A cultura caipira no cinema brasileiro: um estudo da filmografia de Mazzaropi Patrícia Gomes dos Santos1 Cristina Schmidt Silva2 1. Introdução “O Segredo do meu sucesso foi falar a língua do meu povo”. Essa era sempre a resposta de Mazzaropi quando perguntado sobre o sucesso de seus filmes. Sempre interpretou o jeito caipira, não era um personagem que havia nascido no cinema, esse jeito caipira é uma herança de seu avô João José Ferreira, segundo Amacio Mazzaropi: Quando ia à missa e festas, usava um teninho seco, paletó curto e a calça acima da botina, sempre amarela, deixando aparecer um pedaço da canela. O chapéu de palha não saía da cabeça (...) Por isso mesmo eu morando no centro de Taubaté, nos fins de semana, me mandava para a casa do meu avô, zona rural (...) Eu, e meu avô e os trabalhadores da roça, eram causos e mais causos, cantigas e mais cantigas. Eu adorava cantar “Oi Sapeca”. (RODRIGUES e SOUZA, 1994, p. 10) Na sua época de criança mazzaropi sempre montava um cirquinho no quintal para entreter a molecada. O tal caipira veio oficializar –se em apresentações em circos, onde ele foi denominado “O cômico caipira Mazzaropi” desde então sua carreira é marcada por peças teatrais, números musicais, brincadeiras de auditório e as canções, naquele tempo era comum apresentar tais números no cinema. Na década de 50, Mazzaropi fez vários testes e então em 1951 fez seu primeiro filme “Sai da frente”, na companhia Vera Cruz. Eva Paulino Bueno também compara os filmes de mazzaropi e o Cinema Novo e afirma “No confronto entre as propostas de Mazzaropi e as do Cinema Novo, é oportuno considerar que muitos dos filmes cinemanovistas se apoiavam num experimentalismo vanguardista... , [...] estava aliado ao político e ao ideológico”. Empresto-me de umas palavras de mazzaropi a repeito de seu amor pelo cinema;(1999) “A minha relação com o cinema é coisa séria, um namoro, um ato de entrega “. (Mazzaropi – imagem de um caipira, 1994, p.23). As bases desse trabalho é analisar até que ponto o personagem vivido por Mazzaropi no cinema é caipira, relacionando os seus filmes com a cultura popular brasileira e também à cultura regional, podendo assim rever a nossa visão do que é um caipira brasileiro, a análise consiste em provar que essa visão de caipira burro, sem informações não é necessariamente verdade. Nos filmes de Mazzaropi é mostrado um caipira esperto, um jeitinho brasileiro para resolver os problemas, ou seja, buscar o entendimento do que realmente se define o “jeca” em sua filmografia. Segundo sua própria concepção do que era um sujeito do interior: “Caipira é um homem comum, inteligente, sem preparo. Alguém muito vivo, malicioso, bom chefe de família, mas que não teve escola, daí aquele seu jeito de falar”.( OLIVEIRA, 1986.) 1 Estudante do Curso de Jornalismo; bolsista UMC programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC. Email: [email protected]. 2 Professora Orientadora, Curso de Comunicação Social da Universidade de Mogi das Cruzes. E-mail: [email protected]. 1 No livro Inteligência do Folclore, Renato Almeida (1974, p.03) diz que todas as sociedades possuem uma sabedoria popular e define o folclore como o “equipamento mental do povo”, entendidos como os contos, mitos, provérbios, adágios, adivinhas, canções, em suma, “a literatura dita oral, por se transmitir de boca a boca e cuja criação se faz no meio do povo”. Em a Literatura no Brasil de Afrânio Coutinho; “ O estudo do folclore no Brasil iniciou-se pela colheita de sua literatura oral”.(2004, p.185). Mas para entender o universo do folclore é importante contextualizar o universo da cultura popular brasileira, antes até, o universo da cultura. Por isso, Almeida cita em seu livro Sol Tax que define cultura como aquela “concebida como a ação através dos indivíduos, mas para a sociedade” (1974, p.166). E ainda faz referência a Franz Boas (p.167), que considera a cultura um “produto da mentalidade humana”. Essa cultura mais ligada ao universo popular e ao que foi colocado como literatura oral, ou transmissão do saber pelo processo oral pelos grupos rurais, Amadeu Amaral em seu livro Tradições Populares (1982, p.113) diz que “ de quando em quando, a arte do caipira se complica, deita as manguinhas e tece brincadeiras rimadas para dar mostra do seu virtuosismo”, e exemplifica com as estrofes do poeta PEDRO SATURNINO: Primeiro eu peço desculpa Se faço mal em falá: A respeito dansadô, Tenho gosto pra dansá; A respeito inventá moda, Tenho fama no lugá. A cultura caipira sempre foi vista como uma vida rústica, grosseira e, por isso, inferior, e a sua própria imagem sempre foi a de um homem preguiçoso, doente e ignorante, como é mostrado em várias literaturas. Mazzaropi trouxe em seus filmes um caipira que foge aos padrões do que nos foi colocado por essas publicações. Amacio Mazzaropi ficou conhecido como o “cômico caipira MAZZAROPI”, LUIZ CARLOS SCHRODER de Oliveira afirma: [...] Seus filmes eram de singela captação das desventuras do caipira que vinha para a cidade e tinha que aprender novos conceitos, às vezes, só no campo, outras, só nos grandes centros. Mas sempre envolvendo o caipira e retratava parcialmente o dia a dia do povo brasileiro. (Oliveira, 1986, p. 81.) Em seu livro Mazzaropi – Saudade de um povo, Schroder de Oliveira mostra uma visão de Amacio Mazzaropi no cinema brasileiro e o quanto ele amava esse país chamado Brasil, e o quanto ele queria transformar a indústria brasileira. Para ele “ o cinema era uma indústria como outra qualquer. Pretendia fazer cinema – indústria. Indústria brasileira queria ele, e não exportadora. Uma indústria que fosse capaz de suprir o mercado interno consumidor para seus filmes.” (1986, p.103). Mazzaropi comentou certa vez sobre o cinema- indústria: “Não podemos pensar em conquistar o mercado externo, se não temos nem lâmpadas aqui. Tudo que temos vem de lá. Mas, se pudermos ter uma indústria produzindo fitas nacionais, se nossas salas ficassem ocupadas por fitas nacionais, quanto dinheiro nós estaríamos evitando de mandar para fora”, dizia ele.(1986, p. 103) . Para Glauco BARSALINI, MAZZAROPI é um crítico do sistema, não importando qual seja ele: Símbolo da resistência cultural de um povo, ajustado à maneira desse povo inserir-se na economia moderna, a personagem de Mazzaropi passou a ser identificado com seu próprio criador, fenômeno característico da cultura de massa que o cineasta soube explorar muito bem. (2002; p. 109) 2 Barsalini relacionou a filmografia de Mazzaropi com diferentes situações em que se encontrava o Brasil,em sua análise “ o seu caipira foi-se alterando em função das diferenças econômicas, políticas e sociais pelas quais o Brasil passou”. Este autor cita inclusive a Revista Veja(Salem,1970), quando divulga entrevista de Mazzaropi que ao ser perguntado sobre qual era o seu público, responde: “Meu público é o Brasil, do Oiapoque ao Chuí. Eu loto casa em São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Acre, Ronônia, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, ilha do Bananal”. (sic) ( Revista Veja, Apud, Barsalini; 2002,p.83). Dentro das teorias da Folkcomunicação podemos dizer que Mazzaropi, ao afirmar que “fala a língua de seu povo”, ele está adotando uma postura que Luiz Beltrão chama de Líder de Opinião ou líder folk, e busca utilizar de mensagens e códigos próprios ao seu público, ou seja, usa em seus filmes. O líder de opinião tem essa capacidade: é um tradutor, que não somente sabe encontrar palavras como argumentos que sensibilizam as formas pré-lógicas que (...) caracterizam o pensamento e ditam a conduta desses grupos sociais. (BELTRÃO, 2004, p.39) 2. Desenvolvimento 2.1. Metodologia Este estudo analisa os filmes de Mazzaropi como um meio que registra uma imagem de caipira. Será estudado os seguintes filmes, Candinho(1953), Pedro Malasartes(1960) Jeca Tatu(1959) Tristeza do Jeca( 1965), Casinha Pequenina(1962), Betão Ronca Ferro(1970) Jeca e seu filho Preto(1977), Sai da Frente( 1951), Jeca e a Freira( 1963), Jeca contra o Capeta(1975) . Na primeira etapa foi realizada uma pesquisa bibliográfica e documental sobre Mazzaropi, seus filmes, sobre as características sociais – da época do filme e da época atual (relacionados ao homem caipira)-, sobre os recursos tecnológicos da época e o contexto de produção. Para o segundo momento adotou-se a análise da imagem como método. Para Iluska Coutinho: A importância da Análise da Imagem poderia ainda ser avaliada pelo espaço a ocupado pelos registros visuais na vida em sociedade, ou melhor, no próprio reconhecimento das origens do homem na concepção religiosa, que reforça os conceitos de imagem e semelhança na construção do ser humano. (in DUARTE e BARROS, 2005, p.331) A autora diz que na pesquisa em comunicação com o estudo da imagem pode ser feita em três linhas: analisar a imagem como documento; análise através de exercícios do ver; e a análise como narrativa. Nesta pesquisa, adotaremos a primeira linha, onde os filmes de Mazzaropi serão estudados como documento de uma história e cultura popular. Será levantada uma pesquisa bibliográfica e documental sobre os filmes, sobre as características sociais – da época do filme e da época atual (relacionados ao homem caipira)-, sobre os recursos tecnológicos da época e o contexto de produção. E também se fez uma análise fílmica que segundo VANOYE e GOLIOTLÉTÉ: Analisar um filme ou um fragmento é, antes de mais nada, no sentido científico do termo, assim como se analisa, por exemplo, a composição química da água, decompô-lo em seus elementos constitutivos. É despedaçar, descosturar, desunir, extrair, separar, destacar e denominar materiais que não se percebem isoladamente “a olho nu”, pois se é tomado pela totalidade. Parte-se, portanto, 3 do texto fílmico para “desconstruí-lo” e obter um conjunto de elementos distintos do próprio filme. Através dessa etapa, o analista adquire um certo distanciamento do filme. Essa desconstrução pode naturalmente ser mais ou menos aprofundada, mais ou nenos seletiva segundo os desígnios da análise. (1994, p. 15) 2.2. Vida e Obra de Amacio Mazzaropi “Os filmes de Mazzaropi era o jeito de mostrar a ferida sempre aberta da sociedade, onde o homem comum, sem poder, rir, ria” comenta o cineasta Pedro Della Paschoa Junior. Osvaldo Massaini, também cineasta, afirmou que este “foi um homem que conseguiu angariar a simpatia do homem brasileiro, porque ele encarnava a configuração do próprio povo brasileiro”. E para o poeta J. G. de Araújo Jorge Mazzaropi “não era propriamente aquele Jeca lobatiano, resíduo de nossa miséria, mas o Jeca brasileiro, astuto, inteligente, misturando ignorância, sagacidade, na mesma paisagem de abandono”. (OLIVEIRA, 1986, p. 58) Segundo os livros Mazzaropi – a saudade de um povo (Oliveira, 1986) e Mazzaropi A imagem de um caipira (Carlos Roberto e Olga Rodrigues, 1994), Amacio Mazzaropi, nascido aos 9 de abril de 1912, na casa nº 5, da Rua Vitório Carmilo, em São Paulo e Batizado na Igreja de Santa Cecília. Filho do italiano Bernardo Mazzaropi e de Clara Ferreira Mazzaropi, filha de portugueses. Seus pais eram comerciantes da Barra Funda, gueto de italianos da capital paulista. O avô por parte de pai chamava-se Amazzio Mazzaropi e sua avó Ana Mazzaropi. Da parte da sua mãe era João José Ferreira e Maria Pita, ambos residiam no Bairro dos Guedes na cidade de Tremembé pequena cidade do Estado de São Paulo. O avô de Mazzaropi, João José Ferreira, trabalhava na agricultura, tocava viola muito bem e, quando ia à missa, usava um paletó curto e a calça acima da botina, sempre amarela, deixando aparecer um pedaço da canela. O chapéu de palha não saía da cabeça. Era um tipo que se destacava na cidade. Mazzaropi sempre ia à casa do seu avô, em zona rural. Lá eles ficavam sentados no terreiro da casa, à luz da lua e do fogo, com uma pequena foqueira contando causos e mais causos, cantigas e mais cantigas. Em 1932 chegou em Taubaté a troupe de Luiz Carrara, Mazzaropi ajudou na montagem do cenário, saiu pela cidade divulgando o espetáculo e acabou fazendo um teste para entrar na troupe. Ele fez com Luiz Carrara a peça “A Herança do Padre João”, e as criticas da época começaram a nota-lo. Em 1934 ingressou na Troupe de Olga Crutt, uma troupe de nome, muito famosa na época. Olga Crutt era uma dama do teatro, atriz há vinte anos. Amacio havia entrado com todas as suas forças e logo percebeu que precisava voar alto e criar sua própria troupe. As troupes sempre se apresentavam em cinemas, após a projeção dos filmes. Convenceu sua mãe e seu pai, seu pai vendeu o botequim e os dois o acompanharam por esse mundo afora, trabalhando com ele, lado a lado, organizando e atuando como atores. A Olga Crutt veio trabalhar com ele e adotou o nome artístico de Olga Mazzaropi. As troupes se apresentavam nos cinemasapós a exibição das fitas, com a chegada do Cinemascope a tela passou a ser fixa, não dava para ser removida, como antigamente, o que impedia a apresentação das troupes. A saída foi o pavilhão, que consistia num barracão de madeira, coberto de zinco, mantendo, internamente, as características próximas do teatro. Construiu o seu pavilhão e o inaugurou em Jundiaí e logo se apresentou em vários lugares. As críticas jornalísticas sempre colocaram seu personagem como “caipira admirável”, “perfeita encarnação do caipira”, “dominador original”. O seu caipira sempre buscava formas mais elaboradas. Ele sempre conversava com o povo, o qual parecia ser o seu grande repertório de referências e de aprendizado. Em 1944 o pai de Amacio adoeceu, o que o fez gastar tudo o que havia ganhado. Por isso, não pode mais continuar com o pavilhão. Foi então para o Rio de Janeiro a convite do empresário Walter Pinto. O grande sucesso da época no Teatro João Caetano, era a dupla Beatriz Costa e Oscarito e esse não queria renovar o contrato, Mazzaropi foi para substituí-lo. Mas no dia de sua primeira 4 apresentação, Oscarito renovou o contrato. Isso foi um golpe para o artista, e o deixou profundamente magoado. Em fins de 1945, foi convidado pelo ator Nino Nello, proprietário de uma companhia de Teatro com o mesmo nome, para atuar no Teatro Colombo em São Paulo, permanecendo com ele um ano e em 1946 entrou para a rádio, tinha 34 anos, conversava com todos os grupos populares da cidade, batia papo e costurava conversa com piada. Quando a Tupi melhorou com seus 50 mil quilowats, montou o programa Rancho Alegre levado ao ar aos domingos. Esse programa preparou, criou um público fiel e esperançoso diante da arte de Mazzaropi. Era um fenômeno. Ficou na Tupi por sete anos. Na década de 1950, foi a vez de estrear na Televisão, com o Show a que dera o mesmo nome usado na Rádio – “Rancho Alegre”. Levando ao ar, ao vivo, todas as quartas-feiras, foi sucesso marcante na televisão, do mesmo modo como foi no teatro e no rádio. O jornal RADAR de São Paulo, publicou matéria onde comentava “desse jeito, não se sabe onde poderá ir o cômico paulistano, pois a televisão é o campo do futuro, e Mazzaropi já lavrou e semeou o seu torrão”. Na década de 1950, Mazzaropi fez testes para um filme e, em 1951, fez o seu primeiro filme Sai da Frente. O caipira nesse filme é um caipira urbanizado, há alguns traços do homem rural e muitas características do homem marginalizado urbano. Vendeu tudo o que tinha e criou sua própria produtora, a PAM FILMES – Produções Amacio Mazzaropi. Mazzaropi fez 33 filmes, sendo que o último não foi concluído, pelo fato de Amacio falecer por complicações de câncer na medula óssea, no dia 13 de junho de 1981. Seus critérios pessoais na escolha dos elencos, a forma de conduzir seus negócios na Pam Filmes é que dificultaram a continuidade das suas atividades pelos seus seguidores. 2.3. O caipira em seus filmes Numa época em que o urbano invade o universo rural, o Jeca espelha contradições entre dois mundos diversos, a ingenuidade e a malicia. Segundo MILTON de FREITAS: (...) A filmografia de Amacio Mazzaropi, não deve ser entendida apenas como um processo de comunicação cinematográfica. Há nessa postura um descompromisso em relação a uma obra que, nos seus aspectos intrínsecos, abre um leque temático muito sério. (1994, p.07) Os filmes de Mazzaropi sempre abordaram problemas concretos, que afetavam o Brasil em determinado momento, e esse jeito desengonçado do jeca permitia que o público, ao mesmo tempo em que se identificava com os problemas na tela, ria das situações apresentadas. Esse era o seu jeito de fazer filmes, com humor, e esse jeito que está em tudo o que ele sempre faz é a cultura do “povo”. Ele estava falando a língua do público ao qual direcionava suas produções. O estereótipo de “caipira burro” não é mostrado em seus filmes, pelo contrário, é mostrado um caipira esperto que consegue sair dos problemas, com um “jeitinho malandro”, outro estereótipo usado para caracterização popular. Ele estava preocupado com a popularização do cinema brasileiro, e os cineastas não o entendiam. Mazzaropi costumava dizer que “eram um bando de intelectuais, fazendo filmes para intelectuais e que não dá nem meia dúzia de pessoas”. Para ele o que os seus filmes mostravam era o que o grande público queria ver, coisa simples do dia a dia, da vida do brasileiro, e por isso dava tanta bilheteria. Glauco Barsalini diz que “Mazzaropi era um intelectual do povo, um homem que compreendia perfeitamente a forma popular de enxergar o mundo, que tinha organicidade com a forma através da qual o trabalhador vê o mundo”. (2002, p. 41). Para o autor, ‘ele sempre representou o resgate das tradições culturais, ele era a nossa resistência cultural”. (Barsalini, 2002, p.62). 5 3. Resultados Finais De acordo com a teoria da folkcomunicaçao, a cultura popular é transmitida por meios próprios de comunicação, em linguagem e canais adequados a cada grupo. Já nos meios de comunicação de massa ocorre a apropriação de referências do popular para criar seus produtos midiáticos, isso é a Folkmídia (Schmidt, 2006). Os filmes de Amacio Mazzaropi são resultado dessa apropriação, pois buscam o universo caipira brasileiro para transmitir exatamente o que se passava naquele determinado momento da história e cultura. Segundo Antonio Hohlfeldt, Folkcomunicação não é o estudo da cultura popular ou do folclore. E sim “é o estudo dos procedimentos comunicacionais pelos quais as manifestações da cultura popular ou do folclore se expandem, se sociabilizam, convivem com outras cadeias comunicacionais, sofrem modificações por influência da comunicação massificada e industrializada, ou se modificam quando apropriadas por tais complexos”. (1990, p.1-6) Nos filmes, o caipira não é propriamente aquele Jeca de Monteiro Lobato, resíduo de nossa miséria, mas o jeca brasileiro, astuto, inteligente. Representa uma realidade popular daquele momento, tem os mesmos conflitos enfrentados pelo homem simples da década de 1950. Alguns filmes dele não passam de apenas histórias engraçadas. Outros se passam na cidade, e ele assume um personagem rico onde a história acontece em um contexto político e social da época. Outros filmes retratam o personagem saindo do campo para a cidade grande, mas sempre no final volta para o meio rural. Também nesses filmes era mais comum retratar um problema real que as pessoas do campo enfrentavam na época, tanto com relação aos preconceitos, política ou até mesmo o estereotipo de que o caipira é burro e ingênuo. Analisou-se o filme Tristeza do Jeca, que se passa no campo e o assunto principal é a política, as eleições. E tudo se passa em torno do personagem do Jeca. O que o Jeca fala, todos escutam. O filme trata a história de dois políticos que disputam a eleição e, no vale tudo para angariar votos, tentam enganar os eleitores, simples pessoas do campo, usando o Jeca como cabo eleitoral. O problema é que o Jeca acaba fazendo campanha para os dois. O filme foi visto várias vezes, buscando assim um melhor entendimento. Os diálogos foram transferidos para o papel, o filme foi cortado em várias cenas para facilitar a análise detalhada dos objetos significativos, cenários, música, etc. Durante a análise foi considerado a época do filme, a história do filme e um fato importante que tenha acontecido na época, se havia alguma relação com o filme e a linguagem utilizada. E ainda se o filme procurou mostrar contradições da sociedade para a massa popular, ou se queria apenas divertir essa público. Refletiu-se sobre esse aspecto tendo em vista que “as formas cinematográficas constituem-se num fundo cultural no qual os cineastas se inspiram, e cabe ao analista explicar os movimentos que dele decorrem”. (VANOYE e GOLIOT-LÉTÉ, 1994, p.37) Nesse levantamento bibliográfico na biografia podemos evidenciar que os autores apresentam Mazzaropi como um cineasta de sucesso, direcionado ao público simples, trazendo questões relacionadas à cultura popular em cada época. A filmografia de Amacio Mazzaropi foi extremamente importante desde a década de 50, em cada filme ele retratava um problema que o Brasil e as pessoas estavam enfrentando no momento, e ele passava isso com humor trazendo à tona as características da cultura popular brasileira, representada pelo caipira no personagem central. Procurou mostrar em seus filmes uma outra imagem do caipira, diferente dos estereótipos presentes no imaginário coletivo. Em todos os seus filmes, o caipira, a cultura popular está presente, com seu personagem Jeca, o que caracteriza Mazzaropi como um líder de opinião de seu tempo e de sua gente caipira. 4. Referências Bibliográficas 6 AMARAL, Amadeu. Tradições populares. 3.ed.-São Paulo: hucitec; Brasília/: 1nl,1982 BELTRÃO, Luiz. Folkcomunicação: Teoria e Metodologia. São Bernado do Campo: Universidade Metodista, 2004. BUENO, Paulino Eva. O Artista do Povo:Mazzaropi e Jeca Tatu no cinema do Brasil. Maringá: Eduem, 1999. CÂNDIDO, Antonio. Recortes. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. COUTINHO, Afrânio; COUTINHO, Eduardo de Faria. A Literatura no Brasil. 7ª.Ed. São Paulo: Global, 2004. DUARTE, Jorge e BARROS, Antonio. Métodos e Técnicas de Pesquisa em Comunicação. São Paulo: Atlas, 2005. GLAUCO, Barsalini. Mazzaropi – O Jeca do Brasil. São Paulo: Ed.Atomo, 2002. OLIVEIRA, De Schroder Carlos Luiz. Mazzaropi: A Saudade de um Povo. Londrina/PR: Cedm, 1986. 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