PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2013.0000734926
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº
0004498-19.2008.8.26.0210, da Comarca de Guaíra, em que são apelantes/apelados
GERALDO GARCIA RAMOS NETO (ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA),
DELAVANGE FERREIRA DE FREITAS (ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA),
DIOGO FERREIRA DE FREITAS (ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA), LAURA
MARIA LANATOVITZ DA CUNHA DE FREITAS (ASSISTÊNCIA
JUDICIÁRIA) e MARCOS MENDONÇA MARCELINO (ASSISTÊNCIA
JUDICIÁRIA), é apelado/apelante WILLIAN HENRIQUE DE SOUZA, Apelados
CONRADO DA SILVA GARCIA (ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA), ELDER
BORGES GARCIA (ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA), GABRIELA CRISTINA DA
SILVA GARCIA (ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA) e SIMONE CRISTINA GARCIA
RAMOS.
ACORDAM, em 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de
São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram parcial provimento ao recurso do
corréu e negaram provimento aos demais recursos.", de conformidade com o voto do
Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores MIGUEL
BRANDI (Presidente sem voto), LUIS MARIO GALBETTI E WALTER
BARONE.
São Paulo, 27 de novembro de 2013.
Mendes Pereira
RELATOR
Assinatura Eletrônica
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Voto nº 4409
Apelação Cível nº 0004498-19.2008.8.26.0210
Apelantes: Geraldo Garcia Ramos Neto; William Henrique de Souza e outros
Apelados : os mesmos
Comarca : Guaíra
7ª Câmara de Direito Privado
DANOS MORAL E MATERIAL - Lesão física - Agressão
decorrente de pedradas, do que resultou perda da visão no
olho esquerdo - Agressores e vítima menores de idade ao
tempo dos fatos - Responsabilidade dos genitores Inteligência do art. 932 do Código Civil - Confirmação do
valor indenizatório por danos morais em R$60.000,00, tal
como constou da sentença - Recurso de um dos corréus
parcialmente provido para fixar a correção monetária do
quantum indenizatório a partir do arbitramento e juros a
contar do evento danoso, conforme as Súmulas 54 e 362 do
STJ, desprovidos os demais apelos.
A r. sentença de fls. 385/387, adotado o relatório, julgou parcialmente
procedente pedido de indenização por danos materiais e morais fundado em lesões
físicas decorrentes de agressão para condenar os corréus ao pagamento de
R$2.771,00 por danos materiais e R$60.000,00 por danos morais.
Recorrem as partes.
O autor, a fls. 393/395, exclusivamente para pugnar a majoração da
indenização por danos morais para o patamar de R$100.000,00, ante as
peculiaridades do caso concreto.
O corréu Geraldo, a fls. 389/392, para alegar que não atingiu a vítima
com a pedrada que culminou na perda de sua visão e que, por isso, não pode ser
responsabilizado. De outra banda, requer a redução da condenação, máxime levando
em conta suas condições financeiras.
Os corréus Delavange, Diogo e Laura, a fls. 397/400, sustentam que a
vítima provocara os agressores com xingamentos, disso resultando a reação, que
reclama, ao menos, culpa recíproca. Diz, ainda, que o menor Delavange não teve
participação efetiva no evento. Pede a redução da indenização por danos materiais e
morais para metade do valor fixado na r. sentença.
O corréu Marcos, a fls. 404/413, alegando, preliminarmente, a
prescrição, porque, tendo ocorrido o evento em abril de 2005, a ação foi proposta
apenas em setembro de 2008, quando já transcorrido o prazo trienal. Sustenta, ainda,
a ilegitimidade de parte, porque não detém ou deteve a guarda de seu filho Geraldo
Garcia Ramos Neto. No mérito, pede o afastamento dos danos morais, porque não
houve dano ou culpa na agressão. Alternativamente, pede a redução do quantum e
que seja declarada a existência de culpa recíproca. Pede, por fim, que a correção
Apelação nº 0004498-19.2008.8.26.0210 - Guaíra - Voto nº 4409 - LEAS
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monetária seja aplicada nos termos da Súmula 362 do STJ.
As contrarrazões vieram a fls. 417/418.
Os recurso foram processados regularmente.
É o relatório.
De início, repelem-se as preliminares de prescrição e ilegitimidade
passiva, as quais, observe-se, já foram rechaçadas na irrecorrida decisão saneadora
de fls. 275/276. Nesse decisório o magistrado bem assinala que a guarda com um
dos pais não afasta a responsabilidade do outro genitor e que não corre a prescrição
contra incapazes, como era o caso da vítima, que contava dez anos ao tempo do
infeliz evento.
A situação dos autos assim se apresenta: em 8-4-2005, a vítima
William foi agredida por pedradas por Geraldo, Delavange e Conrado. Todos eram
então menores de idade e das agressões resultou a perda da visão do olho esquerdo
da vítima.
O repulsivo relato de suposta brincadeira convertida em expediente
primitivo e definitivamente deletério não pode ficar apoiado em excludentes ou
tentativas diversionistas de fuga à responsabilidade.
É incontroverso que os três agressores atingiram a vítima e já em
primeiro grau, como agora, tentam afirmar que a cegueira não ocorreu por sua ação.
Não houve testemunhas do fato. A vítima era física e etariamente menor do que seus
detratores, também menores de idade.
Disso decorre a responsabilidade parental, sendo irrelevante se
detinham ou não a guarda dos filhos. Nesse sentido, bem consigna a r. sentença que
“a responsabilidade de seus genitores se extrai do próprio texto legal, sendo certo
que nenhum deles comprovou que não exercia poder familiar sobre os filhos, não
podendo se entender que o simples fato de que seus filhos, todos menores de idade à
época, não produziram o acidente, o que vai ao desencontro com o teor destes autos.
Trata-se de modalidade de responsabilidade por fato de outrem, com aplicação da
regra do art. 932, I, do Código Civil, que estabelece, no mais, que a responsabilidade
dos pais por ato dos filhos é objetiva (cf. art. 933)”.
Essa responsabilidade não fica afastada mesmo se não há guarda,
estando o filho em companhia do ascendente. Nesse aspecto, Claudio Luiz Bueno de
Godoy leciona:
“Responderá o genitor que, mesmo sem a guarda, mas não destituído
do poder familiar, estiver com o menor sob sua autoridade no momento dos fatos, tal
como quando esteja no período de visita do genitor separado ou divorciado. Quer
dizer, parece haver a lei, agora, ao aludir à autoridade dos pais, e não a seu poder
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familiar, tencionado evidenciar que a responsabilidade do genitor se funda em seu
direto poder de direção e, pois, de vigilância do filho menor, portanto quando esteja
sob seu controle”1
Delimitada a responsabilidade dos genitores pela lesão causada pelos
filhos, que culminou com a cegueira permanente da vítima, a questão é a do
balizamento do quantum indenizatório.
Como ensinava Carlos Alberto Bittar: “Somente os reflexos
negativos nas esferas referidas da personalidade constituem danos morais e, como
tais, suscetíveis de reação defensiva ou reparatória que, a esse título, o Direito
permite, com cunho eminentemente compensatório a atribuição de um
sancionamento ao lesante pelo fato e uma compensação ao lesado pelos reflexos
negativos sentidos em sua personalidade, independentemente de haver repercussão
em sua atuação profissional, econômica, política ou social...”2.
Assim, também a lição de Carlos Roberto Gonçalves: “Este
independe de reflexos patrimoniais. Basta a ofensa à honra para gerar o direito à
indenização. O dano moral está ínsito, presumido juris et de jure, na ofensa à
honra...”3.
Como exposto, tais danos exsurgem pela só ofensa moral.
É cediço que a fixação da indenização por dano moral deve se dar em
termos aceitáveis, não se justificando que a reparação venha a constituir-se em
enriquecimento indevido da vítima, tampouco diminuto ao ponto de incentivar o
ofensor na prática do ilícito e furtar-se ao seu papel sancionador. Em vista disto, o
arbitramento deve operar-se com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa,
ao potencial econômico das partes, que, no caso, não fizeram prova de sua propalada
dificuldade financeira, e às suas atividades.
Nessa linha de raciocínio, a indenização no montante de R$
60.000,00 (sessenta mil reais) para os autores do fato ilícito não se mostra irrisória
ou excessiva e guarda proporcionalidade com os danos experimentados, consistentes
na perda da visão e de todo o impacto que carreará para a vítima pelos anos de sua
existência.
Cabe, contudo, correção do julgado para que esteja em sintonia com
as Súmulas 544 e 3625 do Superior Tribunal de Justiça. Assim, as importâncias
fixadas a título tanto de indenização por danos materiais e morais devem ser
corrigidas a partir do arbitramento, com juros desde o evento danoso, isto é, 8 de
1
In PELUSO, Cezar. Código Civil comentado. 6. ed. rev. e atual. Barueri: Manole, 2012. p. 934
Reparação Civil por Danos Morais. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. pp. 58-60.
3 Carlos Roberto Gonçalves, Responsabilidade Civil, p. 42.
4 “Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade
extracontratual.”
5 “A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do
arbitramento.”
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abril de 2005.
Diante de todo o exposto, dá-se parcial provimento ao recurso do
corréu Marcos, para se fixar a correção do quantum indenizatório a partir do
arbitramento e juros do evento danoso, negado provimento aos demais recursos,
preservando-se, assim, a r. sentença.
MENDES PEREIRA
Relator
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