Enron América do Sul Ltda. Av. das Nações Unidas, 11.541 6º andar – 04578-000 São Paulo – SP – Brasil Tel. 5511 5503-1399 Fax. 5511 5503-1270 São Paulo, 16 de junho de 2000. Ilmo Sr. Dr. José Mário Miranda Abdo Diretor Geral Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL REF: Audiência Pública 02/2000 – Regras do Mercado Atacadista de Energia Prezado Dr. Abdo: A ENRON agradece à ANEEL pela oportunidade de oferecer contribuições referentes à Audiência Pública 02/2000, relativa à homologação das Regras do MAE (Mercado Atacadista de Energia). A ENRON entende que o processo de Audiência Pública para homologação das Regras do MAE pela ANEEL será dividido em duas etapas. Em uma primeira etapa, a ANEEL estará compilando opiniões gerais sobre o assunto. Com base nestas opiniões a serem fornecidas pelos diversos agentes setoriais e pelos demais interessados, a ANEEL preparará e tornará público um documento identificando os aspectos mais relevantes, os quais serão objeto de análise mais aprofundada na segunda fase desta mesma Audiência Pública. As contribuições que estão sendo agora oferecidas pela ENRON referem-se exclusivamente à primeira fase da Audiência Pública supra. Tecem comentários sobre o conteúdo básico das Regras do MAE, bem como sobre o processo de desenvolvimento das mesmas, sugerindo algumas medidas para acelerar o processo de homologação. A ENRON entende que as regras do MAE estão no caminho crítico de implementação do Mercado Atacadista de Energia. Como observação de caráter geral, a ENRON gostaria de externar sua preocupação quanto à excessiva demora no processo de elaboração das Regras do MAE, e por decorrência da implementação do Mercado Atacadista de Energia como um todo. As Regras do MAE, que foram elaboradas pelo Ministério de Minas e Energia e entregues ao então recémcriado Mercado Atacadista de Energia em novembro de 1998, deveriam ter sido revisadas e aprovadas por esta instituição noventa dias após a primeira Assembléia de criação do MAE, em outubro de 1998 (cláusula 44 do Acordo de Mercado). Infelizmente, e devido a uma série de razões que fogem ao escopo deste documento, o processo de refinamento e aprovação das regras sofreu inúmeros atrasos, devendo estar concluído somente ao final do ano em curso. A ENRON entende que estes atrasos são de extrema seriedade para a criação de um mercado competitivo de energia elétrica. A ENRON entente também que, a despeito das razões e justificativas alegadas para este atraso, existe um custo social resultante da demora na implementação do MAE. Este custo se torna mais preocupante neste momento crítico do setor elétrico, quando que a implementação do Mercado Atacadista de Energia passa a ser percebida como uma condição sine qua non para a viabilização do programa emergencial das térmicas do Governo Brasileiro. Os investidores potenciais deste programa percebem um risco regulatório muito grande em comprometer vultosos capitais ou em celebrar contratos de longo prazo sem que as regras básicas de funcionamento da indústria estejam finalizadas e sacramentadas. Finalmente, a ENRON entende que a ANEEL está perfeitamente consciente quanto à situação delicada de desequilíbrio entre oferta e demanda por que está passando o Setor Elétrico Brasileiro e consequentementete quanto à importância na aprovação imediata das Regras do MAE. Dentro deste entendimento e objetivos comuns é que a ENRON está oferecendo as sugestões e colaborações contidas neste documento. Por facilidade expositiva, as idéias estão organizadas em três seções principais: - I. O atraso na implementação das Regras do MAE e do Mercado Atacadista de Energia propriamente dito II. A importância da implementação do MAE como elemento viabilizador do Programa Termelétrico - III. Sugestões específicas para acelerar o processo Cada uma destas seções será detalhada nas páginas que seguem: I. O atraso na implementação das Regras do MAE e do Mercado Atacadista de Energia propriamente dito. O Mercado Atacadista de Energia e a criação do Operador Nacional do Sistema foram duas pedras basilares acordadas para o estabelecimento da competição nos segmentos de geração e de comercialização. Ambos foram instituídos através de diploma legal amplamente discutido no âmbito do Poder Executivo e do Congresso Nacional, e que resultou na MP 1531, posteriormente convertida na Lei 9.648 de 1998. As regras de funcionamento do Mercado, por sua vez, resultaram de uma organizada e meticulosa discussão técnica desenvolvida no âmbito do Projeto RE-SEB, do qual participaram mais de 250 técnicos do Setor Elétrico, com suporte de consultoria internacional. O assunto foi discutido em um nível de detalhe excruciante. As Regras de Mercado, bem como os mecanismos de regência e organização do mesmo, foram consolidados em um único documento, o assim chamado Acordo de Mercado, assinado por praticamente todos os agentes representantes dos segmentos de geração e de consumo. Vale lembrar que este Acordo, antes de sua assinatura, foi objeto de Consulta Pública instaurado pela ANEEL. Em suma, o Acordo de Mercado consolidou um trabalho técnico exaustivo e meticuloso, contou com o suporte legal e foi aprovado de acordo com os procedimentos transparentes de instaurados pelo Poder Concedente. Este Acordo de Mercado estabelecia que, uma vez criado o Comitê Executivo do Mercado (COEX), este envidaria seus melhores esforços para revisar e aprovar as Regras detalhadas de Mercado, em seu formato algébrico definitivo. Instaurado o COEX, o mesmo corroborou os prazos para aprovação das Regras e para a implementação do Mercado Atacadista de Energia, o qual deveria estar operativo ao início do ano 2000. Entretanto, as ações empreendidas pelo COEX e pela ASMAE, seu braço executivo, não foram suficientes para aprovação das Regras do MAE no prazo acordado (entre os agentes e entre estes e a sociedade). Por razões das mais diversas possíveis, os prazos de implementação do MAE foram sendo sucessivamente dilatados. Não cabe aqui fazer uma análise exaustiva das razões que determinaram as sucessivas revisões de cronograma. Entretanto, é importante destacar algumas delas, no sentido de extrair lições de como o processo pode agora ser acelerado. Algumas das razões mais importantes que determinaram atrasos na implantação do MAE, podem ser resumidas como segue: Fase I.0 + Fase 1) Maior detalhamento e conhecimento das nuances do processo de implementação – quando da elaboração do orçamento de operação Fase os conselheiros tomaram Fase e investimentos do MAE, conhecimento da complexidade do processo, o que de per si exigiu uma revisão para tornar o cronograma mais realista; Fase Fase 2) Cassação da MP 1819 – esta ação forçou uma absorção intempestiva, por parte da ASMAE, das funções que vinham sendo executadas pelo GCOI; esta absorção implicou em uma mudança Fase de foco dos trabalhos de detalhamento e aprovação das regras definitivas, o que implicou uma nova revisão do cronograma. Foi Evolução a necessário buscar regras para aplicação imediata, o que foi objeto da Resolução 222/99 da ANEEL; 3) Discussões quanto aos aspectos técnicos das Regras do MAE – em Evolução a Mercado “ Pseudo parte, isto se deve a um preciosismo dos técnicos que trabalharam neste projeto; entretanto, em grande parte, as discussões exaustivas se deviam à busca legítima, por parte dos agentes, de encontrar soluções favoráveis às suas empresas em particular. Muitas das regras discutidas implicavam em alocação de renda econômica entre os segmentos de geração e carga e eram percebidas como “jogos de soma zero”; 4) Sistema de Governance – o MAE, o COEX e a Assembléia Geral, não contavam com incentivos e penalidades que fomentassem a finalização das regras dentro dos prazos acordados; o sistema de governance levava a um comportamento dos agentes no sentido de buscar soluções que beneficiassem suas empresas, ainda que isto comprometesse os prazos de implementação. O todo resultou em algo inferior a soma de suas partes. No entendimento da ENRON, este tem sido o fator de maior importância no atraso da aprovação das regras e do MAE como um todo. Com base neste diagnóstico aqui descrito de forma expedita e nas lições extraídas do processo de implementação do MAE nos últimos 18 meses, a ENRON sugerirá, ao final deste documento, algumas recomendações específicas no sentido de acelerar o processo de implementação do MAE. II. A importância da implementação do MAE como elemento viabilizador do Programa Termelétrico Implementar o Mercado Atacadista de Energia tem sido até agora, um componente chave para introduzir concorrência no Setor Elétrico. Este objetivo é, como já comentado, uma das pedras basilares da reforma do Setor. Introduzir concorrência é um objetivo nobre, legítimo, mas que não está sujeito a uma pressão forte da sociedade para implementação imediata e intempestiva. Sabe-se que os benefícios da concorrência se materializam a médio e longo prazo, o que de per si, dá aos agentes e ao governo um grau de conforto em implementar de forma correta e paulatinamente, sem as pressões do dia a dia. Entretanto, o cenário atual mudou radicalmente. O Setor Elétrico sofre ameaça de um racionamento de energia sem proporções, o que mobilizou o governo e os agentes a buscarem uma solução a curto prazo. Desta mobilização resultou o Programa Emergencial de Termelétricas do MME. A ENRON entende que a finalização da Regras do MAE e a implementação do Mercado são indispensáveis para o êxito deste programa emergencial. Não ter as regras claramente definidas e os procedimentos de Mercado operando efetivamente, é um risco regulatório muito grande para os investidores comprometidos em alocar vultosos capitais para a consecução do programa. As unidades geradoras são particularmente “sensíveis” aos riscos regulatórios do mercado. Apenas a título de ilustração, seguem algumas inquietudes que são críticas quando da análise do projeto por parte dos investidores. As Regras do MAE abordam e definem todos estes aspectos, faltando apenas uma finalização e homologação oficial. a) Formação de Preços I – Como será determinado o preço spot e qual o grau de transparência na definição dos parâmetros de entrada dos modelos? b) Formação de Preços II – O Encargo de Capacidade será implementado? Como será calculado e “discretizado” em diferentes patamares c) Formação de Preços III – Haverá interferência do MAE e do Governo no sentido de limitar preços do MAE? Em que áreas? Sob que circunstâncias? TMO, Encargos de Capacidade, Serviços Ancilares? d) Perdas - Como serão calculados e aplicados os fatores de perda? Incluirão perdas na rede como um todo ou apenas na malha de transmissão (Rede Básica)? e) Restrições de Transmissão – Como serão compensadas as plantas forçadas a gerar fora da ordem de mérito por questões de estabilidade, falhas na transmissão ou para provimento de serviços ancilares? As regras “constrained-on” e “constrained-off” propostas serão aceitas? f) Oferta de preços – As novas térmicas terão liberdade de determinar seus preços e condições para fins de despacho (custo marginal e inflexibilidade)? Estes parâmetros poderão ser “auditados” pelo MAE, ONS ou ANEEL? Sob que circunstâncias? Apenas em caso de “market power” ou inteiramente à discrição destes agentes? g) Registro de Contratos – Os procedimentos que permitem aos agentes declarações de contratos “ex-post” serão de fato implementados? (para permitir a celebração de contratos de capacidade). Todos estes aspectos são cruciais quando da análise de viabilidade das usinas, particularmente das térmicas constantes no Programa Emergencial. A indefinição de um ou mais destes aspectos implica em riscos regulatórios muito grandes, os quais levarão a longas e complexas discussões entre os futuros geradores e as concessionárias distribuidoras quando da negociação dos PPAs (“Power Purchase Agreements”). Riscos e indefinições implicam que os geradores exigirão preços mais elevados, o que levará, por sua vez, a novas e intensas discussões entre as concessionárias distribuidoras e a ANEEL quanto aos termos e condições de repasse. Tudo isto implica em prazos adicionais, atrasos e desgastes que podem ser mitigados quando da homologação, tão rápido quanto possível, de um conjunto coerente e claro que são as Regras do MAE. Portanto, o sentido de urgência na implementação do MAE passa agora a ser de extrema prioridade. Não há mais tempo para refinamentos e discussões de detalhes técnicos de natureza menor. Sucessivos atrasos são socialmente danosos e inaceitáveis . O compromisso entre qualidade do produto, defesa de interesses individuais e urgência na implementação deve ser claramente revisado. A sociedade organizada não pode se dar ao luxo de permitir sucessivos atrasos como os que vem ocorrendo na implementação do MAE. III. Sugestões específicas para acelerar o processo Em primeiro lugar, é preciso encarar o problema de frente. Há necessidade de uma consciência muito clara de que o processo de implementação do MAE está atrasado e que a delonga em consolidar as regras é um dos fatores que tem determinado este atraso. Deve-se admitir que houve uma ineficiência do Setor Elétrico como um todo em implementar o Mercado Atacadista nos prazos devidos. Em segundo lugar, é interessante avaliar friamente as razões determinantes do atraso da implementação do MAE, sendo que a mais importante, na visão da ENRON, se deve a um sistema de Governance com incentivos e penalidades muito frágeis, que não estimulam os agentes a implementarem o MAE nas datas aprazadas. Neste sentido, a ENRON sugere que a ANEEL, como o agente que outorgou uma Autorização para funcionamento do MAE, adote adequados instrumentos para induzir o seu mais rápido funcionamento. Em terceiro lugar, e para dar eficácia às recomendações do item anterior, a ENRON sugere que a ANEEL deva exercer um papel de vigilância sobre o andamento dos trabalhos, identificando atrasos, problemas levantados pelo COEX, contingências, conflitos potenciais entre MAE e ONS, e outros dados relevantes. Em quarto lugar, a ENRON recomenda que a ANEEL seja a mais objetiva possível quando da discussão e homologação das Regras de Mercado, objeto desta Audiência Pública. Houve um questionamento de parte de alguns agentes quanto à necessidade ou não da ANEEL ter colocado as Regras em Audiência Pública, o que poderá implicar em um atraso adicional na implementação do MAE. Não vamos questionar esta decisão da ANEEL, tampouco emitir qualquer julgamento de valor quanto à conveniência ou não de realizar Audiência Pública nesta fase dos trabalhos. O ponto que a ENRON gostaria de ressaltar é que a ANEEL, ao avaliar as diversas sugestões, tenha em mente que estas Regras não estão sendo discutidas a partir de uma “folha branca de papel”. Há uma série de documentos basilares, tais como a Lei 9.648/98, o Decreto 2.655/98 e o Acordo de Mercado que devem servir como “âncora” para o processo de homologação. A ENRON está preocupada sobremaneira com a possibilidade de que esta Audiência Pública venha a questionar aspectos e decisões que consubstanciaram o Acordo de Mercado, recaindo em discussões técnicas intermináveis e não resolvidas no mundo acadêmico internacional. Há consciência de que as Regras de Mercado aprovadas não representam o mundo ideal, mas sim representam o melhor compromisso técnico, político e comercial que o Setor pode formular. Sabe-se também que estas regras não estão “escritas em pedra” e que passarão por um processo evolutivo natural nos próximos anos. Desta forma, a ENRON reitera, com grande ênfase, que a ANEEL tome como ponto de partida o Acordo de Mercado e seja extremamente seletiva quanto a proposições de mudança de natureza acadêmica, que não tenham o pragmatismo necessário nem o compromisso com a implementação do mercado competitivo de energia a curto prazo. Estes são pontos principais que espelham a visão da ENRON neste momento, com base nas informações disponíveis. A ENRON estará também atenta e tecerá comentários sobre documento a ser divulgado brevemente pela ANEEL como próximo passo desta Audiência. Como comentário final, a ENRON se coloca inteiramente à disposição da ANEEL para esclarecimentos adicionais que se façam necessários no sentido de aperfeiçoar as Regras de Mercado e, principalmente no sentido de acelerar a implementação do Mercado Atacadista de Energia. Agradecemos antecipadamente, subscrevemos, Atenciosamente. Lindolfo Ernesto Paixão Vice-Presidente – Assuntos Regulatórios