A construção do Espaço de AU de Belo Horizonte: uma experiência multiatoral 1 2 3 Ivana Cristina Lovo , Katia Maria Silveira Pessoa , Zoraya Bernadete Souza , 4 5 6 Sonia de Fátima Rabelo Coutinho , Ana Barros e Daniela Almeida A agricultura urbana em Belo Horizonte tem as atividades incrementadas a partir de 1993, com a eleição da primeira gestão democrática e popular no município. Destacam-se nesse inicio os Programas Hortas Escolares e Comunitárias e o Pro-pomar, coordenado pela Secretaria Municipal Adjunta de Abastecimento (SMAAB), recém criada na época. Entre 1995 à 2001 destaca-se o a efetivação do Programa Centro de Vivência Agroecológico (CEVAE), com instalação de quatro Centros em quatro diferentes Regionais da cidade. Esse Programa foi uma parceria entre a SMAAB, Secretaria Municipal de Meio Ambiente e a Rede de Intercambio de Tecnologias Alternativas (REDE), que apoiado por agencia internacional, dialogou com o desafio de elaborar e instalar a Agenda 21 local. O CEVAEs lograram êxito em seus objetivos, alcançando reconhecimento internacional. Em 2005 a REDE e a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) se aproximam novamente com o objetivo de criar condições de implementar o Programa Cidade Cultivando para o Futuro, através da parceria com Ipes/Ruaf Foudation. Foi a oportunidade de ter apoio para desenvolver um processo multiatoral para diagnosticar a realidade da agricultura urbana no município e elaborar um plano de ações focando a formulação de uma política municipal de agricultura urbana. Portanto, essa foi a oportunidade de criar uma aliança entre o poder público e a sociedade civil com o intuito de identificar debilidades e oportunidades para consolidar o desenvolvimento da agricultura urbana em BH, assim como identificar ações e atitudes para superar as debilidades e aproveitar as oportunidades identificadas. O principal resultado do Programa CCF em BH foi a formulação de um instrumento de planejamento e gestão para fortalecer e consolidar a agricultura urbana e estimular o fortalecimento do diálogo entre poder público e sociedade civil através da criação de um Espaço de diálogo e gestão que pudesse implementar, revisar e monitorar os impactos das ações desenvolvidas. A seguir está portanto descrito esse processo vivido em Belo Horizonte. O Espaço de AU de Belo Horizonte A conformação do espaço multiatoral da AU em Belo Horizonte tem origem nos grupos de discussão e planejamento que ocorreram como parte de la implementação del proceso multicatiral del Programa Cidades Cultivando para o Futuro em Belo Horizonte. Assim, durante a realização do Seminário "Belo Horizonte Cultivando o Futuro: Agricultura Urbana como Instrumento de Gestão da Cidade", em 02 de junho de 2008, foi formalizado o espaço multiatoral que recebeu a denominação de Espaço de AU de Belo Horizonte. Espaço de Agricultura Urbana de Belo Horizonte-AU/BH é um Espaço político que busca identificar, planejar, articular e monitorar as estratégias de promoção e consolidação da AU em Belo Horizonte. Articula trinta e três (33) instituições/organizações que assinaram uma carta de adesão demonstrando interesse em participar do Espaço de AU de BH. Destas, 16 representam setores governamentais da instancia Municipal, Estadual e Federal, 11 são organizações não governamentais, 10 são organizações sociais de base e 02 representam grupos produtivos (Lovo, 2011). Além dessas instituições/organizações outros setores governamentais e também organizações não governamentais se envolveram no processo do planejamento e continuam participando de atividades do Espaço mesmo não tendo assinado a carta de adesão ao Espaço. 1 Assessora do Ipes-Brasil. [email protected] Assessora do Ipes-Brasil. [email protected] Técnica da Secretaria Municipal Adjunta de Segurança Alimentar Nutricional/PBH. [email protected] 4 Técnica Fundação de Parques Municipais/PBH. [email protected] 5 Técnica da Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas. [email protected] 6 Técnica da Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas. [email protected] 2 3 1 A gestão da AU/BH, conforme figura esquemática, constitui-se da seguinte forma: a Plenária é a instância máxima de tomada de decisões, constituída por todos os interessados em acompanhar as ações da AU/BH. Tem como função aprovar, monitorar e avaliar o plano de ações, definir as prioridades para cada biênio, além de indicar o Grupo Gestor e os Grupos de Trabalho. O Grupo Gestor, constituído por instituições indicadas pela plenária e que, juntamente com a Secretaria Executiva, tem a função de coordenar os Grupos de Trabalho, fomentar e avaliar a implementação do Plano de Ação e articular os diversos setores governamentais e segmentos da sociedade civil com atuação relacionada à AU participantes ou não do Espaço de AU. Atualmente, é integrado pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), representada pela Secretaria Municipal Adjunta de Segurança Alimentar Nutricional (SMASAN) e pela Fundação de Parques Municipais (FPM), o IPES-Brasil e a Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas (REDE). A Secretaria Executiva tem o papel de dar encaminhamentos às deliberações da Plenária e do Grupo Gestor, mobilizar as instâncias para as ações planejadas e implementar as ações de divulgação. Finalmente, os Grupos de Trabalhos, são instâncias executivas e operacionais relacionadas aos objetivos estratégicos do Plano de Ação. A Secretaria Executiva está sob a responsabilidade da SMASAN desde maio de 2010. Instrumentos de planificación y gestión: O Plano de Ação de AU de Belo Horizonte O Plano de Ação de AU/BH possui 06 Objetivos Estratégicos a serem alcançados por meio de Objetivos Operacionais e Ações Estratégicas de curto, médio e longo prazo, no horizonte de 10 anos 2008/2018. O Plano de Ação aponta a necessidade de manter um exercício constante de diálogo e planejamento de ações, focando os objetivos acordados e buscando alternativas para superar contingências adversas e potencializar situações favoráveis. O modelo de Plano de Ação, sem orçamento específico se apóia no desenvolvimento de ações propostas pelos atores envolvidos com o Espaço de AU/BH e na captação de novos projetos. Para o período 2009 a 2010, o Espaço implementou ações que significaram investimento de recursos superiores a 800 mil dólares, conforme dados da tabela 1. Além dos recursos incluídos na Tabela, o projeto contou ainda com apoio e esforços e os recursos de outros atores, como as organizações participantes da Articulação Metropolitana de Agricultura Urbana (AMAU), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), de outras ONGs e setores da PBH, além do trabalho e das horas de dedicação dos agricultores e agricultoras participantes dos grupos produtivos. . Tabela 1– Investimentos no Espaço de Agricultura Urbana em Belo Horizonte Belo Horizonte – (US$) 2009-2010 Projeto SWITCH 0.00 Projeto Da Semente à Mesa (FStT) 22941.18 SMASAN (SMAAB) 0.00 FPM 0.00 Adm. Reg. Barreir o 0.00 128573.60 137031.80 0.00 0.00 48676.47 51550.03 0.00 0.00 0.00 0.00 20588.24 44673.70 3716.47 0.00 0.00 0.00 33088.24 0.00 0.00 4129.41 0.00 13764.71 2328.82 3352.94 7058.82 0.00 0.00 0.00 3730.24 3867.88 0.00 0.00 TOTAL 140149.72 154664.39 5681.76 *Valor considerado para o cambio U$1.00 = R$1.70 7058.82 Itens/Instituiçõe s/Projetos Formação Assistência Técnica Monitoramento Insumos e Equipamentos Infra-estrutura Água Energia Elétrica 2 CAAUPRMBH 81236.71 REDE 74411.76 115270.58 5294.12 TOTAL 178589.64 481102.48 70556.06 36804.71 0.00 0.00 0 0 0 9387.65 21247.06 0.00 0.00 0 7598.12 125294.12 177460.44 194976.46 805285.71 A execução do Plano de AU ocorre por meio de planejamentos bianuais, com a priorização das ações para cada período e a divisão de responsabilidades entre os participantes do Grupo Gestor e outros atores participantes do Espaço. Cada ator local tem implementado aquelas ações do Plano que dialogam com suas prioridades institucionais. 12 10 8 Objetivos operacionais 6 4 Ações estratégicas 2 0 Divulgar benefícios da AU Fortalecer a organiz. dos agricultores/as Capacitar agricult., gestores e agente comunit. Fortalecer produção e comercialização Acessar progr. de Apoio AU Inst. política intersetorial AU Ações reallizadas Ações com algum nível execução Ações não iniciadas Gráfico 1. Grau de implantação do Plano de AU de BH considerando o período de 2008-2 a 2010-2 O Grafico 1 apresenta o Grau de Implantação do Plano de AU/BH, segundo seus objetivos estratégicos, no biênio 2008-2010. É possível destacar um avanço nas ações relacionadas ao objetivo estratégico de institucionalização de uma política de AU em Belo Horizonte. Tendo em vista que em 2009 e 2010 vários projetos de Lei relacionados à AU entraram em pauta na Câmara de Vereadores. o Destacam-se a aprovação da Lei n 9.959/10, vinculada à Conferência da Cidade, que realizou a revisão do Plano Diretor de Uso e Ocupação do Solo incluindo a prática da agricultura urbana como uma das atividades previstas para o uso do solo, nas categorias reconhecidas como uso do solo não residencial e o o Projeto de Lei n 274/2009 que trata da normatização de uma política municipal de AU. Durante o segundo semestre de 2009 e o primeiro de 2010, este Projeto de Lei foi discutido nas reuniões do Grupo Gestor do Espaço de AU e em uma reunião ampliada realizada na Câmara dos Vereadores. Esse processo de discussão gerou uma emenda substitutiva que está tramitando nas diversas Comissões da Câmara. Ainda no âmbito da institucionalização, também se destaca a iniciativa da Regional Administrativa Nordeste que manteve em 2010 um grupo de debate sobre ações de AU naquela Região e do Movimento Deixem o Onça Beber Água Limpa, que incorporou os conceitos da AU como um dos principais elementos para o planejamento do uso e ocupação do solo para a revitalização do córrego do Baixo Onça e para a transformação da realidade local. Vale ressaltar que a institucionalização do Plano nas instituições parceiras é diferenciada, em função das especificidades de cada uma delas, no que se refere aos seus objetivos e prioridades. Dentro das ações de fortalecimento da organização dos agricultores, tem destaque a execução de atividades da AMAU, que ao longo de 2010, contaram com uma representação bem diversificada, com destaque para os grupos comunitários e organizações de base, movimentos de luta por moradia, de luta pela terra e reforma agrária, movimento feminista, economia solidária, segurança alimentar, permacultura e coletivos do alimento vivo atuantes em oito municípios da região e; das ações do projeto Da Semente à Mesa (From Seed to Table -FStT), que permitiram fortalecer a produção e comercialização a partir da organização de três grupos (Jardim Produtivo, Vila Pinho e Grupo Macaúbas/CEVAE Capitão Eduardo) para fornecer hortaliças para as escolas públicas municipais. O trabalho foi desenvolvido junto à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) que ofereceu assistência técnica, água, energia elétrica e insumos para os grupos de agricultores urbanos. A experiência permitiu ampliar a autonomia dos agricultores para produção e comercialização. Os agricultores foram cadastrados como micro empreendedores, o que viabilizou documentos fiscais para as escolas públicas manter a compra 3 de seus produtos. Essa experiência, apoiada pela Ruaf Foudation, possibilitou desenvolver uma iniciativa de comercialização inédita na realidade de Belo Horizonte. Com relação ao objetivo de capacitar os agricultores, gestores públicos, agentes comunitários, público universitário sobre AU, agro ecologia e economia solidária, a Rede-MG desenvolveu diversas ações no escopo da implementação do CAAUP-RMBH – Centro de Apoio à Agricultura Urbana e Periurbana da RMBH, que apontam caminhos para a estruturação de um programa amplo e continuado de capacitação. As ações de monitoramento dos Projetos FStT e CAAUP-RMBH que encontram-se em execução através da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) retratam a continuidade da iniciativa pioneira do Programa Cidade Cultivando para o Futuro (CCF), implementado em BH entre 2006-2008, e que fomentou a geração de informações sobre os impactos da AU nos projetos desenvolvidos em BH. A divulgação preliminar desses impactos da AU tem gerado publicações acadêmicas (artigos, monografias, teses de mestrado e doutorado) e em revistas especializadas. A próxima avaliação da implementação do Plano de AU está prevista para o primeiro semestre de 2011, com a realização de um seminário municipal, em que se pretende avaliar o que foi realizado no biênio passado, eleger a priorização de ações para o próximo biênio (2011-2012) e renovar a composição do Grupo Gestor. Lições aprendidas Construir um Plano de Ação entre diferentes atores foi um passo importante para vivenciar a possibilidade de uma ação coletiva envolvendo segmentos da sociedade civil e do poder público. A definição conjunta de objetivos e ações prioritárias foi importante para evitar duplicidade das mesmas e a defesa de interesses institucionais e organizacionais isolados. Mas, como aponta Lovo (2011) a maior ou menor efetivação de uma determinada ação estratégica depende dos interesses e prioridades de cada instituição. Dessa forma, o Plano de Ação de AU de BH tem se concretizado não só a partir dos investimentos e ações coletivas, mas, também, a partir das ações focadas nos planejamentos e prioridades de cada organização/instituição. Essa situação reflete como cada organização tem incorporado e se comprometido com os objetivos estratégicos acordados no contexto do Espaço de AU. Isso significa potencializar os pontos de convergência entre os atores, criando sinergias, e não a priorização das diferenças entre eles. Ter um plano que aponta para ações de curto, médio e longo prazo tem possibilitado um exercício de diálogo e planejamento de ações constante, focando os objetivos acordados, evitando dispersar e buscando alternativas para a superação de contingencias adversas e a potencialização de situações favoráveis. O Espaço de AU tem se mostrado como uma oportunidade de experimentar novas formas de relação, principalmente por meio da dinâmica de trabalho do seu Grupo Gestor e da constituição dos Grupos de Trabalho. Destaca-se a participação de instituições que historicamente promovem a AU em Belo Horizonte, mas que não mantinham uma rotina de diálogo sobre suas ações. Dentro desse quadro as reflexões acumuladas também apontam limites nas formas de relação entre as organizações da sociedade civil e o governo, tais como divergências entre as prioridades políticas e diferentes expectativas de tempos para a execução dos projetos e programas, que geram tensões entre as partes envolvidas. Em muitas situações acabam por prevalecer formas habituais na relação entre poder público/sociedade civil, como posturas autoritárias da parte governamental ou apenas reivindicatórias por parte das organizações sociais. A forma de implementar ações e aplicar os recursos financeiros na maioria das situações ainda se faz de forma isolada, onde cada instituição aplica os recursos sob sua responsabilidade sem dialogar sobre a forma de fazer isso no conjunto do Grupo Gestor ou mesmo nas plenárias do Espaço. Conseguir um diálogo mais integral sobre o conjunto de ações que cada ator desenvolve poderia ser uma alternativa para melhor integrar e potencializar os recursos disponíveis na implementação das ações do Plano de AU. É também um desafio para ampliar o processo “Belo Horizonte Cultivando AU” aprimorar mecanismos que promovam o envolvimento protagonista dos grupos produtivos, para que os mesmos possam se apropriar do Plano de AU e priorizar onde e como se integrariam nos momentos de planejamento, monitoramento e de execução do referido Plano. 4 Referências bibliográficas LOVO, Ivana Cristina. Agricultura Urbana: um elo entre o ambiente e a cidadania. 2011. 230f (Doutorado em Ciências Humanas) – Programa Interdisciplinar em Ciências Humanas, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2011. LOVO, Ivana Cristina. Sistematização do seminário agricultura urbana: Belo Horizonte cultivando o futuro. Belo Horizonte. Ipes. 2008. 19p. Relatório. PREFEITURA DE BELO HORIZONTE e REDE DE INTERCÂMBIO DE TECNOLOGIAS ALTERNATIVAS. Agricultura urbana: Belo Horizonte cultivando o futuro. Ângela Christina Ferreira Lara e Daniela Almeida (org.). Belo Horizonte: Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas, 2008. 36p. PREFEITURA DE BELO HORIZONTE e FUNDAÇÃO de PARQUES MUNICIPAIS.. 2008-1018 Belo Horizonte Cultivando Agricultura Urbana: Plano de Ação de Agricultura Urbana de Belo Horizonte. Belo Horizonte: PBH e FPM, 2009. 21p. 5