PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União PARECER Referência: 00077.000613/2013-86 Assunto: Recurso interposto por cidadão à CGU contra decisão denegatória de acesso à informação, com fundamento no art. 23 do Decreto no 7.724, de 16 de maio de 2012. Restrição de Acesso: Ementa: Informação de natureza ostensiva. Recorrido: Secretaria de Comunicação República – SECOM-PR Solicitação de teor de e-mails institucionais que instruem Procedimento administrativo disciplinar em curso. Informações constantes em procedimentos disciplinares em curso gozam de sigilo legal específico do art. 150 da Lei 8.112/1990, que é albergado pelo regime de acesso à informação inaugurado pela Lei 12.527/2011 por meio de seu art. 22. Recurso conhecido e, no mérito, desprovido. Social da Presidência da Recorrente: Senhor Ouvidor-Geral da União, I - RELATÓRIO 1. Trata o presente de Parecer de recurso em sede de solicitação de acesso à informação pública, com base na Lei nº 12.527/2011, formulado por cidadão em 11/04/2013 em face da Casa Civil da Presidência da República – redirecionado à Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República – SECOM-PR, em que requer lhe seja fornecido acesso a mensagens eletrônicas enviadas e recebidas pela ex-servidora da Presidência em São Paulo Rosemary Novoa de Noronha a partir do email oficial com terminação “.gov.br” no período compreendido entre 1/01/2011 e 26/11/2012 Página 1 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União 2. Ao dia 16/05/2013, o órgão manifestou-se tempestivamente, a fim de negar acesso sob os fundamentos que seguem: [...] o pedido não poderá ser atendido, tendo em vista tratar-se de matéria alcançada por sigilo inviolável, nos termos do inciso XII, do art. 5º, da Constituição Federal. Com informações da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República. 3. Irresignado, o requerente interpôs recurso em primeira instância em 16/05/2013, no qual reiterava o seu pedido original, nos termos e pelos motivos transcritos: Reitero pedido original nos termos da lei de acesso a informação tendo em vista que a alegação de negativa de acesso não se aplica. E ainda trata-se de um contrasenso em relação ao que a presidência da República tem adotado. Explico: A resposta da Secom sustenta que o pedido não pode ser atendido tendo em vista "tratar-se de matéria alcançada por sigilo inviolável, nos termos do inciso XII, do art. 5º, da Constituição Federal". O referido artigo diz que "é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal". Meu pedido original se refere a email funcional com terminação "gov.br", ou seja, não é email pessoal. Ora, a presidência deve decidir qual interpretação adota sobre email funcional. É de conhecimento público que a defesa da ex-servidora, cujos emails foram solicitados neste pedido, tentaram intervir na sindicância da Casa Civil sob alegação de que os emails são "correspondência inviolável", e a Casa Civil entendeu que não. Seguiu jurisprudência do TST estabelecendo que email funcional não é de propriedade do trabalhador. Portanto, os dados estão sob controle de seu verdadeiro dono, no caso, o governo, mais precisamente a presidência da República. Basta lembrar o que entendeu a própria comissão de sindicância ao dizer que para a investigação examinou emails "institucionais" da exservidora. Não bastasse isso, a lei de acesso estabelece que são dados públicos informações em qualquer formato ou meio, como diz o artigo 4º : "para efeitos da lei considerá-se: I informação: dados, processados ou não, que podem ser utilizados para produção e transmissão de conhecimento, contidos em QUALQUER MEIO, SUPORTE OU FORMATO (grifo meu); II - documento: unidade de registro de informações, QUALQUER QUE SEJA O SUPORTE OU FORMATO (grifo meu)". Aproveito o ensejo para manifestar o estranhamento e pedir explicações sobre o motivo de o presente pedido de Página 2 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União informação ter sido redirecionado para a Secom, sendo que originalmente foi endereçado à Casa Civil, órgão detentor das informações originais solicitadas. Gostaria de saber qual o critério para tal redirecionamento? A Secom está respondendo a todo e qualquer pedido de informação dirigido à Casa Civil? Ou o redirecionamento tem relação com a natureza do pedido ou com o perfil do solicitante? No mais, solicito acesso as informações conforme indiquei no pleito original: "acesso a mensagens eletrônicas enviadas e recebidas pela ex-servidora da presidência em São Paulo Rosemary Novoa de Noronha a partir do email oficial no período de 01/01/2011 a 26/11/2012, data de sua exoneração". 4. que: Em 21/05/2013, indeferindo o recurso interposto, o órgão argumentou [...] Não cabe reparo à manifestação do SIC-PP. O sigilo previsto no art. 5º da Constituição é garantia individual, limitada apenas às hipóteses constantes do próprio texto. Neste sentido, um requerimento administrativo formulado com fundamento na Lei de Acesso à Informação não pode ter o condão de fulminar garantia individual de índole constitucional. Deve ser considerado ainda que o tratamento de informações pessoais deve respeitar a intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, conforme disposto no art. 31 da já citada Lei de Acesso à Informação. Neste contexto, o disposto no § 4º, do referido artigo, não pode ser confundido com uma permissão para divulgação ampla de dados cujo acesso seja necessário para apuração de irregularidades, pois restaria de todo contraditório com a previsão do caput. Ademais, e não menos importante, a distinção entre “informação” e “documento” deve ser interpretada no sentido de que o documento é um suporte, e não constitui uma informação, se considerado isoladamente. Assim, o acesso à informação deve se dar pela indicação precisa de elementos de interesse como o assunto, período, destinatário ou remetente das mensagens, sem desconsiderar o tratamento legal às informações pessoais. Do contrário, o pedido incide nas hipóteses do inciso I e II, do art. 13, do Decreto 7.724, de 16 de maio de 2012. 5. Em 22/05/2013, o cidadão interpôs recurso à autoridade máxima do órgão, reiterando o seu pleito. [...] é preciso haver uma uniformidade de interpretação sobre o caráter dos emails funcionais ou "institucionais", como a própria Presidência os classificou em sindicância instaurada contra a Página 3 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União referida servidora, sob pena de estar-se tratando de situação teratológica. Qual seja: ou se está negando acesso à informação que é pública por se tratar de documento público e não privado; ou se corre o risco de anulação de toda investigação tendo em vista que a sindicância analisou dados de caráter pessoal sem cumprir as exigências legais, ficando inclusive sujeitos os servidores que assim o fizeram às sanções da lei. Lembro apenas que se persiste o argumento de que não se dá acesso a email de servidor via lei de acesso sob alegação de que é correspondência pessoal, não pode então a administração ter acesso sem que cumpra o que estabelece a lei que regulamentou justamente o inciso XII do artigo 5º da Constituição. A lei 9.296, que trata de escutas telefônicas e também se aplica a emails, é clara em seu artigo 10: "constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL (grifo meu) ou com objetivos não autorizados em lei". Está ali claro, "comunicações de informática ou telemática". Na resposta ao último recurso a administração sustentou que ""um requerimento administrativo formulado com fundamento na Lei de Acesso à Informação não pode ter o condão de fulminar garantia individual de índole constitucional. Deve ser considerado ainda que o tratamento de informações pessoais deve respeitar a intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, conforme disposto no art. 31 da já citada Lei de Acesso à Informação. Neste contexto, o disposto no § 4º, do referido artigo, não pode ser confundido com uma permissão para divulgação ampla de dados cujo acesso seja necessário para apuração de irregularidades, pois restaria de todo contraditório". Ora, se por via da LAI não pode haver violação de dado pessoal, por via administrativa (sindicância) pode? E sem autorização judicial? Lembrando que a referida investigação faz menção a exist~encia de emails de conteúdo pessoal que foram lidos, mas descartados. Ou seja, sem autorização judicial, verificaram uma correspondência pessoal? Indago isso com intuito para que a administração deixe claro sua posição para destacar a contradição bastante arriscada que as negativas de acesso neste pedido estão a expor. Esclareço, no entanto, que insisto no pedido por considerar que a interpretação dada pela administração na referida sindicância é que deve ser considerada a correta. Qual seja, os emails são institucionais. E vale, como a corregedoria do Planalto entendeu, a jurisprudência do TST asseverando que email funcional é de livre consulta do "patrão" e o uso irregular do Página 4 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União instrumento de trabalho é passível de punição. No caso em questão 'o patrão" é o Estado e a LAI asseverou que na suas definições de informação que emails também são documentos públicos, como já citado em recurso anterior: " I - informação: dados, processados ou não, que podem ser utilizados para produção e transmissão de conhecimento, contidos em QUALQUER MEIO, SUPORTE OU FORMATO (grifo meu); II documento: unidade de registro de informações, QUALQUER QUE SEJA O SUPORTE OU FORMATO (grifo meu)". O acesso a emails institucionais via lei de acesso não é uma novidade jurídica. A título de exemplo cito recente divulgação promovida pelo governo americano que, de ofício, divulgou emails trocados por servidores em relação a incidente sobre a morte de diplomata americano. Nos EUA, cujo FOIA serviu de inspiração para a lei brasileira, os emails funcionais são divulgados em pedidos de informação sempre que assim solicitados em situações específicas, como por exemplo, emails que trataram de tortura na base de Guantanamo que foram acessados por ONGs com base do FOIA. É de se reconhecer, todavia, que tanto a Constituição brasileira, como a LAI asseguram a preservação de dados pessoais. E afastam informações desse gênero da ampla divulgação. Mas aproveito aqui para me apropriar dos argumentos apresentados pela administração na resposta enviada onde assevera que "o acesso à informação deve se dar pela indicação precisa de elementos de interesse como o assunto, período, destinatário ou remetente das mensagens, sem desconsiderar o tratamento legal às informações pessoais". Ou seja, se é necessário delimitar informação a período, isso já foi feito desde o período original. Há data ali delimitada. Agora onde está escrito na lei que que é preciso delimitar um "assunto"? Um destinatário ou remetente? Se assim o fosse, a administração não teria examinado na sindicância toda a caixa postal "institucional" da exservidora. Tanto é que pedidos de outra ordem como solicitação de ofícios classificados ou não de determinado órgão emitidos em determinado período são atendidos pela administração sem necessidade de especificação de destinarário do documento ou assunto em tela. Se não estariam inviabilizados, por exemplo, pedidos remetidos a um determinado ministério que assim estabelecesse: 'solicito ofícios emitidos pelo ministra X no período de 2 meses no ano de 1967 e que foram classificados como sigilosos na época'. Isso é genérico? Não me parece ser. Do contrário, já está a administração a preparar novo argumento para denegar o Página 5 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União acesso as informações solicitadas. Em que pese os argumentos ora apresentados, subsidiariamente, caso prevaleça entendimento de que há muita informação de caráter pessoal, solicito acesso a emails emitidos pela exservidora para também servidores públicos. Ou seja, é de se esperar que o assunto tratado não seja pessoal. Ou um email para colega de outra repartição solicitando uma vantagem pessoal é informação pessoal e portanto não pode ser divulgada? Ou, ao contrário, é exemplo de violação funcional de uso de documento institucional e portanto um registro público que deve ser conhecido ? Acredito que se trata da segunda opção. Se ainda assim, a administração considerar uma formulação "genérica", o pedido pode ser reduzido a emails trocados (enviados e recebidos) pela referida servidora no ano de 2012 cuja contra-parte sejam os senhores Paulo Vieira, Marcelo Vieira, Rubens Vieira, Mauro Luciano Hauschild, bem como todos os ministros e secretários especiais com status de ministro do governo federal. E, por último, se mesmo assim a administração avaliar que o pedido ainda é genérico, solicito então todos os emails trocados pela ex-servidora Rosemary nos dias 9, 10, 11 e 12 de maio de 2011, com o sr. Paulo Vieira; bem como todos os emails enviados e recebidos no dia 23 de novembro de 2012 pela ex-servidora cujos destinatários sejam também emails institucionais (terminação ".gov.br"). 6. Respondeu o órgão em 27/05/2013 para indeferi-lo, aduzindo que: ...o recurso de segunda instância apresentado por Vossa Senhoria introduz aspectos alheios aos termos do pedido de acesso à informação registrado sob o n.º 00077.000613/201386, bem como aos trâmites previstos pela Lei nº 12.257, de 18 de novembro de 2011, e pelo Decreto nº 7.724, de 16 de maio de 2012, que não cabe apreciar em sede recursal, como a distribuição das competências no âmbito da Presidência da República e supostos precedentes no exterior. Acerca do objeto do pedido, não identifico elementos que me permitam rever as manifestações recorridas. 7. Em face do indeferimento de seu pleito, o recorrente fez uso da prerrogativa que lhe é facultada pelo art. 23 do Decreto 7.724/2012 para interpor o presente Recurso à CGU em 14/02/2013, no qual no qual sustenta, em sede prelimiar: [...] A negativa de acesso apresentada agora ao recurso de segunda instância com informações do Ministro de Estado, interino, Roberto Messias confunde argumentos de fundamentação com novo pedido. Não solicitei para que os Página 6 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União "precedentes no exterior" fossem examinados. A referência a casos externos foram apresentados a título de exemplo sobre o entendimento em relação ao FOIA que vigora nos EUA em relação ao tema "acesso a emails funcionais". [...] Solicitei apenas esclarecimento sobre o fato de o pedido original ter sido redirecionado a outra Pasta da Presidência da República que não é a detentora/guardiã da informação requisitada. Tanto a LAI como o decreto que a regulamenta asseveram que o órgão demandado, se não for o titular da informação, indicará o órgão que a detém. Não há nada na lei que estabeleça a terceirização da informação requisitada. 8. Mais além, ao referir-se ao mérito do pedido, oferece, em complemento às razões apresentadas em instâncias precedentes, [...] destaco o que estabelece a Norma de Administração de Recursos Computacionais da Presidência da República. Reproduzo os itens 7.1 a 7.3: "7.1 todas as caixas de correio da Presidência da República disponibilizadas aos servidores são institucionais. 7.2 o acesso à caixa de correio institucional, que não por seus responsáveis, no interesse de trabalho da área do servidor está condicionado ao devido requerimento e justificativa do responsável pelo órgão e aprovação da Secretaria de Administração. 7.3 o acesso à caixa de correio institucional, que não por seus responsáveis, para fins de instrução de apuratório, regularmente instituído no âmbito da Presidência da República, está condicionado ao devido requerimento da autoridade responsável pelo apuratório". Ou seja, o normativo interno deixa claro que não é correspondência privada e pessoal conforme previsto no inciso constitucional utilizado pela administração para negar acesso à informação. E há mais: cartilha sobre segurança da informação produzida pela presidência informa aos servidores que os emails institucionais "devem ser utilizados estritamente para as atividades vinculadas ao trabalho exercido no órgão". 9. Entendendo que subsídios adicionais deveriam ser fornecidos para que se procedesse à análise do caso em apreço, esta Controladoria-Geral da União fez gestão junto ao órgão, a fim de solicitar-lhe esclarecimentos que pudessem auxiliar a compreensão da base legal que fundamentou a decisão denegatória de acesso aos documentos ora solicitados, bem como que encaminhasse à análise, a fim de instruir os autos do presente, documento que formaliza a decisão de primeira instância, sem registro no e-SIC. 10. É o relatório. Página 7 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União II - ANÁLISE 11. Observa-se, preliminarmente, que o recurso interposto perante a CGU é tempestivo, visto que apresentado dentro do prazo de 10 (dez) dias previsto no art. 23 do Decreto nº 7.724/2012. 12. Cumpre, primeiramente, atentar para o fato de que não cabe à CGU manifestar-se quanto ao mérito de questão não ventilada em instância originária, razão pela qual impossibilitada estaria de conhecer do recurso no que este faz referência à motivação que deu ensejo ao redirecionamento da demanda do recorrente, da Casa Civil da Presidência da República à Assessoria de Comunicação da Presidência da República. 13. Contudo, tratando-se a matéria procedimental não aderente, em tese, à Lei 12.527/2011, impõe-se o conhecimento da matéria por força da competência atribuída a esta casa pelo art. 16, IV daquela Lei. Verbis: Art. 16. Negado o acesso a informação pelos órgãos ou entidades do Poder Executivo Federal, o requerente poderá recorrer à Controladoria-Geral da União, que deliberará no prazo de 5 (cinco) dias se: [...] IV - estiverem sendo descumpridos prazos ou outros procedimentos previstos nesta Lei. 14. A consideração feita ao § 12 do presente parecer, no entanto, resta plenamente efetiva no que se refere aos pedidos alternativos de redução do escopo feitos pelo recorrente em grau recursal. Se bem se possa esgrimar argumentos em sentido contrário com fundamento no princípio “quem pode mais, pode menos”, a análise de mérito sobre pedidos originais é competência do juízo a quo, mesmo que não sejam mais do que o resultado da fragmentação de um pedido inicial. 15. de mérito. Definido os contornos do conhecimento do recurso, passemos à análise 16. Para além do debate suscitado pelo recorrente no caso em apreço, debate este com ampla repercussão na doutrina e na jurisprudência pátria, reportemonos ao fato de que a informação ora solicitada compõe os autos do Processo Administrativo Disciplinar registrado sob o número único de protocolo 00190.004044/2013-41, ainda em curso na Controladoria-Geral da União. 17. Em que pese a natureza da informação em e-mail institucional poder servir de amparo a eventual restrição de acesso, tal análise é tão-somente incidental e mesmo assessória em face de incidência de outro sigilo legal específico, de fundamento menos movediço, trazido ao regime de acesso inaugurado pela Lei 12.527/2011 pelo seu art. 22: Página 8 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União Art. 22. O disposto nesta Lei não exclui as demais hipóteses legais de sigilo e de segredo de justiça nem as hipóteses de segredo industrial decorrentes da exploração direta de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa física ou entidade privada que tenha qualquer vínculo com o poder público. 18. Recordemos que a Lei de Acesso à Informação define três espécies de restrição de acesso à informação produzida ou custodiada pela Administração: a informação sigilosa e classificada, nos termos do art. 23, a informação pessoal, nos termos do art. 31, e a informação sobre a qual incida hipótese legal de sigilo, nos termos do art. 22. O art. 7º, §3º da Lei 12.527/2011, ao assegurar o acesso a documento preparatório para tomada de decisão, não cria uma quarta hipótese de sigilo, visto que seu comando é positivo. Tampouco o art. 20 do Decreto 7.724/2012 tem o condão de criar uma hipótese adicional de classificação, embasada naquele dispositivo. Adicionalmente, convém ressaltar que a restrição ao direito fundamental de acesso à informação pública custodiada pela Administração somente poderá ser feita por meio de Lei, não sendo normativo infra legal meio idôneo para tanto. 19. Afastemos da matéria “procedimento disciplinar” hipótese que relacione sua natureza àquela do rol taxativo de informações objeto de classificação. Somente de modo muito incidental se poderia propor a classificação de um procedimento disciplinar que contivesse informação imprescindível à segurança da sociedade e do Estado, nos termos do inciso XXXIII do art. 5º, última parte, da Constituição Federal. Desse modo, resta-nos considerar que o fundamento à restrição de acesso a procedimentos disciplinares deverá encontrar-se ou no caráter pessoal da informação neles contida ou em hipótese legal específica de sigilo. 20. Nesse sentido, tem se manifestado esta CGU de modo reiterado no sentido de que as informações que digam respeito a procedimento disciplinar gozam da proteção do sigilo legal específico previsto no art. 150 da Lei 8.112, de 1990: Art. 150. A Comissão exercerá suas atividades com independência e imparcialidade, assegurado o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da administração. Parágrafo único. As reuniões e as audiências das comissões terão caráter reservado. 21. De outra parte, assiste à Administração a faculdade de restringir acesso a documentos e informações utilizados como fundamento da tomada de decisão e do ato administrativo até a edição do respectivo ato decisório, conforme disposto no art. 7, §3º da Lei 12.527/2011. Por constituir ato discricionário, deverá a decisão que Página 9 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União impõe tal restrição de acesso atender a sua finalidade precípua, que é o interesse público. 22. A fim de regulamentar uma e outra situações, definindo, de um lado, o que seria considerado “sigilo necessário”, e, de outro, quais documentos e informações utilizados como fundamento da tomada de decisão seriam considerados de acesso restrito em âmbito da Controladoria-Geral da União, a Portaria CGU/SE 1.613/2012 determinou que: Art. 4º A CGU manterá, independentemente de classificação, acesso restrito em relação às informações e documentos, sob seu controle e posse, mantidas em qualquer suporte, relacionadas a: [...] VII – relatórios e notas técnicas decorrentes de investigações, auditorias e fiscalizações, e outros documentos relativos à atividade de correição, bem como outras ações na área de competência da CGU, quando ainda não concluídos os respectivos procedimentos. Art. 5º A restrição de acesso às informações prevista nos incisos IV e VII do artigo 4º desta Portaria se extingue a partir da conclusão do procedimento investigativo, quando os relatórios e notas técnicas se tornarão públicos. §1º Consideram-se concluídos, no âmbito da CGU, os procedimentos investigativos relativos a: I - ação correicional: a) procedimento disciplinar instaurado ou acompanhado: com a publicação do julgamento pela autoridade competente; b) investigação preliminar: com o arquivamento do processo em caso de não ser procedente o fato originário da investigação e, no caso contrário, a publicação do julgamento do procedimento disciplinar decorrente da investigação; e c) relatórios de inspeção correicional: com a aprovação do relatório pelo Corregedor-Geral da União. 23. Desse modo, a restrição de acesso a informações relativas aos procedimentos levados em curso em âmbito da Corregedoria-Geral da União deriva tanto do art. 7 §3º da Lei 12.527 de 2011 quanto do art. 150 da Lei 8.112 de 1990, para abranger procedimentos disciplinares e correlatos. 24. Por esse motivo, concluído o procedimento, a restrição de acesso remanescerá somente no que se referir a informação pessoal, a qualquer outa hipótese legal de sigilo que se relacione com a matéria dos fatos apurados, conforme art. 22 e 31 da Lei 12.527/2011, ou a matéria que sirva de subsídio a novo procedimento. Decaída a restrição ao todo da informação, o requerente poderá exigir Página 10 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União que lhe seja dado acesso, nos termos do §2º do art. 7º da Lei 12.527/2011, à parte não sigilosa por meio de certidão, extrato ou cópia com ocultação da parte sob sigilo. 25. Ao colher evidências acerca da conduta a ser imputada ao agente, apropria-se a Administração de informações diversas relativas à intimidade das partes e, eventualmente, de terceiros. Tal é o motivo pelo qual esta espécie de sigilo acaba por assumir um caráter híbrido. Os sigilos de processos e procedimentos visam a garantir a lisura e eficácia de ditos processos, contribuindo à manutenção da segurança jurídica das relações e da tutela da confiança dos administrados, uma vez que impede a propagação de meras expectativas de direito ou de fato decorrentes da sua publicidade. Tais espécies de sigilo possuem um componente de interesse público (segurança jurídica) e de defesa da intimidade, honra e imagem dos envolvidos. Concluído o processo, todavia, a este deverá ser dado publicidade, mantendo-se a restrição de acesso tão-só à informação que diga respeito à intimidade das partes (art. 31 da Lei 12.527/2011). É este raciocínio que se mostra de modo muito claro quando recordamos que o inciso LX do art. 5º da Constituição Federal determina que a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social exigirem. Dentre os sigilos de processos e procedimentos, temos aqueles relativos a processos administrativos e aqueles referentes a processos jurisdicionais. 26. Assim como no regime da Lei 9.296/1996 a informação a que se teve acesso por força do § único do art. 1º ingressa no processo sob o véu do segredo de justiça, também a informação relativa à intimidade obtida por força do poder disciplinar passa a compor um core do processo que somente terá natureza ostensiva, nos termos da Lei 12.527/2011, em prazo de cem anos, na inexistência de disposição legal que estipule prazo menor ou na inexistência de autorização expressa da parte, de seu procurador ou sucessores. 27. Por fim, antes de incorrermos na análise do procedimento adotado pelo Serviço de Informação ao Cidadão no presente processo de acesso à informação, consignemos apontamento relativo a observação feita pelo recorrente em seu recurso de segunda instância, ao afirmar que: Nos EUA, cujo FOIA serviu de inspiração para a lei brasileira, os emails funcionais são divulgados em pedidos de informação sempre que assim solicitados em situações específicas, como por exemplo, emails que trataram de tortura na base de Guantanamo que foram acessados por ONGs com base do FOIA. 28. Devemos recordar que a possibilidade de afastamento do sigilo em razão de tutela de Direito Fundamental não é estranha ao ordenamento jurídico brasileiro, que buscou dar tratamento à matéria no art. 21 da Lei 12.527/2011: Art. 21. Não poderá ser negado acesso à informação necessária à tutela judicial ou administrativa de direitos fundamentais. Página 11 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União Parágrafo único. As informações ou documentos que versem sobre condutas que impliquem violação dos direitos humanos praticada por agentes públicos ou a mando de autoridades públicas não poderão ser objeto de restrição de acesso. 29. O perecimento do sigilo em face da necessidade de tutela de Direitos Fundamentais é, igualmente, estendido para a restrição de acesso à informação pessoal, que resguarda o direito à intimidade, como podemos perceber pela redação do art. 31 daquela mesma norma: Art. 31. O tratamento das informações pessoais deve ser feito de forma transparente e com respeito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, bem como às liberdades e garantias individuais. § 1o As informações pessoais, a que se refere este artigo, relativas à intimidade, vida privada, honra e imagem: [...] II - poderão ter autorizada sua divulgação ou acesso por terceiros diante de previsão legal ou consentimento expresso da pessoa a que elas se referirem. § 2o Aquele que obtiver acesso às informações de que trata este artigo será responsabilizado por seu uso indevido. § 3o O consentimento referido no inciso II do § 1 o não será exigido quando as informações forem necessárias: [...] IV - à defesa de direitos humanos; ou V - à proteção do interesse público e geral preponderante. 30. Diante do status dado pela norma à prevalência da proteção dos Direitos Humanos, tratou o Decreto 7.724/2012 de regulamentar o art. 21 da Lei de Acesso à Informação dispondo, ao § único do art. 42, que “O requerente deverá apresentar razões que demonstrem a existência de nexo entre as informações requeridas e o direito que se pretende proteger.” 31. Portanto, não se havendo apresentado nexo entre o direito fundamental a ser tutelado mediante o acesso à informação solicitada e a informação objeto do pedido, inócua se faz a comparação com o direito estadunidense, visto que o direito brasileiro também contempla tais situações. Contudo, se, no caso citado, o assunto “tortura na base de Guantanamo” evidencia de imediato o nexo com a matéria de Direitos Humanos a que se pretende tutelar; no caso em apreço, em que a solicitação se faz sobre mensagens trocadas entre servidora e terceiros, o nexo se faz muito menos intuitivo. 32. Passemos à análise do procedimento adotado pelo órgão recorrido no curso do presente processo de acesso à informação. 33. Dado que não se verificam incidentes que mereçam análise para além daquele denunciado pelo próprio recorrente, relativo ao supostamente irregular redirecionamento de sua solicitação de acesso à informação, da Casa Civil da Presidência Página 12 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União da República à Secretária de Comunicação Social da Presidência da República, passemos diretamente à sua avaliação. 34. Recordemos, primeiramente, qual a única hipótese legal admitida em nosso regime de acesso à informação, para redirecionamento da informação: Art. 11. O órgão ou entidade pública deverá autorizar ou conceder o acesso imediato à informação disponível. § 1o Não sendo possível conceder o acesso imediato, na forma disposta no caput, o órgão ou entidade que receber o pedido deverá, em prazo não superior a 20 (vinte) dias: [...] III - comunicar que não possui a informação, indicar, se for do seu conhecimento, o órgão ou a entidade que a detém, ou, ainda, remeter o requerimento a esse órgão ou entidade, cientificando o interessado da remessa de seu pedido de informação. 35. O redirecionamento, que não recebe regulamentação pelo Decreto 7.724/2012, portanto, apenas poderia ter lugar quando o órgão ou entidade demandado não houver produzido e tampouco custodie a informação solicitada e, tendo conhecimento acerca de quem detivesse responsabilidade sobre ela, desse ciência ao cidadão a fim de proceder ao redirecionamento ao órgão competente. Este não é o caso que se evidencia nos autos, uma vez que a Secretaria de Comunicação Social não é responsável pela gestão do provedor. 36. Quer nos parecer que, invertendo a lógica proposta pela Lei de Acesso à Informação, o redirecionamento deu-se não em razão da informação solicitada, mas em função do solicitante, que exerce a profissão de jornalista. 37. Recordemos que a relação entre informação da Administração Pública e profissionais do jornalismo desenvolve-se por meio de duas interfaces distintas à luz da Constituição Federal: como cidadãos, veem-se acolhidos pelo direito de acesso à informação insculpido no inciso XXXIII do art. 5º, regulamentado pela Lei 12.527/2011; como jornalistas, pelo direito à informação necessária ao exercício da profissão, insculpido no inciso XIV do art. 5º. 38. Ao optar por oferecer questionamento por meio do e-SIC, sistema desenvolvido para garantir os ritos previstos no Decreto 7.724/2012, que regulamenta a Lei de Acesso à Informação, claro está que o jornalista o faz em exercício de sua cidadania, estando vedada a administração de perquirir acerca dos motivos que o levam a fazê-lo, nos termos do art. 14 daquele Decreto. Se até mesmo é pacífico, à luz da jurisprudência administrativa, que a solicitação de informação feita por militar ao seu comando não é desrespeito ao princípio hierárquico que rege aquela instituição, visto que feito na qualidade de cidadão, no exercício de um direito subjetivo, não se haveria sequer de cogitar da correição do procedimento adotado pelo órgão redirecionante no presente caso. Página 13 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União III - CONCLUSÃO 39. Diante do exposto, opino pelo conhecimento do presente recurso, opinando, em seu mérito, pelo seu desprovimento, fulcro no art. 150 da Lei 8.112/1990, combinado com art. 22 da Lei 12.527/2011. 40. Ademais, em face da irregularidade do procedimento de redirecionamento da demanda, recomenda-se seja cientificada a autoridade de monitoramento a que se refere o art. 40 da Lei 12.527/2011 para que esta tome as providências necessárias à correção desta irregularidade, de forma a assegurar o cumprimento das normas processuais previstas no Decreto 7.724/2012. 41. À apreciação do Sr. Ouvidor-Geral da União. Página 14 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União DECISÃO No exercício das atribuições a mim conferidas pela Portaria n. 1.567 da Controladoria-Geral da União, de 22 de agosto de 2013, adoto, como fundamento deste ato, o parecer acima, para decidir pelo desprovimento do recurso interposto, nos termos do art. 23 do referido Decreto, no âmbito do pedido de informação nº 00077.000613/2013-86, direcionado à Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República. Página 15 de 15 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Controladoria-Geral da União Folha de Assinaturas Documento: PARECER nº 2413 de 24/09/2013 Referência: PROCESSO nº 00077.000613/2013-86 Assunto: Recurso à CGU contra decisão denegatória de acesso à informação Signatário(s): JOSE EDUARDO ELIAS ROMAO Ouvidor Assinado Digitalmente em 24/09/2013 Relação de Despachos: À superior consideração. MARCOS GERHARDT LINDENMAYER ANALISTA DE FINANCAS E CONTROLE Assinado Digitalmente em 20/09/2013 Este despacho foi expedido eletronicamente pelo SGI. O c ódigo para verificação da autenticidade deste documento é: 14302923_8d087686aa5f645