Yuri Bruns Brasília, 22 de março de 2015 A Crise na Ucrânia Como chegamos até aqui Após ter integrado a antiga União Soviética e garantido poderes soberanos apenas no ano de 1991, a Ucrânia encontra novas situações políticas no século XXI, enfrentadas pelo então presidente Viktor Yanukovych. Frente à decisão mais importante da história contemporânea do país, estavam as opções entre unir-se à União Europeia – e isso quer dizer: gozar de todos os benefícios econômicos, políticos e sociais que possuem o fato de fazer parte do maior bloco de integração regional do mundo, além de aproximar-se de forma grosseira do ocidente -, ou manter-se como um fiel aliado da Rússia, do leste europeu e parte da Ásia – aderindo à barganha russa de ficar sobre seu guarda-chuva unindo-se em adicional à Bielorrússia e Cazaquistão. Esse grande dilema foi o desencadeador de guerras civis, seguidas de mortes, deposição do presidente e interferência internacional. A Agenda de Associação à UE foi apresentada em 2009, e estabeleceu determinados requisitos, explícitos e implícitos, para os quais a Ucrânia deveria adaptar-se a fim de torna-se um país membro – i.e. o abandono da ideologia imposta pela antiga URSS. Quanto à associação à “União Eurásia”, a proposta de Putin acompanhava meros R$15 bi. De etnia russa e de relações de longas datas com Putin, Yanukovych opta por coagir com a Rússia. É fácil associar a decisão do presidente à “cláusula monetária”, ao histórico soviético do país, e à proximidade ideológica e geográfica. No entanto, a mesma proximidade parece ser o divisor de águas e opiniões entre a população civil. O leste da Ucrânia, que divide suas fronteiras com a Rússia, conta com uma população de cerca 20% de russos por etnia, e 30% que adota o idioma russo com oficial. O restante do território é inteiramente ucraniano e próocidente. O país entra em uma guerra civil em 2014, como resposta à decisão de Yanukovych, que acaba com seu mandato deposto. Os ucranianos se sobrepõem em quantidade em relação aos pró-russos, enquanto esses saem em vantagem militarmente. A oportunidade de aproximação do ocidente e adesão à União Europeia se distanciava, e, assistindo a esse fato, os pró-ocidentes optaram por reagir. Os protestos deixam cerca de 100 manifestantes mortos – aparentemente pela polícia de choque que atuava nos confrontos, e a tiros de sniper, comandados pelo presidente. Yuri Bruns Brasília, 22 de março de 2015 Com o presidente deposto, a decisão pela União Europeia ou Rússia, ocidente ou oriente, futuro ou passado, retorna à estaca zero. Deixar que o país volte à normalidade, sem um presidente pró-russo no poder, para a Rússia, seria entregar o vizinho à UE. Sendo assim, Putin manda tropas militares às fronteiras, militantes (embora não declaradamente pró-russos) ao aeroporto da Crimeia (cidade ucraniana autônoma e também região de disputa por dominação, de maioria de etnia e língua russa), veículos militares para bloqueios de ruas, soldados para o Parlamento Regional da Crimeia e tropas para dominação dos navios e bases navais da cidade. Não obstante, um referendo - dado por ilegal pela Ucrânia, UE e Estados Unidos -, é implantado com duas opções de voto para definir o futuro da Crimeia: anexação à Rússia ou independência. O resultado trouxe 97% dos votos para a anexação, e a cidade hoje se vê como parte do território Russo. Cabe ressaltar a importância prática da Crimeia, que, localizada quase como uma ilha dentro do Mar Negro, possui saídas para o oceano por praticamente todos os lados e está tão próxima da Rússia quanto da Ucrânia. O território russo tem posição desfavorável em relação ao oceano – tanto ao norte quanto ao sul -, e o governo enxerga uma oportunidade na Crimeia. As atividades russas já foram iniciadas há décadas no Mar Negro, e o acordo assinado em 1997 com a Ucrânia, após a dissolução da União Soviética, permitiu que a Rússia mantivesse suas atividades e frotas navais intactas. Como consequência e reflexo no cenário internacional, a anexação da Crimeia desencadeia uma série de sanções advindas da UE e dos EUA – i.e. vistos revogados e suspensão de transações econômicas -, tanto pelas violações aos direitos humanos e à democracia em que a Rússia foi acusada no processo de militarização do território ucraniano e anexação da Crimeia, como pela importância política em que a Ucrânia possui para o ocidente. Para os Estados Unidos, além da proteção da democracia e dos direitos humanos, o interesse da contenção à expansão russa é evidente. O acesso sem censuras ao Mar Negro pode significar a dominação de outros territórios, não necessariamente geográficos, perigosos para o ocidente. Para o bloco europeu, a Ucrânia ganha importância apenas em meados de 2004 – tendo em vista a relação política limitada que possuíam devido à distância ideológica, geográfica, e proximidade com a Rússia-, especialmente depois da “Revolução Laranja”, que trouxe ao poder a legenda então opositora e permitiu à Ucrânia a criação de políticas mais Yuri Bruns Brasília, 22 de março de 2015 democráticas e próximas ao ideológico ocidental. Nesse sentido, a UE começa a pensar em métodos de inserção da Ucrânia, e apresenta as referidas propostas da Agenda de Associação para reformas políticas do Estado e adesão ao bloco. A esperança de que mais um país das redondezas europeias aderisse à democracia e se tornasse uma economia de mercado era real. No entanto, as negociações, em termos de dimensão e importância, com o possível novo membro, ficariam a cargo de cada Estado membro da União Europeia, considerando os interesses de cada um e possibilidades político-econômicas oferecidas pela Ucrânia. De todo modo, e embora ambos apoiadores da causa ucraniana tenham impostos sanções à Rússia como forma de demonstrar tentativas de freio, as políticas de controle são divergentes. Enquanto a União Europeia debate sobre estratégias de diminuição de perdas para a Rússia, os Estados Unidos munem os combatentes ucranianos com armamentos norteamericanos. É notória a busca pela sobrevivência dos Estados. As interpretações remetem-se a fatores a serem levados em consideração no processo de tomada de decisões, mas todas convergem ao mesmo ponto: a busca externa pelo controle, alianças e preservação ideológica para sobrevivência interna e ascensão do Estado. A discussão quanto à adesão da Ucrânia à União Europeia ainda está em andamento, embora lentamente, enquanto auxílios ao país afetado pelas guerras civis e contenção do impasse russo são tratados em paralelo. Na última quinta-feira, 19, foi aprovado pela UE um auxílio de €1.8 bi à Ucrânia, uma semana após o Ministro das Relações Exteriores da Espanha declarar achar necessário levar em consideração os interesses russos na possível adesão ucraniana. Yuri Bruns Brasília, 22 de março de 2015 Referências: http://www.theguardian.com/world/2014/apr/11/ukraine-russia-crimea-sanctions-us-eu-guideexplainer#sanctions http://www.bbc.com/news/world-europe-26270866 http://www.economist.com/topics/ukraine http://www.redstate.com/2014/03/05/u-s-russia-ukraine-matters-won/ http://www.theguardian.com/world/2014/apr/11/ukraine-russia-crimea-sanctions-us-eu-guideexplainer#sanctions http://carnegieeurope.eu/publications/?fa=51522 http://eeas.europa.eu/ukraine/docs/eu_ukr_ass_agenda_24jun2013.pdf http://www.rferl.org/contentinfographics/map-ukraine-percentage-who-identify-as-ethnic-russians-orsay-russian-is-their-first-language-/25323841.html http://www.theguardian.com/world/2014/mar/07/ukraine-russia-crimea-naval-base-tatars-explainer http://www.the-american-interest.com/2015/01/26/why-ukraine-is-our-business/ http://rt.com/business/239305-russia-ukraine-eu-association/