Artigo Original
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Article
ADOLFO,
L.G.S.
et al.
A Omissão Legislativa na Proteção do Autor Empregado: Critérios Para Superar a Omissão a
Partir do Direito do Trabalho Como Direito Fundamental
The Legislative Omission in Protection of Employee Author: Criteria to Overcome Failure
from the Labor Law as Fundamental Right
Luiz Gonzaga Silva Adolfoa*; Flaviano Monteiro Boffb; Jéssica Molina Camposb; Mariana de Macedo Meurerb
Presidente da Comissão Especial de Propriedade Intelectual da OAB/RS. Universidade de Santa Cruz do Sul. Santa Cruz do Sul - RS, da
Universidade Luterana do Brasil, Gravataí - RS e Instituto Brasileiro de Gestão de Negócios, Rio Grande do Sul, Brasil.
b
Escola Superior de Administração, Direito e Economia, Rio Grande do Sul, Brasil.
a
*E-mail: [email protected]
Resumo
O artigo tem por escopo a breve análise da aplicação dos direitos autorais no campo do Direito do Trabalho, suas falhas e consequências, tais
como a omissão, na Lei de Direitos Autorais (Lei no 9.610, de 1998), da proteção ao autor empregado. Faz um sucinto apanhado histórico
acerca do Direito do Trabalho e do Direito Autoral, mostrando seu caráter de direito fundamental. Demonstra a lacuna da atual Lei de Direitos
Autorais e parte da principiologia e da utilização da analogia à Lei de Propriedade Industrial e à Lei do Software como tentativa de solução de
tal omissão e informa, ainda, que o anteprojeto de modernização da Lei de Direitos traz um capítulo sobre o tema.
Palavras-chave: Direito do Trabalho. Direitos Fundamentais. Direitos Autorais. Autor Empregado. Princípios. Analogia.
Abstract
This paper analyses the application of copyright in the field of Labor Law, its failures and consequences, like the omission of protection to the
employed author in the Brazilian Copyright Law (Law nº. 9.610/1998). It makes a brief historical on Labor Law and Intellectual Property Law
showing their characteristic of fundamental right. It demonstrates the omission of the present Copyright Law and uses the principles and the
utilization of analogy to the Industrial Property Law and to the Software Law as an attempt at solving such omission, and also informs that the
draft of modernization of the Copyright Law brings a chapter of this subject.
Keywords: Labor Law. Fundamental Rights. Copyright. Employed Author. Principles. Analogy.
1 Introdução
2 O Direito ao Trabalho Como Direito Fundamental
Este artigo, inicialmente, traz um breve apanhado histórico
do Direito do Trabalho, tanto no âmbito nacional quanto no
internacional, e mostra a evolução da legislação trabalhista
ao longo dos tempos, até chegar à Constituição Federal de
1988, que consagrou o Direito do Trabalho como direito
fundamental, calcado no princípio da dignidade da pessoa
humana.
A segunda parte inicia com uma sucinta explanação
sobre o Direito Autoral como direito fundamental, mostrando
sua evolução histórica no ordenamento jurídico pátrio e
alienígena. Na sequência, trata da omissão legislativa na
proteção do autor empregado, na Lei nº 9.610, de 1998, com o
objetivo de demonstrar os motivos pelos quais foi suprimido o
artigo 36 da lei anterior (Lei nº 5.988, de 1973).
O texto finaliza determinando a quem caberia a titularidade
dos direitos autorais nas obras criadas nas relações de trabalho
e, por fim, aponta as possíveis soluções para a omissão da Lei
nº 9.610, de 1998 (Lei dos Direitos Autorais), inicialmente,
mediante a utilização dos princípios gerais do Direito e da
analogia com a Lei de Propriedade Industrial e, num segundo
e principal instante, da Hermenêutica Constitucional para
suprir esta lacuna.
Não há que se falar em Direito do Trabalho sem antes,
sinteticamente, destacar sua gênese. Nos primórdios, o
trabalho era tido como um castigo. A palavra “trabalho”
origina-se do latim tripalium, uma espécie de instrumento
de tortura. O trabalho, objeto do Direito do Trabalho, surgiu
somente após a consolidação do modo de produção capitalista.
Anteriormente, as relações de trabalho caracterizavam-se
ou pelo regime escravagista ou pelo servil, ou, ainda, pela
autonomia do trabalhador (MARTINS, 2009).
Sobre a evolução do Direito do Trabalho, cabe destacar
que diz Delgado (2011, p.87):
O Direito do Trabalho é, pois, produto cultural do século
XIX e das transformações econômico-sociais e políticas ali
vivenciadas. Transformações todas que colocam a relação
de trabalho subordinado como núcleo motor do processo
produtivo daquela sociedade. Em fins do século XVIII e
durante o curso do século XIX é que se maturaram, na Europa
e nos Estados Unidos, todas as condições fundamentais
de formação do trabalho livre, mas subordinado e de
concentração proletária, que propiciaram a emergência do
Direito do Trabalho.
Por ser objetivo principal do presente trabalho o direito ao
trabalho (autoral) como direito fundamental, passa-se à análise,
UNOPAR Cient., Ciênc. Juríd. Empres., Londrina, v. 13, n. 1, p. 23-28, Mar. 2012.
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A Omissão Legislativa na Proteção do Autor Empregado: Critérios Para Superar a Omissão a Partir do Direito do Trabalho Como Direito Fundamental
a partir da terceira fase do Direito do Trabalho, o período de
institucionalização, que se iniciou logo após a Primeira Guerra
Mundial. Surgiu o denominado constitucionalismo social, que
é a inserção nas Constituições de preceitos relativos à defesa
social da pessoa, de normas de interesse social e de garantia de
certos direitos fundamentais, incluindo o Direito do Trabalho
(MARTINS, 2009).
O direito ao trabalho encontra-se entre os direitos
fundamentais de segunda dimensão. Sarlet (2009) assevera
que o que distingue tais direitos é sua dimensão positiva, visto
que seu principal objetivo é propiciar um direito de participar
do bem-estar social, e não mais evitar a intervenção do Estado.
Contudo, foi no século XX, especialmente nas Constituições
do Pós-Guerra, que esses novos direitos fundamentais
acabaram sendo consagrados em um número significativo
de Constituições, além de serem objeto de diversos pactos
internacionais.
A primeira Constituição que tratou do tema foi a do México,
em 1917. Fazer constar os direitos dos trabalhadores no rol de
direitos constitucionais foi a fórmula jurídica encontrada pelas
lideranças sociais para que fossem observados e respeitados,
como já o eram, os direitos humanos individuais e políticos
(PINTO, 2006).
A segunda Constituição a versar sobre o assunto foi a de
Weimar, de 1919. Com o fim da Primeira Grande Guerra,
fez-se necessária a intervenção jurídica estatal na economia,
para concretizar e garantir direitos políticos, civis e sociais,
com a finalidade de assegurar a ascensão e o desenvolvimento
social e impedir a exploração humana (PINTO, 2006). A
partir de então, vários países constitucionalizaram os direitos
trabalhistas, isto é, passaram a tratar do Direito do Trabalho
em suas Constituições.
Silva Neto (1998) ilustra os efeitos e a influência da
Constituição de Weimar na história do constitucionalismo
mundial e da teoria política, servindo esta de exemplo a
inúmeras outras que seguiram o modelo social-democráticointervencionista, inclusive, a Constituição brasileira de 1934.
Também, em 1919, foi criada pela Conferência de Paz,
após a Primeira Guerra Mundial, a Organização Internacional
do Trabalho - OIT. Sua Constituição converteu-se na Parte XIII
do Tratado de Versalhes. A OIT iria incumbir-se de proteger
as relações entre empregados e empregadores no âmbito
internacional, expedindo convenções e recomendações nesse
sentido. Em 1944, à luz dos efeitos da Grande Depressão e da
Segunda Guerra Mundial, a OIT adotou a Declaração da Filadélfia
como anexo da sua Constituição. A Declaração antecipou a
Carta das Nações Unidas e a Declaração Universal dos Direitos
Humanos e serviu de modelo para ambas (OIT, [2010]).
A principal função da OIT é proteger o trabalhador. Tal
proteção demanda a realização da justiça e do desenvolvimento
social e a promoção da dignidade da pessoa humana. A pessoa
que trabalha deve ser respeitada e valorizada para que seja,
efetivamente, resguardada (ESPADA, 2008).
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Com o fim da Segunda Guerra Mundial, os direitos
humanos tornaram-se uma legítima preocupação internacional.
Surgiram, então, a Organização das Nações Unidas, em 1945,
e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948. Tal
Declaração, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas
sob forma de resolução, ou seja, sem força de lei, trouxe como
objetivo principal o respeito à dignidade humana, consagrando
valores básicos universais. A única e exclusiva condição para a
titularidade de direitos constantes na Declaração Universal é a
condição de pessoa (PIOVESAN, 2010).
No que concerne aos direitos dos trabalhadores, a referida
Declaração previu alguns direitos, tais como: limitação
razoável do trabalho, férias remuneradas periódicas, repouso
e lazer.
Em 1966, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais, aprovado pela XXI Sessão da Assembleia
Geral das Nações Unidas, passou a
incorporar os dispositivos da Declaração Universal sob a
forma de preceitos juridicamente obrigatórios e vinculantes.
Os direitos sociais, econômicos e culturais, nos termos em
que estão concebidos pelo Pacto, apresentam realização
progressiva (PIOVESAN, 2010, p.178).
O caráter multidimensional do direito fundamental ao
trabalho abarca prestações negativas (respeito à liberdade dos
trabalhadores) e prestações positivas por parte do Estado.
O Pacto em questão previu, dentre outras coisas, o direito
ao trabalho e à justa remuneração capaz de proporcionar, no
mínimo, um salário equitativo e uma remuneração igual por
trabalho de igual valor, a segurança e a higiene do trabalho,
descanso, lazer e limitação razoável das horas de trabalho
e férias periódicas remuneradas, além de remuneração dos
feriados (BRASIL, 1992).
O Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre
Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais (Protocolo de São Salvador) também
dispõe sobre a questão (FONSECA, 2006, p.163):
Artigo 6
Direito ao trabalho
1. Toda pessoa tem direito ao trabalho, o que inclui a
oportunidade de obter os meios para levar uma vida digna
e decorosa por meio do desempenho de uma atividade lícita,
livremente escolhida ou aceita.
2. Os Estados Partes comprometem‑se a adotar medidas
que garantam plena efetividade do direito ao trabalho,
especialmente as referentes à consecução do pleno emprego,
à orientação vocacional e ao desenvolvimento de projetos
de treinamento técnico‑profissional, particularmente os
destinados aos deficientes. Os Estados Partes comprometem‑se
também a executar e a fortalecer programas que coadjuvem
um adequado atendimento da família, a fim de que a mulher
tenha real possibilidade de exercer o direito ao trabalho.
Em 5 de outubro de 1988, foi promulgada a Constituição
da República Federativa do Brasil, tendo a dignidade da
pessoa humana como valor fundamental e fim primeiro da
ordem jurídica constitucional, consagrando-a como um dos
UNOPAR Cient., Ciênc. Juríd. Empres., Londrina, v. 13, n. 1, p. 23-28, Mar. 2012.
ADOLFO, L.G.S. et al.
fundamentos do Estado Democrático de Direito. A dignidade
humana é bem mais que um valor preservado pela Constituição
Federal; é, em verdade, um princípio norteador que protege e
é protegido (PINTO, 2006).
A Carta Magna trouxe avanços significativos em relação
à tutela dos direitos fundamentais, sobretudo garantias e
remédios constitucionais, e dos chamados direitos sociais.
Em um Estado Social de Direito, que tem por objetivo a
melhora das condições de vida dos hipossuficientes, visando
à realização da igualdade social, é obrigatória a observância
das liberdades positivas, ou seja, dos direitos sociais (PAULO;
ALEXANDRINO, 2009).
Dentre os direitos sociais previstos constitucionalmente,
destacam-se, para fins deste estudo, aqueles dispostos nos
artigos 7º a 11º, quais sejam, os direitos trabalhistas.
Cabe destacar que, entre os direitos sociais elencados no
artigo 6o da Constituição Federal, encontra-se o direito ao
trabalho, porém nem o artigo 6º nem o artigo 7º apresentam
norma expressa conferindo tal direito. Ele, contudo, ressai do
conjunto de normas sobre o trabalho presentes na Constituição.
É de se observar que o inciso IV do artigo 1º é expresso
em afirmar que a República Federativa do Brasil tem como
fundamento, entre outros, os valores sociais do trabalho;
o artigo 170 estatui que a ordem econômica se funda na
valorização do trabalho, e o artigo 193 dispõe que a ordem
social tem como base o primado do trabalho. Isso tudo no
sentido de se reconhecer o direito social ao trabalho como
condição de efetividade da existência digna e da dignidade
da pessoa humana, também base da República Federativa do
Brasil (inciso III do artigo 1º) (SILVA, 2005).
No Brasil, nos termos do supracitado inciso III do artigo 1º
da Constituição Federal, para que um direito seja fundamental,
é necessário que concretize o princípio da dignidade da
pessoa humana, alicerce do Estado Democrático de Direito
(ACCIOLY, 2010).
Finalizando este intróito, com base em Fonseca (2006),
pode-se concluir que o direito ao trabalho é considerado como
direito fundamental no ordenamento jurídico, já que, na sua
classificação, é elencado no rol do artigo 6º do Capítulo II, do
Título II, ou seja, no catálogo de direitos da Constituição de 1988.
3 O Direito do Autor Como Direito Fundamental e a
Omissão da Proteção do Autor Empregado na Lei no
9.610, de 1998
O direito autoral como direito fundamental está previsto
na Constituição Federal, no inciso IX do artigo 5º: “é livre
a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, independentemente de censura e licença”; e,
ainda, em seu inciso XXVII, lê-se: “aos autores pertence o direito
exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras,
transmissíveis aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar”.
Comparado com outros direitos, o direito autoral foi,
recentemente, normatizado no ordenamento jurídico nacional e
internacional. Conforme expresso na Declaração Universal dos
Direitos Humanos, é sustentado como um direito humano, da
mesma forma que está disposto dentre os Direitos Fundamentais
da Constituição da República Federativa do Brasil. Embora
as prerrogativas morais e patrimoniais do autor não estejam
expressas na Constituição, elas podem ser reconhecidas por
meio da interpretação das normas e acordos internacionais de
que o Brasil é signatário, a exemplo da Convenção de Berna.
Além das normas e dos acordos internacionais, os princípios
jurídicos, como o da proporcionalidade, são meios de gerenciar
eventuais conflitos entre direitos (AVANCINI, 2009).
A Lei nº 5.988, de 1973, que regulava os direitos autorais
até a vigência da Lei nº 9.610, de 1998, trazia previsão expressa
de proteção ao autor empregado em seu artigo 36, in verbis:
Art. 36. Se a obra intelectual for produzida em cumprimento a
dever funcional ou a contrato de trabalho ou de prestação de
serviços, os direitos do autor, salvo convenção em contrário,
pertencerão a ambas as partes, conforme for estabelecido pelo
Conselho Nacional de Direito do Autor.
A Lei nº 9.610, de 1998, no entanto, foi omissa ao tratar
especificamente do direito do autor empregado, mas, no
artigo 22, previu que pertencem ao autor os direitos morais e
patrimoniais sobre a obra que criou.
Nos casos em que o autor é empregado, cria obras
previstas na legislação e não é ressarcido por sua criatividade,
deve buscar compensação mediante o Poder Judiciário. Nesse
sentido, transcreve-se jurisprudência do Tribunal Superior do
Trabalho:
EMENTA: Invenção softwares autoria - Justa remuneração
- Leis no 9.279/96 e 9.609/98 - Violações não configuradas.
1. Tendo Acórdão Regional registrado que o Reclamante,
embora contratado para exercer a função de escriturário,
exerceu atividade inventiva em prol da Reclamada,
desenvolvendo “softwares”, tem-se por adequada aplicação
do disposto no §2o do art.91 da Lei 9.279/96, também
conhecida como Lei da Propriedade Industrial, a fim de lhe
garantir uma justa remuneração pelo invento.
2. Com efeito, estando a matéria disciplinada por dois
instrumentos legislativos, um específico, a Lei do Software
(Lei 9.609/98), outro geral, a Lei da Propriedade Autoral (Lei
9.279/96), também aplicável, no que for compatível aos casos
de criação de Programas de Computador, não só por serem
reconhecidos mundialmente como uma obra intelectual,
como também e, sobretudo, por força do art. 2o da Lei
9.609/98, segundo o qual “o regime de proteção à propriedade
intelectual de Programa de Computador é o conferido às
obras literárias pela legislação de Direitos Autorais”.
3. Por outro lado, o art. 4o, da Lei 9.609/98, ao preceituar,
em seu “caput”, que, “salvo estipulação em contrário,
pertencerão exclusivamente ao empregador, contratante de
serviços ou órgão público, os direitos relativos ao programa
de computador, desenvolvido e elaborado durante a vigência
de contrato ou de vínculo estatutário, expressamente destinado
à pesquisa e desenvolvimento, ou em que a atividade do
empregado, contratado de serviço ou servidor seja prevista,
ou ainda, que decorra da própria natureza dos encargos
concernentes a esses vínculos”, regula a hipótese em que o
empregado é contratado especificamente para desenvolver
programas de computador em prol da sua empregadora, ou
UNOPAR Cient., Ciênc. Juríd. Empres., Londrina, v. 13, n. 1, p. 23-28, Mar. 2012.
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A Omissão Legislativa na Proteção do Autor Empregado: Critérios Para Superar a Omissão a Partir do Direito do Trabalho Como Direito Fundamental
seja, trata da situação em que a criação de “softwares” faz parte
do conteúdo ocupacional do trabalho executado pelo obreiro, o
que, conforme expressamente registrado pelo Regional, não é o
caso dos autos. (Processo no TST-RR-7200-68.2004.5.13.0022,
firmado por assinatura eletrônica, em 23/02/2011, pelo Sistema
de Informações Judiciárias do Tribunal Superior do Trabalho,
nos termos da Lei nº 11.419/2006.) (BRASIL, 2011).
Da leitura do Projeto de Lei no 5.430, de 1990, depreende-se
que a redação dada pela emenda de plenário no 2, referente ao
projeto de lei, enseja muitos problemas. O projeto afirma que
é um retrocesso em relação à Lei no 5988/73, que estabelece
(art. 36) a propriedade comum dos direitos patrimoniais entre
autor/empregado (BRASIL, 1997).
O texto do Projeto de Lei nº 5.430, de 1990, é esclarecedor
no que concerne à omissão legislativa referente ao direito autoral
nas relações de trabalho. Entendem os parlamentares que, sendo
o direito patrimonial prerrogativa exclusiva do autor conforme
a Constituição Federal, deve a Lei Autoral adotar como
princípio tal privilégio e, somente depois, abrir a possibilidade
de transmissão a terceiros. A redação original do artigo tolerava
a interpretação inadmissível de que, assinando um contrato de
prestação de serviço, estaria o autor renunciando a seus direitos
de autor. Nessa trilha, o contrato seria considerado uma ameaça
à propriedade intelectual quando, em verdade, deveria ser uma
garantia ao autor (BRASIL, 1997).
4 Alguns Critérios Para a Solução da Lacuna de Não
Previsão da Tutela ao Autor Empregado
Princípios são formas de solucionar o problema da
omissão, pois, assim como as regras, são normas jurídicas.
Contudo, os primeiros, que são normas generalíssimas dentro
do sistema, desempenham uma função distinta daquela
exercida pelas regras no mesmo contexto normativo: estas
detêm a nítida função de regular, direta ou indiretamente, as
relações jurídicas que se amoldem às figuras típicas por elas
descritas (LIMA, 2002).
O princípio, enquanto “mandamento nuclear de um
sistema”, exerce a importante função de fundamentar a ordem
jurídica em que se insere, fazendo com que todas as relações
jurídicas que adentram o sistema busquem, na principiologia
constitucional, “o berço das estruturas e instituições jurídicas”.
Quanto aos valores, princípio é como “a pedra de toque ou o
critério com que se aferem os conteúdos constitucionais em
sua dimensão normativa mais elevada” (BANDEIRA DE
MELLO, 2000, p.254).
O Supremo Tribunal Federal vem, aos poucos, captando
essa dimensão funcional dos princípios, conforme se observa
no voto do Ministro Celso de Mello, proferido na PET-1458/
CE (BRASIL, 1998):
O respeito incondicional aos princípios constitucionais
evidencia-se como dever inderrogável do Poder Público.
A ofensa do Estado a esses valores – que desempenham,
enquanto categorias fundamentais que são, um papel
subordinante na própria configuração dos direitos individuais
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ou coletivos – introduz um perigoso fator de desequilíbrio
sistêmico e rompe, por completo, a harmonia que deve
presidir as relações, sempre tão estruturalmente desiguais,
entre os indivíduos e o Poder.
Ferreira Filho (1991, p.73-74) resume em três as
classificações utilizadas pelos juristas:
Os juristas empregam o termo ‘princípio’ em três sentidos
de alcance diferente. Num primeiro, seriam ‘supernormas’,
ou seja, normas (gerais ou generalíssimas) que exprimem
valores e que, por isso, são ponto de referência, modelo para
regras que as desdobram. No segundo, seriam standards, que
se imporiam para o estabelecimento de normas específicas
– ou seja, as disposições que preordenem o conteúdo da
regra legal. No último seriam generalizações obtidas por
indução a partir das normas vigentes sobre determinada ou
determinadas matérias.
Nos dois primeiros sentidos, pois, o termo tem uma conotação
prescritiva, e no derradeiro a conotação é descritiva: trata-se
de uma ‘abstração’ por indução.
Neste ponto, é imprescindível o questionamento sobre a
quem caberia a titularidade dos direitos autorais sobre as obras
criadas em função de relações de trabalho: ao empregador,
que arcou com as despesas, usufruindo assim do direito de
exploração, ou seus direitos estariam restringidos apenas à
utilização da criação resultado do serviço prestado, ficando o
empregado com os direitos de criação?
Primeiramente, cabe esclarecer a quem pertence a
titularidade originária nos direitos autorais. Conforme o artigo
11 da Lei no 9.610, de 1998, “autor é a pessoa física criadora
de obra literária, artística ou científica”, com exceção nas obras
coletivas, em que se admite a titularidade oriunda de pessoa
jurídica. Além da titularidade originária, há aquela derivada, que
é o emprego de alguns direitos, originariamente, pertencentes
ao criador, que são transmitidos a pessoas físicas ou jurídicas
por intermédio de negócios inter vivos ou mortis causa
(PINHEIRO, 2008). Cabe lembrar que não existe necessidade
de registro para que se atribua titularidade de direitos.
A obra intelectual é um modo de exteriorizar uma criação do
espírito (ASCENSÃO, 2007). Por isso, os progressos científicos
ou tecnológicos não interferem na delimitação do objeto do
Direito Autoral, já que, independentemente desses avanços, a
obra intelectual sempre será exclusivamente humana.
Costuma-se ouvir que algumas pessoas adquiriram os
direitos autorais sobre determinadas obras. Um engano. O direito
do autor não se compra. O que ocorre é uma cessão de um ou
de vários direitos patrimoniais do autor, nunca o direito que o
autor tem sobre a obra (PINHEIRO, 2008). Perfectibilizado
o contrato de cessão dos direitos patrimoniais, o criador não
deixa de ser o autor da obra; ninguém adquire direitos de autor
por contrato. Afinal, são direitos morais do autor, sendo assim
inalienáveis, irrenunciáveis e imprescritíveis, perdurando durante
toda a sua vida e, até mesmo, alguns deles, após sua morte.
A Lei no 9.610, de 1998 (Lei de Direitos Autorais – LDA),
é omissa quanto ao direito autoral na relação de trabalho, ao
contrário da legislação anterior (Lei no 5.988, de 1973), que
UNOPAR Cient., Ciênc. Juríd. Empres., Londrina, v. 13, n. 1, p. 23-28, Mar. 2012.
ADOLFO, L.G.S. et al.
prescrevia a cotitularidade entre contratante e contratado,
salvo acordo em contrário. Resta, assim, a aplicação da regra
geral que é a atribuição da titularidade originária, vedando a
apropriação do contratante da obra criada por seu empregado.
Cabe destacar o que seria uma relação de trabalho: ela
nada mais é do que uma relação jurídica entre o empregador
e o empregado. Este pode prestar serviços de ordem física ou
intelectual, com ou sem remuneração, isto é, a prestação do
trabalho humano pode ser estabelecida por um contrato ou
não, envolvendo pagamento pelo serviço ou não.
Diante deste quadro, a possível solução para suprir tal
lacuna na lei é considerar a ponderação de princípios e a
analogia com a Lei da Propriedade Industrial a partir do artigo
91, que reconhece a copropriedade, a invenção realizada na
constância do contrato de trabalho, que pertencerá também ao
empregador.
Veja-se, primeiramente, o que seria uma lacuna na lei: é
um “espaço em branco”, algo que ficou vazio no ordenamento
legislativo. Sendo assim, é a inexistência de uma norma jurídica
aplicada in concreto. A lacuna ocorre quando uma lei é omissa
ou falha em relação à determinação do caso. No caso do direito
autoral na relação de trabalho, a lei é incompleta, a lacuna do
Direito é uma deficiência do sistema jurídico (ENGISH, 1983).
A própria lei dispõe sobre os meios que se pode utilizar
para o preenchimento da lacuna existente, como se verifica na
Lei de Introdução ao Código Civil, em seu artigo 4o. Afinal,
não pode ficar sem solução o caso concreto posto à apreciação
do Judiciário.
A analogia é a existência da ideia de semelhança ou
similitude. Consiste em aplicar a um caso não previsto de
modo direto ou específico por uma norma jurídica uma norma
prevista para uma hipótese distinta, mas semelhante ao caso
não contemplado, fundado na identidade do motivo da norma
e não na identidade do fato (DINIZ, 1991).
O fundamento da aplicação da analogia é o princípio da
igualdade, de forma que a lei deve tratar igualmente os iguais
na exata medida de sua desigualdade.
Alguns doutrinadores estabelecem uma divisão à analogia,
classificando-a em analogia legis e analogia iuris. A analogia
legis é a aplicação de lei a caso similar por ela previsto, ou
seja, parte de um preceito legal e concreto e faz sua aplicação
aos casos semelhantes (PRADO, 1997). A analogia iuris
é uma espécie de união de dois métodos lógicos: a indução
e a dedução. A partir dos casos particulares, obtém-se uma
generalização da qual resultam princípios, os quais se aplicam,
então, dedutivamente, a outros casos. É um raciocínio quase
lógico (FERRAZ JÚNIOR, 1994).
Partindo-se para outra solução, a dos princípios jurídicos,
logo se percebe que o termo princípio não é de fácil definição,
uma vez que pode ser utilizado em vários contextos e com
diversos significados. Muitas ciências valem-se da palavra
princípio em suas definições, mas cada qual sob sua óptica.
Princípio pode ser considerado uma norma abstrata que
expressa um valor fundamental de qualquer sociedade, servindo,
assim, de base para o ordenamento jurídico, limitando as regras
que se relacionam com ele e integrando as lacunas normativas
existentes. É utilizado para a atividade interpretativa e, por
possuir eficácia, pode ser concretizado e gerar direitos subjetivos.
Pode-se dizer que os princípios possuem, entre outras, as
funções normativa, integrativa e interpretativa.
Reza o artigo 4o da Lei de Introdução ao Código Civil:
“Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo
com a analogia, os costumes e os princípios gerais do
Direito”. Neste caso, quando há lacuna, ela pode ser suprida
pela utilização dos princípios. Dessa forma, o aplicador do
Direito deverá perquirir os princípios e valores que norteiam
a formação do ato legislativo. Cabe esclarecer que norma é o
gênero do qual os princípios e as regras são espécies.
Enfim, a via de resolução de eventual conflito entre o
autor/empregado e o empregador aqui apresentada pode estar,
inicialmente, na utilização da analogia e dos princípios gerais
de Direito. Portanto, ainda que inexista uma norma jurídica
aplicável ao caso concreto, o juiz deverá se apropriar de outros
meios para solucionar tal conflito, beneficiando-se, assim, dos
métodos de integração da norma jurídica, tais como a analogia
e os princípios gerais do conflito, como é o caso.
A solução aqui proposta não envolve, em princípio, os
contratos de trabalho ou de prestação de serviço de artistas e
técnicos em espetáculos de diversão. Legislação (Lei no 6.533,
de 1978) e disciplina própria tornaram vedada a transferência
do direito conexo desses titulares quando sujeitados a contrato
de trabalho ou prestação de serviços. Não se pode negar a
incongruência legislativa de admitir a cessão de direito do autor
e, ao mesmo tempo, proibir a cessão de direito conexo, mas há
que se entender que a regra é especial (PINHEIRO, 2008).
Com relação ao software, pertence, originalmente
e exclusivamente, salvo convenção em contrário, ao
empregador, ao contratante de serviços ou a ente público
(artigo 4o da Lei no 9.609, de 1998).
Por fim, é importante enfatizar que o Anteprojeto de
modernização da Lei de Direitos Autorais que está em
tramitação insere um capítulo, intitulado “Da Obra Decorrente
de Vínculo Estatutário ou Contrato de Trabalho”, que virá
suprir a lacuna existente na lei em vigor. Da exposição de
motivos da revisão da legislação, destaca-se:
A lacuna correspondente ao tema ‘obra decorrente de vínculo
empregatício é uma das maiores fontes de incerteza na lei em
vigor. Assim, os direitos patrimoniais das obras produzidas
diretamente relacionadas ao vínculo de trabalho pertencerão ao seu
autor, garantido, porém ao empregador uma autorização exclusiva
de uso das obras criadas no estrito cumprimento das atribuições
e finalidades decorrentes de vínculo estatutário ou contrato de
trabalho. Excepciona-se, entretanto, as proteções já previstas
em leis especiais, como ocorre com os autores e artistas cujo
exercício profissional é regulado pelas Leis 6533/78 e 6615/78,
assim como os arquitetos e engenheiros, pela Lei 5194/66. Da
mesma maneira, são previstas ressalvas para os casos de obras
produzidas para instituições de ensino e pesquisa (BRASIL, 2011).
UNOPAR Cient., Ciênc. Juríd. Empres., Londrina, v. 13, n. 1, p. 23-28, Mar. 2012.
27
A Omissão Legislativa na Proteção do Autor Empregado: Critérios Para Superar a Omissão a Partir do Direito do Trabalho Como Direito Fundamental
5 Conclusão
Tanto o direito ao trabalho quanto o direito do autor são
direitos fundamentais elencados na Carta Magna, e ambos
devem ser protegidos de acordo com essa prerrogativa. Não
há como estipular hierarquia entre direitos fundamentais. No
caso concreto, havendo colisão entre princípios, há que se
fazer uma ponderação entre eles.
A Lei no 9.610, de 1998, não confere ao empregado a mesma
proteção que lhe concederam as Leis de Propriedade Industrial e
a Lei do Software. Não havendo proteção específica ao autor nas
relações entre empregado/empregador, e ela não sendo objeto
do contrato de trabalho, há que ser levada em consideração uma
possível solução para esta lacuna. O operador do Direito poderá
valer-se de dois métodos de integração da norma jurídica para
o caso concreto: a analogia com a Lei de Propriedade Industrial
a partir de seu artigo que confere o direito de copropriedade e
a utilização dos princípios, um campo mais amplo que busca
suprir a insuficiência do Direito Positivo. Antes mesmo da
utilização da analogia, que é um ferramental eficaz, porém
conservador, de preenchimento das lacunas, é necessário ter
firme e claro como visão hermenêutica e concretizadora qual
principiologia emana da Constituição Federal no que concerne
à proteção efetiva e social dos trabalhadores. Nesse aspecto,
também, como em todos os instantes de interpretação, já há a
“resposta certa” por meio de um processo de pré-compreensão.
Ela somente pode estar na tutela estatal concreta e pontual dos
autores empregados, que não podem ficar totalmente à mercê
do maior poder de seus contratantes, mas merecem tutela
adequada por força de prestações positivas do Estado.
Estes dois primeiros instantes, então, são hermenêuticos.
No segundo momento, apesar da utilização cabível e esperada
do ferramental interpretativo próprio, enfatizam-se as necessárias
e imprescindíveis reformas legislativas que o tema reclama.
Importante passo será dado, nesta seara, com a aprovação do
anteprojeto que prevê significativas alterações para a atualização
da Lei de Direitos Autorais no que concerne ao tema “obras
decorrentes de vínculo empregatício”. A previsão expressa na
lei de artigos que regulem tal situação é imprescindível para a
proteção do autor nas relações de trabalho, garantindo-lhe direitos
morais e patrimoniais sobre sua obra, ficando resguardada ao
empregador “uma autorização exclusiva de uso das obras criadas
no estrito cumprimento das atribuições e finalidades decorrentes
de vínculo estatutário ou contrato de trabalho”.
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