LINDOLFO COLLOR E A ORGANIZAÇÃO DO MINISTÉRIO DO
TRABALHO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO (1930-1932)
Thiago Oliveira Martins1
O presente trabalho tem por objetivo, analisar o período de constituição do primeiro
Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, (1930- 1932). Esse Ministério foi criado pelo
Decreto n 19.433, de 26 de novembro de 1930, portanto um mês após a vitória da Aliança
Liberal na Revolução de outubro, que colocou Vargas na Presidência da República do Brasil.
Seu primeiro ministro foi o gaúcho Lindolfo Collor, ele ocupou a pasta nos primeiros dois anos e
nesse período construiu a base do que seria futuramente as leis trabalhistas, sindicais e toda uma
gama de instrumentos utilizados pelo Estado para desenvolver a indústria e o comércio, na
chamada Era Vargas. Ao fazer a leitura de alguns textos sobre esse período notamos a
importância desse ministério, para a organização do capitalismo brasileiro. Nossa leitura será
referenciada pelos conceitos de Estado Amplo e Estada Restrito, bem como o de Condições
Gerais de Produção, do teórico marxista português João Bernardo. E para compreendermos a
forma como essa classe pensava, ou pelo menos tentar aferir quais as formas de pensamento
existiam na época, quais teorias eram utilizadas pelos gestores, quais foram as
influências teóricas desses organizadores, utilizarei os conceitos de Visão de Mundo, consciência
Real e Consciência Possível, desenvolvidos na obra do teórico marxista Lucien Goldmann.
Palavras-Chave: Gestores, Visão de Mundo, Condições Gerais de Produção.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por objetivo, analisar o período de constituição do primeiro
Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, (1930- 1932). Esse Ministério foi criado pelo
Decreto n 19.433, de 26 de novembro de 1930, portanto um mês após a vitória da Aliança
Liberal na Revolução de outubro, que colocou Vargas na Presidência da República do Brasil.
Seu primeiro ministro foi o gaúcho Lindolfo Boeckel Collor, ele ocupou a pasta nos primeiros
dois anos e nesse período construiu a base do que seriam futuramente as leis trabalhistas, bem
como toda uma gama de instrumentos utilizados pelo Estado para desenvolver a indústria e o
1
Atualmente cursa Mestrado em História, na Universidade Federal de Goiás. Bolsista CAPES.
comércio, na chamada Era Vargas. Ao fazer a leitura de alguns textos sobre esse período
notamos a importância desse ministério, para a organização do capitalismo brasileiro. Nossa
leitura será referenciada pelos conceitos de Gestores, Estado Amplo e Estada Restrito, bem como
o de Condições Gerais de Produção, do teórico marxista português João Bernardo. No livro
Transnacionalização do Capital e Fragmentação dos Trabalhadores2, o autor define da seguinte
maneira o Estado Restrito:
“O conjunto das instituições que compõem o governo, o parlamento e os
tribunais, ou seja, aos poderes executivo, legislativo e judiciário. É uso corrente
denominar estes três poderes, simplesmente, Estado, e para a maior parte das
pessoas é a eles que se limita o aparelho estatal.” (BERNARDO, 2000,11)
No livro Economia dos Conflitos Sociais (1991), o autor desenvolve de forma mais completa o
conceito de Estado Restrito, para ele:
“Apenas sob o estrito ponto de vista das relações entre capitalistas, o Estado
pode se reduzir ao sistema de poderes classicamente definido, a que chamo aqui
Estado Restrito. Os parâmetros da organização do Estado R definem-se pelos
casos-limite da acumulação de capital sob forma absolutamente centralizada, e
temos então a ditadura interna aos capitalistas, ou sob forma dispersa, isto é,
quando existe uma pluralidade de pólos de acumulação, e temos então a
democracia interna aos capitalistas. A organização do Estado R depende, em
suma, do processo de constituição das classes capitalistas.” (BERNARDO,
1991, 162/163)
O Estado Restrito seria, portanto o Estado Clássico, tanto na sua forma autoritária como
na democrática. Porém para esse autor no capitalismo existe outro tipo de estado que é o que ele
define como sendo o Estado Amplo, que para o autor possui as seguintes características:
“Em tudo o que diz respeito à organização interna das empresas, os patrões e os
gestores escolhem os sistemas de administração e organizam a força de
trabalho, o que constitui uma forma de poder legislativo. Além disso, eles
estabelecem as hierarquias, definindo a amplitude das decisões possíveis de ser
tomadas em cada escalão, e impõem as normas de trabalho, o que constitui uma
forma de poder executivo. Finalmente, os proprietários das empresas ou os seus
administradores avaliam o desempenho de cada trabalhador, concedendo
prêmios de produtividade ou impondo multas e outros tipos de punição,
inclusive a demissão, o que constitui uma forma de poder
judiciário.”(BERNARDO,2000,11/12)
Podemos destacar outra definição sua sobre Estado Amplo, no livro Economia dos Conflitos
Sociais, segundo João Bernardo:
“É constituído pelos mecanismos da produção de mais-valia, ou seja, por
aqueles processos que asseguram aos capitalistas a reprodução da exploração.
Os parâmetros da organização do Estado A definem-se pelos limites da maisvalia absoluta e da mais-valia relativa; a sua história é a dos ciclos sucessivos da
mais-valia relativa; e a diferença entre os sistemas de organização do Estado A
nas várias épocas e regiões é a diferença entre os tipos de extorsão da maisvalia”. (BERNARDO, 1991, 162)
As empresas privadas na análise bernardiana do capitalismo, funcionam como um
Estado, tendo em seu interior uma organização administrativa, que em alguns momentos
ultrapassa as funções do Estado Restrito, e este reconhece juridicamente os poderes do Estado
Amplo. E é nessa conjugação do Estado Amplo com o Restrito que o autor concebe o Estado
Capitalista. É, portanto fortemente embasado na perspectiva de análise de João Bernardo que
tentaremos analisar o papel institucional do Ministério do Trabalho, Indústria e comércio, como
uma instituição que faz a articulação entre esses dois tipos de Estado, pois esse é um dos
ministérios mais importantes para as Condições Gerais de Produção, que segundo João
Bernardo:
“Chamo Condições Gerais de Produção a todas as infra-estruturas, não só
materiais, mas ainda sociais e culturais, indispensáveis para que o capitalismo
exista e se expanda, e que vigoram num âmbito superior ao de cada empresa
particularmente considerada. As ferrovias, por exemplo, a rede elétrica, o
sistema escolar, os padrões culturais, não se podem confinar aos limites de cada
empresa e ultrapassam-nos todos. Sem estas Condições Gerais de Produção o
capitalismo não poderia ter começado a desenvolver-se, nem conseguiria hoje
deter a hegemonia.”(BERNARDO,2000,12/13)
O capitalismo, portanto depende das CGP(s), para sua reprodução, e o caso brasileiro,
notadamente no período em que estamos estudando, é central pensarmos como se deu a sua
constituição. É, portanto nesse momento que a figura dos gestores será analisada. Pois não tendo
uma base industrial forte, coube a essa classe a tarefa de desenvolver as condições para que se
constituísse um Estado Capitalista, no país. Em resumo pretendemos defender que no período de
constituição do M.T.I.C, em plena Revolução de 1930, o Brasil viveu uma Revolução
Capitalista, empreendida pelos gestores do Estado Restrito, por não haver um Estado Amplo com
condições de empreender tal revolução. Sendo, portanto indispensável a industrialização para
que um país competisse a nível internacional, ou seja, disputasse mercados com empresas dos
chamados países centrais, no caso brasileiro quem organizou as condições para que os
capitalistas brasileiros pudessem disputar esses mercados foi o Estado Restrito.
O Ministério e seu primeiro Ministro
Antes dos acontecimentos que possibilitaram a Getúlio Vargas, assumir a presidência do
Brasil em outubro de 1930, houve alguns acontecimentos que colocou como prioridade a solução
do conflito capital/trabalho no Brasil. Alguns eventos foram fundamentais para que boa parte da
classe dominante compreendesse que era preciso encontrar uma saída para os impasses entre os
trabalhadores e os empresários. Dessa forma as greves de 1917 e 1919, foram importantes para
que o Estado Restrito se mobilizasse, as atitudes tomadas até o Governo Vargas, foram as mais
variadas, porém o que sobressaia era a repressão militar. Varias leis foram criadas no intuito de
amenizar o conflito, porém nenhuma delas teve uma aplicação efetiva, é o caso, por exemplo, da
diminuição da jornada de trabalho e das férias de 15 dias remunerada.
Foi no governo Vargas que o Estado R, assumiu a tarefa de amenizar esse conflito e a
criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, foi à primeira medida tomada por ele,
para efetivar novas leis que pudessem enfim arbitrar esse conflito. Não assumo a visão de que foi
Getúlio Vargas o pai dos pobres e que seu governo possuía uma posição neutra no conflito, se
em alguns momentos ele se posicionou contrário aos interesses do capital, foi por que o
empresariado no objetivo de obter o maior lucro possível não cedia em favor dos trabalhadores e
com isso possuíam atitudes que colocavam em risco a estabilidade do sistema capitalista. E como
esses gestores possuíam conhecimentos técnicos, que os possibilitavam vislumbrar maiores
lucros com a nova forma de regulação do trabalho em vários momentos tiveram atrito com esses
empresários.
No livro O batismo do Trabalho: a experiência de Lindolfo Collor, Rosa Maria Barbosa
de Araújo, aponta o motivo central da criação desse ministério. Para a autora:
“A pretendida solução para a questão social traduz-se na implementação da
Legislação Trabalhista promovida pelo Ministério do Trabalho, dotando o país
de um novo Direito Social, cuja análise é capaz de apontar instrumentos
identificadores das relações de poder.” (ARAÚJO, 1990,25)
A denominação “Questão Social” foi criada para designar os problemas que envolviam a
classe trabalhadora no Brasil.
A partir desse ponto de vista podemos entendemos que o M.T.I.C, foi peça chave na
articulação e nas negociações com empresários e trabalhadores, e não é possível compreender o
papel dessa instituição sem abordar alguns aspectos de sua formação e a importância que teve
Lindolfo Collor e sua equipe nos primeiros dois anos de funcionamento da instituição.
Lindolfo Boeckel Collor, primeiro ministro do Ministério do Trabalho, Indústria e
Comércio, era um gaúcho e pertencia a chamada Geração de 1907, ano em que terminou o seu
curso jurídico em Porto Alegre e ingressa no Bloco Acadêmico Castilhista, junto com alguns dos
nomes que serão fundamentais para a consolidação da Revolução de 1930, são eles: Getúlio
Vargas, Osvaldo Aranha, João Neves da Fontoura, Flores da Cunha, Firmino Paim Filho,
Maurício Cardoso.
1 – “UM MONTE DE IDÉIAS NOVAS”
Ao refletir sobre a literatura brasileira de sua época, o crítico literário Silvio Romero,
percebeu que havia “um monte de idéias novas”, vindas da Europa e sendo utilizadas pelos
intelectuais brasileiros. Nesse caldeirão de novas idéias, se encontrava o positivismo, o
cientificismo, liberalismo, spencerianismo e o darwinismo social. Para alguns teóricos e dentre
eles destaco Roberto Schwarz, essa geração que vai do final do século XIX até a década de 1930
do século XX, era caracterizada por copiar as teorias estrangeiras, para esse autor essas “idéias
estavam fora do lugar”,3 o que pretendendo discutir nesse tópico é a importância dessas teorias e
dentre elas do positivismo, para a formação de uma visão de mundo tecnocrática no Brasil.
Esse período da história brasileira marca uma profunda transformação social, é o
momento do fim da escravidão e da proclamação da República. É evidente que as
transformações não são naturais, fruto de uma evolução natural das sociedades, como
acreditavam os evolucionistas. Essas transformações vieram a partir de choques, de embates, e
em alguns momentos a partir de guerras e revoluções. No Brasil não foi diferente, a mudança
ocorrida foi estrutural, não foi somente uma mudança circunstancial. Uma dessas mudanças foi o
fim do trabalho escravo, e sua substituição pelo trabalho livre. É de se supor que essa mudança
foi radical, pois todo o sistema produtivo e social brasileiro estava fortemente ligado a
escravidão, e havia, portanto muitos interessados na continuidade, dentre eles os produtores de
café, que nesse momento ditavam as regras por aqui. Outro grave problema para o país era a
substituição dessa mão de obra escrava pelo trabalhador livre, pois a população do país era
escassa, dessa forma uma das soluções encontradas foi importar mão de obra estrangeira, o que
não era fácil. Primeiro por causa dos custos e depois pela dificuldade de recrutar trabalhadores
especializados na Europa, convencer essa gente de que eles se sairiam bem aqui no Brasil, pois a
imagem que a Europa fazia do Brasil não era nada encantadora, pelo contrário, desde os
primeiros viajantes, com Saint Hileire, Gobineau, o Brasil era depreciado. Com intuito de mudar
a imagem do Brasil no exterior, principalmente na Europa, Dom Pedro II financia a participação
do país nas grandes “exposições universais”. Essas exposições eram organizadas com intuito de
apresentar as “novidades” das nações “modernas”, e o Brasil com incentivo do imperador via
nesses eventos a oportunidade de mostrar que o país não possuía somente grande riqueza natural,
era um país em pleno desenvolvimento, portanto era uma nação “moderna”.
A argumentação por parte dos grandes produtores de café, que eram contrários ao fim da
escravidão era vasta, porém a partir da leitura dos clássicos Europeus, principalmente os
liberais4, alguns políticos e intelectuais começaram a defender o fim do tráfico e dessa maneira,
as campanhas antiescravista, cresceram ganhando vários adeptos, dentre eles o senador Nabuco
de Araujo, pai do também abolicionista Joaquim Nabuco, outro defensor do fim da escravidão
era André Rebouças.
Esse último era um engenheiro que havia se formado na Escola Politécnica, e além de
defender o fim da escravidão, também possuía projetos de desenvolvimento do capitalismo
brasileiro. Seus trabalhos na construção de ferrovias, o possibilitou fazer contatos com vários
engenheiros ingleses, e é da Inglaterra que Rebouças mais se aproxima, ele defendia um modelo
liberal de desenvolvimento para o Brasil, mas sem mudança na estrutura política, ou seja, era um
defensor da monarquia. Já a maior parte dos estudantes e professores da Politécnica, defendia o
4
É interessante notar que liberalismo não significou no Brasil, fim da escravidão. Muitos dos defensores da
escravidão eram membros do Partido Liberal, e defendiam bandeiras liberais. Como aponta Alfredo Bosi em seu
ensaio, A Escravidão Entre dois Liberalismos, liberalismo e escravidão se combinaram no Brasil, pósIndependência. Estou defendendo que uma visão tecnocrática que havia sido fortemente influenciada pela Inglaterra,
teve expressão no período que vai de 1870-1930. Essa corrente de pensamento não pode ser classificada somente
como liberal, mas de toda forma, intelectuais e políticos como, Nabuco de Araujo, Joaquim Nabuco e André
Rebouças, costumam ser classificados com liberais. Esse caráter pouco homogêneo do pensamento social brasileiro,
é justificado por Ângela Alonso,quando essa autora defende que essas idéias estrangeiras eram utilizadas no Brasil
de forma pragmática, ou seja, eram readaptadas conforme a realidade brasileira.
fim da escravidão e da monarquia, por ver nessa forma de representação política o alicerce de
um modelo de sociedade atrasado.
Porém o mais interessante é que a partir das demandas internas, políticos e intelectuais,
começaram a utilizar formas de pensamento que estavam entre as mais progressistas em termos
de desenvolvimento do capitalismo, como afirma Josianne Francia Cerasoli, na sua dissertação
de mestrado A Grande Cruzada: Os Engenheiros e as Engenharias de Poder na Primeira
República: “Não, seria, nesse sentido, mimetismo das elites, mas tentativas de alcançar o
crescimento desejado, de adaptar as condições nacionais aos valores de civilização”. Portanto é
com uma visão de mundo progressista, tendo com ideal a ser atingido o desenvolvimento
material através da ciência que os representantes da classe dominante brasileira utilizam as idéias
estrangeiras. É verdade que algumas dessas idéias eram de cunho racistas, e o racismo enquanto
forma de interpretar a sociedade brasileira possui uma literatura vasta nesse período, dentre os
nomes que podemos citar, está Silvio Romero, Nina Rodrigues, Oliveira Vianna, entre outros.
Mas mesmo com esse caráter racista, boa parte dessas correntes de pensamento possuía um
conteúdo progressista e buscavam uma forma para desenvolver o Brasil, e torna esse país de
dimensão continental uma grande Nação capitalista. A forma como esse desenvolvimento se
daria é que causa a divergência entre os membros da classe dominante brasileira.
2 – A IMPORTÂNCIA DO PENSAMENTO CORPORATIVISTA DE OLIVEIRA
VIANNA, PARA A CONSOLIDAÇÃO DAS NOVAS RELAÇÕES DE TRABALHO NO
BRASIL
No livro Problemas de Política Objetiva, Vianna, dedica três capítulos para a questão dos
Conselhos Técnicos. Para chegar a tal organização é preciso para ele solidariedade. Pois “a força
de qualquer classe econômica ou não econômica, reside na sua solidariedade. Força moral, força
social, força política” (VIANNA,1974,115). Solidariedade essa impossível de ser atingida no
Brasil através de um modelo Liberal, pois esse deixa na mão de pessoas que não tem o
conhecimento técnico necessário a responsabilidade de tomar decisões importantes para a nação.
Para a solução desse problema a aposta de Vianna é no técnico. Em suas palavras:
“Realmente, nada há que supra o conhecimento do “técnico”, do “prático” ou do
“entendido do negócio”. Nenhum homem de Estado, nenhum administrador
consciencioso, com o sentimento natural de suas limitações, há hoje que ouse resolver
por si só por ciência infusa, por palpite, por intuição os problemas relativos a nenhuma
classes, a não ser a classe a que ele realmente pertence”. (VIANNA, 2004, 116).
Para ele essa é uma demanda vinda da nova forma de organização da sociedade, estabelecida no
pós-guerra, tanto a primeira como a segunda guerra mundial, trouxe com sigo a necessidade de
uma nova organização, e que veio para ficar “trata-se de coisa séria não é algo transitório”
(VIANNA, 1974, 118).
Nesse novo modelo de organização a substituição da competência parlamentar pela
competência técnica é inevitável. Esse modelo é possível em um Estado Corporativista por ser o
modelo da cooperação, e não da subordinação. Pois o povo não adere às leis que são impostas, é
preciso criar um consenso, é preciso trazer o povo para dentro do aparelho estatal, ou em outras
palavras é preciso fazer o povo participar da nação.
As formulações de Oliveira Vianna estão em consonância com a nova organização do
Estado instituída com a Revolução de 1930. Estado esse centralizador, que assume a tarefa de
forjar uma consciência nacional. É nesse sentido que Vianna é importante para a instituição do
Estado Novo Varguista.
A todo instante notamos no pensamento do autor fluminense a preocupação com a
consciência nacional, que como já foi exposto fora prejudicada pelo modelo institucional
federativo da República Velha. Essa linha de pensamento foi inaugurada no Brasil, no século
XIX e entre outros intelectuais que se preocupam com o assunto nesse período destaca-se,
Varnhagem, Silvio Romero, Nina Rodrigues, Euclides da Cunha, para citar os mais relevantes. O
centro do debate era a questão racial, pois eram antes de tudo herdeiros das formulações feitas
por Von Martius. A questão racial suscitou o aparecimento de diversas posições. Destaca-se no
final do século XIX, a posição do médico baiano Nina Rodrigues, que via com pessimismo a
presença do negro e do índio na sociedade brasileira, e para ele o caminho da miscigenação era
prejudicial e prejudicava todas as raças que participavam de tal processo. Porém com as
mudanças ocorridas durante o século XX, essa visão foi cada vez mais sendo relegada, em
oposição surgia uma posição mais harmônica no seio da Elite intelectual brasileira. Nessa nova
visão o ideal de branqueamento racial, surgia com muita força, e Oliveira Vianna talvez tenha
sido o mais conhecido porta-voz deste ideal. Para Muryatan Santana Barbosa:
“A sua obra tem a teorização de uma idéia que esteve presente em intelectuais
significativos da época, segundo a qual o Brasil seria uma nação formada por um povo
majoritariamente mestiço, mas em processo de branqueamento. O arianismo de Vianna
era uma teoria na qual a miscigenação, propiciada por uma política eugenista, formaria
com o tempo uma nova raça ariana nos trópicos. O sucesso deste projeto baseava-se em
causas tidas como naturais da “superioridade da raça branca”, como: a) a maior
reprodução da “raça branca”; b) a maior taxa de mortalidade dos negros e mulatos,
submetidos à miséria e a fome após a abolição, e o controle político-ideológico deste
projeto eugenista através da imigração européia. (BARBOSA, 2004, 33)
Portanto a questão posta era a da identidade nacional, e essa para Vianna só era possível
de ser alcançados com a incorporação das raças marginalizadas, os negros e índios. O
branqueamento cumpria um papel ideológico de criar esse sentimento de pertencimento, a uma
nação, característica da identidade nacional.
Outra característica importante da identidade nacional é a fixação de pontos de diferença
em relação à outra civilização, e nesse sentido a obra de Vianna Mog, Bandeirantes e Pioneiros:
Marcos de duas Civilizações contribui nesse momento para o debate a cerca das diferenças no
tratamento da relação entre brancos e negros, por parte dos EUA e o Brasil. Autor esse que era
contemporâneo a Vianna, e que possuía como um de seus objetivos expresso através de sua obra
a busca da identidade nacional. Ele via no Bandeirante o papel de alargador das fronteiras
nacionais, agente que tem papel fundamental na incorporação de regiões outrora distantes a vida
nacional. Neste sentido a uma convergência fundamental com Oliveira Vianna, pois este autor
defende em seu livro O povo brasileiro e sua evolução, o arianismo bandeirante.
Ambos se aproximam com maior força, ao enxergarem na Revolução de 1930 e no
Estado Novo, o momento de construção ideológica que procurou construir a cultura política
nacional sobre dois pilares: a busca das raízes brasileiras e a implantação de um Brasil moderno.
As raízes brasileiras para Vianna estavam ligadas a sua formação de Clã, formação essa que
vinha da colônia e persistia até o século XX, momento em que escreve.
Como já foi apontado anteriormente Oliveira Vianna era um defensor da imigração como
forma de solucionar o problema da incorporação das raças “inferiores” ao projeto de Brasil
moderno, e em 1935 com a fundação do Conselho Nacional de Imigração, ele terá um aparelho
institucional importante para a efetivação de um projeto que incentivasse a imigração. E ele será
encarregado de criar o anteprojeto da lei de imigração. Nesse sentido ganha força a
argumentação aqui proposta, a de que Oliveira Vianna é um produtor e executor de suas teorias.
Esse aparelho institucional criado na Era Vargas, é fundamental na visão do autor para a unidade
nacional, esse modelo dos conselhos tem um peso fundamental para participação de todos os
brasileiros na vida nacional, neste sentido os conselhos contribuem para incorporar os indivíduos
na esfera pública, uma das características da identidade.
A partir do exposto podemos notar que José Francisco de Oliveira Vianna, possui projeto
claro de intervenção social. Nesse sentido entendemos que o autor, por não ser um burguês
clássico, e nem um intelectual que pretendia somente interpretar o mundo, está inserido na classe
dos gestores. Essa classe é definida por João Bernardo, “como a expressão institucional do
controle e organização da exploração global capitalista sobre a força de trabalho assalariada.”
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAÚJO, Rosa Maria Barbosa de. O batismo do trabalho: A experiência de Lindolfo Collor.Rio
de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1990.
BERNARDO, João. Economia dos Conflitos Sociais. São Paulo, Cortez, 1991.
_______________.Democracia Totalitária:Teoria e prática da empresa soberana.São Paulo,
Cortez, 2004.
________________.Transnacionalização do Capital e Fragmentação dos trabalhadores.Ainda
há lugar para os sindicatos?. São Paulo, Boitempo Editorial, 2000.
BARBOSA,
Muryatan
Santana.
Identidade
Nacional
e
Ideologia
Racialista.
In.
http://historiaecultura.googlepages.com/Identidadenacional.pdf.
CARVALHO, José Murilo. A Utopia de Oliveira Vianna.In. O pensamento de Oliveira
Vianna/por Élide Rugai Bastos, João Quartim de Moraes. Campinas, Editora da Unicamp,1993.
DINIZ, Eli. O Estado Novo: Estrutura de Poder Relações de Classes. In. O Brasil
republicano,v.3:sociedade e política(1930-1964)/por Ângela Maria de Castro Gomes. 3ª Ed. Rio
de Janeiro, Bertrand Brasil, 2004.
GOLDMANN, Lucien. Dialética e Cultura. 3.ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1991.
GUIMARAES, Manoel Luís Salgado. Nação e civilização nos trópicos: o Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro e o projeto de uma história nacional. In. Revista Estudos Históricos:
caminhos da Historiografia, Rio de Janeiro, n.1, 1988.
LAMOUNIER, Bolivar. Formação de um Pensamento Político Autoritário na Primeira
República. Uma Interpretação. In.O Brasil Republicano, v2: Sociedade e instituições (18891930)/por Paulo Sérgio Pinheiro. 7 ª Ed. Rio de Janeiro Bertrand Brasil, 2004.
MEDEIROS, Jarbas. Ideologia Autoritária no Brasil (1930-1945). Instituto de Documentação.
Editora da Fundação Getúlio Vargas. Rio de Janeiro, 1978.
OLIVEIRA VIANNA, Francisco José. Problemas de Política Objetiva. 3ª Ed. Rio de Janeiro,
Record.1974.
ODALIA, Nilo. As formas do mesmo: ensaios sobre o pensamento historiográfico de Varnhagen
e Oliveira Vianna. São Paulo: UNESP, 1997.
VENANCIO, Giselle Martins. Na Trama do Arquivo: A Trajetória de Oliveira Vianna (18831951). Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História Social, do
Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Orientadora:
Andrea Daher, Rio de Janeiro, 2003.
Download

LINDOLFO COLLOR E A ORGANIZAÇÃO DO MINISTÉRIO