COMPETÊNCIAS COMO EIXO ESTRUTURANTE DA FORMAÇÃO EM ENFERMAGEM Moêmia Gomes de Oliveira Miranda Resumo As mudanças ocorridas nas sociedades capitalistas provocadas pela revolução científico-tecnológica têm determinado transformações significativas na organização produtiva. Este cenário coloca para a universidade o desafio de repensar a formação comprometendo-se com o desenvolvimento de competências que possibilitem ao futuro profissional, o domínio de saberes e uma base sólida para a aquisição contínua de conhecimentos específicos e habilidade de aprender e recriar permanentemente. Na graduação em enfermagem, a incorporação da concepção de competências, encontra-se articulada às exigências postas pela reestruturação produtiva, bem como à necessidade de formar profissionais dinâmicos e adaptáveis ao mercado de trabalho. Porém, apesar de legalmente sustentada e oficialmente incentivada, a noção de competências situa-se diante da polissemia, distinções, contradições, permanências e rupturas que envolvem as concepções e idéias construídas em torno das competências profissionais. Contudo, há espaço para um intenso debate acerca da pertinência e da intencionalidade de sua incorporação nas propostas de formação profissional. Palavras Chave: reestruturação produtiva; competências; enfermagem; STRUCTURER L’AXE FORMATION EN SOINS INFIRMIERS Sommaire Les changements dans les sociétés capitalistes causés par la révolution scientifique et technologique a donné d'importants changements dans l'organisation productive. Ce scénario met l'université pour la reconsidération de la formation de s'engager avec le développement des compétences qui permettent à l'avenir professionnel, le domaine des connaissances et une base solide pour l'acquisition continue du savoir-faire et sa capacité à apprendre et ré-permanente. Pour les étudiants de premier cycle en sciences infirmières, la prise en compte des compétences de conception, est articuler les exigences posées par la restructuration de la production et la demande qualifiée et adaptable au marché du travail dynamique. Toutefois, en dépit soutenu légalement et officiellement encouragée, la notion de compétence est en face de la polysémie, les distinctions, les contradictions, les continuités et les ruptures impliquant les concepts et les idées construites autour de compétences professionnelles. Cependant, il ya place pour un débat intense sur la pertinence et de l'intentionnalité de leur incorporation dans la formation proposée. Mots-clés: restructuration de la production, les compétences, les soins infirmiers; 2 Introduzindo a Temática As mudanças ocorridas nas sociedades capitalistas provocadas pela revolução científico-tecnológica em curso, consubstanciada pela difusão e introdução da microeletrônica e seus derivados, têm determinado transformações significativas na organização produtiva, no mundo do trabalho e nas mais diversas relações sociais inseridas no processo de globalização. No âmbito político internacional a orientação do neoliberalismo prevalece, trazendo drásticas repercussões à maioria das populações mundiais. No âmbito produtivo, configura-se um cenário que revela a crise do padrão de acumulação capitalista estruturado sob orientação taylorista-fordista e sua alteração ou passagem para formas produtivas flexibilizadas e desregulamentadas, sem, contudo, representar sua real superação. Essa passagem para os moldes flexíveis da produção ou da acumulação flexível, instala-se segundo novos padrões produtivos. A nova base material da produção, em função da competitividade internacional, criou as condições necessárias para que o processo de trabalho se modifique, passando a requerer uma produção de conhecimento maior e mais rápida e mais flexível. Neste contexto, surge a necessidade de uma redefinição do perfil do trabalhador ajustado às novas exigências da produção, demandando-se, agora, mais habilidade, criatividade, maior poder de decisão, além de uma maior polivalência frente à dinâmica estabelecida pela automação flexível. Neste cenário de transformações em processo associa-se um crescimento substancial de demandas quanto ao papel da educação formal ofertada à força de trabalho. Estas colocam para o campo da educação o desafio de rever os atuais padrões de escolarização ofertados, na perspectiva de ampliar o espaço em torno do debate relativo aos desdobramentos para a educação frente aos novos conceitos emergentes com o advento das novas tecnologias. A universidade, enquanto espaço de produção de conhecimento, novas tecnologias e força de trabalho, “deve enfrentar os desafios postos pelas atuais transformações operadas no âmbito da sociedade”. Assim, é convidada a (re)construir o projeto político-pedagógico para os cursos de graduação comprometendo-se com o desenvolvimento de competências que possibilitem “ao futuro profissional, o domínio sobre os modos de produção do saber e estabelecer uma base sólida para a aquisição contínua de conhecimentos específicos, desenvolvendo, ao mesmo tempo, a habilidade de aprender e recriar permanentemente” (CABRAL NETO, 2004, p.12) 3 Com essa compreensão, esse texto representa uma tentativa de contribuir com o debate em torno do atual processo de reorientação da educação superior no Brasil, tomando como referência a graduação em enfermagem, destacando a incorporação da concepção de competência enquanto um dos eixos que delineiam a política de currículo para os cursos de graduação em formulação no país em sua articulação com as alterações no mundo do trabalho, ocasionadas pela reestruturação produtiva, que interferem diretamente na esfera da produção do conhecimento e da formação profissional. Reestruturação Produtiva e Política de Formação O capitalismo mundializado passa por mudanças significativas com a finalidade de tornar as organizações mais eficientes e eficazes. As necessidades decorrentes do processo de mundialização determinam novos cenários competitivos, ocasionando a adoção de novos formatos organizacionais. Esses novos formatos são caracterizados pela absorção da microeletrônica, de modo especial a informática, em larga escala. A tecnologia tornou-se fator fundamental num contexto marcado pela competitividade e produtividade enquanto garantia de luta pela sobrevivência no mundo da produção. Essa nova forma de organização do capital é denominada por Harvey (1992) como acumulação flexível e se caracteriza por um regime de acumulação inteiramente novo, associado a um regime de regulamentação política e social bem distinto. A administração flexível surge da crise do modelo taylorista-fordista de acumulação, cuja ênfase centrava-se na rigidez e no Estado de Bem-Estar ocorrida, em especial na primeira metade da década de 1970, do século XX. A recessão, a crise fiscal e de legitimidade possibilitaram o cenário favorável à reestruturação econômica e o reajustamento social e político. A acumulação flexível se constitui em modelo contra-hegemônico a rigidez do taylorismo-fordismo, apoiando-se “na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo”. Esse modelo se caracteriza pelo surgimento de novos setores de produção, novas formas de prestação de serviços, novos mercados, inovação tecnológica, aumento da competição, além das rápidas mudanças dos padrões do desenvolvimento desigual entre setores e regiões geográficas (HARVEY, 1992, p.140). 4 Como desdobramento da acumulação flexível nos defrontamos com níveis relativamente altos de desemprego estrutural, oriundo da substituição dos homens por máquinas e da reorganização e otimização produtiva que inclui o remanejamento e a demissão de trabalhadores. Esse quadro de desemprego fez aumentar os índices de desproletarizados e de subproletarizados, em que o primeiro caracteriza-se pela diminuição do próprio proletariado nas indústrias e o segundo, refere-se ao setor informal da economia. Este crescente setor econômico não possibilita aos seus trabalhadores seguridade e previdência social. Ao contrário, recorre a regimes e contratos de trabalho mais flexíveis, materializados na adoção do trabalho em tempo parcial, temporário ou subcontratado. Esse modelo, ainda, determina o retrocesso do poder sindical, considerado por Harvey (1992) enquanto um dos eixos estruturantes do modelo taylorista-fordista. A fragilidade, a inoperância e a descaracterização dos movimentos sindicais impõe aos trabalhadores, empregados ou não, uma postura de aceitabilidade e dependência do mercado, gerando péssimas condições de trabalho, baixos salários, o multiemprego, a falta de segurança, a ausência de prazer no trabalho e fora dele, entre outros. Para Antunes (1998) os trabalhadores vivem um processo de “heterogeinização, complexificação e fragmentação”, o que contribui para o enfraquecimento dos movimentos políticos da categoria. O autor acrescenta existir uma tendência de crise do sindicalismo que pode ser observada através de, ...uma crescente individualização das relações de trabalho, deslocando o eixo das relações entre capital e trabalho da esfera nacional para os ramos de atividade econômica e destes para o universo micro, para o local de trabalho; ...uma fortíssima corrente no sentido de desregulamentar e flexibilizar ao limite o mercado de trabalho; ...o esgotamento dos modelos sindicais vigentes nos países avançados que optaram, nessa última década, em boa medida, pelo sindicalismo de participação; ...uma tendência crescente de burocracia e institucionalização das entidades sindicais; ...culto do individualismo exacerbado e da resignação social (ANTUNES, 1998, p.65-7). O desenvolvimento tecnológico ocasionou a Terceira Revolução permitiu Industrial e mudanças revolucionárias no processo produtivo e organizacional. Assim, o trabalho não-qualificado, fragmentado, repetitivo, rotineiro e prescritivo, característico do modelo taylorista-fordista, é substituído, por um trabalho polivalente, integrado, em equipe, com mais flexibilidade e autonomia. Essas características vão exigir um 5 trabalhador capaz de diagnosticar, prevenir, antecipar, decidir e intervir em uma situação concreta de trabalho. Dessa forma, o trabalhador terá que fazer escolhas, ampliando as operações mentais e cognitivas envolvidas nas práticas. A organização desse modelo de acumulação flexível vem sendo alcançada, de modo especial, através do acesso e controle da informação. Aliás, a informação tem se constituído em mercadoria imprescindível principalmente para a “propagação do consumo e desenvolvimento de atividades no sistema financeiro global; do acesso e controle do conhecimento científico e técnico, de importância vital na luta competitiva” (CATANI et al, 2001, p.70). Da mesma forma, o conhecimento também se constitui em instrumento fundamental que assegura vantagem no espaço do mercado competitivo e em consequência passa por processo de subordinação ao capital. As mudanças no mercado de trabalho, o enfraquecimento dos movimentos de classe, a consolidação de um novo modelo tecnológico organizacional oriundo da terceira revolução industrial tem produzido a necessidade de trabalhadores cada vez mais qualificados e adequados para atender a estas mudanças. São trabalhadores que dominam a informática, a internet, línguas, a eloqüência, enfim, competências em variadas áreas. A educação, portanto, passa a ser considerada como um fator que pode alavancar ou dificultar o incremento da competitividade internacional das empresas e do Estado. Ela tem assumido um importante papel nas macropolíticas do Estado, como um instrumento significativo para a qualificação da força de trabalho requisitada pelo novo padrão de desenvolvimento internacional, onde se destaca a produtividade e a qualidade dos bens e produtos decisivos para a competição internacional. Assim, os organismos internacionais representados pelo Banco Mundial (BIRD), pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) e a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL), preocupados com a situação de atraso destes países, resolvem delinear caminhos para que encontrem a prosperidade, o desenvolvimento e a lucratividade. Os caminhos pensados se fazem por uma adequação dos países em desenvolvimento ao novo padrão tecnológico e de produção qualificação dos trabalhadores, ou seja, estas através da instâncias internacionais traçam estratégias de fortalecimento e de superação a partir da educação básica, profissionalizante e superior, que aponte para uma educação de qualidade e para a eqüidade social. 6 Torna-se premente uma reforma educacional nestes países, pois são necessárias estratégias, metas e processos avaliativos que possibilitassem esta educação de qualidade e, consequentemente o progresso. Trata-se, portanto, de uma educação capaz de promover a inclusão no mercado global, mas principalmente, capaz de promover a mobilidade social através da inclusão dos pobres ou desempregados no processo de produção. Ressaltamos que esta reforma educacional vem romper com a formação de trabalhadores que atendia ao taylorismo-fordismo. Esse modelo de produção necessitava de uma organização pedagógica fundamentada em três grandes eixos, ou seja, o tempo, a hierarquização e valores para a funcionalidade do trabalho, sendo na última encontrada a especialização. As atividades eram desenvolvidas em tempos rígidos com horas, dias, meses e anos fixamente estabelecidos; sua organização espacial naturalizava o respeito à hierarquia o que fazia gerar os sentimentos de aceitação e submissão como o disciplinamento. Contudo, a reforma educacional que se insere na era da informação, vem necessitar de uma formação que aponte para a flexibilidade; a possibilidade de mobilidade; superação da dicotomia entre o pensar e o fazer; e, competências e habilidades em áreas diversas. A concretização deste ideário de reforma educacional tem como pressuposto o fortalecimento de vínculos entre a educação, o desenvolvimento e o setor de produção, na perspectiva de adequar-se às assegurando uma melhor exigências dos processos de reconversão competitiva inserção dos setores econômicos na concorrência internacional. As propostas educacionais citadas vêm resgatar a Teoria do Capital Humano, desenvolvida na década de 1960 (SCHULTZ, 1973) que procura explicar que o desenvolvimento econômico e a redistribuição de renda são proporcionados pela melhoria do nível de especialização dos trabalhadores, um aumento das habilidades e uma maior acumulação de conhecimento. Ao analisar esta teoria, Frigotto (1993, p.41) enfatiza que, (...) o conceito de capital humano – ou mais, extensivamente, de recursos humanos – busca traduzir o montante de investimentos que uma nação faz ou os indivíduos fazem, na expectativa de retornos adicionais futuros. Do ponto de vista macroeconômico, o investimento no fator humano passa a significar um dos determinantes básicos para aumento da produtividade e elemento de superação do atraso econômico. Do ponto de vista microeconômico, 7 constitui-se no fator explicativo das diferenças individuais de produtividade e de renda, consequentemente, de mobilidade social (grifos do autor). Essa mobilidade social, proposta pela teoria do capital humano, e consequentemente, pela reforma educacional, a qualificação se dá essencialmente para uma mobilidade dentro da própria classe ou até mesmo dentro da empresa, pautada em valores empresariais e não em valores pessoais e nem como resultado de conquista política. Assim, a educação não possibilita uma conquista econômica e de mudança de classe social, mas uma falsa igualdade social e política. Não podemos negar que a Teoria do Capital Humano, citada anteriormente, foi incorporada aos discursos dos organismos internacionais. Porém, o ideário hegemônico preconiza uma redefinição da mesma, acrescentando novos conceitos do atual modelo de produção como flexibilização, polivalência, eficiência, produtividade, qualidade e sociedade do conhecimento. Essas concepções têm exigido novos perfis profissionais e, consequentemente, novos modelos de formação. Corroborando com essa discussão, Castro (2005, p.472) acrescenta que, a mudança da base eletrônica para a base microeletrônica passa a exigir o desenvolvimento de habilidades cognitivas e comportamentais, próprios de ser desenvolvidas nas escolas, tais como: análise, síntese, criatividade, raciocínio lógico, interpretação e uso de diferentes formas de linguagem, necessários para adaptação dos jovens às variações de funções que passaram a compor o mundo do trabalho. A autora acrescenta que um dos paradoxos do modelo de acumulação flexível diz respeito ao fato de que ao simplificar as práticas realizadas pelo trabalhador, um maior nível de conhecimento é exigido. Diante desta exigência, o seu processo de escolaridade também deve ser elevado, requerendo, portanto, um processo de formação permanente. Para a autora citada, a política de formação, “mediada pela ideologia de mercado “ incorpora conceitos como competências, habilidades, competitividade, entre outros, que vão sendo disseminados a partir da aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9.394-96 (BRASL, 1996) através de uma diversidade de estratégias de natureza política e pedagógica na perspectiva de reorientar o papel da instituição de ensino formal e da educação. O Modelo de Competências e a Formação em Saúde – Enfermagem 8 A incorporação de novas tecnologias no setor saúde tem determinado o surgimento de novos serviços e práticas e de um modo geral, o aumento da produtividade do trabalho. Assim, diante dessas exigências de produtividade e de qualidade dos setores produtivos e em um contexto no qual o mercado de trabalho é instável, flexível e cambiante, ampliam-se os requerimentos relativos à qualificação dos trabalhadores e torna-se cada vez mais generalizada a implantação de um modelo de formação e gestão da força de trabalho baseado no enfoque das competências. A adoção do enfoque das competências na formação em saúde/enfermagem, de igual modo que na formação de professores, se constitui em, estratégia do denominado ajuste estrutural, que direcionou as reformas do Estado no plano político institucional e no plano econômico-administrativo. inserida Portanto, em está uma perspectiva de adaptação dos profissionais às novas exigências do sistema capitalista (CASTRO, 2005, p.473). No contexto das mudanças tecnológicas, o currículo por competências atende às necessidades dos organismos internacionais uma vez que permite delinear um perfil profissional que atende às exigências de empregabilidade do mundo contemporâneo. As alterações produzidas por este modelo resultam em deslocamento de noções como: dos saberes à competência, na esfera da educação; da qualificação à competência, na esfera do trabalho. O termo competência não é novo e tem sido usado sob várias concepções. Origina-se das ciências da organização e surge no quadro de crise do modelo de organização taylorista-fordista, de mundialização da economia, de exacerbação da competição nos mercados e de demandas de melhoria da qualidade dos produtos e de flexibilização dos processos de produção e de trabalho (DELUIZ, 1996). Apesar de não se configurar como conceito novo, ele ressurge nas últimas décadas do século XX com um novo sentido. Trata-se de um termo complexo, polêmico e que tem uma diversidade de significados e sentidos. As competências não são elas mesmas saberes e sim “a capacidade de agir eficazmente em determinado tipo de situação, apoiada em conhecimentos, mas sem se limitar a eles” (PIRRENOUD,1999, p.7). Para o autor, as competências integram e mobilizam vários recursos cognitivos na resolução de 9 problemas. Nesta perspectiva se constituem enquanto instrumentos de reorganização da formação, para atender as demandas deste tempo de mudanças constantes e instáveis. Para Nuñez e Ramalho (2002, p.14) diante dessa demanda por reorientação do processo de formação, o conceito de competências surge como “uma noção básica que procura unir operativamente teoria e prática. Isto quando se assume que toda teoria tem implicações práticas e toda habilidade prática tem uma teoria, implícita ou não, que a sustenta, fazendo-se necessário conhece-la para fundamentar o agir profissional”. Essa forma de compreender competência representa uma tentativa de superar o sentido meramente técnico característico do modelo técnico-positivista. Na formação em enfermagem a abordagem das competências já vem sendo discutida a alguns anos, de modo especial no nível técnico, em função da regulamentação da LDB 9.394-96 para essa área de formação. Tem como parâmetro a Resolução 04-99 que explicita as competências profissionais de nível técnico. No espaço das universidades, as Diretrizes Curriculares para a graduação de enfermagem adota a noção de competências como eixo estruturante da formação de enfermeiros, valorizando a relação com o mundo do trabalho, suas transformações e demandas. Como desdobramento dessa relação, é esperada a formação de um enfermeiro com competências que vão além da qualificação instrumental. Um enfermeiro tecnicamente competente, com conhecimentos de natureza global, com capacidade para tomar decisões, de empreender, de trabalhar coletivamente e de construir estratégias para enfrentamento das situações de mudança, entre outros. Esses requisitos não se desvinculam do conjunto de exigências impostas pelo processo produtivo. Hirata (1994) nos alerta para a possibilidade do conceito de competência está política e ideologicamente subordinado ao interesse econômico, à produção mais rápida e eficaz, adequada ao mercado empresarial. Apesar dessa vinculação, as exigências citadas anteriormente, não podem ser desconsideradas pelo processo de formação. No entanto devem ser submetidas à crítica considerando a necessidade de resgatar o compromisso social da educação com a construção de cidadãos. Porém, o texto das Diretrizes Curriculares explicita uma imprecisão conceitual em torno da noção de competências, o que certamente demandará orientações divergentes no momento da construção dos Projetos Políticos-Pedagógicos. Para Feuerwerker e Almeida (2003) esta imprecisão expressa a diversidade de concepções que vão desde as orientações de natureza behavoristas às de natureza construtivistas, entre outras. Porém, as diretrizes “não explicitam as diferenças, nem tampouco sugerem 10 uma ou outra opção. Deixam a questão em aberto, mas indicam as competências comuns a todos os profissionais de saúde”. Considerações Finais A incorporação curriculares para intrinsecamente da noção os cursos articulada ao de competências de graduação conjunto de na elaboração em saúde-enfermagem exigências postas pela das diretrizes encontra-se reestruturação produtiva do capitalismo, bem como à necessidade de formar profissionais dinâmicos e adaptáveis ao mercado de trabalho. Por outro lado, se constitui em processo de aligeiramento da formação visando à expansão e massificação da educação superior. Porém, apesar de legalmente sustentada e oficialmente incentivada, a noção de competências situa-se diante da polissemia, distinções, contradições, permanências e rupturas que envolvem as concepções e idéias construídas em torno das competências profissionais. Contudo, há espaço para um intenso debate acerca da pertinência e da intencionalidade de sua incorporação nas propostas de formação profissional. Referências Bibliográficas ANTUNES, R. Adeus ao Trabalho: ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. Campinas: Cortez, 1998. BRASIL. Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília, 23 dez. 1996. Disponível em: http www.planalto.gov.br. Acesso em:16 ago. 2005. CATANI, A. M.; OLIVEIRA, J. F. de; DOURADO,L. F. 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