INTRODUÇÃO À LINGUÍSTICA
AULA 03: FUNCIONALISMO LINGUÍSTICO
TÓPICO 01: A LINGUÍSTICA FUNCIONAL: PANORAMA
A partir desse ponto, veremos o que denominamos Linguística
Funcional, isso porque a Linguística, assim como as outras ciências
humanas, atravessou três momentos: historicismo, descritivismo e
funcionalismo. O primeiro momento foi marcado pelos estudos históricos da
língua, na busca da protolíngua, no estabelecimento de árvores genealógicas
das línguas e na comparação estrutural de línguas de origem comum (latim:
português, espanhol, francês, italiano etc; germânico: inglês, alemão,
holandês etc, por exemplo).
O segundo foi marcado pela formulação científica da Linguística por
meios de trabalhos, como o de Ferdinando de Saussure (Curso de
Linguística Geral) que esquematiza princípios de análise linguística,
diferenciando língua (langue) de fala (parole); seguidamente encontramos
outras propostas de cientifização dos estudos linguísticos: Leonardo
Bloomfield (distribucionalismo); Noam Chomsky (Gerativismo). A ênfase
dessa perspectiva é a análise exaustiva da estrutura da língua. Contudo,
outra maneira de estudar a língua é buscar entender seus usos e
seu funcionamento.
Cabe ao Funcionalismo buscar entender a relação entre os usos da
linguagem e suas funções comunicativas. Essa corrente adota pontos de
convergência como: mais atenção à funcionalidade da estrutura linguística
(para que serve?); a utilização do conceito de enunciado (como é utilizado?)
e, consequentemente, o conceito de discurso (qual o contexto de utilização?).
VERSÃO TEXTUAL
ENUNCIADO – sequência de frases emitidas entre dois brancos
semânticos, duas suspensões de comunicações; DISCURSO: enunciado
do ponto de vista do mecanismo discursivo que o condiciona.
(GYESPIN, Louis. Problematique dês travaux sur le discours politique.
In: LANGAGES, 23, p. 3-24, 1971)
“O discurso é toda enunciação que supõe um locutor e um auditor,
e, no primeiro, a intenção de influenciar ao outro de alguma maneira
(BENVENISTE, Emile. PROBLEMAS DE LINGUÍSTICA GERAL I. 4.
ed. México DF: Siglo XXI, 1974)
Parece haver uma ideia de que o Funcionalismo não se preocupa com
regras gramaticais, não atenta para a estrutura ou mesmo o extremo: não
concebe a noção de uma teoria gramatical, porém não é nada disso. A
questão é que, embora não demonstrando uma unidade doutrinal, o
Funcionalismo entende a língua como um sistema de significados
acompanhados por formas por meio das quais esses significados podem ser
atualizados. Um dos principais teóricos funcionalistas, Michael Halliday
(1985), apresentando um quadro conceitual da gramática funcional (estuda
como a língua é usada) apresenta três instâncias de análise:
1. O texto – usado para explicar a linguagem, seja ele escrito ou dito, é um
contexto de uso.
2. O sistema – retoma a ideia de articulação de elementos para a
produção e a recepção¬ de sentido; organizado em dois eixos, o da
atividade (o uso da linguagem) e o da reflexão [melhor dizendo: a relação
interpessoal (agir sobre os outros)].
3. A estrutura linguística – cada elemento da língua é explicado por sua
função, uso, dentro do sistema linguístico.
Por isso que a visão linguística de Halliday é chamada de sistêmicofuncional, pois busca integrar o binarismo língua/fala, dicotomias já
propostas por Saussure e grandes nomes do Formalismo.
Leia a charge abaixo:
Fonte [2]
UMA PROPOSTA DE ANÁLISE FUNCIONAL
Veja, a seguir, a proposta de análise funcional da charge.
NÍVEL TEXTUAL:
A charge é um gênero textual que se caracteriza por uma leitura rápida,
estrutura linguística simples, tamanho reduzido, reunião de elementos
verbais e não verbais principalmente icônicos; de teor crítico, pendendo
quase sempre ao jocoso. Sabemos que nem sempre para esse tipo de texto
era possível sua vinculação pública. Ainda hoje, em países de regime político
fechado, sua publicação é proibida. Mesmo no Brasil, alguns políticos
conseguiram judicialmente que não se relacione sua imagem ou nome à
charge, dado que sempre são ironizados, criticados.
Veja: analisamos a relação do texto com seu processo histórico.
NÍVEL SISTÊMICO E FUNCIONAL (ESTRUTURA LINGUÍSTICA EM
ARTICULAÇÃO):
No nível sistêmico, analisamos como os elementos linguísticos se
articulam no texto. Um princípio já estabelecido por Hjelmslev: a função
nasce da articulação de dois elementos.
Neste nível, focaremos a partícula ONDE, que na gramática é
preestabelecido como advérbio ou pronome relativo. Contudo, pela
gramática funcional, um elemento linguístico ganha funções e é classificado
de acordo com seu uso, sua posição (o chamado aspecto tático (Táctico, ca:
do gr. τακτικός, der. de τάσσειν, por em ordem.)
Observe que o onde é o primeiro elemento apresentado no texto,
direcionando-nos a dizer Brasil, cuja resposta não aparece em nenhum
momento no texto. Inclusive o próprio nome “país” está antecedido por um
denominado artigo indefinido “um”, ratificando a ideia de indefinição, de
não apontar a algo específico no mundo. Mas nosso conhecimento de mundo
e inferências de leitura fazem-nos deduzir qual o lugar a que a charge faz
referência. Não é à toa que é o primeiro termo a ser empregado no texto e
que encabeça a oração retirada de sua estrutura canônica, fazendo surgir em
sua posição o “assim” – que retoma a tudo o que foi dito anteriormente, até
aquilo que as reticências indicam que foi suspenso da fala do locutor. Note
que o próprio vocativo “Kadafi”, que, comumente vem no início de oração, é
o último elemento a ser utilizado. Isso por que: o autor quis focar as
características do dito país. O tema de sua fala é o dito país em que tudo é
possível, não o ditador, que é apenas uma informação compartilhada para
contextualizar o texto.
Uma análise funcional da língua entende que cada escolha do usuário
estabelece uma função para a constituição textual – eis o exemplo da eleição
do nome de Kadafi, como exemplo, e não outro político.
KADAFI
Aqui poderíamos usar um substantivo que mais convém a nossa
visão de mundo: ditador, presidente, chefe de estado, premier etc. –
embora sinônimas cada um deles tem um sentido diferenciado.
Veja: aqui utilizamos dois níveis sistêmico e funcional para exemplificar
a relação entre a escolha de determinados elementos linguísticos (onde,
assim, Kadafi) e sua função argumentativa na charge em estudo.
Essa é uma das diferenças entre o Funcionalismo e o Estruturalismo:
para este, a noção de função linguística surge pela oposição de elementos
linguísticos, para aquele, surge da articulação.
De tudo o que comentamos, perguntamos: é o advérbio um termo
acessório como afirma a Gramática Tradicional? Está ele ligado apenas ao
verbo (ad para/verbio
verbo)? Neste caso, não. Seu campo de
abrangência é todo o texto – considerando que, no Funcionalismo, as
análises são colocadas em um continuum entre mais ou menos – podendo,
em outros casos, o advérbio estar ligado mais ao verbo.
FONTES DAS IMAGENS
1. http://www.adobe.com/go/getflashplayer
2. http://alagoinhas-bahia-acaminhada.blogspot.com/2011/08/oposicaoposiciona-se-contra-as.html
Responsável: Profª. Maria Silvana Militão
Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual
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