Pró-Reitoria de Graduação Curso de Direito Trabalho de Conclusão de Curso ADPF 153: INSTITUCIONALIZAÇÃO DA IMPUNIDADE Autor: Marcelo Alonso de Jesus Silva Orientador: MsC. Prof. Daniel Scott Brasília – DF 2011 MARCELO ALONSO DE JESUS SILVA ADPF 153: INSTITUCIONALIZAÇÃO DA IMPUNIDADE Monografia apresentada ao curso de graduação em Direito da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: MsC. Prof. Daniel Scott Brasília 2011 Monografia de autoria de Marcelo Alonso de Jesus Silva, intitulada “ADPF n. 153: INSTITUCIONALIZAÇÃO DA IMPUNIDADE”, apresentada como requisito parcial para obtenção do certificado do grau de Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Brasília, em ____/____/______, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo examinada: _____________________________________________ Prof. MsC. Daniel Scott Bacharelado em Direito - UCB _____________________________________________ Prof. de Direito Bacharelado em Direito - UCB _____________________________________________ Prof. de Direito Bacharelado em Direito - UCB Brasília 2011 AGRADECIMENTO Agradecer é um ato de reconhecimento por tudo aquilo que aconteceu de bom em sua vida. Por todos aqueles que te ajudaram no decorrer de uma determinada caminhada. Agradecer por tudo e por todos é uma tarefa difícil, pois muitas pessoas nos auxiliam no curso de nossas vidas, ainda que de forma mínima, no entanto, com diferentes intensidades. De outro lado, muitas coisas gostaríamos de viver de novo e outras gostaríamos apenas de lembrar, pois foram lições árduas, mas, necessárias. Assim, agradeço aos meus professores que nesta longa caminhada de nossas vidas se empenharam por nos transmitir o conhecimento da melhor maneira possível, sempre se esforçando para que fôssemos profissionais de grande excelência. Agradeço também o auxílio do professor Paulo Abrão que, inicialmente, direcionou algumas das construções acerca desta pesquisa. Agradeço aos colegas de sala de aula que estiveram juntos nos núcleos de prática jurídica, nos intervalos, nos corredores, trocando experiências, compartilhando tristezas e alegrias. E acrescento dois amigos especiais: Francisco Ferreira do Carmo e Rossbem Betuel, dois camaradas que sempre estão por perto nos encorajando para vencer os desafios desta vida. Agradeço aos professores do núcleo de prática jurídica de Samambaia. Alcio Sinott, Gleyce Belarmino, Quézia Fabrício, Ricardo Barbosa e Raquel Moreira. Esses professores possuem um significado especial. Sempre exigiram o máximo do nosso conhecimento e de nossa prestação enquanto auxiliares do NPJ – Samambaia. Desejavam sempre que dominássemos o conhecimento para que a frustração no mercado de trabalho não nos alcançasse. A esses e demais professores, o meu muito obrigado. Agradeço aos colegas de estágio do Ministério Público de Ceilândia, em especial, a Promotora de Justiça Dra. Clara Paim Diaz, que com graciosa paciência me recepcionou naquele lugar. Promotor de Justiça Dr. Marcelo Tannus, simplicidade em pessoa. Promotor de Justiça Dr. Amaury Damasceno e Vasconcelos que com seu humor alegrava nossas tardes de trabalho. Agradeço a minha família. Essa estrutura é a base da minha vida. Meu porto seguro que Deus me presenteou com lindas meninas. Caroline a irmã família. A primogênita que toda casa deveria ter. Nosso exemplo de vida. Camila. A caçulinha com cara de irmã mais velha. A pequena Sofia. Minha sobrinha de 1 ano e alguns meses. Que com aquela voz rouca e dócil alegrava os dias de cansaço da monografia. E a minha princesa Suerilda. Minha mãe. Que com sua coragem sempre me deu força para prosseguir e ser o melhor na vida. Obrigado a todas vocês que me inspiram no dia-a-dia. E, não muito longe, in memorian, ao papai José Maria da Silva. Em relação ao papai, prefiro não falar muito. Saudades dele. Por fim. Agradeço a Deus pelo dom da vida, por me permitir gozar de uma vida saudável e tão rica de pessoas e circunstâncias agradáveis que me rodeiam. ...prefiro deslocar a questão e falar do amor, para falar dos direitos humanos. Eles não são práticas e discursos de resistência à morte. Trata-se de mostrar que os direitos humanos, como problemática, precisam gerar práticas e discursos de preservação do amor, discursos que precisem falar de instâncias liberatórias, que permitam ao homem reencontrar seus vínculos perdidos com a vida. Luís Alberto Warat RESUMO Referência: DE JESUS SILVA, Marcelo Alonso. Título: ADPF n. 153: Institucionalização da impunidade. 89 folhas. Trabalho de Conclusão de Curso de Direito – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2011. O objetivo desta pesquisa é avaliar a decisão do STF, a respeito do alcance da lei de anistia, o qual entendeu que não é possível a responsabilização dos agentes estatais brasileiros que praticaram crimes de tortura e desaparecimento forçado no período ditatorial, institucionalizando, assim, a impunidade, uma vez que o próprio Estado – Poder Executivo (Comissão de Anistia e Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos) – já reconheceu a manifesta violação dos direitos fundamentais e das liberdades públicas impetradas contra o povo brasileiro. Além disso, as medidas de justiça de transição aconselhadas aos países emergentes do regime de exceção serão objeto de estudo, considerando os efeitos produzidos por cada uma dessas alternativas, de acordo com a tipologia autoritária caracterizada no caso brasileiro. Atualmente, os sistemas de justiça de transição têm sido implantados em diversas regiões do mundo, como América Latina, Europa, África, Ásia e o Árabe, mais novo sistema a ser criado para supervisão das práticas que atentam contra os direitos da pessoa humana. Acredita-se que a instituição do Estado de Direito é o caminho para pacificação social, redução das desigualdades sociais, distribuição equitativa da renda e crescimento gradativo das nações. Ademais, os tratados internacionais, convenções e tribunais internacionais, ratificados pelos diferentes países, são instrumentos de significativa importância nesse contexto, pois, diante da própria ação ou omissão estatal que atue violando a natureza do homem, esses tribunais e os correspondentes preceitos legais constituem parâmetros de proteção às pessoas vítimas de violação em massa. Nessa esteira, este estudo vem demonstrar o retrocesso jurídico da Suprema Corte Brasileira ao interpretar a lei da anistia conforme a constituição, institucionalizando, assim, no que se trata da anistia política, a impunidade no Brasil. Palavras-chave: Justiça de transição. Anistia. Impunidade. Estado Democrático de Direito. Tratados internacionais. Trabalho acadêmico. Referência. Citação. ABSTRACT Reference: DE JESUS SILVA, Marcelo Alonso. Title: ADPF n. 153: Institutionalization of impunity. 89 pages. Completion of Work Law Course – Catholic University of Brasilia, Brasília, 2011. The objective of this research is to evaluate the decision of the Supreme Court, regarding the scope of the amnesty law, which can not be understood that the responsibility of the Brazilian state officials who committed crimes of torture and forced disappearance during the dictatorship, institutionalized, thus, impunity, since the state itself - Executive (Amnesty Commission and the Special Commission of Political Dead and Disappeared) - has already recognized the blatant violation of fundamental rights and civil liberties filed against the brazilian people. In addition, measures of transitional justice advised to countries emerging from authoritarian regime will be the object of study, considering the effects produced by each of these alternatives, according to the authoritative typology characterized in the brazilian case. Currently, the transitional justice systems have been deployed in various regions of the world such as Latin America, Europe, Africa, Asia and the Arab newest system to be created to oversee the practices that violate the rights of the individual. It is believed that the establishment of the rule of law is the path to social peace, reduction of social inequalities, equitable distribution of income and gradual growth of nations. Moreover, international treaties, conventions and international courts, ratified by individual countries, are instruments of significant importance in this context, because before his own act or omission to act in violation of state the nature of man, these courts and the relevant legal principles are parameters protection to victims of mass rape. On this track, this study demonstrates the legal setback to the Brazilian Supreme Court to interpret the law as the constitution of the amnesty, institutionalized, so in that it is a political amnesty, impunity in Brazil. Keywords: Transitional justice. Amnesty. Impunity. Democratic Rule of Law. International Treaties. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 8 1. JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO ...................................................................................... 11 1.1 CONCEITUAÇÃO ................................................................................................. 11 1.2 DIREITO E POLÍTICA .......................................................................................... 16 1.3 FUNDAMENTOS DO ESTADO DE DIREITO ................................................... 22 1.4 A TRANSIÇÃO NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988: ARTIGO 8º ADCT ........................................................................................................................... 27 1.5 A IMPORTÂNCIA DA JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO PARA A RECONCILIAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DA DEMOCRACIA ............................... 33 2. OS DIREITOS DA TRANSIÇÃO ............................................................................. 39 2.1 DIREITO À REPARAÇÃO ................................................................................... 41 2.2 DIREITO À VERDADE ........................................................................................ 46 2.3 DIREITO À MEMÓRIA ........................................................................................ 53 2.4 DIREITO À JUSTIÇA ........................................................................................... 58 3. CONFLITO DE INTERPRETAÇÕES NA APLICAÇÃO DA JUSTIÇA NO CASO BRASILEIRO ............................................................................................................. 64 3.1 ADPF Nº153. ALCANCE DA LEI DE ANISTIA ................................................. 66 3.2 CONDENAÇÃO DO BRASIL PELA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS PELOS PAÍSES DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS (OEA): CASO ARAGUAIA ............................................................. 70 3.3 A CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS COMO INSTÂNCIA MÁXIMA JUDICIAL NO BRASIL PARA MATÉRIA DE DIREITOS HUMANOS .................................................................................................................. 75 CONCLUSÃO......................................................................................................................... 82 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ...................................................................................... 86 8 INTRODUÇÃO Atualmente, em diversas nações do mundo a análise do regime político tem sido tema de debate e até mesmo de guerrilhas. Os recentes e diversos fenômenos de insurgência da democracia nos países ditos ditatoriais tem sido marcantes nos países orientais. Cite-se, o caso da Líbia, Síria e muitos outros países da América Latina que tem se estruturado para o estabelecimento sólido e verdadeiro das bases institucionais democráticas. A necessidade de estudo e análise da solidificação do Estado Democrático de Direito é tema de supremacia inconteste nos diferentes lugares do mundo. Enquanto países do oriente lutam pelo reconhecimento de um governo democrático e o rompimento de um sistema de exceção, países emergentes do regime ditatorial planificam e estruturam alternativas e projetos para a edificação de um sistema de governo democrático. Esse processo de transição é chamado de justiça de transição: o encontro da política com o mundo do Direito. Em alguns países esse fenômeno sequer existe como acima foi citado. Em outros, esse estado de passagem começa a acontecer com pequenas ações, mas, que, constituem-se de extrema importância para a construção de um legado de direitos e deveres de ambas as partes: Estado e cidadãos. E sob esse prisma que este estudo vem inclinar sua atenção para o processo de transição dos países emergentes do sistema ditatorial, dirigindo seus apontamentos para tais fatos históricos os quais não são inéditos, mas, ao revés, tem se mostrado recorrentes. E a partir disso, primar pelo incentivo de reparação à memória, à verdade, à justiça e às pessoas perseguidas, torturadas e mortas que lutaram pela instituição de um sistema democrático que, nos dias atuais, vigora sob o ranço do autoritarismo beligerante. A questão inédita nessa pesquisa científica é tratar da amplitude do conceito de reparação no que se diz respeito à extensão da anistia concedida pela Suprema Corte Brasileira aos perseguidores políticos, os quais, manifestamente, praticaram crimes de homicídio, tortura e desaparecimento forçado. A partir deste contexto, demonstrar que o conceito de reparação não se limita apenas ao campo econômico ou moral, mas também, viabilizar o julgamento de seus algozes, iniciando, outrossim, um enfrentamento das inúmeras situações de impunidade no seio das instituições ditas democráticas e da comunidade brasileira. Compartilhando desse mesmo pensamento, oportunas são as considerações realizadas por Kathryn Sikkin e Carrie Walling, as quais analisaram cem países que passaram pela 9 transição de regimes autoritários para democráticos e concluíram que os países que julgaram crimes cometidos contra os direitos humanos tiveram uma redução significativa nos índices de violência dos agentes de segurança hoje. Por todo o exposto, a escolha do tema objeto de pesquisa originou-se da participação do II Seminário Latino-americano de Justiça de Transição, realizado nos dias 7 e 8 de julho de 2011, em Brasília. Logo, após a explanação de diversos atores internacionais detalhando a magnitude do tema que vem sendo instituído em países como Peru, Argentina, Chile, Guatemala, El Salvador e muitos outros – os quais vêm se submetendo ao mesmo processo de transição – o interesse em examinar o conteúdo tornou-se latente, mormente, em razão dos diversos eventos ocorridos na sociedade oriental, cujas situações não são de perplexidade para a comunidade internacional face à recorrência dos acontecimentos. Além disso, a matéria cerne de discussão, estudo e implantação em muitos países é de urgente relevância, pois, além de batalhar pelo fim da impunidade característica das instituições democráticas brasileiras, visa reformar o sistema de forma que impeça o fortalecimento de ações autoritárias e despojadas de dignidade humana. O julgamento pelo STF da ADPF 153, a respeito do alcance e da constitucionalidade da lei de anistia aos crimes cometidos no período de exceção, a condenação do Brasil pela Corte Interamericana de Direitos Humanos e o mais recente caso do menino Juan são fatos que reforçam a necessidade de reformulação das bases institucionais para que se propicie a solidificação da democracia no Estado brasileiro. Ademais, esse intervalo de transição recomenda a restituição do passado histórico brasileiro, reparação das vidas que foram ceifadas e torturadas e julgamento dos perseguidores políticos. Portanto, a matéria em questão requer observação, com o intuito de se evitar que esse fenômeno que tem sido marcante na humanidade não opere as conseqüências vistas e revistas no mundo oriental. Face ao exposto, reitera-se a importância de vivência da justiça de transição brasileira a qual se afigura tímida, prematura e muito distante dos objetivos e ações necessárias à sua implantação. Ressalte-se que esse passo já foi dado pelos trabalhos realizados pela Comissão de Anistia, porém, é evidente a necessidade de desvendar contextos por ora intocáveis. Por derradeiro, a finalidade dessa pesquisa é “enfrentar esta questão, postergada por tanto tempo, visando consolidar de uma vez por todas os valores democráticos e humanitários no seio da sociedade brasileira, e explicitar que a reconciliação nacional e a 10 pacificação política não podem justificar o olvido, o esquecimento daqueles atos praticados para reprimir quem ousava discordar da ideologia oficial.” 1 BOTTINI, Pierpaolo Cruz e et. al. Lei da anistia: com a palavra, O STF. Boletim IBDCRIM, ano nº 17, nº 225, dez./2009. p.4. 1 11 1. JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO 1.1 CONCEITUAÇÃO Segundo Genro e Pires Júnior, as práticas arbitrárias cometidas pelo Estado brasileiro, durante o regime militar, contra todos aqueles que foram perseguidos politicamente, exigem reparação. Nesse contexto, a Justiça de Transição mostra-se como instrumento tempestivo, de viabilização para reconstrução do passado e para consolidação da democracia, inclusive no sentido de conceder a condição de anistiado político e o direito às reparações econômicas, como forma de reparação pelas ações despóticas estatais.2 O cenário de reiterados confrontos nos países orientais é o mais recente exemplo e prova da necessidade de tratamento e atenção ao processo de transição dos regimes ditatoriais ao estado ou implantação da democracia. Além disso, diversos outros exemplos podem ser citados no Brasil ou em outros países da América Latina como Argentina, Chile, Peru, El Salvador e Guatemala, os quais se submeteram a regimes ditatoriais e, atualmente, passam por um processo de reestruturação de seu sistema de governo. Nesse sentido, o reflexo do autoritarismo reproduz atrocidades e atos de impunidade como acima delineado. E é nesse pensar que o presente estudo vem demonstrar a justiça de transição como elemento necessário e fundamental na construção ou reconstrução do Estado Democrático de Direito. Segundo Pinheiro, “é extremamente difícil consolidar uma democracia política sem que se constitua um sistema sólido de responsabilidade, de responsabilização pública como política do Estado no presente, sem que também valha em relação ao passado.” 3 Compartilhando do mesmo pensamento, pode-se observar a lição do professor Jorge Capizo: La democracia es fenómeno dinámico y expansivo. Las sociedades actuales se desarrollan a velocidad nunca antes vista, los avances científicos y tecnológicos benefician grandemente y presentan nuevos peligros a las libertades. Problemas que realmente no lo eran unas cuantas décadas o años atrás, ahora hay que enfrentarlos y resolverlos, GENRO, Tarso; PIRES JUNIOR, Paulo Abrão. Anistia Política no Brasil: caminhos para efetivação da Justiça de Transição. In: Relatório Anual da Comissão de Anistia, Brasília, dez., 2007. p.5. 3 SOARES, Inês Virgínia Prado e KISHI, Sandra Akemi Shimada. Memória e verdade: a justiça de transição no Estado democrático brasileiro. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p.15. 2 12 cuidando el respeto a los derechos de las personas. Los sistemas democráticos, para hacer frente a nuevas realidades, tienen que legislar y precisar cuestiones novedosas, o que no presentaban mayores dificultades con anterioridad, pero que se convirtieron en peligros potenciales para la propia democracia y las libertades de las personas. 4 Portanto, a justiça de transição é um elemento que precisa ser compreendido pelos países emergentes do regime ditatorial como fundamental à solidificação do Estado democrático de direito e à implantação de instituições democráticas regidas pela dignidade do ser humano, a fim de que se evite a reprodução do autoritarismo no período de estruturação das bases institucionais. A justiça de transição, segundo o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), é o conjunto de abordagens, mecanismos (judiciais e mão judiciais) e estratégias para enfrentar o legado de violência em massa do passado, para atribuir responsabilidades, para exigir a efetividade do direito à memória e à verdade, para fortalecer as instituições com valores democráticos e garantir a não repetição das atrocidades. 5 Para Alexander L. Borraine, o conceito de justiça de transição concretiza-se a partir da análise dos seguintes termos: transição e justiça. Transição é literalmente compreendida como a morte da velha ordem e o nascimento de uma nova ordem. Já justiça seria o encontro de desafios do futuro mais controvertidos face aos diversos tipos de justiça existentes. Em resumo, o autor define justiça de transição como um conveniente caminho de descrever a procura por uma sociedade justa na esteira antidemocrática, frequentemente opressiva e violenta. Portanto, ao invés de diminuir a justiça criminal, a justiça de transição oferece uma visão profunda, rica e ampla de justiça que procura confrontar perpetradores, localizando as necessidades das vítimas e auxiliando o começo de um processo de reconciliação e transformação.6 O Conselho de Segurança das Nações Unidas define justiça de transição da seguinte forma: O conjunto de processos e mecanismos associados às tentativas da sociedade em chegar a um acordo quanto ao grande legado de abusos cometidos no passado, a fim de assegurar que os responsáveis prestem contas de seus atos, que seja feita a justiça e se conquiste a reconciliação. Tais mecanismos podem ser judiciais ou extrajudiciais, com diferentes níveis de envolvimento internacional (ou nenhum), CARPIZO, Jorge. El contenido material de La democracia: tendencias actuales Del constitucionalismo latinoamericano. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p.3. 5 PRADO SOARES, Inês Virginia. Justiça de transição. Disponível em: <http://www.esmpu.gov.br/dicionario/tikiindex.php?page=Justi%C3%A7a+de+transi%C3%A7%C3%A3o>. Acesso em: 03 de agosto de 2011. 6 Sou responsável por esta tradução. BORAINE, Alexander L. Transitional justice: a holistic interpretation. Disponível em: <http://jia.sipa.columbia.edu/files/jia/17-27_boraine.pdf>. Acesso em: 08 de agosto de 2011. 4 13 bem como abarcar o juízo de processos individuais, reparações, busca da verdade, reforma individual, investigação de antecedentes, a destituição de um cargo ou a combinação de todos esses procedimentos. 7 A idéia central de justiça de transição, segundo Ferreira Bastos, visa restabelecer as relações entre as vítimas e os perpetradores dos direitos humanos.8 Castro Emígio9 leciona que a justiça de transição consiste em uma figura de justiça que busca reconciliar o Estado com o seu passado, implantando medidas alternativas eficazes de reparação, cometidas em um momento de arbitrariedade e violência. Essas alternativas têm por objetivo recuperar a memória, clarificando a verdade, responsabilizar os violadores dos direitos humanos e reformular as instituições estatais, com vistas à efetivação do processo de conscientização política social, apta a impedir a repetição de atos contrários aos direitos do homem. Nessa condição, a justiça transicional aponta como um norteador, “uma mediadora entre demandas insurgentes nos planos ético, político e jurídico, com vistas a fomentar capacidade operacional de geração de mudanças nos contextos sociais concretos, de modo que a consolidação democrática se entrelace ao estabelecimento de uma forma de organização do Estado que, a um só tempo, seja democrática e de Direito.”10 Silva Filho observa que a justiça de transição é indispensável à solidificação, de fato, da democracia, sobretudo em um contexto de passado arbitrário e de repressão política, em que o diferencial marcante deste histórico sombrio e as novas perspectivas de reparação estão voltados para o respeito aos direitos humanos e às liberdades públicas.11 A justiça de transição, segundo o Centro Internacional para a Justiça de Transição (ICTJ)12, refere-se a um conjunto de abordagens e mecanismos designados para identificar a NAÇÕES UNIDAS – Conselho de Segurança. O Estado de Direito e a justiça de transição em sociedades em conflito ou pós-conflito. Relatório do Secretário Geral S/2004/616. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.320-351, jan-jun. 2009. p.325. 8 FERREIRA BASTOS, Lucia Helena Arantes. As reparações por violações de direitos humanos em regimes de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.228-249, jan-jun. 2009. p.240. 9 CASTRO EMÍGIO, Rodrigo Ferraz de. Democracia e anistia política: rompendo com a cultura do silêncio, possibilitando uma justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.178-202, jan-jun. 2009. p.195. 10 Repressão e Memória Política no Contexto Ibero-Brasileiro: estudos sobre Brasil, Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal. – Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, 2010. 11 SILVA FILHO, José Carlos da. O julgamento da ADPF 153 pelo Supremo Tribunal Federal e a Inacabada Transição Democrática Brasileira. Disponível em: http://idejust.wordpress.com/biblioteca/artigosacademicos/>. Acesso em: 16 de setembro de 2011. 12 O ICTJ foi concebido em uma reunião estratégica propiciada pela Fundação Ford em abril do ano 2000. Os participantes, entre os quais especialistas na área jurídica, defensores de direitos humanos e funcionários, se reuniram para discutir maneiras de contribuir para a efetividade no campo da justiça transicional em conjunto crescimento no mundo. Como conseqüência, a Fundação pediu a três consultores 7 14 massiva situação de violações de direitos humanos na esteira de regras repressivas ou conflitosas. A escala e o impacto de tantas violações requerem soluções que não apenas forneçam medidas significativas de justiça para um grande número de vítimas, mas também, que ajude a reconstruir os elementos básicos de confiança entre cidadãos e instituições governamentais que são necessárias para o funcionamento efetivo da lei. Determinar se mecanismos e abordagens deveriam ser adotados requer conhecimentos técnicos e comparativos sobre os próprios métodos, bem como uma compreensão detalhada do contexto em que estão sendo aplicados.13 Portanto, o objetivo desse estudo é demonstrar o atraso da implantação adequada dos mecanismos de justiça de transição e, principalmente, à luz dos princípios constitucionais, dos elementos de interpretação hermenêutica, dos preceitos legais constitucionais e internacionais, fazer conhecida a decisão da Suprema Corte Brasileira que de forma manifesta ignorou a validade dos direitos humanos, institucionalizando, assim, de forma “legal” a impunidade na sociedade brasileira, ao considerar que os crimes de tortura praticados no período militar foram crimes políticos. Genro e Pires Júnior lecionam, claramente, que a justiça de transição é um instrumento de reparação imprescindível aos países que, deliberadamente, praticaram atos de violência contra os seus próprios cidadãos. Assim, esta ferramenta de reconstrução não tem por objeto a restituição, pois pessoas mortas não são restituídas e atos de tortura não são apagados, nem físico ou psicologicamente. Ela visa à restauração da própria sociedade que foi usurpada em suas liberdades públicas. Tem por finalidade precípua a instituição de medidas que propiciem o reconhecimento das vítimas e a promoção de possibilidades de reconciliação e consolidação democrática.14 A partir das concepções acima delineadas, raciocínio a contrário senso seria a concessão de uma anistia considerada irrestrita, englobando inclusive os agentes governamentais. É sabido que a finalidade de criação da lei de anistia estava voltada exclusivamente para aqueles que praticaram crimes políticos. Todavia, essa anistia foi – Alex Boraine, Priscilla Hayner, e Paul van Zyl – que desenvolvessem um plano para uma organização com tal objetivo. A proposta inicial foi a de realizar um trabalho em conjunto com diversos países durante cinco anos e obteve apoio da Fundação Ford, da Fundação Catherine T. e John D. MacArthur, a Coorporação Carnegie de Nova York, o Fundo dos Irmãos Rockefeller e o Fundo da Família Andrus. ICTJ Brasil. Julho 2011. Disponível em: <http://www.ictj.org 13 ICTJ Briefing. International Policy Relations. Transitional Justice in the United Nations Human Rights Council. Disponível em: <http://ictj.org/sites/default/files/ICTJ-Global-TJ-In-HRC-2011-English.pdf>. Acesso em: 17 de setembro de 2011. 14 Repressão e Memória Política no Contexto Ibero-Brasileiro: estudos sobre Brasil, Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal. – Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, 2010. p.23. 15 sistematicamente estendida aos agentes públicos, perpetradores dos direitos humanos, quando do julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.º 153. Nesse particular, Lenio Streck 15 explicita, de forma clara e evidente, aquilo que a Suprema Corte Brasileira entendeu de maneira diversa: [...] nenhuma lei pode proteger de forma deficiente ou insuficiente os direitos humanos fundamentais. Como tortura não é crime político, explica, não pode ser alcançada por qualquer lei ou Constituição. O problema da Lei de Anistia está em sua interpretação, que deu azo a que se considerassem, indevidamente, anistiadas todas as pessoas que participaram das ações contra e a favor do regime. Se o Brasil se comprometeu a punir com rigor a tortura, seria incoerente que aprovasse uma lei “inocentando” aqueles que praticam esse tipo de crime. O Estado Democrático de Direito tem o dever de proteger os direitos dos cidadãos, tanto contra os ataques do Estado como dos demais cidadãos. 16 Segundo Flávia Piovesan 17 , “a inexistência de uma justiça de transição é fator a justificar o quadro de graves violações dos direitos humanos no Brasil, sobretudo no que se refere à prática da tortura e à impunidade que a fomenta.” 18 Por todo o exposto, Piovesan reitera a necessidade de implantação dos mecanismos de justiça de transição a qual se afigura como medida inexorável, mormente em um contexto que as relações entre Direito e Política são interdependentes para a consolidação do Estado Democrático de Direito, face o seu caráter de condicionalidade e de complementariedade. Portanto, o contexto fático apresentado requer a ruptura da permanência autoritária no ambiente democrático. Tamanha é sua importância que a verificação da justiça de transição é perfeitamente possível, principalmente, em diversos países da América Latina, tais como, Argentina, Chile, Peru, El Salvador e outros, os quais de forma diferenciada, estabeleceram o tratamento da justiça de transição, por meio da instrumentalização de diversas medidas, a saber, o Mestre e Doutor pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e pós-doutor pela Universidade Lisboa. O professor de Graduação e Pós-Graduação (mestrado e doutorado) do Centro de Ciências Jurídicas da Unisinos Lenio Streck é também membro da Comissão Permanente de Direito Constitucional do Instituto dos Advogados Brasileiros e presidente de honra do Instituto de Hermenêutica Jurídica. 16 STRECK, Lenio. A Lei de Anistia, a Constituição e os direitos humanos no Brasil: Lenio Streck responde. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.2, p.24-30, jul-dez. 2009. p.24. 17 Professor Doutora em Direito Constitucional e Direitos Humanos da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Professora de Direitos Humanos dos Programas de Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e da Universidade Pablo Olavide (Sevilha, Espanha); visiting fellow do Human Rights Program da Harvard Law School (1995 e 2000), visiting fellow do Centre for Brazilian Studies da Universidade of Oxford (2005), visiting fellow do Max Planck Institute for Comparative Public Law and International Law (Heidelberg – 2007 e 2008), sendo atualmente Humboldt Foundation Georg Forster Research Fellow no Max Plank Institute (Heidelberg 2009 -2011). Procuradora do Estado de São Paulo, membro do Clamdem (Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher), membro do Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, e da SUR – Human Rights University Network. 18 PIOVESAN, Flávia. Direito Internacional dos direitos humanos e Lei de Anistia: o caso brasileiro. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 2, jul.-dez., 2009. p.186. 15 16 julgamento dos perseguidores políticos, a reparação econômica, o direito à memória e à verdade dos fatos cometidos pelo Estado. Em síntese, Paul Van Zyl assegura que “pode se definir a justiça transicional como o esforço para a construção da paz sustentável após um período de conflito, violência em massa ou violação sistemática dos direitos humanos.” 19 1.2 DIREITO E POLÍTICA A conjugação do Direito e da Política ocorre de forma tão intrínseca que ao discorrer a respeito da temática acima abordada, faz-se necessário observar os apontamentos elencados por Dalmo de Abreu Dallari: A política sem o direito ou contra ele é o caminho certo para a corrupção e a ditadura, assim como o direito sem a política é a base para o estabelecimento de formalidades injustas, expressadas em atos normativos, ações de governo ou decisões judiciais e administrativas, ou então para a fixação de regras sem autenticidade e, por isso mesmo, desprovidas de eficácia. 20 Nessa esteira, a segunda subseção deste capítulo tem por objetivo demonstrar a interdependência desses dois institutos e a influência que ambos operam em suas atividades típicas e atípicas no estabelecimento do Estado Democrático de Direito, o qual se constitui elemento essencial para consolidação da democracia e o consequente exercício dos direitos fundamentais. Segundo Dallari a primazia na seleção de ações sociais e dos meios de consecução são atividades incumbidas à política, as quais quando desenvolvidas de forma legal exigem a observância simultânea de regras, que expressem os interesses da coletividade e que permitam ser cogente a toda uma comunidade, preservando, sobretudo, a dignidade humana. O estabelecimento dessas regras, sem a violação das liberdades e dos meios de garantia, é ação da seara do direito. Portanto, direito e política devem primar, incessantemente, pela busca de uma sociedade justa.21 Dallari reitera que, “de fato, não é possível estabelecer-se a nítida separação entre o jurídico e o político.” Desse modo, é inconcebível a concepção do Estado sem os institutos da ZYL, Paul Van. Promovendo a justiça transicional em sociedades pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.32-55, jan.-jun., 2009. p 32. 20 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. – 24. ed. – São Paulo: Saraiva, 2003. p.15. 21 Ibid., p.15-16. 19 17 política e do direito, uma vez que toda delimitação de regras de comportamento se baseia em fundamentos e finalidades, enquanto que a existência dos meios para os respectivos fins depende de sua materialização jurídica.22 Dada a imbricada relação de interdisciplinariedade entre direito e política, que a decisão do Supremo Tribunal Federal revela-se controversa, uma vez que o Brasil, enquanto sujeito de deveres e direitos no cenário internacional orienta-se como defensor dos direitos humanos. Ora, tal opção política é manifestamente clara pelo Estado brasileiro, vez que, segundo Lenio Streck, ao regular a necessidade do uso de algemas, na edição da súmula vinculante nº 11, fez uso das regras da Organização das Nações Unidas para tratamento dos prisioneiros.23 Assim, a decisão jurídica tomada frente ao caso concreto – interpretação da Lei de Anistia – mostra-se plenamente incoerente com os preceitos políticos do Estado democrático brasileiro. A relação entre o direito e a política desvela-se de maneira estreita, posto que Antonio Carlos Wolkmer vivifica a complementariedade desses dois desígnios: O Estado configura-se como uma organização de caráter político que visa não só a manutenção e coesão, mas a regulamentação da força em uma formação social determinada. Esta força está alicerçada, por sua vez, em uma ordem coercitiva, tipificada pela incidência jurídica. O Estado legitima seu poder pela segurança e pela validade oferecida pelo Direito, que, por sua vez, adquire força no respaldo proporcionado pelo Estado. (grifo nosso). 24 Portanto, oportuno é o raciocínio do ilustres pensadores jurídicos Tarso Genro e Paulo Abrão o qual expressam a primazia do desenvolvimento de uma política de justiça de transição nos países que se submeteram à égide do sistema totalitário: A sucessão de regimes repressivos e autoritários, ditatoriais e/ou totalitários que avassalaram a América Latina, entre meados dos anos 60 e 80, ainda não foi tratada de forma sistemática por nenhum regime democrático em processo de afirmação do continente. Isso se justifica, de uma parte porque todas as transições políticas para a democracia foram feitas sob compromisso. De outra porque a democracia expandiu-se mais como “forma” do que como “substância”. Na verdade, nenhum dos regimes de fato foi derrotado ou derrubado por movimentos revolucionários de caráter popular; logo, os valores que sustentaram as ditaduras ainda são aceitos como “razoáveis” para a época da guerra fria, e também face às “barbáries também cometidas pelos resistentes de esquerda.” 25 (grifo nosso) DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. – 24. ed. – São Paulo: Saraiva, 2003. p.128. 23 STRECK, Lenio. A Lei de Anistia, a Constituição e os direitos humanos no Brasil: Lenio Streck responde. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 2, jul.-dez., 2009. p.26. 24 WOLKMER, Antonio Carlos. Ideologia, Estado e Direito. – 2. ed. rev. E ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995. p.73. 25 GENRO, Tarso; ABRÃO, Paulo. Memória Histórica, Justiça de Transição e Democracia sem fim. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: estudos sobre Brasil, Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal. Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 16-24, 2010. p.18. 22 18 Nesse sentido, é manifesta a necessidade de fomento à construção de um Estado de direito que esteja interligado por intermédio das políticas públicas ao jurídico, ao direito. Ora, o Estado de direito é senão a titularidade de ser sujeito de direitos e deveres que lhe foram outorgados e reconhecidos pela Magna Carta. Desta feita, não se admite a sujeição de políticas ou leis que não se adéquem ao texto constitucional. Corroborando desse raciocínio, oportunas são as palavras do professor Marcelo Neves ao relatar que o Estado de Direito sistematicamente compreendido não se alude a uma forma de relação espúria entre o jurídico e o político. Nas formas anteriores ao período moderno de dominação, bem como no absolutismo do princípio da era moderna e nas autocracias atuais, é representada a relação de submissão entre o jurídico e o político.26 Norberto Bobbio ressalta a relação entre política e direito como um processo complexo de interdependência mútua, de forma que o direito consiste no ordenamento jurídico composto pelas diversas normas legais ao qual uma sociedade se submete. Já a política se perfaz por meio do direito que regulará os limites da atuação política.27 Outro elemento destacado por Bobbio para compreensão entre direito e política está situado na legitimidade do poder, situação em que “não é mais o poder político que reproduz o direito, mas o direito que justifica o poder político.” 28 Além disso, considera que a legitimidade e a legalidade do poder constituem pilares para o esclarecimento do envolvimento entre política e direito, vez que dessa intersecção nasce o Estado de Direito, subordinando o poder político ao direito, como destinação final do grupo social. Em que pese os argumentos sustentados a respeito da legitimidade, pertinente é a colocação de Melo a respeito da legitimidade do poder: É com referência ao poder, que se manifesta, com mais rigor e clareza, o princípio da legitimidade, como relação de confronto entre a percepção que a sociedade tem quanto aos fundamentos e fins daquele e o sistema de crenças e valores prevalecentes. Por isso é interessante verificar que o fenômeno do consenso, como instrumento de legitimação, depende dessas crenças e desses valores, cujas mudanças bruscas podem levar a rupturas e à retirada da adesão existente. 29 Ora, ao tratarmos do assunto de ditadura ou sistema de ditatorial ou período de exceção no Brasil, a impressão que se detecta, principalmente, pelos órgãos de representação governamental, é que esta matéria já foi cuidada e o melhor procedimento a ser tomado é NEVES, Marcelo. El contenido material de La democracia: tendencias actuales Del constitucionalismo latinoamericano. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. 27 BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política: a filosofia política e as lições dos clássicos. – 20ª Reimpressão – organizado por Michelangelo Bovero; tradução Daniela Beccacia Versiani. – Rio de Janeiro: Elsevier, 2000. p.232. 28 Ibid., p.238-9. 29 MELO, Osvaldo Ferreira de. Temas Atuais de Política do Direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. p.83. 26 19 prosseguirmos para o futuro sem tratarmos de um passado que se faz perfeitamente presente até os dias atuais, contudo, com novas máscaras. A mesma idéia de que houve um consenso na elaboração do texto da Lei de Anistia, sob os auspícios do regime ditatorial, se dá pela influência que o governo brasileiro busca transferir para as gerações de hoje. No entanto, é reticente em diversos estudos e pesquisas a importância e a necessidade dos países emergentes do regime ditatorial enfrentarem o passado político totalitário, por meio não de revoluções ou guerrilhas, mas, sim, pelo fortalecimento da democracia e da redução das desigualdades sociais. A partir dos fundamentos de Melo acima consignado, é evidente a necessidade de imbuir esforços no sentido de explicitarmos os acontecimentos ocorridos sob a égide do regime de exceção. Muitas das decisões e ações praticadas naquele período refletem a realidade brasileira do século XXI. Portanto, ao analisarmos os tratados internacionais dos quais o Brasil era, foi e é signatário, é clarividente que a política brasileira sempre primou pela proteção dos direitos humanos. Assim, seria ilógico senão irracional dar sentido diverso daquele delimitador da política da proteção universal dos direitos do homem, sem a estrita observância dos valores e crenças pelo qual o Estado brasileiro despendeu esforços pela sua preservação.(grifo nosso) Nesse particular, sob o prisma da política e do direito, torna-se tênue a necessidade de fomento aos espaços de humanização jurídica, mormente, quando se está diante do grave fenômeno de judicialização da política dos direitos humanos. Destarte, o ilustre professor Dr. Paulo Abrão reitera: “as tensões entre política e direito são recorrentes na vida pública e o debate da lei de anistia é um exemplo privilegiado para se perceber essas tensões.” 30 Nessa mesma linha, Eduardo C. B. Bittar sintetiza: O que pode concluir desse relacionamento entre Direito e Política, no plano do ordenamento jurídico nacional, é que deve a Política (Estado e democracia) conformar-se às regras de Direito (Direito e legalidade), sendo isto importante e marcante para a definição dos limites entre a arbitrariedade e a juridicidade com a qual se governa o Estado.31 Segundo Melo os preceitos legais estão vinculados à sua história, pois o surgimento de uma norma legal decorre da necessidade de satisfação de uma realidade social. Nesse sentido, ABRÃO, Paulo. O alcance da Lei de Anistia: o último passo. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/main.asp?Team={2AD759EF-DCFB-46EB-A16C-73502B9C09EF}>. Acesso em: 28 de setembro de 2011. 31 BITTAR, Eduardo C. B. Curso de filosofia política. – 3. ed. – 2. reimpr. – São Paulo: Atlas, 2008. p.26. 30 20 “o Direito é fenômeno cultural, contingenciado pela experiência social e pelos juízos de valor. E por isso nada que se passa no mundo jurídico é sem história.” 32 Caminhando nesse pensar, a Lei de Anistia foi criada a partir da necessidade de justificar os atos de violação dos direitos humanos praticados pelo governo ditatorial brasileiro. Com isso, a votação do texto orientou-se na concessão de anistia àqueles que se insurgiram contra o regime político da época. Por óbvio, que a massificação da política brasileira orienta-se no sentido de sepultar e prolongar esse discurso, visto os avanços desenfreados propiciados pelas revoluções democráticas no mundo oriental. Todavia, o texto votado, ainda que expressamente claro, por interesses políticos de governantes que permanecem no poder, permite a discussão sobre a amplitude da anistia propugnada. Com efeito, as lições de Osvaldo Ferreira de Melo retratam o prestígio delineado pelas interações entre a política e o direito como instrumento de regulação da sociedade: [...] a Política Jurídica se interessa pela norma desde a sua forma embrionária no útero social. Os valores, fundamentos e consequências sociais da norma são suas principais preocupações. Para ela, dentro dessa dimensão prática e imediata, importante é alcançar a norma que responda tão bem quanto possível às necessidades gerais, garantindo o bem estar social pelo justo, pelo verdadeiro e pelo útil, sem descurar da necessária segurança jurídica e sem por em risco o Estado de Direito. 33 (grifo nosso) A política em si busca representar os anseios e interesses de toda uma sociedade, de todo um povo. Nesse diapasão, a ausência de interesse pela política torna-se cada vez maior no cenário brasileiro face aos elevados índices de corrupção e, sobretudo, aos inúmeros casos de impunidade. Bittar, em análise ao Índice de Participação Social (IPS), criado pela Rede Interamericana para a Democracia, destaca o manifesto desinteresse pela sociedade brasileira aos temas de cunho político. Tamanho é o desinteresse que numa escala de 0 a 20, o Brasil apresenta um índice de 1,7 ponto IPS, enquanto países como República Dominica 3,4 pontos, Chile 3,1 pontos, Peru 2,6 e a Argentina 2,2 pontos. Em síntese, o retrato da política e do direito no contexto brasileiro é assim representado: A ojeriza da opinião comum à política decorre do histórico mau uso do poder, sobretudo na experiência política brasileira, cenário onde sempre se confundiram os interesses privados e os interesses públicos, numa espécie de exercício de alternância de dominância de elites econômicas e circunstancialmente favorecidas.34 MELO, Osvaldo Ferreira de. Temas Atuais de Política do Direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. p.20. 33 MELO, Osvaldo Ferreira de. Temas Atuais de Política do Direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. p.19. 34 BITTAR, Eduardo C. B. Curso de filosofia política. – 3. ed. – 2. reimpr. – São Paulo: Atlas, 2008. p.14. 32 21 Por conseguinte, Dieter Grimm relata a interdependência do direito e a política e o viés de subordinação inerente a esses institutos: Em sua forma atual, a relação entre direito e política encontra-se decisivamente cunhada pela positivação do direito. Por positivação entenda-se o processo histórico no qual o direito passou de validade tradicional ou transcendente para validade decisionista. O resultado desse processo, o direito positivo, é caracterizado por sua realização por meio de uma legislação humana consciente e sua validade por força de decisão. Essa decisão não ocorre no sistema jurídico, mas, sim, no político. O que vale juridicamente é determinado politicamente. Nesse caso, a política está subordinada ao direito. Um conteúdo próprio, politicamente independente do direito, não existe.35 (grifo nosso) Desse modo, as políticas de transição devem pautar-se pela confrontação e enfrentamento das questões pelas quais o Estado busca imprimir a noção de superação da ditadura. Deve-se ater que as políticas estatais pós-ditadura pressupõem mudanças estruturais. Portanto, o Estado deve manifestar o seu legítimo interesse em resgatar o passado sombrio da ditadura para edificação de um Estado novo, livre das amarras arbitrárias que são características ainda presentes nas instituições atuais. Paul Van Zyl frisa que é necessário atentar-se para as políticas que o Estado propõe desenvolver, pois muitas delas são destituídas de qualquer força de transformação, constituindo, tão somente, ativismo político como forma de demonstração à sociedade de implantação de medidas de reparação. A partir disso, confira-se: Hoje é muito mais factível que os governos antecipem ou respondam à pressão e adotem medidas pela metade (tais como tribunais politizados ou comissões da verdade frágeis) que podem parecer legítimas na superfície, mas que são na realidade tentativas cínicas de evadir a responsabilidade de confrontar o passado. Isso significa que os ativistas, os governos, assim como os doadores, devem fazer uma análise minuciosa dos esforços e empreender refinadas defesas de seus projetos a fim de garantir que somente respaldem ou promovam as tentativas genuínas.36 Logo, Osvaldo Ferreira de Melo ensina: “mais além da questão da eficácia, há o fato da prestação social, quando uma norma gera expectativas não passíveis de realização. 37 Tal sentimento difuso é revelado como forma de injustiça emanada do Poder.” Assim, as políticas de esquecimento imbuídas pelo Estado devem ser repugnadas, pois, conforme afirma Paulo Abrão e Marcelo Torelly, a ideia de amnésia social imposta potencializa a ofensa moral ao perseguido, ampliando ainda mais a negação ao direito de ser humano e de ter idéias políticas divergentes que a perseguição original gerou, prolongando no tempo a perseguição política sofrida, uma vez que nesta visão o final da ditadura e a abertura democrática GRIMM, Dieter. Constituição e Política. Tradução de Geraldo de Carvalho; coordenação e supervisão Luiz Moreira. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. p.3. 36 ZYL, Paul Van. Promovendo a justiça transicional em sociedades pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.32-55, jan.-jun., 2009. p 54. 37 MELO, Osvaldo Ferreira de. Temas Atuais de Política do Direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. p.56. 35 22 não tem força de, prontamente, re-legitimar as lutas e defesas políticas que foram interrompidas pelo regime autoritário. 38 1.3 FUNDAMENTOS DO ESTADO DE DIREITO Este tópico tem por fundamento demonstrar as obrigações do Estado de Direito, ressaltando sua estrutura e formação básica. Todavia, não tem por objetivo a delineação detida e específica do processo histórico de formação e, sim, a partir das precípuas obrigações estatais, estabelecer um paralelo com os atos praticados pelo Estado brasileiro no período de exceção. Conforme Soares, “no sentido etimológico, Estado deriva do latim status – estar firme – ou condição social. Significa também constituição e ordem, equivalendo ao status republicae dos romanos.” Assim, para se entender o sentido do Estado faz-se necessário entender as diversas mudanças de modelos no processo histórico e, a partir dos direitos fundamentais, diagnosticar os elementos fundadores do Estado de Direito.39 Santos leciona que a ideia inicial é subentendida da expressão Estado de Direito, como sendo aquele Estado fundamentado pelo Direito, que observa as normas do Direito. Entretanto, a superficialidade de tal raciocínio conduziria a interpretação de que todo Estado dotado de organização jurídica é Estado de Direito.40 Para Streck et. al, “este Estado que se juridiciza/legaliza é, todavia, mais e não apenas um Estado jurídico/legal. Não basta, para ele, assumir-se e apresentar-se sob uma roupagem institucional normativa.”41 Salienta, ainda, que por detrás da legalidade do Estado de Direito, este possui intrinsecamente em sua forma uma característica além da sua forma jurídica. Maluf consigna que o conceito de Estado não encontra uma definição exata de seu sentido e sim que, cada autor de acordo com seu entendimento, conceitua a amplitude este instituto. Portanto, reitera que, em observação a um dos tratadistas de direito público de maior ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de Transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: estudos sobre Brasil, Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal. Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p.50. 39 SOARES, Mário Lúcio Quintão. Teoria do estado: o substrato clássico e os novos paradigmas como précompreensão para o DireitoConstitucional. – Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p.120. 40 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. – 2. ed. – São Paulo: Atlas, 2001. p.89. 41 STRECK, Lenio Luiz; DE MORAIS, José Luis Bolzan. Ciência política e teoria geral do estado. 4. ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p.87. 38 23 destaque – Bluntschi – relata a impossibilidade de definição do conceito de Estado inerente ao sentido de Estado enquanto entidade histórica, real, empírica.42 Soares entende que para formulação do conceito de Estado, é necessária a observância às mudanças dos modelos no período histórico, realizando, com base nos direitos fundamentais, uma meditação a despeito de suas transformações, seus elementos básicos e evolução de seus conceitos clássicos.43 Portanto, Streck repisa que o ideal do Estado de Direito surge quando o Estado, a partir das transformações da sociedade humana ao longo de determinado período, sujeita-se a um regime de direito no desenvolvimento da atividade estatal, assim como esse mesmo conjunto de regras e normas delimitadoras do exercício da ação governamental promove proteção aos seus cidadãos.44 Por derradeiro, as palavras de Celso Ribeiro de Bastos expressam de forma clara as nuances do Estado de Direito: Portanto para que haja um Estado de Direito faz-se necessária a presença de dois requisitos básicos, quais sejam, a proteção às garantias individuais e a limitação do arbítrio do poder estatal. Em suma, o Estado de Direito nada mais é do que o Estado limitado pelo Direito, sendo que este último passa a ser o parâmetro do próprio Estado, com vistas a evitar qualquer tipo de arbitrariedade. O Estado sempre deve buscar o máximo de juridicidade possível. 45 Por todo o exposto, a partir dos argumentos supracitados sobre o Estado de Direito e tendo como pressuposto que o Estado brasileiro é um Estado Democrático de Direito, passase a breves considerações e obrigações decorrentes dessa simbiose. Nesse caminhar, faz-se essencial a análise do Estado liberal – fixador de limites – e do Estado Social – welfare state – consubstanciando, destarte, no Estado Democrático de direito. Segundo Streck, a gênese do Estado liberal de Direito surge ligado aos ideais do liberalismo, alinhando-se dessa maneira aos contornos jurídicos do Estado em relação ao princípio da igualdade – subordinação estatal aos ditames legais – à separação dos poderes e, como tema central, à garantia dos direitos fundamentais.46 Nessa esteira, Streck relaciona, resumidamente, as características do Estado de direito: a) separação entre Estado e Sociedade civil mediada pelo Direito; b) garantia das liberdades MALUF, Sahid, 1914 – 1975. Teoria geral do Estado. 25. ed. atual./ pelo Prof. Miguel Alfredo Malufe Neto. - São Paulo: Saraiva, 1999. p.20. 43 SOARES, Mário Lúcio Quintão. Teoria do Estado: introdução. – 2. ed. rev. Atual. – Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p.79. 44 STRECK, Lenio Luiz; DE MORAIS, José Luis Bolzan. Ciência política e teoria geral do estado. 4. ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p.86-87. 45 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Teoria do Estado e Ciência Política. – 5ª edição atualizada e ampliada.São Paulo: Celso Bastos Editora, 2002. p.163. 46 STRECK, Lenio Luiz; DE MORAIS, José Luis Bolzan. Ciência política e teoria geral do estado. 4. ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p.89. 42 24 individuais; c) surgimento da democracia como ideário da soberania da nação; d) redução do papel do Estado como Estado mínimo.47 Nessa ótica, Streck sintetiza o cerne do Estado de Direito, em sua concepção originária, entrelaçando-se com os fundamentos do liberalismo e resguardando, sobretudo, a autêntica funcionalidade que carrega em si, tal qual: [...] o Estado liberal de Direito apresenta-se como uma limitação jurídico-legal negativa, ou seja, como garantia dos indivíduos-cidadãos frente à eventual atuação do Estado, impeditiva ou constrangedora de sua atuação cotidiana. Ou seja: a este cabia o estabelecimento de instrumentos jurídicos que assegurassem o livre desenvolvimento das pretensões individuais, ao lado das restrições impostas à sua atuação positiva. Em razão disso é que o Direito, próprio a este Estado, terá como característica central e como metodologia eficacial a coerção das atitudes, tendo como mecanismo fundamental a sanção. 48 Noutro norte, Silva ensina que o Estado social de direito representou a escusa do Estado liberal, revelando, nesse diálogo, as incapacidades das liberdades burguesas, permitindo o conhecimento da necessidade da justiça social. Assim, Silva assevera que “ainda é insuficiente a concepção do Estado Social de Direito, ainda que, como Estado Material de Direito, revele um tipo de Estado que tende a criar uma situação de bem-estar geral que garanta o desenvolvimento da pessoa humana.” 49 Streck (2004) afirma que o Estado Social de Direito inclina-se à correção do individualismo liberal, por meio de medidas coletivas saneadoras, as quais por intermédio do capitalismo buscam proporcionar o welfare state (bem-estar social). 50 Assim, o Estado Democrático de Direito vem a surgir da conjugação de abstenção do Estado frente às liberdades negativas e da necessidade de promoção de medidas sociais que efetivassem os direitos sociais ao mínimo existencial. Canotilho prescreve que “o Estado constitucional de direito procura estabelecer uma conexão interna entre democracia e Estado de Direito.”51 Desse modo, Silva aduzindo as concepções do Estado Democrático de Direito salienta: No Estado Democrático de Direito, a lei não deve ficar numa esfera puramente normativa, não pode ser apenas lei de arbitragem, pois precisa influir na realidade social. E se a Constituição se abre para as transformações políticas, econômicas e sociais que a sociedade brasileira requer, a lei se elevará de importância, na medida em que, sendo fundamental expressão do direito positivo, caracteriza-se como desdobramento necessário do conteúdo da Constituição e aí exerce função transformadora da sociedade, impondo mudanças sociais democráticas, ainda que STRECK, Lenio Luiz; DE MORAIS, José Luis Bolzan. Ciência política e teoria geral do estado. 4. ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p.89. 48 Ibid., p.91. 49 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2007. p.115. 50 STRECK, op. cit., p.91. 51 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. Portugal: Edições Almedina, 2007. p.93. 47 25 possa continuar a desempenhar uma função conservadora, garantindo a sobrevivência de valores socialmente aceitos. 52 A novidade do Estado Democrático de Direito para Lenio Streck “não está em uma revolução das estruturas sociais, mas deve-se perceber que esta nova conjugação incorpora características novas ao modelo tradicional.” 53 Assim, afirma que o Estado Liberal ao lado do Estado Social surge como real efetivador da igualdade apregoada pelo Estado Democrático de Direito, ainda que em busca de sua materialização contida no texto constitucional, a qual prima pela promoção das necessidades básicas aos seus cidadãos. Quanto à estrutura do Estado, prevalece um discurso quase que unânime entre os diversos doutrinadores a respeito dos elementos constitutivos do Estado, encontrando-se quem defenda como elemento constitutivo do Estado o governo-soberano. Malgrado os vários entendimentos, entende-se que tais elementos restringem-se em: povo, território e soberania. Segundo Soares, o povo na constituição brasileira de 1988 constitui “como titular do poder soberano, através de seus representantes ou diretamente, estabelecendo o substrato do aparelho ideológico do Estado democrático.” 54 Para Menezes, o elemento humano povo possui sentido político que não se deve confundir com nação55 ou até mesmo população56, pois aqueles são os que verdadeiramente participam de forma direta da vida nacional.57 O território, segundo Sahid Maluf se constitui como a delimitação física-geográfica do país em que determinado povo o habita.58 Lenio Streck considera como o locus sobre o qual será fixado o elemento humano e terá lugar o exercício do poder e aplicação do ordenamento jurídico-positivo estatal.59 A soberania, na lição de Ricardo Rodrigues Gama, deve ser compreendida como as prerrogativas do poder do Estado exercido de forma inexorável e sem limites sobre todo o SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2007. p.121-122. STRECK, Lenio Luiz; DE MORAIS, José Luis Bolzan. Ciência política e teoria geral do estado. 4. ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p.97. 54 SOARES, Mário Lúcio Quintão. Teoria do Estado: introdução. – 2. ed. rev. Atual. – Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p.176. 55 Nação: para a existência de nação, devem comparecer motivos de ordem social, moral e histórica, por via dos quais os indivíduos humanos, devidamente agrupados, apresentam aquilo que se convencionou chamar parentesco espiritual. 56 População: massa de indivíduos que, em dado momento, vivem dentro da jurisdição de certo Estado. Não se leva em conta entre eles,consequentemente,íntimas e demoradas relações sociais, de base éticohistórica, ou nem mesmo rigorosas relações jurídicas, nem afins relações políticas. 57 MENEZES, Aderson de. Teoria Geral do Estado. – atualização por José Lindoso – e atual. – Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2009. p.137-8. 58 MALUF, Sahid, 1914 – 1975. Teoria geral do Estado. 25. ed. atual./ pelo Prof. Miguel Alfredo Malufe Neto. - São Paulo: Saraiva, 1999. p.25. 59 STRECK, Lenio Luiz; DE MORAIS, José Luis Bolzan. Ciência política e teoria geral do estado. 4. ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 152. 52 53 26 território nacional.60 Brancato assevera que soberania é “o poder subordinado a uma disciplina jurídica e que o torna impessoal. Sem essa disciplina o poder nada mais é que do que a configuração do arbítrio pessoal que irá depender do prestígio de quem o exerce. Daí os regimes ditatoriais.” 61(grifo nosso) Isso posto, é possível detectar as violações praticadas pelo Estado Democrático de Direito no período ditatorial, uma vez que, desconsiderando o golpe de Estado, o Brasil era um país que, de acordo com a Constituição de 1946, constituía-se em Estado de Direito. Portanto, face às variáveis que giram em torno do Estado Liberal até a sua evolução em Estado democrático, o Brasil tem por obrigação a proteção de seus cidadãos, não se permitindo a prática de atos arbitrários que afrontem os direitos fundamentais e as garantias das liberdades públicas do ser humano. Impende expor que os fundamentos do Estado Democrático de Direito tem por primazia a viabilização e a concretização dos direitos fundamentais dos brasileiros e estrangeiros que estejam em seu território. Partindo desse pressuposto, incontestes são as violações praticadas pelo Estado brasileiro no período ditatorial, o qual de forma manifesta praticou crimes de tortura e desaparecimento forçado neste intervalo, sabedor de que a escolha de um regime político por seus governantes não seria argumento capaz de violar as liberdades públicas de seus cidadãos. Além disso, como se não bastassem as diversas violações e escusas do Estado brasileiro no sentido de apurar e reparar as violações praticas no regime de exceção, após 22 anos da promulgação da Magna Carta de 1988, novamente se perfaz a violação dos direitos fundamentais, por meio do reconhecimento da extensão de anistia aos crimes de tortura e desaparecimento forçado praticado naquele momento de totalitarismo. É cediço que crimes políticos não são crimes comuns e muito menos de tortura. Além disso, a Carta Magna em diversos dispositivos vela pela proteção à vida e integridade física e moral de seus cidadãos. Portanto, não seria permitido conceder tamanha anistia aos perseguidores políticos que mataram e torturam brasileiros por motivos de ordem política. No atual cenário mundial em que se discute a efetivação dos direitos fundamentais humanos, é desprovida de qualquer força jurídica, moral ou legal a decisão da Suprema Corte Brasileira que ignorou os parâmetros jurídicos ao proferir referida decisão. Assim, convém GAMA, Ricardo Rodrigues. Ciência Política. Campinas: LZN Editora, 2005. p.114. BRANCATO, Ricardo Teixeira. Instituições de direito público e de direito privado. – 11. ed. rev. – São Paulo: Saraiva: 1998. p.59. 60 61 27 relembrar o viés propugnado pela Política e pelo Direito, o qual, no caso em análise, foram veemente dissociados. 1.4 A TRANSIÇÃO NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988: ARTIGO 8º ADCT O processo de abertura política ou tão conhecido como transição democrática teve, inegavelmente, como grande marco regulatório a promulgação da Magna Carta, no dia 5 de outubro de 1988, a qual, sob a direção de uma “Comissão de Notáveis”, nomeada pelo então Presidente da República José Sarney, teria os seus trabalhos presididos pelo eminente professor Afonso Arinos de Melo Fraco que detinha a incumbência de elaborar um projeto de Constituição e regulamentar as leis advindas do período autoritário.62 Nesse contexto, não se pode olvidar que inequivocamente a Constituição Federal de 1988 foi fruto de um processo autoritário ao qual o povo não mais concordava com o regime político imposto pelo governo. Assim, segundo Bonavides, pedia-se o fim daquela ruptura prolongada que fora a chamada “revolução permanente” do golpe de Estado de 1964, cuja derradeira tempestade, ainda em plena vigência do AI-5, se concretizou com o célebre “pacote” de 29 de abril de 1977, do presidente Geisel. Não se pode dizer que esse processo foi dádiva do Estado. Tanto não foi que o mais bem-intencionado governante da época, a que já nos referimos, fechou temporariamente o Congresso. Sem a fadiga da Nação, a descrença do povo, a erosão completa do princípio da legitimidade, nada poderia contrariar a vocação perpetuísta que animava os bolsões radicais do movimento de 64, indiferentes e hostis, como sempre, à democracia e ao exercício das franquias liberais.63 Paulo Bonavides descreve que “o período de transição da ditadura militar instalada em 1964 para a Nova República foi, certamente, o mais doloroso de todos quantos a história marcou em nosso País.” 64 Assevera, ainda, Bonavides que, desde o período da Monarquia até República, não houve um período marcado pela prática recorrente de atos arbitrários liderado pelo poder estatal, tais como, pessoas presas, por razão política, sem culpa formada, torturas e assassínios.65 Tudo isso, se valendo de uma doutrina de segurança nacional que representava, SKIDMORE, Thomas E. Brasil: de Castelo a Tancredo. – tradução Mariano Salviano Silva. – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988. p.495-6. 63 BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes. História Constitucional do Brasil. Brasília: OAB Editora, 2008. p.455. 64 Ibid., p.448. 65 Ibid., p.448. 62 28 senão, o poder arbitrário “apelidado de democracia, que envidava esforços em manter pela violência aquilo que não tem condições de viver pelo debate e pela aceitação livre.” 66 Santos e Filho retratam com precisão o período de transição democrática brasileiro: O período compreendido entre 1964 e 1985 no Brasil foi marcado por uma ditadura militar que violou uma série de direitos fundamentais de nacionais e não nacionais por meio da organização pelo Estado de um aparelho repressivo brutal que institucionalizou a prisão, a tortura, o desaparecimento forçado e o assassinato de setores da população civil, em virtude de intolerância ideológica, pois eram considerados como opositores do regime67.68 A ruptura desse período autoritário à instauração da República se aperfeiçoou, em 15 de janeiro de 1985, com a eleição do Presidente Tancredo Neves, cuja morte foi fator impeditivo para sua posse. Logo, o vice-presidente, José Sarney, não obstante as diversas discussões a respeito da sua legitimidade enquanto tal, tomou posse como Presidente. Desse modo, em um contexto histórico de profundas revoluções e um ambiente de severas discussões, o texto constitucional de 1988 teve seu nascedouro influenciado por todas essas questões. É cediço que a Constituição Federal de 1988 não foi fruto de um desligamento das instituições anteriores. Contudo, é de bom alvitre ponderar que a Constituição de 88, segundo Bonavides “operou-se na alma da Nação, profundamente rebelada contra o mais longo eclipse das liberdades públicas: aquela noite de 20 anos sem parlamento livre e soberano, debaixo da tutela e violência dos atos institucionais cuja remoção a Constituinte se propunha a fazê-lo.” 69 Nesse passo, a transição democrática teve o seu início mesmo, marcado pela Lei n. 6.683/1979, a qual é considerada um marco jurídico-fundante para a democracia, segundo o Professor Dr. Paulo Abrão, pois a referida lei trouxe em seus próprios dispositivos, dimensões reparatórias, tais como, a readmissão do serviço público dos trabalhadores que haviam sido SODRÉ, Nelson Werneck. Vida e morte da ditadura: 20 anos de autoritarismo no Brasil. Petrópolis: Editora Vozes, 1984. p.8. 67 Os regimes políticos repressivos se generalizaram pelos países do Cone Sul: Brasil (1964), Argentina (1996 e 1976), Uruguai (1973), Chile(1973), enquanto que a ditadura de Stroessner, no Paraguai, remonta à década anterior, 1954. O Brasil e diversos outros países da região, que lutaram como aliados dos Estados Unidos na Segunda Guerra, ficaram sob a influência norte americana, começando a partir daí o embrião de uma cooperação estratégia militar que se estendeu sob as décadas posteriores, caracterizada pela uniformidade de doutrinas, treinamento conjunto de quadros e estreita identidade ideológica. Essa influência sobre a nova concepção de “Defesa Nacional”, que visava a contenção do comunismo, ficou conhecida como “doutrina da segurança nacional”, que procurava fortalecer o “Poder Nacional” não contra um ataque externo, mas contra um “inimigo interno” que teoricamente tentava solapar as instituições, num suposto contexto de “guerra interna”. 68 SANTOS, Roberto Lima; FILHO, Vladimir Brega. Os reflexos da “judicialização” da repressão política no Brasil no seu engajamento com os postulados da justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.152-177, jan-jun. 2009. p.152. 69 BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes. História Constitucional do Brasil. Brasília: OAB Editora, 2008. p.455. 66 29 afastados arbitrariamente dos seus postos de trabalho, restituição dos direitos políticos aos cidadãos que foram afastados da vida democrática pelos atos institucionais.70 De outro lado, o tema da anistia foi recepcionado pela Magna Carta no artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, o qual concedeu anistia a todos aqueles que foram atingidos por atos exclusivamente políticos e seus efetivos desdobramentos regulados no caput do artigo. Outro marco regulatório foi a emenda constitucional nº 26/1985 que trouxe a possibilidade reparatória para alguns trabalhadores da iniciativa privada e aos estudantes expulsos dos bancos escolares, em razão da militância, grêmios escolares ou diretórios acadêmicos. Daí em diante, o artigo 8º do ADCT da Carta de 1988 reconheceu o direito de reparação que somente recebeu regulamentação com a medida provisória nº 2.151, de 31 de maio de 2001, a qual teve por bem reconhecer como anistiados políticos aqueles que entre o período de 18 de setembro de 1946 até 5 de outubro de 1988 foram perseguidos, por motivos exclusivamente políticos. A medida provisória foi convertida na Lei nº 10.559/2002, a qual instituiu um órgão para promover a reparação administrativa.71 O referido diploma legal – 10559/2002 – possui um preceito legal de larga perspicácia, pois conseguiu englobar todos aqueles que foram atingidos por atos de exceção como tortura, perseguição política latu senso, expurgos estudantis, demissões arbitrárias, compelimento à vida clandestina e ao exílio, banimento e extinção do país, processamentos administrativos e judiciais ilegais, prisões arbitrárias, monitoramento ilícito da vida das pessoas, etc. Assim, a sociedade brasileira do período pós-88 teve a possibilidade de identificar se foram violadas em alguma área de suas vidas, bem como pleitear a respectiva reparação.72 Ocorre que o artigo 1º da Lei 6.683/1979 tratou inicialmente e expressamente da concessão de anistia aos perseguidos políticos. Todavia, a referida lei, editada sob o agouro do governo ditatorial, teve por pressão governamental a concessão de uma anistia “ampla, geral e irrestrita”, visto que os atos de arbitrariedade eram de intensa magnitude e, considerando, as diversas pessoas que foram submetidas a atos de tortura e desaparecimento forçado, que a pressão política orientou-se no sentido de imbuir um sentido de anistia que abarcasse tanto a classe daqueles que se insurgiram contra o regime político, assim como os perseguidores políticos que praticaram crimes de lesa-humanidade. TV JUSTIÇA. Programa Fórum. Anistia Política. Acesso em 13 de outubro de 2011. Vide nota 91. TV JUSTIÇA. Programa Fórum. Anistia Política. Acesso em 13 de outubro de 2011. Vide nota 91. 72 TV JUSTIÇA. Programa Fórum. Anistia Política. Acesso em 13 de outubro de 2011. Vide nota 91. 70 71 30 Tamanha era a pressão em elaborar um texto que conjugasse a concessão de anistia aos perseguidos políticos e, também, aos perseguidores políticos que o excerto abaixo delineado por Paulo Abrão, da peça do Amicus Curiae da Associação Democrática Nacionalista de Militares junto ao STF, reflete os interesses governamentais na escusa de suas responsabilidades pelas violações praticadas: A votação da Lei de Anistia dá-se em 1979, com os senadores biônicos e em um ambiente de abertura democrática apenas nominal. Não há um pré-compromisso, pois não há liberdade para o dissenso e, portanto, para a discussão. Não há um grande debate nacional, não há debate parlamentar: prevalece o texto enviado pelo Poder Executivo com poucas variações, vitorioso por curta margem em um Congresso manietado. É rejeitada a proposta de convocação das entidades representativas como a Ordem dos Advogados do Brasil, a Associação Brasileira de Imprensa e a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil. O partido do governo sistematicamente esvazia as reuniões na Comissão Mista. As entidades representativas posicionam-se contra o projeto. [...] Essa “regra-mordaça” 5, ilegítima de origem, não pode, no entanto, tornar a sociedade refém de um passado autoritário. Sem condições de exercício da oposição, sem liberdade de imprensa, sem legitimação democrática de todos os parlamentares, não há espaço para acordos ou compromissos. [...] O que se tem, portanto, é uma situação de auto-anistia, por meio da qual os próprios perpetradores de violações aos direitos humanos asseguraram a seus agentes que, com emergência inevitável do retorno à democracia, não seriam responsabilizados pelos crimes cometidos durante a ditadura. 73 (grifo nosso) Conforme se pode verificar, Rodrigues, claramente, acentua que a anistia foi uma das bandeiras de luta das oposições ao regime militar instaurado no Brasil em 1964. Entretanto, se a Lei nº. 6.683, de 28 de agosto de 1979, concedeu a anistia para os seus opositores, foi, também, uma “autoanistia” do regime militar, particularmente dos seus agentes de repressão. E, como veremos a seguir, o texto aprovado no Congresso Nacional e promulgado pelo então presidente João Batista Figueiredo não foi objeto de consenso, mesmo entre os que lutaram pela anistia.74(grifo nosso) Desenvolvendo raciocínio similar, Paulo Abrão certifica que “pela clareza dispositiva da Constituição de 1988 que, ao recepcionar e promover a compreensão democrática da lei de anistia de 79, em seu artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, é explícita em anistiar os perseguidos e não aos perseguidores” 75 (grifo nosso) ABRÃO, Paulo. O alcance da lei de anistia: o último passo. Texto fruto da palestra proferida durante o Seminário Internacional sobre Justiça Internacional Penal, promovido pelo Instituto de Relações Internacionais da USP, em São Paulo, em 13 de abril de 2010. p.3-4. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?Team={2AD759EF-DCFB-46EB-A16C-73502B9C09EF}>. Acesso em: 7 de outubro de 2010. 74RODRIGUES, Georgete Medleg. Arquivos, anistia política e justiça de transição no Brasil: onde os nexos?. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.136-151, jan-jun. 2009. p.140. 75 ABRÃO, Paulo. O alcance da lei de anistia: o último passo. Texto fruto da palestra proferida durante o Seminário Internacional sobre Justiça Internacional Penal, promovido pelo Instituto de Relações Internacionais da USP, em São Paulo, em 13 de abril de 2010. p.5. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?Team={2AD759EF-DCFB-46EB-A16C-73502B9C09EF}>. Acesso em: 7 de outubro de 2010. 73 31 Daí, alinhando-se às lições de Santos e Filho, após o interregno de imposição política instaurado no Brasil e a consequente passagem para a construção de uma democracia que protegesse os direitos dos cidadãos, o povo brasileiro se sentiu incomodado com esse passado obscuro de manifestas violações aos direitos humanos, levantando-se, assim, questionamentos a respeito de quais medidas poderiam ser aplicadas ao caso brasileiro.76 O sentido de reparação é dos mais diversos, de acordo com o momento histórico e político de cada nação. Visualizando as formas de reparação dos países latino-americanos emergentes do regime ditatorial, averigua-se a aplicação de determinações desde o estabelecimento de reparações econômicas até a possibilidade de julgamento dos perseguidores políticos. No que tange ao processo de transição de justiça brasileira, estas medidas têm sido executadas pela Comissão de Anistia, órgão vinculado ao Ministério da Justiça, criado por meio de Projeto de Medida Provisória no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, o qual tem por competência promover reparações administrativas e/ou econômicas, a depender do caso, bem como determinar o julgamento daqueles que ainda não foram considerados anistiados políticos oficialmente pelo Estado brasileiro. Nesse sentido, a Lei nº 9.140/95 trazida no projeto de Medida Provisória teve por objeto o reconhecimento como mortas das pessoas desaparecidas em razão de participação ou acusação de participação em atividade política. O projeto de medida provisória foi convertido na Medida provisória nº 65/02 e, posteriormente, tornou-se na Lei nº 10.559/02, a qual passou a regular a condição de anistiado político. A partir disso, três dispositivos legais – Lei nº 6.683/79, 9.140/95 e 10.559/02 – tornaram-se de extrema relevância para o entendimento do ideal de anistia promovido pelo regime de exceção e suas posteriores modificações. Logo, se fazem oportunas as considerações elencadas por Santos e Filho: A Lei nº 9.140/95 marcou o reconhecimento pelo Estado brasileiro na sua responsabilidade histórica e administrativa ao admitir como mortas pessoas desaparecidas em razão da participação, ou acusação de participação, em atividades políticas, no período de 02 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979. No entanto, com relação à revelação da verdade, quase trinta anos após a Lei de Anistia (Lei nº 6.683, de 28 de agosto de 1979), ainda impera o silêncio e nega-se o acesso aos arquivos, mantendo-se o segredo quanto aos fatos relacionados à repressão política, muitas vezes até destruindo os documentos do período. Com efeito, o Estado brasileiro apenas priorizou o pagamento de reparações pecuniárias (Leis 9.140/95 e 10.559/02) às vítimas e a seus familiares e, por força do silêncio que impera sobre o SANTOS, Roberto Lima; FILHO, Vladimir Brega. Os reflexos da “judicialização” da repressão política no Brasil no seu engajamento com os postulados da justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.152-177, jan-jun. 2009. p.154. 76 32 assunto, grande parte da sociedade não consegue entender o porquê das vítimas estarem recebendo essa indenização, pois acham que nada aconteceu a elas. 77 A partir das ponderações afirmadas, conclui-se, que, o artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias constitui-se em ato de pleno reconhecimento estatal destinado à reparação daqueles que foram perseguidos por motivação de ordem política. Assim, é indubitável que a Constituição Federal ao recepcionar a Lei nº 6.683/79 tinha por objetivo proporcionar anistia e reparação a esta classe de cidadãos – insurgentes do regime político – tanto na vigência do regime de exceção, assim como sob a vigência da Magna Carta, que mesmo orientada pelos valores de proteção dos direitos humanos, não teve por condão a interpretação da Suprema Corte, a qual entendeu que referida anistia também alcança os perseguidores políticos. (grifo nosso) Além disso, Paulo Abrão e Marcelo Torelly salientam que o artigo 8º do ADCT “ao recepcionar e promover a compreensão democrática da lei de anistia de 1979 rejeita frontalmente a pretensão da existência de uma anistia bilateral e recíproca, que abrangeria inclusive crimes que o próprio regime negava à época.” 78Posto isso, convém consignar que a intenção do legislador ordinário encontra-se consubstanciada no texto legal e independente de qualquer rumor que pretendia a ordem política à época, não se mostrando pertinente o alvitramento de um “acordo político” à luz da Lei de Anistia. Portanto, nefasta foi a decisão do STF, uma vez que a suprema corte primando pela defesa dos direitos do homem restringiu a prisão do depositário infiel, fazendo uso, inclusive, do Pacto de San José da Costa Rica para fundamentar sua decisão, elevando, assim, esse tipo de norma aos status de norma supra-legal, enquanto essas normas não forem ratificadas pelo quorum qualificado. Portanto, é plenamente visível que o Brasil sempre se posicionou pela defesa dos direitos humanos no cenário internacional e controversa seria a mudança de seu posicionamento ao compactuar com a prática de atos de tortura ou desaparecimento forçado. Ainda nesse contexto, o dispositivo constitucional transitório possibilita o direito de resistência aos atos cometidos pelo Estado contra o seu povo, como sustentado por Abrão e Torelly. Portanto, aqueles que se insurgiram contra o regime político ditatorial, na palavra dos autores, estavam “exercendo legítimo direito de resistência a uma ordem ilegítima. Assim, SANTOS, Roberto Lima; FILHO, Vladimir Brega. Os reflexos da “judicialização” da repressão política no Brasil no seu engajamento com os postulados da justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.152-177, jan-jun. 2009. p.160-161. 78 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de Transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p.45. 77 33 antes de serem vítimas, portanto, são resistentes,” vez que lutaram pela consolidação de um Estado democrático de Direito que garantisse a estabilidade dos direitos fundamentais.79 Por todo o exposto, as palavras dos professores Paulo Abrão e Marcelo D. Torelly são fundamentais para compreensão do artigo 8º do ADCT, visto que “a filtragem constitucional das leis anteriores à sua constituição impõe que a nova Constituição não pode ser lida com os olhos do ambiente político do velho regime”. 80 Assim, o preceito normativo (Lei de Anistia) legitima o reconhecimento estatal dos atos cometidos por seus agentes e a necessidade manifesta de tratamento de transição da ordem democrática, a qual enseja a aplicação de medidas que visem o enfrentamento dos atos de tortura e desaparecimento forçado e a construção de um legado capaz de solidificar a democracia e construir uma sociedade que reprima a violência e rejeite a impunidade como elemento integrante de seu sistema. 1.5 A IMPORTÂNCIA DA JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO PARA A RECONCILIAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DA DEMOCRACIA Como cediço, a Constituição Federal de 1988 teve por bem institucionalizar a concretização do Estado Democrático de Direito que visa não apenas pela proteção dos direitos fundamentais, mas também, pela defesa das liberdade públicas, as quais requerem, por vezes, um dever de abstenção estatal. Noutro norte, esse mesmo Estado democrático de direito busca a efetivação dos direitos sociais de forma a subsidiar a manutenção daquilo que constitua o mínimo necessário à sobrevivência de cada cidadão brasileiro. A partir desses conceitos, a justiça de transição apresenta-se como instrumento de mediação entre a ordem política vigente no Brasil no período de 1964 a 1985 e a consequente instituição da ordem democrática, por intermédio da Magna Carta de 1988. A justiça de transição como claramente discorrida no decorrer deste estudo possui como finalidade o enfrentamento das violações perpetradas pelos agentes estatais em decorrência do regime político instaurado no Brasil. ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de Transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p.46. 80 Ibid., p.45. 79 34 Assim, quando se trata da importância da justiça de transição, insta destacar que não há uma fórmula pré-determinada, mas, levando-se em consideração as diversas experiências de países como Portugal, Alemanha, Espanha, Moçambique, Argentina, Peru, Chile, Guatemala e outros, percebe-se que a justiça de transição é elemento imprescindível para solidificação das bases do Estado Democrático de Direito, uma vez que, a partir da implementação da justiça de transição, valores e obrigações serão construídos com vistas à valorização dos direitos humanos e fundamentais e à edificação de um Estado que esteja compromissado com a probidade e boa-fé das instituições democráticas. Portanto, a justiça de transição afigura-se de forma relevante como medida apta a enfrentar os déficits sociais, reflexos das ações arbitrárias praticadas pelo Estado brasileiro. Nesse particular, em vistas de se compreender a profundidade e dimensão das vicissitudes proporcionadas por esse instrumento de transição, apresentam-se adequadas as palavras da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça: A Justiça Transicional é um ramo altamente complexo de estudo, que reúne profissionais das mais variadas áreas, passando pelo Direito, Ciência Política, Sociologia e História, entre outras, com vistas a verificar quais processos de Justiça foram levados a cabo pelo conjunto dos poderes dos Estados nacionais, pela sociedade civil e por organismos internacionais para que, após o Estado de Exceção, a normalidade democrática pudesse se consolidar. Mais importante, porém, é a dimensão prospectiva desses estudos, cuja aplicação em política públicas de educação e justiça serve para trabalhar socialmente os valores democráticos, com vistas à incorporação pedagógica da experiência de rompimento da ordem constitucional legítima de forma positiva na cultura nacional, transformando o sofrimento do período autoritário em um aprendizado para a não-repetição.81 A implantação dos mecanismos de justiça de transição nos diversos países tem como fator marcante sua variabilidade de caso a caso, pois o estabelecimento de determinadas medidas irá depender especificamente do contexto ditatorial vigente nas diferentes realidades. Por exemplo, os regimes de exceção vigentes em alguns países da Europa e/ou América Latina diferenciam-se em larga escala ou, por vezes, possuem semelhanças, pois essas variações encontram-se ligadas às ações operacionais e políticas executadas por cada governo. O caso brasileiro possui uma especificidade elementar, pois depara-se com um povo que não é omisso em reivindicar medidas de reparação, no entanto, também, não detém uma parte da população que seja envolvida e possua uma cultura de efetivação dos direitos fundamentais. A professora Alexandra Barahona de Brito retrata as peculiaridades de tal abordagem: ABRÃO, Paulo; ALVARENGA, Roberta Vieira; BELLATO, Suelli Aparecida; TORELLY, Marcelo D.Justiça de Transição no Brasil: O papel da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.12-21, jan-jun., 2009. p.12. 81 35 Se, por outro lado, se tenha herdado do período autoritário uma sociedade civil fraca ou apática ou, se além de um imediato desejo de “vingança”, a sociedade seja indiferente à questão da verdade e justiça, pode não haver qualquer política de responsabilização, como foi o caso na transição na Espanha, ou a questão da verdade e da justiça transicional pode se tornar uma arma na luta de poder entre grupos ou partidos, como no caso de Portugal e em alguns países da Europa do leste. 82 Logo, o estudo dos legados construídos pela ditadura é de fundamental importância para se delimitar a esfera de propagação das medidas a serem implantadas e o nível de reformas institucionais e políticas a serem estruturadas. O problema desse estudo localiza-se justamente nas estruturas construídas no período ditatorial e que vigem sob a ordem democrática. Os reflexos das ações estatais de impunidade constituem as marcas de uma sociedade que não se submeteu às formas de tratamento ou restauração de suas estruturas. A professora Alexandra Barahona de Brito coloca a questão de forma muito clara, salientando que “a persistência de „enclaves autoritários‟ pode se tornar um obstáculo para a busca da verdade e da justiça, especialmente quando localizados no poder judicial.” 83(grifo nosso) A consideração da respectiva professora retrata tão somente o cerne da problemática deste estudo, uma vez que as instituições brasileiras, sejam elas institucionais ou jurídicas, estão permeadas em sua composição, por agentes estatais, remanescentes do período militar. Portanto, a justiça de transição, quanto aos legados da ditadura, revela-se indispensável para a consolidação da ordem democrática brasileira. Veja-se: A duração e a penetração institucional de um regime autoritário também devem ser levadas em conta. Nenhuma ditadura pode se sustentar por um longo período de tempo sem ganhar alguma forma de apoio popular e algum nível de institucionalização. Quanto mais durável e bem sucedida é a ordem autoritária, mais ela permeará a burocracia do Estado e o sistema judicial, socializando uma classe de funcionários públicos nos valores da ditadura, e criando novas elites favorecidas pelas políticas do regime. Quanto mais prolongada e institucionalizada uma ditadura for, mais difícil será estigmatizar os grupos sociais e as instituições que participaram da ordem antiga. Uma ditadura durável e bem institucionalizada normalmente apresenta um nível maior de legitimidade residual, havendo mais pessoas que se identificam com a ideologia e a justificação ideológica do regime e da repressão. [...] Na falta de saneamentos profundos, as políticas de justiça transicional terão que ser implementadas por funcionários públicos da ‘velha ordem,’ e estes podem muito bem resistir a essas políticas, porque estas podem por em causa suas ações no passado e várias práticas sociais entrincheiradas.(grifo nosso)84 Segundo Brito as diversas experiências de enfrentamento das ditaduras materializadas no mundo permitiram identificar os problemas sociais propalados em cada região. Tal BRITO, Alexandra Barahona de. Justiça transicional e a Política da memória: uma visão global. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.56-83, jan.-jun., 2009. p 66. 83 Ibid., p.67. 84 BRITO, Alexandra Barahona de. Justiça transicional e a Política da memória: uma visão global. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.56-83, jan.-jun., 2009. p 67. 82 36 identificação ressalta a importância da justiça transicional, pois as diferentes experiências auxiliam na importação de políticas ou medidas que se adéqüem à realidade de cada nação. A experiência sul-americana verifica a presença de impunidade e de estabilidade democrática como demandas a serem tratadas; na África, essas questões são resultados de sociedades divididas etnicamente e com estados fracos; e no Leste Europeu os problemas situaram-se nas violações do devido processo legal e do uso abusivo da “justiça transicional”.85 Desta feita, a análise das medidas que sejam, deveras, necessárias à reparação das ações violadoras dos direitos humanos é determinante para orientar a execução dos órgãos governamentais, uma vez que as diferentes realidades em que o autoritarismo vigeu, como acima demonstrado, requerem a atuação do Estado de maneira diversificada e de acordo com o contexto em que os atos estatais foram direcionados no impacto da dignidade do ser humano. Assim, é perfeitamente possível a identificação de medidas que estejam sendo implementadas em determinado país e em outros países as medidas estarem sendo direcionadas para uma realidade diferenciada. Paul Van Zyl acredita que “a justiça transicional implica em processar os perpetradores, revelar a verdade sobre crimes passados, conceder reparações às vítimas, reformar as instituições perpetradoras de abuso e promover a reconciliação.” 86 Assim, as estratégias de justiça transicional são de fundamental importância para confrontação de um passado histórico marcado por violações dos direitos humanos. A adoção dessas medidas visa ao fortalecimento do Estado democrático de direito e à consolidação da democracia, instrumento de transformação política essencial para tratamento dos resquícios ditatoriais presentes na sociedade e nas instituições democráticas. Portanto, a persecução penal dos agentes estatais precisa ser compreendida como alternativa de reparação e como forma de demonstrar que o próprio Estado encontra-se sob o crivo da Lei. Segundo Zyl, o julgamento dos perseguidores políticos não pode ser entendido como uma medida de retribuição, mas, sim como forma de restaurar a relação de confiança entre o Estado de Direito e os cidadãos, enfatizando, sobretudo, que a existência das instituições democráticas tem por finalidade a proteção de seus cidadãos.87 Convém consignar que os mecanismos de justiça de transição não são auto-aplicáveis em todos os países, pois o contexto político e social de cada país exigirá a aplicação de formas BRITO, Alexandra Barahona de. Justiça transicional e a Política da memória: uma visão global. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.56-83, jan.-jun., 2009.p.58. 86 ZYL, Paul Van. Promovendo a justiça transicional em sociedades pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.32-55, jan.-jun., 2009. p 34. 87 Ibid., p.35. 85 37 diferenciadas de saneamento das arbitrariedades estatais praticadas. Isso posto, as alternativas de reparação selecionadas por Paul Van Zyl constituem meios básicos de atribuir às vítimas e à sociedade uma resposta pelos atos efetuados no regime de exceção brasileiro. Seguindo a linha de raciocínio de Paul Van Zyl a respeito das medidas indispensáveis à solidificação da ordem democrática, outro elemento relevante é o esclarecimento da verdade. O Estado precisa assumir a responsabilidade das ações praticadas: É importante não somente dar amplo conhecimento ao fato de que ocorreram violações dos direitos humanos, mas também que os governos, os cidadãos e os perpetradores reconheçam a injustiça de tais abusos. O estabelecimento de uma verdade oficial sobre um passado brutal pode ajudar a sensibilizar as futuras gerações contra o revisionismo e dar poder aos cidadãos para que reconheçam e oponham resistência a um retorno às práticas abusivas.88 Além disso, a dimensão dos sentidos de reparação precisa ser ampliada em conformidade com as demandas existentes nos diversos contextos. A transição brasileira reconheceu a necessidade da reparação econômica. De outro lado, a Comissão de Anistia, órgão responsável em promover essas providências, acredita que outras obrigações – moral, histórica, jurídica, assistência psicológica, pedagógica e outros – decorrentes dessa relação são cabíveis na recuperação das vítimas do autoritarismo estatal e na reforma das instituições governamentais que tem por dever a proteção de seus indivíduos. Kathryn Sikkink & Carrie Booth Walling anotam que “deve-se dar mais atenção as mudanças dos mecanismos com a passagem do tempo. Enquanto algumas medidas eram consideradas impossíveis em muitos países imediatamente após as transições, essas medidas tornaram-se não apenas possíveis, mas prováveis.” 89 Desse modo, não se pode dar azo a cultura do esquecimento, como o governo brasileiro procurou estabelecer no período de transição. É certo que as memórias dos porões da ditadura é uma lembrança rejeitada por diversos atores, mormente, aqueles que foram submetidos à tortura, exílio ou desaparecimento forçado. Contudo, o respeito aos direitos fundamentais e às liberdades públicas são conceitos que devem ser primados pelo Estado Democrático brasileiro e perseguido por cada cidadão brasileiro com vistas à consolidação das estruturas democráticas. Por derradeiro, ressalte-se o direito à reconciliação, pois ao analisar o período ditatorial brasileiro é possível visualizar a frontal violação aos direitos fundamentais humanos ZYL, Paul Van. Promovendo a justiça transicional em sociedades pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.32-55, jan.-jun., 2009. p.35. 89 Sou responsável por esta tradução. SIKKIN, Kathryn; WALLING, Carrie Booth. The impact of Human Rights Trials in Latin America. Disponível em:<htt://jpr.sagepub.com/content/44/4/427>. Acesso em: 11 de outubro de 2011. 88 38 pelo qual o Estado brasileiro comprometeu-se a proteger. Destarte, é inconcebível que após 30 anos da passagem do regime de exceção brasileiro, a Suprema Corte Brasileira desenvolva uma interpretação de maneira exacerbadamente retrógada, quando os tratados e organismos internacionais posicionam-se em favor da proteção dos direitos humanos e pelo fortalecimento do Estado de Direito. Nesse sentido, é manifesto o retrocesso jurídico frente aos clamores de reparação do Estado brasileiro. É sabido e consabido que o julgamento dos perseguidores políticos não terá caráter de restituição às famílias brasileiras. Porém, é preciso resguardar a validade do ordenamento jurídico e velar pela segurança jurídica da sociedade. A reconciliação é um dos fatores de maior amplitude do sistema de reparação, pois tem como escopo o retorno ao passado para construção do futuro. A geração nascida dos anos 80 e 90 são gerações alienadas no sentido de desconhecerem a história de seu país, pois foi fruto da própria política estatal não cuidar da transição democrática. No entanto, Paul Van Zyl observa com precisa clareza e sapiência: Em geral, o fortalecimento das obrigações legais internacionais e o crescente consenso normativo segundo o qual as violações graves dos direitos humanos devem se resolver têm feito com que não se dê ênfase à questão de confrontar ou não o passado, mas sim sobre como confrontá-lo. Isso cria possibilidades extraordinárias para examinar a intersecção entre a justiça transicional e a construção da paz pósconflito em uma série de contextos diferentes, assim como para estabelecer boas práticas com base em uma análise comparativa de políticas. Esse processo não pode limitar-se a transplantar um modelo bem sucedido de um entorno a outro, mas deve explorar os fatores que fizeram com que o modelo funcionasse e verificar se eles se aplicam em outras situações.90 Face o exposto, a justiça de transição, inobstante todos os empecilhos e a limitada vontade política para o cuidado com a lacuna da concretização democrática, representa o horizonte a ser investido de estudos e projetos políticos voltados não somente às vítimas da ditadura, mas também, à construção de uma nação que tenha por fundamento o respeito aos direitos humanos e a proteção à vida e à liberdade de seus compatriotas. Por conseguinte, a sedimentação deste instrumento é vital para reconciliação e consolidação da democracia. ZYL, Paul Van. Promovendo a justiça transicional em sociedades pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.32-55, jan.-jun., 2009. p 54. 90 39 2. OS DIREITOS DA TRANSIÇÃO Quando se depara com a matéria das medidas ou alternativas de reparação no contexto da justiça transicional, é importante observar que tais estratégias variam de acordo com os meios de repressão que foram impostos à época do regime ditatorial. O professor Dr. Paulo Abrão, em entrevista sobre a anistia política, no programa Fórum, transmitido na TV Justiça, no dia 12 de outubro de 2011,91 salientou que, de acordo com a topologia autoritária – ações de partidos políticos de esquerda ou de direita –, identificada em cada zona territorial, diferentes estratégias serão implementadas para se adequar àquela realidade social. Destacou, ainda, que as medidas de justiça transicional adotadas no Brasil são de natureza peculiar, visto que as ações de arbitrariedade concentraram-se em atos de tortura, desaparecimento forçado e, principalmente, limitando a capacidade laboral daqueles que se insurgiram contra o regime político, colocando o nome dessas pessoas em listas, de forma que não pudessem ser novamente inseridos no mercado de trabalho. Além disso, destacou que o programa de reparações brasileiro fundamenta-se na reparação econômica dos servidores públicos que foram exonerados de ofício, sejam estes empregados ou servidores públicos. Asseverou, também, que muitos dos militares que não aquiesciam com a doutrina nacional de segurança também se utilizam dos serviços prestados pela Comissão de Anistia para pleitear indenizações e reintegrações aos cargos anteriormente ocupados. Nesse sentido, relatou que, no caso brasileiro, outras medidas também são implementadas no sentido de resguardar a memória dos atos cometidos, para que não mais sejam cometidos, e daqueles que combateram o autoritarismo, como maneira de honrar essas pessoas que doaram as próprias vidas pela implantação do Estado de Direito e pelo exercício livre da cidadania e da democracia. TV JUSTIÇA. Programa Fórum. Anistia Política. Disponível em: Parte 1:<http://www.youtube.com/watch?v=oBJVOA_B5s0&feature=results_video&playnext=1&list=PL9C5D7 465FCD58C04>; Parte 2: <http://www.youtube.com/watch?v=M3MiY6edBaA&feature=BFa&list=PL9C5D7465FCD58C04&lf=resul ts_video>; Parte 3: <http://www.youtube.com/watch?v=aBKTUtdPI6I&feature=BFa&list=PL9C5D7465FCD58C04&lf=results _video>; Parte 4: <http://www.youtube.com/watch?v=zBCqkbI5SfI&feature=BFa&list=PL9C5D7465FCD58C04&lf=results_ video>. Acesso em 13 de outubro de 2011. 91 40 Ponderou que a peculiaridade do sistema de transição brasileiro é de tamanha força que as medidas implantadas no Brasil têm sido instrumentos de orientação na construção dos países do norte da África. Asseverou nesse pensar que nada impede a adoção de outras medidas que não aquelas aqui utilizadas, pois, como dito, as ações autoritárias variam de acordo com o regime político instaurado em cada país. Citou, como exemplo, os casos emblemáticos da Argentina e do Chile em que o número de pessoas mortas foi elevadíssimo, sendo utilizado como medidas de reparação até mesmo o julgamento dos algozes políticos. Nessa ótica, evidenciou que, em conformidade com os tratados internacionais que o Brasil é signatário, que os crimes de tortura e desparecimento forçado são imprescritíveis, não havendo, portanto, prazo determinado para apuração das violações perpetradas, assim como para concessão dos meios de reparação. Informou que para apuração desses atos cometidos e consulta dos documentos dos quais o Ministério da Justiça tem acesso, que o programa de reparação ou de ação depende do trabalho de duas comissões, atualmente existentes: a Comissão de Anistia e a Comissão Especial para Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMP). Informou, ademais, que encontra-se em trâmite no Congresso Nacional a criação da Comissão da Verdade, a qual terá poder de investigação e de requisitar servidores e testemunhas para elucidação de fatos ocorridos no regime de exceção. Não obstante, as últimas declarações de determinados setores governamentais, cite-se, o posicionamento92 do Senado Federal, proferido por seu Presidente José Sarney, quanto à impossibilidade de cumprimento da sentença prolatada pela Corte Interamericana dos Direitos Humanos em desfavor do Estado Brasileiro, invocando como fundamentos jurídicos, primeiramente, que o crime de seqüestro e desaparecimento forçado é crime continuado e permanente, logo houve a perda do bem jurídico tutelado, vez que as vítimas seqüestradas foram mortas e, ademais, o crime de desaparecimento forçado é um tipo penal que carece de reserva legal no ordenamento jurídico brasileiro. Diante do exposto e face à problemática da institucionalização da impunidade da Suprema Corte Brasileira, a partir da concessão de anistia aos perseguidores políticos, acredita-se, inicialmente, que, o objetivo desse estudo não é de desvelar uma solução por meio do julgamento daqueles que praticaram as atrocidades em nome do Estado brasileiro, vez que em conformidade com Pierpaolo et. al, “não se acredita que a incidência do direito penal terá o condão de reparar o sofrimento das vítimas, seus familiares, amigos, e de toda a 92 Correio Braziliense de 15/10/2011. 41 comunidade que acompanhou tais atrocidades.” 93 Mas, sim, analisar o caráter dessas condutas praticadas e a interpretação desprendida pela Suprema Corte acerca do alcance da Lei de Anistia aos perseguidores políticos, uma vez que a política jurídica internacional brasileira sempre se posicionou a favor da defesa dos direitos humanos. A partir das considerações acima elencadas, o estudo desta pesquisa delimitou quatro formas de reparação para análise, as quais são as comumente executadas no Brasil, efetuando, por vezes, comparações com sistemas executados em outros países na América Latina, uma vez que os estudos de justiça transicional brasileiro têm servido de parâmetro para os demais países do mundo. 2.1 DIREITO À REPARAÇÃO As medidas de reparação que gravitam em torno da justiça de transição são diversificadas, de acordo com o contexto político impetrado naquele país ou região e em observação às práticas de repressão praticadas contra os seus concidadãos. Benedetti e Nahoum lecionam que “as particularidades de cada país podem influenciar a extensão das medidas de justiça transicional aplicadas, explicando a preferência pelo foco a determinada dimensões em detrimento de outras.” 94 Remígio relata que a promulgação de uma Constituição democrática não pode representar a total extração das raízes ditatoriais, pois o exercício da democracia pela sociedade é uma prerrogativa inerente à estruturação do Estado, tornando-se imperiosa sua participação popular na construção desse novo processo político.95 A professora Roberta Camineiro Baggio afirma que os dispositivos normativos nº 9.140/95, 10.536/02 e 10.559/02 representam uma evolução no processo de transição político brasileiro 96 , não obstante, o caso brasileiro, nas palavras do professores Paulo Abrão e BOTTINI, Pierpaolo Cruz; TAMASAUSKAS, Igor; CAMARGO BARROS VIDAL, Luis Fernando de; FELIPPE, Kenarik Boujikian; MARTINS DE MORAIS, Dora Aparecida. Lei da Anistia: com a palavra, O STF. In: Instituto Brasileiro de Ciência Criminais, São Paulo , ano 17, nº 205, dez., 2009. p.4. 94 BENEDETTI, Juliana Cardoso; NAHOUM, André Vereta. Justiça de transição e integração regional: o direito à memória e à verdade no Mercosul. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.296-317, 2009. p.301. 95 REMÍGIO, Rodrigo Ferraz de Castro. Democracia e anistia política: rompendo com a cultura do silêncio, possibilitando uma justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, jan.-jun., p. 178-202, 2009. p.187. 96 BAGGIO, Roberta Camineiro. Justiça de Transição como Reconhecimento: limites e possibilidades do proceso brasileiro. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre 93 42 Marcelo Torelly, inequivocamente estar situado em um “nível tardio de desenvolvimento de políticas de reparação, se comparado com outros países da América Latina, Grécia, Alemanha ou, até mesmo, o mais recente caso da Lei Espanhola, a qual editou em 2007 uma lei para tratar dos crimes da Guerra Civil e do regime franquista.” 97 Nesse sentido, Baggio observa que a noção de reparação imbuída na sociedade brasileira possui um significado distorcido, pois ao reconhecer o direito de reparação aos mortos e desaparecidos políticos e dos perseguidos políticos foi instalado um entendimento de esquecimento, tendo em vista que o pagamento de quantia pecuniária não mais ensejaria a necessidade de tocar nas feridas do passado, vez que o referido pagamento já teria sido implementado, operando, portanto, a devida reparação/ restituição ou restauração.98 Remígio reitera que “a anistia política tratada pela Lei nº 6.683/79 representou um acordo político de esquecimento, à semelhança do pacto de paz celebrado entre Esparta e Atenas em 403 a.C. Ela foi, assim, uma forma de esquecimento, e não propriamente de perdão.” 99 Corroborando desse ideal manifesta-se Baggio discursando que “a transição brasileira, portanto, buscou inicialmente o padrão do esquecimento”, de tal maneira que as práticas autoritárias efetuadas no passado estariam perdoadas.100 Com efeito, Baggio assevera que a consequência imediata dessa característica é a manutenção de uma situação de reificação dos partícipes da resistência, ou ainda, de amnésia do reconhecimento da importância do papel dos perseguidos políticos na história e o consequente enfraquecimento da defesa dos direitos humanos.101 Malgrado a ideologia configurada na Lei 6.683/79, a Carta Federal de 1988 trouxe no artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias uma nova técnica legislativa, passando a produzir novo efeito jurídico de reparação, pois não reforça o esquecimento, mas, sim, em um ato de reconhecimento de que o Estado violou os direitos de seus cidadãos. Nessa perspectiva desenvolvida por Remígio, averigua-se a possibilidade de ser reparado Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 260-286, 2010. p.272. 97 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de Transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p. 40. 98 BAGGIO, Roberta Camineiro. Justiça de Transição como Reconhecimento: limites e possibilidades do proceso brasileiro. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 260-286, 2010. p.272. 99 REMÍGIO, Rodrigo Ferraz de Castro. Democracia e anistia política: rompendo com a cultura do silêncio, possibilitando uma justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, jan.-jun., p. 178-202, 2009. p.188. 100 BAGGIO, op. cit., p. 274. 101 Ibid., p.272. 43 economicamente tanto pelos atos arbitrários pelo Estado, bem como pelos atos de desaparecimento forçado.102 André Marcos Tavares e Walber de Moura Agra destacam que a Lei nº 10.559/2002 foi responsável por regularizar as indenizações para os brasileiros que sofreram alguma forma de perseguição política. Os autores salientam que “o objetivo explícito dessa lei foi providenciar uma reparação econômica aos atingidos pelo arbítrio, sem que houvesse possibilidade de punição ou qualquer outro tipo de sanção penal ou de natureza cível.” 103 Ratificando referido raciocínio, Baggio aduz que A lei 10.559/02, que institui a reparação aos atingidos por atos de exceção, tem uma forte presença de características distributivas, uma vez que indeniza aqueles que, por terem sido vítimas de atos autoritários do Estado, não puderam manter o curso normal de suas vidas, tendo sido prejudicados nos seu desenvolvimento profissional e pessoal, consequentemente excluídos do acesso aos bens materiais e sociais produzidos à época.104 A partir dessas considerações, Baggio desenvolve um pensamento crítico no sentido de que a concessão da medida de reparação pecuniária tornou-se um meio de “amnésia do esquecimento”, porquanto o pagamento das indenizações aos perseguidos políticos transformou-se em instrumento de depreciação.105 Paulo Abrão e Marcelo Torelly ressaltam que “apenas uma hermenêutica rasa pode limitar a reparação promovida pela lei 10.559/2002, por meio da Comissão de Anistia, a um simples processo de reparação econômica.” 106 Contudo, a lição de Baggio ao discorrer sobre o efeito de amnésia oportunizado por meio da concessão pecuniária alinha-se aos ideais de valorização da justiça de transição e ao mesmo tempo contrapondo-se à falsa transição democrática pactuada pelos organismos governamentais: Diante desse quadro, torna-se extremamente difícil vislumbrar a retomada de um processo de reconciliação que impulsione a integração social no Brasil. A ausência de estratégias de integração aos moldes do debate do reconhecimento enfraquece a busca por uma justiça de transição completa. Isto porque a redução do debate a uma perspectiva meramente economicista sobre as indenizações e a difusão a partir de um viés negativo da condição de vitimização dos perseguidos políticos, unidos à REMÍGIO, Rodrigo Ferraz de Castro. Democracia e anistia política: rompendo com a cultura do silêncio, possibilitando uma justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, jan.-jun., p. 178-202, 2009. p.189. 103 TAVARES, André Ramos; AGRA, Walber de Moura. Justiça reparadora no Brasil. In: Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.69-91, 2009. p.86. 104 BAGGIO, Roberta Camineiro. Justiça de Transição como Reconhecimento: limites e possibilidades do proceso brasileiro. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 260-286, 2010. p.275. 105 Ibid., p.276. 106 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de Transição no Brasi: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p.44. 102 44 ausência de um aprofundamento democrático de algumas instituições do Estado e outros tantos segmentos da sociedade, como a imprensa, acabaram por reproduzir um senso comum depreciativo sobre os perseguidos políticos, que impede o país de crescer como uma nação livre, justa e fraterna, que protege incondicionalmente os direitos de seus cidadãos.107 (grifo nosso) Sintetizando a importância do direito à reparação e seus desdobramentos negativos, por força de que não houve uma transição política efetiva em decorrência da permanência no poder daqueles que serviam ao regime ditatorial, Baggio desenvolve a seguinte conclusão: A redução a uma dimensão pecuniária da reparação não permitiu que o ato de indenizar os perseguidos políticos fosse concebido como uma iniciativa de integração social, como uma oportunidade dessas pessoas poderem reconstruir suas vidas, sem a necessidade de lamentarem suas escolhas políticas, já que uma sociedade justa possui lugar para todas as opções de vida, crença e pensamento. 108 Assim, as problemáticas existentes em torno do direito à reparação, principalmente, após as considerações efetuadas pela professora Roberta Baggio, é capaz de demonstrar que a justiça de transição teve sua gênese materializada, no entanto, encontra obstáculos, de ordem política governamental, os quais inviabilizam o aperfeiçoamento e a promoção de novas políticas que ensejem na solidificação do Estado Democrático de direito. Destarte, a fim de aprimorar a dimensão do conceito de reparação, faz-se necessária a observação da dimensão da reparação no plano material e moral desenvolvida pelos professores Paulo Abrão e Marcelo Torelly. Abrão e Torelly consignam que, em uma leitura economicista, a anistia não pode – para fazer sentido como ato de um Estado fundado nos valores em que se funda o Estado brasileiro – ser vista como a imposição da amnésia ou como ato de esquecimento, ou de suposto e ilógico perdão do Estado a quem ele mesmo perseguiu e estigmatizou como subversivo ou criminoso.109 De outro lado, os autores sustentam que o direito à reparação econômica decorre de uma violação do desempenho da atividade laboral primeiramente. Partindo desse pressuposto, o direito à reparação moral tem por fundamento “no direito de resistência e na violação da dignidade humana ofendida que, por sua vez, teve BAGGIO, Roberta Camineiro. Justiça de Transição como Reconhecimento: limites e possibilidades do proceso brasileiro. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 260-286, 2010. p.277. 108 BAGGIO, Roberta Camineiro. Justiça de Transição como Reconhecimento: limites e possibilidades do proceso brasileiro. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 260-286, 2010. p.276. 109 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p.46. 107 45 extirpado o direito de manifestação do pensamento político,” 110 divergente daquele que imperava à época, impedindo-o, portanto, de partilhar seus pensamentos políticos e de expressar-se enquanto cidadão detentor no gozo das liberdades públicas e dos direitos fundamentais. Logo, o direito à reparação não pode limitar-se a concessão de indenização pecuniária, nem tampouco propiciar senso de depreciação em relação àqueles que fizeram força para o império do poder democrático, posto que o Estado soberano tem por obrigação inerente à sua própria instituição a proteção de seus cidadãos. Por essas razões, que o estabelecimento do direito à reparação deve primar em reparar não apenas o dano de direito comum, mas sim dignidade violada seja pelo projeto de vida interrompido seja pela violação contra a humanidade que o regime autoritário tantas vezes perpetrou no corpo de alguns dos perseguidos individualmente.111 Aprimorando esse sentido de reparação moral, há dois mecanismos que compõem esse sistema, tal qual, as Caravanas da Anistia que, como instrumento de reparação individual com efeitos coletivos, tem por objetivo resgatar a dignidade das vítimas, trazendo à memória as violações do passado, permitindo-lhe o direito do exercício de manifestação. Ao lado das Caravanas da Anistia, há também o Memorial da Anistia que, apresentando-se como instrumento de reparação coletiva de efeitos individuais, tem por escopo retomar as vivências estabelecidas pela amnésia do esquecimento, restaurando o significado original da anistia que foi deteriorado pelos resquícios remanescentes do poder estatal. Por derradeiro, o direito à reparação direciona suas ações à reparação econômica, mas, sobretudo, envidando esforços para que os “perseguidos políticos voltem a se sentirem plenamente reintegrados ao país que lhes deu as costas, tendo sua identidade recomposta.”112(grifo nosso) ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p.49. 111 Ibid., p.49. 112 Ibid., p.55. 110 46 2.2 DIREITO À VERDADE Trazer um tempo vivido intensa e ativamente, de forma um tanto frenética, pois tudo nos parecia urgente de ser realizado, sem cair em espécie de saudosismo conservador, é um desafio. Desafio que aceitamos ao tentar trazer alguns fragmentos de uma história que será não somente minha, mas de uma geração que generosamente sonhou, ousou, correu riscos e, como a peste, foi marcada, massacrada e exterminada: uma geração que, apaixonadamente, nos anos 60 e 70, caracterizou-se não pela “mesmice”, pelo instituído, pelo conformismo, mas, ao contrário, pela denúncia, pela desmitificação, pela criação de novos espaços. 113 A finalidade da subseção deste estudo não é de relatar os fatos históricos marcados em uma geração que sacrificou a própria vida pela instalação da democracia no Brasil. É sabido que muitas pessoas foram presas ilegalmente, torturadas por agentes do Estado e outras encontram-se desaparecidas até o dia de hoje. Assim, a importância desta subseção é ressaltar que o exercício das liberdades públicas e dos direitos fundamentais foi assegurado por um período de luta o qual resultou na conquista dos direitos que atualmente são gozados pela sociedade brasileira. E, por conseguinte, a elucidação desses fatos constitui direito fundamental de toda comunidade brasileira como guia na construção da identidade política da nação. José Adércio Leite Sampaio e Alex Luciano Valadares de Almeida ensinam que a melhor forma de construção da identidade de determinada sociedade é garantindo o conhecimento da verdade, a respeito de seu processo histórico de formação, aos presentes e futuros descendentes, prezando pela autonomia privada – leia-se direitos individuais clássicos – em conformidade com a autonomia pública – leia-se manifestação dos anseios do povo.114 Desvelar a verdade é ato de demonstração democrática, pois permite a interação das diversidades filosóficas e políticas dos diferentes grupos sociais em busca da edificação de uma sociedade em comunhão. Portanto, o respeito à livre formação dessas identidades, individual e coletiva, é capaz de agregar os indivíduos em torno do respeito aos diferentes projetos de vida de cada cidadão, respeitando-se a pluralidade da sociedade, para então viabilizar, no reconhecimento da diferença do outro, a construção de um projeto de sociedade que envolva a participação de todos os cidadãos. Garantir o conhecimento da verdade é fomentar o desenvolvimento da democracia e reforçar o princípio republicano.115 (grifo nosso) COIMBRA, Cecília; QUEIROZ, Leoncio de; JAPA, Mario; OSAVA, Chizuo; MAESTRI, Mario. Panorama Histórico. In: 68 a geração que queria mudar o mundo: relatos, Brasília, p.38-63, 2011. p.39. 114 SAMPAIO, José Adércio Leite; ALMEIDA, Alex Luciano Valadares de. Verdade e história: por um direito fundamental à verdade. In: Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.249-267, 2009. p.251. 115 Ibid., p.251. 113 47 Além disso, a verdade constitui, por imperativo lógico, resultado da existência do Estado constitucional e republicano, nas palavras de Sampaio e Almeida. Segundo os autores, “o direito à verdade se articula ao direito à informação notadamente em face do poder público. Logo, o direito fundamental à verdade decorre do regime constitucional democrático e dos princípios constitucionais”, não suportando a inviabilização de informações que digam respeito ao interesse social. 116 Tal desdobramento é perfeitamente visível, na visão de Barbosa, ao lecionar que a opção política em favor dos princípios republicanos e democráticos devem nortear a conduta do poder público da República Federativa do Brasil, o que supõe um compromisso incondicional com a verdade, em virtude de o direito à verdade decorrer do princípio fundamental e constitucional da dignidade da pessoa humana.117 Segundo o Ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República e o Presidente da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, Marco Antônio Rodrigues Barbosa e Paulo Vannuchi, “a democracia, para que efetivamente se consolide necessita, portanto, que os povos conheçam toda a verdade sobre o seu passado, como forma de aprendizado para modificar o presente e gerar um futuro de paz.” 118 Glenda Mezarobba afirma que conhecer a verdade a respeito de crimes do passado perpetrados pelo Estado contra os seus cidadãos “é um direito inalienável” 119 , ou seja, segundo Diane Orentlicher120, “cada povo tem o direito inalienável de conhecer a verdade a respeito dos acontecimentos ocorridos no passado com relação a perpetração de crimes abomináveis e das circunstâncias e os motivos que levaram, mediante violações maciças ou sistemáticas, à perpetração desses crimes.”121 Assim, em consonância com os ensinamentos de Paul Van Zyl, “o estabelecimento de uma verdade oficial sobre um passado brutal pode ajudar as futuras gerações contra o SAMPAIO, José Adércio Leite; ALMEIDA, Alex Luciano Valadares de. Verdade e história: por um direito fundamental à verdade. In: Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.249-267, 2009. p.264. 117 BARBOSA, Marco Antônio Rodrigues. Direito à memória e à verdade. In: Revista Direitos Humanos, Brasília, n. 1, p.26-33, dez., 2008.p. 32. 118 BARBOSA, Marco Antônio Rodrigues; PAULO, Vannuchi. Resgate da memória e da verdade: um direito de todos. In: Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.55-67, 2009. p.55. 119 MEZAROBBA, Glenda. Afinal, o que é uma Comissão da Verdade? In: Revista Direitos Humanos, Brasília, n.5, p.32-34, abr., 2010. p.32. 120 Perita independente encarregada de atualizar o conjunto de princípios para a luta contra a impunidade. 121 Conselho Econômico e Social das Nações Unidas. Promoção e proteção dos direitos humanos. In: Revista Anistia Política e Justiça de transição, n.3, p.426-463, jan.-jun., 2010. p.432.Comissão de Direitos Humanos, 61º período de sessões, Tema 17 do programa provisório, distribuição geral E/CN.4/2005/102/Add.1. 8 de fevereiro de 2005. Original: Inglês. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605-A9D8-5247054336A6}>. Acesso em 21 de outubro de 2011. 116 48 revisionismo e dar poder aos cidadãos para que reconheçam e oponham resistência a um retorno às práticas abusivas.” 122 Barbosa afirma que o direito à verdade auxilia a esclarecer e revelar que o Estado foi o verdadeiro perpetrador das violações estatais impetradas contra o povo brasileiro, desmistificando a prática de crimes pelos perseguidos políticos. Ora, ter convicções políticas divergentes daquelas manifestadas pelo Estado constituem, senão, a materialização de uma sociedade politicamente pluralista.123 Assim, o prestígio da verdade somente é capaz de se concretizar, segundo Sampaio e Almeida, quando, por meio da interação popular no cenário político, os indivíduos estiverem esclarecidos acerca das informações mistificadas pelo Estado, após o regime de exceção. O direito à verdade é, sobretudo, a obrigação estatal em propiciar condições materiais mínimas que permitam aos seus cidadãos formar suas opiniões e interagir no contexto em que estejam inseridas, pois “se o fluxo de informações estiver comprometido, ou pela mentira propositadamente plantada ou pelo descaso na apuração da verdade, os indivíduos terão sua participação ativa impossibilitada pelo Estado.” 124 Sampaio e Almeida enfatizam que a diversas nações emergentes do sistema ditatorial que se propuseram livremente a efetuar uma discussão em relação às atrocidades praticadas obtiveram resultados positivos no diálogo estabelecido com seus cidadãos e na execução das medidas de reparação. Desse modo, toda democracia que se alicerça na incerteza sobre os compromissos e projetos que a ela deram as fundações conviverá sempre com o fantasma do passado a assombrarlhe a existência. Será sempre um regime frágil e imaturo, porque duvidará da sua própria dignidade e correção ou estará sempre refém do sobressalto de algo inesperado que revele o engodo de seus laços. A conciliação não se torna definitiva, se há feridas não saradas e conflitos não resolvidos. 125 Sampaio e Almeida, ainda, prescrevem que a conveniência do esquecimento não detém compromisso com a abertura democrática, pois o autoritarismo, ainda que de forma camuflada, encontra-se presente no percurso da redemocratização, criando um retrato de impunidade que comprometerá o processo de pacificação social.126 ZYL, Paul Van. Promovendo a justiça transicional em sociedades pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, jan.-jun., p.32-55, 2009. p.35. 123 BARBOSA, Marco Antônio Rodrigues. Direito à memória e à verdade. In: Revista Direitos Humanos, Brasília, n. 1, p.26-33, dez., 2008.p. 31. 124 SAMPAIO, José Adércio Leite; ALMEIDA, Alex Luciano Valadares de. Verdade e história: por um direito fundamental à verdade. In: Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.249-267, 2009. p.252. 125 Ibid., p.253. 126 Ibid., p.254. 122 49 Barbosa e Vannuchi certificam que o Estado não possui a prerrogativa de dissimular a verdade dos fatos. A inviabilidade de acesso aos arquivos de interesse da coletividade configura manifesta violação a direitos fundamentais, cerceando o próprio dever de publicidade e transparência estatal inerente ao exercício da cidadania. Em suma, os autores anotam que “a reconstituição da memória, fundada na verdade, é, consequentemente, um passo histórico necessário e imprescindível à consolidação democrática.” 127 Nesse contexto, Sampaio e Almeida salientam que “os sistemas constitucionais de proteção dos direitos lhes garantem a transparência dos poderes constituídos, o que abarca o direito de receberem informações verdadeiras do Estado.” 128 Ademais, reiteram que o direito à informação, ou liberdade informacional (Informationelle Selbstbestimmung), tem como premissa o fato de que o poder público não detém informação em seu próprio interesse, mas o faz em benefício de todos os membros da coletividade. Em um Estado republicano e democrático o acesso à informação manipulada pelo Poder Público é, portando, regra.129 (grifo nosso) Corroborando deste raciocínio, Barbosa destaca a obrigação estatal em fornecer informações de interesse público, sob pena de censura, prática que não se coaduna com o Estado Democrático de Direito: A negativa de comunicação ou informação, ao revés, em estrita consonância com a verdade, importa em censura, que, se cometida por funcionários do governo ou por outras instâncias do Estado, nega o princípio democrático do poder transparente e a democracia não medra em terreno onde sua existência é condicional. 130 Realçando a primazia da verdade num contexto de consolidação da democracia, Barbosa avalia que a reconstituição da verdade é um marco histórico para unificação da memória, pois cidadãos de uma nação doaram suas vidas em prol de um regime político que negava o império da democracia. A ponderação do autor se manifesta de maneira ampla com vistas à reflexão do passado para que se conheça o presente e se projete o futuro de um país que vela pela proteção dos direitos fundamentais e das liberdades públicas. Ademais, notifica: “somente o conhecimento pleno do que efetivamente ocorreu nos chamados anos de chumbo BARBOSA, Marco Antônio Rodrigues; PAULO, Vannuchi. Resgate da memória e da verdade: um direito de todos. In: Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.55-67, 2009. p.59-60. 128 SAMPAIO, José Adércio Leite; ALMEIDA, Alex Luciano Valadares de. Verdade e história: por um direito fundamental à verdade. In: Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.249-267, 2009. p.254. 129 Ibid., p.263. 130 BARBOSA, Marco Antônio Rodrigues. Direito à memória e à verdade. In: Revista Direitos Humanos, Brasília, n.1, p.26-33, dez., 2008. p.31. 127 50 será capaz de promover a verdadeira reconciliação nacional, que só pode se fundar na verdade.” 131(grifo nosso) De outro lado, Sampaio e Almeida mencionam que “os eventos sociais são tão traumáticos que podem gerar uma grave ruptura interna ou desagregação social, demandando ambiente próprio para apurar os acontecimentos de forma imparcial.” 132 Nessas circunstâncias, os autores descrevem a necessidade dos trabalhos desenvolvidos pelas Comissões de verdade e reconciliação. Segundo o Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, as Comissões da verdade referem-se “a órgãos oficiais, temporários e de constatação de feitos, que não têm caráter judicial e se ocupam de investigar abusos contra os direitos humanos ou o direito humanitário que foram cometidos ao longo de vários anos.”133 Além do mais, as Comissões da verdade, segundo Paul Van Zyl “estão habilitadas para fazer sugestões em seus relatórios finais a respeito das medidas legais, administrativas e institucionais que devem ser tomadas para evitar o ressurgimento dos crimes sistemáticos do passado.” 134 Priscilla Hayner135 ensina que as Comissões da verdade são tipicamente encarregadas de alguns ou todos os seguintes objetivos: para descobrir, esclarecer e reconhecer formalmente os abusos do passado, para atender às necessidades das vítimas, "contra a impunidade" e à antecedência de responsabilização individual; para delinear a BARBOSA, Marco Antônio Rodrigues. Direito à memória e à verdade. In: Revista Direitos Humanos, Brasília, n.1, p.26-33, dez., 2008. p.32. 132 SAMPAIO, José Adércio Leite; ALMEIDA, Alex Luciano Valadares de. Verdade e história: por um direito fundamental à verdade. In: Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.249-267, 2009. p.254. 133 Conselho Econômico e Social das Nações Unidas. Promoção e proteção dos direitos humanos. In: Revista Anistia Política e Justiça de transição, n.3, p.426-463, jan.-jun., 2010. p.431.Comissão de Direitos Humanos, 61º período de sessões, Tema 17 do programa provisório, distribuição geral E/CN.4/2005/102/Add.1. 8 de fevereiro de 2005. Original: Inglês. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605-A9D8-5247054336A6}>. Acesso em 21 de outubro de 2011. 134 ZYL, Paul Van. Promovendo a justiça transicional em sociedades pós-conflitos. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.32-55, jan.-jun., 2010. p.37. 135 Sou responsável por esta tradução. Priscilla Hayner é uma co-fundadora do Centro Internacional para Justiça Transicional e dirige seu trabalho sobre a Serra Leoa, Peru, Gana e uma série de outros países. Uma especialista em comissões de verdade e iniciativas de justiça transicional em todo o mundo, ela tem escrito extensamente sobre o tema da busca da verdade oficial em transições políticas. Ela é a autora de Unspeakable Truths (Routledge, 2001), que explora o trabalho de mais de 20 comissões de verdade em todo o mundo. Antes de ingressar na ICTJ, ela era uma consultora da Fundação Ford, o Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos, e inúmeras outras organizações. Priscilla Hayner antigamente era uma oficial do programa em direitos humanos internacionais e de segurança para a Fundação Joyce MertzGilmore em Nova York. Ela é formada na Earlham College e na School of International and Public Affairs at Columbia University. Disponível em:<http://www.idea.int/rrn/individual/p_hayner.cfm>. Acesso em 21 de outubro de 2011. 131 51 responsabilidade institucional e recomendar reformas e promover reconciliação e reduzir os conflitos ao longo dos anos.136 Brito informa que a designação do termo „Comissões da Verdade‟ teve origem na América Latina, por meio das comissões realizadas para apuração das atrocidades efetuadas na Argentina e no Chile inicialmente. Em outros países como, Bolívia, Uruguai e Paraguai foram instaladas comissões parlamentares de investigação, diferente dos relatórios realizados por organização não-governamentais no Brasil, Uruguai, Paraguai, Bolívia e Peru.137 Brito esclarece que os efeitos proporcionados pelos relatórios produzidos pelas Comissões de verdade nem sempre produzirão mudanças de imediato em função do „equilíbrio do poder‟. Alguns tipos de transição irão optar pela instauração de anistia ou adotarão julgamentos como resposta às práticas de violação dos direitos humanos. Importante lembrar que o „equilíbrio do poder‟ não permanecerá intangível, visto que sua reação poderá direcionar-se em favor daqueles que buscam a justiça ou a favor dos que se protegem de qualquer responsabilização. Ou até mesmo, a política transicional poderá ser colocada de lado e, posteriormente, por acordos internacionais ou deslocamento do poder, vir a serem implementadas novas medidas de reparação.138 A funcionalidade das Comissões de verdade é perfeitamente visível no relatório do Secretário-Geral do Conselho de Segurança das Nações Unidas: As Comissões da Verdade podem prestar um auxílio muito valioso às sociedades pós-conflitos aos constatar fatos relacionados com violações dos direitos humanos no passado, incentivar a responsabilização, preservar as provas, identificar os perpetradores e recomendar reparação e reformas institucionais. Também podem servir de plataforma pública para que as vítimas contem diretamente à nação suas histórias pessoais e podem facilitar o debate público sobre como chegar a um acordo com o passado.139 No que diz respeito ao Brasil, este no período autoritário, ao dirigir-se para abertura democrática, optou pela aplicação do instituto da anistia. Apesar de todas as discussões, quanto à criação de uma Comissão da verdade, que apurasse a responsabilidade dos atos de atrocidade praticados pelos agentes estatais, a implementação deste recurso encontra-se em votação no Congresso Nacional. No dia 19/10/2011, foi aprovado o texto que autoriza a criação da Comissão da Verdade brasileira, para apuração dos fatos relacionados ao período Texto fornecido no II Seminário Latino-americano de Justiça de Transição realizado, no Superior Tribunal de Justiça, nos dias 7 e 8 de julho de 2011. HAYNER, Priscilla. Unspeakable Truth: transitional justice and the challenge of truth commissions. 2 edition. New York: Routledge, 2011. p.20. 137 BRITO, Alexandra Barahona de. Justiça transicional e a política da memória: uma visão global. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.56-83, jan.-jun., 2009. p.61. 138 Ibid., p.64. 139 Conselho de Segurança das Nações Unidas. O Estado de Direito e a justiça de transição em sociedades em conflito ou pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.320-351, jan.jun., 2009.p.343. 136 52 de exceção. Existem diversas críticas quanto à elaboração do texto político de sua criação. Contudo, conforme observa Ruti Teitel, em entrevista concedida à Revista Anistia Política e Justiça de Transição, “o fato de o Brasil estar hoje debatendo a criação de uma comissão da verdade ou a possibilidade punir certos delitos do regime é, em si, fantástico, uma vez que demonstra esse amadurecimento do debate público sobre o tema.” 140 Nesse contexto, os professores Paulo Abrão e Marcelo Torelly acreditam que a consolidação do direito à verdade, de forma plena, por meio da Comissão da Verdade, seja possível, pois, a partir da consulta dos arquivos exclusivos dos centros de investigação e repressão dos comandos militares, será elucidada a maneira como o Estado procedia na imposição dos atos de arbitrariedade.141 Além disso, o Conselho Econômico e Social das Nações Unidas ressalta a relevância do papel da Comissão da Verdade em cenários que foram palcos de violações em massa dos direitos humanos. Para isso, examine o excerto a seguir: As sociedades que experimentaram crimes odiosos perpetrados em série ou sistematicamente podem beneficiar-se particularmente com a criação de uma comissão da verdade ou de outra comissão de investigação com o objetivo de estabelecer os fatos relativos a essas violações de maneira a certificar-se da verdade e impedir o desparecimento das provas.142 (grifo nosso) O acesso aos arquivos públicos é outra questão polêmica enfrentada pela política brasileira, a qual produz efeitos reflexos na elucidação do direito à verdade, resguardada pelos arquivos públicos, a respeito da versão do Estado, quanto aos atos arbitrários praticados durante o regime de exceção. Diferentemente da transição democrática argentina, a qual “retirou a classificação de segurança de todos os documentos e informações relacionados às Forças Armadas no período entre 1976 e 1983” 143, o acesso aos arquivos públicos brasileiros é regulado pelas Leis nº 8.159/1991 e 11.111/2005, as quais, na visão de Pacheco, “restringem o acesso aos TEITEL, Ruti. Entrevista. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.3, p.27-40, jan.-jun., 2010. p.37. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605A9D8-5247054336A6}>. Acesso em: 21 de outubro de 2011. 141 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo. Justiça de Transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.3, p.108-139, jan.-jun., 2010. p.119. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605-A9D8-5247054336A6}>. Acesso em: 21 de outubro de 2011. 142 Conselho Econômico e Social das Nações Unidas. Promoção e proteção dos direitos humanos. In: Revista Anistia Política e Justiça de transição, n.3, p.426-463, jan.-jun., 2010. p.433.Comissão de Direitos Humanos, 61º período de sessões, Tema 17 do programa provisório, distribuição geral E/CN.4/2005/102/Add.1. 8 de fevereiro de 2005. Original: Inglês. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605-A9D8-5247054336A6}>. Acesso em 21 de outubro de 2011. 143 Decreto 04/2010. Retira a classificação de segurança de todos os documentos e informações relacionados às ações das Forças Armadas no período compreendido entre 1976 e 1983. 140 53 documentos públicos classificados como sigilosos e que têm contribuído para práticas políticas que levam ao recalque e ao esquecimento.”144 (grifo nosso) A conjugação desses dois elementos – criação da Comissão da verdade e alteração da lei de acesso a arquivos públicos – é temática que se encontra em grande debate no cenário político e que propiciará um novo olhar sob as questões que apresentam-se pendentes pela ausência de regulamentação desses mecanismos de atuação social. Por todo o exposto, o direito à elucidação dos atos praticados no período ditatorial é essencial na construção de uma democracia que se alinhe aos princípios democráticos do Estado de Direito, mormente, quando as ações arbitrárias praticadas encontram-se protegidas pelo sigilo da suposta segurança pública. Assim, confira o excerto abaixo transcrito do livrorelatório, Direito à memória e à verdade, elaborado pela Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP): Só conhecendo profundamente os porões e as atrocidades daquele lamentável período de nossa vida republicana, o País saberá construir instrumentos eficazes para garantir que semelhantes violações dos Direitos Humanos não se repitam nunca mais.145 2.3 DIREITO À MEMÓRIA Segundo Marco Antônio Rodrigues Barbosa e Paulo Vannuchi, os atos de arbitrariedade estatal praticados na América latina possuem como obrigação precípua um olhar sobre os fatos do passado, como instrumento de promoção e de respeito aos direitos humanos. 146 Os autores sustentam, de maneira clara, a importância sobre as ações de preservação da história política brasileira, com a finalidade de se aprimorar os esforços voltados para a construção de um Estado livre das arbitrariedades. Averigúe-se sua essencialidade: O direito à memória com verdade, se desrespeitado, afeta a todos os cidadãos; influi no cotidiano de suas vidas. A preservação da memória, como registro de fato ou acontecimento histórico e psicológico, individual e coletivo, exerce função PACHECO, Mariana Pimentel Fischer. Direito à memória como exigência ética – uma investigação a partir da hermenêutica filosófica de Hans-Georg Gadamer. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.250-271, jan.-jun., 2009. p.265. 145 Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos. Brasília, Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/sedh/biblioteca/livro_direito_memoria_verdade/livro_direito_memoria_verd ade_sem_a_marca.pdf>. Acesso em 21 de outubro de 2011. 146 SOARES, Inês Virgínia Prado; KISHI, Sandra Akemi Shimada. Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p.55. 144 54 primordial na evolução das relações humanas: trata-se de um ato político que constitui a base sobre a qual a sociedade pode afirmar, redefinir e transformar os seus valores e as suas ações. Ao contrário do esquecimento, que, para os gregos, constitui a mais dolorosa das experiências, a memória individual e a memória coletiva são os eixos primordiais e os meios de se aplicarem, na prática, os fundamentos dos direitos humanos. 147 (grifo nosso) O caso brasileiro é emblemático, pois as atitudes implantadas no período pós-ditadura alinharam-se no sentido de esquecer os atos no passado praticados. Não se pautou em uma política de esclarecimento das práticas violentas exercidas pelos órgãos governamentais. Ao revés, o Estado, principal responsável em instituir ações que o conduzisse a uma prática de confissão, limitou-se a seguir em frente e não mais tocar naquele conteúdo, em razão das inúmeras práticas de prisões ilegais, torturas e desparecimento forçado contra os seus cidadãos, ou até mesmo sob o temor de ter que se submeter à égide totalitária. Entretanto e infelizmente [...] a repressão atroz e os crimes produzidos na ditadura foram atos não desejados, mas necessários, repartindo, assim, a culpa pelo regime autoritário entre os dois lados combatentes: a repressão e a resistência. O centro do discurso está na ideia de que esta história não pode ser contada, senão exclusivamente desta maneira: a de que o regime ditatorial foi uma etapa de paz civil e avanços econômicos onde se localiza as bases da ordem e da democracia atual. Em virtude disso, em nome da governabilidade, tenta fixar-se um pacto de silêncio, onde não se deve olhar mais para o passado, sob pena de abrir-se as suas feridas. Nestes termos, contata-se um uso político da memória para coincidi-la com a hermenêutica dos dominadores de então, e isto em verdade, constitui-se em uma não-memória.148 Marco Antônio e Paulo Vannuchi ao discorrerem a respeito da valorização da memória frisa sua essencialidade, eis que tal elemento constitui-se instrumento de reaquisição do sentimento de justiça. O resgate da verdadeira memória autoriza o esclarecimento daquilo que se tornou camuflado na vida da sociedade, de forma que se vivifiquem os fatos e ações do passado para um caminho de reconciliação.149 Malgrado a Magna Carta de 1988 representar um marco da abertura democrática, ela, também, significa a perda da memória do país. Consubstanciando tal raciocínio, a lição de Marco Antonio e Paulo Vannuchi defende que “a estratégia da ditadura é conhecida: produzir a supressão da memória por meio de pactos de silêncio e de concessões mútuas que acomodam, precariamente, os sobreviventes do conflito e mantêm intocadas a possibilidade SOARES, Inês Virgínia Prado; KISHI, Sandra Akemi Shimada. Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p.57-58. 148 ABRÃO, Paulo; GENRO, Tarso. Memória Histórica, Justiça de Transição e Democracia sem Fim. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 16-24, 2010. p.19. 149 SOARES, Inês Virgínia Prado; KISHI, Sandra Akemi Shimada. Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p.58. 147 55 de ajuste de contas com o passado e a ignorância dos fatos pretéritos, sobretudo entre os jovens.”150 A memória é um dos pilares de sustentação do Estado Democrático de Direito, pois, a partir de sua análise, é possível identificar os valores que vigeram no regime repressivo, conforme ensina Tarso Genro e Paulo Abrão. O poder da memória possui papel de transformação das culturas impostas em um cenário de repressão, de autoritarismo.151 Segundo Félix Reátegui Carrillo, “o papel da memória nos processos de transição está associado à compreensão da cultura como uma dimensão central na constituição de todo regime político em longo prazo.” 152 A influência da cultura será guiada pela diversidade de valores em uma determinada sociedade. Assim, é relevante perceber, não obstante, que em muitos países que experimentam transições para a democracia a partir de situações de autoritarismo ou de violência, este último fator – o da trama cultural e o das relações sociais que tal trama sustenta – é sumamente débil. Isso é certo, sobretudo, em sociedades pluriétnicas e onde a diversidade é o reflexo, para não dizer o resultado, de uma história colonial. A constelação de valores e representações coletivas subjacentes ao funcionamento institucional de uma democracia – e que podem subsistir sintetizadas na noção de reconhecimento e no valor da igualdade – disputa e resulta frequentemente superada por outra constelação: idéias organizadas, valores, atitudes, imagens do mundo que contradizem e solapam os esforços de ordenamento democrático da sociedade.153 Destarte, a valorização da democracia, orientada pela memória e pelas formas culturais sobressai, na concepção de Carrillo, a dimensão estritamente institucional, alçando a cultura como fator preponderante nas transições políticas, pois o exercício democrático da cidadania, por exemplo, dependerá do processo de colonização e dos valores de formação daquele Estado.154 Portanto, Carrillo salienta que a memória constitui-se instrumento simbólico de representação política, apto não apenas à substituição de atores sociais, mas também, à SOARES, Inês Virgínia Prado; KISHI, Sandra Akemi Shimada. Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p.58. 151 ABRÃO, Paulo; GENRO, Tarso. Memória Histórica, Justiça de Transição e Democracia sem Fim. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 16-24, 2010. p.20. 152 CARRILLO, Félix Reátegui. Memória Histórica: o papel da cultura nas transições. In: Revista Anistia Política e Justiça de transição, Brasília, n.2, p. 32-49, jul.-dez., 2009, p.32. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605-A9D8-5247054336A6}>. Acesso em: 17 de outubro de 2011. 153 Ibid., p.33. 154 CARRILLO, Félix Reátegui. Memória Histórica: o papel da cultura nas transições. In: Revista Anistia Política e Justiça de transição, Brasília, n.2, p. 32-49, jul.-dez., 2009, p.32. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605-A9D8-5247054336A6}>. Acesso em: 17 de outubro de 2011. p.33. 150 56 elaboração de resultados políticos de longo prazo. Assevera, por fim, a cultura como ferramenta de democratização: Em uma sociedade em que o exercício dos direitos fundamentais é precário, a consolidação de uma democracia em longo prazo depende, entre outras coisas, das representações sociais e da adequação destas a um regime de vida cidadão. Se a cultura é um dos espaços mais importantes da reprodução social, a mobilização dos recursos simbólicos que compõem essa cultura sempre gravitará sobre o tipo de ordem política produzido e reproduzido. 155 Exemplo singular da demonstração das práticas culturais brasileiras é perfeitamente visível na obra – 68 a geração que queria mudar o mundo: relatos – o poder de transformação gerado pelas forças sociais no período militar: Foi a época do Centro Popular da UNE, dos Cadernos do Povo Brasileiro, de filmes como Cinco Vezes Favela e do, então, inacabado Cabra Marcado para Morrer. A finalidade era “educar o povão” por meio da arte. No nordeste, Francisco Julião e as Ligas Camponesas incendiavam com sonhos de liberdade e de reforma agrária os pequenos camponeses da Zona da Mata. Diferentes experiências com alfabetização de adultos eram realizadas, desde Com Pés Descalços Também se Aprende a Ler, no Rio Grande do Norte, passando pelo movimento de Cultura Popular, em Pernambuco, até o Programa Nacional de Alfabetização de Paulo Freire, em Pernambuco e Rio de Janeiro.156 Esse mesmo poder de transformação, energizado pelo direito à memória, é capaz de orientar e implantar as ações do Estado na solidificação da democracia, sobretudo, da garantia de respeito às liberdades públicas e aos direitos fundamentais. Nesse sentido, o trabalho da memória nas sociedades pós-autoritárias é fundamental não apenas para rememorar o trabalho daqueles que lutaram pela instituição do Estado de Direito, mas também, em função da necessidade inerente da própria sociedade, de por meio deste exercício, iniciar a criação de sua própria identidade.157 Nesse particular, Tarso Genro e Paulo Abrão nos ensinam que o exercício efetivo da democracia por meio da participação popular ainda é ferramenta primordial para diferenciar as verdadeiras leituras construídas em nossa história.158 CARRILLO, Félix Reátegui. Memória Histórica: o papel da cultura nas transições. In: Revista Anistia Política e Justiça de transição, Brasília, n.2, p. 32-49, jul.-dez., 2009, p.32. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605-A9D8-5247054336A6}>. Acesso em: 17 de outubro de 2011. p.35. 156 COIMBRA, Cecília; QUEIROZ, Leoncio de; JAPA, Mario; OSAVA, Chizuo; MAESTRI, Mario. Panorama histórico. In: 68 a geração que queria mudar o mundo: relatos, Brasília, p. 38-63, 2011. p. 41. 157 ABRÃO, Paulo; GENRO, Tarso. Memória Histórica, Justiça de Transição e Democracia sem Fim. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 16-24, 2010. p.21. 158 ABRÃO, Paulo; GENRO, Tarso. Memória Histórica, Justiça de Transição e Democracia sem Fim. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 16-24, 2010. 155 57 Daí surgem as transformações permeadas pela instituição do Estado ao longo de sua história. As influências externas. Os anseios, os valores, a cultura, todos são elementos que determinam a formação da história do Estado Brasileiro. Dessa estreita relação, os professores nos ensinam que “a história é um dos elementos de legitimação constitucional” e que “deve-se convencer de que na interpretação do passado joga-se o futuro dos Estados democráticos.” 159 Na apresentação da 2ª edição da Revista Anistia Política e Justiça de Transição é desenvolvida uma perspectiva salutar a despeito dos 30 anos após o regime de exceção: A retrospectiva desses 30 anos nos faz ver como a democracia tornou o Brasil um país melhor, e como os conceitos mudam com o tempo. Se na década de 1970 falar em democracia era causa suficiente para ir à prisão, hoje falar contra a democracia soa, no mínimo, anacrônico. [...] Olhar esses 30 anos em retrospectiva, por uma perspectiva otimista, mostra-nos quanto se avançou: hoje temos eleições regulares, os poderes funcionam de forma independente e as crises políticas são resolvidas institucionalmente.160 O direito à memória, entendido como princípio da memória ou princípio da nãorepetição, segundo Rodrigo Ferraz de Castro Remígio, “não se trata de fomentar nas pessoas um sentimento de estarrecimento, muito menos proporcionar imagens mentais de tortura. Ao contrário, o direito à memória é entendido como obrigação do Estado de criar espaços públicos, rendendo homenagens a quem efetivamente deva ser lembrado.” 161 Marco Antônio Rodrigues Barbosa e Paulo Vannuchi concluem da seguinte maneira: Nem os algozes nem as vítimas da trágica história vivida pelo Brasil no período ditatorial têm o direito de ocultar os fatos, entorpecendo a memória. A proibição de restaurar a memória, com verdade, consiste em retrocesso social e configura conduta ilícita do agente público que assim proceder. Trata-se – a proibição – de negação dos acontecimentos históricos e de arbitrariedade, por trás da qual se escondem a mediocridade e os obstáculos para vencer a força idéias. 162 Compartilhando desse mesmo pensar, clara é a necessidade de valorização da memória e de resguardar os muros construídos: Por essa razão, se costuma falar de uma batalha pela memória como um processo contencioso que se desenvolve durante e depois da elaboração de uma narrativa da verdade. Uma vez existente o texto, a tarefa mais árdua é conquistar para ele certa ABRÃO, Paulo; GENRO, Tarso. Memória Histórica, Justiça de Transição e Democracia sem Fim. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 16-24, 2010. p. 22. 160 ABRÃO, Paulo; GENRO, Tarso; BELLATO, Sueli Aparecida. Apresentação. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 2, p.8-15, jul.-dez., 2009. p 9. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605-A9D8-5247054336A6}>. Acesso em: 15 de outubro de 2011. 161 REMÍGIO, Rodrigo Ferraz de Castro. Democracia e Anistia Política: Rompendo com a cultura do silêncio, possibilitando uma justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, jan. –jun., p.178 – 201, 2009. p. 178. 162 BARBOSA, Marco Antônio Rodrigues; VANNUCHI, Paulo. Resgate da memória e da verdade: um direito de todos. In: Memória e verdade: a justiça de transição no estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.55-67, 2009. p.58-59. 159 58 eficácia social, isto é, convertê-lo em memória: representação social compartilhada que não é somente um conjunto de conteúdos – de enunciados com pretensões de verdade sobre o passado violento ou repressivo –, senão também, e fundamentalmente, uma fonte de crítica e deslegitimação de certas práticas sociais precedentes – certo tipo de relações entre Estado e sociedade; certa forma de encarar a luta política; certos hábitos e retóricas que determinam a relação entre as diversas classes sociais e os conglomerados étnicos da nação – e, naturalmente, uma demanda de transformação de tais políticas.163 Paulo Endo expressa, de maneira contundente, que, mesmo tendo nascido em período de repressão, “o futuro é incerto e gera temor.” O que demonstra veemente a necessidade de reavivar as memórias, relatos e fatos desse período, não apenas em documentos, mas, inclusive, por meio de depoimentos vivos como exemplo de expressão da cidadania e da participação popular.164 Por todo o exposto, Antônio Leal de Oliveira ressalta a finalidade da primazia da memória, uma vez que as dívidas herdadas do período de exceção se multiplicam em razão da sua presencial ínsita no Estado Democrático de Direito Brasileiro. Aqui, o direito à memória encontra o seu maior foco: “a construção de um conceito de história (da história da realidade sociopolítica brasileira) que dê conta da realidade dos oprimidos, que acabam vivenciando um verdadeiro „estado de exceção‟, um „estado de exceção‟ que é a regra nas periferias, nos morros, nas cadeias.” 165 2.4 DIREITO À JUSTIÇA Esta subseção representa em larga medida a importância do desenvolvimento desta pesquisa, pois, analisando as medidas adotadas pelos países da América Latina e os tratados internacionais de direitos humanos do qual o Brasil é signatário, é claramente visível a inobservância da Suprema Corte Brasileira aos tratados internacionais e de direitos humanos. CARRILLO, Félix Reátegui. Memória Histórica: o papel da cultura nas transições. In: Revista Anistia Política e Justiça de transição, Brasília, n.2, p. 32-49, jul. – dez., 2009, p.32. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605-A9D8-5247054336A6}>. Acesso em: 18 de outubro de 2011. 164 ENDO, Paulo. A dor dos recomeços: luta pelo reconhecimento e pelo devir histórico no Brasil . In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 2, jul. – dez., p.50 – 63, 2009. p. 51. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605-A9D8-5247054336A6}>. Acesso em: 18 de outubro de 2011. 165 OLIVEIRA, Antônio Leal de. O perdão e a reconciliação com o passado em Hannah Arendt e Jacques Derrida. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.203-227, jan. – jul., 2009. p.208-209. 163 59 Ainda, que, inicialmente, convém consignar que esta pesquisa não possui qualquer manifestação de natureza ideológica, mas, tão somente busca avaliar os mecanismos de transição democrática brasileira adotados para a consolidação de um Estado de direito, ante a decisão prolatada pela Suprema Corte Brasileira, vez que não somente no plano internacional, mas também no interno, o Brasil assumiu o compromisso de proteção dos direitos fundamentais humanos, segundo o artigo 5º, §§ 1º e 2º da Constituição Federal. Inúmeros países latino-americanos na execução dos instrumentos da justiça transicional fizeram uso do julgamento dos agentes estatais que praticaram crimes de lesahumanidade, ressaltando que tal medida é importante para o combate da impunidade e também para demonstrar que o próprio Estado de Direito se submete ao ordenamento jurídico do qual faz parte. Insta lembrar que o julgamento dos agentes estatais que praticaram crimes de tortura e desaparecimento forçado no período de exceção não constitui uma forma de revanchismo ou uma maneira de retribuição pelos atos praticados, mas, sim, uma maneira de se contrapor à impunidade, a qual é característica reticente na sociedade brasileira. A ideia da promoção da responsabilização dos perpetradores políticos é combater o senso de impunidade característico da sociedade brasileira. Brito destaca que “a justiça é vista como uma arma contra o esquecimento, que pode combater a „amnésia social‟, a negação, o encobrimento, e várias formas perniciosas de revisionismo que negam ou justificam as atrocidades do passado.”166 Paul Van Zyl assevera que “os julgamentos não devem ser vistos como um anseio social de retribuição, dado que também desempenham uma função vital quando reafirmam publicamente normas e valores essenciais cuja violação implica em sanções.” 167 O autor considera que a adoção de julgamentos das práticas autoritárias é um mecanismo de restaurar ação da confiança entre o cidadão e o Estado, uma vez que este possui o dever de proteger os seus cidadãos e não infringir os direitos fundamentais da pessoa humana. Nesse sentido, Pistori e Moreira da Silva Filho apud Katryn Sikkink e Carrie Booth Walling destaca os resultados produzidos nos países em que houve a responsabilização dos perpetradores políticos: Mediante coleta e análise de dados relacionados aos países latino-americanos, ambas constataram que, nos países onde ocorreram julgamentos por violações de direitos humanos cometidas por agentes públicos que atuavam no período autoritário, o BRITO, Alexandra Barahona de. Justiça transicional e a política da memória: uma visão globral. IN: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.56-83, jan.-jun., 2009. p.77. 167 ZYL, Paul Van. Promovendo a justiça transicional em sociedades pós-conflitos. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p. 32-55, jan.-jun., 2009. p.35. 166 60 índice de respeito aos direitos humanos é sensivelmente maior do que nos países onde tais julgamentos não ocorreram. 168 (grifo nosso). Sendo assim, Pistori e Moreira da Silva Filho afirmam que “no Brasil, o reconhecimento da barbárie que a tortura representa continua ainda pendente. Não houve o necessário reconhecimento da perda, da dor e da violência ocorrida nos anos de chumbo.”169(grifo nosso) Portanto, a possibilidade de julgamento dos algozes que cometeram crimes de lesahumanidade, considerados imprescritíveis, torna-se premente no sentido de que a responsabilização estatal pelos atos de violação de direitos humanos deve ser apurada. A morosidade do Judiciário brasileiro e sua omissão não podem ser justificativas para a escusa estatal frente ao dever legal de investigação e de promoção da justiça.170 Marcelo Torelly observa, claramente, que “o fato das violações de direitos humanos cometidas em nome do Estado durante o regime militar jamais terem sido apuradas e, ainda, ter-se buscado impor esquecimento daqueles fatos, certamente guarda relação com esta conjuntura” 171 – leia-se baixa credibilidade nos órgãos governamentais e elevado nível de violência. Assim, é importante reforçar que a adoção da justiça como estratégia no processo de abertura democrática não é uma retribuição da violação proporcionada pelo Estado. Ao revés, a opção por essa medida possui como escopo o combate ao esquecimento pela omissão do Estado em apurar a responsabilidade dos agentes estatais. Por isso, confira-se: Nesse sentido, aceitar as regras do Estado de Direito não é apenas se colocar em oposição à ilegalidade e à violência ditatorial, mas também fazer algo a mais; pois o grande temor para a justiça e a memória é que o crime caia no esquecimento, que a passagem do tempo, tal como um solvente natural, liberte o perpetrador e enfraqueça a justiça. O julgamento seria assim um espaço que resiste a esse temor. Julgamentos contra os perpetradores podem servir como um alerta. Os julgamentos determinam como a sociedade tornar-se-á a partir daquele fato, pois podem contribuir para a construção da memória coletiva de uma comunidade e para fomentar a identidade política logo após um trauma ou um rompimento das estruturas.172 PISTORI, Edson Claudio; MOREIRA DA SILVA FILHO, José Carlos. Memorial da anistia política do Brasil. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.114-133, jan.-jun., 2009. p.122. 169 Ibid., p.122. 170 Ibid., p.130. 171 TORELLY, Marcelo D. Justiça transicional, memória social e senso comum democrático: notas conceituais e contextualização do caso brasileiro. In: Repressão e Memória Política no contexto ibero-brasileiro: estudos sobre Brasil, Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p.104-123, 2010. p.113. 172 SOARES, Inês Virgínia Prado; BASTOS, Lucia Elena Arantes Ferreira. Direito à verdade na Corte Interamericana de direitos humanos: as perspectivas no julgamento do Brasil (caso Araguaia). In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 3, p. 288-307, jan.-jun., 2010. p.299-300. 168 61 De outro lado, o Conselho de Segurança das Nações Unidas considera o sistema penal como uma alternativa relevante, hábil a descrever uma história oficial a respeito das atrocidades praticadas, além de ser uma via de responsabilização dos agentes estatais e de promoção da justiça. Além disso, pode ser um meio de fortalecer a credibilidade das instituições democráticas, uma vez que o próprio Estado estará se submetendo ao crivo da lei.173 Os julgamentos dos violadores de direitos humanos atingiram tamanha acuidade na América-Latina que, atualmente, a região serve de paradigma para as demais regiões do mundo. Veja: A América Latina possui uma notável história de julgamentos por violações dos direitos humanos. O “julgamento do século” pelo governo democrático da Argentina condenou e encarcerou integrantes da antiga junta militar por violações dos direitos humanos. O ex-ditador chileno Augusto Pinochet morreu em prisão domiciliar aguardando julgamento por abusos contra os direitos humanos. Em 1995, a Bolívia conseguiu extraditar do Brasil e, em seguida, julgar, condenar e sentenciar a 30 anos o ex-ditador Luis García Meza. Em 2009, os tribunais peruanos condenaram o expresidente Alberto Fujimori a 25 anos de prisão por abuso dos direitos humanos. A promotoria pública pediu pena de 45 anos de prisão para o ex-presidente uruguaio Juan María Bordaberry pela sua conexão com mortes durante a Operação Condor. Esses casos, agora conhecido de todos, criaram uma imagem da região como precursora e líder dos processos judiciais bem sucedidos na área dos direitos humanos.174 Nesse particular, Ruti Teitel destaca que o uso dos julgamentos pela justiça transicional não visão tão somente a punição, mas sim, a mudança do futuro político da nação, valorizando, acima de qualquer circunstância, a supremacia da democracia. Assegura, também, que a justiça transicional brasileira afigura-se de maneira especial, pois, ainda que não adote o julgamento dos perseguidores políticos, estabelece um conjunto de medidas que busquem a construção da memória e a elucidação da verdade, a fim de que o Estado democrático de direito seja consolidado livre do ranço autoritário da ditadura.175 Ademais, Moreira da Silva Filho apud Kathryn Sikkink e Carrie Booth Walling afirma que “em nenhum dos países nos quais ocorreram julgamentos por violações de direitos humanos houve um retrocesso democrático.” Assim, o autor certifica que a adoção de julgamentos por transgressões dos direitos humanos é instrumento hábil ao fortalecimento da Conselho de Segurança das Nações Unidas. O Estado de Direito e a justiça de transição em sociedades em conflito ou pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.320-351, jan.jun., 2009.p.338. 174 OLSEN, Tricia D. ; PAYNE, Leigh A. ; REITER, Andrew G. Equilibrando julgamentos e anistias na América Latina: perspectivas comparativa e teórica. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.2, p.152-175, jul.-dez., 2009. p.152-153. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605-A9D8-5247054336A6}>. Acesso em: 21 de outubro de 2011. 175 TEITEL, Ruti. Entrevista. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, n. 3, p.28-39, jan.-jun., 2010. p.33. 173 62 cultura de respeito aos direitos humanos, vez que a omissão do Estado incentiva a nãoobservação dos agentes e órgãos governamentais aos preceitos de respeito aos direitos fundamentais.176 Tavares e Agra apontam as dificuldades de promoção dos julgamentos, quando é perfeitamente possível verificar que não houve uma ruptura do sistema democrático da Magna Carta de 1988 com o regime ditatorial entre 1964 e 1985: A concretização da justiça reparadora não é tarefa simplória porque presume o dever de punir todas as pessoas que tiveram participação em atos atentatórios à dignidade da pessoa humana, e dentre essas pessoas figuram personalidades que ocuparam cargos importantes no governo arbitrário. Essa tarefa se mostra muito mais difícil quando não existe uma ruptura governamental, ou seja, quando o poder político não sofre uma translação em seus detentores.177 (grifo nosso) Segundo Tavares e Agra enfatizam que, não obstante as dificuldades impostas para realização dos julgamentos, utilizar-se desta medida não significa na criação de um tribunal de exceção, pois caracterizaria um retrocesso do Estado de direito. Porém, os julgamentos constituem em um modo de superar o aspecto “democrático” imposto naquele período e repugnar as formas de controle manifestadas no regime de exceção, primando pela valorização e consolidação da democracia.178 Nesse norte, Tavares e Agra com extrema ousadia afirmam que “não pode existir um Estado de Direito completo se a impunidade dos crimes praticados envolvendo os direitos mais fundamentais configura-se como regra, no qual a exceção, infelizmente, é a garantia dos direitos fundamentais.” 179 Com base nos autores, pode-se afirmar que enquanto não houver um reconhecimento oficial pelo Estado, a respeito das violações de direitos humanos praticadas no regime de exceção, a democracia, como elemento primordial da sociedade, restará inviável à solidificação do Estado democrático de Direito, ao qual a República Federativa do Brasil comprometeu-se em sua inauguração.180 Quando esta pesquisa inclinou seu objeto de investigação para a institucionalização da impunidade, por meio da análise do controle concentrado de constitucionalidade da ADPF 153, foi no sentido de que a responsabilização dos perpetradores políticos tornou-se MOREIRA DA SILVA FILHO, José Carlos. Dever de memória e a construção da história viva: a atuação da Comissão de Anistia do Brasil na concretização do direito à memória e à verdade. In: Repressão e Memória Política no contexto ibero-brasileiro: estudos sobre Brasil, Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p.186-227, 2010. p.205-207. 177 TAVARES, André Ramos; AGRA, Walber de Moura. Justiça reparadora no Brasil. In: Memória e verdade: a justiça de transição no estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.69-91, 2009. p.72. 178 Ibid., p.72. 179 Ibid., p.73. 180 TAVARES, André Ramos; AGRA, Walber de Moura. Justiça reparadora no Brasil. In: Memória e verdade: a justiça de transição no estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.69-91, 2009. p.89. 176 63 sensivelmente hermética, estanque no cenário brasileiro, inviabilizando, assim, o julgamento de seus algozes. Em síntese, o julgamento da ADPF nº 153 conforme à Constituição estabeleceu o sentido da interpretação do §1º do artigo 1º da Lei 6.683/79, fixando que o alcance da anistia abrangeria tanto os perseguidos como aos perseguidores políticos, tornando, assim, inexeqüível a responsabilização dos agentes estatais, ressaltando, inclusive, de maneira majoritária, que o normativo legal em discussão foi fruto de um acordo político que resultou em uma lei de autoanistia. A interpretação da Lei de Anistia foi efetuada invocando-se diferentes métodos de interpretação. Todavia, a fim de contextualizar os limites em que o intérprete encontra-se inserido, o trecho abaixo retrata com clareza a liberdade de interpretação dos dispositivos legais: Mas o que fica claro é que sempre existiu uma gama de diretrizes interpretativas que possibilitariam ao intérprete confrontar a Lei de Anistia brasileira, seja em face da Constituição Federal (controle de constitucionalidade), seja à luz da Convenção dos Direitos Humanos (controle de convencionalidade), ou até mesmo pelo critério cronológico de resolução de antinomias de leis de mesma hierarquia. Em todo caso, há uma tremenda margem de liberdade ao intérprete, cujos limites são sua consciência e vontade jurídica, que, no entanto, é restringida pela opacidade gerada por força da “normalização” e repressão. 181 (grifo nosso) Nessa ótica, Tavares e Agra afirmam que “a dedução que pode ser formulada é que, historicamente, há uma impunidade na prática de tais atos, servindo de estímulo para que condutas iguais possam ser repetidas no futuro.” 182 Portanto, aquiescendo do entendimento de Rui Aurélio de Lacerda Bardaró, se conclui que [...] os direitos à verdade e à justiça constituem pilares democráticos da igualdade dos cidadãos, exigindo-se que não haja tratamento diferenciado para aqueles que cometeram crimes de lesa-humanidade e, também, as vítimas devem ter seus direitos protegidos e suas reparações efetivadas. Frise-se que verdade e justiça são medidas imprescindíveis para a garantia de que, nos dias atuais e no futuro, a impunidade e as desculpas frente a atrocidades não sirvam de base para exercícios abusivos de poder por parte das forças de segurança. 183 (grifo nosso) Nesse passo, insta a análise das ações decorrentes dos tratados internacionais de direitos humanos firmados pelo Brasil e as repercussões decorrentes deste descumprimento de norma cogente no plano internacional. SANTOS, Roberto Lima; FILHO, Vladimir Brega. Os reflexos da “judicialização” da repressão política no Brasil no seu engajamento com os postulados da justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.152-177, jan.-jun., 2009. p.172. 182 TAVARES, André Ramos; AGRA, Walber de Moura. Justiça reparadora no Brasil. In: Memória e verdade: a justiça de transição no estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.69-91, 2009. p.89. 183 DE LACERDA BARDARÓ, Rui Aurélio. Crimes contra a humanidade nas Américas: uma dívida pendente de reparação. In: Revista Jurídica Consulex, Brasília, ano XIV, nº 322, 15 de junho de 2010.p.42. 181 64 3. CONFLITO DE INTERPRETAÇÕES NA APLICAÇÃO DA JUSTIÇA NO CASO BRASILEIRO Após as considerações acima delineadas, o foco central da pesquisa torna-se cada vez mais restrito o seu conteúdo e de maior profundidade a sua análise. Nesse contexto dos conflitos de interpretações relativo à aplicação da justiça, Abrão e Torelly narram que “o principal obstáculo à consecução da regularização das funções da justiça pós-autoritarismo é produto da persistência histórica de uma interpretação dada pela própria ditadura à Lei de Anistia de 1979, pretensamente vista como uma “anistia bilateral, que camufla uma autoanistia (...)” 184 Não obstante, Santos e Filho enfatizam que Analisando-se a atuação do Poder Judiciário no Brasil durante e após o período de ditadura militar, verifica-se no primeiro momento um maior ativismo judicial em virtude da necessidade de se apostar nas lacunas e brechas da lei a fim de driblar a 185 arbitrariedade e o autoritarismo do sistema político-jurídico de então. Por outro lado, destacam Santos e Filho que com a promulgação da Carta de 1988, no que dizia respeito à violação dos direitos humanos, o Judiciário mostrou-se tímido e, contraditoriamente à maneira que vinha atuando no período ditatorial, seu desempenho na defesa dos direitos fundamentais contraiu.186 No entanto, faz-se imprescindível registrar que a ambigüidade da Lei de Anistia de 1979 para compreender a tortura efetuada pelos agentes estatais não foi pleiteado pela sociedade brasileira, uma vez que a prática da tortura não foi reconhecida como de fato pelos órgãos governamentais.187 A partir desses conflitos de interpretação e do desenvolvimento de políticas na América-latina que passaram a reconhecer a possibilidade de julgamento dos perseguidores políticos, instaurou-se um conflito de interpretação das leis nos países emergentes do regime de exceção, principalmente, naqueles que haviam promulgado leis de anistia à época, pois diversas dessas nações como Argentina, Peru e Uruguai destituíram de qualquer eficácia as leis que impediam o julgamento dos algozes políticos e numa súbita orientação jurídica, ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.3, p.108-139, jan.-jun., 2010. p.117. 185 SANTOS, Roberto Lima; FILHO, Vladimir Brega. Os reflexos da “judicialização” da repressão política no Brasil no seu engajamento com os postulados da justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.2, p.152-177, jul.-dez., 2009. p.172. 186 Ibid.,p.174. 187 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.3, p.108-139, jan.-jun., 2010. p.113. 184 65 submeteram-se às diretrizes da Corte Internacional dos Direitos Humanos para a responsabilização daqueles que praticaram crimes de lesa-humanidade no período de ditadura. Assim, como bem esclarecido pela professora Leigh Payne et. al “a Suprema Corte Brasileira, por sete votos a dois, decidiu, em 29 de abril de 2010, declarar válida a anistia para todos os crimes cometidos por agentes de Estado no Brasil durante a Ditadura”188, ao realizar interpretação conforme à Constituição em controle de constitucionalidade concentrado na análise da ADPF nº 153. Essa decisão propiciou a condenação do Brasil pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos, em dezembro de 2010, ao apreciar o ajuizamento do caso da Guerrilha do Araguaia perante a respectiva Corte. Na análise da ação, a sentença prolatada pela Corte entendeu que a lei de 1979 configura-se como uma autoanistia para os agentes do regime e, mais ainda, funciona como mecanismo de impunidade frente a graves violações de direitos humanos não passíveis de anistia segundo a Convenção de San José da Costa Rica. Em seu acórdão, a Corte não apenas considerou ilegal e nula de qualquer efeito a Lei de Anistia para o caso em análise – Guerrilha do Araguaia – como estabeleceu que a mesma lei não poderia obliterar a investigação e o processamento de qualquer outro crime de Estado.189 (grifo nosso) Por derradeiro, Leigh Payne et. al observa que em um contexto em que diversas nações no mundo tem se utilizado dos mecanismos de transição democrática, submetendo-se inclusive a Tribunais Internacionais e pautando seus interesses pela eficácia da norma global de responsabilização individual,190 o Brasil, diante da decisão recentemente prolatada pelo STF, encontra-se, paradoxalmente, apontando suas decisões internas para um horizonte diverso daquele anteriormente posicionado pela República Federativa do Brasil, ao se posicionar como nação protetora dos direitos humanos e signatária do Pacto de San José da Costa Rica. Assim, este capítulo passa a observar as nuances dos conflitos de interpretação da lei de anistia do caso brasileiro e os demais posicionamentos destacados no ambiente internacional de defesa dos direitos humanos. PAYNE, Leigh A.; ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. A Anistia na Era da Responsabilização: contexto global, comparativo e introdução ao caso brasileiro. In: A Anistia na Era da Responsabilização: o Brasil em perspectiva Internacional e Comparada, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, p.18-31, 2011. p.23. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID8F4D8A167F8D4E20ACEF9F0981BA8B55 PTBRNN.htm>. Acesso em 24 de outubro de 2011. 189 Ibid., p.23. 190 Ibid., p.22. 188 66 3.1 ADPF Nº153. ALCANCE DA LEI DE ANISTIA O julgamento da argüição de descumprimento de preceito fundamental nº 153 tinha por objetivo efetuar uma interpretação conforme à Constituição do § 1º do artigo 1º da Lei 6.683/1979, uma vez que a referida norma era considerada e ainda continua sendo como impeditiva à responsabilização dos agentes estatais pelas atrocidades praticadas durante o período de 1964 a 1985 no Brasil. O interessante nessa perspectiva é que, conforme salienta a professora Leigh Payne et. al, o STF ao meditar sobre o alcance da lei de anistia construiu um saída política para a não aplicação de princípios jurídicos previstos na Constituição e no Direito Internacional, sustentando um modelo de responsabilidade abstrata e impessoal do Estado, como a tida nos crimes de guerra anteriores às Convenções de Haia.191(grifo nosso). Todavia, olvidou-se das obrigações as quais o Estado de Direito por sua própria natureza reclama, pois, segundo Leigh Payne et. al, acima de qualquer relação de confiabilidade estabelecida entre o seu cidadão e o Estado do qual se faz parte, este, Estado, possui uma obrigação moral para com seus cidadãos que foram violados em suas liberdades e garantias fundamentais, as quais constituem o pilar do Estado compromissado como de Direito.192 Nesse sentido, o relatório do Secretário-Geral do Conselho de Segurança das Nações Unidas retrata com clareza as funções do Estado de Direito: O “Estado de Direito” é um conceito que está no centro da missão da Organização. Refere-se a um princípio de governança segundo o qual todas as pessoas, instituições e entidades, públicas e privadas, incluindo o próprio Estado, estão submetidas às leis que se promulgam publicamente, sendo igualmente impostas e independentemente aplicadas, e que são compatíveis com as normas e princípios internacionais de direitos humanos. Isso também requer medidas para assegurar o respeito aos princípios de supremacia da lei, igualdade diante da lei, responsabilidade para com a lei, equidade na aplicação da lei, separação de poderes, participação na tomada de decisões, legalidade, não arbitrariedade, transparência legal e processual.193 PAYNE, Leigh A.; ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. A Anistia na Era da Responsabilização: contexto global, comparativo e introdução ao caso brasileiro. In: A Anistia na Era da Responsabilização: o Brasil em perspectiva Internacional e Comparada, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, p.18-31, 2011. p.29. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID8F4D8A167F8D4E20ACEF9F0981BA8B55 PTBRNN.htm>. Acesso em 24 de outubro de 2011. 192 Ibid., p.25. 193 CONSELHO DE SEGURANÇA DAS NAÇÕES UNIDAS. O Estado de Direito e a justiça de transição em sociedades em conflito ou pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p. 320-351, jan.-jun., 2009. p.324. 191 67 O professor Paulo Abrão, em Seminário Internacional sobre Justiça Internacional Penal realizado no dia 13 de abril de 2010,194 véspera do julgamento da ADPF nº 153, tratou a respeito do alcance da lei de anistia. Nesta oportunidade, destacou que não é possível o reconhecimento da anistia aos crimes de tortura praticados durante o regime de exceção brasileiro, por uma simples compreensão do texto da Lei 6.683/79 e, principalmente, pelo fato do Estado não ter reconhecido, em momento algum, a prática de tal ilicitude. Acrescentou, ainda, que não há cabimento em considerar o crime de tortura como um delito conexo ao crime político, pois seria ilógico ou irracional fundamentar tal inferência perante bens jurídicos distintos os quais a lei pretende proteger. O sentido da anistia propugnada pelo governo ditatorial prevaleceu durante muito tempo como um perdão concedido tanto aos perseguidos assim como aos perseguidores políticos. Assim, é imprescindível explanar que o verdadeiro significado da anistia consiste “na possibilidade de um perdão concedido pela vítima em relação ao ato criminoso do Estado.” 195 No entanto, no julgamento da ADPF nº 153 a Suprema Corte Brasileira reconheceu a legitimidade da Lei nº 6.683/79, fundamentando, para tanto, que anistia foi um acordo político que beneficiasse ambas às partes (perseguidos e perseguidores políticos), bem como relatou, também, nas palavras de Paulo Abrão e Marcelo Torelly, que o respectivo preceito legal constituiu coluna de sustentação do Estado de Direito. 196 Os autores sustentam que, atualmente, a validade da referida lei reconhecida pelo STF é o grande obstáculo para o desenvolvimento da justiça de transição, uma vez que o reconhecimento formal da norma legal representa empecilho máximo para apuração dos ilícitos penais no período de exceção. Nesse norte, os trabalhos realizados pela Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) com o intuito de apurar as violações em massa perpetradas contra os cidadãos não possuem o condão de viabilizar o julgamento de seus algozes, mas, reforça a responsabilidade maior da Comissão em investigar os atos autoritários, com vistas à ABRÃO, Paulo. O alcance da lei de anistia: o último passo. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/main.asp?Team={2AD759EF-DCFB-46EB-A16C-73502B9C09EF}>. Acesso em 24 de outubro de 2011. 195 PISTORI, Edson Claudio; MOREIRA DA SILVA FILHO, José Carlos. Memorial da Anistia Política do Brasil. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.114-133, jan.-jun., 2009.p.124. 196 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. As dimensões da justiça de transição no Brasil, a eficácia da Lei de Anistia e as alternativas para a verdade e a justiça. In: A Anistia na Era da Responsabilização: o Brasil em perspectiva Internacional e Comparada, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, p.212-248, 2011. p.241. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID8F4D8A167F8D4E20ACEF9F0981BA8B55 PTBRNN.htm>. Acesso em 24 de outubro de 2011. 194 68 valorização da memória e à publicidade da verdade oficial, camuflada por aqueles que apoiaram a ditadura e permanecem no poder. Moreira da Silva Filho destaca o reconhecimento da lei de anistia pelo STF como um ato de conservadorismo, pois, assim como o Poder Judiciário anistiou formalmente perseguidos e agentes públicos pela prática de crimes de lesa-humanidade, até os dias de hoje, remanescem práticas de tortura para investigação criminal. Nesse diapasão, o autor assinala que “o Estado tem se revelado o principal autor dos crimes contra a humanidade.” 197 Moreira da Silva Filho ressalta ademais que [...] o julgamento da ADPF 153 no STF é a grande prova do quanto ainda estamos longe no Brasil de uma verdadeira ruptura com o passado autoritário. A ditadura no Brasil teve uma característica muito particular. Ela se preocupou em maquiar seus desmandos e suas práticas ditatoriais com um manto ou simulacro de legalidade. Esse fato causou a sensação, entre muitos dos juristas brasileiros, de que a Constituição de 1988 foi o fruto de um processo “natural” e de continuidade com a “legalidade” aqui instituída à base de Atos Institucionais. 198 (grifo nosso) Em que pese as discussões a respeito do alcance da Lei de Anistia pela Suprema Corte brasileira e a condenação do Brasil pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, criando um conflito manifesto de posicionamentos, inafastáveis são as considerações da professora Deisy Ventura: [...] no que concerne à segurança jurídica da qual os princípios da legalidade e da prescrição seriam garantes, questiono: qual interpretação da Lei de Anistia causa maior insegurança jurídica, a que torna possível o julgamento de um agente público por graves violações de Direitos Humanos cometidas durante um estado de exceção ou a que garante a impunidade das graves violações de Direitos humanos? A tolerância da prática de crimes contra a humanidade parece-me vertiginosamente mais ameaçadora à segurança jurídica de um Estado de Direito do que o postulado da imprescritibilidade desses crimes. Sim, a imprescritibilidade confronta os agentes da repressão à possibilidade de reversão de “fatos consumados”, gerando “insegurança” para determinado número de pessoas (supondo que o devido processo legal possa ser chamado de insegurança). Entretanto, quando a vítima é a humanidade e o algoz permanece impune, é o Estado de Direito que se esvai como promessa, gerando a pior das inseguranças coletivas.199 (grifo nosso) 197MOREIRA DA SILVA FILHO, José Carlos. Memória e reconciliação nacional: o impasse da anistia na inacabada transição democrática brasileira. In: A Anistia na Era da Responsabilização: o Brasil em perspectiva Internacional e Comparada, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, p.278-307, 2011. p.283-287. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID8F4D8A167F8D4E20ACEF9F0981BA8B55 PTBRNN.htm>. Acesso em 24 de outubro de 2011. 198 Ibid., p.305. 199 VENTURA, Deisy. A interpretação judicial da Lei de Anistia brasileira e o Direito Internacional. In: A Anistia na Era da Responsabilização: o Brasil em perspectiva Internacional e Comparada, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, p.308-343, 2011. p.335. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID8F4D8A167F8D4E20ACEF9F0981BA8B55 PTBRNN.htm>. Acesso em 24 de outubro de 2011. 69 Por todo o exposto, Ventura sintetiza que o alcance permeado pelo STF relativo à Lei de Anistia significa que “a impunidade das graves violações de direitos humanos cometidas por agentes públicos durante o regime militar estaria assegurada pela própria ordem constitucional.” 200 Ventura assevera, de forma complementar, que Os regimes que dão guarida a violadores de Direitos Humanos tendem a instalar, quando de sua ascensão ao poder, simulacros de Direito – o que, no caso brasileiro, chamamos de “Direito da ditadura” ou “entulho autoritário”, de árdua remoção quando do restabelecimento da democracia. 201 Destarte, Ventura ressalta a importância do Direito Internacional dos Direitos Humanos quando os próprios cidadãos de um determinado Estado não encontram proteção ou reconhecimento de seus direitos por parte de seu país. Clarifica a autora que a atuação subsidiária da “jurisdição internacional” ou “jurisdição universal penal” se materializa quando (i) não há mais Estado, ou (ii) quando o Direito ainda não veio ao Estado ou (iii) ou ainda quando veio mas não trouxe a remoção deste entulho.202 (grifo nosso). Ventura realça a autoridade do Direito Internacional no ordenamento jurídico brasileiro, delineando que, “o Brasil de hoje reconhece formalmente a imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade, como Direito convencional, por força da incorporação do Estatuto de Roma.” 203 A grande crítica que se constrói, doravante pelo autor da pesquisa, em torno da decisão do STF em relação ao julgamento da ADPF nº 153 é em relação à inobservância dos acordos, tratados e convenções internacionais de que o Brasil já manifestava sua adesão, desde 1926, quando aderiu à Convenção sobre a escravatura.204 Portanto, afigura-se anacrônico o posicionamento da Suprema Corte ao afirmar que o referido reconhecimento somente se opera a partir do tratado, sendo inaplicável aos fatos anteriormente praticados, quando a busca pela pacificação social se manifesta de forma global e a jurisprudência do Sistema Interamericano de Direitos Humanos é uníssona quanto à ineficácia das leis de autoanistia. VENTURA, Deisy. A interpretação judicial da Lei de Anistia brasileira e o Direito Internacional. In: A Anistia na Era da Responsabilização: o Brasil em perspectiva Internacional e Comparada, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, p.308-343, 2011. p.331-332. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID8F4D8A167F8D4E20ACEF9F0981BA8B55 PTBRNN.htm>. Acesso em 24 de outubro de 2011. 201 Ibid., p. 332. 202 Ibid., p.332. 203 Ibid., p.332. 204 Disponível em: <http://www2.mre.gov.br/dai/Home.htm>. Acesso em 25 de outubro de 2011. 200 70 Por último, o STF na análise da ADPF nº 153 firmou entendimento de que a Lei 6.683/79 foi fruto de um acordo político à época que não poderia ser revisto sob pena de oscilação das instituições democráticas, devendo ser interpretada como uma anistia ampla, geral e irrestrita, capaz de alcançar inclusive os agentes públicos, segundo lição da professora Baggio.205 3.2 CONDENAÇÃO DO BRASIL PELA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS PELOS PAÍSES DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS (OEA): CASO ARAGUAIA A Guerrilha do Araguaia, ocorrida entre 1972 a 1975, foi um movimento armado desenvolvido pelo Partido Comunista do Brasil, PCdoB, formado por dissidentes do Partido Comunista Brasileiro, na região da tríplice fronteira entre os estados do Pará, Maranhão e Goiás (hoje Tocantins), tendo como objetivo central a derrubada do regime militar, para, com isso, desencadear a Revolução Socialista no Brasil, partindo do campo para a conquista das cidades. A Guerrilha era formada por 69 militantes do PCdoB e por cerca de 20 moradores que aderiram ao movimento, distribuídos em três destacamentos. As Forças Armadas realizaram três campanhas militares, mobilizando cerca de 10 mil homens. No ano de 1972, foram feitos prisioneiros, mas, depois, a ordem do comando era matar todos os envolvidos. Há registros de que guerrilheiros foram levados vivos para as bases militares de Marabá, conhecida como casa Azul, ou Xambioá. Assim, o saldo final dos confrontos das operações militares foi de cerca de 70 pessoas desaparecidas entre militantes do PCdoB e moradores da região. Registra-se que 17 militantes do PCdoB sobreviveram: alguns conseguiram sair da região, outros abandonaram o movimento e, por fim, alguns guerrilheiros foram presos e não executados. 206 (Fonte: Memórias Reveladas. Arquivo Nacional. Com adaptações) O ajuizamento de ação perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos foi resultado da omissão estatal em responsabilizar a prática de detenção arbitrária, tortura e desaparecimento forçado de 70 pessoas, entre membros do Partido Comunista do Brasil e camponeses da região, assim como pela não abertura dos arquivos públicos e não revelação do paradeiro dos desaparecidos políticos da Guerrilha do Araguaia. Esta ação foi identificada BAGGIO, Roberta Camineiro. Anistia e reconhecimento: o processo de (dês)integração social da transição política brasileira. In: A Anistia na Era da Responsabilização: o Brasil em perspectiva Internacional e Comparada, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, p.250-277, 2011. p.253. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID8F4D8A167F8D4E20ACEF9F0981BA8B55 PTBRNN.htm>. Acesso em 25 de outubro de 2011. 206 Disponível em: <http://www.memoriasreveladas.arquivonacional.gov.br/multimidia/araguaia/araguaia.htm>. Acesso em 25 de outubro de 2011. 205 71 como o caso nº 11.552, conhecida como Julia Gomes Lund e outros versus República Federativa do Brasil em que pretenderam a responsabilização de operações do Exército brasileiro empreendidas entre 1972 e 1975 com o objetivo de erradicar a Guerrilha do Araguaia, no período do regime de exceção entre 1964 e 1985.207 No dia 24 de novembro de 2010, o Brasil foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos humanos sob os seguintes fundamentos: (i) pelo desparecimento forçado e pela violação dos direitos à personalidade jurídica, à vida, à integridade pessoal e à liberdade pessoal, às garantias judiciais e proteção judicial em combinação com a obrigação de respeitar os direitos previstos e o dever de adotar disposições de direito interno; (ii) pela aplicação da Lei de Anistia como empecilho à investigação, julgamento e punição dos crimes; (iii) pela ineficácia das ações judiciais não penais; (iv) pela falta de acesso à informação sobre o ocorrido com as vítimas desparecidas e executada; e (v) pela falta de acesso à justiça, à verdade e à informação.208 As considerações abaixo estão relacionadas, em síntese, com o pronunciamento da sentença prolatada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos condenando a República Federativa do Brasil pela inobservância das normas de defesa dos direitos humanos.209 Em análise da sentença proferida, o Brasil em sua peça contestatória sustenta a incompetência da Corte Interamericana para averiguar supostas violações que teriam ocorrido em momento anterior ao reconhecimento da competência do Tribunal. Rechaçando as alegações brasileiras, a Corte fundamentou sua competência, lecionando que, não obstante o Brasil ter ratificado a Convenção em 10 de dezembro de 1998, os fatos que requerem investigação são de caráter contínuo ou permanente, pois, entre a restrição de liberdade da vítima e até a presente falta de informação, não há informações a respeito de seu paradeiro ou destino. Portanto, a Corte é sim competente para analisar tais casos, mormente, em face da jurisprudência sedimentada por esse Tribunal. COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Demanda perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos: caso 11.552 – Julia Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia) contra a República Federativa do Brasil. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 2, jul.-dez., p.372484, 2009. p.373. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605-A9D85247054336A6}>. Acesso em 25 de outubro de 2011. 208 CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Caso Gomes Lund e outros (“Guerrilha do Araguaia”) VS. Brasil – Sentença de 24 de novembro de 2010. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em 25 de outubro de 2011. 209 Considerações efetuadas utilizando-se a fonte de pesquisa a seguir. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Caso Gomes Lund e outros (“Guerrilha do Araguaia”) VS. Brasil – Sentença de 24 de novembro de 2010. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em 26 de outubro de 2011. 207 72 Em sua resposta, o Estado brasileiro alegou ainda falta de interesse processual da Comissão para que se proceda ao exame do mérito. A Comissão rebateu as alegações, sustentando que o país não adotou os procedimentos necessários para solucionar as intempéries, confirmando, assim, sua autonomia para denunciar o caso a Corte Interamericana. A Comissão defende também que o interesse brasileiro relativo à preliminar de falta de interesse direciona-se no sentido de as medidas adotadas pelo Brasil não serem suficientes para elucidação das violações. A Corte, entretanto, salientou que não averigua-se no caso a prática de erro grave ou de desequilíbrio processual, o que não autoriza o reconhecimento da preliminar. Observou, também, que, mesmo após prorrogações dos prazos para apresentação do relatório nº 91/08 sobre as recomendações efetuadas pela Comissão, o Estado brasileiro não observou o prazo determinado e tampouco efetivou as medidas recomendadas. Ressaltou, ainda, que a proteção internacional de natureza convencional é complementar àquelas ofertadas pelo direito interno de cada país. O Brasil sustentou, também, em sede de preliminares, que não houve o esgotamento dos recursos internos brasileiros. Refutando tal alegação preliminar, a Corte destacou que somente reconhece o esgotamento dos recursos internos referentes à ação ordinária, pois, em que se cuida da ADPF, da ação civil pública e do recurso penal, todos esses ultrapassaram prazo considerado razoável para um posicionamento do Estado quanto aos anseios das vítimas. A regra da quarta instância e a falta de esgotamento da ADPF foi rejeitada salientando que a ADPF não é instrumento adequado para propiciar as devidas reparações, esclarecer os fatos, definir as respectivas responsabilidades individuais e esclarecer o paradeiro das vítimas. Além disso, aduziu que a pretensão da Corte não é efetuar uma revisão a respeito do posicionamento do STF frente à Lei de Anistia, mesmo porque tal pedido não foi entabulado. Todavia, a competência dessa corte decorre de avaliar as obrigações internacionais inerentes a cada caso e neste particular, o juízo de convencionalidade emitido por esta Corte com as obrigações internacionais do Brasil contidas na Convenção. No mérito, foi considerado que a posição do STF esbarrou em jurisprudência clara da Corte, assim como em norma de direito internacional, tal qual, jus cogens, norma de natureza obrigatória, contida na Convenção, para observação dos países. Evidenciou que, no que diz respeito aos direitos humanos, o controle de convencionalidade apresenta-se como uma Constituição supranacional. Realçou a importância de a Constituição Federal estar em harmonia com a Convenção de Direitos Humanos ou até mesmo serem elaborados projetos de 73 emenda constitucional que se alinhem nesse entendimento, citando, o exemplo do Chile. Registrou-se que o reconhecimento da responsabilidade estatal mostra-se limitada, requerendo maior aprofundamento e esclarecimento das demais violações. Acrescentou, ainda, que a Corte possui, sim, competência para apreciação dos crimes de lesa-humanidade em razão das obrigações internacionais inerentes à sua instituição e que o ato de ratificação não depende de sua confirmação, segundo o costume internacional. Asseverou, além disso, que não dispõe de competência para julgar os crimes praticados naquele contexto, mas, de outro lado, deve apreciá-los classificando-os como crimes de lesa-humanidade ou como graves para os direitos humanos. Ponderou a complementariedade dos direitos humanos, humanitário e penal internacional. Assegurou que as normas de direito interno não podem ser impeditivos para a execução de suas obrigações inalienáveis. Por fim, anotou que é preciso superar o positivismo exacerbado para que haja o reconhecimento dos direitos da pessoa humana, colaborando para redução da impunidade. Por todo o exposto, resta claro que os posicionamentos do Supremo Tribunal Federal e da Corte Interamericana de Direitos Humanos manifestam-se de maneira divergentes, não obstante, as restritas medidas de reparação implementadas pelo Estado brasileiro com a finalidade de compensar as violações executadas pelos agentes públicos. A Corte, por outro lado, pugna pela execução de estratégias de justiça transicional que se afastem das peculiaridades autoritárias, primando pela obrigação estatal em se pronunciar a respeito do paradeiro dos familiares das vítimas, uma vez que o próprio Estado, pelas poucas ações de investigação, reconhece as atrocidades praticadas contra aqueles que se insurgiram contra o regime político instaurado no Brasil. Atualmente, a abertura dos arquivos públicos, a criação de uma Comissão da Verdade, estruturada e capaz de investigar os fatos ocorridos no regime de exceção, e o alcance da lei de anistia abrangendo agentes públicos e perseguidos políticos são os maiores obstáculos para a consolidação do Estado de Direito e para a supremacia da democracia aliada ao exercício pleno e efetivo da cidadania. Não se mostra tardio enfatizar que este trabalho não possui caráter ideológico, mas visa analisar a evolução da interpretação jurídica dos direitos humanos em face do posicionamento do STF e dos demais acordos, tratados e convenções internacionais da qual o Brasil faz parte. Desse modo, o direito à verdade e ao destino das vítimas brasileiras apresenta-se inexorável, uma vez que, segundo Deisy Ventura, os atos investidos pelo Estado mostram-se com extrema barbárie: 74 Uma vez que o exército descobriu a existência do foco guerrilheiro, iniciou suas investidas na região. Em uma sequência de operações secretas que se desenrolaram por cerca de dois anos (1972 a 1974), o exército brasileiro envolveu o maior contingente até hoje mobilizado entre as suas fileiras após a Segunda Guerra Mundial. Foram de 3 mil a 10 mil homens, com aviões, helicópteros, carros de combate, embarcações de guerra, paraquedistas, e demais equipamentos para combater 75 guerrilheiros. As ordens dadas pelos presidente Emílio Garrastazu Médici era a de não deixar sobreviventes. Os corpos dos guerrilheiros e guerrilheiras até hoje não foram encontrados e as Forças Armadas se negam a abrir os seus arquivos. Os oficiais que atuaram na época e que ainda vivem também se negam a dar informações. Além dos guerrilheiros, muitos lavradores e lavradoras humildes foram torturados e tiveram suas casas e seus parcos bens destruídos. A Guerrilha do Araguaia é uma verdadeira ferida aberta na história do Brasil, visto que, de todas as histórias da ditadura militar, é a que está envolta em maior segredo e mistério, e que tem voltado à cena pública nos últimos anos [...] 210 (grifo nosso) Nesse contexto, a decisão da Suprema Corte Brasileira mostra-se incoerente com os fundamentos e princípios norteadores do Estado Democrático de Direito ao qual o Brasil se comprometeu a cumprir. De outro lado, a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos vela pelo respeito e defesa dos direitos humanos, quando estes deixaram de ser observados pelo próprio Estado, tendo em vista que, até mesmo “na história da humanidade, os povos mais sanguinários interrompiam suas batalhas em curtas tréguas para troca de cadáveres, possibilitando a cada exército, tribo ou nação prantear seus mortos, fazendo o funeral o encerramento simbólico do ciclo da vida.” 211 Malgrado a transição democrática brasileira deveras ser lenta e gradual, essas discussões no cenário político e jurídico brasileiro são extremamente pertinentes, pois, conforme ensina o professor Antônio Leal de Oliveira, é essa dívida que se pretende pagar, a dívida assumida com as vítimas do regime militar que pagaram com suas vidas pela derrubada desse regime, que sofreram nas celas as violências mais vis, que viram seus filhos saírem por uma porta que não mais foi aberta para que entrassem. Essa dívida acumula juros quando, a despeito de sofrimento passado, ainda vivencia-se um Estado violento, que vale das masmorras (cadeias) como depósito de pessoas, que ainda faz uso da tortura para obter confissões e informações que deseja, que extermina nossos filhos quando lhe convêm.212 VENTURA, Deisy. A interpretação judicial da Lei de Anistia brasileira e o Direito Internacional. In: A Anistia na Era da Responsabilização: o Brasil em perspectiva Internacional e Comparada, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, p.308-343, 2011. p.306. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID8F4D8A167F8D4E20ACEF9F0981BA8B55 PTBRNN.htm>. Acesso em 25 de outubro de 2011. 211 Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre mortos e desaparecidos. Direito à memória e à verdade. In: Apresentação, Brasília, Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007. Disponível em:<http://portal.mj.gov.brsedhbibliotecalivro_direito_memoria_verdadelivro_direito_memoria_verdade_ sem_a_marca.pdf>. Acesso em: 25 de outubro de 2011. 212 OLIVEIRA, Antônio Leal de. O perdão e a reconciliação com o passado em Hannah Arendt e Jacques Derrida. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.203-227, jan.-jun., 2009.p.208-9. 210 75 Ademais, a condenação do Brasil pela Corte Interamericana de Direitos Humanos é mais uma dentre muitas outras ações que demonstram a violação dos direitos fundamentais perpetrada pelo próprio Estado. Nesse sentido, insta consignar, por fim, a lição de Viviana Krsticevic e Beatriz Affonso: Se hoje o Estado brasileiro reconhece na democracia a brutalidade e a magnitude da repressão da ditadura militar que assolou o país, e tem avançado nas indenizações aos familiares mortos, torturados, perseguidos e desparecidos políticos, existe uma dívida pendente no acesso à verdade, à justiça e à reparação desde uma perspectiva integral, que transcende o tempo e se consolida perversamente em práticas violatórias e inabalável impunidade garantida aos agentes do Estado.213 3.3 A CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS COMO INSTÂNCIA MÁXIMA JUDICIAL NO BRASIL PARA MATÉRIA DE DIREITOS HUMANOS No que tange à competência da Corte Interamericana de Direitos Humanos e a aplicação de sua jurisprudência no ordenamento jurídico brasileiro, nota-se a lição de Deisy Ventura: Logo, para entender o problema do alcance da jurisprudência interamericana no Direito brasileiro, deixando de lado a questão da difícil permeabilidade da cultura internacionalista na autarquia intelectual do Judiciário brasileiro, questiono: a já mencionada reserva feita pelo Brasil, quando de sua submissão à jurisdição da CIDH, teria sentido em relação ao acervo jurisprudencial da Corte? Um marco temporal, quando figura numa reserva, pode atingir fatos e atos específicos? Ora, parece-me insustentável fatiar a submissão de um Estado a uma jurisdição, ao menos no que diz respeito aos princípios fundamentais que ela edificou. Em qualquer caso, de modo mais bem singelo, admitamos – eis que até o STF já o reconheceu, embora não no seio da ADPF 153 – que estamos diante de crimes continuados.214 (grifo nosso) Corroborando de igual raciocínio, pertinente é a lição do eminente jurista Antônio Augusto Cançado Trindade ao lecionar que o requisito do formalismo não pode constituir 213KRSTICEVIC, Viviana; AFFONSO, Beatriz. A dívida histórica e o Caso Guerrilha do Araguaia na Corte Interamericana de Direitos Humanos impulsionando o direito à verdade e à justiça no BRasil. In: A Anistia na Era da Responsabilização: o Brasil em perspectiva Internacional e Comparada, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, p.344-390, 2011. p.355. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID8F4D8A167F8D4E20ACEF9F0981BA8B55 PTBRNN.htm>. Acesso em 25 de outubro de 2011. 214 VENTURA, Deisy. A interpretação judicial da Lei de Anistia brasileira e o Direito Internacional. In: A Anistia na Era da Responsabilização: o Brasil em perspectiva Internacional e Comparada, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, p.308-343, 2011. p.337-8. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID8F4D8A167F8D4E20ACEF9F0981BA8B55 PTBRNN.htm>. Acesso em 27 de outubro de 2011. 76 motivo impeditivo para a validade das normas internacionais em detrimento do direito interno.215 Nesse particular, o caso brasileiro assemelha-se ao caso chileno em que a Suprema Corte Chilena negou aplicabilidade do Pacto de Direitos Civis e Políticos pela ausência de publicação no diário oficial.216 No mesmo sentido, pautou-se o Brasil em sua contestação da APDF 153 relatando que aderiu à Convenção Americana de Direitos Humanos, no entanto, sua ratificação somente se operou em 10 de dezembro de 1998, razão pela qual encontra-se destituída de qualquer eficácia para produzir efeitos a fatos anteriores à sua ratificação. Conforme ensina a professora Flávia Piovesan, a assinatura do tratado, após seu processo de formação, por intermédio do Poder Executivo, corresponde apenas a autenticidade e definitividade do tratado, uma vez que o aceite possui natureza precária e provisória. Malgrado a assinatura tenha se operado, somente o ato de ratificação constitui ato hábil e capaz de produção de efeitos. Segundo a autora, a ratificação é ato jurídico que irradia necessariamente efeitos no plano internacional, posto que os tratados não podem criar obrigações para os Estados que neles não consentiram, ao menos que preceitos constantes do tratado não tenham sido incorporados pelo costume internacional.217 (grifo nosso) Portanto, conforme as exposições destacadas pelos autores Flávia Piovesan e Cançado Trindade, o ato de aceitação do tratado e sua posterior ratificação representa a titularidade de direitos e deveres por parte daquele Estado. Assim, a argumentação do STF alegando a impossibilidade de observação dos preceitos relativos à Convenção Americana de Direitos Humanos, no que diz respeito aos fatos praticados no período de 1964 a 1985, é improcedente, vez que, conforme acima delineado, o ato de ratificação autoriza a produção – irradiação – de efeitos no plano internacional. Ainda mais, conforme Piovesan, quando a própria Carta de 1967 já previa em seu artigo 153, § 36 o respeito a outros direitos e garantias decorrentes do regime e dos princípios que ela adota. Portanto, a Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5º, § 2º “assume expressamente o conteúdo constitucional dos direitos constantes dos tratados internacionais dos quais o Brasil é parte.” 218 Ao tratar da inclusão de novos direitos decorrentes de tratados internacionais de que o Brasil é signatário, Flávia Piovesan destaca que CANÇADO TRINDADE, Augusto Antônio. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997 (1a. ed.), 2003 (2a.ed.), volume I. p.546. 216 Ibid., p.546. 217 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. – 12. ed. rev. e atual. –São Paulo: Saraiva, 2011. p.99. 218 Ibid., p.104-7. 215 77 esse elenco de direitos enunciados em tratados internacionais de que o Brasil é parte inova e amplia o universo de direitos nacionalmente assegurados, na medida em que não se encontram previstos no Direito interno. Desse modo, percebe-se como o Direito Internacional dos Direitos Humanos inova, estende e amplia o universo dos direitos constitucionalmente assegurados. 219 Nesse norte, Cançado Trindade observa que atitudes como esta, reveladoras de um dualismo fictício e descabido, atentam contra a unidade de solução jurídica e esvaziam o Direito de todo o sentido. Não há como reconhecer ou admitir as obrigações convencionais contraídas por um Estado no plano internacional e ao mesmo tempo negar-lhes vigência no plano do direito interno.220 (grifo nosso) Cançado Trindade salienta que o direito internacional e o direito interno não comportam tratamento de maneira dissociada, pois as obrigações internacionais decorrentes dos direitos humanos não se aplicam somente aos Estados que aderiram ao Pacto ou Convenção, mas também, àqueles que se submetem ao ordenamento jurídico interno daquele país.221 Mazzuoli denomina esse movimento como sendo o controle de convencionalidade efetuado pelo Poder Judiciário ao efetuar a validade das normas internas, visto que estas devem observar (i) a Constituição Federal, (ii) os tratados internacionais ratificados pelo Brasil e (iii) também os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo país.222 Especificamente, Mazzuoli designa esse controle das normas como sendo uma dupla compatibilidade vertical material, em que a vigência e a validade das normas jurídicas internas para que tenham validade jurídica devem observar a Constituição e os tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil. Acrescenta o autor que “o controle de convencionalidade tem por finalidade compatibilizar verticalmente as normas domésticas (as espécies de leis, lato sensu, vigentes no país) com os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Estado e em vigor no território nacional.” 223 Em síntese, Mazzuoli afirma que doravante, não somente os tribunais internos devem realizar o controle de convencionalidade (para além do clássico controle de constitucionalidade), mas também os tribunais internacionais (ou supranacionais) criados por convenções entre Estados, em que estes (os Estados) se comprometem, no pleno e livre exercício de PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. – 12. ed. rev. e atual. –São Paulo: Saraiva, 2011. p.152-3. 220 CANÇADO TRINDADE, Augusto Antônio. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997 (1a. ed.), 2003 (2a.ed.), volume I. p.536. 221 CANÇADO TRINDADE, Augusto Antônio. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997 (1a. ed.), 2003 (2a.ed.), volume I. p.547-8. 222 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Teoria geral do controle de convencionalidade no direito brasileiro. In: Revista de Informação Legislativa, Brasília, n. 181, p.113-139, jan.-mar., 2009. p.128. Disponível em: <http://www2.senado.gov.br.bdsf.bitstream.id.194897.1.000861730.pdf.>. Acesso em: 26 de outubro de 2010. 223 Ibid., p.125. 219 78 sua soberania, a cumprir tudo o que ali fora decidido e a dar sequência, no plano do seu direito interno, ao cumprimento de suas obrigações estabelecidas na sentença, sob pena de responsabilidade internacional. 224 Em suma, Mazzuoli conclui que ao STF realizar o controle de constitucionalidade deve observar a Constituição e os tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil. 225 No entanto, conforme destaca Deisy Ventura, “este Direito Internacional não foi empregado, em momento algum, no julgamento da ADPF 153.” 226 Nesse particular, a posição manifestada acima é perfeitamente condizente e razoável com as obrigações inerentes ao Estado em seu dever de defesa e garantia dos direitos fundamentais internas, assim como aquelas decorrentes de tratado internacional do qual o país se comprometeu a cumprir, vez que seria senão controverso o Estado efetuar adesão à determinado Pacto ou Tratado e, por conseguinte, ser inobservado pelos Tribunais internos ao reconhecer a produção de seus efeitos. Enriquecendo as lições de Mazzuoli, relevantes são as colocações de Flávia Piovesan ao destacar a influência do Direito Internacional pelo direito português, ao tratar da incorporação automática dos tratados de direitos humanos à Magna Carta, visto que o regime jurídico reconhecido aos tratados de direitos humanos possui status constitucional e aplicação imediata, por imperativo lógico do artigo 5º, §§ 1º e 2º da Magna Carta. Enquanto, os demais tratados possuem status infra-constitucional e aplicação não imediata, vez que o artigo 102, III, b da Constituição Federal não permite sua aplicação imediata.227 Nesse passo, apresentam-se oportunos os artigos 27 e 46 da Convenção de Viena, adotados em 26 de maio de 1969 e que passaram a produzir efeitos em âmbito internacional em 27 de janeiro de 1980.228 Artigo 27. Uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado. Esta regra não prejudica o artigo 46. 229 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Teoria geral do controle de convencionalidade no direito brasileiro. In: Revista de Informação Legislativa, Brasília, n. 181, p.113-139, jan.-mar., 2009. p.129. Disponível em: <http://www2.senado.gov.br.bdsf.bitstream.id.194897.1.000861730.pdf.>. Acesso em: 26 de outubro de 2010. 225 Ibid., p.129-0. 226 VENTURA, Deisy. A interpretação judicial da Lei de Anistia brasileira e o Direito Internacional. In: A Anistia na Era da Responsabilização: o Brasil em perspectiva Internacional e Comparada, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, p.308-343, 2011. p.322. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID8F4D8A167F8D4E20ACEF9F0981BA8B55 PTBRNN.htm>. Acesso em 27 de outubro de 2011. 227 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. – 12. ed. rev. e atual. –São Paulo: Saraiva, 2011. p.146-7. 228 Brasil. Ministério das Relações Exteriores. Disponível em: <http://www2.mre.gov.br/dai/dtrat.htm>. Acesso em 31 de outubro de 2011. 229 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Decreto/D7030.htm>. Acesso em 31 de outubro de 2011. 224 79 Artigo 46. 1. Um Estado não pode invocar o fato de que seu consentimento em obrigar-se por um tratado foi expresso em violação de uma disposição de seu direito interno sobre competência para concluir tratados, a não ser que essa violação fosse manifesta e dissesse respeito a uma norma de seu direito interno de importância fundamental. 2. Uma violação é manifesta se for objetivamente evidente para qualquer Estado que proceda, na matéria, de conformidade com a prática normal e de boa fé. 230 Portanto, a inobservância da Suprema Corte Brasileira aos tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário é inconteste, vez que, ao analisar a constitucionalidade da Lei de Anistia, os ministros deste Tribunal Constitucional alegaram a impossibilidade de revisar o texto jurídico, pois este teria sido fruto de um acordo político firmado entre o Estado e a sociedade. Constata-se, portanto, que o STF ao apreciar o alcance da lei de anistia invocou o próprio direito interno, desconsiderando os tratados internacionais firmados pelo Brasil e o entendimento pacificado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos quanto às leis de autoanistia. Não obstante, a inobservância dessas normas internacionais incorporadas ao direito interno brasileiro e os tratados internacionais de que o Brasil faz parte, é mister enfatizar a competência da Corte Interamericana de Direitos Humanos para apreciar as violações decorrentes das ações ou omissões do Estado brasileiro em seu dever de defesa dos direitos humanos de seus cidadãos. Viviana Krsticevic e Beatriz Affonso ensinam que “o Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos é o mecanismo regional estabelecido pela Organização dos Estados Americanos (OEA) para promover e defender os direitos humanos.” 231 As autoras destacam que esse sistema é formado pela Comissão Americana de Direitos Humanos, mais conhecida como o Pacto de San José da Costa Rica, aprovada no Brasil pelo Decreto Legislativo 27, de 25 de setembro de 1992, e promulgada pelo Decreto presidencial 678, de 6 de novembro de 1992. Além da Comissão, integra esse sistema a Corte Interamericana de Direitos humanos, a qual foi estabelecida pela Convenção Americana de Direitos Humanos em 1978. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Decreto/D7030.htm>. Acesso em 31 de outubro de 2011. 231 KRSTICEVIC, Viviana; AFFONSO, Beatriz. A dívida histórica e o Caso Guerrilha do Araguaia na Corte Interamericana de Direitos Humanos impulsionando o direito à verdade e à justiça no Brasil. In: A Anistia na Era da Responsabilização: o Brasil em perspectiva Internacional e Comparada, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, p.344-390, 2011. p.356. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID8F4D8A167F8D4E20ACEF9F0981BA8B55 PTBRNN.htm>. Acesso em 27 de outubro de 2011. 230 80 Dentre as competências da Comissão as autoras Viviana Krsticevic e Beatriz Affonso ressaltam a realização de visitas e estudos dos direitos humanos na região, adoção de posições pública e processamento de denúncias individuais de violações de direitos humanos. Diferentemente, a Corte tem por finalidade o processamento da responsabilidade estatal por violações dos direitos humanos. Assim, as autoras destacam a essencialidade dos órgãos do Sistema Interamericano de Direitos humanos no sentido de que, durante as últimas décadas, a Comissão e a Corte Interamericana têm contribuído para o restabelecimento do direito das vítimas e das sociedades devastadas por graves e sistemáticas violações aos direitos humanos ocorridas durante as infelizmente notórias ditaduras da América Latina e os conflitos internos na região.232 Por todo o exposto, referente à incorporação das normas internacionais ao direito interno brasileiro e seu consequente controle de convencionalidade somado à competência da Corte Interamericana de Direitos humanos como instância máxima no Brasil em matéria de direitos humanos, confira-se o ensino do eminente juiz Antônio Augusto Cançado Trindade: Cabe, pois, naturalmente aos tribunais internos interpretar e aplicar as leis dos países respectivos, exercendo os órgãos internacionais especificamente a função de supervisão, nos termos e parâmetros dos mandatos que lhes foram atribuídos pelos tratados e instrumentos de direitos humanos respectivos. Mas cabe, ademais, aos tribunais internos, e outros órgãos dos Estados, assegurar a implementação em nível nacional das normas internacionais de proteção, o que realça a importância de seu papel em um sistema integrado como o da proteção dos direitos humanos, no qual as obrigações convencionais abrigam um interesse comum superior de todos os Estados partes, o da proteção do ser humano. Os órgãos de supervisão internacionais, por sua vez, controlam a compatibilidade da interpretação e aplicação do direito interno com as obrigações convencionais, para determinação dos elementos factuais a serem avaliados para o propósito da aplicação das disposições pertinentes dos tratados de direitos humanos. 233 (grifo nosso) Por fim, resta claro, pois, a competência da Corte Interamericana para a responsabilização do Estado brasileiro perante as violações de direitos humanos consubstanciadas por meio da ação ou omissão estatal, eis que os tratados internacionais firmados pelo Brasil e os preceitos constitucionais autorizam o exame da matéria por esta Corte. É certo, porém, a inobservância dos direitos humanos pelos tribunais brasileiros na aplicação da norma legal, assim como ocorreu no julgamento da ADPF 153. No entanto, é KRSTICEVIC, Viviana; AFFONSO, Beatriz. A dívida histórica e o Caso Guerrilha do Araguaia na Corte Interamericana de Direitos Humanos impulsionando o direito à verdade e à justiça no Brasil. In: A Anistia na Era da Responsabilização: o Brasil em perspectiva Internacional e Comparada, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, p.344-390, 2011. p.356. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID8F4D8A167F8D4E20ACEF9F0981BA8B55 PTBRNN.htm>. Acesso em 27 de outubro de 2011. 233 CANÇADO TRINDADE, Augusto Antônio. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997 (1a. ed.), 2003 (2a.ed.), volume I. p.521-2. 232 81 forçoso pautar-se por esse entendimento, posto que a proteção dos direitos humanos e das liberdades públicas são direitos indisponíveis e inalienáveis, não comportando, portanto, qualquer espécie de transação, em um contexto mundial que caminha para consolidação da pacificação social. 82 CONCLUSÃO A discussão desta pesquisa teve por escopo demonstrar os efeitos que se irradiam, a partir da concepção de Estado de direito, e sua dependência aos institutos da política e do direito, principalmente, analisando as violações de direitos humanos em um Estado que se diz democrático de direito como o Brasil, o qual autorizou o alcance da anistia aos torturadores políticos. Além disso, detalhamos as medidas aconselhadas pela justiça transicional para condução da pacificação social. Ademais, ressaltamos a relevância dos tratados de direitos internacionais de direitos humanos, sua influência no direito interno brasileiro e, por conseguinte, a competência da CIDH como instância máxima judicial brasileira no que tange aos direitos humanos. A partir disso, depreende-se, inicialmente, que é manifesta a inobservância dos tratados internacionais de direitos humanos pela Suprema Corte Brasileira. Ao revés, a sua observância ocorre de acordo com o entendimento de seus ilustres ministros, pois ao estipular precedente sobre a impossibilidade da restrição de liberdade do depositário infiel, utilizou-se do Pacto de San José da Costa Rica. Ao elaborar a súmula vinculante a respeito do uso de algemas, invocou as regras das Organizações das Nações Unidas para tratamento de prisioneiros, segundo observa Lenio Streck.234 No entanto, ao apreciar o alcance da lei de anistia escusou-se do uso desta fonte de direito reconhecida pela própria Constituição Federal. Nesse norte, revela-se uma profunda insegurança jurídica ao cuidar de normas de caráter internacional que produzem efeitos no ordenamento jurídico brasileiro, mormente, quando se verifica que não há um posicionamento consolidado pelo STF. Em que pese as considerações acima delineadas, acredito que a insegurança jurídica visualizada no alcance da anistia se coaduna com uma questão desenvolvida pelo professor Lenio Streck, a saber, a discricionariedade da decisão judicial. Quando se expressa uma versão crítica e contrária à decisão daquela apontada pelo julgamento da ADPF 153 não se está a dizer que a discricionariedade da decisão judicial é um ato de proibição de interpretar. Ao revés, conforme salienta Streck, esta impossibilidade reside nas hipóteses em que os juízes, no exercício da atividade judicial, revestem-se do poder legislador. E nesse particular, Streck observa: [...] esse “poder discricionário” propicia a “criação” do próprio objeto de “conhecimento”, típica manifestação do positivismo. Ou seja, a razão humana STRECK, Lenio. A Lei de Anistia, a Constituição e os direitos humanos no Brasil: Lenio Streck responde. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 2, jul.-dez., 2009. p.26. 234 83 passa a ser a “fonte iluminadora” do significado de tudo que possa ser enunciado sobre a realidade. As coisas são reduzidas aos nossos conceitos e às nossas concepções de mundo, ficando à dis-posição de um protagonista (intérprete lato sensu). Consequências disso? Inúmeras.235 (grifo nosso) Portanto, conforme leciona Streck existe uma grande diferença entre o que é uma escolha e o que é uma decisão, uma vez que a carga de pré-compreensão a respeito daquela matéria não pode ser o fio condutor para solução de determinada controvérsia. 236 Se o Tribunal Constitucional posicionou-se anteriormente pelos efeitos produzidos pelas normas de caráter internacional, seria, no mínimo, lógico que seu parecer se orientasse como os demais casos apreciados pela Corte. Noutro olhar, é possível perceber diante do retrocesso jurídico prolatado pela Suprema Corte diante da ADPF 153 que tal decisão constitui, senão, aquilo que Castor Ruiz denomina de o estado de exceção como paradigma de governo: Nos regimes absolutistas, como nos autoritarismos, a exceção é a norma, já que a norma emana da vontade soberana que vigora com pleno arbítrio. O Estado de direito foi instituído para abolir a arbitrariedade da vontade soberana e em seu lugar instituir a lei de forma isonômica. Porém, o que a tese de Agamben desvela é que o Estado de direito não conseguiu abolir plenamente a vontade soberana, senão que ela persiste oculta como potência do Estado para ser utilizada quando necessário.237 (grifo nosso) Um dos maiores clamores da justiça transicional é a necessidade de reforma das instituições democráticas. Nessa esteira, são clarividentes as raízes da ditadura ainda presentes nos órgãos de cúpula, exercendo influência e produzindo efeitos de forma que se oculte a responsabilidade estatal pelas atrocidades praticadas no regime de exceção. Daí, a necessidade de implantação das medidas de justiça transicional a fim de que se reconstrua a estrutura do Estado democrático de Direito e não haja a supremacia da vontade soberana do Estado, ainda que camuflada, mas, sim, a supremacia da democracia livre e o pleno exercício da cidadania em suas diversas manifestações. Além disso, a República Federativa do Brasil assumiu o compromisso de Estado Democrático e de Direito. Portanto, fazer uso da exceção como técnica de governo constitui uma verdadeira afronta ao Estado democrático de direto insculpido na Magna Carta de 88. Lembremos, pois, os compromissos inerentes à sua instituição, que tem por obrigação STRECK, Lenio. O que é isto – decido conforme minha consciência? Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2010. p.87. 236 Ibid., p.97. 237 RUIZ, Castor. O Estado de exceção como paradigma de governo. In: Revista do Instituto Humanitas Unisinos: Direito à cidadania. A política social brasileira em debate, Brasília, n. 373, ano XI, 12.09.2011, ISSN 1981-8769. Disponível em: <>. Acesso em 27 de outubro de 2011. 235 84 promover o mínimo existencial para seus cidadãos, assegurando, da mesma forma, a efetividade dos direitos fundamentais e das liberdades públicas. Por derradeiro, diante dos inúmeros estudos desenvolvidos no mundo, é nítida a necessidade de implantação das medidas de justiça transicional para o repúdio da formas que se assemelham ao totalitarismo ou absolutismo. A impunidade nesse contexto é uma das características mais marcantes nos países emergentes do período ditatorial, conforme destaca Kathryn Sikkink & Carrie Booth Walling e Viviana Krsticevic & Beatriz Affonso. E, no Brasil não é diferente. Conforme destaca Flávia Piovesan apud Kathryn Sikkink238 & Carrie Booth Walling239 o julgamento de violações de direitos humanos pode também contribuir para reforçar o Estado de Direito, como ocorreu na Argentina.(...) os cidadãos comuns passam a perceber o sistema legal como viável e legítimo se a lei é capaz de alcançar os mais poderosos antigos líderes do país, responsabilizando-os pelas violações de direitos humanos do passado. O mais relevante componente do Estado de Direito é a ideia de que ninguém está acima da lei. Desse modo, é difícil construir um Estado de Direito ignorando graves violações a direitos civis e políticos e fracassando ao responsabilizar agentes governamentais do passado e do presente (...).240 (grifo nosso) Assim, diante do reconhecimento pelo STF da anistia aos torturadores políticos, constata-se a plena impossibilidade de julgamento de agentes estatais violadores dos direitos humanos, reconhecido pelo próprio Estado, e que não podem ser julgados, conforme o entendimento da Suprema Corte Brasileira, a qual caminha em direção contrária a todos os precedentes consolidados pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. Portanto, a referida decisão configura a institucionalização da impunidade, pois inviabilizou o julgamento dos agentes públicos, aquiescendo, a contrario sensu, com os atos envidados pelo Estado brasileiro. Como dito, o desígnio desta pesquisa não possui finalidade ideológica, mas, sim, examinar os efeitos decorrentes do alcance da lei de anistia. Lenio Streck (2009) apud Gabriel Garcia Marques considera que assim como “em Mancondo, o mundo era tão recente que muitas coisas careciam de nome e para mencioná-la precisava-se apontar com o dedo” 241 , PhD em Ciência Política pela Universidade de Columbia, 1988. Disponível em: <http://jpr.sagepub.com/content/44/4/427>. Acesso em 4 de novembro de 2011. 239 Candidata a PhD em Ciência Política pela Universidade de Minnesota. Disponível em: <http://jpr.sagepub.com/content/44/4/427>. Acesso em 4 de novembro de 2011. 240 PIOVESAN, Flávia. Direito Internacional dos Direitos humanos e lei de anistia: o caso brasileiro. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 2, jul.-dez., p.176-189, 2009. p.185-6. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={72590C4A-B0ED-4605-A9D85247054336A6}>. Acesso em: 4 de novembro de 2011. 241 OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni; MACHADO, Felipe Daniel Amorim. Constituição e processo: A resposta do constitucionalismo à banalização do terror. – Belo Horizonte: Del Rey, 2009. 238 85 que o exercício da democracia no Brasil é tão incipiente que pode(ria) se apontar com o dedo a melhor solução jurídica a ser traçada na concessão da anistia aos agentes estatais. Ademais, reitera-se que aquilo que é Direito não é o apregoado pela Suprema Corte brasileira, mas, senão, conforme bem observa Lenio Streck, “é uma questão de democracia.”242 STRECK, Lenio. O que é isto – decido conforme minha consciência? Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2010. p.87. 242 86 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA 1 BOTTINI, Pierpaolo Cruz e et. al. Lei da anistia: com a palavra, O STF. Boletim IBDCRIM, ano nº 17, nº 225, dez./2009. p.4. 2 GENRO, Tarso; PIRES JUNIOR, Paulo Abrão. Anistia Política no Brasil: caminhos para efetivação da Justiça de Transição. In: Relatório Anual da Comissão de Anistia, Brasília, dez., 2007. p.5. 3 Inês Virgínia Prado e KISHI, Sandra Akemi Shimada. Memória e verdade: a justiça de transição no Estado democrático brasileiro. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p.15. 4 SOARES CARPIZO, Jorge. El contenido material de La democracia: tendencias actuales Del constitucionalismo latinoamericano. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p.3. 5 PRADO SOARES, Inês Virginia. Justiça de transição. Disponível em: <http://www.esmpu.gov.br/dicionario/tiki-index.php?page=Justi%C3%A7a+de+transi%C3%A7%C3%A3o>. Acesso em: 03 de agosto de 2011. 6 Sou responsável por esta tradução. BORAINE, Alexander L. Transitional justice: a holistic interpretation. Disponível em: <http://jia.sipa.columbia.edu/files/jia/17-27_boraine.pdf>. Acesso em: 08 de agosto de 2011. 7 NAÇÕES UNIDAS – Conselho de Segurança. O Estado de Direito e a justiça de transição em sociedades em conflito ou pós-conflito. Relatório do Secretário Geral S/2004/616. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.320-351, jan-jun. 2009. p.325. 8 FERREIRA BASTOS, Lucia Helena Arantes. As reparações por violações de direitos humanos em regimes de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.228-249, jan-jun. 2009. p.240. 9 CASTRO EMÍGIO, Rodrigo Ferraz de. Democracia e anistia política: rompendo com a cultura do silêncio, possibilitando uma justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.178-202, jan-jun. 2009. p.195. 10 Repressão e Memória Política no Contexto Ibero-Brasileiro: estudos sobre Brasil, Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal. – Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, 2010. 11 SILVA FILHO, José Carlos da. O julgamento da ADPF 153 pelo Supremo Tribunal Federal e a Inacabada Transição Democrática Brasileira. Disponível em: http://idejust.wordpress.com/biblioteca/artigosacademicos/>. Acesso em: 16 de setembro de 2011. 12 O ICTJ foi concebido em uma reunião estratégica propiciada pela Fundação Ford em abril do ano 2000. Os participantes, entre os quais especialistas na área jurídica, defensores de direitos humanos e funcionários, se reuniram para discutir maneiras de contribuir para a efetividade no campo da justiça transicional em conjunto crescimento no mundo. Como conseqüência, a Fundação pediu a três consultores – Alex Boraine, Priscilla Hayner, e Paul van Zyl – que desenvolvessem um plano para uma organização com tal objetivo. A proposta inicial foi a de realizar um trabalho em conjunto com diversos países durante cinco anos e obteve apoio da Fundação Ford, da Fundação Catherine T. e John D. MacArthur, a Coorporação Carnegie de Nova York, o Fundo dos Irmãos Rockefeller e o Fundo da Família Andrus. ICTJ Brasil. Julho 2011. Disponível em: <http://www.ictj.org 13 ICTJ Briefing. International Policy Relations. Transitional Justice in the United Nations Human Rights Council. Disponível em: <http://ictj.org/sites/default/files/ICTJ-Global-TJ-In-HRC-2011-English.pdf>. Acesso em: 17 de setembro de 2011. 14 Repressão e Memória Política no Contexto Ibero-Brasileiro: estudos sobre Brasil, Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal. – Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, 2010. p.23. 15 Mestre e Doutor pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e pós-doutor pela Universidade Lisboa. O professor de Graduação e Pós-Graduação (mestrado e doutorado) do Centro de Ciências Jurídicas da Unisinos Lenio Streck é também membro da Comissão Permanente de Direito Constitucional do Instituto dos Advogados Brasileiros e presidente de honra do Instituto de Hermenêutica Jurídica. 16 STRECK, Lenio. A Lei de Anistia, a Constituição e os direitos humanos no Brasil: Lenio Streck responde. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.2, p.24-30, jul-dez. 2009. p.24. 17 Professor Doutora em Direito Constitucional e Direitos Humanos da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Professora de Direitos Humanos dos Programas de Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e da Universidade Pablo Olavide (Sevilha, Espanha); visiting fellow do Human Rights Program da Harvard Law School (1995 e 2000), visiting fellow do Centre for Brazilian Studies da Universidade of Oxford (2005), visiting fellow do Max Planck Institute for Comparative Public Law and International Law (Heidelberg – 2007 e 2008), sendo atualmente Humboldt Foundation Georg Forster Research Fellow no Max Plank Institute (Heidelberg -2009 -2011). Procuradora do Estado de São Paulo, membro do Clamdem (Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher), membro do Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, e da SUR – Human Rights University Network. 18 PIOVESAN, Flávia. Direito Internacional dos direitos humanos e Lei de Anistia: o caso brasileiro. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 2, jul.-dez., 2009. p.186. 87 19 ZYL, Paul Van. Promovendo a justiça transicional em sociedades pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.32-55, jan.-jun., 2009. p 32. 20 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. – 24. ed. – São Paulo: Saraiva, 2003.p.15. 21 Ibid., p.15-16. 22 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. – 24. ed. – São Paulo: Saraiva, 2003. p.128. 23 STRECK, Lenio. A Lei de Anistia, a Constituição e os direitos humanos no Brasil: Lenio Streck responde. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 2, jul.-dez., 2009. p.26. 24 WOLKMER, Antonio Carlos. Ideologia, Estado e Direito. – 2. ed. rev. E ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995. p.73. 25 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Memória Histórica, Justiça de Transição e Democracia sem fim. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: estudos sobre Brasil, Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal. Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 16-24, 2010. p.18. 26 NEVES, Marcelo. El contenido material de La democracia: tendencias actuales Del constitucionalismo latinoamericano. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. 27 BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política: a filosofia política e as lições dos clássicos. – 20ª Reimpressão – organizado por Michelangelo Bovero; tradução Daniela Beccacia Versiani. – Rio de Janeiro: Elsevier, 2000. p.232. 28 Ibid., p.238-9. 29 MELO, Osvaldo Ferreira de. Temas Atuais de Política do Direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. p.83. 30 ABRÃO, Paulo. O alcance da Lei de Anistia: o último passo. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/main.asp?Team={2AD759EF-DCFB-46EB-A16C-73502B9C09EF}>. Acesso em: 28 de setembro de 2011. 31 BITTAR, Eduardo C. B. Curso de filosofia política. – 3. ed. – 2. reimpr. – São Paulo: Atlas, 2008. p.26. 32 MELO, Osvaldo Ferreira de. Temas Atuais de Política do Direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. p.20. 33 MELO, Osvaldo Ferreira de. Temas Atuais de Política do Direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. p.19. 34 BITTAR, Eduardo C. B. Curso de filosofia política. – 3. ed. – 2. reimpr. – São Paulo: Atlas, 2008. p.14. 35 GRIMM, Dieter. Constituição e Política. Tradução de Geraldo de Carvalho; coordenação e supervisão Luiz Moreira. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. p.3. 36 ZYL, Paul Van. Promovendo a justiça transicional em sociedades pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.32-55, jan.-jun., 2009. p 54. 37 MELO, Osvaldo Ferreira de. Temas Atuais de Política do Direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. p.56. 38 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de Transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: estudos sobre Brasil, Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal. Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p.50. 39 SOARES, Mário Lúcio Quintão. Teoria do estado: o substrato clássico e os novos paradigmas como précompreensão para o DireitoConstitucional. – Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p.120. 40 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. – 2. ed. – São Paulo: Atlas, 2001. p.89. 41 STRECK, Lenio Luiz; DE MORAIS, José Luis Bolzan. Ciência política e teoria geral do estado. 4. ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p.87. 42 MALUF, Sahid, 1914 – 1975. Teoria geral do Estado. 25. ed. atual./ pelo Prof. Miguel Alfredo Malufe Neto. São Paulo: Saraiva, 1999. p.20. 43 SOARES, Mário Lúcio Quintão. Teoria do Estado: introdução. – 2. ed. rev. Atual. – Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p.79. 44 STRECK, Lenio Luiz; DE MORAIS, José Luis Bolzan. Ciência política e teoria geral do estado. 4. ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p.86-87. 45 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Teoria do Estado e Ciência Política. – 5ª edição atualizada e ampliada.São Paulo: Celso Bastos Editora, 2002. p.163. 46 STRECK, Lenio Luiz; DE MORAIS, José Luis Bolzan. Ciência política e teoria geral do estado. 4. ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p.89. 47 STRECK, Lenio Luiz; DE MORAIS, José Luis Bolzan. Ciência política e teoria geral do estado. 4. ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p.89.Ibid, p.89. 48 Ibid., p.91. 49 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2007. p.115. 88 50 STRECK, op. cit., p.91. CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. Portugal: Edições Almedina, 2007. p.93. 52 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2007. p.121-122. 53 STRECK, Lenio Luiz; DE MORAIS, José Luis Bolzan. Ciência política e teoria geral do estado. 4. ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p.97. 54 SOARES, Mário Lúcio Quintão. Teoria do Estado: introdução. – 2. ed. rev. Atual. – Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p.176. 55 Nação: para a existência de nação, devem comparecer motivos de ordem social, moral e histórica, por via dos quais os indivíduos humanos, devidamente agrupados, apresentam aquilo que se convencionou chamar parentesco espiritual. 56 População: massa de indivíduos que, em dado momento, vivem dentro da jurisdição de certo Estado. Não se leva em conta entre eles,consequentemente,íntimas e demoradas relações sociais, de base ético-histórica, ou nem mesmo rigorosas relações jurídicas, nem afins relações políticas. 57 MENEZES, Aderson de. Teoria Geral do Estado. – atualização por José Lindoso – e atual. – Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2009. p.137-8. 58 MALUF, Sahid, 1914 – 1975. Teoria geral do Estado. 25. ed. atual./ pelo Prof. Miguel Alfredo Malufe Neto. São Paulo: Saraiva, 1999. p.25. 59 STRECK, Lenio Luiz; DE MORAIS, José Luis Bolzan. Ciência política e teoria geral do estado. 4. ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 152. 60 GAMA, Ricardo Rodrigues. Ciência Política. Campinas: LZN Editora, 2005. p.114. 61 BRANCATO, Ricardo Teixeira. Instituições de direito público e de direito privado. – 11. ed. rev. – São Paulo: Saraiva: 1998. p.59. 62 SKIDMORE, Thomas E. Brasil: de Castelo a Tancredo. – tradução Mariano Salviano Silva. – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988. p.495-6. 63 BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes. História Constitucional do Brasil. Brasília: OAB Editora, 2008. p.455. 64 Ibid., p.448. 65 Ibid., p.448. 66 SODRÉ, Nelson Werneck. Vida e morte da ditadura: 20 anos de autoritarismo no Brasil. Petrópolis: Editora Vozes, 1984. p.8. 67 Os regimes políticos repressivos se generalizaram pelos países do Cone Sul: Brasil (1964), Argentina (1996 e 1976), Uruguai (1973), Chile(1973), enquanto que a ditadura de Stroessner, no Paraguai, remonta à década anterior, 1954. O Brasil e diversos outros países da região, que lutaram como aliados dos Estados Unidos na Segunda Guerra, ficaram sob a influência norte americana, começando a partir daí o embrião de uma cooperação estratégia militar que se estendeu sob as décadas posteriores, caracterizada pela uniformidade de doutrinas, treinamento conjunto de quadros e estreita identidade ideológica. Essa influência sobre a nova concepção de “Defesa Nacional”, que visava a contenção do comunismo, ficou conhecida como “doutrina da segurança nacional”, que procurava fortalecer o “Poder Nacional” não contra um ataque externo, mas contra um “inimigo interno” que teoricamente tentava solapar as instituições, num suposto contexto de “guerra interna”. 68 SANTOS, Roberto Lima; FILHO, Vladimir Brega. Os reflexos da “judicialização” da repressão política no Brasil no seu engajamento com os postulados da justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.152-177, jan-jun. 2009. p.152. 69 BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes. História Constitucional do Brasil. Brasília: OAB Editora, 2008. p.455. 70 TV JUSTIÇA. Programa Fórum. Anistia Política. Acesso em 13 de outubro de 2011. Vide nota 91. 71 TV JUSTIÇA. Programa Fórum. Anistia Política. Acesso em 13 de outubro de 2011. Vide nota 91. 72 TV JUSTIÇA. Programa Fórum. Anistia Política. Acesso em 13 de outubro de 2011. Vide nota 91. 73 ABRÃO, Paulo. O alcance da lei de anistia: o último passo. Texto fruto da palestra proferida durante o Seminário Internacional sobre Justiça Internacional Penal, promovido pelo Instituto de Relações Internacionais da USP, em São Paulo, em 13 de abril de 2010. p.3-4. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?Team={2AD759EF-DCFB-46EB-A16C-73502B9C09EF}>. Acesso em: 7 de outubro de 2010. 74 RODRIGUES, Georgete Medleg. Arquivos, anistia política e justiça de transição no Brasil: onde os nexos?. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.136-151, jan-jun. 2009. p.140. 75 ABRÃO, Paulo. O alcance da lei de anistia: o último passo. Texto fruto da palestra proferida durante o Seminário Internacional sobre Justiça Internacional Penal, promovido pelo Instituto de Relações Internacionais da USP, em São Paulo, em 13 de abril de 2010. p.5. Disponível em:<http://portal.mj.gov.br/main.asp?Team={2AD759EF-DCFB-46EB-A16C-73502B9C09EF}>. Acesso em: 7 de outubro de 2010. 51 89 76 SANTOS, Roberto Lima; FILHO, Vladimir Brega. Os reflexos da “judicialização” da repressão política no Brasil no seu engajamento com os postulados da justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.152-177, jan-jun. 2009. p.154. 77 SANTOS, Roberto Lima; FILHO, Vladimir Brega. Os reflexos da “judicialização” da repressão política no Brasil no seu engajamento com os postulados da justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.152-177, jan-jun. 2009. p.160-161. 78 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de Transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p.45. 79 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de Transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p.46. 80 Ibid., p.45. 81 ABRÃO, Paulo; ALVARENGA, Roberta Vieira; BELLATO, Suelli Aparecida; TORELLY, Marcelo D.Justiça de Transição no Brasil: O papel da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.12-21, jan-jun., 2009. p.12. 82 BRITO, Alexandra Barahona de. Justiça transicional e a Política da memória: uma visão global. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.56-83, jan.-jun., 2009. p 66. 83 Ibid., p.67. 84 BRITO, Alexandra Barahona de. Justiça transicional e a Política da memória: uma visão global. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.56-83, jan.-jun., 2009. p 67. 85 BRITO, Alexandra Barahona de. Justiça transicional e a Política da memória: uma visão global. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.56-83, jan.-jun., 2009.p.58. 86 ZYL, Paul Van. Promovendo a justiça transicional em sociedades pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.32-55, jan.-jun., 2009. p 34. 87 Ibid., p.35. 88 ZYL, Paul Van. Promovendo a justiça transicional em sociedades pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.32-55, jan.-jun., 2009. p.35. p.35. 89 Sou responsável por esta tradução. SIKKIN, Kathryn; WALLING, Carrie Booth. The impact of Human Rights Trials in Latin America. Disponível em:<htt://jpr.sagepub.com/content/44/4/427>. Acesso em: 11 de outubro de 2011. 90 ZYL, Paul Van. Promovendo a justiça transicional em sociedades pós-conflito. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.32-55, jan.-jun., 2009. p 54. 91 TV JUSTIÇA. Programa Fórum. Anistia Política. Disponível em: Parte 1:<http://www.youtube.com/watch?v=oBJVOA_B5s0&feature=results_video&playnext=1&list=PL9C5D7465F CD58C04>; Parte 2: <http://www.youtube.com/watch?v=M3MiY6edBaA&feature=BFa&list=PL9C5D7465FCD58C04&lf=results_ video>; Parte 3: <http://www.youtube.com/watch?v=aBKTUtdPI6I&feature=BFa&list=PL9C5D7465FCD58C04&lf=results_vid eo>; Parte 4: <http://www.youtube.com/watch?v=zBCqkbI5SfI&feature=BFa&list=PL9C5D7465FCD58C04&lf=results_vid eo>. Acesso em 13 de outubro de 2011. 92 Correio Braziliense de 15/10/2011. 93 BOTTINI, Pierpaolo Cruz; TAMASAUSKAS, Igor; CAMARGO BARROS VIDAL, Luis Fernando de; FELIPPE, Kenarik Boujikian; MARTINS DE MORAIS, Dora Aparecida. Lei da Anistia: com a palavra, O STF. In: Instituto Brasileiro de Ciência Criminais, São Paulo , ano 17, nº 205, dez., 2009. p.4. 94 BENEDETTI, Juliana Cardoso; NAHOUM, André Vereta. Justiça de transição e integração regional: o direito à memória e à verdade no Mercosul. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, p.296-317, 2009. p.301. 95 REMÍGIO, Rodrigo Ferraz de Castro. Democracia e anistia política: rompendo com a cultura do silêncio, possibilitando uma justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, jan.jun., p. 178-202, 2009. p.187. 96 BAGGIO, Roberta Camineiro. Justiça de Transição como Reconhecimento: limites e possibilidades do proceso brasileiro. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 260-286, 2010. p.272. 97 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de Transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, 90 Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p. 40. 98 BAGGIO, Roberta Camineiro. Justiça de Transição como Reconhecimento: limites e possibilidades do proceso brasileiro. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 260-286, 2010. p.272. 99 REMÍGIO, Rodrigo Ferraz de Castro. Democracia e anistia política: rompendo com a cultura do silêncio, possibilitando uma justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, jan.jun., p. 178-202, 2009. p.188. 100 BAGGIO, op. cit., p. 274. 101 Ibid., p.272. 102 REMÍGIO, Rodrigo Ferraz de Castro. Democracia e anistia política: rompendo com a cultura do silêncio, possibilitando uma justiça de transição. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n. 1, jan.jun., p. 178-202, 2009. p.189. 103 TAVARES, André Ramos; AGRA, Walber de Moura. Justiça reparadora no Brasil. In: Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.69-91, 2009. p.86. 104 BAGGIO, Roberta Camineiro. Justiça de Transição como Reconhecimento: limites e possibilidades do proceso brasileiro. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 260-286, 2010. p.275. 105 Ibid., p.276. 106 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de Transição no Brasi: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p.44. 107 BAGGIO, Roberta Camineiro. Justiça de Transição como Reconhecimento: limites e possibilidades do proceso brasileiro. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 260-286, 2010. p.277. 108 BAGGIO, Roberta Camineiro. Justiça de Transição como Reconhecimento: limites e possibilidades do proceso brasileiro. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 260-286, 2010. p.276. 109 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p.46. 110 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Justiça de transição no Brasil: a dimensão da reparação. In: Repressão e Memória Política no Contexto Íbero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal, Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia; Portugal: Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais, p. 26-59, 2010. p.49. 111 Ibid., p.49. 112 Ibid., p.55. 113 COIMBRA, Cecília; QUEIROZ, Leoncio de; JAPA, Mario; OSAVA, Chizuo; MAESTRI, Mario. Panorama Histórico. In: 68 a geração que queria mudar o mundo: relatos, Brasília, p.38-63, 2011. p.39. 114 SAMPAIO, José Adércio Leite; ALMEIDA, Alex Luciano Valadares de. Verdade e história: por um direito fundamental à verdade. In: Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.249-267, 2009. p.251. 115 Ibid., p.251. 116 SAMPAIO, José Adércio Leite; ALMEIDA, Alex Luciano Valadares de. Verdade e história: por um direito fundamental à verdade. In: Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.249-267, 2009. p.264. 117 BARBOSA, Marco Antônio Rodrigues. Direito à memória e à verdade. In: Revista Direitos Humanos, Brasília, n. 1, p.26-33, dez., 2008.p. 32. 118 BARBOSA, Marco Antônio Rodrigues; PAULO, Vannuchi. Resgate da memória e da verdade: um direito de todos. In: Memória e verdade: a justiça de transição no Estado Democrático brasileiro, Belo Horizonte, p.55-67, 2009. p.55. 119 MEZAROBBA, Glenda. Afinal, o que é uma Comissão da Verdade? 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Priscilla Hayner antigamente era uma oficial do programa em direitos humanos internacionais e de segurança para a Fundação Joyce Mertz-Gilmore em Nova York. Ela é formada na Earlham College e na School of International and Public Affairs at Columbia University. Disponível em:<http://www.idea.int/rrn/individual/p_hayner.cfm>. Acesso em 21 de outubro de 2011. 136 Texto fornecido no II Seminário Latino-americano de Justiça de Transição realizado, no Superior Tribunal de Justiça, nos dias 7 e 8 de julho de 2011. HAYNER, Priscilla. Unspeakable Truth: transitional justice and the challenge of truth commissions. 2 edition. New York: Routledge, 2011. p.20. 137 BRITO, Alexandra Barahona de. Justiça transicional e a política da memória: uma visão global. In: Revista Anistia Política e Justiça de Transição, Brasília, n.1, p.56-83, jan.-jun., 2009. p.61. 138 Ibid., p.64. 139 Conselho de Segurança das Nações Unidas. 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