LINDOLFO COLLOR E A ORGANIZAÇÃO DO MINISTÉRIO DO TRABALHO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO (1930-1932) Thiago Oliveira Martins1 O presente trabalho tem por objetivo, analisar o período de constituição do primeiro Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, (1930- 1932). Esse Ministério foi criado pelo Decreto n 19.433, de 26 de novembro de 1930, portanto um mês após a vitória da Aliança Liberal na Revolução de outubro, que colocou Vargas na Presidência da República do Brasil. Seu primeiro ministro foi o gaúcho Lindolfo Collor, ele ocupou a pasta nos primeiros dois anos e nesse período construiu a base do que seria futuramente as leis trabalhistas, sindicais e toda uma gama de instrumentos utilizados pelo Estado para desenvolver a indústria e o comércio, na chamada Era Vargas. Ao fazer a leitura de alguns textos sobre esse período notamos a importância desse ministério, para a organização do capitalismo brasileiro. Nossa leitura será referenciada pelos conceitos de Estado Amplo e Estada Restrito, bem como o de Condições Gerais de Produção, do teórico marxista português João Bernardo. E para compreendermos a forma como essa classe pensava, ou pelo menos tentar aferir quais as formas de pensamento existiam na época, quais teorias eram utilizadas pelos gestores, quais foram as influências teóricas desses organizadores, utilizarei os conceitos de Visão de Mundo, consciência Real e Consciência Possível, desenvolvidos na obra do teórico marxista Lucien Goldmann. Palavras-Chave: Gestores, Visão de Mundo, Condições Gerais de Produção. INTRODUÇÃO O presente trabalho tem por objetivo, analisar o período de constituição do primeiro Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, (1930- 1932). Esse Ministério foi criado pelo Decreto n 19.433, de 26 de novembro de 1930, portanto um mês após a vitória da Aliança Liberal na Revolução de outubro, que colocou Vargas na Presidência da República do Brasil. Seu primeiro ministro foi o gaúcho Lindolfo Boeckel Collor, ele ocupou a pasta nos primeiros dois anos e nesse período construiu a base do que seriam futuramente as leis trabalhistas, bem como toda uma gama de instrumentos utilizados pelo Estado para desenvolver a indústria e o 1 Atualmente cursa Mestrado em História, na Universidade Federal de Goiás. Bolsista CAPES. comércio, na chamada Era Vargas. Ao fazer a leitura de alguns textos sobre esse período notamos a importância desse ministério, para a organização do capitalismo brasileiro. Nossa leitura será referenciada pelos conceitos de Gestores, Estado Amplo e Estada Restrito, bem como o de Condições Gerais de Produção, do teórico marxista português João Bernardo. No livro Transnacionalização do Capital e Fragmentação dos Trabalhadores2, o autor define da seguinte maneira o Estado Restrito: “O conjunto das instituições que compõem o governo, o parlamento e os tribunais, ou seja, aos poderes executivo, legislativo e judiciário. É uso corrente denominar estes três poderes, simplesmente, Estado, e para a maior parte das pessoas é a eles que se limita o aparelho estatal.” (BERNARDO, 2000,11) No livro Economia dos Conflitos Sociais (1991), o autor desenvolve de forma mais completa o conceito de Estado Restrito, para ele: “Apenas sob o estrito ponto de vista das relações entre capitalistas, o Estado pode se reduzir ao sistema de poderes classicamente definido, a que chamo aqui Estado Restrito. Os parâmetros da organização do Estado R definem-se pelos casos-limite da acumulação de capital sob forma absolutamente centralizada, e temos então a ditadura interna aos capitalistas, ou sob forma dispersa, isto é, quando existe uma pluralidade de pólos de acumulação, e temos então a democracia interna aos capitalistas. A organização do Estado R depende, em suma, do processo de constituição das classes capitalistas.” (BERNARDO, 1991, 162/163) O Estado Restrito seria, portanto o Estado Clássico, tanto na sua forma autoritária como na democrática. Porém para esse autor no capitalismo existe outro tipo de estado que é o que ele define como sendo o Estado Amplo, que para o autor possui as seguintes características: “Em tudo o que diz respeito à organização interna das empresas, os patrões e os gestores escolhem os sistemas de administração e organizam a força de trabalho, o que constitui uma forma de poder legislativo. Além disso, eles estabelecem as hierarquias, definindo a amplitude das decisões possíveis de ser tomadas em cada escalão, e impõem as normas de trabalho, o que constitui uma forma de poder executivo. Finalmente, os proprietários das empresas ou os seus administradores avaliam o desempenho de cada trabalhador, concedendo prêmios de produtividade ou impondo multas e outros tipos de punição, inclusive a demissão, o que constitui uma forma de poder judiciário.”(BERNARDO,2000,11/12) Podemos destacar outra definição sua sobre Estado Amplo, no livro Economia dos Conflitos Sociais, segundo João Bernardo: “É constituído pelos mecanismos da produção de mais-valia, ou seja, por aqueles processos que asseguram aos capitalistas a reprodução da exploração. Os parâmetros da organização do Estado A definem-se pelos limites da maisvalia absoluta e da mais-valia relativa; a sua história é a dos ciclos sucessivos da mais-valia relativa; e a diferença entre os sistemas de organização do Estado A nas várias épocas e regiões é a diferença entre os tipos de extorsão da maisvalia”. (BERNARDO, 1991, 162) As empresas privadas na análise bernardiana do capitalismo, funcionam como um Estado, tendo em seu interior uma organização administrativa, que em alguns momentos ultrapassa as funções do Estado Restrito, e este reconhece juridicamente os poderes do Estado Amplo. E é nessa conjugação do Estado Amplo com o Restrito que o autor concebe o Estado Capitalista. É, portanto fortemente embasado na perspectiva de análise de João Bernardo que tentaremos analisar o papel institucional do Ministério do Trabalho, Indústria e comércio, como uma instituição que faz a articulação entre esses dois tipos de Estado, pois esse é um dos ministérios mais importantes para as Condições Gerais de Produção, que segundo João Bernardo: “Chamo Condições Gerais de Produção a todas as infra-estruturas, não só materiais, mas ainda sociais e culturais, indispensáveis para que o capitalismo exista e se expanda, e que vigoram num âmbito superior ao de cada empresa particularmente considerada. As ferrovias, por exemplo, a rede elétrica, o sistema escolar, os padrões culturais, não se podem confinar aos limites de cada empresa e ultrapassam-nos todos. Sem estas Condições Gerais de Produção o capitalismo não poderia ter começado a desenvolver-se, nem conseguiria hoje deter a hegemonia.”(BERNARDO,2000,12/13) O capitalismo, portanto depende das CGP(s), para sua reprodução, e o caso brasileiro, notadamente no período em que estamos estudando, é central pensarmos como se deu a sua constituição. É, portanto nesse momento que a figura dos gestores será analisada. Pois não tendo uma base industrial forte, coube a essa classe a tarefa de desenvolver as condições para que se constituísse um Estado Capitalista, no país. Em resumo pretendemos defender que no período de constituição do M.T.I.C, em plena Revolução de 1930, o Brasil viveu uma Revolução Capitalista, empreendida pelos gestores do Estado Restrito, por não haver um Estado Amplo com condições de empreender tal revolução. Sendo, portanto indispensável a industrialização para que um país competisse a nível internacional, ou seja, disputasse mercados com empresas dos chamados países centrais, no caso brasileiro quem organizou as condições para que os capitalistas brasileiros pudessem disputar esses mercados foi o Estado Restrito. O Ministério e seu primeiro Ministro Antes dos acontecimentos que possibilitaram a Getúlio Vargas, assumir a presidência do Brasil em outubro de 1930, houve alguns acontecimentos que colocou como prioridade a solução do conflito capital/trabalho no Brasil. Alguns eventos foram fundamentais para que boa parte da classe dominante compreendesse que era preciso encontrar uma saída para os impasses entre os trabalhadores e os empresários. Dessa forma as greves de 1917 e 1919, foram importantes para que o Estado Restrito se mobilizasse, as atitudes tomadas até o Governo Vargas, foram as mais variadas, porém o que sobressaia era a repressão militar. Varias leis foram criadas no intuito de amenizar o conflito, porém nenhuma delas teve uma aplicação efetiva, é o caso, por exemplo, da diminuição da jornada de trabalho e das férias de 15 dias remunerada. Foi no governo Vargas que o Estado R, assumiu a tarefa de amenizar esse conflito e a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, foi à primeira medida tomada por ele, para efetivar novas leis que pudessem enfim arbitrar esse conflito. Não assumo a visão de que foi Getúlio Vargas o pai dos pobres e que seu governo possuía uma posição neutra no conflito, se em alguns momentos ele se posicionou contrário aos interesses do capital, foi por que o empresariado no objetivo de obter o maior lucro possível não cedia em favor dos trabalhadores e com isso possuíam atitudes que colocavam em risco a estabilidade do sistema capitalista. E como esses gestores possuíam conhecimentos técnicos, que os possibilitavam vislumbrar maiores lucros com a nova forma de regulação do trabalho em vários momentos tiveram atrito com esses empresários. No livro O batismo do Trabalho: a experiência de Lindolfo Collor, Rosa Maria Barbosa de Araújo, aponta o motivo central da criação desse ministério. Para a autora: “A pretendida solução para a questão social traduz-se na implementação da Legislação Trabalhista promovida pelo Ministério do Trabalho, dotando o país de um novo Direito Social, cuja análise é capaz de apontar instrumentos identificadores das relações de poder.” (ARAÚJO, 1990,25) A denominação “Questão Social” foi criada para designar os problemas que envolviam a classe trabalhadora no Brasil. A partir desse ponto de vista podemos entendemos que o M.T.I.C, foi peça chave na articulação e nas negociações com empresários e trabalhadores, e não é possível compreender o papel dessa instituição sem abordar alguns aspectos de sua formação e a importância que teve Lindolfo Collor e sua equipe nos primeiros dois anos de funcionamento da instituição. Lindolfo Boeckel Collor, primeiro ministro do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, era um gaúcho e pertencia a chamada Geração de 1907, ano em que terminou o seu curso jurídico em Porto Alegre e ingressa no Bloco Acadêmico Castilhista, junto com alguns dos nomes que serão fundamentais para a consolidação da Revolução de 1930, são eles: Getúlio Vargas, Osvaldo Aranha, João Neves da Fontoura, Flores da Cunha, Firmino Paim Filho, Maurício Cardoso. 1 – “UM MONTE DE IDÉIAS NOVAS” Ao refletir sobre a literatura brasileira de sua época, o crítico literário Silvio Romero, percebeu que havia “um monte de idéias novas”, vindas da Europa e sendo utilizadas pelos intelectuais brasileiros. Nesse caldeirão de novas idéias, se encontrava o positivismo, o cientificismo, liberalismo, spencerianismo e o darwinismo social. Para alguns teóricos e dentre eles destaco Roberto Schwarz, essa geração que vai do final do século XIX até a década de 1930 do século XX, era caracterizada por copiar as teorias estrangeiras, para esse autor essas “idéias estavam fora do lugar”,3 o que pretendendo discutir nesse tópico é a importância dessas teorias e dentre elas do positivismo, para a formação de uma visão de mundo tecnocrática no Brasil. Esse período da história brasileira marca uma profunda transformação social, é o momento do fim da escravidão e da proclamação da República. É evidente que as transformações não são naturais, fruto de uma evolução natural das sociedades, como acreditavam os evolucionistas. Essas transformações vieram a partir de choques, de embates, e em alguns momentos a partir de guerras e revoluções. No Brasil não foi diferente, a mudança ocorrida foi estrutural, não foi somente uma mudança circunstancial. Uma dessas mudanças foi o fim do trabalho escravo, e sua substituição pelo trabalho livre. É de se supor que essa mudança foi radical, pois todo o sistema produtivo e social brasileiro estava fortemente ligado a escravidão, e havia, portanto muitos interessados na continuidade, dentre eles os produtores de café, que nesse momento ditavam as regras por aqui. Outro grave problema para o país era a substituição dessa mão de obra escrava pelo trabalhador livre, pois a população do país era escassa, dessa forma uma das soluções encontradas foi importar mão de obra estrangeira, o que não era fácil. Primeiro por causa dos custos e depois pela dificuldade de recrutar trabalhadores especializados na Europa, convencer essa gente de que eles se sairiam bem aqui no Brasil, pois a imagem que a Europa fazia do Brasil não era nada encantadora, pelo contrário, desde os primeiros viajantes, com Saint Hileire, Gobineau, o Brasil era depreciado. Com intuito de mudar a imagem do Brasil no exterior, principalmente na Europa, Dom Pedro II financia a participação do país nas grandes “exposições universais”. Essas exposições eram organizadas com intuito de apresentar as “novidades” das nações “modernas”, e o Brasil com incentivo do imperador via nesses eventos a oportunidade de mostrar que o país não possuía somente grande riqueza natural, era um país em pleno desenvolvimento, portanto era uma nação “moderna”. A argumentação por parte dos grandes produtores de café, que eram contrários ao fim da escravidão era vasta, porém a partir da leitura dos clássicos Europeus, principalmente os liberais4, alguns políticos e intelectuais começaram a defender o fim do tráfico e dessa maneira, as campanhas antiescravista, cresceram ganhando vários adeptos, dentre eles o senador Nabuco de Araujo, pai do também abolicionista Joaquim Nabuco, outro defensor do fim da escravidão era André Rebouças. Esse último era um engenheiro que havia se formado na Escola Politécnica, e além de defender o fim da escravidão, também possuía projetos de desenvolvimento do capitalismo brasileiro. Seus trabalhos na construção de ferrovias, o possibilitou fazer contatos com vários engenheiros ingleses, e é da Inglaterra que Rebouças mais se aproxima, ele defendia um modelo liberal de desenvolvimento para o Brasil, mas sem mudança na estrutura política, ou seja, era um defensor da monarquia. Já a maior parte dos estudantes e professores da Politécnica, defendia o 4 É interessante notar que liberalismo não significou no Brasil, fim da escravidão. Muitos dos defensores da escravidão eram membros do Partido Liberal, e defendiam bandeiras liberais. Como aponta Alfredo Bosi em seu ensaio, A Escravidão Entre dois Liberalismos, liberalismo e escravidão se combinaram no Brasil, pósIndependência. Estou defendendo que uma visão tecnocrática que havia sido fortemente influenciada pela Inglaterra, teve expressão no período que vai de 1870-1930. Essa corrente de pensamento não pode ser classificada somente como liberal, mas de toda forma, intelectuais e políticos como, Nabuco de Araujo, Joaquim Nabuco e André Rebouças, costumam ser classificados com liberais. Esse caráter pouco homogêneo do pensamento social brasileiro, é justificado por Ângela Alonso,quando essa autora defende que essas idéias estrangeiras eram utilizadas no Brasil de forma pragmática, ou seja, eram readaptadas conforme a realidade brasileira. fim da escravidão e da monarquia, por ver nessa forma de representação política o alicerce de um modelo de sociedade atrasado. Porém o mais interessante é que a partir das demandas internas, políticos e intelectuais, começaram a utilizar formas de pensamento que estavam entre as mais progressistas em termos de desenvolvimento do capitalismo, como afirma Josianne Francia Cerasoli, na sua dissertação de mestrado A Grande Cruzada: Os Engenheiros e as Engenharias de Poder na Primeira República: “Não, seria, nesse sentido, mimetismo das elites, mas tentativas de alcançar o crescimento desejado, de adaptar as condições nacionais aos valores de civilização”. Portanto é com uma visão de mundo progressista, tendo com ideal a ser atingido o desenvolvimento material através da ciência que os representantes da classe dominante brasileira utilizam as idéias estrangeiras. É verdade que algumas dessas idéias eram de cunho racistas, e o racismo enquanto forma de interpretar a sociedade brasileira possui uma literatura vasta nesse período, dentre os nomes que podemos citar, está Silvio Romero, Nina Rodrigues, Oliveira Vianna, entre outros. Mas mesmo com esse caráter racista, boa parte dessas correntes de pensamento possuía um conteúdo progressista e buscavam uma forma para desenvolver o Brasil, e torna esse país de dimensão continental uma grande Nação capitalista. A forma como esse desenvolvimento se daria é que causa a divergência entre os membros da classe dominante brasileira. 2 – A IMPORTÂNCIA DO PENSAMENTO CORPORATIVISTA DE OLIVEIRA VIANNA, PARA A CONSOLIDAÇÃO DAS NOVAS RELAÇÕES DE TRABALHO NO BRASIL No livro Problemas de Política Objetiva, Vianna, dedica três capítulos para a questão dos Conselhos Técnicos. Para chegar a tal organização é preciso para ele solidariedade. Pois “a força de qualquer classe econômica ou não econômica, reside na sua solidariedade. Força moral, força social, força política” (VIANNA,1974,115). Solidariedade essa impossível de ser atingida no Brasil através de um modelo Liberal, pois esse deixa na mão de pessoas que não tem o conhecimento técnico necessário a responsabilidade de tomar decisões importantes para a nação. Para a solução desse problema a aposta de Vianna é no técnico. Em suas palavras: “Realmente, nada há que supra o conhecimento do “técnico”, do “prático” ou do “entendido do negócio”. Nenhum homem de Estado, nenhum administrador consciencioso, com o sentimento natural de suas limitações, há hoje que ouse resolver por si só por ciência infusa, por palpite, por intuição os problemas relativos a nenhuma classes, a não ser a classe a que ele realmente pertence”. (VIANNA, 2004, 116). Para ele essa é uma demanda vinda da nova forma de organização da sociedade, estabelecida no pós-guerra, tanto a primeira como a segunda guerra mundial, trouxe com sigo a necessidade de uma nova organização, e que veio para ficar “trata-se de coisa séria não é algo transitório” (VIANNA, 1974, 118). Nesse novo modelo de organização a substituição da competência parlamentar pela competência técnica é inevitável. Esse modelo é possível em um Estado Corporativista por ser o modelo da cooperação, e não da subordinação. Pois o povo não adere às leis que são impostas, é preciso criar um consenso, é preciso trazer o povo para dentro do aparelho estatal, ou em outras palavras é preciso fazer o povo participar da nação. As formulações de Oliveira Vianna estão em consonância com a nova organização do Estado instituída com a Revolução de 1930. Estado esse centralizador, que assume a tarefa de forjar uma consciência nacional. É nesse sentido que Vianna é importante para a instituição do Estado Novo Varguista. A todo instante notamos no pensamento do autor fluminense a preocupação com a consciência nacional, que como já foi exposto fora prejudicada pelo modelo institucional federativo da República Velha. Essa linha de pensamento foi inaugurada no Brasil, no século XIX e entre outros intelectuais que se preocupam com o assunto nesse período destaca-se, Varnhagem, Silvio Romero, Nina Rodrigues, Euclides da Cunha, para citar os mais relevantes. O centro do debate era a questão racial, pois eram antes de tudo herdeiros das formulações feitas por Von Martius. A questão racial suscitou o aparecimento de diversas posições. Destaca-se no final do século XIX, a posição do médico baiano Nina Rodrigues, que via com pessimismo a presença do negro e do índio na sociedade brasileira, e para ele o caminho da miscigenação era prejudicial e prejudicava todas as raças que participavam de tal processo. Porém com as mudanças ocorridas durante o século XX, essa visão foi cada vez mais sendo relegada, em oposição surgia uma posição mais harmônica no seio da Elite intelectual brasileira. Nessa nova visão o ideal de branqueamento racial, surgia com muita força, e Oliveira Vianna talvez tenha sido o mais conhecido porta-voz deste ideal. Para Muryatan Santana Barbosa: “A sua obra tem a teorização de uma idéia que esteve presente em intelectuais significativos da época, segundo a qual o Brasil seria uma nação formada por um povo majoritariamente mestiço, mas em processo de branqueamento. O arianismo de Vianna era uma teoria na qual a miscigenação, propiciada por uma política eugenista, formaria com o tempo uma nova raça ariana nos trópicos. O sucesso deste projeto baseava-se em causas tidas como naturais da “superioridade da raça branca”, como: a) a maior reprodução da “raça branca”; b) a maior taxa de mortalidade dos negros e mulatos, submetidos à miséria e a fome após a abolição, e o controle político-ideológico deste projeto eugenista através da imigração européia. (BARBOSA, 2004, 33) Portanto a questão posta era a da identidade nacional, e essa para Vianna só era possível de ser alcançados com a incorporação das raças marginalizadas, os negros e índios. O branqueamento cumpria um papel ideológico de criar esse sentimento de pertencimento, a uma nação, característica da identidade nacional. Outra característica importante da identidade nacional é a fixação de pontos de diferença em relação à outra civilização, e nesse sentido a obra de Vianna Mog, Bandeirantes e Pioneiros: Marcos de duas Civilizações contribui nesse momento para o debate a cerca das diferenças no tratamento da relação entre brancos e negros, por parte dos EUA e o Brasil. Autor esse que era contemporâneo a Vianna, e que possuía como um de seus objetivos expresso através de sua obra a busca da identidade nacional. Ele via no Bandeirante o papel de alargador das fronteiras nacionais, agente que tem papel fundamental na incorporação de regiões outrora distantes a vida nacional. Neste sentido a uma convergência fundamental com Oliveira Vianna, pois este autor defende em seu livro O povo brasileiro e sua evolução, o arianismo bandeirante. Ambos se aproximam com maior força, ao enxergarem na Revolução de 1930 e no Estado Novo, o momento de construção ideológica que procurou construir a cultura política nacional sobre dois pilares: a busca das raízes brasileiras e a implantação de um Brasil moderno. As raízes brasileiras para Vianna estavam ligadas a sua formação de Clã, formação essa que vinha da colônia e persistia até o século XX, momento em que escreve. Como já foi apontado anteriormente Oliveira Vianna era um defensor da imigração como forma de solucionar o problema da incorporação das raças “inferiores” ao projeto de Brasil moderno, e em 1935 com a fundação do Conselho Nacional de Imigração, ele terá um aparelho institucional importante para a efetivação de um projeto que incentivasse a imigração. E ele será encarregado de criar o anteprojeto da lei de imigração. Nesse sentido ganha força a argumentação aqui proposta, a de que Oliveira Vianna é um produtor e executor de suas teorias. Esse aparelho institucional criado na Era Vargas, é fundamental na visão do autor para a unidade nacional, esse modelo dos conselhos tem um peso fundamental para participação de todos os brasileiros na vida nacional, neste sentido os conselhos contribuem para incorporar os indivíduos na esfera pública, uma das características da identidade. A partir do exposto podemos notar que José Francisco de Oliveira Vianna, possui projeto claro de intervenção social. Nesse sentido entendemos que o autor, por não ser um burguês clássico, e nem um intelectual que pretendia somente interpretar o mundo, está inserido na classe dos gestores. Essa classe é definida por João Bernardo, “como a expressão institucional do controle e organização da exploração global capitalista sobre a força de trabalho assalariada.” REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARAÚJO, Rosa Maria Barbosa de. O batismo do trabalho: A experiência de Lindolfo Collor.Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1990. BERNARDO, João. Economia dos Conflitos Sociais. São Paulo, Cortez, 1991. _______________.Democracia Totalitária:Teoria e prática da empresa soberana.São Paulo, Cortez, 2004. ________________.Transnacionalização do Capital e Fragmentação dos trabalhadores.Ainda há lugar para os sindicatos?. São Paulo, Boitempo Editorial, 2000. BARBOSA, Muryatan Santana. Identidade Nacional e Ideologia Racialista. In. http://historiaecultura.googlepages.com/Identidadenacional.pdf. CARVALHO, José Murilo. A Utopia de Oliveira Vianna.In. O pensamento de Oliveira Vianna/por Élide Rugai Bastos, João Quartim de Moraes. Campinas, Editora da Unicamp,1993. DINIZ, Eli. O Estado Novo: Estrutura de Poder Relações de Classes. In. O Brasil republicano,v.3:sociedade e política(1930-1964)/por Ângela Maria de Castro Gomes. 3ª Ed. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2004. GOLDMANN, Lucien. Dialética e Cultura. 3.ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1991. GUIMARAES, Manoel Luís Salgado. Nação e civilização nos trópicos: o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e o projeto de uma história nacional. In. Revista Estudos Históricos: caminhos da Historiografia, Rio de Janeiro, n.1, 1988. LAMOUNIER, Bolivar. Formação de um Pensamento Político Autoritário na Primeira República. Uma Interpretação. In.O Brasil Republicano, v2: Sociedade e instituições (18891930)/por Paulo Sérgio Pinheiro. 7 ª Ed. Rio de Janeiro Bertrand Brasil, 2004. MEDEIROS, Jarbas. Ideologia Autoritária no Brasil (1930-1945). Instituto de Documentação. Editora da Fundação Getúlio Vargas. Rio de Janeiro, 1978. OLIVEIRA VIANNA, Francisco José. Problemas de Política Objetiva. 3ª Ed. Rio de Janeiro, Record.1974. ODALIA, Nilo. As formas do mesmo: ensaios sobre o pensamento historiográfico de Varnhagen e Oliveira Vianna. São Paulo: UNESP, 1997. VENANCIO, Giselle Martins. Na Trama do Arquivo: A Trajetória de Oliveira Vianna (18831951). Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História Social, do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Orientadora: Andrea Daher, Rio de Janeiro, 2003.