Rev. Bras. Fisiot. Vol. 2, No. 2 (1997) ©Associação Brasileira de Fisioterapia 49 - Avaliação Funcional do Joelho em Indivíduos Submetidos à Reconstrução de LCA Alexandra Avanian Jacob 1, Vania Maria Portes de Souza 1, Rúben de Faria Negrão Filho 2, Antonio José Dócusse Filho 3 e Júlio José de Andrade Quialheiro 4 1 Fisioterapeutas formados pela Universidade Estadual Paulista - UNESP, Campus de Presidente Prudente, no ano de 1995 2 Professor na disciplina de Eletroterapia do curso de Fisioterapia da Universidade Estadual Paulista UNESP, Rua Roberto Simonsen n° 300, 19060-900 Presidente Prudente, SP 3 Fisioterapeuta responsável pelo Setor de Fisioterapia em Ortopedia e Traumatologia da Clínica Nossa Senhora AparecidaS/C Ltda., Rua Heitor Graça 11° 966, 19013-360 Presidente Prudente, SP 4 Médico Ortopedista e Traumatologista da Clínica Nossa Senhora Aparecida SIC Ltda., Rua Heitor Graça n° 966, 19013-360 Presidente Prudente, SP Recebido: 20.08.96; Aceito: 18.06.97 Resumo. A rotina do tratamento cirúrgico e conservador de indivíduos portadores de lesão de ligamento cruzado anterior (LCA) necessita de instrumentos que permitam avaliar objetivamente os resultados destas condutas terapêuticas. Assim, o objetivo deste trabalho foi utilizar duas formas de avaliação funcional do joelho, a escala de Lysholm e o teste de performance, para avaliar indivíduos que se submeteram à cirurgia de reconstrução ligamentar do LCA. Foram estudados trinta indivíduos do sexo masculino, de dezoito a quarenta e cinco anos e que foram divididos em dois grupos. O grupo controle constou de quinze indivíduos sem história de doença articular ou muscular dos membros inferiores, e que foram submetidos à exame ligamentar do joelho para comprovação do estado de normalidade articular. O segundo grupo constou de quinze indivíduos que haviam sido submetidos à cirurgia de reconstrução ligamentar, todos com o mesmo cirurgião, nos últimos 5 anos, com um tempo mínimo de pós-cirúrgico de 8 meses. Todos os indivíduos foram submetidos a avaliação funcional pela escala de Lysholm, que consistiu de um questionário designado para determinar a função do joelho nas situações da vida diária; e pelo teste de performance, constituído de atividades fisicas que simulam situações de stress no LCA e que consistiu de três testes: corrida em linha reta, corrida da figura do oito e o teste do salto. O resultados deste estudo demonstraram que a escala de Lysholm e o teste de performance (através do teste do salto) foram eficazes para mostrar diferenças entre o grupo de indivíduos normais e o grupo pós-operado; e que a diferença observada entre os grupos sugerem que, embora os indivíduos tenham se submetido à cirurgia de reconstrução ligamentar, a recuperação completa da capacidade funcional do joelho não foi totalmente alcançada. Palavras-chave: testesfimcionais, lesões ligamentares, reconstrução do lca Abstract. The surgi cal and conserva tive treatment routine o f individuais with anterior cruciate ligament (ACL) lesion needs an instrument that make it possible to objectively evaluate the results o f the therapeutical procedures. The main objective of the work is to use two forms of functional evaluation of the knee: the Lysholm scale and the performance test, which were used to evaluate subjects that gone through surgical ligament reconstruction of the ACL. Thirty subjects ( 18 to 45 year old) were divided in two groups. The contrai group consisted o f 15 subjects with no history o f joint o r muscle disease in the inferior limbs, and were subjected to knee ligament examination to prove the normal articular status. The second group had 15 subjects who underwent through surgi cal knee ligament reconstruction, all o f them with the same surgical doctor, in the last five years and presented an 8-month minimum post-surgical period. Ali subjects underwent the Lysholm scale evaluation, which consisted of a questionnaire designed to determine the knee function in their daily lives, and the performance test, which simulated the ACL stress performance, consisting ofthree tests: running in a straight-line, the eight-figure test and the jumping test. The result ofthis study demonstrates that the Lysholm scale and the performance teste (jumping test) were effective to demonstrate differences between the contrai group and the post-operation group, and that this difference suggests that even though the subjects that had the knee ligament reconstruction surgery re-acquired the ACL, the complete recuperation ofthe knee functional capacity was not totally reached. Keywords: fimctional test, ligaments lesions, A CL reconstruction 50 Jacob et ai. Introdução Embora os procedimentos c1rurgicos e conservadores, incluindo a terapêutica de reabilitação, tenham avançado, o aspecto referente à avaliação do LCA parece não ter evoluído adequadamente a ponto de permitir uma avaliação consistente das condições funcionais desses indivíduos. Os estudos realizados demonstraram que a avaliação em pacientes lesados ou pós-operados tem sido efetuada, classicamente, através de testes ligamentares que avaliam o ligamento isoladamente e não a função do joelho. Dentre os testes ligamentares mais utilizados estão o teste de gaveta anterior (Gould, 1993; Turek, 1991), o teste de Lachman (Torg & Conrad, 1976), e o teste Pivot Shift (Galway & Macintosh, 1980). Outro método desenvolvido para medir a frouxidão do LCA é o uso do artrômetro de joelho, denominado KT-1000, que é um equipamento portátil, que uma vez fixado ao fêmur e à tíbia quantifica objetivamente em milímetros o movimento de deslocamento ântero-posterior da tíbia em relação ao fêmur (Daniel et a!., 1985). É importante ressaltar que os testes anteriormente descritos avaliam as condições específicas do ligamento, oferecendo uma avaliação parcial da estabilidade do joelho, de forma que uma avaliação funcional completa compreende um conjunto de aspectos relacionados ao conjunto de estruturas que compõem o joelho. Vários métodos diferentes de avaliação funcional do joelho são apresentados por Perez & Garcia (1994) através de uma revisão bibliográfica. Eles relataram que em escalas de avaliação funcional não existe um método ideal, universalmente aceito, para avaliar a função em indivíduos com instabilidade do joelho. Segundo Perez & Garcia (1994), foi O'Donoghue* quem primeiro quantificou os resultados objetivos e subjetivos nas reparações das lesões ligamentares do joelho. Desde então, vem surgindo uma enorme variedade de métodos para avaliar funcionalmente o joelho. Algumas escalas denominadas verbais, em geral pouco precisas, expressam o resultado funcional em categorias descritivas amplas do tipo: excelente, bom, regular c ruim. Nas escalas numéricas, quanto rüais freqüentes são os sintomas e mais baixo o nível de carga, menor será a pontuação alcançada. Outras usam sistemas binários pouco precisos, onde em cada item responde se 'sim' ou 'não', dando um valor numérico a cada alternativa. Dentre os vários métodos para avaliação funcional do joelho, o questionário proposto por Lysholm & Guillquist ( 1982) tem sido muito difundido, sobretudo para avaliar lesões do LCA. Fonseca (1989), após revisão de literatura, revelou que "a maioria dos sistemas de avaliação são dependentes de análise subjetiva dos pacientes ou de informações que podem não ser um indicador adequado do status funcional do joelho dos pacientes". * O'Donoghue, DH. An analysis o f cnd rcsults o f surgi cal trcatmcnt o f mayor injuries to ligaments ofthc knee ..J. Bone .Joint Surg. 37A: 1-13, 1955. Rev. Bras. Fisiot. Na tentativa de resolver o problema da falta de objetividade dos diversos sistemas de avaliação empregados, Tegner et a!. (1986), desenvolveram um teste de performance cujo resultado demonstrou a possibilidade de se obter uma visão geral da função do joelho, embora não tenha sido sensível o suficiente para detectar a lesão em todos os indivíduos. Fonseca (1989), baseado no trabalho de Tegner et a!. (1986), propôs e aplicou um teste de performance (cujas atividades exigem controle, força e estabilidade da articulação do joelho, reproduzindo alguns itens do esporte) para avaliar funcionalmente indivíduos com lesão de LCA. Seus resultados demonstraram a eficácia do teste ao verificar diferenças entre indivíduos normais e aqueles com lesão de LCA. Portanto, o objetivo deste trabalho foi empregar duas formas de avaliação funcional do joelho, a escala proposta por Lysholm & Gillquist (1982) e o teste de performance proposto por Fonseca (1989), para avaliar a função do joelho de indivíduos que se submeteram à cirurgia de reconstrução do ligamento cruzado anterior. Materiais e Métodos Foram testados trinta indivíduos do sexo masculino, de dezoito a quarenta e cinco anos, e que foram divididos em dois grupos. O grupo controle constou de quinze indivíduos sem história de doença articular ou muscular dos membros inferiores. No grupo pós-cirurgico, participaram os indivíduos que foram submetidos à cirurgia de reconstrução ligamentar, realizada pelo mesmo cirurgião ortopedista nos últimos anos. Todos os indivíduos testados tinham no mínimo oito meses da cirurgia (tempo este necessário para completa cicatrização do enxerto ligamentar) e tinham participado do tratamento fisioterápico utilizando o protocolo de reabilitação da Clínica Nossa Senhora Aparecida adaptado de Fonseca et a!. (1992), com o tempo total de tratamento previsto para 6 a 9 meses. Embora todos os indivíduos tivessem iniciado o protocolo de reabilitação, a continuidade no tratamento ocorreu de forma diferente entre os indivíduos.Tanto os indivíduos do grupo controle como os do grupo pós-operado foram submetidos a avaliação clínica objetiva dos seus joelhos, pelo mesmo médico cirurgião que realizou as cirurgias de reconstrução do LCA do grupo pós-operado c que constou dos testes de gaveta anterior5·11, Lachman 12 c pivot shift4 para avaliação da estabilidade do LCA. A avaliação foi realizada junto aos indivíduos do grupo controle para a comprovação do estado de normalidade dos joelhos direito e esquerdo; e para os indivíduos do grupo pósoperado, o exame fisico foi empregado para verificar o do estado atual da articulação submetida à cirurgia, de forma que todos os indivíduos que participaram deste trabalho apresentavam estabilidade de seu LCA. Foram excluídos da amostra os indivíduos portadores de anormalidade da articulação fêmuropatelar. V oi. 2. No. 2, 1997 51 Avaliação Funcional do Joelho Para a avaliação funcional dos joelhos, foi utilizada a escala de classificação de Lysholm & Gillguist (1982) e o teste de performance de Fonseca (1989). A denominada escala de Lysholm, mostrada no quadro 1, consiste de um questionário designado para determinar a função do joelho nas situações diárias, e consiste de oito itens com diferente pontuação para cada item. A pontuação máxima é de cem pontos e todos os itens, exceto o item atrofia muscular da coxa, consistem de auto avaliação da função. Como resultado final, a função do joelho é classificada em um dos quatro níveis: Função normal (95 -100 pontos); Bom (84- 94 pontos); Regular (65 -83 pontos); e Ruim (inferior a 65 pontos). O denominado teste de performance constitui de atividades fisicas que simulam situações de stress no conjunto articular do joelho, mais especificamente no ligamento cruzado anterior. Dentre estas situações, incluem-se aceleração, desaceleração e mudança de direção, entre outros. Este teste consiste de: 1. Corrida em linha reta; 2. Corrida da figura do oito; 3. Teste de salto. No teste de corrida em linha reta o indivíduo corre uma distância de dez metros, previamente marcada em uma pista de corrida plana. No teste da corrida da figura do oito, uma linha em oito é marcada no solo, tendo ao todo a distância de vinte metros. O diâmetro das duas curvas foram iguais e mediram quatro metros. O ponto de partida é localizado à dois metros da intercessão das duas retas. O teste de salto é desenvolvido em uma área de aproximadamente quatro metros, onde uma linha demarca o ponto de partida. O indivíduo coloca um pé na linha de partida e salta para frente caindo na mesma perna. I - Claudicar 2- Apoio 5( Apoio Total 5( Leve ou periódico 3( Muleta 3( Severo e constante O( Impossível de suportar éarga O( Não 4- Agachar 3 - Subir degraus !O ( Nenhum problema 5( Nenhum problema 6( Leve dificuldade 4( Um degrau de cada vez 2( Não passa de 90° 2( Incapaz o( Incapaz o( Leve dificuldade Andando, Correndo e Saltando a) Instabilidade De nenhuma forma 30 ( Raramente durante atividades atléticas ou outro severo esforço 25 ( Frequentemente durante atividades atléticas ou outro severo esforço 20 ( Ocasionalmente em atividades diárias I O( Frequentemente em atividades diárias 5( A todo momento o( b) Dor Nenhuma 30 ( Inconstante e leve durante um esforço severo 25 ( Notada em todas as formas 20 ( Notada durante severo esforço 15 ( Procedimento Notada durante ou O teste de performance foi executado na pista de atletismo da Universidade Estadual Paulista de Presidente Prudente, que apresenta uma área compatível e um piso adequado. Nessa área foram mensuradas as distâncias necessárias para a realização dos três testes de performance. O uso adequado de tênis e shorts foi obrigatório. Antes de começarem os testes, os indivíduos realizavam vinte minutos de aquecimento muscular como o trote e alongamento muscular. O primeiro teste realizado foi o da linha reta. Neste teste o indivíduo posicionava-se sobre a linha de partida iniciando a corrida quando desejasse. O indivíduo era orientado a correr o mais rápido possível e desacelerar somente após cruzar a linha de chegada. Repetia-se o teste duas vezes, com 4 min de intervalo entre uma corrida e outra, sendo registrados os dois tempos. O segundo teste realizado na pista foi a corrida da figura do oito. O indivíduo posicionava-se sobre a linha de partida iniciando o teste quando desejasse, percorrendo a distância e retomando ao mesmo ponto de largada. O indivíduo era orien- Notada durante ou após andar menos de 2 quilômetros 5( Constante e severo O( ap~s andar mais de 2 quilômetros !O ( c) Inchaço Nenhum lO ( Inconstante e leve durante severo esforço 7( Em severo esforço 5( Durante esforço de rotina 2( Constante o( d) Atrofia da coxa Nenhum 5( I- 2 em 3( mais que 2 em O( TOTAL Quadro 1. Escala de Lysholm para avaliação funcional do joelho. (Lyshom & Gillquist, 1982). 52 Rev. Bras. Fisiot. Jacob et ai. tado, como no teste de linha reta, a correr o mais rápido possível, desacelerando somente após ultrapassar a linha de chegada. O teste repetia-se duas vezes com intervalo de 4 min entre uma corrida e outra, sendo registrados os tempos das duas repetições. O tempo dos dois testes de corrida (em linha reta e na figura em oito), eram controlados por dois cronometristas que ficavam posicionados na linha de chegada. Por último, no teste de salto, o indivíduo posicionava-se sobre a linha marcada com giz branco em apoio monópode. A parte posterior do calçado era marcada com giz branco para demarcar melhor a distância após o salto. Depois de posicionarse sobre a linha, o indivíduo saltava a maior distância possível caindo sobre o mesmo membro. Este teste foi repetido duas vezes com cada perna, registrando-se a distância dos dois saltos com uma trena. Os resultados obtidos nos testes de corrida em linha reta e da figura em oito foram convertidos em valores proporcionais (VP), onde o tempo obtido no teste da figura em oito foi dividido pelo tempo do teste em linha reta: yp = 1 tempo da corrida da figura oito tempo do teste da corrida em linha reta Da mesma forma, os valores obtidos no teste do salto foram convertidos em valores proporcionais entre as distâncias conseguidas na perna normal e reabilitada. No caso do grupo controle dividiu-se a distância da perna dominante sobre a perna não dominante: yp = 2 distância da perna direita distância da perna esquerda Este procedimento baseou-se nos estudos de Tegner et a/.(1986) e Fonseca (1989), que têm como objetivo diminuir a influência de fatores individuais, tais como velocidade e agilidade, rios resultados do teste de performance. Levando-se em consideração que os tempos médios de cada indivíduo não difere entre observadores e nem entre as provas, para o cálculo dos VP 1, optou-se por considerar a média de todos os tempos observados para cada tipo de corrida. Portanto o objetivo seguinte foi comparar os resultados destes valores entre os grupos (controle e pós-operado). Pela análise de variância obteve-se uma estatística F= 0.34 com um nível de significância de 5%, p = 0.56, assim, pode-se aceitar a hipótese de que não há diferença significativa dos VP1 entre os grupos considerados. Os valores médios obtidos de cada grupo podem ser visualizados na Fig. 1. A outra informação a ser analisada é o VP2, tainbém considerou-se a média para cada perna obtida por cada um dos indivíduos nas provas de salto. Novamente pela análise de variância, observou-se uma estatística F = 11.45 com um nível de significância de 5%, p = 0.0021, mostrando a existência de diferença nos valores proporcionais 2 entre os grupos. Os valores médios de cada grupo podem ser observados no Fig. 2. Por último, foi analisado o resultado dos valores escala de Lysholm, considerando-se a média de cada grupo. Novamente, pela análise de variância, observou-se uma estatística F= 18.81 com um nível de significância de 5%, p = 0.002, mostrando a existência de diferença entre os grupos. Os valores médios de cada grupo podem ser visualizados no Fig. 3. Pela observação das variáveis escala de LYSHOLM e VP2, nota-se a existência de uma relação entre elas. O coeficiente de correlação entre as duas variáveis foi de r=- 0.37, e o Coeficiente de Correlação de Pearson mostra um nível de Tabela I. Estatística do teste e nível de significância para a comprovação das médias entre as provas da corrida da figura do oito e em linha reta (n = 30). observador I Provas observador 2 Valor de F Valor de p Valor de F Valor de p Resultados corrida da figura do 8 0.60 0.4404 1.08 0.3027 Inicialmente foi realizada uma análise para verificar a confiabilidade da coleta dos dados, uma vez que para cada indivíduo observado foram realizadas duas provas, e em que cada uma delas havia dois observadores para tomar os tempos das corridas em oito e em linha reta. Primeiro verificou-se se existia diferença entre os tempos médios obtidos por cada um dos observadores, onde pelo teste t, obteve-se uma estatística t = -1.61 com um nível de significância de p = 0.11 para a corrida em oito; e t = -0.07 com um nível de significância de p = 0.94 para a corrida em linha reta. Assim, pode-se aceitar a hipótese de que não há diferença entre os tempos obtidos por cada um dos observadores. Verificou-se, também, se existia diferença nos tempos médios entre as provas. Os resultados destes testes obtidos através de análise de variância podem ser vistos na tabela abaixo: Pela Tabela 1 pode-se observar que os níveis de significância obtidas são maiores que 0.05, portanto não há evidência de que haja diferença nas medidas entre as provas. corrida em linha reta 0.26 0.6135 0.76 0.387 Controle Pós-Operado Figura I. Médias dos valores obtidos nos cálculos dos VP I para os gmpos controle e pós-operado. Avaliação Funcional do Joelho Vol. 2. No. 2, 1997 53 correlação observado foi r= 0.07, com nível de significância obtida de p = 0.68, mostrando que não existe nenhuma relação entre estas duas variáveis. Portanto, os testes VP2 e a escala de Lysho1m se mostraram mais eficazes que o teste VP1, na detecção das diferenças entre os grupos estudados. Discussão Pós-Operado Controle Figura 2. Médias dos valores obtidos nos cálculos dos VP2 para os grupos controle e pós-operado. Pós-Opemdo Controle Figura 3. Médias dos valores obtidos nas da escala de L YSI-IOLM para os grupos controle e pós-operado. Tabela 2. Distribuição dos pacientes entre as categorias da variável L YS e VP2. Lysholm Valor Proporcional 2 TOTAL VP> l VP<2 Lyshom = 100 6 (20.00) 12 11 (36.67) I 17 (56.67) 13 Lysholm < 100 (40.00) 18 (3.33) 12 (43.33) 30 Total (60.00) (40.00) (100.00) Obs : Os valores entre parênteses representam o percentual em relação ao total de indivíduos observados (N = 30). significância p = 0.03, indicando que pode haver uma pequena relação entre as variáveis. Para visualizar melhor este resultado foi montado a Tabela 2. Pelo teste exato de Fisher obtivemos um nível de significância p = 0.0024, portanto pode-se considerar a existência da relação entre as variáveis, ou seja, a variável VP2 está relacionada ao resultado da variável escala de Lysholm. Foi realizado também um teste de correlação entre as variáveis escala de Lysholm e VP1, sendo que o coeficiente de O objetivo principal deste estudo foi verificar a efetividade de dois protocolos de avaliação (desenvolvidos por Lysholm & Gillquist, 1982 e Fonseca, 1989, para avaliar funcionalmente o joelho de indivíduos com lesão de LCA) em quantificar a recuperação de um grupo de indivíduos que se submeteram à cirurgia de reconstrução do LCA. A escolha do protocolo de avaliação, denominado de escala de Lysholm, deve se à sua enorme aceitação e fácil aplicabilidade, embora se caracterize pela subjetividade das informações, uma vez que este protocolo é constituído de um questionário que tem o caráter auto-aplicativo (Reid, 1992). Já a escolha do teste de performance deve se à característica objetiva do teste, onde os indivíduos são submetidos a situações de esforço, equilíbrio e stress ligamentar, que se assemelham de atividades fisicas e esportivas que ocorrem naturalmente, e podem ser mensurados. O resultado deste estudo comparativo entre o grupo controle e o grupo pós-operado do LCA, e a de análise de variância nos mostra que para um nível de significância de 5%, existe diferença estatisticamente significante entre os grupos quando a escala de Lysholm e o teste do salto (VP2) foram empregados. O mesmo não ocorreu com o teste da corrida da figura do oito (VP1), onde nenhuma diferença estatisticamente significante foi observada. De acordo com Lysholm & Gillquist (1982), para um joelho normal o total de pontos obtidos em seu questionário (escala de Lysholm) varia de 95 a 100 pontos, não existindo desta forma diferença entre o joelho testado e o joelho normal. Entretanto, quando os valores encontram-se entre 84 e 95 pontos, existe uma ligeira diferença quando comparado ao joelho normal, porém isto não implica em incapacidade funcional. Assim, como os valores médios obtidos dos joelhos de 15 indivíduos do grupo pós-cirurgico foi de 93.467 pontos, observa-se que existe concordância com classificação proposta por Lysholm & Gillquist (1982). Com relação ao teste de performance, Fonseca (1989) demonstrou que tanto o VP1 (relação entre o teste da corrida da figura do oito e o da corrida em linha reta) como o VP2 (relação entre teste do salto da perna direita com o teste de salto da perna esquerda) poderiam ser usados para proporcionar dados objetivos do status funcional em indivíduos com deficiência do LCA; e que o teste da corrida da figura do oito (VP 1) foi o único capaz de detectar a diferença significante entre indivíduos normais e aqueles com deficiência do LCA. O interessante foi verificar que o teste da corrida da figura do oito (VP 1), considerado um teste eficaz para diferenciar indivíduos com lesão de 54 Jacob et a!. LCA, não foi sensível o suficiente para mostrar diferenças entre o grupo de indivíduos submetidos à cirurgia de reconstrução ligamentar do LCA com o grupo controle em nosso estudo. Neste momento cabe uma pergunta sobre o resultado do teste de performance. Por que o teste do salto (VP2) mostrou diferenças entre os grupos (pós-operado e controle) e o teste da corrida da figura do oito (VPl) não? Vejamos o seguinte: conforme Fonseca (1989), o conjunto destes testes incluem situações de aceleração, desaceleração, mudança de direção, saltos e rotação, que são componentes presentes em atividades fisicas e esportivas e que colocam maior demanda sobre joelhos com deficiência de LCA No entanto, ao analisarmos os testes individualmente, verificamos que as cinco situações acima citadas se apresentam de forma diferente, e nem sempre presente totalmente para os dois testes (VP 1 e VP2). Por exemplo, as situações de rotação e mudança de direção estão mais presentes no teste da corrida da figura do oito (VP 1), e as situações de desaceleração e salto evidenciam se mais no teste do salto (VP2). Considerando esses aspectos anteriormente citados, e o fato de que os indivíduos do grupo pós-operado apresentaram seus LCA's reconstituídos (confirmados pelo cirurgião responsável, por meio de testes ligamentares específicos), acreditamos que o teste do salto (VP2) foi mais eficiente para detectar diferenças entre os grupos (controle e pós-operado) porque as situações de aceleração, desaceleração e o salto são realizadas de maneira mais rápida c brusca, se comparado ao teste da corrida da figura do oito (VP 1), exigindo do joelho pós-reconstituído não só estabilidade ligamentar e força de impulsão, mas principalmente equilíbrio e segurança na aterrissagem. A correlação existente entre a escala de Lysholm e o teste do salto (VP2) no grupo pós-operado demonstrada em nosso estudo também foi observado por Fonseca (1989) nos pacientes com deficiência do LCA. Portanto, o resultado dos dados nos leva a crer que a escala de Lysholm e o teste do salto (VP2) foram eficientes para demonstrar que embora os 15 indivíduos submetidos à cirurgia de reconstrução ligamentar tenham recuperado a estabilidade do LCA e parte de sua capacidade funcional, existe ainda uma porcentagem de recuperação que não foi conseguida, ou seja, não conseguiram recuperar totalmente a capacidade funcional do joelho. E por que isso ocorreu? Prováveis respostas a esta questão dependem da análise de aspectos individuais tais como: lesões de outras estruturas associadas, intercorrências cirúrgicas, evolução do processo de reabilitação, freqüência e tempo de tratamento, já que o resultado do processo de avaliação proposto neste estudo estatístico foi realizado a partir de valores médios dos dados coletados, pennitindo mostrar apenas que existe diferença entre joelho normal e aqueles não totalmente reabilitados. A seguir discutiremos alguns aspectos individuais dos sujeitos do grupo pós-cirurgico com respeito ao resultado do processo de reabilitação a que foram submetidos. Com relação ao processo médico-cirúrgico, cabe reafinnar que a reavaliação Rev. Bras. Fisiot. do procedimento cirúrgico foi realizado pelo mesmo cirurgião, e o mesmo confirmou o sucesso do referido procedimento. Com relação ao processo de reabilitação, verifica-se que os indivíduos do grupo pós-operado não seguiram o protocolo de reabilitação de forma igual, principalmente no que se refere ao período de reabilitação e à freqüência diária ao tratamento, além do período de retomo à atividade esportiva que também ocorreu em momentos diferentes entre eles. Na avaliação em dois indivíduos, verificamos que os valores tanto da escala de Lysholm como o teste de performance encontraram-se próximos aos valores obtidos pelo grupo controle normal (I 00 pontos na escala de Lysholm, 0.96 e 0.97 para o VP2 -média do VP2 normal= 0.99). Esses dois indivíduos tinham um aspecto em comum que foi o retorno regular às atividades fisicas, cujo gesto desportivo se aproximam das atividades anteriormente realizadas. Já aqueles indivíduos que não retornaram totalmente à prática de atividades esportivas, apresentaram valores que se distanciaram do grupo normal (exemplo de um indivíduo que obteve 85 pontos para a escala de Lysholm, e 1.093 para o VP2). Para Reid (1992), a reabilitação deveria enfatizar o trabalho proprioceptivo através de vários exercícios de balanço, pois a propriocepção é uma aliada da reconstrução do LCA, restaurando a estabilidade articular. Sampaio et al. (1994) relataram que: "A perda da informação proprioceptiva no joelho, em decorrência de lesão do LCA, contribui para o agravamento da instabilidade devido à diminuição da sensação de posição e pela ausência do estímulo para a contração muscular". Portanto acreditamos que a diferença entre os grupos estudados, detectadas por meio do protocolo de avaliação fimcional, sugere que grande ênfase deve ser dada à reeducação proprioceptiva durante o processo de reabilitação dos indivíduos portadores de lesão de LCA. Finalmente, entendemos que o protocolo da avaliação funcional proposto neste trabalho se mostrou útil na avaliação de indivíduos pós-operados de lesões do LCA, oferecendo condições de se quantificar o resultado do processo de reabilitação. Conclusão O estudo sobre o uso da escala de Lysholm e do teste de performance na avaliação funcional de indivíduos submetidos à cirurgia de reconstrução do ligamento cruzado anterior, conforme metodologia empregada neste trabalho, nos permite concluir que: I -A escala de Lysholm e o teste do salto foram eficazes para mostrar diferenças entre o grupo de indivíduos normais e o grupo pós-operado; 2 - A diferença observada entre os grupos sugere que embora os indivíduos submetidos à cirurgia de reconstrução ligamentar tenham recuperado o LCA, a recuperação completa da capacidade funcional do joelho não foi totalmente alcançada. Vol. 2. No. 2, 1997 Avaliação Funcional do Joelho Referências Bibliográficas 1. TUREK, S.L. Ortopedia: princípios c sua aplicação. Ed. Manole, 4 ed.,03,I991. 2. GOULD, J .A. Fisioterapia na ortopedia c na medicina do esporte. 2 ed. São Paulo: Manole, I993. 3. TORG, J.S.; CONRAD, W. Clinicai diagnosis of anterior cruciate ligament instability in the athete. Am. 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