Universidade do Vale do Paraíba Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Isabel Cristina Fracasso Póvoa Brycon opalinus (CUVIER, 1819) (CHARACIFORMES): AVALIAÇÃO HEMATOLÓGICA E GENÉTICO-BIOQUÍMICA FRENTE À HIPÓXIA São José dos Campos 2008 Isabel Cristina Fracasso Póvoa Brycon opalinus (CUVIER, 1819) (CHARACIFORMES): AVALIAÇÃO HEMATOLÓGICA E GENÉTICO-BIOQUÍMICA FRENTE À HIPÓXIA Dissertação de mestrado apresentada no Programa de Pós Graduação em Ciências Biológicas, como complementação dos créditos necessários para obtenção do título de Mestre em Ciências Biológicas. Orientador: Profª Drª Maria Regina de Aquino Silva São José dos Campos, SP 2008 P894b lsabelCrisüna Fracãsso Povoa, ES):avâliâção Bryconopalinus(CUVIER,I 819) (CHARACIFORM / lsabelCrisitna Fracasso fÍentea hipóxia hematologica e genético-bioqulmiça Prof.aD|a.MariaRegina deAquinoSilva.SãoJosédos Póvia:Orientadora campos,2008. I Discolaser color em Ciências DissêÍtaÉoapr€,sentada ao Programade Pós-Graduação do da Universidade do Instituto de Pesquisa e Dêsenvolvimento Biológicas Va,edo PaÍaíba. 2008. 1. Rio PaÍaÍbado Sul 2. DegradaÉoambiental3. Anóxia 4. Aguas dêAquino, Orient.ll. TÍtulo 5. Peixesl. Slva,MariaRegina Residuárias CDU:504 parafinsâcâdêmicos a reprodugão e científicos, exclusivamente Autorizo, porprocessos ou fotocopiadores totalou parcialdestadissertação, que a fonte. desde citâda êletrônica, transmissão Assinatura doAluno: Dalada defesa: 0L , turrto , trng ISABEL CRISTINA FRACASSOPOVOA o'BRycoN oPALTNUS(cwrER, 1819)(cEARAcIFoRMÉs)r AVALIAÇÃo FRENTEÀ HIPOXIA'' HEMATOLóGICA E GENÁTICO-BIOQUÍMICA do grau de Mestre em Ciênoias Dissertaçãoaprcvaalacomo reqúsito parcial à obtenção e em CiênciasBiológicas'do Instituto de Pesqursa Biológicas,do Programade Pós-Gmduação Josédos campos,sP, pela seguinte Desenvolvimentoda universidadedo Vale do Paraíba,são bancaexaminadora: Prol Dr. DRAUZIO EDUARDO NARETTO RANGEL Pfof. DÍa.MARIA REGINA DE AQUINO SILVA Prof.Dr. ORLANDO MOREIRA FILHO (UFSCar Prof. Dr. MarcosTadeuTavaÍesPacheco Diretor do IP&D - UniVaP SãoJosédosCampos,0l dejulhode 2008 “Só engrandeceremos o nosso direito à vida, cumprindo o nosso dever de cidadãos do mundo” Gandhi A minhas razões para viver, Amândio e Vinícius. Aos meus pais Alceu e Lourdes Agradecimentos Agradeço a Deus pela oportunidade de poder buscar o “SABER”. A Profª Drª Maria Regina de Aquino Silva, pela amizade, pela simplicidade, pela humildade em transmitir seus valiosos conhecimentos e total apoio. A Profª Drª Maria Luiza Barcellos Schwantes,Universidade Federal de São Carlos, pelas valiosas observações e suporte técnico. Ao Amândio, meu companheiro nesta jornada, pela paciência, pelo incentivo, pelo apoio incondicional, pelo exemplo e pelo amor. Ao Vinícius, meu horizonte, que mais tarde vai entender a grande importância das horas ausentes. A minha amiga Solange pelo apoio, pelo exemplo de l uta e otimismo. Ao Rodrigo pelas horas de “eletroforese”. As minhas amigas Drª Claudia e Drª Silvana do Laboratório Quaglia, que tão gentilmente atenderam meu pedido. Aos diretores do Laboratório Quaglia pela pronta atenção, estimulo aos estudos científicos e exemplo de competência. As bibliotecárias da UNIVAP, em especial a Rubia pela competência, apoio e delicadeza. Ao Diretor da Faculdade de Engenharia, Arquitetura e Urbanismo – FEAU, pelo uso dos laboratórios. A Profª Drª Cristina Pacheco Soares do Laboratório de Cultura de Células-IP&D, pelo uso do laboratório. A todos que de alguma maneira contribuíram para que este trabalho fosse realizado, estão todos no meu coração. Brycon opalinus (Cuvier, 1819) (Characiformes): avaliação hematológica e genético-bioquímica frente à hipóxia Resumo Um dos principais problemas enfrentados pela bacia do rio Paraíba do Sul está na disposição de efluentes de origem doméstica e industrial em suas águas, causando entre outros problemas a depleção oxigênio dissolvido. No presente trabalho foram estudadas as respostas hematológicas e bioquímicas, frente a baixas concentrações de oxigênio da espécie de peixe Brycon opalinus, endêmica do rio Paraíba do Sul. Os animais foram divididos em três grupos: controle ou normóxia, hipóxia (hpx) 3 horas, hipóxia (hpx) 6 horas. Os valores para eritrócitos em normóxia (1.9 ± 0.2 6 3 6 3 6 3 10 /mm ), hpx 3 horas (2.1 ± 0.5 10 /mm ) e hpx 6 horas (2.4 ± 0.2 10 /mm ), tiveram diferença significativa (p<0,01) entre grupo controle e hpx 6. Para o hematócrito foi observada diferença estatística significativa (p<0,05), em relação ao grupo controle (37,7 %) e hipóxia 6 horas (44,6 %). Para o VCM, o valor maior foi em hipóxia 3 horas (200.6 ± 4.0 µm3) e praticamente invariável em normóxia (190.3 ± 8.2 µm3) e hipóxia de 6 horas (190.1 ± 6.6 µm3). Para hemoglobina corpuscular média (HCM) e concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM) observaram-se os menores valores na condição de hpx 3 horas (61.5 ± 4.4 pg e 30.5 ± 3.8 % , respectivamente) em relação à normóxia (66.5 ± 7.3 pg e 34.4 ± 4.3 % respectivamente) e hipóxia 6 horas (63.6 ± 4.6 pg e 34.3± 4.8 %, respectivamente). Em relação à glicose plasmática os valores não tiveram diferenças significativas, mas verificou-se que em hpx 6 horas (76,3 ± 27,4 mg/dL) e 3 horas (68,8 ± 35,5 mg/dL) que os valores foram 15% e 4%, respectivamente, superiores ao de normóxia (66,2 ± 22,1 mg/dL). Foram analisados fenótipos das isozimas malato desidrogenase (MDH) e lactato desidrogenase (LDH) em eletroforese. Para a MDH sugere-se a presença de dois locos gênicos sMDH-A* (predominando em fígado) e sMDH-B* (predominando em músculo esquelético e cardíaco) com alelo variante (B106*) para o loco B*. O cálculo da freqüência gênica realizado para este loco indica que a população encontra-se em equilíbrio de Hardy-Weinberg. Uma vez que não se observou a presença da fração mitocondrial da MDH, fracionamento celular e testes de termoestabilidade foram realizados. Os resultados obtidos pelo fracionamento celular indicam que esta fração tem migração similar a isoforma A. Em hipóxia (3 e 6 horas) foi possível observar um aumento nas intensidades relativas das diferentes isoformas da MDH, quando comparadas a normóxia. Em músculo esquelético e cardíaco, também em hipóxia foi possível identificar a presença da fração mitocondrial. Para a LDH sugere-se a presença de dois locos gênicos LDH-A* (predominando em músculo esquelético) e LDH-B* (predominando em coração e fígado). A exemplo do detectado para a MDH observa-se um aumento na intensidade relativa do produto dos diferentes locos para as condições de hpx 3 horas e 6 horas. Os ajustes hematológicos, mesmo não muito expressivos, e a presença da mMDH nos tecidos analisados e em hpx 3 e 6 horas, sugerem uma forma de adaptação bioquímica utili zada frente a uma reorganização metabólica decorrente de variações ambientais. Palavras chaves: degradação ambiental, oxigênio dissolvido, isozimas, Paraíba do Sul. Brycon opalinus (Cuvier, 1819) (Characiformes): haematologycal and genetic-biochemical assessment face to hypoxia Abstract One of the main problems faced by the basin of Paraíba do Sul river is the disposition of domestic and industrial effluents in its waters, which causes the depletion dissolved oxygen, among other problems. This paper presents the study on the haematological and biochemical answers in the low concentrations of oxygen by the Brycon opalinus fish species, endemic of Paraíba do Sul River. The animals were divided in three groups: control group in normal conditions, hypoxia (hpx) 3 hours, hypoxia (hpx) 6 hours. The values for erythrocytes in normal conditions (1.9 ± 0.2 106/ 3 6 3 6 3 mm ), hpx 3 hours (2.1 ± 0.5 10 /mm ) and hpx 6 hours (2.4 ± 0.2 10 /mm ), showed significant differences (p< 0,01) between control group and hpx 6. For hematocrite, significant statistic difference was observed (p< 0,05), related to the control group (37,7 %) and hypoxia 6 hours (44,6 %). For the VCM, the highest value was in hypoxia 3 hours (200.6 ± 4.0 µm3) and practically invariable in normal conditions (190.3 ± 8.2 µm3) and hypoxia of 6 hours (190.1 ± 6.6 µm3). For hemoglobin corpuscular medium (HCM) and concentration of hemoglobin corpuscular medium (CHCM) the lowest values were observed in the condition of hpx 3 hours (61.5 ± 4.4 pg and 30.5± 3.8 %, respectively) regarding normal conditions (66.5 ± 7.3 pg e 34.4± 4.3 % respectively) and hypoxia 6 hours (63.6 ± 4.6 pg e 34.3± 4.8 %, respectively). As for plasmatic glucose, the values did not present significant differences. However, in hypoxia 6 hours (76,3 ± 27,4 mg/dL) and 3 hours (68,8 ± 35,5 mg/dL) the values were 15% and 4% respectively higher than the one in normal conditions (66,2 ± 22,1 mg/dL). Electrophoretic phenotypes of malate (MDH) and lactate (LDH) dehydrogenase isozymes were analyzed. MDH presented variant allele for MDH-B* locus. The genic frequency for MDH indicates that the individuals studied are according to Hardy- Weinberg. The presence of MDH isoforms in muscular tissues did not reveal any difference when compared with the control with normal conditions, except in the presence of mitochondrial phenotype, mMDH* locus product, in hpx 3 hours and 6 hours. LDH did not reveal any change in the phenotype for skeletal muscle. For hepatic tissues, an increase of the intensity of MDH and LDH in the conditions of hpx 3 hours and 6 hours was observed. In the cardiac tissue, isoform B, sMDH-B* locus product was predominant. In hypoxia 3 and 6 hours, the expression of the mitochondrial fraction product of mMDH* and an increase in the intensities related to products of locus A* and B* were observed. The haematological adjustments, though not so significant, and the presence of mMDH in the analyzed tissues and in hpx 3 and 6 hours suggest a kind of biochemical adaptation used due to a metabolic reorganization resulting from environmental variations. Key words: environmental degradation, dissolved oxygen, isozyme, Paraíba do Sul. Lista de Figuras FIGURA 1: BACIA HIDROGRÁFICA DO R IO PARAÍBA DO S UL - F ONTE: CBH-PS ........................................... 5 FIGURA 2: SÉRIE TEMPORAL DE M EDIÇÕES DE OD ( MG/L) ESTAÇÃO PRBS440 - R IO PARAÍBA DO SUL EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS. FONTE AGEVAP, 2006 ......................................................................... 9 FIGURA 3: ESTRUTURA DIMÉRICA DA MALATO DESIDROGENASE 1, NAD (SOLÚVEL ) EC: 1.1.1.37 FONTE:HTTP://WWW.CSRRI.IIT. EDU............................................................................................ 18 FIGURA 4: ESTRUTURA TETRAMÉRICA DA LACTATO DESIDROGENASE (LDH, EC 1.1.1.27 LACTATO: NADOXIDOREDUTASE) FONTE: HTTP:// WWW. IONCHANNELS. ORG ........................................................... 20 FIGURA 5: BRYCON OPALINUS (CUVIER, 1819) ................................................................................... 21 FIGURA 6: PIRAPITINGA DO S UL - F ONTE: ARQUIVO DA AUTORA ............................................................. 22 FIGURA 7: R EDES DE CONTENÇÃO (A E C) INSTALADAS NOS TANQUES PARA EXPERIMENTO DE HIPÓXIA REALIZADO PARA B. OPALINUS , IMPEDINDO ACESSO DOS PEIXES AO OXIGÊNIO SUPERFICIAL. (B) MONITORAMENTO DO OD E TEMPERATURA ................................................................................. 24 FIGURA 8: GRÁFICO DOS VALORES OBTIDOS PARA ERITRÓCITOS DE B. OPALINUS PARA NORMÓXIA , HIPÓXIA 3 HORAS E HIPÓXIA 6 HORAS. ...................................................................................................... 35 FIGURA 9: G RÁFICO DOS VALORES OBTIDOS PARA HEMOGLOBINA DE B. OPALINUS PARA NORMÓXIA , HIPÓXIA 3 HORAS E HIPÓXIA 6 HORAS. ...................................................................................................... 36 FIGURA 10: GRÁFICO DOS VALORES OBTIDOS PARA HEMATÓCRITO DE B. OPALINUS PARA NORMÓXIA , HIPÓXIA 3 HORAS E HIPÓXIA 6 HORAS. ................................................................................................... 37 FIGURA 11: GRÁFICO DOS VALORES PARA VOLUME CORPUSCULAR MÉDIO (VCM) DE ERITRÓCITOS DE B. OPALINUS PARA NORMÓXIA , HIPÓXIA 3 HORAS E HIPÓXIA 6 HORAS. ................................................. 37 FIGURA 12: GRÁFICO DOS VALORES DE HEMOGLOBINA CORPUS CULAR MÉDIA (HCM) DE B. OPALINUS PARA NORMÓXIA , HIPÓXIA 3 HORAS E HIPÓXIA 6 HORAS. ....................................................................... 38 FIGURA 13: GRÁFICO DOS VALORES DE CONCENTRAÇÃO DE HEMOGLOBINA CORPUSCULAR MÉDIA (CHCM) DE B. OPALINUS PARA NORMÓXIA , HIPÓXIA 3 HORAS E HIPÓXIA 6 HORAS .............................................. 38 FIGURA 14: CORRELAÇÃO DOS ÍNDICES VCM E CHCM DE B. OPALINUS EM NORMÓXIA ............................. 40 FIGURA 15: CORRELAÇÃO DOS ÍNDICES VCM E CHCM DE B. OPALINUS EM HIPÓXIA 3 HORAS. .................. 40 FIGURA 16: CORRELAÇÃO DOS ÍNDICES VCM E CHCM DE B. OPALINUS EM HIPÓXIA 6 HORAS ................... 41 FIGURA 17: R ESPOSTA AO ESTRESSE SEGUNDO BARTON, 2002............................................................ 43 FIGURA 18: EXPRESSÃO FENOTÍPICA EM ELETROFORESE DA S I OZIMA MDH, EM FIGADO (F), CORAÇÃO (C) E MÚSCULO ESQUELÉTICO (M) DE B. OPALINUS . PRESENÇA DE ALELO VARIANTE (B * 106). ................... 45 FIGURA 19: F RACIONAMENTO CELULAR REALIZADO PARA A MDH DE FÍGADO (F) E MÚSCULO ESQUELÉTICO (M) DE B. OPALINUS EM NORMÓXIA (A) E HIPÓXIA 6 H (B). S: FRAÇÃO SOLÚVEL / M: FRAÇÃO MITOCONDRIAL. A SETA INDICA A PRESENÇA DA FRAÇÃO MITOCONDRIAL EM MÚSCULO ESQUELÉTICO NO CONTROLE. ....... 47 FIGURA 20: TESTE DE TERMOESTABIL IDADE DE MDH NO TECIDO MUSCULAR ESQUELÉTICO DE B. OPALINUS , NOS TEMPOS DE 1, 3, 5, 7, 9 E 10 MINUTOS À 50°C E CONTROLE (C). AMOSTRA DE TECIDO DO GRUPO DE ANIMAIS EM NORMÓXIA . ........................................................................................................... 48 FIGURA 21: TESTE DE TERMOESTABIL IDADE DE MDH NO TECIDO MUSCULAR ESQUELÉTICO DE B. OPALINUS , NOS TEMPOS DE 1, 3, 5, 7, 9 E 10 MINUTOS À 50°C E CONTROLE (C). AMOSTRA DE TECIDO DO GRUPO DE ANIMAIS EM HIPÓXIA 6 H. .......................................................................................................... 48 FIGURA 22: TESTE DE TERMOESTABIL IDADE DE MDH NO TECIDO HEPÁTICO DE B. OPALINUS , NOS TEMPOS DE 1, 3, 5, 7, 9 E 10 MINUTOS À 50 °C E CONTROLE (C). A MOSTRA DE TECIDO DO GRUPO DE ANIMAIS EM NORMÓXIA ............................................................................................................................. 49 FIGURA 23: TESTE DE TERMOESTABIL IDADE DE MDH NO TECIDO HEPÁTICO DE B. OPALINUS , NOS TEMPOS DE 1, 3, 5, 7, 9 E 10 MINUTOS À 50 °C E CONTROLE (C). A MOSTRA DE TECIDO DO GRUPO DE ANIMAIS EM HIPÓXIA 6H. ........................................................................................................................... 49 FIGURA 24: EXPRESSÃO FENOTÍPICA EM ELETROFORESE DA ISOZIMA LDH, EM CORAÇÃO, MÚSCULO E FIGADO DE B. OPALINUS ..................................................................................................................... 51 FIGURA 25: EXPRESSÃO FENOTÍPICA DE MDH EM ELETROFORESE EM GEL DE AMIDO, PARA FÍGADO (F), CORAÇÃO (C) E MÚSCULO (M) DE B. OPALINUS , EM NOMÓXIA (A), HIPÓXIA 3 HORAS (B), HIPÓXIA 6 HORAS (C)....................................................................................................................................... 53 FIGURA 26: EXPRESSÃO FENOTÍPICA DE LDH EM ELETROFORESE EM GEL DE AMIDO, EM FÍGADO (F), CORAÇÃO (C) E MÚSCULO (M) DE B. OPALINUS PARA NOMÓXIA (A), HIPÓXIA 3 HORAS (B), HIPÓXIA 6 HORAS (C). . 55 FIGURA 27: ESQUEMA DEMONSTRANDO AS VIAS METABÓLICAS NAS QUAIS A MDH E A LDH ESTARIAM ATUANDO (MODIFICADO A PARTIR DE SUAREZ E MOMMSEN, 1987). ........................................... 62 Lista de Tabelas TABELA 1: NÚMERO DE HABITANTES DOS ESTADOS ONDE ESTÁ INS ERIDO O VALE DO PARAÍBA ..................... 6 TABELA 2: CARGA POLUIDORA (KG DBO/ DIA ) DAS PRINCIPAIS CIDA DES DO VALE DO PARAÍBA . DADOS CETESB (2006) ................................................................................................................... 10 TABELA 3: DISTRIBUIÇÃO DOS PEIX ES NAS DIFERENTES CONDIÇÕES EXPERIMENTAIS E SUAS RESPECTIVAS RÉPLICAS. ............................................................................................................................. 23 TABELA 4: SOLUÇÃO DE COLORAÇÃO ESPECIFICA PARA MDH ............................................................... 27 TABELA 5: SOLUÇÃO DE COLORAÇÃO ESPECIFICA PARA LDH................................................................ 28 TABELA 6: ÍNDICES MONITORADOS NOS TANQUES DURANTE EXPERIMENTO. ............................................. 30 TABELA 7: MÉDIA E DESVIO PADRÃO DOS PARÂMETROS HEMATOLÓGICOS INVESTIGADOS. ......................... 33 TABELA 8: ANÁLISE DE VARIÂNCIA (ANOVA KRUSKAL-W ALLIS ) DOS DADOS HEMATOLÓGICOS. .................. 34 TABELA 9: MÉDIAS E DESVIO PADRà O PARA GLICOSE EM NOMÓXIA , HPX 3 H E HPX 6 H................................ 42 TABELA 10: CÁLCULO DE FREQÜÊNCIA GÊNICA PARA ALELO VARIANTE *106 NO LOCO B*........................... 45 Sumário 1. INTRODUÇÃO.....................................................................................................................1 2. OBJETIVOS .........................................................................................................................4 2.1. OBJETIVO GERAL.............................................................................................................4 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS..................................................................................................4 3. REVISÃO DA LITERATURA ............................................................................................5 3.1. A BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO PARAÍBA DO SUL.........................................................5 3.2. O XIGÊNIO DISSOLVIDO E MATÉRIA ORGÂNICA ...............................................................8 3.3 ALTERAÇÕES DE OXIGÊNIO DISSOLVIDO COMO CONDICIONANTE AO ESTRESSE ......... 11 3.4. ADAPTAÇÕES FISIOLÓGICA E BIOQUÍMICA EM RESPOSTA A HIPÓXIA . .......................... 12 3.4.1 Ajustes Hematológicos ....................................................................................... 13 3.4.2 Ajustes genético-bioquímicos - Isozimas......................................................... 14 3.4.3. Malato Desidrogenase (MDH).......................................................................... 16 3.4.4 Lactato Desidrogenase (LDH)........................................................................... 18 3.5. BRYCON OPALINUS - PIRAPITINGA DO SUL: ESPÉCIE ENDÊMICA DO RIO PARAÍBA DO SUL ....................................................................................................................................... 20 4. MATERIAL E MÉTODOS ............................................................................................... 23 4.1 OBTENÇÃO DOS ANIMAIS........................................................................................... 23 4.2 DESENHO DO EXPERIMENTO ......................................................................................... 23 4.3 PARÂMETROS HEMATOLÓGICOS.................................................................................... 25 4.4 GLICOSE PLASMÁTICA ................................................................................................... 25 4.5 ANÁLISE ESTATÍSTICA .................................................................................................... 25 4.6 ANÁLISE GENÉTICO-BIOQUÍMICA ................................................................................... 25 4.6.1 Preparo dos tecidos............................................................................................. 26 4.6.2 Eletroforese no gel de amido............................................................................ 26 4.6.3 Detecção enzimática........................................................................................... 27 4.7 CALCULO DE FREQÜÊNCIA GÊNICA .............................................................................. 29 4.8 TESTES DE TERMOESTABILIDADE.................................................................................. 29 4.9 FRACIONAMENTO CELULAR ........................................................................................... 29 5. RESULTADOS E DISCUSSÃO..................................................................................... 30 5.1 PARÂMETROS AMBIENTAIS ............................................................................................ 30 5.2 RESPOSTAS FISIOLÓGICAS E BIOQUÍMICAS FRENTE À HIPÓXIA ..................................... 32 5.2.1 Variáveis Hematológicas.................................................................................... 33 5.2.2 Glicose Plasmática.............................................................................................. 41 5.2.3 Variação genético-bioquímica - Isozimas........................................................ 44 5.3 REORGANIZAÇÃO METABÓLICA DAS ISOZIMAS FRE NTE À HIPÓXIA ................................ 52 5.3.1.Padrão de expressão das isozimas da MDH.................................................. 52 5.3.2. Padrão de expressão das isozimas da LDH.................................................. 54 5.4. PLASTICIDADE FENOTÍPICA E ADAPTAÇÃO AO AMBIENTE ............................................. 56 5.4.1. Mecanismos adaptativos na produção de energia........................................ 57 5.4.2. Metabolismo oxidativo vs anaeróbico ............................................................. 60 5.5 CONSERVAÇÃO BIOLÓGICA EM BACIAS HIDROGRÁFICAS ............................................. 64 6. CONCLUSÕES................................................................................................................. 67 REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 70 1 Introdução Atualmente um dos principais problemas enfrentado pela bacia do rio Paraíba do Sul está na disposição de efluentes de origem doméstica e industrial. A influência antrópica devido à rápida expansão demográfica nas áreas urbanas da bacia, não foi acompanhada das medidas necessárias de planejamento e saneamento. Este processo resultou numa ocupação indiscriminada de suas margens e na carência de infraestrutura sanitária. Segundo dados da CEIVAP (FUNDAÇÃO COPPETEC) em 2006, para cidades paulista que fazem parte da bacia do Rio Paraíba, 89,9% das populações urbanas são atendidas por rede coletora, das quais somente 32,3% possuem tratamento para seus efluentes sanitários. Os números relativos às concentrações de fosfato, coliformes fecais e DBO mostram o alto nível de poluição orgânica. Além da poluição de origem doméstica, a intensa atividade industrial na região contribuiu para a degradação dos recursos hídricos. De fato, a bacia engloba importantes regiões industriais e urbanas do país cuja produção corresponde a aproximadamente 10% do PIB (IBGE, 2005). Tais fatos têm contribuído fundamentalmente para que nas últimas décadas, os habitats, a diversidade e a quantidade de peixes venham diminuindo na bacia do Rio Paraíba. As espécies de peixes vêm sendo expostos a condições ambientais cada vez mais desafiadoras do ponto de vista biológico, resultando em efeitos negativos na saúde, crescimento, reprodução e sobrevivência desses animais (SANDERS, MEEUWING, VICENT, 2002). Um dos importantes fatores é alteração do meio ocasionada por variações na concentração de oxigênio dissolvido, onde se destaca a introdução de matéria orgânica. Condições ambientais desfavoráveis à sobrevivência dos peixes determinam ajustes comportamentais, fisiológicos e bioquímicos que lhes permitem sobreviver. Há evidentemente limites para essa habilidade, os quais podem ser ultrapassados provocando estresse. Essa condição de alteração no estado orgânico produzida por um fator ambiental requer ajustes fisiológicos e/ou bioquímicos que dependendo da intensidade e freqüência de ocorrência, pode resultar numa diminuição da capacidade de sobrevivência do animal. Em ambientes aquáticos tropicais, altas temperaturas associadas com a decomposição da matéria orgânica causam depleção do oxigênio, condição a qual é agravada devido à introdução artificial de nutrientes provenientes da atividade antrópica (WU, 1999). A baixa disponibilidade de oxigênio no ambiente aquático conduz a ajustes adaptativos em todos os níveis da organização biológica, desde a regulação do número de células sangüíneas em circulação até adequação na maquinaria bioquímica das células, podendo levar a mudanças de comportamento a nível populacional. Segundo Val, Silva e Almeida-Val (2004), as alterações que ocorrem no nível fisiológico e bioquímico podem ser empregadas no diagnostico dos efeitos de condições ambientais adversas. Estudos em Piaractus mesopotamicus, demonstraram que ambientes com baixas concentrações de oxigênio podem aumentar a toxicidade de contaminantes, onde tais fatores combinados causam distúrbios nas defesas antioxidantes e em parâmetros bioquímicos (SAMPAIO et al.,2008). Fato importante se considerada a contaminação atual da bacia do rio Paraíba do Sul, onde existe violação de classe praticamente em toda a bacia (CEIVAP, 2006). No presente trabalho estudam-se as respostas fisiológicas frente a baixas concentrações de oxigênio de Brycon opalinus, espécie endêmica do rio Paraíba do Sul, considerada como vulnerável (IUCN-The World Conservation Union) e foi declarada ameaçada de extinção segundo o Diário Oficial da União de 21 de maio de 2004. Foram abordados aspectos hematológicos, já que o sistema hematopoiético responde rapidamente a variações na concentração de oxigênio. Respostas primárias à hipóxia envolvem liberação de eritrócitos do reservatório esplênico e influencia os níveis de fosfato inorgânico nos eritrócitos (VAL; ALMEIDA-VAL, 1995; VAL, 1999; FERNANDES et al.,1999; TAVARES-DIAS ; MORAES, 2004). No enfoque bioquímico foram estudadas as isozimas malato desidrogenase (MDH) e lactato desidrogenase (LDH), considerando seu importante papel no metabolismo celular em relação às modificações nos níveis de oxigênio. Variações no nível de atividade isozímica são demonstradas e relacionadas com processos de alteração ambiental, como são mudanças de temperatura e níveis de oxigênio. Desta forma, vários estudos têm sugerido que os peixes, em particular, utilizam mecanismos genéticos e/ou metabólicos em resposta a alterações no meio ambiente, fato o qual, poderia se constituir numa estratégia qualitativa de adaptação bioquímica (ALMEIDA-VAL et al, 2000; PANEPUCCI et al., 2000; SCHULTE, 2004; SOMERO, 2003, 2004). Sendo assim, salienta-se a importância de estudos sobre a ictiofauna e sua relação com o meio, visando à recuperação dos estoques naturais do rio Paraíba do Sul e a conservação da sua biodiversidade. 2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo geral Avaliar as respostas hematológicas e bioquímicas da espécie Brycon opalinus, endêmica do rio Paraíba do Sul, frente a baixas concentrações de oxigênio. 2.2 Objetivos específicos ♦ Avaliar os parâmetros hematológicos de Brycon opalinus, em resposta a hipóxia de 3 e 6 horas. ♦ Analisar os níveis de glicemia dos animais expostos à baixa concentração de oxigênio em diferentes tempos, como variável indicadora de estresse. ♦ Estudar a expressão fenotípica das isozimas MDH e LDH em eletroforese, considerando as diferentes condições experimentais de hipóxia. 3 REVISÃO DA LITERATURA 3.1 A Ba cia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul A área delimitada pelo relevo que drena a água da chuva por uma rede de córregos e rios é chamada de bacia hidrográfica, reconhecida como uma unidade básica de ecossistema terrestre reunindo partes do meio ambiente que interagem local e regionalmente através do fluxo de materiais e organismos mediado pela água. Na última década as bacias hidrográficas passaram a ser consideradas unidades de conservação devido a sua grande importância e diante das previsões não tão otimistas em relação à escassez de água e o declínio das espécies aquáticas (MOULTON ; SOUZA, 2006). A bacia do Paraíba do Sul (Figura 1) está situada entre as latitudes 20°26' e 23°39'S e as longitudes de 41° e 46°30'W, ocupando aproximadamente 55.400 km2, sendo 13.500 km2 no Estado de São Paulo, 21.000 km2 no Estado do Rio de Janeiro e 20.900 km2 em Minas Gerais (GRUBEN, JOHNSSON, LOPES, 2002). Figura 1: Bacia hidrográfica do Rio Paraíba do Sul - Fonte: CBH-PS Sua origem está na Serra da Bocaina, a 1800 m acima do nível do mar, onde suas nascentes ganham corpo com a junção de afluentes tornando-se o rio Paraitinga, o qual se encontra com a barragem da Usina Hidrelétrica de Paraibuna 200 km à frente. A partir de Paraibuna segue para Guararema, trecho que recebe a denominação de Alto Paraíba, com 280 km de extensão. De Guararema a Cachoeira Paulista está o Médio Paraíba com altitude variando entre 580 m a 520 m. Em Cachoeira Paulista inicia-se o Baixo Paraíba, sendo percurso final até desembocar no Oceano Atlântico na cidade de São João da Barra no estado do Rio de Janeiro (COPPETEC, 2001). A população urbana total da bacia em 2005 chegou a 5.258.068 habitantes (Tabela 1) (COPPETEC, 2006; CETESB, 2008). A tendência de concentração populacional nas áreas urbanas segue o mesmo padrão de outras regiões brasileiras e é um dos fatores responsáveis pelo aumento da poluição na bacia. Tabela 1: Número de habitantes dos Estados onde está inserido o Vale do Paraíba. Estado Habitantes na bacia do Rio Paraíba do Sul Rio de Janeiro 2.264.070 Minas Gerais 1.245.300 São Paulo 1.975. 465 Fonte: CETESB, 2008. A bacia do Rio Paraíba tem sofrido modificações ao longo do tempo por influência da atividade humana. Pode-se ressaltar o fato de se encontrar localizada entre os dois mais importantes centros urbano-industriais do país, o que tem contribuído para o crescente grau de poluição acarretando grandes impactos sobre a fauna e flora (PEINADO, 2006). Caracterizada por uma diversidade de indústrias, desde a química, a metalúrgica e a produção de papel (FÉRES et al. 2005). No trecho paulista o número de empresas de grande porte dos setores químico e metalúrgico com alto potencial poluente é expressivo. Um número significativo destas empresas instalou sistemas de tratamento de efluentes, não eliminando, no entanto, a ocorrência de lançamentos de cargas tóxicas nos rios (GRUBEN, JOHNSSON, LOPES, 2002). Deve-se salientar que além dos impactos decorrentes das atividades agrícolas e industriais, essa bacia tem sido afetada pela implantação de várias represas para geração de eletricidade e captação de água. Encontram-se entre as maiores, a represa de Paraibuna formada pelos rios Paraibuna e Paraitinga em São Paulo, e a represa do Funil no Rio de Janeiro. Tais reservatórios formados produzem energia elétrica, fornecem água e controlam enchentes em áreas ribeirinhas, entretanto afetam diretamente a sobrevivência das comunidades aquáticas, entre elas as dos peixes. É muito evidente a alteração no fluxo de água, de sedimentos e nutrientes, perturbando a dinâmica do ecossistema. A transformação de um ambiente lótico para um ambiente lêntico cessa rotas migratórias das espécies reofílicas; altera obstáculos naturais necessários para as espécies de piracema; provoca extinção lagoas marginais, onde várias espécies utilizam para desova e fase juvenil; reduz oxigênio no fundo e produz aumento de H2S e de CO2 no represamento (HILSDORF; PETRERE, 2002; TUNDISI, 2005). A construção de reservatórios no curso do rio Paraíba do Sul, ocasionou modificações na estrutura da comunidade de peixes, onde espécies com maior capacidade de adaptação tomaram lugar causando impacto nas características tróficas do ecossistema. Com o barramento do rio houve alterações na disponibilidade de recursos, impactando as espécies de peixes, as quais se baseiam tanto na disponibilidade quanto na abundância de alimentos no ambiente para sua sobrevivência (PEREIRA et al., 2002). Outro fato a destacar é a introdução de espécies exóticas na década de 50, que segundo Sanders, Meeuwing e Vicent (2002) é uma das principais ameaças para a conservação de ecossistemas de água doce, juntamente com perturbações de origem antrópica. Ainda, o desmatamento das áreas próximas à cabeceira do rio é considerado outro importante problema, pois aumenta significativamente o risco de diminuição da produção de água na bacia, diminuindo a disponibilidade hídrica. Ações danosas ao leito e várzea do Rio Paraíba do Sul, tais como a devastação da mata ciliar, cortes e desmontes em encostas devido a edificações, extração de areia, cargas poluidoras domésticas e industriais, o processo de eutrofização acelerado, entre outras, denota degradação deste ecossistema. 3.2 Oxigênio dissolvido e Matéria Orgânica Os processos de decomposição da matéria orgânica lançada em um corpo d'agua são realizados por bactérias decompositoras, que convertem a matéria orgânica em compostos simples e inertes, como água e gás carbônico utilizando-se do oxigênio disponível no meio líquido para a sua respiração. O oxigênio dissolvido (OD) é geralmente medido em miligramas por litro (mgL¯ ¹) da água analisada. Provém da dissolução do oxigênio atmosférico, e também, da produção liberada por alguns microorganismos vivos na água (algas e bactérias). De vital importância para os seres aquáticos aeróbicos, o seu nível de disponibilidade na água vai depender do balanço entre a quantidade consumida por bactérias para oxidar a matéria orgânica (fontes pontuais e difusas) e a quantidade produzida no próprio corpo d’água através de organismos fotossintéticos. Quando dado balanço do nível de OD permanece negativo por tempo prolongado, o corpo d’água pode tornar-se anaeróbico, causando a geração de maus odores, o crescimento de outros tipos de bactérias e morte de diversos seres aquáticos aeróbicos, inclusive peixes. A queda na taxa da concentração de oxigênio dissolvido tem diversas implicações do ponto de vista ambiental, trazendo prejuízo a toda comunidade aquática principalmente às espécies aeróbicas, alterando relações ecológicas e a estabilidade do ecossistema. Segundo relatório da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (CETESB, 2006), o Rio Paraíba do Sul apresenta elevada carga orgânica remanescente lançada pelos municípios de Jacareí, São José dos Campos e Taubaté, constatando níveis do oxigênio dissolvido reduzidos em vários trechos do seu percurso. A Figura 2 apresenta a oscilação nos teores de oxigênio dissolvido no ponto de captação de São José dos Campos entre os nos de 1985 e 1999 (AGEVAP). Para o mesmo ponto a CETESB (2006) publicou a média de 3,6 mgL¯ ¹ entre os anos 1996 e 2005. Assim, pode-se observar uma depleção nos níveis de oxigênio OD (mg/L) dissolvido com o passar dos anos. Tempo (ano) Figura 2: Série Temporal de Medições de OD (mg/L) Estação PRBS440 - Rio Paraíba do Sul em São José dos Campos. Fonte AGEVAP, 2006 O aumento substancial do abastecimento de água da população urbana na bacia, nas últimas décadas, não foi acompanhado dos mesmos índices de coleta de esgoto e principalmente do seu tratamento, provocando impactos negativos importantes na qualidade das águas. No seu relatório anual de 2006, a CETESB reforça a importância da manutenção dos níveis normais de oxigênio dissolvido para a sobrevivência da biota, em especial para a população de peixes, visto que em vários pontos de amostragem as águas do rio Paraíba do Sul, estiveram abaixo das especificações do CONAMA 357/05, a qual define um mínimo de 5 mgL¯ ¹ para corpo d´água classe 2 (CETESB, 2007). A carga poluidora total estimada pela CETESB em 2007 para a bacia do Rio Paraíba do Sul, foi de 99.115 DBO/dia com remanescente de 68.714 kg DBO/dia, ou seja, quase 70% do esgoto lançado sem tratamento, reforçando aqui a necessidade de serem concluídas as obras de coleta e tratamento pelas empresas de saneamento na região (CETESB, 2008). Sendo assim, devido às características de degradação da bacia, alguns parâmetros de qualidade das águas extrapolam os limites da sua classe correspondente, ou seja, Classe II (CARVALHO, 2008). Os parâmetros que apresentam maior nível de violação são os compostos fosfatados, a demanda bioquímica de oxigênio e os coliformes fecais e totais, resultado da elevada e constante contaminação por esgoto doméstico na bacia (CEIVAP, 2006; CETESB, 2008), os quais superaram os limites estabelecidos pela Resolução CONAMA 357/05. A carga poluidora lançada no rio além de acarretar a presença de coliformes termotolerantes, adicionalmente favorece o aumento dos valores de fósforo, promovendo a eutrofização. Tal fato contribui intensamente para a piora do Índice de qualidade das águas para proteção da Vida Aquática (IVA), sobretudo na depleção do oxigênio dissolvido, variável a qual, é determinante neste índice (CETESB, 2006). A carga poluidora dos municípios mais importantes economicamente situados no Médio Paraíb a podem ser evidenciadas conforme dados da Tabela 2. Tabela 2: Carga poluidora (kg DBO/dia) das principais cidades do Vale do Paraíba. Município Jacareí São José dos Campos Taubaté Fonte: CETESB, 2008. Coleta Tratamento % % 96 Carga poluidora (kg DBO/dia) Potencial Remanescente 20 11.000 9.167 88 46 32.715 19.885 92 0 13.939 13.939 3.3 Alterações de Oxigênio dissolvido como condicionante ao estresse O oxigênio no ambiente aquático é proveniente da atmosfera ou do fitoplâncton, via respiração, supre as necessidades metabólicas dos animais que vivem nesse ambiente, seja na coluna d’água ou no substrato. Quando o suprimento de oxigênio é interrompido, ou taxa de consumo dos animais e das plantas aquáticas excede o difundido, sua concentração declina além da concentração mínima necessária para a vida da maioria dos animais, levando a hipóxia ambiental (DIAZ, 2001; KARIM, SEKINE, UKITA, 2003). As respostas dos peixes e outros organismos frente à hipóxia são variáveis, em geral isso ocorre quando a concentração de oxigênio está abaixo de 2 mg L -1 (DIAZ, 2001). A estratificação vertical da coluna d’água, fenômeno natural causada por mudanças nas estações do ano, causa hipóxia ambiental em níveis mais profundos (HEATH, 1995). Entretanto, frequentemente a hipóxia é provocada pela ação antropogênica por meio de excessivo despejo de nutrientes e matéria orgânica nos corpos d’água. Segundo Soares, Menezes e Junk, (2006) e Camargo e Alonso (2006), atualmente a hipóxia e/ou anóxia afetam águas continentais e grandes extensões costeiras marinhas em todos continentes do mundo. É evidente o aumento dos níveis de nutrientes em corpos d’água, atribuído à excessiva utilização de fertilizantes, cortes de matas e principalmente descargas de esgoto doméstico. As conseqüências podem ser graves, como mortalidade em massa de peixes e mamíferos, diminuição das populações bentônicas e enfraquecimento na produção pesqueira (CAMARGO ; ALONSO, 2006; Wu, 2002). As águas doces tropicais são caracterizadas por altas temperaturas e baixa concentração de oxigênio dissolvido, frequentemente os peixes se deparam com o desafio de satisfazer seus requerimentos metabólicos com condições de reduzida oferta de oxigênio na água (VAL,1996). Em águas doces subtropicais, embora continuamente oxigenadas, os peixes podem também ser expostos à hipóxia devido à alta entrada de material orgânico de origem antrópica. Sendo assim, em tais ambientes com amplas oscilações nos níveis de oxigênio, tanto os peixes de respiração área, quanto os peixes de respiração exclusivamente aquática demonstram sua adaptabilidade com respostas que associam os vários níveis de organização biológica para sobreviverem, embora a baixa disponibilidade de OD seja um dos fatores ambientais mais estressantes para os peixes (KALINIM et al,1996; FERNANDES et al, 1999, BALDISSEROTTO, 2002). 3.4 Adaptações fisiológica e bioquímica em resposta a hipóxia. A resposta fisiológica dos peixes a um estímulo de estresse é adaptativa e inespecífica, basicamente neuroendocrina, que desencadeia uma cascata de acontecimentos fisiológicos e metabólicos necessários para fazer frente à situação adversa. A glicose é um eficiente indicador de mudanças no estado fisiológico, por ser a principal fonte de energia utilizada pelos peixes para lidar com situações de estresse (MORGAN e IWAMA, 1997). Normalmente o aumento da glicose está relacionado com a liberação de cortisol e outros hormônios, principalmente catecolaminas (MOMMSEN , MONN, VIJAYAN, 1999) A hipóxia pode induzir distúrbios osmoregulatórios havendo desordem no balanço aquoso e mineral, onde a taxa de diurese aumenta levando a hemoconcentração com redução do volume de plasma. Tal fato se deve ao resultado da elevação na permeabilidade da membrana branquial à água pela ação da adrenalina (TERVONEN et al., 2006). Mudanças na morfologia branquial podem ser observadas em teleósteos devido à exposição hipóxia, promovendo distúrbios nas trocas gasosas (MATEY et al., 2008). Em relação aos ovos e larvas de peixes, a sensibilidade à hipóxia varia com o estágio de desenvolvimento. O embrião é relativamente resistente a baixas concentrações de oxigênio, entretanto com a evolução do crescimento, a sensibilidade a hipóxia aumenta. O embrião recém eclodido obtém sua energia através por mecanismos anaeróbicos, mas com seu desenvolvimento a respiração aeróbica toma lugar e se torna vital para a sobrevivência. Os alevinos são menos competentes em tolerar as quedas na concentração de OD que adultos da mesma espécie (HEATH, 1995). Wu et al. (2003), descreveu em efeitos da hipóxia na reprodução de carpas (Cyprinus carpio), tendo como resultado alterações no desenvolvimento das gônadas. A fertilização de ovos de animais expostos a hipóxia foi 55,5%, para os de normóxia foi de 99,4% e a eclosão dos ovos de progenitores expostos a baixa concentração de oxigênio foi de 17,2%, sendo que os ovos dos animais em concentrações normais de OD, a eclosão alcançou 98,8%. As larvas de peixes que não sofreram com hipóxia sobrevivem melhor, cerca de 93,7%, enquanto as larvas de pais expostos a pouca disponibilidade de oxigênio apenas sobrevivem 46,4% (WU et al., 2003). Atualmente, os estudos das respostas de um organismo a hipóxia têm sido amplamente difundidos através dos peixes teleósteos, já que representam o um dos grupos de espécies mais abundante no meio aquático, e são caracterizados por sobreviver em ambientes sob condições de constantes alterações nos níveis de oxigênio (NIKINMAA, 2002). 3.4.1 Ajustes Hematológicos Nos teleósteos, a porção superior do rim, além de tecido hematopoético possui função endócrina (ROCHA; FLORES, 2001) e imunológica promovendo a interação imunoendócrina, de importância para ambos os sistemas, atuando na produção de anticorpos e de catecolaminas (WEYTS et al., 1999). Mudanças em certos parâmetros bioquímicos e hematológicos são potencialmente úteis, porque permitem detectar danos agudos ou crônicos causados por algum tipo de estresse (ADHAM, HAMED ;SALEH, 2002). Os estudos hematológicos das diferentes espécies de peixes são de interesse ecológico e fisiológico, pois auxiliam na compreensão da relação entre as características sanguíneas, a filogenia, o hábitat e a adaptabilidade dos peixes ao ambiente. As espécies de peixes, de mesmo gênero, na maior parte dos casos, apresentam variações quanto aos valores da quantidade de eritrócitos, seu tamanho, volume, concentração de hemoglobina e hematócrito. Tais variações intra- específicas podem ser atribuídas às diferentes características de comportamento, hábitat, hábito alimentar, clima e outros fatores (TAVARES-DIAS ;MORAES, 2004). A quantidade de oxigênio transportada por unidade de volume de sangue depende da tensão de oxigênio, do número de eritrócitos, da quantidade de hemoglobina nos eritrócitos e da afinidade da hemoglobina pelo oxigênio. Essa afinidade desempenha duas importantes funções: a hemoglobina deve chegar efetivamente saturada de O2 nos capilares dos órgãos de troca gasosa e, liberar o O2 nos tecidos a alta pressão parcial de oxigênio, necessária para manter um gradiente de difusão entre o sangue e as estruturas que utilizam o oxigênio (NIKINMAA, 1990, 1997). Ao considerar a variedade de espécies que depende da hemoglobina para o transporte de O2, o sistema hematológico desempenha seu papel sob condições ambientais extremamente variáveis, o que resulta no desenvolvimento de mecanismos regulatórios para satisfazer os requerimentos fisiológicos dos organismos. A relação entre transporte de O2 e mecanismos regulatórios pode ser evidenciada pela disponibilidade de O2 em ambientes aquáticos de água doce, os quais mostram acentuada variação diária, espacial e sazonal (VAL e ALMEIDA-VAL, 1995). Assim, o estresse causado pela hipóxia no ambiente aquático pode causar alterações hematológicas. Os parâmetros hematológicos constituem frequentemente um reflexo de processos orgânicos que servem como indicadores das condições gerais de um organismo ou de distúrbios metabólicos (TAVARES-DIAS ; MORAES, 2004). 3.4.2 Ajustes genético-bioquímicos - Isozimas Na escala evolutiva os peixes apresentam um maior número de locos gênicos do que os vertebrados terrestres, principalmente no que se refere aos sistemas isozímicos. Segundo Fisher et al. (1980), a relativa constância no número de locos entre as várias espécies de peixes, assim como padrões característicos de expressão tissular diferencial dos locos isozímicos para estes organismos sugerem que as isozimas desempenhem papel fundamental na fisiologia destes organismos. As diferenças estruturais existentes entre os membros de um grupo de isozimas podem ter origem durante a síntese primária de uma cadeia ou cadeias polipeptídicas. Essas modificações poderiam envolver alterações químicas secundárias das enzimas tais como, retirada de um grupo amino de resíduos da glutamina ou aspargina, oxidação de glicídeos de várias estruturas e clivagem de uma cadeia polipeptídica por enzimas proteolíticas com perda de um fragmento terminal. Se tais alterações secundárias envolvem algumas, mas não todas as moléculas das enzimas ou, afetá-las em diferentes graus ou ainda, representarem uma série de etapas em um processo pelo qual todas passam, então bandas múltiplas podem ser reproduzidas em um zimograma. Outra possibilidade é que formas múltiplas de um grupo de isozimas possam diferir entre si, não nas suas estruturas primárias mas sim, nas secundárias ou terciárias, diferindo na mobilidade eletroforética (KITTO et al., 1967; EPSTEIN ; SCHECHTER, 1968). A extensa variabilidade observada no tamanho do genoma e cariótipo dos peixes, aparentemente, seria resultante de uma diversificação do estado original, iniciada durante a história evolutiva dos vertebrados (MURAMOTO, OHNO, ATKIN, 1968). Durante o curso da evolução houve um aumento do conteúdo celular de DNA, facilitando o aparecimento de formas mais complexas de vida. Segundo HINEGARDNER (1976), estes aumentos devem ter ocorrido, infrequente e irregularmente, com intervalos de milhões de anos. A evolução biológica primordial teve necessidade de uma nova maquinaria metabólica codificada em novos DNAs.. A duplicação gênica tem sido considerada como um dos fatores evolutivos mais importantes, e é provavelmente, uma das causas de heterogeneidade protéica, comumente detectada em peixes na forma da isozimas. Os estudos dos sistemas isozímicos, em peixes, têm sido direcionados para pesquisa de estruturas, função e regulação, particularmente, nas áreas da bioquímica, genética e evolução molecular, uma vez que, a duplicação gênica é considerada um dos mecanismos mais importantes na formação de novos genes e de novas funções metabólicas, durante o processo evolutivo. O estudo de isozimas proporciona uma considerável compreensão das subunidades estruturais das enzimas, assim como marcadores genéticos (MARKET; MOLLER, 1959; FENRICH-VERANI et al. 1990), evolutivos e ambientais (AQUINOSILVA, 1992; AQUINO-SILVA, SCHWANTES, SCHWANTES, 2003; AQUINO-SILVA et al. 2008). As desidrogenases como a LDH e MDH, assim como muitas outras proteínas são objetos de estudo em vertebrados, tanto sob ponto de vista estrutural como sob o aspecto funcional, onde se observa mudanças na sua expressão e atividade diante de condições ambientais adversas (CHIPPARI-GOMES et al., 2005; SAMPAIO, 2008; VAL; ALEMIDA-VAL, 1999). 3.4.3 Malato Desidrogenase (MDH) O sistema isozímico da malato desidrogenase (MDH; EC 1.1.1.37; Malato: NAD oxidorredutase) é representado, em vertebrados e invertebrados, por duas formas principais: malato desidrogenase solúvel (sMDH) e malato desidrogenase mitocondrial (mMDH). As duas formas, além da sua localização celular, diferem também quanto à mobilidade eletroforética (MARKERT;MOLLER, 1959), comportamento cinético (BANASZAK e BRADSHAW, 1975), composição de aminoácidos (McALISTER-HENN, 1988) e propriedades antigênicas (KITTO ; LEWIS, 1967), estando sob controle de locos gênicos separados (BAILEY, COCKS, WILSON, WHITT, PROSSER, 1970; WHITT, 1970). Quanto a sua estrutura molecular, ambas as formas apresentam-se como dímeros com pesos moleculares de 60.000 a 80.000 daltons (BANASZAK; BRADSHAW, 1975), e catalisam a oxidação reversível do L-malato em oxalacetato, requerendo NAD como cofator. Das duas formas, a mMDH atua no ciclo de Krebs, enquanto que a sMDH se encontra envolvida com a gliconeogênese, lipogênese e lançadeira malato -aspartato durante a glicólise aeróbica (BANASZAK; BRADSHAW, 1975). Segundo Zink e Shaw (1968), três diferentes rotas metabólicas têm sido propostas para a sMDH: gliconeogênese, lipogênese e lançadeira malato-aspartato durante a glicólise aeróbica. Quanto a mobilidade eletroforética, a sMDH é mais anódica que a mMDH em anfíbios, répteis, aves e mamíferos (SCHWANTES; SCHWANTES, 1977) e em várias espécies de peixes (MONTEIRO et al., 1998; AQUINO-SILVA, 2003; 2008). O número de genes ativos para a sMDH nos vertebrados pode ser variável. Na maioria dos peixes e anfíbios, a sMDH aparece como uma série de isozimas anódicas, em geral 3, que se comportam como dímeros compostos por duas classes de subunidades: A e B, codificadas por dois locos gênicos distintos sMDH-A* e sMDH-B* (SCHWANTES; SCHWANTES, 1982; MONTEIRO et al., 1998). O sistema multilócico da sMDH, determinado por locos gênicos múltiplos pode ter sido formado por deferentes tipos de duplicação gênicas ou genômicas (aneuploidia, poliploidia, duplicações regionais), relativamente antigas e mantidas por centenas de milhões de anos. A importância da duplicação gênica como um mecanismo fundamental de evolução molecular, foi enfatizada desde a década de 70 por Ohno (1970), onde foi postulado que maior avanço no tamanho genômico facilitou a radiação dos vertebrados. A existência de locos isozímicos parálogos, duplicados no primórdio da evolução dos vertebrados, em cromossomos separados, suporta o postulado de que esses foram formados pela amplificação do genoma inteiro através de um ou mais eventos de poliploidização (FISHER et al., 1980). Entretanto, a sMDH de algumas espécies de peixes apresenta formas múltiplas adicionais como resultado de poliploidização e variação alélica (FERRIS ; WHITT, 1977). A constante de Michaelis (Km) e os números de “turnover” (número de moléculas do substrato transformadas, por minuto por uma única molécula enzimática ou por um único sítio ativo, em condições ótimas), das duas formas de MDH, mostram diferenças bem marcadas. Através da afinidade ao substrato, Kaplan (1963) observou diferenças significantes entre sMDH e mMDH de grande importância fisiológica. O oxalacetato tem efeito inibidor sobre a mMDH enquanto que a sMDH tem uma inibição ainda maior quanto a altas concentrações de malato. A fração mitocondrial parece então, ser orientada no sentido da oxidação do malato e a solúvel ser direcionada para a redução do oxalacetato. As diferenças estruturais entre as duas formas podem impedir a redução do oxalacetato na mitocôndria e a oxidação do malato na fração solúvel da célula. Variações quanto à inibição pelo substrato das duas formas da MDH devem dês empenhar importante papel nas relações energéticas da mitocôndria, já que a oxidação da NADH mitocondrial é acoplada à formação de ATP. Figura 3: Estrutura dimérica da Malato Desidrogenase 1, NAD (solúvel) EC: 1.1.1.37 Fonte:http://www.csrri.iit.edu 3.4.4 Lactato Desidrogenase (LDH) A lactato desidrogenase (LDH, EC 1.1.1.27 lactato: NAD-oxidoredutase) é encontrada em todas as células dos vertebrados assim como, em muitos invertebrados, ocupando uma importante posição no metabolismo celular fora da via glicolítica. Na fase anaeróbica, o piruvato é convertido a lactato pela ação da LDH, com oxidação simultânea da coenzima NADH. Esta forma oxidada da coenzima é essencial para a complementação de um passo anterior da glicólise, ou seja, na passagem de gliceraldeído-3-fosfato para 1,3-difosfoglicerato . Isto possibilita a continuidade da glicólise mesmo em ausência de oxigênio. Quando o oxigênio se torna novamente disponível, o lactato pode ser reoxidado. Neste caso, o piruvato é levado, via acetil coenzima A, para o ciclo de Krebs com conseqüente fosforilação oxidativa e formação de gás carbônico e água. O estudo da LDH teve um grande impulso com Hunter e Markert (1957), pela combinação da técnica de eletroforese em gel de amido, desenvolvida por Smithies (1955), com métodos histoquímicos (zimograma). Com isso foi possível verificar que a LDH é um tetrâmero que, na maioria dos vertebrados, existe como cinco formas moleculares resultantes da associação ao acaso de duas subunidades, A e B, codificadas por dois locos gênicos diferentes (CAHN et al., 1962; SCHWANTES, 1970). O loco LDH-A*, codifica a subunidade A, predominante em músculo esquelético e o loco LDH-B* codifica a subunidade B, predominante em músculo cardíaco. Essa associação ao acaso leva a formação dos diferentes tetrâmeros: A4, A3B, A2B2, AB3, B4 com peso molecular de aproximadamente 140.000 daltons (DARNALL e KLOTZ, 1975) apresentando diferentes pontos isoelétricos. Assim, o homopolímero B4 é carregado mais negativamente e migra mais para o ânodo, sendo anódico. Já o homopolímero A4 é carregado menos negativamente, constituindo-se na isozima catódica. Os heteropolímeros, conseqüentemente, apresentam mobilidade intermediária a estes (PICKLES, JEFFEERY, ROSSMANN, 1964). Todavia, em um terço dos teleósteos estudados, a LDH apresenta-se com mobilidade reversa, ou seja, a isoforma A4 é o componente mais anódico e a isoforma B4 é o menos anódico (PANEPUCCI, SCHWANTES, SCHWANTES, 1984). Segundo Holbrook et al. (1975), na maioria dos vertebrados a isozima A4, predominante em músculo esquelético seria reconhecida primariamente como piruvato redutase, atuando na manutenção do balanço redox durante a anaerobiose, enquanto que a isozima B4, predominante em tecidos aeróbios, seria considerada como lactato oxidase, pois direciona o substrato para o metabolismo oxidativo e é rapidamente inibida por altas concentrações de piruvato. Estudos têm sido realizados procurando avaliar adaptações genéticas a nível molecular comparando a atividade iso/alozímica em relação a fatores ambientais tais como temperatura, salinidade, pressão, além de impactos ambientais (PANEPPUCCI et al., 2000). Um caso bem documentado de alozimas que exibem um desempenho diferencial em relação a variações ambientais está no loco para lactato desidrogenase LDH-B* em Fundulus heteroclitus (POWERS et al., 1991). Esta espécie é encontrada em diferentes regiões que apresentam uma variação média na temperatura superior a 15°C. Assim, nas diferentes populações ocorre a presença de dois alelos codominantes para o loco LDH-B* os quais apresentam diferentes respostas cinéticas quando submetidos a diferentes temperaturas. Segundo Dimichele e Powers (1982), a presença desta espécie em uma ampla extensão geográfica seria não somente decorrente da presença de variações genotípicas, conferindo adaptação a níve l molecular, assim como das relações que este organismo apresenta com o ambiente em que se encontra. Figura 4: Estrutura tetramérica da Lactato desidrogenase (LDH, EC 1.1.1.27 lactato: NADoxidoredutase) Fonte: http://www.ionchannels.org 3.5 Brycon opalinus - Pirapitinga do Sul: espécie endêmica do Rio Paraíba do Sul Dentre os peixes de água doce, a família Characidae, ordem Characiformes, é considerada a mais especiosa e complexa do ponto de vista taxonômico quando comparada a outras famílias (BUCKUP, 1998). Esta família é a maior representante de água doce do Brasil, com cerca de 20 subfamílias com aproximadamente 400 espécies, sendo a grande maioria dos peixes com escamas, nadadeira adiposa, variando de peso, tamanho e forma. Inclui peixes de hábitos alimentares muito diversificados (herbívoros, onívoros e carnívoros) que exploram uma grande quantidade de habitats. O gênero Brycon pertence à família Characidae, é um dos principais gêneros entre os peixes de água doce Neotropical. Este gênero compreende pelo menos 60 espécies, sendo um dos gêneros com mais espécies entre os Characiformes, distribuidas do México à bacia do Rio Prata (HOWES, 1982). As espécies de Brycon são tipicamente prateadas, de médio a grande porte e usualmente importantes para os pescadores comerciais e de subsistência. É espécie considerada onívora com tendência à herbívora. Classificação: Super classe: Pisces Classe: Actinopterygii Ordem: Characiformes Família : Characidae Subfamília: Bryconinae Gênero: Brycon Espécie: B. opalinus Figura 5: Brycon opalinus (Cuvier, 1819) Brycon opalinus, também conhecido popularmente como Pirapitinga do Sul é espécie endêmica dos rios de cabeceiras da bacia do Paraíba do Sul, localizada no extremo norte da zona da Floresta Ombrófila Densa do Estado de São Paulo. É uma espécie de rios e riachos de encosta (HILSDORF ; PETRERE JR., 2002; LIMA 2003), se encontra na categoria vulnerável (IUCN-The World Conservation Union) e foi declarada como ameaçada de extinção segundo o Diário Oficial da União de 21 de maio de 2004. Tal fato torna imprescindíveis informações sobre estas populações para a sua conservação e uso sustentável. No momento conhecimento sobre a genética molecular e estrutura genética deste grupo tem sido limitada a algumas publicações (WASKO; GALETTI, 2000; WASKO et al., 2001; HILSDORF et al., 2002), apesar da sua importância ecológica e econômica. Figura 6: Pirapitinga do Sul - Fonte: arquivo da autora O gênero Brycon tem sido muito utilizado tanto nas criações experimentais como comerciais, necessitando de pesquisas mais detalhados sobre a sua biologia. Existem poucas informações disponíveis na literatura sobre esta espécie na região do Vale do Paraíba, trabalhos relacionados a esta espécie vêem sendo desenvolvidos na Estação de Hidrobiologia e Aqüicultura da CESP de Paraibuna (DINÓLA, 2001). Atualmente são de grande importância os estudos sobre peixes neotropicais, uma vez que a procura por estas espécies vem crescendo de forma acelerada (HACKBARTH, 2004). 4 Materials e Métodos 4.1 Obtenção dos animais Os animais foram obtidos dos tanques de piscicultura da Companhia Energética de São Paulo – CESP da Usina Hidrelétrica de Paraibuna, tendo sido transportados para o Laboratório de Ciências Ambientais da Universidade do Vale do Paraíba, onde foram alimentados com ração extrusada flutuante de 38% de proteína bruta. 4.2 Desenho do experimento Cinqüenta e um peixes em fase juvenil com peso médio de 60 gramas e comprimento médio de 18 cm, aproximadamente 10 meses de idade, foram igualmente divididos em quatro aquários com capacidade para 200L todos providos de aeração fornecida por um compressor de ar e fluxo de água constante, onde foram aclimatados pelo período de uma semana antes do início do experimento. Durante este período, a água dos tanques foi monitorada em relação à concentração de oxigênio dissolvido, pH, temperatura e condutividade elétrica. A alimentação foi interrompida 24 horas antes do experimento, o qual foi conduzido em duas etapas: hipóxia 3 horas e hipóxia 6 horas, de acordo com a tabela 3. Tabela 3: Distribuição dos peixes nas diferentes condições experimentais e suas respectivas réplicas. Condições experimentais Primeira etapa Segunda etapa T01 – Normóxia (n=09) T01 – Normóxia (n=08) T02 – Hipóxia 3 horas (n=09) T02 – Hipóxia 6 horas (n=08) T03 – Hipóxia 3 horas, réplica (n=09) T03 – Hipóxia 6 horas, réplica (n=08) Para que fosse estabelecida hipóxia nos tanques 2 e 3, os aeradores foram desligados, e a fim de evitar os peixes pudessem fazer uso do oxigênio presente na lamina superficial da água, redes de contenção foram fixadas nesta região. A concentração de oxigênio dissolvido foi monitorada através da Sonda multiparamétrica Radiometer Analytical – Pionner até que alcançasse a condição de hipóxia ou valor de OD inferior a 2mg/dl para o inicio do experimento, finalizando-se após 3 horas e 6 horas. (A) (B) (C) Figura 7: Redes de contenção (A e C) instaladas nos tanques para experimento de hipóxia realizado para B. opalinus, impedindo acesso dos peixes ao oxigênio superficial. (B) Monitoramento do OD e temperatura. A coleta de sangue foi realizada via punção caudal utilizando-se seri ngas descartáveis com 10% de EDTA, tendo sido amostrado um animal por vez. Para tal procedimento, os peixes foram anestesiados em água contendo 100 mgL-1 de benzocaína. As amostras de sangue coletadas em tubo pediátrico, aproximadamente 700 µl, foram acondicionadas em gelo até o momento da análise em laboratório. Após a coleta do sangue, procedeu-se a biometria dos peixes e posterior sacrifício visando retirar os tecidos para as análises genéticas. Para a realização da segunda etapa (réplicas), adotou-se os mesmos procedimentos anteriormente descritos: oito peixes distribuidos em três tanques, sendo um para normóxia ou controle e outros dois para hipóxia 3 e 6 horas. 4.3 Parâmetros hematológicos As amostras de sangue foram levadas imediatamente ao Laboratório de Análises Clínicas Quaglia, as quais foram processadas para a análise da série vermelha em contador de células eletrônico Coulter-STKS, obtendo o número de eritrócitos (Ert), hemoglobina (Hb), hematócrito (Ht) e índices hematológicos (VCM, HCM e CHCM). 4.4 Glicose plasmática A taxa de glicose foi determinada pelo método da glicose oxidase através de um dosador de glicose ONETOUCH ULTRA®. Tal procedimento consistiu na leitura por meio de uma gota do sangue total em fita específica inserida no aparelho e então processada a leitura da glicose. Os valores de glicose sanguínea foram expressos em mg/dL. 4.5 Análise estatística Os resultados obtidos foram expressos em média ± desvio padrão. As médias obtidas nos diferentes tempos de amostragem foram comparadas com o momento controle por uma análise de variância ANOVA Kruskal-Wallis. 4.6 Análise genético-bioquímica Com a finalidade de verificar o número de locos gênicos que codificam a Malato Desidrogenase (mMDH / sMDH) e Lactato Desidrogenase (LDH), foram utilizados músculo esquelético, coração e fígado. 4.6.1 Preparo dos tecidos Frações dos tecidos foram retiradas dos animais recém sacrificados (após amostragem de sangue) e estocadas a – 20 °C até o momento de uso. Para o preparo dos extratos uma porção de cada tecido foi homogeneizada em tampão Fosfato de Potássio 0,05 M, pH 7.0, numa proporção de 2:1. Posteriormente foram centrifugados a 12.000 RPM por 20 minutos, em centrifuga refrigerada a 4°C no Laboratório de Cultura de Células - IP&D / UNIVAP. 4.6.2 Eletroforese no gel de amido Para a determinação dos padrões enzimáticos foram utilizadas as técnicas eletroforéticas em de gel de amido, sistema horizontal, segundo Smithies (1955). Para o preparo do gel utilizou-se o amido de milho, sendo utilizada a concentração de 14% . O sistema de tampão utilizado para o preparo do gel foi o Tris-citrato, pH 6.9 (0.75 M Tris e 0.25 M de ácido cítrico), diluído 60 vezes para o gel (0.017 M) e, 20 vezes para os eletrodos (0.05 M), segundo Whitt (1970). A aplicação das amostras foi realizada inserindo-se pequenos retângulos de papel Whatman 3MM no gel em cortes transversais feitos previamente a uma distância de 5cm da extremidade catódica. As migrações eletroforéticas foram realizadas a 4 °C, num intervalo de 14 a 17 horas e 5 V/cm, no Laboratório de Saneamento Ambiental – FEAU / UNIVAP. Após a eletroforese em gel de amido, este foi seccionado transversalmente em duas camadas, sendo uma delas submetida à solução de coloração específica para MDH e a outra à coloração específica para a LDH. 4.6.3 Detecção enzimática Para a determinação dos padrões eletroforéticos obtidos os géis foram submetidos à soluções de coloração específica para: a) Malato Desidrogenase (MDH) Para a MDH foi empregada a solução de coloração segundo Shaw e Prasad (1970) modificado por Schwantes e Schwantes (1982). Esta utiliza sal de tretazólio (MTT) que, quando reduzido forma um composto colorido (a formazana) que é intensamente corada e não se difunde rapidamente de seus sítios de formação. Como a coenzima NAD não reage diretamente com o sal de tetrazólio, torna-se necessária a presença de agente transportador de hidrogênio como intermediário. Nesse caso foi utilizado a fenazina metassulfato (PMS). Tabela 4: Solução de coloração especifica para MDH Drogas Concentração NAD 4.3 x 10-4 M MTT 8.5 x 10-4 M PMS 1.6 x 10-4 M Tris 0.05 M Agar 1.5% Ac. Málico 0.2 M A solução do ágar faz com que a solução de coloração fique geleificada sobre o gel de amido, reduzindo consideravelmente a quantidade de drogas em cada coloração. A metade do gel contendo a solução de coloração foi incubada a 37°C no escuro por, aproximadamente, 20 minutos. Para interromper o processo de coloração foi utilizada uma solução de ácido acético 7,5%. b) Lactato Desidrogenase (LDH) A coloração enzimática para a LDH baseia-se também na redução dos sais de tetrazólio e PMS (fenazina metassulfato) como transportador intermediário de elétrons. Na detecção da atividade da LDH foi utilizada solução de coloração, segundo Allendorf el al.(1977): Tabela 5: Solução de coloração especifica para LDH Drogas Concentração NAD 4.3 x 10-4 M MTT 8.5 x 10-4 M PMS 1.6 x 10-4 M Ágar 1.5% Lactato de Lítio 64 mM Tris 0.1 M Assim como na coloração para MDH, a utilização do agar se faz necessária visando reduzir a quantidade de drogas na solução. Ácido acético 7,5% foi empregado para cessar o processo de coloração, após permanência no escuro (37ºC) por aproximadamente 20 minutos. 4.7 Calculo de Freqüência Gênica As freqüências gênicas foram calculadas com base na análise dos padrões detectados em eletroforese, admitindo-se herança mendeliana simples do tipo codominante. 4.8 Testes de Termoestabilidade A fim de se verificar a termoestabilidade dos produtos dos diferentes locos da MDH, foi empregada a técnica de incubação de extratos de músculos esqueléticos e fígado em banho na temperatura de 50 ºC. Foram analisados diferentes tempos:1’,3’,5’,7’, 8’, 9’, 10’. Em seguida a incubação, os extratos foram imediatamente aplicados em gel de amido juntamente com os controles de cada tecido e submetidos à eletroforese. Após o termino da eletroforese foi efetuada a coloração para MDH, segundo método descrito acima, para visualização das subunidades da isozima. 4.9 Fracionamento celular O fracionamento celular consiste em uma série de procedimentos que levam à separação das organelas de células de tecidos específicos, para estudos peculiares a uma enzima ou estrutura celular. Inicialmente faz-se a homogeneização do tecido em solução isotônica de sacarose, a qual permite rompimento da membrana plasmática, mas impede o dano de organelas. A fim de verificar a atividade da sMDH e mMDH, se utilizou o método descrito segundo Meizel e Markert (1967), por centrifugação diferencial. 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO 5.1 Parâmetros Ambientais Condições inadequadas de qualidade da água prejudicam o crescimento, a reprodução e a sobrevivência de peixes. Diversas variáveis e processos físicos, químicos e biológicos interagem entre si determinando a qualidade da água. A fim de monitorar os parâmetros físico-químicos da água e níveis de oxigênio durante o experimento, foram avaliados pH, OD, temperatura e condutividade elétrica, nos diferentes tanques (Tabela 06). Pode-se observar que as condições experimentais foram mantidas praticamente constantes, apresentando grandes variações apenas para a concentração de oxigênio garantindo o ambiente hipóxico. Tabela 6: Índices monitorados na água dos tanques durante experimento realizado com B. opalinus condicionado à hipóxia. Oxigênio Parâmetros dissolvido Temperatura Condutividade elétrica PH °C mg/dl µs/cm Normóxia 7,0 ± 1,0 7,5 ± 0,5 23,0 ± 1,0 43,0 ± 3,0 Hipóxia 3h 2,0 ± 0,3 7,3 ± 0,5 23,0 ± 1,0 40,5 ± 3,0 Hipóxia 6h 1,8 ± 0,3 7,5 ± 0,5 23,0 ± 1,0 44,0 ± 2,0 A temperatura da água é um dos fatores mais importantes nos fenômenos químicos e biológicos dos organismos aquáticos. Todas as atividades fisiológicas dos peixes estão intimamente ligadas à temperatura da água (JIAN , CHENG, CHEN, 2003; KUBITZA, 2003). Os peixes ajustam sua temperatura corporal de acordo com a temperatura da água. Cada espécie tem uma temperatura ideal na qual melhor se adapta e se desenvolve, sendo esta temperatura chamada de temperatura ótima. As temperaturas acima ou abaixo do ótimo influenciam de forma a reduzir seu crescimento (BUTTNER, SODERBERG, TERLIZZI, 1993). O metabolismo dos peixes é maior à medida que aumenta a temperatura. Os peixes de águas tropicais geralmente vivem bem com temperaturas entre 20 – 28ºC. No presente trabalho, em todas as condições verificadas, a temperatura manteve-se constante (23,0 ± 1,0 °C). Assim, o efeito desta variável sobre os organismos estudados não deve ter promovido mudanças metabólicas nas diferentes condições experimentais, garantindo o conforto térmico da espécie em estudo. O pH é considerado um parâmetro importante, já que possui efeito direto sobre o metabolismo e os processos fisiológicos. A faixa de tolerância de pH para os peixes está compreendida entre 4.0 e 9.0, enquanto o índice ideal é entre 6.5 e 8.0 (WURTS ; DURBOROW, 1992). Valores extremos de pH prejudicam o crescimento e a reprodução dos peixes, e ainda podem causar mortalidade principalmente nas fases iniciais de desenvolvimento (KUBITZA, 2003). O pH também afeta a toxicidade de vários poluentes comuns, como a amônia e metais pesados. Alteração no pH na água pode afetar o funcionamento branquial, prejudicando o equilíbrio osmótico, o que determina grandes dificuldades respiratórias. Também para este parâmetro os valores observados foram constantes (7,5 ± 0,5 / 7,3 ± 0,5), e dentro dos limites fisiológicos ideais. A condutividade elétrica expressa a quantidade de sais existentes na água, é uma expressão numérica da capacidade de uma água conduzir a corrente elétrica. Este parâmetro também fornece uma boa indicação das modificações na composição de uma água, especialmente na sua concentração mineral, mas não fornece nenhuma indicação das quantidades relativas dos vários componentes. Em geral, níveis superiores a 100 µS/cm indicam ambientes impactados (CONAMA 357, 2005). No presente trabalho os valores para condutividade elétrica variaram de 40,5 ± 3,0 µS/cm (normóxia) a 44,0 ± 2,0 µS/cm (hipóxia 6 horas), portanto de acordo com a resolução Conama 357/05. 5.2 Respostas fisiológicas e bioquímicas frente à hipóxia Condições ambientais desfavoráveis à sobrevivência dos peixes, como baixa concentração de oxigênio dissolvido, induzem ajustes comportamentais, fisiológicos e bioquímicos que lhes permitem sobreviver. Segundo Val e Almeida-Val (1995), as alterações ambientais possuem importância fundamental no surgimento de características adaptativas, assim como na estratégia de sobrevivência e evolução dos peixes. A adaptação a novos ambientes envolve mecanismos estratégicos, incluindo características morfofisiológicas, reprodutivas e comportamentais similares, que durante o processo evolutivo podem ter se disseminado no nível das populações e espécies, resultando em muitos casos no que é conhecido como convergência adaptativa. Outros estudos mais direcionados mostram que diferentes espécies podem reordenar seu metabolismo de acordo com o estresse ao qual estão expostas, como por exemplo, ao estresse causado por exposição à hipóxia prolongada (ALMEIDA-VAL et al. 1995). Vários fatores também podem determinar a resposta hematológica à hipóxia, as quais variam com a espécie (TAVARES-DIAS e MORAES, 2004). Contudo, devese destacar que a instabilidade do ambiente interno dos peixes, aliada a outros fatores intrínsecos e extrínsecos, causa enorme variabilidade dos parâmetros hematológicos, mesmo entre indivíduos da mesma família (RANZANI-PAIVA; SILVASOUZA, 2004). Fatores como o estado nutricional, sazonalidade, maturação gonadal, sexo e variação genética também podem influenciar as variáveis hematológicas (KORI-SIAKPERE, 1985). Assim, exames hematológicos são necessários à caracterização fisiológica de uma espécie e em trabalhos de manejo de criações, podendo ser relacionados à presença de alterações ambientais (RANZANI-PAIVA ; SILVA-SOUZA, 2004). 5.2.1 Variáveis Hematológicas Dentre os peixes de respiração aquática encontramos aqueles que aparentemente não apresentam adaptação à hipóxia, espécies que utilizam a respiração superficial e outras que suportam longas temporadas de redução na concentração de oxigênio em seu ambiente (ALMEIDA-VAL; VAL,1995), tais fatos demonstram que a resposta hematológica à hipóxia varia com a espécie (TAVARES DIAS; MORAES, 2004). A Tabela 07 apresenta as médias e desvio padrão verificado para os parâmetros hematológicos e índices hematimétricos, nas diferentes condições experimentais. Os resultados da análise de variância verificados para a comparação entre as médias obtidas nos diferentes tempos de amostragem com o controle são apresentados na Tabela 08. Tabela 7: Média e desvio padrão dos parâmetros hematológicos investigados na espécie B. opalinus condicionado à normóxia e hipóxia. Ert Hb Htc VCM HCM CHCM (106/mm³ ) (g/dl) (%) (µm³) (pg) (%) Normóxia 1.9 ± 0.2 12.8 ± 0.9 37.7 ± 4.4 190.3 ± 8.2 66.5 ± 7.3 34.4± 4.3 Hipóxia 3h 2.1 ± 0.5 13.4 ± 1.2 42.3 ± 5.7 200.6 ± 4.0 61.5 ± 4.4 30.5± 3.8 Hipóxia 6h 2.4 ± 0.2 15.1 ± 0.8 44.6 ± 7.7 190.1 ± 6.6 63.6 ± 4.6 34.3± 4.8 Parâmetros* (*) Eritrócitos (Ert), hemoglobina (Hb), hematócrito (Htc), volume corpuscular médio (VCM), hemoglobina corpuscular média (HCM), concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM). Tabela 8: Análise de variância (ANOVA Kruskal-Wallis) dos dados hematológicos analisados em B. opalinus. Parâmetros Ert Hb Htc VCM HCM CHCM ns ns ns ns ns ns p < 0,01 p < 0,01 p < 0,05 ns ns ns ns p < 0,01 ns ns ns ns Normóxia vs Hipóxia 3h Normóxia vs Hipóxia 6h Hipóxia 3h vs Hipóxia 6h ns: não significativo. Segundo Fernandes et al. (1999), a liberação de eritrócitos do reservatório esplênico, ajustes nas concentrações iônicas e de fosfatos orgânicos em eritrócitos podem ocorrer em resposta à baixa concentração de oxigênio. Todavia, estudos realizados com Pacu submetidos à hipóxia por 2, 4 e 6 horas (PANEPUCCI et al., 2001), assim como com Tambaqui (PORTO, 2005) não apresentaram alterações quanto ao número de células vermelhas. No presente trabalho, verificou-se que, para todas as condições experimentais, os valores obtidos quanto ao número de eritrócitos apresentaram-se muito próximos, sendo o grupo controle ou normóxia, semelhantes aos estudos de Ranzani-Paiva (1991) para a mesma espécie, assim como para outros teleósteos (TAVARES-DIAS et al. 2002; PORTO, 2005; SANTOS, 2006). Todavia, quando são consideradas as análises estatísticas para eritrócitos, observa-se entre o grupo controle (1.9 ± 0.2 106/mm3) e hipóxia 6 horas (2.4 ± 0.2 106/mm3), diferença significativa (p<0,01) (tabela 08). A Figura 08 apresenta a variação no número de eritrócitos nas diferentes condições estudadas. Eritrócitos Ert (106/mm 3) 3.0 2.0 1.0 0.0 normóxia hipoxia 3h hipóxia 6h condições experientais Figura 8: Gráfico dos valores obtidos para eritrócitos de B. opalinus para normóxia, hipóxia 3 horas e hipóxia 6 horas. Barra de erros - 95% de intervalo de confiança para cada determinação. Em todos os vertebrados, o transporte de oxigênio é efetivado pelas moléculas de hemoglobinas presentes nos eritrócitos sendo que, a quantidade de oxigênio transportada depende da tensão de oxigênio, do número de eritrócitos, da quantidade de hemoglobina nos eritrócitos e da afinidade desta proteína ao oxigênio (NIKINMAA, 1997). A Figura 09 apresenta a variação da concentração de hemoglobina nas três condições avaliadas, podendo ser observado menor valor para normóxia (12.8 ± 0.9 g/dL) e maior valor para hipóxia 6 horas (15.1 ± 0.8 g/dL), estando de acordo com outros estudos em condições de hipóxia realizados com peixes teleósteos (AFFONSO et al., 2002; MORAES et al.; 2002; WELLS et al., 2005). Comparando os valores de normóxia vs hipóxia 6horas e hipóxia 3 horas vs hipóxia 6 horas tem-se que estes são estatisticamente diferentes (p<0,01) (Tabela 08). Os peixes possuem sistema múltiplo de hemoglobina (RIGGS, 1979), demonstrado um caráter adaptativo desses vertebrados. A regulação da síntese protéica ajusta cada componente hemoglobínico de acordo com os níveis de oxigênio ou outras alterações como resposta a pressão do meio ambiente (VAL; VAL-ALMEIDA, 1995), entretanto no presente estudo não foi ana lisada a composição da estrutura dessa proteína, onde talvez poderia estar ocorrendo mudanças frente as condições experimentais aqui conduzidas. Hemoglobina Hb (g/dL) 16.0 12.0 8.0 4.0 normóxia hipoxia 3h hipóxia 6h condições experimentais Figura 9: Gráfico dos valores obtidos para hemoglobina de B. opalinus para normóxia, hipóxia 3 horas e hipóxia 6 horas. Barra de erros - 95% de intervalo de confiança para cada determinação Análises hematológicas, considerando-se a série vermelha, podem permitir o estabelecimento de relações entre estas e a concentração de oxigênio disponível no ambiente. Evolutivamente, peixes mais primitivos em ambientes lênticos, sedentários e bentônicos apresentam menores valores de hematócrito, sendo os maiores valores observados em espécies pelágicas (LARSSON et al, 1976). Morone saxatilis mantidos em reservatório mostram redução na concentração de hemoglobina, hematócrito e do número de eritrócitos em decorrência da baixa concentração de oxigênio dissolvido (LOCHMILLER , WEICHMAN, ZALE, 1989). Segundo Chapmam et al, (2002) o aumento na concentração de hemoglobina e hematócrito foram demonstrados em peixes vivendo em condições de hipóxia na região pantanosa do lago Vitória na África Ocidental. Tais fatos demonstram que as espécies podem responder de modo distinto a baixas concentrações de O2. A variação quanto à porcentagem de hematócrito avaliada para as 3 condições experimentais é apresentada na Figura 10, sendo observada a média de 37,7 % para normóxia, 42,3 % para hipóxia 3 horas e 44,6 % para hipóxia 6 horas. Diferença estatística significativa foi observada em relação ao grupo controle e hipóxia 6 horas (p<0,05). Hematócrito 50 Ht % 40 30 20 10 0 normóxia hipoxia 3h hipóxia 6h condições experimentais Figura 10: Gráfico dos valores obtidos para hematócrito de B. opalinus para normóxia, hipóxia 3 horas e hipóxia 6 horas. Barra de erros - 95% de intervalo de confiança para cada determinação Segundo Val et al. (1990), geralmente a resposta à hipóxia pode apresentar correlação negativa de parâmetros como hemoglobina e hematócrito versus a concentração de oxigênio dissolvido na água, indicando um direcionamento a adaptação frente à nova situação ambiental. A Figura 11 apresenta valores médios para volume corpuscular médio (VCM), sendo maior em hipóxia 3 horas (200.6 ± 4.0 µm3) e praticamente invariável em normóxia (190.3 ± 8.2 µm3) e hipóxia de 6 horas (190.1 ± 6.6 µm 3). Volume Corpuscular Médio 220 VCM (µm³) 210 200 190 180 170 160 normóxia hipoxia 3h hipóxia 6h condições experimentais Figura 11: Gráfico dos valores para volume corpuscular médio (VCM) de eritrócitos de B. opalinus para normóxia, hipóxia 3 horas e hipóxia 6 horas. Barra de erros - 95% de intervalo de confiança para cada determinação Para hemoglobina corpuscular média (HCM) (Figura 12) e concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM) (Figura 13) observou-se os menores valores na condição de hipóxia 3 horas (61.5 ± 4.4 pg e 30.5 ± 3.8 %, respectivamente) em relação à normóxia (66.5 ± 7.3 pg e 34.4 ± 4.3 % respectivamente) e hipóxia 6 horas (63.6 ± 4.6 pg e 34.3 ± 4.8 %, respectivamente). Hemoglobina Corpuscular Média 75 HCM (pg) 70 65 60 55 50 normóxia hipoxia 3h hipóxia 6h condições experimentais Figura 12: Gráfico dos valores de hemoglobina corpuscular média (HCM) de B. opalinus para normóxia, hipóxia 3 horas e hipóxia 6 horas. Barra de erros - 95% de intervalo de confiança para cada determinação. Concentração de Hemoglobina Corpuscular Média CHCM (%) 38.0 36.0 34.0 32.0 30.0 28.0 normóxia hipóxia 3h hipóxia 6h condições experimentais Figura 13: Gráfico dos valores de concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM) de B. opalinus para normóxia, hipóxia 3 horas e hipóxia 6 horas Barra de erros - 95% de intervalo de confiança para cada determinação. As análises estatísticas realizadas não revelaram diferença significativa para os índices hematimétricos VCM, HCM e CHCM, no entanto se observou aumento para VCM em condição de hipóxia 3 horas comparado à normóxia sugerindo ajustes osmoregulatórios como resposta à baixa disponibilidade de oxigênio dissolvido (BARTON, 2002; TAVARES-DIAS e MORAES, 2004; TERVONEN et al.,2006). Considerando a hipóxia uma situação de estresse, o aumento no volume eritrocitário pode ser decorrente da hidratação celular, uma vez que a adrenalina, uma das catecolaminas produzidas durante este processo causa inchaço nas células vermelhas (NIKINMAA, 1982). Essa catecolamina parece produzir retenção de sódio e cloreto no meio intracelular aumentando a sua concentração, que induz entrada de água na célula e aumento no volume eritrocitário (RAILO et al., 1985). Tal fato pode ter acarretado diminuição dos índices de HCM e CHCM, o que pode ser observado nas Figuras 12 e 13, onde se verifica correlação negativa entre esses índices nos experimentos de hipóxia 3 horas e hipóxia 6 horas e ausência de correlação em situação de normóxia (Fig. 14, 15 e 16). O incremento do volume celular também pode estar relacionado com uma maior deformabilidade das membranas dos glóbulos vermelhos que determinaria a diminuição na viscosidade sangüínea (NIKINMAA, 1990). De fato se há demonstrado uma possível ação das catecolaminas sobre os receptores de membrana de glóbulos vermelhos, aumentando a deformabilidade destes, facilitando assim o fluxo sangüíneo em períodos de estresse, devido à baixa na viscosidade (PARKHURST, WELLS, CARRAGHER, 1992). normóxia 45.0 40.0 A 35.0 CHCM 30.0 25.0 y = 0.0879x + 19.047 R2 = 0.0332 20.0 15.0 10.0 5.0 0.0 175.0 180.0 185.0 190.0 195.0 200.0 VCM Figura 14: Correlação dos índices VCM e CHCM de B. opalinus em normóxia. 45.0 hipóxia 3 horas B 40.0 35.0 CHCM 30.0 25.0 20.0 y = -0.2151x + 73.694 R2 = 0.6209 15.0 10.0 5.0 0.0 175.0 185.0 195.0 205.0 215.0 225.0 235.0 VCM Figura 15: Correlação dos índices VCM e CHCM de B. opalinus em hipóxia 3 horas. hipóxia 6 horas 45.0 40.0 35.0 CHCM 30.0 25.0 y = -0.2458x + 81.024 R2 = 0.7279 20.0 15.0 10.0 5.0 0.0 160.0 170.0 180.0 190.0 200.0 210.0 220.0 230.0 VCM Figura 16: Correlação dos índices VCM e CHCM de B. opalinus em hipóxia 6 horas 5.2.2 Glicose Plasmática Os peixes são completamente dependentes do metabolismo aeróbico, exceto em breves períodos de anaerobiose como durante natação em alta velocidade e oscilações na concentração de oxigênio dissolvido (VAL,1995). Segundo Hochachka (1980), a limitação de oxigênio ao nível celular pode comprometer as funções fisiológicas dos organismos. Alem dos ajustes fisiológicos, comportamentais e morfológicos garantirem a sobrevivência em hipóxia, uma combinação de redução da taxa metabólica com ativação do metabolismo anaeróbico pode ocorrer em muitos vertebrados (HOCHCHKA ; SOMERO, 2002). Normalmente, o aumento da glicose está relacionado com a liberação de cortisol e outros hormônios, principalmente catecolaminas (MOMMSEN, VIJAYAN, MONN 1999). Segundo MacCormack e al (2006) os aumentos de glicose e lactato plasmáticos verificados em Pterygoplichthys pardalis submetidos à hipóxia sugerem uma estratégia metabólica anaeróbica. A tabela 09 apresenta os resultados obtidos para glicose plasmática em normóxia, hipóxia 3 horas e hipóxia 6 horas assim como as análises estatísticas realizadas. O tratamento estatístico revelou que os níveis de glicose plasmática não foram significativamente diferentes nos grupos experimentais em relação ao grupo controle. Tabela 9: Médias e desvio padrão para a dosagem de glicose plasmática de B. opalinus em nomóxia, hipóxia 3h e hipóxia 6h Glicose (mg/dL) Condições Experimentais Média Desvio Análise Padrão estatística Normóxia 66,2 ± 22,1 ns Hipóxia 3 horas 68,8 ± 35,5 ns Hipóxia 6 horas 76,3 ± 27.4 ns Também em estudos realizados por Porto (2005) e Gomes et al (2006) com Tambaqui (Colossoma macropomum ) e por Panepucci et al. (2001) para Pacu (Piaractus mesopotamicus), não apresentaram mudanças nas concentrações de glicose plasmáticas nos animais expostos a baixas concentrações de oxigênio. No entanto, segundo Panepucci et al. (2001), alterações no metabolismo da glicose podem ocorrer em outros tecidos, como por exemplo, músculo e coração, como observado para pacu. Apesar das diferenças aqui observadas serem consideradas não significativas pelas analises estatísticas, pode-se verificar que em hipóxia 6 horas e 3 horas os valores foram 15% e 4%, respectivamente, superiores ao de normóxia. A baixa oferta de OD no ambiente pode causar nos peixes, aumento de níveis plasmáticos de corticosteróide, osmolaridade plasmática e pH sangüíneo (TAVARES-DIAS ; MORAES, 2004). As respostas ao estresse (Fig. 17) em peixes podem ser divididas em primária, secundária e terciária (CARMICHAEL et al.,1984; MAZEUAUD et al.,1977; IWAMA, VIJAYAN, MORGAN 1999; BARTON, 2002). A resposta neuroendrócrina, ou primária, é caracterizada por um aumento dos hormônios corticosteróides (cortisol) e da concentração de catecolaminas (adrenalina e noradrenalina). Na resposta secundária há aumento dos níveis de glicose no sangue, devido à hidrólise das reservas de glicogênio no fígado e aumento do batimento cardíaco. Figura 17: Resposta fisiológica ao estresse segundo Barton, 2002 Para atender a demanda de energia do organismo, as catecolaminas atuam diretamente no fígado, transformando o glicogênio em glicose (glicogenólise), causando hiperglicemia. A hiperglicemia significa um custo energético para o organismo, o qual responde aumentando a resistência tecidual periférica à insulina, reduzindo a utilização total de glicose, processo mediado por hormônios contrarregulatórios como as catecolaminas, cortisol e glucagon (MOMMSEN, VIJAYAN, MONN, 1999) A resposta terciária é marcada pela diminuição da resistência dos peixes às doenças, pois ocorre uma diminuição no número de leucócitos, ocorrendo linfocitopenia (diminuição do número de linfócitos) e neutrofilia (aumento do número de neutrófilos circulantes) segundo Mazeuaud et al. (1977). 5.2.3 Variação genético-bioquímica - Isozimas As atividades metabólicas fundamentais dos organismos são muito similares e consequentemente, diferentes organismos e diferentes tecidos apresentam reações catalíticas idênticas (DEVLIN ; MICHELACCI 2003). Entretanto, quando as enzimas são analisadas do ponto de vista químico e sorológico, se utilizando de uma variedade de testes enzimáticos, apresentam-se diferentes entre organismos. Em vista do controle genético na síntese de proteínas, não é de se surpreender que existam diferenças na estrutura de enzimas homólogas sintetizadas por animais de uma mesma espécie, os quais são genotipicamente distintos (LEHNINGER, NELSON, COX, 2006). Nos vertebrados inferiores, especialmente em peixes, estas diferenças ou heterogeneidade parecem ser maiores, principalmente no que diz respeito às hemoglobinas, desidrogenases, isomerases e a muitas outras proteínas. 5.2.3.1 Malato desidrogenase: Padrão eletroforético e especificidade tissular Os padrões eletroforéticos da MDH de Brycon opalinus foram interpretados de acordo com a mobilidade relativa e a especificidade tissular dos seus componentes. Dados obtidos no presente trabalho sugerem que cada uma das bandas de MDH é um dímero formado pela combinação de duas classes de subunidades A e B, e a distribuição das isoformas nos tecidos estudados (fígado, coração e músculo esquelético), mostrou especificidade considerável de cada subunidade em relação aos tecidos analisados. No presente trabalho, os 51 exemplares de Pirapitinga do Sul analisados, apresentaram para a malato desidrogenase solúvel (sMDH) dois fenótipos: em 42 exemplares observou-se um padrão eletroforético de três componentes e em 9 exemplares, um padrão de seis componentes (Figura 18), não tendo sido observada a presença da fração mitocondrial (mMDH) no controle. Figura 18: Expressão fenotípica em eletroforese da isozima MDH, em figado (F), coração (C) e músculo esquelético (M) de B. opalinus. Presença de alelo variante (B * 106). Foi realizado o cálculo da freqüência gênica (Tabela 10) a fim de avaliar se a variação fenotípica observada poderia ser considerada polimorfismo. De acordo com a lei de Hardy- Weinberg admitindo-se herança Mendeliana simples, do tipo codominante, o valor de χ 2 obtido (0,6025), indica que a população está em equilíbrio. Assim, para a espécie, a sMDH seria codificada por dois locos sMDH-A* e sMDH-B* com a presença de um alelo variante mais rápido *106 no loco B*. Tabela 10: Cálculo de freqüência gênica para alelo variante *106 no loco B*. p2 2 pq q2 Total Observado 41 10 0 51 Esperado 81,3533 17,6855 0,9612 100% número 41,49 9,019 0,49 51 Desvios -0,49 0,981 -0,49 χ2 = 0,6025 O número de genes que codifica a MDH pode variar entre os vertebrados. Em répteis, aves e mamíferos as sMDH existe tipicamente como uma banda principal (FISHER et al., 1980), que sugere a presença de apenas um loco gênico. Em peixes e anfíbios três bandas anódicas, eqüidistantes são comumente presentes (BAILEY et al., 1970). Presumivelmente, essas bandas das sMDH na maioria dos casos, são produzidas por dois locos, que codificam as duas subunidades da sMDH, no entanto podem apresentar bandas distintas quando há variação alélica ou polimorfismo genético. Geralmente, a primeira indicação de um polimorfismo protéico numa espécie ocorre quando em alguns indivíduos dessa, o padrão eletroforético de proteínas apresenta maior número de bandas que o esperado, provavelmente pela formação de heteropolímeros entre as subunidades codificadas pelo alelo mais freqüente e o alelo variante. O polimorfismo genético faz referência à existência em uma população de múltiplos alelos de um gene, sendo uma variação na seqüência de um determinado sitio no DNA entre os indivíduos de uma população. Polimorfismos, os quais afetam a seqüência codificante ou reguladora e produzem mudanças importantes na estrutura da proteína, podem traduzir diferentes fenótipos. As alterações pouco freqüentes na seqüência das bases no DNA são apenas mutações, assim, para que verdadeiramente se considere essa modificação um polimorfismo, a variação deve aparecer ao menos em 1% da população. Em relação a especialização funcional de uma enzima, sua medida é a extensão na qual ela se expressa em um determinado número de tecidos. Geralmente as enzimas menos especializadas são expressas em um grande número de tecidos. Assim, a exemplo do estabelecido pela literatura (WILSON et al., 1973; CLAYTON, HARRIS, TRETIAK, 1975), a forma menos anódica da sMDH (isoforma A), apresentou-se com maior intensidade em tecido hepático, sendo também detectada em músculo esquelético e cardíaco, tecidos estes onde ocorreu predomínio da isoforma B. Em várias espécies de peixes os três componentes da sMDH são muito mais intensos e anódicos que da mMDH (BAILEY et al., 1970). Em outras espécies como no atum (KITO; LEWIS, 1967), a sMDH apresenta-se menos anódica que a mitocondrial. Neste sentido, considerando que a localização celular de ambas as formas da MDH a técnica de fracionamento celular por centrifugação diferencial, segundo Meizel e Markert (1967) foi realizada a fim de verificar a se a não detectaçao da fração mitocondrial seria referente à sobreposição das duas isoformas: sMDH-A e mMDH. Alem disso, considerando a estabilidade térmica diferencial apresentada entre mMDH e sMDH, testes de termoestabilidade em gel de amido também foram realizados. Os resultados observados para o fracionamento celular são apresentados na Figura 19. Assim, em normóxia foi possível separar as duas frações da MDH (solúvel e mitocondrial) presentes em fígado, o que significa que ambas as isoformas não foram visualizadas anteriormente pela sobreposição destas quando aplicada diferença de potencial elétrico. Em relação ao músculo, não foi alcançado o mesmo resultado satisfatório, sendo detectada somente a fração solúvel (sMDH). Para hipóxia de 6 horas, o resultado foi igualmente satisfatório para o fígado, revelando a presença da mMDH e, em músculo não foi dectada a fração mitocondrial. Todavia é possível se observar a presença da mMDH no controle porém com intensidade relativa menor. Figura 19: Fracionamento celular realizado para a MDH de fígado (F) e músculo esquelético (M) de B. opalinus em normóxia (A) e hipóxia 6h (B). s: fração solúvel / m: fração mitocondrial. A seta indica a presença da fração mitocondrial em músculo esquelético no controle. Os testes de termoestabilidade realizados com “pool” de tecido muscular esquelético e hepático demonstraram que para ambos os tecidos de Brycon opalinus, assim como para as diferentes condições ambientais, as subunidades A e B da sMDH não foram inativadas (Figuras 20 a 23). - MDH B* - MDH A* -0 C 1’ 3’ 5’ C 7’ 8’ 9’ 1 0’ Termoestabilidade – Norm óxia – M úsculo Esquelé tico Figura 20: Teste de termoestabilidade de MDH no tecido muscular esquelético de B. opalinus , nos tempos de 1, 3, 5, 7, 9 e 10 minutos à 50°C e controle (C). Amostra de tecido do grupo de animais em normóxia. - MDH - B* - MDH - A* -0 C 1’ 3’ 5’ C 7’ 8’ 9’ 10’ Termoestabilidade – hpx 6 h – m ú sculo Figura 21: Teste de termoestabilidade de MDH no tecido muscular esquelético de B. opalinus, nos tempos de 1, 3, 5, 7, 9 e 10 minutos à 50°C e controle (C). Amostra de tecido do grupo de animais em hipóxia 6 h. - MDH A* -0 C 1’ 3’ 5’ C 7’ 8’ 9’ 10 ’ T e r m o e s t a b i l i d a d e - N o r m óxia - f íg a d o Figura 22: Teste de termoestabilidade de MDH no tecido hepático de B. opalinus, nos tempos de 1, 3, 5, 7, 9 e 10 minutos à 50 °C e controle (C). Amostra de tecido do grupo de animais em normóxia. - MDH -A * - 0 C 1’ 3’ 5’ C 7’ 8’ 9 ’ 1 0’ Termoestabilidade – h p x 6h – fígado Figura 23: Teste de termoestabilidade de MDH no tecido hepático de B. opalinus, nos tempos de 1, 3, 5, 7, 9 e 10 minutos à 50 °C e controle (C). Amostra de tecido do grupo de animais em hipóxia 6h. A atividade enzimática depende de vários fatores tais como pH, concentrações de substrato/coenzima e temperatura. Segundo Zuber (1988) e Somero (1995), a temperatura seria o principal fator ambiental para todos os organismos, determinando a velocidade de seus processos biológicos, o estado estrutural de suas proteínas, assim como, a evolução desses organismos e de seus componentes celulares. Deste modo, durante a evolução dos organismos, o metabolismo celular e consequentemente, a estrutura e função dos componentes celulares se adaptaram às temperaturas ambientais e celulares (ZUBER, 1988). Schwantes e Schwantes (1982), estudando o possível caráter adaptativo dos locos da sMDH de Leiostomus xanthurus, peixe estuarino de região temperada, cuja temperatura variava de 5-30 °C anualmente. Detectaram as subunidades A e B, em diferentes níveis e tecidos , as quais podiam ser alteradas a partir de flutuações na temperatura ambiental. A adaptação à temperatura pelos dois locos da sMDH de teleósteos onde o sMDH-A* codifica a isoforma estável e o sMDH-B*, a termolábil, foi demonstrada por Schwantes e Schwantes (1982), Farias e Almeida-Val (1992), Lin e Somero (1995) e Aquino-Silva et al. (2003, 2008). No presente trabalho, os testes de termoestabilidade não permitiram diferenciar a fração solúvel da mitocondrial (problema este sanado pelo fracionamento celular), porém indicaram que os produtos dos locos A* e B* não apresentaram diferenças quando submetidos a 50 ºC por diferentes intervalos de tempo. 5.2.3.2 Lactato desidrogenase: Padrão eletroforético e especificidade tissular A lactato desidrogenase dos vertebrados é uma enzima de alto significado biológico e de especial interesse evolutivo por ocorrer como isozima codificadas por locos gênicos múltiplos que evoluíram substancialmente em sua estrutura e regulação, durante o desenvolvimento filogenético. Pesquisas pioneiras sobre a estrutura da LDH e sua expressão durante o desenvolvimento levaram ao estabelecimento do conceito de isozimas, como formas múltiplas enzimáticas codificadas em diferentes locos, e de seu significado biológico (MARKET ; MOLLER, 1959). Segundo Market, Shaklee, Whitt (1975), somente um loco gênico codificava a LDH no inicio da evolução dos vertebrados. A subunidade codificada por esse loco gênico adquiriu a habilidade de sofrer polimerização formando homotetrâmeros com propriedades similares aos da isozima A4, comumente encontrada em músculo esquelético da maioria dos vertebrados. Uma vez que os vertebrados contemporâneos têm, pelo menos, dois locos gênicos que codificam a sua LDH, o gene LDH-A* original, deve ter sofrido, muito cedo o evento de duplicação. Mais tarde, esses dois genes similares ao A*, divergiram por mutação, dando origem aos dois genes distintos denominados LDH-A* e LDH-B*, também detectados no presente trabalho. Os padrões eletroforéticos da LDH de Brycon opalinus foram interpretados de acordo com a mobilidade relativa e a especificidade tissular dos seus componentes. A Figura 24 apresenta o padrão eletroforético da LDH observado para os 51 exemplares de Pirapitinga do Sul estudados. Assim, nos três tecidos analisados, pode-se observar o produto dos locos LDH-A* e LDH-B*, com a predominância da subunidade A (isoforma A4) em músculo esquelético, das isoformas A4, A3B, A2B2 e B4 em músculo cardíaco e da isoforma B4 em tecido hepático. Para os tecidos/individuos analisados não foi observada a presença de alelos variantes. Figura 24: Expressão fenotípica em eletroforese da isozima LDH, em coração, músculo e figado de B. opalinus A exemplo do que ocorre na maioria dos vertebrados, também em B.opalinus, os locos que codificam LDH expressam-se diferentemente entre os tecidos. 5.3 Reorganização metabólica das isozimas frente à hipóxia As características estruturais e funcionais de um organismo, em geral, parecem ser especializadas em aumentar suas chances de sucesso no ambiente em que se encontram. Assim, adaptação seria a melhor maneira de um organismo realizar uma função tendo, normalmente, influência direta na sua sobrevivência e reprodução. Essas adaptações ambientais podem ser demonstradas em termos de: • Comportamento, onde os organismos parecem agir de forma a aumentar suas chances de sobrevivência, assim como, suas habilidades em explorar seus habitats particulares; • Anatomia, onde as estruturas do organismo parecem estar ajustadas ao seu modo particular de vida e; • Fisiologia, onde as formas pelas quais as funções vitais são realizadas, freqüentemente refletem as condições ambientais encontradas pela espécie. Assim, quando um organismo é estudado do ponto de vista adaptativo, deve ser considerado que todas as interações que este mantém com o ambiente, atuam diretamente sobre o seu metabolismo celular (HOCHACHKA ; SOMERO, 1984). 5.3.1 Padrão de expressão das isozimas da MDH O perfil eletroforético obtido para a MDH de Pirapitinga do Sul, nas três condições experimentais (Figura 25) mostra em situação de normóxia para o músculo esquelético, apenas a expressão das isoformas da fração solúvel (sMDH). Para as demais condições experimentais neste mesmo tecido, tanto hipóxia 3 horas quanto hipóxia 6 horas pode-se observar a presença do produto do loco mMDH*. Segundo Hochachka e Lutz (2001) as propriedades da membrana mitocôndrial e conseqüentemente sua atividade são alteradas em condições de hipóxia, na tentativa de suprimir a demanda por ATP. Entretanto no presente estudo a detecção da mMDH pode significar uma estratégia de adaptação ao ambiente para otimizar o aproveitamento de oxigênio. Tal fato pode estar relacionado com mudanças qualitativas na expressão gênica, tais como a alternância entre isoformas para atender a demanda metabólica (SOMERO, 2004; SCHULTE, 2004; WU, 2002). No presente trabalho, o do produto do loco-A* (sMDH) em tecido hepático, a exemplo do determinado para outras espécies (AQUINO-SILVA, 1992, AQUINOSILVA et al., 1997, 2003, 2008), poderia conferir a esta espécie uma maior eficiência no processo de redução do oxalacetato a malato, favorecendo o metabolismo no sentido glicolítico. Em situação de hipóxia (3 e 6 horas), a presença da fração mitocondrial da malato desidrogenase, envolvida no ciclo de Krebs, indicaria a manutenção do metabolismo glicolítico em tensões de OD inferiores a 2 mg/L. Figura 25: Expressão fenotípica de MDH em eletroforese em gel de amido, para fígado (F), coração (C) e músculo (M) de B. opalinus, em nomóxia (A), hipóxia 3 horas (B), hipóxia 6 horas (C). Segundo Almeida-Val et al., (2000), o papel da MDH no metabolismo oxidativo é intermediar o ciclo de Krebs, quando reduz malato a oxalacetato. Em estudos com Astronotus ocellatus, o alto nível de MDH observados no fígado refletiria seu papel na gliconeogênese. A hipóxia não necessariamente pode conduzir a ajustes da atividade da MDH no tecido hepático, apesar de ser um tecido aeróbio. Estudos com Piaractus mesopotamicus não foi observada variações entre normóxia e hipóxia, o que sugerindo que provavelmente esses mecanismos adaptativos não foram ativados (PANEPUCCI, 2001). Diferentemente, no presente trabalho se observou aumento da intensidade da mMDH nos três tecidos, indicando aumento da atividade para metabolismo oxidativo. Considerando o tecido cardíaco é possível observar o predomínio da isoforma B em normóxia e, em hipóxia 3 e 6 horas observa-se, a exemplo do músculo esquelético, a presença da fração mitocondrial. Aumento nos níveis de MDH representa maior disponibilidade de glicose para tecidos como coração, aumentando sua fonte de energia (ALMEIDA-VAL et al., 2000), já que peixes expostos à hipóxia promovem ajustes cardíacos (bradicardia hipóxica), vasculares e bioquímicos para manter a transferência de oxigênio do ambiente até os tecidos (OLIVEIRA et al., 2004; FERNANDES; RANTIN, 1999). Em estudos com Astronotus ocellatus (ALMEIDA-VAL et al., 2000), observouse que o aumento da MDH está relacionado com atividade mitocondrial no tecido cardíaco, no entanto estudos com Piaractus mesopotamicus, não demonstraram alteração nas atividades da MDH (PANEPUCCI et al., 2001). No presente trabalho, em Brycon opalinus, a presença da isoforma mitocondrial sugere aumento do metabolismo oxidativo nos momentos de hipoxia 3 e 6 horas, provavelmente suprindo a maior demanda metabólica nesses tecidos. 5.3.2 Padrão de expressão das isozimas da LDH A Figura 26 apresenta os padrões de expressão obtidos para LDH nas três condições experimentais: normóxia, hipóxia 3 horas e hipóxia 6 horas. Assim, podese observar para as diferentes situações que, no tecido hepático, ocorre apenas a expressão do produto do loco B*, porém com baixa intensidade, quando comparada aos demais tecidos. Quanto aos demais tecidos observa -se, em hipóxia 3 horas e hipóxia 6 horas, um aumento nas intensidades relativas dos produtos dos locos A* e B*. (A) (B) (C) Figura 26: Expressão fenotípica de LDH em eletroforese em gel de amido, em fígado (F), coração (C) e músculo (M) de B. opalinus para nomóxia (A), hipóxia 3 horas (B), hipóxia 6 horas (C). Segundo Almeida-Val et al. (2000), os tecidos aeróbicos tendem a evitar a acumulação anaeróbica do lactato regulando os níveis de LDH de acordo com a disponibilidade de oxigênio no ambiente. Quando a concentração de oxigênio na água alcança níveis muito reduzidos, as enzimas oxidativas são inibidas e a LDH ativada, gerando assim maior produção de lactato (ALMEIDA-VAL; VAL; HOCHACHKA, 1993). Estudos têm demonstrado que, apesar da produção de lactato estar relacionada com a inativação da mitocôndria pela falta de oxigênio, sua produção também ocorre sob condições onde não há hipóxia (PAROLIN et al. 2000; RICHARDS , HEIGENHAUSER, WOOD,2002). No entanto, em tecidos anaeróbicos como o músculo esquelético, as vias anaeróbias podem suportar os movimentos de natação e não teriam necessariamente uma correlação com a tolerância em ambientes com baixa concentração de oxigênio. Em estudos realizados com A. ocellatus, se observou grande capacidade de trabalho do músculo branco em condições de hipóxia, tendo sido observado aumento na atividade da LDH em relação ao estágio de desenvolvimento do animal. Tal resposta seria considerada como um aspecto positivo em relação à tolerância a falta de oxigênio (ALMEIDA-VAL et al., 2000). O estudo da LDH em músculo branco de Rhinelepis strigosa, aclimatados as diferentes temperaturas, revelou que a temperatura de 30°C há um aumento significativo na afinidade enzimática da LDH ao piruvato (PANEPUCCI, 2000). Em músculo esquelético de A. crassipinnis exposto a hipóxia moderada, há um decréscimo nos valores de LDH, os quais se restabelecem em hipóxia severa, resposta que sugere um ajuste no metabolismo para manter a produção anaeróbica de ATP e NAD/NADH citoplasmático (CHIPPARI-GOMES et al., 2005). Assim como, estudos realizados com B. cephalus em condições de hipóxia, não revelaram alteração na atividade da LDH em músculo esquelético (SANTOS, 2006). Neste sentido, pode-se observar que a capacidade de enzimas para responder à hipóxia, pode ser distinta em diferentes ambientes e espécies. No presente estudo foi evidenciando um aumento nas intensidades relativas na expressão dos fenótipos da lactato desidrogenase nas diferentes condições experimentais . 5.4 Plasticidade fenotípica e adaptação ao ambiente O conceito de plasticidade fenotipica se confunde com o de estresse (Fig. 17) e com o de “indicador biológico”. Todavia, estas abordagens têm um único objetivo: selecionar mecanismos nos diferentes níveis da organização biológica que permitam avaliar e prever os efeitos de mudanças induzidas por distúrbios ambientais antes que danos irreversíveis ocorram à população, comunidade, ou ecossistema (ALMEIDA-VAL, 1997). Por isso, conhecer as respostas metabólicas da biota a agentes estressantes torna-se extremamente importante para que se possam diagnosticar os principais efeitos das alterações ambientais sobre a mesma. Segundo Val e Almeida-Val (1995), as alterações ambientais possuem importância fundamental no aparecimento de características adaptativas, e na evolução dos peixes. Assim, a adaptação a novos ambientes tem resultado em ajustes nos diferentes níveis da organização biológica, aumentando tanto a plasticidade genotípica quanto fenotípica da maioria das espécies. Segundo Walker (1997), plasticidade fenotípica pode ser definida como os limites da variação morfológica e fisiológica na expressão de um dado genótipo quando este é exposto a mudanças nas condições ambientais. Esta pode envolver mudanças na morfologia como, por exemplo, partes da boca e do trato gastrintestinal, bem como nas capacidades digestivas e de absorção (BUDDINGTON, KROGDAHAL, BAKKE-MCKELLEP 1997; MAGNAN; STEVENS, 1993; MITTELBACH, WAINWRIGHT, OSENBERG, 1999). Esta plasticidade fenotípica possibilita ao individuo modificar seu comportamento alimentar e regular suas funções digestivas em relação à mudança na composição da dieta tendo, obviamente, implicações ecológicas. Estudos mais direcionados mostram que diferentes espécies podem reordenar seu metabolismo de acordo com o estresse ao qual estão expostas (ALMEIDA-VAL et al., 1995). Pode-se concluir que marcadores de estresse podem variar de espécies para espécie e dentre as espécies, além disso, ainda é possível considerar que adaptações desenvolvidas durante o processo evolutivo para um tipo de ambiente pode ser uma ferramenta útil ao peixe quando este lida com estresse provocado pela ação do homem (VAL ;ALMEIDA-VAL, 1999; PAULA-SILVA et al., 2002; ALMEIDA-VAL; DUNCAN; VAL, 2002). 5.4.1 Mecanismos adaptativos na produção de energia A manutenção das atividades biológicas é dependente da produção de energia. Uma das fontes desta energia, a imediata, são os derivados de fosfatos orgânicos, ricos de energia do músculo e a outra, é o metabolismo intermediário de carboidratos e lipídios. A glicose da corrente sanguínea penetra nas células onde é degradada até ácido pirúvico através de uma série de reações químicas. Outra fonte de glicose intracelular e consequentemente de ácido pirúvico, é o glicogênio, polímero da glicose especialmente abundante no fígado e músculo esquelético. Quando existe quantidade adequada de O2, o ácido pirúvico entra no ciclo do ácido cítrico (ciclo de Krebs ou dos ácidos tricarboxílicos) e é metabolizado até CO2 e H2O através da fosforilação oxidativa, liberando energia suficiente para formar grande quantidade de ATP a partir de ADP. Se o fornecimento de O2 não for suficiente, o ácido pirúvico proveniente da glicose não entra no ciclo dos ácidos tricarboxílicos, mas é transformado em ácido lático. Este processo de glicólise anaeróbica é associado à produção líquida de quantidades muito menores de ligações de fosfato de alta energia (DEVLIN ; MICHELACCI 2003; LENHINGER,2006). O ciclo dos ácidos tricarboxílicos necessita de O2 para a oxidação do NADH e não funciona em condições anaeróbicas. A glicólise até piruvato ocorre fora da mitocôndria, que então entra na mitocôndria, onde as enzimas que intervêm neste processo e no ciclo dos ácidos tricarboxílicos, se encontram dispostas ao longo dos compartimentos e paredes internas da mitocôndria. As fibras musculares com taxas relativamente baixas de contração não usam energia mais rapidamente do que a que pode ser restaurada através do metabolismo dos produtos alimentares e do oxigênio que lhes é fornecido. Contudo, as fibras usadas em acessos muito rápidos de atividade armazenam substanciais quantidades de glicogênio. Se o oxigênio não é carregado com bastante rapidez para a fosforilação oxidativa, quantidade considerável de energia é fornecida pela glicólise anaeróbica do glicogênio. Como o produto, ácido pirúvico, não pode entrar no ciclo do ácido cítrico na ausência de oxigênio é convertido em ácido lático que se difunde para fora das células. Quando o oxigênio disponível é suficente, a maior parte do ácido lático é reconvertido a glicose que é levada para as fibras musculares e restaura o glicogênio do músculo (VILLEE, BARNES, WALKER,, 1988). A presença de uma via aneróbica para a degradação da glicose tem uma consequência fisiológica importante, pois durante o exercício muscular, os vasos sanguíneos se dilatam e a irrigação sanguínea é aumentada de maneira que a provisão disponível de oxigênio é aumentada. Quando o esforço muscular é muito intenso, a resíntese aeróbica das reservas de energia não pode acompanhar sua utilização (LENHINGER,2006). Nestas condições a fosfocreatina é utilizada para resintetizar o ATP e e isto é realizado usando a energia liberada pela degradação anaeróbica da glicose até ácido lático. Este uso das vias anaeróbias é auto-limitante, porque a despeito da rápida difusão do ácido lático na corrente sanguínea, acumula-se o suficiente nos músculos para eventualmente exceder a capacidade ‘tampão’ dos tecidos e produzir uma queda do pH que inibe as enzimas. A existência de uma via anaeróbica para degradação da glicose permite por curtos períodos, o esforço muscular de grandeza muito maior do que seria possível sem ela. Segundo Hochachka e Somero (1973, 1984), de uma maneira geral, nos diferentes organismos, o metabolismo celular percorre os mesmos caminhos que são: • Produção de compostos altamente energéticos como o ATP, em quantidades suficientes para suprir as necessidades celulares; • Ingestão ou formação de compostos intermediários necessários a biossíntese; • Formação de poder redutor utilizável nas reduções biológicas e, • Síntese de macromoléculas decorrente da união dos itens anteriores. Para que os organismos possam assegurar que suas funções metabólicas ocorram em taxas adequadas frente aos efeitos perturbadores do ambiente, estes podem lançar mão de três formas básicas de adaptação bioquímica que são: • Os tipos de macromoléculas presentes podem ser mudados; • As suas quantidades ou concentrações podem ser ajustadas, ou • As suas funções podem ser reguladas de maneira adaptativa (HOCHACHKA; SOMERO 1973) Segundo Shaklee et al. (1977), as atividades fisiológicas dos organismos estão sujeitas a influência de fatores físicos ambientais tais como: temperatura, luz, pressão, O2 dissolvido e salinidade entre outros. Para que possam suportar as flutuações de tais parâmetros, muitos organismos utilizam-se de mecanismos homocinéticos. Assim, para estes autores, uma reorganização metabólica decorrente dos processos de aclimatação/aclimatização pode ser, e em geral é, um processo de especificidade tissular. Segundo Hochachka e Somero (2002), alem dos ajustes fisiológicos, comportamentais e morfológicos serem importantes para assegurar a sobrevivência em condições hipóxicas, muitos vertebrados também apresentam uma combinação de redução da taxa metabólica com ativação do metabolismo anaeróbico. Em peixes observa-se que muitas espécies possuem capacidade de sobreviver em ambientes hipóxicos ou anóxicos devido a um grande potencial anaeróbico (HOCHACHKA, 1980; MORAES et al, 1996; CHIPPARI-GOMES et al, 2005), tendo sido observado para cascudos (MACCORMACK et al, 2006) submetidos à hipóxia aumentos de glicose e lactato plasmáticos, sugerindo estratégia metabólica anaeróbica. A glicose é essencial para a manutenção da sobrevivência em condições de hipóxia uma vez que a regulação entre metabolismo aeróbico e anaeróbico ocorre nas primeiras fases da resposta frente às alterações ambientais, onde se utiliza glicose ou glicogênio como substratos e se verifica a presença de lactato como produto final (VAN RAAIJ et al., 1996; DRIEDZIC ; BAILEY, 1999). Para Hochachka e Somero (2002), durante o exercício (situação esta que pode estabelecer hipóxia tissular), o aumento da dependência muscular pelo metabolismo da glicose proveniente do fígado destaca a importância das interações metabólicas inter-teciduais e é frequentemente observada entre os peixes. Estudos realizados com P. anisitsi (CRUZ, 2007) submetidos à hipóxia mostraram a manutenção dos estoques hepáticos de glicogênio até 3 horas, com posterior redução drástica deste assim como de glicose hepática. Segundo o mesmo autor, estes estoques seriam fonte primaria de glicose plasmática que, para a referida espécie, aumentaram significativamente. Para Moraes et al (1996) a glicose proveniente das reservas de glicogênio hepático é provavelmente transferida para o tecido muscular visando aumentar as reservas de combustível para situações de anaerobiose. No presente trabalho, para hipóxia 6 horas e 3 horas os valores observados para a concentração de glicose plasmática foram 15% e 4%, respectivamente, superiores ao observado em normóxia. Assim, mesmo não sendo consideradas significantes estatisticamente, o aumento na concentração de glicose plasmática pode ser resultante das reservas de glicogênio hepático. 5.4.2 Metabolismo oxidativo vs anaeróbico Em ambientes aquáticos naturais, o aumento da temperatura ambiental proporciona uma redução na disponibilidade de oxigênio dissolvido na coluna d’água. Assim, nestas condições, evolutivamente, os organismos aquáticos desenvolveram estratégias bioquímicas para suportar as pressões sofridas pelo ambiente. De acordo com Shaklee et al. (1977), mudanças qualitativas nos padrões isozímicos parecem ser um evento infrequente e de importância questionável relacionado a respostas aclimatórias em peixes, ao passo que alterações quantitativas podem contribuir significativamente para a organização metabólica durante o processo de aclimatização. A Figura 27 apresenta vias metabólicas nas quais a MDH (sMDH no citoplasma e mMDH na mitocôndria), típicas do metabolismo oxidativo, e LDH, típica do metabolismo anaeróbico estariam atuando. Figura 27: Esquema demonstrando as vias metabólicas nas quais a MDH e a LDH estariam atuando (Modificado a partir de SUAREZ e MOMMSEN, 1987). Segundo Zink e Shaw (1968), três diferentes rotas metabólicas têm sido propostas para a sMDH: gliconeogênese, lipogênese e lançadeira malato-aspartato durante a glicólise aeróbica. Segundo Bailey et al. (1970) ambas as isoformas – A e B - devem ocupar diferentes rotas no metabolismo. Considerando o estudo do possível caráter adaptativo dos locos da sMDH de Leiostomus xanthurus, realizado por Schwantes e Schwantes (1982), a presença da isoforma termoestável A, seria mais adaptável do que a B ao aumento no metabolismo oxidativo que ocorre durante a reorganização metabólica em resposta a um aumento na temperatura ambiental. Com isso, o oxalacetato seria reduzido a malato pela isoforma A em presença do NAD, o qual seria utilizado pela gliceraldeido-3-fosfato desidrogenase favorecendo a reação no sentido glicolítico. Em músculo esquelético, o malato é oxidado a oxalacetato pela isoforma B, com redução do NAD. A passagem de equivalentes redutores na mitocôndria via lançadeira malato-aspartato estaria envolvendo o loco -B* com especificidade tissular para esse tecido influenciando no metabolismo oxidativo de carboidratos. Em músculo esquelético, tanto o glicogênio como a glicose são preferencialmente oxidados e para garantir que as funções específicas desse tecido ocorram em taxas adequadas, compostos energéticos como ATP são formados. No presente trabalho, a predominância do produto do loco-A* (sMDH) em tecido hepático, a exemplo do determinado para outras espécies (MONTEIRO SCHWANTES, SCHWANTES, 1991; AQUINO-SILVA, 1992, AQUINO-SILVA et al., 1997, 2003), poderia conferir a esta espécie uma maior eficiência no processo de redução do oxalacetato a malato, favorecendo o metabolismo no sentido glicolítico. Em situação de hipóxia (3 e 6 horas), o aumento na intensidade relativa da isoforma A e a presença da fração mitocondrial, envolvida no ciclo de Krebs, em músculo esquelético e cardíaco indicariam a manutenção do metabolismo glicolítico em tensões de OD inferiores a 2 mg/L. A baixa tensão de oxigênio induz diferenças na distribuição das isozimas em tecidos como o fígado (ALMEIDA-VAL et al., 1995). Comparações entre os fenótipos iniciais e finais de peixes antes e depois de experimentos com baixa disponibilidade de oxigênio, demonstraram diferenças nos níveis de LDH e na inibição do piruvato. A fácil redução do piruvato, catalisada pela LDH serve para regenerar NAD+, permitindo que a glicólise prossiga temporariamente em condições anaeróbicas. O lactato formado em tecidos em atividade, como músculo, e oxidado a piruvato, primariamente no fígado pelas formas isoenzimáticas da LDH, tendo grande importância seu papel na gliconeogênese (HOCHACHKA; SOMERO, 2002). Salienta-se aqui a inter-relação fígado-músculo branco, onde o metabolismo é regulado pela disponibilidade de substratos, pelo controle do teor de enzimas e de suas atividades catalíticas (STRYER, 1996). Para Hochachka e Somero (2002), durante o exercício (situação esta que pode estabelecer hipóxia tissular), o aumento da dependência muscular pelo metabolismo da glicose proveniente do fígado destaca a importância das interações metabólicas inter-teciduais e é frequentemente observada entre os peixes. Comparações entre o fenótipo inicial e final de acarás, submetidos à hipóxia revelam a diminuição na atividade absoluta de LDH (ALMEIDA-VAL et al, 1999). Segundo Lewis et al. (2007), a depressão na taxa de síntese protéica demonstra um decréscimo de entre 50-60% no fígado. Em Brycon opalinus, para as condições de hipóxia não se observou mudanças expressivas na expressão da LDH em tecido hepático, sugerindo que talvez tempo de exposição em baixa tensão de oxigênio, não tenha sido suficiente para induzir alterações significativas. Na proteína oligomérica de LDH, o padrão isozímico está relacionado com o tipo de metabolismo de cada tecido. Para o músculo cardíaco, há predominância de isoformas do tipo B, mais anódicas e codificadas pelo loco LDH-B*. Para Brycon opalinus foi observado 4 isoformas, dois heteropolímeros (A 3B, A2B2) e dois homoplímeros (A 4 e B4). Além disso, em hipóxia 3 horas e hipóxia 6 horas, pode-se observar, um aumento nas intensidades relativas dos produtos dos locos A* e B*, se comparado com a condição de normóxia. Investigações com Astronotus crassipinnis e Symphysodon aequifasciatus, demonstram que a atividade da LDH é acrescida em situações de hipóxia, sugerindo a ativação do metabolismo anaeróbico (CHIPPARI-GOMES et al., 2005). Para espécies de peixes da Amazônia, estudos sugerem que existem dois padrões de distribuição tecidual para LDH: (i) predominância da isozima B4 em tecido cardíaco, indicando seu caráter aeróbico e (ii) redução da atividade do loco LDH-B* e ativação da expressão do loco LDH-A* no músculo cardíaco, indicando intensificação do metabolismo anaeróbico em eventos de hipóxia. Tal fato evidencia o ajuste da maquinaria bioquímica de acordo com as condições ambientais, sendo que, essas variações nos padrões isozímicos são sempre relatadas em tecidos de metabolismo oxidativo, com é o cardíaco (ALMEIDA-VAL et al., 1999). A exemplo do verificado por outros autores (ALMEIDA-VAL et al., 2000; PANEPUCCI et al., 2000; SCHULTE, 2004; SOMERO, 2003, 2004, AQUINO-SILVA et al, 2003, 2008), as variações observadas para os sistemas isozimicos da MDH e LDH de B. opallinus sugerem que estas seriam mecanismos genéticos e/ou metabólicos em resposta a alterações no meio ambiente, fato o qual, poderia se constituir numa estratégia quali/quantitativa de adaptação bioquímica. 5.5 Conservação biológica em Bacias Hidrográficas Devido a sua grande importância e diante das previsões não tão otimistas em relação à escassez de água e o declínio das espécies aquáticas, as bacias hidrográficas, na última década, passaram a ser consideradas unidades de conservação (MOULTON ; SOUZA, 2006). Pesquisadores e gerenciadores vêm buscando novas perspectivas que integrem interesses sociais, econômicos e ambientais visando à conservação de bacias hidrográficas. A integração de sistemas aquáticos e terrestres em pesquisas tem sido adotada de forma mais cuidadosa, sendo um dos pontos chave para efetivar a conservação, considerando que a preservação não estará assegurada sem que haja uma visão do ecossistema como um todo (ABELL; SANDERS et al., 2002). Segundo Sanders et al. (2002) é de grande importância o estabelecimento de áreas de proteção aquática e proteção integral de bacias hidrográficas, sendo também uma estratégia de manejo para conter a degradação do solo, condição prejudicial aos corpos d’água. Esta visão leva a um novo direcionamento no sentido de integração da biodiversidade, não apenas considerando freqüências e abundância de espécies, mas também a interação entre estas e seu ambiente. A proposta de uma abordagem ecológica mais holística pode trazer mais abrangência à conservação de recursos naturais. No entanto, Clark (1999) aponta a falta de conhecimento sobre o funcionamento dos ecossistemas como um obstáculo para sua implementação. Segundo o mesmo autor, as decisões de manejo tomadas à luz desta nova abordagem envolvem muito risco, uma vez que a biologia da conservação ainda não incorporou substancialmente os princípios de funcionamento de ecossistemas, sem contar que os fatores econômicos, culturais e políticos têm sido mais decisivos para implantação de reservas do que os princípios ecológicos (ROCHA et al., 2006). Assim, deve-se considerar a relevância das bacias no contexto de regulação ecossistêmica, na captação e drenagem das chuvas, disponibilização de água potável, estabilização e manutenção do solo e manutenção do clima. A intervenção em bacias hidrográficas, tais como ext ração de água subterrânea, represas, desvios, canalizações e projetos de transposição representam grandes ameaças à conservação desses ambientes. Parâmetros ambientais, como distribuição de nutrientes e sedimentos, concentração de oxigênio dissolvido, temperatura da água e toda estrutura do habitat de espécies nativas, estão relacionados com os padrões hidrológicos (ROCHA et al.,2006). Na bacia do rio Paraíba do Sul não é diferente, onde projetos de aproveitamento hidroelétrico e transposição têm representado as importantes intervenções no fluxo hidrológico. O fato de encontrar localizada entre dois importantes centros urbano-industriais, São Paulo e Rio de Janeiro, também contribui para aumentar o impacto negativo sobre a fauna e a flora pertencente à bacia. O desenvolvimento de ações adicionais no sentido da restauração de áreas degradadas, na reintrodução de espécies, no controle de espécies invasoras entre outros, tornam-se necessárias. Entretanto, estas ações exigem cautela e rigor científico, pois são bastante complexas e, se não forem bem conduzidas, podem levar a degradações ainda maiores, e irreversíveis, nos ecossistemas, habitats e populações. Neste sentido, existe a necessidade de estudos nas áreas de ecologia e de conservação biológica para construir fundamentos, que direcionem ações, com base em princípios científicos. Assim, a conservação passa a ser baseada em um sistema detalhado, visando à compreensão da natureza e da dinâmica dos sistemas biológicos, esclarecendo aspectos da diversidade biológica úteis para o seu estabelecimento. A pirapitinga-do-sul, Brycon opalinus é uma espécie altamente adaptada às condições de Mata Atlântica devido a sua dependência da mata ripária, não apenas para alimentação, mas também pelas características bióticas e abióticas desse ambiente aquático (GOMIERO; BRAGA, 2006). Todavia, as modificações que o rio Paraíba do Sul vem sofrendo ao longo do tempo, principalmente no que se refere ao processo de urbanização e ocupação da terra, representam grande prejuízo às comunidades aquáticas, especialmente as espécies de peixes. Segundo Machado e Abreu (1952), no Vale do Paraíba, a presença da pirapitinga do sul representou, do total de captura, a terceira espécie mais coletada, sendo considerada de alto valor comercial. Todavia, apesar de sua importância encontra-se entre as que estão ameaçadas de extinção (BRASIL, 2003, 2004). No presente trabalho considerando as variações hematológicas associadas ao ajuste enzimático frente à hipóxia, pode-se sugerir que as condições ambientais encontradas hoje na bacia do Paraíba do Sul (PEINADO, 2006) desfavorecem a presença da espécie em questão, visto que para se manter em ambientes hipóxicos, torna-se necessário uma maior demanda energética. Todavia, para trabalhos futuros, estudos mais detalhados das isozimas, abrangendo a cinética, podem trazer mais conhecimentos sobre a adaptabilidade desta espécie em ambientes com baixa concentração de oxigênio. 6 CONCLUSÕES ♦ As análises estatísticas realizadas para normóxia vs hipóxia 6 horas mostraram que o aumento observado no número de eritrócitos, concentração de hemoglobina e hematócrito foi significativo. ♦ As análises estatísticas realizadas não revelaram diferença significativa para os índices hematimétricos VCM, HCM e CHCM, no entanto se observou aumento para VCM em condição de hipóxia 3 horas comparado à normóxia sugerindo ajustes osmoregulatórios como resposta à baixa disponibilidade de oxigênio dissolvido. ♦ Sugere-se que o aumento no volume eritrocitário pode ser decorrente da hidratação celular, uma vez que a adrenalina, uma das catecolaminas produzidas durante este processo causa inchaço nas células vermelhas. ♦ Apesar das diferenças aqui observadas quanto aos níveis de glicose, não serem consideradas significativas pelas análises estatísticas, pode-se verificar que em hipóxia 6 horas e 3 horas os valores foram 15% e 4%, respectivamente, superiores ao de normóxia, sugerindo a transformação de glicogênio em glicose pelo tecido hepático. ♦ Para a MDH, o número de componentes eletroforéticos e especificidade tissular dos indivíduos estudados sugerem a presença de dois locos gênicos sMDH-A* e sMDH-B* admitindo-se sua estrutura como dimérica. ♦ Foi detectado alelo variante para o loco sMDH-B* o alelo *106 no loco B* e o cálculo da freqüência gênica realizado para este alelo (*106 no loco B*), indica que a população encontra-se em equilíbrio de Hardy- Weinberg. ♦ O fracionamento celular realizado para fígado indica que a fração mitocondrial tem migração eletroforética similar à apresentada pela fração solúvel, especificamente para o produto do loco A*. ♦ Em músculo esquelético de animais submetidos à normóxia, o resultado obtido para o fracionamento celular da MDH não permitiu a visualização da fração mitocondrial. Para este mesmo tecido, considerando hipóxia 6 horas, mesmo a fração mitocondrial estando presente no controle, não foi possível visualizar a fração isolada. Tal fato provavelmente se dever por esta fração se encontrar abaixo dos níveis de detecção da eletroforese em gel de amido. ♦ Para a MDH, os testes de termoestabilidade realizados não apresentaram inativação dos produtos dos locos A* e B*, nos diferentes intervalos de tempo estudados. ♦ A detecção da mMDH nos três tecidos para a situações de hipóxia 3 e 6 horas, sugere aumento da atividade para metabolismo oxidativo, provavelmente suprindo a maior demanda metabólica nesses tecidos. ♦ A análise do padrão eletroforético da LDH em Brycon opalinus, demonstrou na expressão gênica que existe predomínio do loco A* em músculo esquelético e do loco B* em fígado e coração, sendo que para os dois locos que a codificam não foi observado a presença de alelos variantes. ♦ Para os três tecidos estudados, considerando-se as situações de hipóxia e normóxia, foi possível observar para a LDH um aumento na intensidade de coloração para o produto dos diferentes locos. ♦ As variações observadas para os sistemas isozímicos da MDH e LDH de B. opallinus, somadas as respostas hematológicas sugerem que estas seriam mecanismos genéticos e/ou metabólicos frente às alterações no meio ambiente, fato o qual, poderia se constituir numa estratégia quali/quantitativa de adaptação bioquímica. ♦ As variações hematológicas associadas ao ajuste enzimático frente à hipóxia (3 e 6 horas), indicam uma maior demanda energética por esta espécie, no sentido de garantir a sobrevivência em ambientes adversos. Assim, pode-se sugerir que as condições ambientais encontradas hoje na bacia do Rio Paraíba do Sul desfavorecem a sobrevivência da espécie B. opalinus. ♦ O fato da espécie B. opalinus estar incluída na lista de animais sujeitos a extinção somada aos resultados aqui apresentados e as características ambientais (oxigênio dissolvido) apresentadas pelo Rio Paraíba do Sul, sugerem que esta espécie pode ser considerada um organismo bioindicador. Neste sentido, projetos de reintrodução de espécies de peixes endêmicas no Rio Paraíba do Sul, devem ser ancorados na correlação entre estudos adaptativos versus caracterização ambiental a exemplo do realizado no presente trabalho. REFERÊNCIAS ABELL, R. Conservation biology for the biodiversity crisis: a freshwater follow-up. Conservation Biology, v. 16, n.5, p. 1435-1437, 2002. ADHAM, K. G.; IBRAIM, H. M.; HAMED, S. S.; SALEH, R. A. Blood chemistry of the Nile tilapia, Oreochromis niloticus (Linnaeus, 1757) under the impact of water pollution. 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