malásia nos momentos mais críticos e delicados; - a preocupação de Allan Greenspan0 quanto a se à reação do governo de Hong Kong contra os “aventureiros dos Fundos”, iriam, ou não, alterar as regras do jogo; - a exceção às regras promovida pelo Banco Central norte-americano no sentido de auxiliar a corporação “Long-Term Capital Management” (LCTM), que havia perdido recursos em operações especulativas; - as constantes negativas oferecidas pelos norte-americanos a qualquer solicitação durante todo o alvoroço e excitamento na Ásia; e 0 Em um ensaio intitulado “A Discussion of the New Asian Resistance to Foreigners” na edição de agosto de 1998 de uma publicação japonesa intitulada “Bungei Shunju”, Shintaro Ishihara exprime o seu ponto de vista de que as várias ações dos Estados Unidos deixam clara a sua intenção estratégica de um ataque contra a Ásia. Embora as opiniões deste “Mr. No” (ele foi co-autor do livro nacionalista “The Japan that can Say No”) sejam de algum modo extremadas elas não representam uma opinião isolada. 0 Ver “Reference News”, 29 setembro 1998, p. 11, que reproduz artigo da Revista norteamericana “Fortune”. 0 [N.T.] Presidente do Banco Central norte-americano - a gradativa redução de referências à expressão “o século da Ásia”; constataremos o quão inteligentemente tudo está interligado, sem que apareçam as costuras0. — Supondo que tudo isso foi completamente estruturado para atacar um alvo sempre ambicionado, não seria esta uma ação combinada bem sucedida utilizando organizações supranacionais + organizações transnacionais + organizações nãoestatais? Ainda que não existam evidências formais para provar que o governo dos Estados Unidos e o seu Banco Central tenham, pacientemente, projetado e utilizado esta arma extremamente poderosa e dissimulada, analisando os indícios, poderemos dizer que, no mínimo, determinadas ações tiveram a sua aprovação prévia e uma concordância tácita. A questão principal com relação aos temas que desejamos discutir aqui, certamente, não é se os norte-americanos utilizaram, ou não, de forma intencional tal arma. Mas, sim, que como uma superarma, ela é eficaz? A resposta é afirmativa. SUPRACOMBINAÇÃO DE AMBIÊNCIAS0 COMBINAÇÕES ALÉM DA AMBIÊNCIA DO CAMPO DE BATALHA “Ambiência” é um conceito derivado do conceito de espaço e utilizado para delinear um campo de ação das atividades humanas. Assim entendido, a ambiência da guerra representa uma delimitação daquilo que é abrangido pelo significado da guerra. Da mesma forma como no contexto das “C COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS” a noção de “S SUPRACOMBINAÇÃO DE AMBIÊNCIAS” que estamos propondo também representa uma simplificação. Para sermos corretos, essas duas expressões deveriam ser seguidas 0 O número de analistas que tem a mesma opinião de Shintaro Inshihara certamente não é pequeno. O analista econômico Konstantin Sorochin apresentou uma opinião semelhante em um artigo intitulado “War Role Does the CIS Play in the Asian Financial Crisis”, publicado em 16 de julho em uma publicação russa. Ver “Reference News”, 15/08/1998. 0 [N.T.] Não adotamos a tradução literal de “Supra-Domain” como constante na obra, por considerar que a expressão decorrente — “Supra-Ambiência” — não teria uma boa conotação semântica, em razão do que, utilizamos a versão “Supracombinação de Ambiências”. das palavras “de de ações de guerra”, guerra caso pretendamos transmitir, de forma completa, o propósito destes conceitos que estamos estruturando e empregando. Isto se faz necessário para deixar bem claro que as visões quanto às “Supra Combinações ou Combinações Supra...”, inspiradas pelo pensamento de “ir ir além dos limites”, limites estão restritas ao escopo da guerra e das ações a ela relacionadas. O conceito de “S SUPRACOMBINAÇÃO DE AMBIÊNCIAS” situa-se entre o conceito previamente abordado da “C COMBINAÇÃO SUPRANACIONAL”, e o conceito da “S SUPRACOMBINAÇÃO DE MEIOS”, que será apresentado a seguir. Da forma como está posicionado em nossa análise, o conceito da “S SUPRACOMBINAÇÃO DE AMBIÊNCIAS” representa um elo indispensável no processo desbravador do conceito de “ir ir além dos limites”. limites Da mesma forma que um avião tem que quebrar a barreira do som, antes de poder desenvolver velocidades supersônicas, aqueles que estão engajados na prática da guerra devem “quebrar” os confinamentos das ambiências, de modo a alcançar uma situação de liberdade de pensamento no que tange à guerra. Ultrapassar as fronteiras da ideologia representa um pré-requisito para romper com as fronteiras do modo de agir. Sem o rompimento das fronteiras ideológicas, ainda que possa ocorrer uma ruptura quanto ao modo de agir, com base numa intuição, será difícil obter-se, no final, a consciência de que esse representou um procedimento correto. Por exemplo, a doutrina de “operações operações em dimensão total” total do Exército dos Estados Unidos e a concepção de “S SUPRACOMBINAÇÃO DE AMBIÊNCIAS”, que propomos, são diferentes quanto aos seus enfoques, mas igualmente adequadas no que tange à sua eficácia (a expressão “em dimensão total” significa em todas as ambiências). Ocorre que o conceito de “operações operações em dimensão total” total do Exército dos Estados Unidos parece decorrer de um eventual lampejo de raciocínio de um grupo de militares inteligentes, ao invés de uma linha de pensamento desenvolvida de forma sistemática, tendo como base um processo de raciocínio, e que, por sua característica, representasse uma completa ruptura. Assim, como as concepções que não são idealizadas de forma completa e profunda certamente irão enfrentar todos os tipos de obstáculos, esse lampejo ideológico que poderia ter dado início a uma revolução de assuntos militares, rápida e lamentavelmente se extinguiu. Nos dias atuais, o entendimento da “dimensão total” do Exército dos Estados Unidos, isto é, “em todas as dimensões” é um conceito apenas aplicável à ambiência militar. Por exemplo, o princípio da “proteção em dimensão total” na publicação “Joint Vision 2010” significa basicamente o fortalecimento da proteção das informações militares norte-americanas. Na opinião do General John Wilson, do Comando do Material do Exército dos Estados Unidos, o “Exército do Futuro”, capaz de deslocar-se para qualquer ponto do globo terrestre é uma “força de dimensão total”. Pode-se ver, assim, que o raciocínio do Exército norte-americano quanto ao conceito de “dimensão total” não leva em conta sua essência, mas apenas o seu significado literal. (Ver “Joint Forces Quaterly”, Ed. Verão,1996). (“Joint Forces Quaterly” é uma publicação da Universidade de Defesa Nacional. O tema é abordado em um artigo intitulado “Joint Vision 2010: America´s MilitaryPreparing for Tomorrow”). A expansão da ambiência da guerra é o resultado necessário da contínua expansão do campo de atividades humanas e de sua recíproca fusão. O entendimento da humanidade quanto a esse fenômeno sempre esteve em atraso em relação ao próprio fenômeno em si. Ainda que, desde a época de Kao Gui (um herói do período Primavera-Outono) até os dias atuais com Collins (John M. Collins autor do livro “Grand Strategy: Principles and Practices”), tenham surgido indivíduos de visão ampla, possuidores de uma elevada percepção, e que, em diversos graus, demonstraram os relacionamentos mutuamente restritivos entre as várias ambiências da guerra; até agora a maioria dos indivíduos envolvidos com a guerra consideravam que todas as ambiências não-militares, independentemente de sua origem, seriam apenas acessórios para atender às alterações das necessidades militares. A estreiteza do campo de visão desses indivíduos, e o seu modo de pensar restringiram o desenvolvimento do campo de batalha e as mudanças na estratégia e na tática a somente uma ambiência. Desde Kutuzov incendiando Moscou (antes de abandoná-la em 1812), e destruindo impiedosamente mais da metade do país, numa estratégia de fortalecimento da defesa e devastando os campos como um processo para o enfrentamento de Napoleão; aos maciços bombardeios de Dresden e à destruição nuclear de Hiroshima e Nagasaki, que provocaram incontáveis perdas na população civil, com o objetivo de obter uma vitória militar completa; até as proposições estratégicas da “retaliação maciça” e da “destruição mutuamente assegurada”, nenhuma dessas ações fugiu ao modelo resultante daquela estreiteza de campo de visão. Este é o momento para corrigir esta tendência errada. A significativa fusão de tecnologias está fazendo com que as ambiências da política, da economia, militar, cultural, diplomática e religiosa se sobreponham. Os pontos de ligação das várias ambiências estão muito claros. Acrescente-se a isso a influência da grande onda de conscientização dos direitos humanos e da moralidade da guerra. Tudo isso está tornando cada vez mais obsoleta a idéia de restringir a guerra à ambiência militar e usar o número de perdas de vidas humanas como um índice da intensidade da guerra. A guerra está afastando-se das fronteiras representadas por massacres sanguinários e mostrando uma tendência no sentido de poucas perdas ou, se possível, nenhuma perda, mas ainda assim, com uma alta intensidade. Isto é o que vem a ser a guerra cibernética, a guerra financeira, a guerra comercial, e várias outras formas de guerra inteiramente novas, que constituem novas áreas que se abrem na ambiência da guerra. Neste sentido não existe, atualmente, qualquer ambiência que não possa ser utilizada pela guerra, assim como, praticamente não existe uma ambiência que não disponha de uma configuração para emprego ofensivo na guerra. Em 19 de outubro de 1987, navios da Marinha dos Estados Unidos atacaram uma plataforma de exploração de petróleo iraniana no Golfo Pérsico. A notícia desse evento chegou à Bolsa de Nova Iorque e, imediatamente, causou a maior queda no mercado de ações em toda a história da “Wall Street”. Esse evento, que passou a ser conhecido como a “Segunda-feira Negra”, provocou uma perda, em valor nominal, de 560 bilhões de dólares na bolsa de ações norte-americana. O montante desta perda é equivalente ao da perda completa do Produto Nacional Bruto de um país como a França. No passar do tempo, as ações militares, seguidamente desencadearam desastres no mercado de ações que, por via de conseqüência, produziram pânicos econômicos. Em 1995-1996, a China Continental anunciou que iria realizar testes de lançamento de mísseis no estreito de Taiwan, assim como outros exercícios militares. Na medida em que os rastros das trajetórias dos mísseis apareceram na atmosfera, a bolsa de Taiwan, imediatamente, entrou em queda como uma avalanche provocada por um estrondo. Ainda que os dois eventos citados não constituam exemplos das “S SUPRACOMBINAÇÕES DE AMBIÊNCIAS” de que estamos falando, no entanto, eles enquadram-se na categoria de ações estúpidas, como a de jogar uma pedra para esmagar o próprio pé. Não obstante, as conclusões inusitadas desses eventos possibilitam colocar o “trem” do nosso raciocínio em movimento: Se alguém, intencionalmente, utilizar duas ou mais ambiências mutuamente distintas, e combiná-las produzindo um tipo de tática que possa ser aplicada, não teríamos um melhor resultado? Sob o ponto de vista do raciocínio “além além dos limites”, SUPRACOMBINAÇÃO DE AMBIÊNCIAS” limites a “S significa combinar os campos de batalha. Cada ambiência, como, por exemplo, a ambiência militar, pode constituir a principal ambiência da guerra do futuro. Porém, um dos objetivos da “S SUPRACOMBINAÇÃO DE AMBIÊNCIAS” é analisar e selecionar qual ambiência será o campo de batalha principal, ambiência esta que será a mais favorável para a consecução dos objetivos da guerra. Considerando-se a experiência prática do conflito entre Estados Unidos e Iraque é possível constatar que a ação militar de 42 dias da “Tempestade no Deserto” foi seguida por um período ininterrupto de oito anos de pressão militar + bloqueio econômico + inspeções de armamentos, o que constitui um exemplo de como os Estados Unidos usou as “C COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS” para atacar o Iraque em novos campos de batalha. Sem levar em consideração os gigantescos danos não-militares causados ao Iraque pelo bloqueio econômico, a ação do Comitê Especial das Nações Unidas para Inspeções de Armamentos, dirigido por Butler, localizando e desmantelando um grande número de armas letais, durante vários anos, o que representou um ataque ao poder militar iraquiano, que excedeu, em muito, o resultado dos bombardeios durante a Guerra do Golfo. Tais fatos demonstram, claramente, que a guerra não é mais uma atividade confinada, apenas, à esfera militar, e que o curso de qualquer guerra pode ser alterado ou o seu resultado decidido, por fatores políticos, econômicos, diplomáticos, culturais, tecnológicos ou quaisquer outros fatores não militares. Diante da grande influência exercida pelos conflitos militares e não-militares em todas as regiões do mundo — somente pelo rompimento dos diversos tipos de fronteiras existentes nos modelos de nossa linha de pensamento, tomando as diversas ambiências que estejam afetadas pela guerra como se fossem cartas de um baralho, e habilmente as embaralharmos com mãos experientes; e assim, utilizar a estratégia e a tática de “ir ir além dos limites” limites na combinação de todos recursos de guerra — é que teremos a possibilidade de ter confiança na obtenção da vitória. SUPRACOMBINAÇÃO DE MEIOS0 COMBINAÇÃO DE TODOS OS MEIOS DISPONÍVEIS (MILITARES E NÃO MILITARES) PARA A EXECUÇÃO DE OPERAÇÕES Numa guerra entre dois países, durante o combate e a matança entre dois exércitos, seria necessária a utilização de meios especiais para deflagrar uma guerra psicológica dirigida contra as famílias dos militares, as quais estão longe, na retaguarda? O Departamento de Defesa dos Estados Unidos intensificou o controle sobre os web sites militares na internet, visando prevenir que potencias hostis tivessem acesso a endereços familiares, Códigos de Seguridade Social, e números de cartões de crédito, e assim pudessem atacar as famílias dos membros das Forças Armadas. Quando a proteção da segurança financeira de uma nação está em jogo, seria válido usar o recurso do assassinato, para eliminar os especuladores financeiros? Uma vez que o governo inglês permite que seus agentes secretos eliminem os líderes das chamadas (por eles) nações terroristas — seria correto o caso de uma nação que considere os especuladores financeiros que pratiquem ataques destrutivos contra sua economia, como criminosos de guerra ou terroristas e, deste modo, tratá-los da mesma maneira que o governo inglês? Será que ataques “cirúrgicos” podem ser executados contra regiões que representam fontes de drogas, ou, de outros itens de contrabando, sem uma prévia declaração de guerra? Poderão ser criados recursos monetários especiais, para exercer uma maior influência sobre o governo e o legislativo de uma outra nação por meio de “lobby”? 0 [N.T.] Não adotamos a tradução literal de “Supra-Means” como constante na obra, por considerar que a expressão decorrente — “SupraMeios” — não teria uma boa conotação semântica, em razão do que utilizamos a versão “Supracombinação de Meios” Os legislativos de nações que adotam o modelo representativo de governo não podem evitar o envolvimento por parte dos grupos de “lobby”. Por exemplo, as organizações judaicas norte-americanas e a “Rifle Associaton” representam grupos de “lobby” bem conhecidos. Na realidade, esta prática pode ter sido problema muito tempo atrás na antiga China. Na guerra entre C’hu e Han, no final da dinastia Ch’in (209 – 202 AC), Liu Pang deu a Chen Ping uma enorme quantia em dinheiro, visando derrotar Hsiang Yu [N.T.] Hsiang Yu era um General poderoso e muito inteligente], fora do campo de batalha. O General rebelde Liu Pang [N.T.] Liu Pang era um líder revolucionário popular] expulsou Hsiang Yu, o qual tinha ganhado a disputa para ser o sucessor da dinastia Chin. [N.T.] Com a vitória, Liu Pang assumiu o governo com o nome imperial de Kao Tsu, tendo sido o primeiro imperador da Dinastia Han]. Poderia a compra ou obtenção do controle de ações ser usada para transformar os jornais e as cadeias de televisão de uma outra nação como instrumentos de uma guerra da mídia?0 Sem levar em conta qualquer justificativa quanto ao emprego de meios, isto é, se eles atendem ou não as regras de moralidade consensuais, um outro ponto em comum entre os questionamentos acima apresentados é que todos eles abordam a utilização de meios no âmbito das “C COMBINAÇÕES SUPRANACIONAIS” e da ”S SUPRACOMBINAÇÃO DE AMBIÊNCIAS”. Eles também constituem temas relacionados ao que estamos tratando agora, quando falamos de “S SUPRACOMBINAÇÃO significado de “S SUPRACOMBINAÇÃO DE DE MEIOS”. E se quisermos esclarecer o MEIOS”, e por que deveria existir este conceito, então deveremos, em primeiro lugar, formular a seguinte pergunta: O que são “meios”? Na realidade, isto não deve representar um questionamento. Todos sabem que um meio significa um método, ou, instrumento, por meio do qual realizamos um objetivo. Mas se parâmetros tão importantes como um país ou um exército, tão parciais como um estratagema ou uma arma, são todos, de forma imprecisa, denominadas de meios, então a questão está longe de ser simples. A relatividade do conceito de “meios” é um tema em relação ao qual tem sido despendido um considerável esforço de raciocínio. Podemos perceber esse tipo de relatividade pelo fato de que, em um determinado nível, algo pode se constituir em um meio, e em outro nível, poderá ser um objetivo. Quando nos referimos às ações supranacionais, um país é considerado um meio, mas quando falamos de ações nacionais, uma força armada ou a força armada de outra nação, representa um meio, e a nação passa a ser o objetivo. Prosseguindo neste raciocínio, os meios com dimensões diferentes são semelhantes a um conjunto de caixas chinesas que se encaixam uma dentro da outra. Um meio em um determinado nível atende a um objetivo mais elevado e, ao mesmo tempo, representa o objetivo de outros meios num nível inferior. 0 Segundo artigo publicado na imprensa, Soros controla a área política da Albânia através da imprensa legal. Deixando de lado a discussão no tocante a objetivos, a complexidade quanto ao que representam “meios” continua existindo. Nós podemos selecionar qualquer objeto, e examiná-lo sob qualquer perspectiva ou nível, e entender o que significa um meio. No que se refere à perspectiva das ambiências: a militar; a política; a diplomática; a econômica; a cultural; a religiosa; a psicológica; e da mídia; todas podem, freqüentemente, serem percebidas como meios. E as ambiências podem ainda ser subdivididas. Por exemplo, na ambiência militar, a estratégia, as táticas, a deterrência militar, as alianças militares, os exercícios militares, o controle de armas, os embargos de armas, os bloqueios, todos estes elementos constituem, sem sombra de dúvida, meios militares. E ainda que outros elementos como o auxilio econômico, as sanções comerciais, a mediação diplomática, a infiltração cultural, a propaganda da mídia, a formulação e implementação de regras internacionais, o emprego das resoluções das Nações Unidas, e assim por diante, pertençam a diferentes ambiências como as da política, da economia ou da diplomacia, os estadistas utilizam-nos, cada vez mais, como se fossem meios militares tradicionais. Sob a perspectiva dos métodos, os métodos filosóficos, os métodos científicos e os métodos artísticos, todos são usados pela raça humana para produzir benefícios em seu proveito. No entanto, eles também podem ser utilizados como meios em uma guerra. Tomemos, por exemplo, a tecnologia. A emergência e o desenvolvimento da tecnologia cibernética, da tecnologia de materiais, da tecnologia espacial, da tecnologia de bioengenharia, e todas as demais novas tecnologias, todas compõe um leque de expansão de meios. Um outro exemplo é a matemática. Os métodos matemáticos estão presentes em praticamente todo o universo de atividades e processos militares, por exemplo: na distribuição das forças, nos valores básicos para o planejamento do consumo de munição, nos cálculo das trajetórias, nos cálculos de probabilidades de perdas, na previsão de possibilidades de mortos e feridos, no cômputo de raios de ação e na capacidade de destruição dos explosivos. Além disso, os métodos filosóficos, científicos e artísticos também são úteis no apoio tanto no desenvolvimento da confiança militar, quanto na ação militar. Este é o motivo pelo qual se recorre à ideologia militar, à teoria militar, e à prática militar em termos filosóficos, científicos e artísticos. Liddell Hart (um Oficial britânico e estudioso militar) definiu o termo estratégia como sendo “a arte do emprego de meios militares para a execução de objetivos políticos”. Podemos desta forma, perceber que o conceito de “meios” abrange uma grande área, em vários níveis, com funções que se sobrepõem, e assim sendo, não é um conceito de fácil entendimento. Somente pela ampliação de nosso campo de visão e do nosso entendimento sobre “meios”, e admitindo o principio de que nada existe que não possa ser considerado um “meio”, é que poderemos evitar a situação embaraçosa de sermos confrontados com muitas dificuldades a serem solucionadas, simultaneamente, e não sabermos como proceder quanto ao emprego de “meios”. Durante a crise de 1978, quando o Irã ocupou a Embaixada dos Estados Unidos e manteve reféns, a princípio, todo o pensamento norte-americano voltou-se para o emprego impetuoso dos meios militares. Somente depois que esses meios fracassaram, as táticas foram alteradas. Congelando-se, inicialmente, as reservas monetárias do Irã no exterior, e em seguida, impondo-se um embargo de armamentos e fornecendo apoio ao Iraque na Guerra contra o Irã. A partir de então, é que surgiram as negociações diplomáticas. Quando todos esses processos foram usados em conjunto a crise chegou ao seu final0. Isto demonstra, claramente, que num mundo com uma complexidade sem precedentes, o modelo e a amplitude de aplicação dos meios está, também, num processo de contínua alteração; o uso isolado de um meio de melhor qualidade, não apresentará vantagens em relação à utilização de vários meios em combinação. Deste modo, a “S SUPRACOMBINAÇÃO DE MEIOS” está se tornando extremamente necessária, sendo lastimável que isto só seja percebido por poucas nações. E, por outro lado, são as organizações não-estatais, na busca de diversos interesses, que não estão poupando esforços na pesquisa quanto ao uso de meios em combinação. Por exemplo, a máfia russa combina o assassinato, o rapto, e os ataques de hackers contra os sistemas eletrônicos dos bancos, objetivando o seu próprio enriquecimento. Algumas organizações terroristas visam objetivos políticos através da combinação de meios, tais como: o lançamento de bombas, captura de reféns e a realização de ataques às redes interativas. 0 Ver Carl Doe, “Analysis of International Relations”; Editora “World Knowledge Publishing House”; p.272-273. (O nome do autor é uma aproximação de sua versão em chinês) Agitar a água e procurar aleatoriamente por um peixe, este é o modo de ação de indivíduos como Soros, que combinam a especulação nos mercados financeiros, nas bolsas de valores e nos mercados de fundos. Eles, também, exploram a opinião publica e criam situações favoráveis de modo a seduzir e reunir os “colossos” como a “Merill Lynch”, a “Fidelity”, e a “Morgan Stanley” e seus parceiros para uma conjugação de forças no mercado financeiro em uma escala gigantesca e, deste modo, desencadear, uma após outra, terríveis guerras financeiras. O analista Barton Bigs é funcionário da Morgan Stanley Holding Company. Ele é considerado como o melhor e mais influente estrategista de investimentos no mundo. Ele preside a empresa que tem um capital de 30 bilhões de dólares, dos quais 15% pertencem a ele. Antes das tempestades financeiras na Tailândia e Hong Kong ele e a empresa implementaram algumas medidas que possibilitaram a atuação dos especuladores. (Ver o artigo “A Preliminary Exploration of the Patters of Action of Today’s International Capitalism”; “China Social Science”, nº 6, 1998). A maioria desses meios não possui uma característica militar (ainda que, freqüentemente, tenham uma tendência para a violência); no entanto os métodos pelos quais eles são combinados certamente não deixam de servir como uma inspiração para o uso eficaz dos meios militares e não militares na guerra. Isto ocorre, porque atualmente o julgamento da eficácia de um determinado meio não representa, fundamentalmente, a determinação da categoria em que ele se enquadra ou se ele obedece ou não a algum padrão de moralidade. Em vez disso, trata-se principalmente de verificar se ele atende ou não a determinado princípio, especificamente falando, se ele é o melhor meio para a consecução do objetivo desejado. Desde que ele atenda a esse princípio, então representará o melhor meio. Embora não se possam desprezar totalmente outros fatores relativos aos meios, eles devem atender ao pré-requisito de que o seu emprego ser vantajoso para a consecução do objetivo. Isto significa que aquilo que as “S SUPRACOMBINAÇÕES DE MEIOS” devem sobrepujar, não são os outros [meios] e sim os padrões morais ou os princípios morais intrínsecos aos próprios meios. Isto é muito mais difícil e complexo do que combinar determinados meios com outros meios. Nós só poderemos nos desvencilhar dos tabus e entrar no campo da livre escolha de meios — a ambiência do “além dos limites” — se tivermos a visão completa do conceito de “além dos limites”. E isto porque não podermos alcançar objetivos simplesmente pelo emprego de meios já prontos. Nós ainda precisamos encontrar o processo ideal para alcançar os objetivos, um modo correto e eficaz de empregar meios. Em outras palavras, descobrir como combinar meios diferentes e criar novos meios para a consecução de objetivos. Por exemplo, nesta era de integração econômica, se alguma nação0 economicamente poderosa deseja atacar a economia de uma outra nação e ao mesmo tempo atacar suas defesas, ela não poderá depender, exclusivamente, do emprego de meios prontos, como os bloqueios econômicos e as restrições ao comércio, ou ameaças militares e o embargo de armamentos. Em vez disso, ela deve ajustar sua própria estratégia financeira, usar prioritariamente a valorização ou a desvalorização monetária, e combinar outros meios, como por exemplo, a conquista de maior influência na opinião pública e mudança de regras de maneira suficiente a criar turbulência financeira e uma crise econômica no país ou área alvo, enfraquecendo o seu poder global, incluindo o seu potencial militar. Na crise financeira do Sudeste Asiático, temos um exemplo em que uma crise provocou uma diminuição no ritmo da corrida armamentista naquela região. Deste modo, podemos perceber as possibilidades de uma crise financeira, ainda que neste exemplo, ela não tenha sido causada de forma intencional, pela ação de alguma grande potência, como por exemplo: alterando, intencionalmente, o valor de sua própria moeda. Até mesmo um eminente poder mundial como a China, já dispõe do potencial para abalar a economia mundial simplesmente alterando suas diretrizes econômicas. Se a China fosse uma nação egoísta, e tivesse faltado com a sua palavra em 1998, permitindo que sua moeda fosse desvalorizada, sem a menor dúvida, tal atitude teria ampliado os infortúnios das economias asiáticas. Teria também provocado um cataclismo nos mercados de capital do mundo, daí resultando, que até mesmo a nação mais devedora do mundo, uma nação que depende da entrada de recursos monetários externos para manter sua prosperidade econômica, e que é os Estados Unidos, teria certamente sofrido pesadas perdas econômicas. Tal desfecho certamente seria melhor do que um ataque militar. A realidade das trocas de informações e do entrelaçamento de interesses está continuamente ampliando o significado da guerra. Por outro lado, qualquer nação que desempenhe um papel decisivo dispõe de várias capacidades para ameaçar outras nações, e não apenas através os meios militares. 0 [N.T.] No texto original o Autor refere-se a “Empresa” ao invés de “Nação”. Creio que o emprego de Nação seja mais correto. O emprego isolado de meios produzirá efeitos progressivamente menos importantes e as vantagens do uso combinado de vários tipos de meios tornar-se-á cada vez mais evidente. Isto abriu uma ampla possibilidade para as “S SUPRACOMBINAÇÕES DE MEIOS” e para o emprego desses tipos de combinações nas ações de guerra ou de quase guerra. SUPRACOMBINAÇÃO DE NÍVEIS COMBINAR TODOS OS NÍVEIS DE CONFLITO EM CADA CAMPANHA Quando uma guerra transforma-se em um evento histórico o seu enredo surge passo a passo, como no resfriamento do aço fundido. A guerra, em um sentido amplo, desenvolve-se numa escala crescente de nível em nível, como que percorrendo uma escada com degraus invisíveis, que vão desde as mais antigas escaramuças locais e de pequena escala, passando pelas campanhas, compreendendo uma série de batalhas inter-relacionadas, chegando às guerras, que agregam campanhas chegando até o ponto de uma guerra intercontinental ou mundial. Possivelmente, poderá ocorrer, também, um retrocesso. Em cada nível existe um lamentável amontoado de vítimas e de corpos dos que morreram; as bocas dos canhões dos vencedores apontando para o alto, e os fuzis dos derrotados abandonados no chão; o mesmo ocorrendo com muitos planos e estratagemas, alguns inteligentes outros estúpidos. Se começássemos pela última página da História da guerra, e voltássemos atrás, capítulo por capítulo, iríamos constatar que todo o processo da guerra decorre de um acúmulo ou acervo, e que todos os resultados decorreram em função desse acúmulo. A vitória representa um acúmulo, o mesmo ocorrendo quanto à derrota. No tocante a esses dois lados oponentes em combate, eles seguem uma única via até os resultados que obtiveram. A única diferença entre eles consiste na determinação de qual dos dois lados, ao subir aqueles degraus invisíveis, atingiu uma posição mais alta, e de qual lado tropeçou e caiu. Mudanças súbitas e eventos imprevistos poderão ocorrer até mesmo quando você atinge o último degrau. Isto é, praticamente, uma regra, e as regras devem ser respeitadas. Fugir às regras ou quebrá-las exige prudência. O tema em torno do qual estamos raciocinando é, precisamente, como fugir das regras ou quebrá-las. Não acreditamos que todas as guerras devam progredir seqüencialmente, nível por nível, gerando um acúmulo, até que seja atingido o momento fatal do destino. Acreditamos que esse momento é algo que pode ser criado. O que devemos fazer é descobrir um método através do qual possamos, continuamente, criar esse momento sem que tenhamos de esperar pela conseqüência do processo de acumulação, e a partir daí, transformar esse método em um tipo de estratégia, ou seja, naquilo que deveríamos procurar fazer. Logicamente, sabemos que uma batalha não representa uma guerra, como também, um soldado não constitui um exército. Isto, porém, não é o tema em discussão. O nosso problema é de como empregar algum método para dissociar todos os níveis e reconstituí-los arbitrariamente. Consideremos, por exemplo, uma luta ou ação no nível tático e combinemo-la, diretamente, com uma ação no nível operacional, ou, no nível estratégico. Transformaríamos, então, a guerra em algo semelhante a um dragão, com membros, tronco e cabeça intercambiáveis, os quais poderíamos montar como desejássemos, e que poderia deslocar-se livremente em qualquer direção. Isto é o que entendemos como o método de “S SUPRACOMBINAÇÃO DE NÍVEIS”. O “nível nível” representa, também, uma espécie de restrição semelhante às fronteiras nacionais, as fronteiras territoriais e os limites dos meios. São fronteiras e limites que devem ser ultrapassados na prática efetiva da “Guerra Guerra de Supracombinações”. Supracombinações Herman Khan dividiu o espectro de uma guerra nuclear em um determinado número de estágios, que existem, também, de maneira semelhante, em outras formas de guerra. Não obstante, seguindo fielmente a linha de raciocínio de Khan iremos constatar que o delineamento de seus 44 níveis é excessivamente refinado e não é fácil de ser utilizado0, existindo uma outra dificuldade, porque ele enfocou a divisão da guerra com base na intensidade de conflito, não tendo, desta forma, penetrado no âmago da natureza essencial dos níveis da guerra. Sob o nosso ponto de vista, se a divisão dos níveis das guerras for feita sob os aspectos da escala da guerra e dos métodos de guerra correspondentes, então os níveis da guerra serão significativamente simplificados, e será suficiente uma divisão em apenas quatro níveis. 0 Com relação à obra de Herman Khan “Rungs of Escalation: A Conceptual Explanation”, ver Carl Doe “Analysis of International Relations”, World Knowledge Publishing House, p. 234. Os militares norte-americanos, normalmente, dividem as atividades de combate em três níveis: estratégia, campanha e tática. (Ver “Air Force Manual AFM 1-1” “Basic Aereoespace Doutrine of the United States Air Force”, edição 1992; Military Sciences Publishings House, pp. 106-111) Quanto a esta conclusão, nossa opinião e as opiniões de alguns analistas militares norte-americanos são basicamente as mesmas, a diferença ocorrendo apenas na terminologia. O nosso delineamento específico é o que se segue: ESCALA DA GUERRA MÉTODOS DA GUERRA Grande Guerra Guerra Campanhas Batalhas Diretriz de guerra Estratégia Arte Operacional Táticas O primeiro nível é o da “Grande Guerra Diretriz de Guerra”. Em termos de escala, corresponderia ás ações militares e não-militares da guerra tendo o “supranacional” como o limite superior e a nação como o limite inferior. A função correspondente a esse nível é o que denominamos de “diretriz da guerra” e que Collins chama de “Grande Estratégia”. Nós usamos a denominação “diretriz da guerra” porque a estratégia neste nível implica, principalmente, nos estratagemas políticos relativos à guerra. O segundo nível é o da “Guerra Estratégia”. As ações militares neste nível incluem as ações não-militares da guerra. O método correspondente a este nível é a “estratégia”, isto é, os estratagemas militares ou estratagemas de guerra de uma nação. O terceiro nível refere-se às “Campanhas Arte Operacional”. Em termos de escala configuram-se ações de combate numa amplitude menor do que uma guerra, porém maior do que a das batalhas. O método correspondente a esse nível não possui uma denominação reconhecida e muitas vezes o conceito de “fazer campanhas” é usado indiscriminadamente. Obviamente, esta imprecisão conceitual obscurece as implicações relativas aos propósitos e métodos das operações de combate e, assim sendo, escolhemos a expressão “arte operacional”. A seleção do posicionamento deste nível, abaixo da estratégia e acima da tática, iria exigir a elaboração de um conceito para a “arte da guerra”. O quarto nível refere-se às “Batalhas Táticas”. Neste nível enquadram-se as ações básicas de combate. O método correspondente a este nível é representado pelas “Táticas”. Pode-se observar que cada um dos níveis possui um correspondente método de combate específico. No caso dos militares tradicionais, pode-se dizer que, ao longo de suas vidas, as lições que lhes foram ensinadas visavam capacitá-los a empregar esses métodos e a lutar bem, qualquer que fosse o nível em que estivessem. Mas, para os militares do século 21, não será suficiente a mera colocação em prática dos métodos previstos nos quatro níveis. Eles deverão descobrir como romper esses níveis de modo a vencer as guerras pela combinação de todos os métodos, desde as ações supranacionais até o combate nas batalhas específicas. Esta é, certamente, uma missão que poderá ser cumprida. Colocando de maneira simples, no processo de ajuste da diretriz de guerra, da estratégia, da arte operacional, e das táticas, com os correspondentes níveis, o princípio da “S SUPRACOMBINAÇÃO DE NÍVEIS” nada mais é do que uma questão de atribuições intercambiáveis e facilmente transponíveis. Como exemplo, poderíamos citar o uso de um método estratégico, que se constitui num tipo de ação não-militar, integrado ao cumprimento de uma ação tática ou, usar uma ação tática para a consecução de um objetivo ao nível de uma diretriz da guerra. Isto decorre do fato de que a tendência na evolução da prática da guerra evidencia, de forma cada vez mais clara, a indicação de que: definitivamente não é mais possível que os problemas de um determinado nível só possam ser solucionados pelos meios disponíveis naquele nível. Não importa se iremos utilizar apenas uma fração dos recursos disponíveis ou usar um machado para matar uma galinha; o método empregado será adequado, desde que funcione corretamente. Bin Laden usou um método tático quando utilizou apenas dois veículos com cargas explosivas e, com isso, estabeleceu uma ameaça para os interesses nacionais dos Estados Unidos a nível estratégico; ao passo que, para os norte-americanos poderem obter a consecução do seu objetivo estratégico, qual seja a proteção da sua própria segurança, teriam de executar uma retaliação a nível tático contra bin Laden. Um outro exemplo é de que nas guerras do passado o menor elemento de combate representava a combinação de um homem com uma máquina e a sua utilidade, normalmente, não iria além do nível de uma batalha. Na guerra “além dos limites”, ao contrário, a combinação homem-máquina realiza funções ofensivas múltiplas que ampliam os níveis desde a batalha até a diretriz de guerra. Um hacker equipado com um modem pode causar danos e perdas a um inimigo quase iguais àquelas que seriam provocadas pela guerra. Por dispor do ímpeto e a discrição do combate “transnível” este método de combate individual, muito facilmente, produz resultados positivos nos níveis estratégicos e até mesmo no nível da diretriz de guerra. Esta é a substância e o significado da “S SUPRACOMBINAÇÃO DE NÍVEIS”. Na guerra militar e na guerra não-militar que são básica e respectivamente nacionais e supranacionais, não existem ambiências que não possam ser ultrapassadas, não existem meios que não possam ser usados na guerra; como também não existem campos de ação e métodos que não possam ser combinados. A aplicabilidade das ações de guerra em relação à tendência da globalização é demonstrada pelo qualificativo “além além”, e esta palavra é suficiente para identificar o emprego de um método que se aplique a dez mil métodos, assim como, dez mil métodos combinados em um único. Deve ser ressaltado, novamente, que a “Guerra Guerra em Supracombinação”, Supracombinação que vai além dos limites, nada mais é do que uma maneira de pensar, e a partir desta condição é que ela pode se transformar em um método. CAP. 8 - PRINCÍPIOS ESSENCIAIS “Os princípios representam um código de conduta, mas não têm um valor absoluto”. George Kennan Sun Tzu é o personagem na história da guerra a quem é atribuído o uso, pela primeira vez, de princípios para regulamentar os métodos de combate. Alguns de seus princípios como, por exemplo, “conheça o inimigo melhor do que a si mesmo e em cem batalhas você nunca será derrotado”; “ataque onde o inimigo não está preparado, tome-o de surpresa”; e “evite o forte e ataque o fraco” constituem, ainda, uma profissão de fé para os modernos estrategistas. Porém, no Ocidente, 2400 anos mais tarde, Napoleão iria revelar o seu verdadeiro desejo aos alunos da Academia Militar de Saint-Cyr, desejo este que, um dia, passou a ornar, o portal principal daquela Academia, qual seja: “Escrever Escrever um livro, descrevendo detalhadamente os Princípios da Guerra, e torná-lo disponível para todos os militares”. militares Infelizmente, enquanto ele combatia e vencia guerras não teve tempo disponível para escrever; e depois que foi derrotado, não teve mais disposição para a tarefa. Não obstante, para um general que obteve cerca de 100 vitórias durante sua vida, isto não deveria representar um fato a se lamentar. Porém, tendo sido um homem notável, foi suficiente que ele deixasse um brilhante legado de vitórias, possibilitando que a posteridade examinasse, detalhadamente, seu caminho para a vitória. E assim foi que 100 anos mais tarde, tendo como fundamento as guerras comandadas por este antigo inimigo, que gerava temor no povo inglês, quer durante sua vida, como também após o seu falecimento, um general inglês chamado J. F. C. Fuller criou cinco princípios para a condução da guerra0. Todos 0 Os cinco princípios que Fuller deduziu a partir das Guerras Napoleônicas são: ataque, manobra, surpresa, concentração e apoio. Em paralelo a isso, Fuller, adotando os pontos de vista de Clausewitz, também deduziu sete princípios, semelhantes aos referentes às Guerra Napoleônicas, quais sejam: manutenção do objetivo; segurança da ação; mobilidade da ação; exaurir a capacidade ofensiva do inimigo; concentrar forças; e a surpresa. Estes princípios tornaram-se o fundamento dos modernos princípios militares. (Ver “The Writings of Fuller” em “Combat Command”; Ed. Liberation Army Publishing House”; p. 38-60) os princípios de guerra moderna, adotados no Ocidente, são descendentes desta proposição de Fuller. Ainda que, mais tarde, os regulamentos militares de algumas nações, bem como diversos analistas militares tenham proposto isto ou aquilo como princípios de guerra, tais propostas diferem muito pouco daqueles princípios que foram enunciados por Fuller0. Esta perenidade conceitual ocorre, porque desde o início das Guerras Napoleônicas, até o período imediatamente anterior à Guerra do Golfo, salvo o contínuo aumento na letalidade e poder de destruição dos armamentos, não existiram motivos para uma alteração significativa na natureza da guerra em si. Atualmente, devido ao que ocorreu durante e depois da Guerra do Golfo, a situação mudou. O advento das armas orientadas por sistemas de precisão, das armas nãoletais e das armas não-militares, afastou a guerra de sua trajetória enlouquecida no sentido de uma maior letalidade e capacidade destrutiva, e provocaram o início da primeira mudança de rumo desde os primórdios da história, estabelecendo uma nova trajetória para a guerra no século XXI, gerando princípios, em relação aos quais os militares profissionais não estão familiarizados. Nenhum princípio pode apoiar-se em uma plataforma frágil, passível de desmoronar, e este pressuposto é ainda mais verdadeiro, quando se trata de princípios de guerra. Os princípios de guerra, independentemente de qual pensador militar os elaboraram, ou de que regulamentos militares eles foram extraídos, representam, sem dúvida, o produto de repetidas têmperas realizadas na fornalha e na bigorna da guerra. Se não tivessem ocorrido as guerras no Período da Primavera – Outono, não existiriam os princípios de Sun Tzu. Se as Guerras Napoleônicas não tivessem ocorrido, não existiriam os princípios de Fuller. Da mesma forma, se não tivessem ocorrido grandes e pequenas guerras militares, quase-militares e até mesmo nãomilitares em todas as regiões do mundo, antes e depois da Guerra do Golfo, não existiriam propostas de novos conceitos como, por exemplo, as “operações operações onidimensionais” Guerra em onidimensionais dos norte-americanos e a nossa proposição de “Guerra Combinação Além dos Limites”. Limites Logicamente, os princípios de guerra que decorrem desses conceitos também estariam fora de questão. 0 Um exemplo são os nove princípios militares básicos do Exército norte-americano: objetivo; ofensiva; concentração; economia de forças; mobilidade; segurança; surpresa; simplicidade e unidade de comando. Estes princípios assemelham-se muito àqueles que baseavam-se na era Napoleônica. Ainda que lamentemos o fato de que a teoria das “operações operações onidimensionais” onidimensionais tenha morrido no seu nascedouro, estamos decididos no propósito de que a “Guerra Guerra em Combinação Além dos Limites” Limites não irá permanecer restrita, ao nível de uma especulação teórica. Ao contrário, desejamos que ela seja incorporada aos métodos de combate e possua uma aplicação prática. Ainda que o objetivo da ideologia “além além dos limites” limites que propomos, seja o de romper com todas as restrições, ainda assim, existe uma limitação que deve ser rigorosamente observada, qual seja, a obediência de princípios essenciais, quando da execução das ações de combate. Apenas em situações excepcionais será válido desobedecer a um princípio. Quando um raciocínio profundo em relação às regras da guerra solidifica-se, transformando-se em algum tipo de método de combate, nasce, ao mesmo tempo, um princípio. É muito difícil dizer se esses princípios e métodos, que ainda não foram experimentados em novas guerras, podem ou não sinalizar o caminho para a próxima vitória. No entanto, a proposição de princípios essenciais é, sem dúvida, um processo teórico indispensável para o aperfeiçoamento do método de combate. Aqui temos um giroscópio, deixemos que ele nos oriente! Examinemos os princípios relacionados a seguir, e vejamos o que eles podem acrescentar à “Guerra Guerra de Combinação Além dos Limites”: Onidirecionalidade; Sincronia; Objetivos Limites limitados; Medidas ilimitadas; Assimetria; Consumo mínimo; Coordenação onidimensional; e Ajuste e controle de todo o processo; ONIDIRECIONALIDADE PLANEJAMENTO E OBSERVAÇÃO EM 360 GRAUS. EMPREGO COMBINADO DE TODOS OS FATORES RELACIONADOS A “ONIDIRECIONALIDADE” representa o ponto de partida da ideologia da guerra sem limites0, proporcionando um invólucro para essa ideologia. Em se tratando de um princípio geral de guerra, as exigências básicas que a ONIDIRECIONALIDADE impõe ao executor da guerra compreendem: considerar todos os fatores existentes e relacionados à guerra específica; e quando observando o campo 0 [N.T.] Na versão apócrifa em inglês foi usada a expressão “unrestricted warfare”, mas os autores, originalmente, sempre se refeririam à guerra além dos limites. de batalha, ou um provável campo de batalha, na elaboração de planos, na adoção de medidas, ou na combinação de todos os recursos que possam ser mobilizados para a guerra, esse executor tenha um campo de visão desimpedido, uma concepção sem obstáculos e uma orientação nítida. No tocante à “guerra guerra além dos limites” limites não existe mais qualquer distinção entre o que é, e o que não é, o campo de batalha. Os espaços naturais, compreendendo a superfície terrestre, os oceanos, a atmosfera e o espaço exterior, constituem campos de batalha, e os espaços sociais, tais como os militares, políticos, econômicos, culturais e psíquicos, também são campos de batalha. O espaço tecnológico, unindo esses dois grandes espaços, representa um campo de batalha ainda mais importante, dentro do qual os antagonistas não medem esforços em sua contendas. O campo de batalha da “guerra além dos limites” difere dos campos de batalha do passado, pelo fato de que ele incorpora todos os espaços naturais, tais como a ambiência social, e a esfera de desenvolvimento contínuo da tecnologia, onde o espaço, agora, já é medido em nanômetros. Atualmente, estes espaços estão interligados uns aos outros. Por exemplo, o espaço cósmico pode ser encarado como um espaço natural, e também como um espaço tecnológico, uma vez que, cada passo no sentido da militarização do espaço exterior requer um avanço tecnológico. Da mesma forma, a interdinâmica entre a sociedade e a tecnologia deve ser vista como uma constante.Não existe um exemplo mais típico deste fenômeno que o efeito da tecnologia cibernética sobre a sociedade. Em decorrência desses aspectos, podemos ver que o campo de batalha é onipresente e desta forma só podemos vê-lo de forma onidirecional. A guerra pode ser militar, quase-militar ou não-militar. Pode usar a violência ou pode ser não-violenta. Poderá ser um confronto com profissionais militares ou com novas forças emergentes compostas basicamente de pessoas comuns ou de peritos. Essas características da “guerra guerra além dos limites” limites representam a linha divisória que a separa da guerra tradicional, assim como a linha de partida para novos tipos de guerra. Sendo um princípio ONIDIRECIONALIDADE bastante significativo, aplicável à guerra atual, a também se aplica em cada um dos níveis da “guerra guerra de combinação além dos limites”, limites descrita no Capítulo 7. No nível da diretriz de guerra, ela se aplica ao emprego combinado de todo o poder de combate de uma nação, incluindo o poder de combate supranacional, no caso de um confronto intercontinental ou mundial. No nível estratégico da guerra, ela se aplica no uso combinado dos recursos nacionais que estão relacionados aos objetivos militares. No nível operacional aplica-se ao uso combinado de diversos tipos de medidas e, basicamente, de um exército ou força equivalente para a consecução dos objetivos da campanha no âmbito de um determinado campo de batalha. E no nível tático, aplica-se ao emprego combinado dos vários tipos de armas, equipamentos e métodos de combate e, principalmente, de uma unidade militar, ou força equivalente, para a execução de uma determinada missão em uma batalha. Devemos ter sempre em mente, que todas essas combinações devem incluir, também, combinações interativas entre os respectivos níveis. Finalmente, deve ser esclarecido que o âmbito das operações de combate, em cada guerra específica, nem sempre irá se expandir para todos os espaços e ambiências, mas o primeiro princípio da “guerra em combinação além dos limites” é o de pensar onidirecionalmente e entender as condições do combate. SINCRONIA A CONDUÇÃO DAS AÇÕES EM ESPAÇOS DISTINTOS DENTRO DO MESMO PERÍODO DE TEMPO Os processos técnicos utilizados na guerra moderna, particularmente, a expansão da tecnologia cibernética; a emergência da tecnologia da guerra a longa distância; a crescente capacidade de transformar o campo de batalha; o entrelaçamento dos campos de batalha que se ampliam continuamente e que estão dispersos, ou são diferentes quanto à sua natureza; e a introdução de diversas forças militares e nãomilitares em iguais proporções na guerra — todos esses fatores reduzem a dimensão do processo da guerra. Inúmeros objetivos, que no passado eram conquistados em etapas mediante um acúmulo de batalhas e campanhas, podem agora ser rapidamente conquistados, sob as condições de ocorrências simultâneas, ações simultâneas, e conclusões simultâneas. Em decorrência, a importância da “SINCRONIA SINCRONIA” nas operações de combate sobrepõe-se, atualmente, à importância do aspecto seqüencial0. Considerando-se que a exigência de um planejamento detalhado já é um fato consagrado, a “guerra guerra além dos limites” limites introduz fatores fundamentais quanto à 0 As guerras do passado envolviam, em termos de espaço, o ataque de forças a partir de áreas fronteiriças em grande profundidade, e em termos de tempo, a sua divisão em fases. De forma contrastante, em termos de espaço, a guerra além dos limites. guerra, que estavam dispersos em ambiências distintas, para que coincidam no mesmo espaço de tempo. Estes fatores relacionam-se intimamente aos objetivos da guerra, e tratados no âmbito de um trabalho de equipe bem organizado, visando um ataque combinado, permitem que sejam alcançadas: a surpresa, o sigilo e a eficácia. Uma única ação de grande profundidade, mas que seja sincronizada, poderá representar apenas uma pequena operação de “combate além dos limites”, mas poderá ser suficiente para representar o desfecho de toda uma guerra. O que queremos caracterizar como “SINCRONIA SINCRONIA” não significa “simultaneidade”, sem que haja até mesmo a diferença de um segundo; ao contrário, deve ser entendida como “dentro de um mesmo período de tempo”. Neste sentido a “guerra guerra além dos limites” limites merece ser chamada de “guerra no momento determinado”. Usando esta definição como um padrão, a força armada cujas capacidades militares estão bastante próximas desse nível é a dos norte-americanos. Considerando-se seus atuais equipamentos e tecnologia, um dos sistemas de informação de campanha empregado pelos militares norte-americanos pode, no espaço de um minuto, prover informações de 4.000 alvos a 1.200 aeronaves. Além disso, existe também o amplo emprego de sistemas de armas de ataque de longo alcance. Esta capacitação deu origem a uma proposta de ideologia operacional compreendendo o “ataque ataque simultâneo de máxima profundidade”. profundidade Em termos de espaço, os militares norte-americanos começaram a abandonar o modelo de ações em profundidade a partir da periferia, e no tocante ao tempo das operações, eles estão abandonando o já obsoleto modelo de combate por ações seqüenciais. No entanto, considerando-se alguns documentos de livre circulação publicados pelos órgãos militares, o pensamento norte-americano quanto ao assunto ainda está restrito ao campo de ação militar e eles foram incapazes de expandi-lo para os campos de batalha além da ambiência militar0. OBJETIVOS LIMITADOS UTILIZAR UMA BÚSSOLA PARA ORIENTAR A AÇÃO — DENTRE UMA SÉRIE ACEITÁVEL DE MEIOS DISPONÍVEIS 0 Não há um exemplo mais típico disto que os quatro princípios, definidos na publicação militar norte-americana “Joint Vision 2010”, quais sejam: “manobra dominante, engajamento de precisão, logística com ação concentrada, proteção em dimensão total”. Todos estes novos princípios destinam-se à guerra militar. Ao qualificarmos um objetivo como limitado isto significa que ele será limitado em relação às medidas adotadas para a sua consecução. Deste modo, o princípio do estabelecimento de objetivos limitados significa que os objetivos sempre devem ser menores do que as medidas utilizadas. utilizadas Quando estabelecendo objetivos deve-se atribuir a máxima consideração quanto à exeqüibilidade de sua consecução. Não se devem estabelecer objetivos que sejam ilimitados no espaço e no tempo. Eles devem situar-se, sempre, dentro de limites que possam ser explícitos e práticos e que, funcionalmente, possam ser alcançados. Adicionalmente, após a conquista de um objetivo, deverá existir a capacidade de prosseguir-se para a conquista do próximo objetivo.0 Ao estabelecermos objetivos, é obrigatório que superemos a mentalidade de desejar da obtenção de grandes sucessos. Ao contrário devemos, conscientemente, selecionar objetivos limitados, assim como, eliminar aqueles objetivos que estão além de nossas possibilidades, ainda que eles pareçam adequados, isto porque o número de objetivos que se pode conquistar é limitado. Não importa qual o motivo, o estabelecimento de objetivos que excedam os limites levarão, apenas, a conseqüências desastrosas. O exemplo mais típico quanto à expansão de objetivos foi o erro cometido por Mac Arthur na guerra da Coréia. Seguindo-se a este podem ser mencionados erros semelhantes cometidos pelos norte-americanos no Vietnã e pelos soviéticos no Afeganistão. Isto prova que não importa apenas qual é o tipo de ação, mas também quem está executando essa ação. Quando os objetivos são mais amplos do que as medidas adotadas, a derrota é praticamente certa. Nem todos os estadistas e estrategistas na atualidade demonstram um entendimento claro deste tema. O relatório do Departamento de Defesa dos Estados Unidos em 1996 contém esta premissa do Presidente Clinton: “sendo a nação mais poderosa do mundo temos uma obrigação de liderança e quando nossos interesses e percepção sobre valores forem ameaçados nós agiremos”. Obviamente, ao pronunciar essas palavras até 0 Estabelecer objetivos limitados não é uma questão de estarmos ou não restringidos subjetivamente, e sim, se excederemos ou não o caráter restrito das medidas a serem adotadas. As medidas são restrições que não podem ser excedidas, quando estabelecendo objetivos. mesmo Clinton não percebeu que os interesses nacionais e a percepção de valores são objetivos estratégicos com duas escalas de medida completamente distintas. Se dissermos que os interesses nacionais representam um objetivo que o poder militar norte-americano pode proteger por meio de ações, a percepção de valores não representa um objetivo que o seu poder militar possa alcançar, como também, não se constitui num objetivo que os Estados Unidos deva procurar alcançar fora do seu território. “Os primeiros do mundo” uma ideologia que redunda no seu “isolacionismo”, alimenta a tendência dos Estados Unidos a assumirem objetivos ilimitados, na medida em que expandem o seu poder nacional. Esta, porém, é uma tendência que poderá ter como resultado um fracasso. Uma empresa que disponha de recursos limitados, mas que ainda assim esteja disposta a assumir responsabilidades ilimitadas, irá obter o único resultado possível e que é a falência. MEDIDAS ILIMITADAS A TENDÊNCIA É NO SENTIDO DO EMPREGO IRRESTRITO DE MEIOS, SENDO, PORÉM, RESTRITA À CONSECUÇÃO DE OBJETIVOS LIMITADOS Iremos discutir medidas ilimitadas e seu relacionamento com objetivos limitados0. A tendência no sentido do “sem limites” representa uma tendência no sentido da contínua ampliação da faixa de seleção e dos métodos de emprego das medidas. Não se trata do emprego imoderado de medidas e muito menos, de um emprego incondicional de medidas ou o emprego de medidas absolutas. O uso de medidas ilimitadas para a consecução de objetivos limitados, representa a última fronteira. As medidas e os objetivos são inseparáveis. Uma medida ilimitada significa que para a consecução de determinado objetivo poderemos ignorar as restrições e fazer uma seleção entre várias medidas. Isto não quer dizer que uma medida possa ser isolada dos objetivos e aplicada como quisermos. As armas atômicas, que podem exterminar a humanidade, têm sido vistas como medidas absolutas, precisamente 0 Para maiores detalhes ver “How Great Generals Win” de Bevin Alexander; p.101-125. porque elas violaram o princípio de que uma medida deve atender à consecução de um objetivo. Finalmente, foram deixadas de lado. O emprego de medidas ilimitadas somente pode ser concretizado, de acordo com o pensamento de Confúcio, “como como for de seu agrado, mas sem desrespeitar as regras”. regras Neste caso, as “regras” significam os objetivos. A ideologia do “além além dos limites” como for do seu agrado”, limites amplia o significado de “como agrado à faixa de seleção e os métodos de emprego das medidas, mas isto certamente não significa uma ampliação dos objetivos “como como for de seu agrado”. agrado Significa apenas empregar medidas sem restrições, além das fronteiras, visando a consecução de objetivos limitados. No sentido oposto, um General inteligente não irá limitar suas medidas levando em conta que os objetivos são limitados. Isto muito possivelmente produziria um fracasso à beira de um sucesso. Assim sendo, o limitado deve ser buscado através o ilimitado. ilimitado A ofensiva de Sherman para Savana, na Guerra da Secessão norte-americana, não visava ao combate e sim à destruição e à pilhagem durante todo o seu avanço. Isto representou uma medida utilizada para destruir a economia na retaguarda do exército sulista, para fazer com que a população sulista, assim como o exército confederado, perdessem suas capacidades de resistência e, deste modo, atingir o objetivo de guerra da União. Este é um exemplo da utilização bem sucedida de medidas ilimitadas para a consecução de um objetivo limitado. Em comparação a este exemplo, na Quarta Guerra do Oriente Médio (A Guerra de Yon Kippur, 1973), o Comando Supremo do exército egípcio, para a consecução do objetivo concebido por seus principais oficiais generais — a ocupação da Península do Sinai — concebeu um plano de batalha previa apenas romper a linha de defesa “Bar Lev” e consolidar o controle do Sinai. O Egito tentou usar medidas limitadas para alcançar um objetivo limitado. Os resultados são bem conhecidos. O Egito não conseguiu a obtenção da vitória quando essa vitória estava ao seu alcance imediato. Antes da Quarta Guerra do Oriente Médio, o “Plano Badr” egípcio (a guerra começou na data de aniversário da Batalha de Badr em 626 DC) estava dividido em duas etapas. A primeira etapa consistia na travessia forçada do Canal de Suez, rompendo com a Linha de Defesa Bar Lev, assumindo o controle de uma área com 15 a 20 quilômetros de profundidade, na margem leste do canal. A segunda etapa compreendia o ataque e captura de uma linha que se estendia da Passagem de Mitla, passando pela Passagem Giddi indo até a Passagem Khatima, visando a garantia da segurança da margem leste do canal, para depois avançar sobre o inimigo, na medida em que a situação assim o permitisse. Porém, durante as ações de combate, assim que o Exército egípcio cruzou o canal assumiu uma posição defensiva, permanecendo nesta postura por cinco dias, antes de prosseguir na sua ofensiva, dando assim oportunidade ao exército israelense de se recuperar. DESEQUILÍBRIO A BUSCA DE MODOS DE AÇÃO NA DIREÇÃO OPOSTA DOS CONTORNOS DO EQUILÍBRIO DA SIMETRIA. O “D DESEQUILÍBRIO”, como um princípio, representa um sustentáculo importante na apreciação das regras da ideologia “além dos limites”. O seu aspecto fundamental é o de canalizar o pensamento na direção oposta ao equilíbrio da simetria e desenvolver ações de combate neste contexto. Desde o posicionamento e emprego das forças e a seleção do eixo principal de combate, assim como do centro de gravidade para o ataque, até a alocação dos armamentos, em todos esses aspectos será necessário uma dupla consideração quanto ao efeito dos fatores assimétricos e quanto ao emprego da assimetria como uma medida para a consecução dos objetivos. Não importa se a assimetria funciona como uma forma de pensamento ou como um princípio orientador das operações de combate; ela se manifesta de alguma maneira em todos os aspectos da guerra. O entendimento, e o emprego correto do princípio da assimetria possibilitam que possamos, sempre, encontrar e explorar os pontos fracos do inimigo. O principal elemento de combate de algumas nações pobres, de nações fracas e de entidades não-estatais tem sido o método de combate assimétrico do tipo “gato e rato”, quando em combate contra adversários muito mais poderosos. Nos casos como, por exemplo, da Chechenia versus Rússia, Somália versus Estados Unidos, guerrilha da Irlanda do Norte versus Inglaterra, Jihad Islâmico versus todo o Ocidente, podemos constatar, sem exceções, a consistente e sábia recusa de enfrentar diretamente as forças da potência mais forte. Em vez disso, o lado mais fraco tem enfrentado o seu adversário utilizando a guerra de guerrilha principalmente a guerrilha urbana, a guerra terrorista, a guerra santa, a guerra de desgaste0, a guerra em redes interativas e outras formas de combate. No que concerne a guerrilha urbana, o famoso pesquisador do desenvolvimento da sociedade capitalista, Fernand Braudel enfatizou, em particular, a “grande importância da função organizacional” das grandes cidades no mundo capitalista. A despeito de seu grande tamanho, este mundo, ainda assim, possui um grande número de pontos de aglomeração compreendendo cidades tais como: Nova Yorque, Londres, Tókio, Bruxelas e talvez Hong Kong. Se estas cidades fossem atacadas simultaneamente, ou se uma guerras de guerrilha eclodisse simultaneamente nestas cidades, isso levaria o mundo a um caos. (“The Motive Force of Capitalism”; Fernand Buluodaier; Ed. Oxford Press). Na maioria das vezes o lado mais fraco seleciona como seu principal eixo de batalha aquelas áreas ou linhas de batalha onde o adversário não espera ser atacado. O centro de gravidade do ataque é sempre um local que irá provocar um enorme impacto psicológico no adversário. Este emprego de medidas assimétricas, criando poder para um determinado indivíduo ou grupo, possibilitando que a situação evolua como desejado, é muitas vezes extraordinariamente eficaz. Muitas vezes, faz com que um adversário que emprega forças convencionais e medidas convencionais como o seu principal poderio de combate assemelhe-se a um enorme elefante investindo contra uma loja de louças. Ele estará sem saber o que fazer e incapaz de utilizar o poder de que dispõe. Além da eficácia que a assimetria demonstra, quando utilizada, que ela se constitui numa aplicação prática da regra da proporção áurea. Dentre todas as regras ela é a única que estimula a ruptura das regras assim como a utilização das regras. É, também, uma prescrição eficaz para um tratamento metódico e bem equilibrado para a enfermidade crônica do raciocínio. CONSUMO MÍNIMO UTILIZAR O MÍNIMO DE RECURSOS DE COMBATE [QUE SEJAM] SUFICIENTE PARA A CONSECUÇÃO DO OBJETIVO O princípio do CONSUMO MÍNIMO significa, em primeiro lugar, que a racionalidade é mais importante que a fragilidade0; em segundo, que a dimensão do consumo no 0 0 [N.T.] Tradução adotada para o conceito “protracted war”. Os princípios militares sempre incluíram a concepção de “economia”, referindo-se, principalmente, à necessidade de se ter atenção ao controle do consumo do potencial humano e materiais em tempos de guerra. Na “guerra além dos limites” o “uso racional” é combate é decidida pela configuração do combate0; e em terceiro lugar, dever-se-á usar “mais” (mais medidas) para obter (“menos”) um menor consumo. A racionalidade pode ser considerada sob dois aspectos: a designação racional dos objetivos e o emprego racional dos recursos. A designação racional de objetivos, além de especificar os objetivos que se enquadram no conjunto de medidas a serem empregadas, refere-se, também, à necessidade de reduzir a quantidade de objetivos e, tanto quanto possível, tornálos simples e concisos. O emprego racional dos recursos, obviamente, significa a utilização do método mais adequado para a consecução de um objetivo e não a mera imposição de uma exigência unilateral quanto a economizar. Economizar, isto é, o emprego da quantidade mínima de recursos, somente faz sentido se forem atendidos os pré-requisitos para a consecução de um objetivo. Mais importante do que uma familiaridade cabal com os princípios será saber como os princípios são aplicados. A consideração quanto a usar, ou não, a quantidade mínima de recursos para a consecução de um objetivo irá depender do tipo de combate que for selecionado. Por exemplo, a campanha de Verdun é considerada pelos historiadores da guerra como um “moedor de carne”, porque ambos os lados travaram uma insensata guerra de atrição. Em contraste com esse exemplo, a razão pela qual a Alemanha foi capaz de eliminar a força conjunta franco-britânica, após o cruzamento da Linha Maginot, foi por ter combinado o menor intervalo temporal com uma ótima rota,e com as armas mais poderosas, formando uma “blitzkrieg”. Assim sendo, pode-se constatar que a solução para realmente obter um “consumo mínimo” é descobrir um método de combate que utilize racionalmente os recursos para o combate. Nos dias atuais, em que os objetivos e as medidas necessárias a sua consecução vem assumindo muitas formas complexas, como nunca ocorreu anteriormente, o processo para a consecução de um objetivo complexo em apenas uma ambiência, empregando apenas um método, definitivamente, não irá produzir o resultado desejado. A conseqüência de uma combinação inadequada entre medidas e objetivos resulta, inevitavelmente, um alto consumo e uma reduzida eficácia. a única forma correta de economizar. 0 A “guerra alem dos limites” permite uma considerável margem na seleção das formas de combate. Naturalmente, existe uma grande diferença entre o custo entre uma guerra militar convencional e outra em que o aspecto financeiro exerça um papel capital. Portanto, o custo de uma guerra futura depende, principalmente, de qual tipo de guerra for selecionado. O raciocínio que nos leva a ultrapassar essas dificuldades é de que devemos usar “mais” para obter “menos”. “menos” Isto é, combinar as vantagens de vários tipos de recursos para o combate em vários tipos de ambiência de modo a estruturar um modelo de combate totalmente novo, conquistando o objetivo e, ao mesmo tempo, minimizando o consumo. COORDENAÇÃO MULTIDIMENSIONAL A COORDENAÇÃO E A ALOCAÇÃO DE TODAS AS FORÇAS QUE PODEM SER MOBILIZADAS NAS AMBIÊNCIAS MILITAR E NÃO-MILITAR EM RELAÇÃO A UM OBJETIVO. O termo “MULTIDIMENSIONAL MULTIDIMENSIONAL” aqui citado representa uma outra maneira de referirmo-nos a ambiências múltiplas e forças múltiplas. Ele nada tem a ver com a definição de “dimensionalidade” no sentido da Matemática ou da Física. “COORDENAÇÃO COORDENAÇÃO MULTIDIMENSIONAL” MULTIDIMENSIONAL refere-se à coordenação e cooperação entre forças distintas, em diferentes ambiências, visando à consecução de um objetivo. Portanto, esta definição nada tem de original. Explicações semelhantes podem ser encontradas em muitos regulamentos de combate, tanto antigos, quanto recentemente publicados. A única diferença que existe entre nossa definição e definições semelhantes é, e isto representa a grande diferença, a introdução direta, em vez de indiretamente, de fatores não-militares e não-bélicos. não-bélicos Em outras palavras, uma vez que qualquer ambiência pode transformar-se em um campo de batalha, e que qualquer força pode ser usada em condição de combate, deveríamos estar mais inclinados a entender a coordenação multidimensional como sendo a coordenação da dimensão militar com várias outras dimensões para a conquista de um objetivo específico. Isto não significa que, em todas as guerras, a ação militar deva ser considerada com o principal modelo de ação. Levando-se em conta que a guerra se defronta com a uniformização de várias dimensões, este conceito passará a representar uma fórmula para a resolução dos problemas das futuras guerras0. O conceito da COORDENAÇÃO MULTIDIMENSIONAL somente poderá ser estabelecido no contexto de um objetivo específico. Sem um objetivo, não podemos falar de coordenação multidimensional. Mas o tamanho do objetivo determina o tipo e a profundidade da coordenação em cada ambiência. Se o objetivo selecionado, ao nível da diretriz de guerra, for o de vencer uma guerra, as ambiências e forças que necessitam ser coordenadas podem abranger toda a nação, ou, até mesmo o nível supranacional. A partir desse ponto poderemos fazer generalizações dizendo que em qualquer ação, militar ou não-militar, independentemente do grau de presença das ambiências e da quantidade de forças a serem empregadas, a coordenação entre as várias dimensões é absolutamente necessária. Isto certamente não implica que, para cada ação, quanto mais medidas forem mobilizadas melhores serão os resultados, ao invés disso, o limite é determinado pela medida do necessário. O emprego de um valor excessivo, ou insuficiente em cada dimensão terá como conseqüência que a ação irá oscilar entre o edema e a atrofia e, em última análise, o objetivo estará sob risco. Um fragmento da sabedoria Oriental, a saber: “ir ir além dos limites é tão ruim quanto ficar aquém dos limites” limites é útil para o nosso entendimento e aplicação deste princípio. Adicionalmente, precisamos, urgentemente, expandir o nosso campo de visão com relação às forças que podem ser mobilizadas e em particular, as forças não-militares. Além do mais, assim como no passado, ao considerar os recursos materiais convencionais para as forças, deveríamos ter atenção, em particular, ao emprego de recursos estratégicos intangíveis, tais como fatores geográficos, o papel da história, tradições culturais, senso de identidade étnica, o domínio e exploração da influência de organizações internacionais, etc0. 0 A etapa mais importante no sentido da uniformidade entre as várias dimensões é superar o conceito de que “o militar é superior”. Nas futuras guerras, as medidas militares serão apenas consideradas como uma das opções convencionais. 0 Quanto a isso, a China é bem provida pela natureza. Uma extensa tradição cultural, uma ideologia pacífica, nenhum registro histórico quanto a agressões, o forte poder econômico do povo chinês, um assento no Conselho de Segurança das Nações Unidas, e assim por diante, tudo isso representar importantes “recursos estratégicos”. Mas, ainda assim, isto não é suficiente. Ao aplicar este principio temos que desenvolver, também, uma ação “além dos limites”, e na maior extensão possível, fazer da coordenação multidimensional um procedimento operacional comum, trazendo os processos de interligação e combinação gradual a todos os níveis desde o das diretrizes até o das táticas. AJUSTE E CONTROLE DE TODO O PROCESSO DURANTE TODO O TRANSCORRER DE UMA GUERRA, DESDE SEU INÍCIO, SUA PROGRESSÃO ATÉ SUA CONCLUSÃO, OBTER, CONTINUADAMENTE, INFORMAÇÕES, ADAPTAR AS AÇÕES E CONTROLAR A SITUAÇÃO. A guerra é um processo dinâmico, pleno de acasos e de criatividade. Qualquer tentativa de condicionar uma guerra a um conjunto de idéias no contexto de um plano pré-determinado é quase que um absurdo ou uma demonstração de ingenuidade. Torna-se necessário, portanto, um processo de realimentação e de revisões durante todo o transcurso da guerra, enquanto ela está em transcurso, afim de que seja mantido o controle da iniciativa. Isto é o que significa o AJUSTE E CONTROLE DE TODO O PROCESSO. PROCESSO Devido à introdução do princípio da SINCRONIA não podemos admitir que o processo de ajuste e controle do transcurso da guerra tenha uma longa duração. Com as modernas facilidades da alta tecnologia, este processo pode ter a duração de um piscar de olhos. Como citado anteriormente, o tempo necessário para travar uma batalha pode ser o suficiente para concluir toda a guerra. Isto poderá fazer com que o transcurso da guerra seja extremamente curto e, circunstancialmente, passe a ser muito mais difícil o ajuste e o controle. Hoje, com a tecnologia cibernética agregando todo o globo terrestre em uma rede, o número de fatores a serem considerados em uma guerra é muito maior do que nas guerras do passado. A capacidade desses fatores em obscurecer os problemas da guerra, e sua influência significativa na ambiência da guerra, implica que a perda de controle sobre qualquer de seus elos assemelha-se ao proverbial exemplo de que a perda de um cravo da ferradura de um cavalo poderá acarretar a perda da guerra. Na guerra moderna, fatores fortuitos influenciam os resultados do mesmo modo que na Antigüidade. Caso um fusível no computador de um centro de comando fique superaquecido ou for destruído em um momento crítico isto poderia causar um desastre. (Isto é inteiramente possível de ocorrer, e foi uma das causas de um ataque por engano efetuado por um F-16 na região do Golfo. Ocorreu porque o circuito elétrico do equipamento de identificação “amigo ou inimigo” a bordo de um helicóptero Blackhawk freqüentemente ficava superaquecido e os pilotos de quando em vez desligavam o equipamento para reduzir a temperatura). Deste modo, defrontando-se com a guerra moderna e as conseqüentes explosões de novas tecnologias, novas medidas, e novas ambiências, o ajuste e o controle de todo o processo está se transformando, progressivamente, em algo mais do que uma habilidade. Não é, todavia, um novo tipo de tecnologia. O que é necessário para controlar a situação do campo de batalha, sempre em alteração, é o emprego mais amplo da intuição em vez da dedução matemática. Mais importante do que constantes alterações do posicionamento das forças e de uma contínua atualização dos armamentos são o conjunto completo de regras de combate resultantes da transferência do campo de batalha para as ambiências não-militares. O resultado de tudo isso é que poderemos ser conduzidos para um campo de batalha desconhecido, para travar uma guerra estranha contra um inimigo que desconhecemos. Não obstante, é obrigatório que nos ajustemos e passemos a exercer o controle deste total e desconhecido processo caso a vitória seja pretendida. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS NA GUERRA ALÉM DOS LIMITES A GUERRA EM COMBINAÇÃO ALÉM DOS LIMITES representa o emprego de métodos de combate completamente novos e inusitados para a execução da guerra, onde todos os princípios acima são aplicáveis. Certamente a vitória não está garantida apenas porque um dos oponentes adere a tais princípios. Todavia, e sem a menor dúvida, o seu não cumprimento leva à derrota. Os princípios representam, sempre, condições essenciais para a vitória na guerra, mas eles não representam as únicas exigências. Na falta de um princípio que garanta a vitória, aquilo de que dispomos são apenas princípios essenciais. Deveremos sempre ter em mente esta conclusão. CONCLUSÃO “A computadorização e a mobilização criaram vários milhares de empreendimentos globais e dezenas de milhares de organizações internacionais e intergovernamentais”. E. Laszio “A humanidade está evoluindo e não mais acredita que a Guerra representa um potencial tribunal de apelações”. Bloch Num tempo em que o antigo ideal de uma “família humana” é usado como um item de propaganda da IBM, a “globalização” não mais representa uma profecia de futuristas. Vivemos numa era em que somos impulsionados pela significativa tendência da integração tecnológica, estampada em todos os rótulos informativos. Vivemos numa era agitada, alternadamente, por correntes oceânicas quentes e frias que surgem do conflito e da fusão das civilizações. Vivemos numa era perturbada pelas guerras locais que surgem aqui e ali, pelas crises financeiras do “tipo dominó” e pelo buraco de ozônio sobre o Pólo Sul. Vivemos numa uma era cujo processo de desdobramento que teve início entre o fim do século XX e o início do século XXI, e que provoca, em cada um de nós, inclusive nos futuristas e visionários, um sentimento de perplexidade e, ao mesmo tempo, de inadaptação. A integração global é ampla e profunda, e como decorrência deste fenômeno implacável, o que inevitavelmente terá de ser alterado ou até mesmo eliminado são os conceitos de autoridade nacional e de fronteiras de interesses nacionais. O conceito moderno de Estado-Nação que surgiu na Paz de Westphalia em 16480 não é mais o único representante ocupando a posição mais elevada nas organizações sociais, políticas, econômicas e culturais. O surgimento de um grande 0 Um termo amplo para definir acordo europeu firmado em 1648. Através dele ocorreu o término de uma guerra que durou 80 anos entre Espanha e os Países Baixos. Assim como, a guerra de trinta anos na Alemanha. Tal acordo pode também ser considerado como a base de todos os tratados firmados após o desmembramento do Sagrado Império Romano em 1806. 248 número de organizações multinacionais, transnacionais e não-nacionais, juntamente com as contradições inerentes entre uma nação e outra, estão apresentando um desafio sem precedentes para a autoridade nacional, os interesses nacionais e a vontade nacional. O posicionamento do Estado como sendo a entidade definitiva tem sido questionado por vários setores, e o que é mais significativo e mais preocupante é que o monopólio do Estado, quanto aos armamentos também está sendo seriamente contestado. De acordo com a publicação “Nationalis and Nacionalism”, um Estado é definido como a única entidade que pode legalmente aplicar a força. De acordo com uma pesquisa de opinião pública realizada pela revista “Newsweek” em 1997, nos Estados Unidos quanto à origem da ameaça que irá surgir no século XXI: 32% dos entrevistados disseram que viria do terrorismo; 26% indicaram o crime internacional e os traficantes de drogas; 15% acreditavam que seria do ódio racial; os Estados-Nação ficaram em quarto lugar na pesquisa. Em um pequeno panfleto que o exército norte-americano divulgou pela internet intitulado “Traduc Pamphlet 525-5: Force XXI Operations”, as forças não-nacionais, são claramente listadas como “futuros inimigos” sendo mencionado, também, que “as ameaças a segurança partindo de forças não-nacionais as quais utilizando modernas tecnologias obtiveram capacidades semelhantes àquelas dos Estados-Nação, estão cada vez mais visíveis, representando um desafio para a ambiência do Estado-Nação tradicional Tendo em vista o seu campo de ação, as ameaças à segurança podem ser divididas em três categorias: 1 - Subnacional – As ameaças subnacionais incluem conflitos políticos, raciais, religiosos, culturais e étnicos e esses conflitos desafiam as características e a autoridade do Estado-Nação a partir do interior do próprio Estado-Nação. 2 – Não-nacional – As ameaças não-nacionais não estão relacionadas aos países onde elas têm origem. As entidades criadoras dessas ameaças não fazem parte de um Estado-Nação e nem desejam estabelecer tal condição, o crime organizado regional, a pirataria e as atividades terroristas são exemplos dessas ameaças. 3 – Transnacional – As ameaças transnacionais transcendem as fronteiras dos Estados-Nação, operando em escala regional ou até mesmo global. Elas incluem os movimentos religiosos, as organizações do crime internacional e organizações econômicas informais que facilitam a proliferação dos armamentos. Ver “The World Map in the Information Age”, Chinese People: University Pres, 1997, pp. 44-46. Os militares norte-americanos não consideram as empresas multinacionais que obtêm lucros através de monopólicos como ameaças à segurança, à ambiência militar. Empresas multinacionais como a Microsoft e a Standard Oil-Exxon, cujas riquezas iguala-se à de muitas nações, podem também vir a constituir ameaças reais à autoridade nacional e podem inclusive provocar significativo impacto nos assuntos internacionais A emergência da maioria dos primeiros Estados-Nação foi através de guerras cruentas. Igualmente, durante a transição dos Estados-Nação para a globalização não existe nenhuma maneira de evitar colisões entre gigantescos blocos de interesses. A diferença reside no fato de que os meios de que dispomos atualmente, para desfazer o “nó górdio”0, não são apenas espadas, e devido a isso, não temos mais que imitar nossos ancestrais que invariavelmente tinham o recurso à força armada como sendo o último tribunal de apelação. Atualmente, quaisquer dos meios políticos, econômicos ou diplomáticos possuem agora suficiente poder para 0 Conta a lenda que Alexandre o Grande após ter invadido a Ásia Menor com o seu exército foi orar no templo de Zeus na cidade de Gordium. No templo havia uma biga que estava totalmente envolvida e presa por um cabo com um nó no final da amarração. Essa biga teria pertencido a Midras Rei da Phygia e segundo se dizia ninguém tinha sido capaz até o momento de desfazer esse nó. Defrontado com o problema Alexandre empunhou sua espada e com um sói golpe rompeu o nó. A expressão “nó Górdio” tem o significado de algo problemático e insolúvel. 249 suplantar os meios militares. Entretanto, a humanidade não tem razões para se regozijar, pois o que foi feito nada mais é que substituir, o quanto possível, a guerra sanguinária por uma guerra sem derramamento de sangue. As guerras futuras terão, com mais freqüência, certos tipos de hostilidades como, por exemplo, a guerra financeira em que uma nação poderá ser subjugada, sem que ocorra derramamento de sangue. Pense um pouco sobre isso! Quais teriam sido as conseqüências desastrosas para as economias de Hong Kong e até mesmo da China se a batalha de agosto de 1998 para proteger as finanças de Hong Kong, tivesse sido perdida? Tais situações são possíveis de ocorrer e se não tivéssemos o colapso do mercado financeiro da Rússia que colocou sob ataque por todos os lados as especuladores financeiros. É difícil prever quais teriam sido as conseqüências. Como decorrência, ao mesmo tempo em que, num sentido estrito, contraímos a ambiência da batalhas, num sentido amplo, transformamos todo o globo terrestre em um campo de batalha. Neste campo de batalha as pessoas ainda brigam entre si, pilham e matam-se umas as outras como antes, mas as armas são mais aperfeiçoadas e sofisticadas e deste modo, embora menos sanguinária, a guerra é igualmente brutal. Considerada esta realidade, o sonho da raça humana quanto à paz é ainda tão ilusório como sempre foi. Mesmo que procuremos ser otimistas, a guerra não será eliminada totalmente dentro um futuro previsível, seja ela sanguinária ou não. Uma vez que tudo o que for acontecer, em última análise, tornar-se-á coisa do passado, o que nós podemos e devemos fazer no presente é enfocar como alcançar a vitória. Defrontados com a guerra em sua interpretação mais ampla, e que irá desdobrar-se em um campo de batalha sem fronteiras, não é mais possível depender apenas das forças armadas e de seus armamentos para alcançar a segurança nacional em seu significado mais amplo, como também, não é possível proteger aqueles interesses nacionais já estratificados. Obviamente a guerra está em um processo de transcender a ambiência dos militares, das unidades militares, e dos assuntos militares, transformando-se, cada vez mais, em um tema para os políticos, cientistas e até mesmos os banqueiros. Como conduzir uma guerra, obviamente, não é mais um problema a ser resolvido, isoladamente, pelos militares. 250 No início do século XX, Clemenceau declarou que “a guerra é um assunto muito sério para ser deixado a cargo dos generais”. A história dos últimos cem anos, todavia, nos mostra que a transferência da direção da guerra para os políticos também não representa a solução ideal para solucionar este importante assunto0. As pessoas estão se desviando para a civilização técnica, esperando encontrar, nos desenvolvimentos tecnológicos, uma válvula de escape que permitiria o controle da guerra. Todavia, o que causa desesperança é constatar que o século XX está em seus derradeiros momentos e, ainda que a tecnologia tenha feito grandes avanços, a guerra continua sendo um cavalo indomado. As pessoas ainda esperam milagres da revolução nos assuntos militares, esperando que as armas de alta tecnologia e as armas não-letais possam reduzir as perdas de vidas humanas civis e, até mesmo militares, visando com isso a diminuir a brutalidade da guerra. Entretanto, a ocorrência da revolução nos assuntos militares, em paralelo a outras revoluções, provocou uma alteração na última década do século XX. O mundo já não é mais o que era antes, mas a guerra continua sendo tão brutal como sempre foi. A única diferença é que essa brutalidade expandiu-se através dos diferentes modos pelos quais dois exércitos se confrontam. Raciocinem quanto ao desastre aéreo em Lockerbie. Raciocinem quanto às duas bombas em Nairobi e Dar es Salaam. Em seguida, raciocinem sobre a crise financeira no leste asiático. Não deveria ser difícil entender o que significa este tipo diferente de brutalidade. Isto sim é a globalização. Isto é a guerra na era da globalização. Ainda que represente apenas um de seus aspectos, ele é chocante. Quando os militares, testemunhas desta encruzilhada dos séculos, se defrontarem com essa realidade, talvez cada um deles devesse perguntar a si mesmo: — o que é que ainda podemos fazer? Se indivíduos como Morris, Bin Laden e Soros podem ser considerados “militares” das guerras do futuro, então quem não é um militar? Se personalidades como Powell, 0 Schwartzkopf, Dayan e Sharon podem ser considerados políticos Não importa se estamos nos referindo a Hitler, Mussolini, Truman, Johnson, ou, Sadan,. A realidade é que nenhum deles conseguiu controlar a guerra com sucesso. O próprio Clemenceau pode ser inserido nesta relação. 251 envergando uniformes militares, então quem não é um político? Este é o enigma que a globalização e a guerra na era da globalização deixaram para a consideração dos militares. Ainda que as fronteiras entre militares e não-militares tenha sido eliminada e o hiato entre guerra e não-guerra seja praticamente inexistente, a globalização interligou e encadeou todos os problemas difíceis, e nós devemos encontrar a chave para desvendar estes problemas. Esta chave deveria abrir todos os encadeamentos que estejam ligados à guerra, devendo ser aplicável a todos os níveis e ambiências, desde a diretriz de guerra, passando pela estratégia, pelas técnicas operacionais até as táticas, como também deve ajustar-se ao proceder dos indivíduos, desde políticos e generais até os soldados rasos. Nós não podemos conceber qualquer outra possível chave que não seja a “guerra além dos limites”. 252 PALAVRAS FINAIS As motivações para a elaboração deste livro originam-se das manobras militares que despertaram a atenção do mundo. Três anos atrás, devido à minha participação em manobras, encontrei-me com Xiangsui em uma pequena cidade em Fujian, chamada Zhao An. Naquela época, a situação, a cada dia, estava ficando mais tensa na costa sudeste, com os oponentes em ambos os lados dos estreitos prontos para uma demonstração de força e, até mesmo, uma força tarefa norte-americana com dois porta-aviões aproximava-se da área, a grande velocidade, para adicionar mais confusão ainda. Naquela situação uma tempestade já estava se formando nas montanhas e a situação militar era tão grave, que subitamente as pessoas foram levadas a “imaginar estratégias capazes de responder àquela situação”. Daí, que resolvemos escrever este livro, um livro que pudesse reunir as preocupações e os pensamentos que cada um de nós acumulou em várias décadas anteriores, e especialmente durante os últimos dez anos, quanto aos assuntos militares. Não há como relatar, detalhadamente, quantas chamadas telefônicas foram feitas, o volume da correspondência que enviamos, e quantas noites ficamos acordados nos três anos seguintes, e a única coisa que pode servir de evidência de todo esse esforço é este pequeno livro. Devemos, em primeiro lugar, pedir desculpas aos leitores pelo fato de que, embora fossemos muitos escrupulosos e nos esforçássemos com todo o esmero na elaboração deste livro ainda assim depois que a palavra escrita passou a refletir as idéias, de modo semelhante às estrelas cadentes que cruzam os céus, transformando-se em meteoritos após o seu resfriamento, todos vocês, (incluindo nós mesmos), ainda poderão encontrar muitos erros e colocações que são inadequadas. 253 Não iremos usar aquelas palavras de desculpas “pedimos sua generosa boa vontade” visando obter perdão. Tão somente iremos introduzir as correções necessárias na segunda edição deste livro (se houver uma). Por ocasião da publicação deste livro desejamos sinceramente agradecer ao Chefe do Estado-Maior Cheng Butao e ao Vice-Chefe do Estado-Maior Huang Guorong da “PLA Literature and Arts Publishing House” por seus constantes apoios, que possibilitaram que este livro fosse publicado em um curto período de tempo. Gostaríamos também de agradecer a Xiang Xiaomi, Diretora do “First Book Editing Department”. Ela reviu cuidadosa e rigorosamente todo o livro, de modo semelhante ao que fez com os outros quatros livros que editamos, e nos proporcionou recomendações muito valiosas. Nós não conhecemos outra maneira mais adequada para expressar nossos agradecimentos além da profunda gratidão que sentimos. Por último, também gostaríamos de agradecer a nossa família pelos sacrifícios que enfrentaram, como conseqüência da elaboração deste livro e, novamente, isto não pode ser expresso por palavras. O livro, em sua versão manuscrita, foi elaborado entre 2 de março e 8 de dezembro de 1998 em Beijing. Estas palavras finais foram escritas em 1 de fevereiro de 1999. 254 CURRÍCULO DOS AUTORES Qiao Liang, cujos antepassados vieram da Província de Huan, nasceu no condado de Xin, na Província de Shanxi, de uma família de militares, no ano de 1956. Ele é um membro Da União Chinesa de Escritores, e atualmente serve como Diretor-assistente do Escritório de Produção do Departamento de Política da Força Aérea e tem o posto de Coronel na Força Aérea além de ser um escritor de nível um. Suas obras mais importantes incluem “Gate to the Final Epoch”, “Spiritual Banner”, e “Great Glacial River”. Ele tem recebido diversos prêmios nacionais e militares. Além de suas criações literárias ele tem se dedicado, durante muito tempo, à pesquisa da teoria militar e juntamente com outros escritores produziu as seguintes obras: “A Discussion of Military Office Quality”; “Viewing the Global Military Big Powers”; “A Listing of the Rankings of Global Military Powers”. Wang Xiangsui nasceu em Guangzhou em 1954 e sua família é de origem militar. Ele foi sucessivamente instrutor político, comissário político de grupo, comissário político regimentar e sub-comissário político divisional. Atualmente ele serve na unidade política da região militar da Força Aérea em Guangzhou e tem o posto de Coronel. Ele colaborou com outros autores na elaboração dos livros “A discussion of Military Officer Quality”, Viewing the Global Military Powers”; e “A Record of Previous Major Global Wars”. 255