XI Salão de Iniciação Científica PUCRS Princípio da supremacia do interesse público sobre o particular: a (des)necessidade da aferição no caso concreto Luciane Frizon Merlin1, Orci Paulino Bretanha Teixeira2 (orientador). Faculdade de Direito, PUCRS. Resumo O presente trabalho versa sobre o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, visando atribuir-lhe caráter de limite interpretativo. A grande maioria dos autores identifica nesse princípio, de forma absoluta, que, em caso de conflito, o interesse público prevalece sobre o particular. Contudo, há circunstâncias passíveis de questionar se realmente haveria essa prevalência, tornando-se possível fazer uma interpretação em favor do interesse privado. Assim, o estudo, de cunho estritamente bibliográfico, deu-se de forma a analisar as posições da doutrina especializada e objetiva aferir racionalização ao princípio em voga, a fim de se evitar qualquer tipo de situação arbitrária. Introdução A pesquisa versa sobre a identificação de uma limitação ou não do princípio do interesse público sobre o particular, ou seja, se o interesse público sempre deve prevalecer sobre o particular, caso em que pode ocorrer a restrição de um direito fundamental individual. Parte da doutrina concebe o interesse público de forma absoluta, considerando que ele sempre prevalecerá sobre o privado, sem a necessidade de identificar se ocorre sua verificação no caso concreto. Em contraposição, outros autores defendem que, em determinados casos, o interesse particular poderia prevalecer sobre o interesse público. Metodologia 1 Acadêmica do curso de Ciências Jurídicas e Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), cursando o nível V. 2 Mestre em Direito. XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010 2325 A realização do trabalho deu-se por meio de consulta bibliográfica, em que se verificaram os conceitos da doutrina sobre o tema, bem como seu respectivo posicionamento, com o fim de aferir uma possível solução ao problema, sem, contudo, esgotar a abordagem. Discussão A discussão envolvida na pesquisa está inserida no fato de que a doutrina majoritária refere que o interesse público sempre será prevalente em relação ao privado, identificando, dessa forma, a supremacia do interesse público sobre o particular. Entretanto, ao passo que esses doutrinadores retiram do caso concreto o enfoque da análise, outros preferem identificar se há ou não a supremacia do interesse público com base na situação concreta. Com efeito, para Carvalho Filho (2010, p. 35), o fim da atividade estatal é o interesse público, sendo que seu destinatário é a coletividade e não o indivíduo particular, pois este é visto como integrante da sociedade e, dessa forma, seus direitos não poderiam ser equiparados aos direitos sociais. Assim, quando do conflito entre um interesse público e um particular, o primeiro sempre deve prevalecer em detrimento do segundo e sua inobservância acarreta em desvio de finalidade. Comenta a existência do entendimento de que o interesse particular tem preferência sobre o público em casos específicos relacionados a direitos fundamentais, mas afirma que a ideia não procede. Embora, prossegue o autor, os interesses particulares estejam protegidos pelo Estado, há de se respeitar o interesse coletivo quando em conflito com o interesse privado, ou seja, a “existência de direitos fundamentais não exclui a densidade do princípio. Este é, na verdade, o corolário natural do regime democrático, calcado [...] na preponderância das maiorias” (CARVALHO FILHO, 2010, p. 35). Complementando o entendimento anterior, Meirelles (2008, p. 105) ensina que o princípio do interesse público sobre o particular deve ser obrigatoriamente observado pela Administração Pública. Na mesma linha, Bandeira de Mello (2008, p. 96) afirma que o princípio em questão “é princípio geral de Direito inerente a qualquer sociedade. É a própria condição de sua existência. [...] é um pressuposto lógico do convívio social.” Ainda, divide o interesse público em primário e secundário. Aquele se refere ao interesse da sociedade como um todo, enquanto este se atribui ao interesse do governo. Nesse sentido, somente o interesse primário “pode ser validamente objetivado, pois este é o interesse que a lei consagra e entrega à compita do Estado como representante do corpo social” (MELLO, 2008, p. 99) e o interesse secundário deve coincidir com o primário para ser válido, ou seja, deve ter sua finalidade voltada à sociedade. XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010 2326 Em oposição a esse entendimento, Ávila (2001, p. 02) versa que o dito princípio incorre em alguns problemas. Primeiramente, seria ele uma regra e não um princípio, pois este permite ponderação, enquanto a regra é imperativa, o que é verificado quando denominado de princípio da supremacia do interesse público. Na ocorrência de conflito, conforme Alexy, este deve ser resolvido por meio de uma preponderância entre o interesse público e o particular. Assim, “em vez de uma „relação abstrata de prevalência absoluta‟, deve ser descrita uma „relação concreta de prevalência relativa‟” (apud ÁVILA, 2001, p. 10). Para a resolução dessa controvérsia, portanto, deve ser analisado o caso concreto. Ávila (2001, p. 11) afirma que quando houver confronto entre o interesse público e o privado e disso resultar agressão a direito fundamental, deve prevalecer o interesse particular, visto que seria inconcebível tal violação a um direito constitucionalmente garantido. Conclusão Embora a doutrina majoritária conclua pela aplicação absoluta do interesse público em detrimento do privado, há de se convir que isso somente será possível analisando-se o caso concreto e verificando se, efetivamente, há essa prevalência. Nesse sentido, não se nega a existência do interesse público, apenas se entende que para que ele efetivamente possa prevalecer sobre o privado deve ser averiguado no caso concreto, ou seja, se analisadas as circunstâncias fáticas, estas realmente identifiquem uma hipótese de incidência do interesse público. Aí sim se pode falar em supremacia do interesse público sobre o particular. Caso contrário, se a situação em concreto apresentar elementos que indiquem que o interesse privado a ser tutelado deve prevalecer sobre o público, aquele deverá ser resguardado. Com isso, não seria viável nominar o princípio de supremacia do interesse público sobre o particular, pois tal supremacia somente se concretizará com a análise de cada caso. Referências ÁVILA, Humberto. Repensando o “Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o Particular”. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ - Centro de Atualização Jurídica, v. I, nº. 7, outubro, 2001. Disponível em: <http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em: 29 mai. 2010. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. ed. 25. São Paulo: Malheiros, 2008. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. ed. 23. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. ed. 34. São Paulo: Malheiros, 2008. XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010 2327