Regulação e reforma da indústria de eletricidade Prof. José Bonifácio S. Amaral Filho Instituto de Economia - UNICAMP Taller: Desarrollo y Características del Sector Eléctrico Brasileño Cidade do Panama, 19 e 20 de Agosto de 2010 Sumário • Regulação e sua evolução (4 -12) • Reforma (13 – 20) • Regulação por incentivos (21 – 34) • Regulação no Brasil até os anos 90 (35 – 42) • Reformas do setor elétrico brasileiro (43 – 53) GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 2 Necessidade da regulação Importância dos Serviços de Utilidade Pública (‘public utilities’) : serviços essenciais, de interesse coletivo (‘affected with public interest’ – U.S. Supreme Court) Características econômicas das ‘public utilities’ : - maior eficiência econômica sob “monopólio natural” - economias de escala e de escopo - menores custos ao se evitar a duplicação das redes (investimentos e custos fixos elevado) para atender um mercado GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 3 Necessidade da regulação • 1848, John Stuart Mill (“Principles of Political Economy”) água e gás em Londres: menor custo, sem a duplicação das instalações do serviço (‘facilities’) • Competição instável, monopólio “inevitável” • Virada século XIX / XX: várias cidades com mais de um supridor de eletricidade nos EUA e Europa • Chicago: 24 companhias entre 1887 e 1893 (Stoft, S.) - ‘Guerra de preços’ entre os supridores - Qualidade irregular do serviço - Duplicação de instalações, ‘desperdício’ GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 4 Necessidade da regulação •Resultado: falências, ou acordos (combinação) entre os supridores com efeitos similares ao monopólio •Combinação entre empresas Monopólio • Efeitos do Monopólio: redução de custos, mas... controle monopolista do preço ! GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 5 Necessidade da regulação 1877 - Suprema Corte EUA (case “Munn vs. Illinois”) afirmou o direito do Estado de impor regras (‘regulação’) sobre as atividades que suprem um serviço de interesse público (‘affected with public interest’) 1890 - Sherman Act (EUA) – lei combate monopólio e acordos contra a concorrência; em 1914 aperfeiçoada (Clayton Act) 1898 - EUA - Samuel Insull, presidente da NELA (‘National Electric Light Association’) propôs a prestação de serviço monopolista com tarifas fixadas pelo Estado : ‘...exclusive franchises should be coupled with the conditions of public control, requiring all charges for services fixed by public bodies to be based on cost plus a reasonable profit ‘ GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 6 Necessidade da regulação Eficiência do “monopólio natural” nos serviços públicos: ? Como colher os resultados do menor custo econômico sob “monopólio natural” sem incorrer forçosamente em “preços de monopólio” ? Alternativas : (1) Propriedade pública das ‘utilities’ , ou (2) Propriedade privada, porém regulação pública GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 7 Evolução da regulação EUA, 1907 - New York e Wisconsin criam as primeiras Public Utilities Comissions (jurisdição estadual) 1920 – Federal Power Comission (a partir de 1977, FERC – Federal Energy Regulatory Comission) Regulação “custo do serviço” se dissemina: cobertura dos custos e controle da taxa de retorno (lucro), com revisões tarifarias quando solicitadas (‘rate cases’). EUA : preponderância da propriedade privada, com reforço da ação regulatória, especialmente após 1930 – inclusive em setores potencialmente competitivos GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 8 Evolução da regulação Regulação pelo ‘Custo do Serviço‘ (ou ‘taxa de retorno’): Custo do Serviço = Custos Operacionais + Depreciação (recuperação do capital) + Remuneração do Capital • Custos de operação e manutenção - pessoal, energia para revenda, materiais e serviços de terceiros • Depreciação- taxa de depreciação (% para cada bem) • Remuneração - resulta da aplicação de uma taxa de lucro, arbitrada pelo regulador, ao capital investido (descontada a parcela do capital já recuperada) Custo do Serviço determina a Receita a ser obtida GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 9 Evolução da regulação Tarefas do Regulador ao calcular o Custo do Serviço - Analisar e aprovar o montante de capital investido (com investimentos prudentes); é a base sobre a qual se vai calcular a depreciação e a remuneração do capital; - Estabelecer a taxa de depreciação anual, para diferentes tipos de bens (rede elétrica, veículos, edificações, etc.) - Estabelecer a taxa de remuneração aplicável ao capital - Estabelecer custos operacionais ‘eficientes’ - Alocar o Custo do Serviço entre as diferentes classes de consumidores, estimar mercado e fixar tarifas GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 10 Evolução da regulação Pós 2ª Guerra Mundial : •Europa : Inglaterra, França e Itália há um intenso crescimento das ‘nacionalizações’ (estatizações), em setores tidos como de interesse estratégico e essenciais (inclusive eletricidade) •América Latina: políticas de industrialização para o desenvolvimento; propriedade estatal adquire importância estratégica para o desenvolvimento GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 11 Reformas 1962 - Averch & Johnson (‘Behaviour of the firm under regulatory constraint’, American Economic Review) postularam que regulação ‘rate of return’ ou ‘cost plus’ pode induzir ao sobre-investimento Estudos posteriores argumentaram que a regulação tradicional (Taxa de Retorno ou Custo do Serviço) pode levar à acomodação e não assegurar eficiência Busca de mecanismos para induzir as empresas à eficiência e superar ‘assimetria de informação’ entre o regulador e empresa regulada GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 12 Reformas Mudanças nos anos 70 Final do ciclo longo pós 2ª Guerra (“30 anos gloriosos”) Choques de preço do petróleo (impactos de custo) Estagnação do crescimento, aceleração inflacionária Crise fiscal do Estado, maior endividamento público Re-estruturação industrial, ‘re-deployment’ GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 13 Reformas EUA, Administração Carter (1977-1981): Democratas assumem a desregulamentação de segmentos potencialmente competitivos, sob regulação desde a era Roosevelt (anos 1930) : airlines, trucking, railroads Estímulo produtor independente de energia (PURPA, 1978) E. Kennedy (1980)- desregulamentação e competição para reduzir custos e preços, beneficiar os consumidores e dar competitividade aos EUA; caso das companhias aéreas 1981 - inflação, elevação dos juros (P. Volcker) e recessão GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 14 Reformas 1979 – UK - M. Thatcher (Conservador) primeira-ministra 1981 - EUA - Ronald Reagan (Republicano) vence o candidato à re-eleição Jimmy Carter (Democrata) “Era Thatcher” (UK) 1979/90 desregulação, privatizações “Era Reagan” ( EUA) 1981/89 desregulação, liberalização Re-estruturação de diversas indústrias para a competição Anos 80 – agenda “neoliberal” dos EUA e UK é disseminada pelo mundo inteiro (FMI, Banco Mundial, BID) GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 15 Reformas América Latina 1982: ‘défault’ do México crise da dívida externa 1985 - Plano Baker; 1986: ‘Institute of International Economics’ proposta de reformas para retomar o crescimento América Latina 1989: “Washington Consensus” políticas ‘adequadas’ A.L. 1989 - Plano Brady- reestruturação das dívidas externas e adoção de planos de ajuste estrutural, sob a supervisão das IFI’s (FMI e Banco Mundial) 1991: Cocoyoc (México): proposta Banco Mundial-OLADE-BID para a reforma do setor elétrico: reestruturação, des-regulação e privatização do setor elétrico na América Latina GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 16 Reformas Chile – reformas pioneiras; setor elétrico D.F.L no. 1/1982 Bolívia – estabilização e liberalização, 1985 (S. de Lozada) Argentina – estabilização e reformas liberais, 1989 (Menem) Brasil - desajuste do balanço de pagamentos, hiperinflação e várias tentativas fracassadas de estabilizar a economia nos anos 80/90 : Plano Cruzado (1986); Plano Bresser (1987); Plano Verão (1989 ); Planos Collor I e Collor II (1990/91): tentativas de estabilização e início das reformas liberais 1994 – Plano Real: estabilização e liberalização econômica; 1995 - início da reforma do setor elétrico GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 17 Reformas Reforma do setor elétrico : pilares do novo modelo • Segmentação G/T/D/C (“unbundling”) ; • Geração e Comercialização: livre entrada • Transmissão e distribuição: reguladas • Livre acesso (open access) de terceiros às redes (TPA), com pagamento de encargos regulados ou negociados • Produtor independente de energia – liberdade para gerar e vender “por sua conta e risco”; • Consumidor livre – inicialmente grandes consumidores, para evitar o poder de mercado (monopsônio) das distribuidoras contra os geradores; GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 18 Reformas • Livre escolha do fornecedor pelos consumidores • Operador Independente do Sistema Elétrico - despacho de usinas por ordem do mérito econômico, prevenção do poder de mercado e de restrições no uso das redes elétricas; • Mercado atacadista de energia – ambiente de negociação livre de energia (preço ‘spot’), ofertas de preço da energia • Regulador – instituição ‘de Estado’, com independência dos governos; autonomia financeira e estabilidade de seus dirigentes, período de mandato fixo; • Regulação econômica – novas sistemáticas de regulação, para estímulo à eficiência; GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 19 A regulação por incentivos Era Thatcher” : des-regulação e privatização 1983 - Privatização da British Telecom – adota a regulação ‘price cap’ (preço máximo) em vez de regulação pela ’taxa de retorno’ Objetivos da nova regulação: - reduzir o custo das revisões tradicionais (‘cost plus’) - alongar o período de tempo entre as revisões - evitar a assimetria de informações - exigir desempenho superior em eficiência, com qualidade - correção das tarifas fica limitada por índices de preços gerais ; uso de redutores para captar ganhos, na correção das tarifas (RPI – X) - revisões periódicas para ajuste das tarifas (‘re-set’) e capturar ganhos de eficiência para o consumidor GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 20 A regulação por incentivos Regulação econômica “por incentivos” ou “por desempenho” estabelece ‘tetos máximos’ de preços/tarifas (‘price cap’) Ganhos extras para a empresa regulada, se a gestão empresarial entre as revisões for mais eficiente que as metas fixadas Nova regulação foi estendida a outros setores, como as ‘utilities’ de eletricidade privatizadas no início dos anos 90 Mudanças na indústria de eletricidade : - geração e comercialização abertas e competitivas - transmissão e distribuição continuam sob regulação; - consumidor pode escolher o supridor de energia - livre acesso e uso das redes por terceiros (‘open acess’) sob tarifas reguladas GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 21 A regulação por incentivos Competição para substituir a regulação, onde possível Regulação substitui a competição somente quando a competição não é eficaz ou o monopólio é inevitável Objetivo anunciado: Proteger o público dos preços monopolistas, Aperfeiçoar desempenho dos setores regulados Trazer benefícios para consumidores com qualidade adequada GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 22 A regulação por incentivos Train, K. – “O propósito da regulação é assegurar resultados socialmente desejáveis quando não se pode confiar na competição para atingi-los. A regulação substitui a mão invisível da competição pela intervenção direta – pela mão visível, por assim dizer” “The purpose of regulation is to ensure socially desirable outcomes when competition cannot be relied upon to achieve them. Regulation replaces the invisible hand of competition with direct intervention – the visible hand, so to speak” GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 23 A regulação por incentivos Regulação ‘por incentivo’ busca forçar os monopólios regulados a se comportar como ‘empresas inovadoras’ que buscam maior eficiência para obter lucros maiores A regulação por incentivos “performance based regulation” buscou eliminar o problema de controle do regulador sobre as ações e resultados do regulado, ao fixar um limite máximo de preço e um redutor “x” que obriga a empresa regulada a buscar eficiência, e ao criar estímulos e recompensas (retorno temporário maior) para a empresa buscar obter melhor desempenho GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 24 A regulação por incentivos Stephen C. Littlechild : “... a principal metodologia que desenvolvemos para regular as utilities inglesas é um melhoramento sobre a metodologia tradicional de regulação das utilities nos EUA. (...) Como bem se sabe agora, focalizamos nos preços em vez do lucro. O limite de preços IPC - X permite que os preços aumentem (ou requer que os preços se reduzam) a X por cento abaixo do Índice de Preços ao Consumidor (..) por um determinado número de anos. Isso traz segurança aos investidores, administradores e consumidores. Também dá maiores incentivos à eficiência para as companhias no curto prazo. Os consumidores se beneficiam com a perspectiva de se repassar a eles o aumento de eficiência resultante, ao longo do tempo, quando o limite de preços é revisto. Onde necessário, os padrões mínimos prescritos podem assegurar que as reduções de custo e preços não se farão às custas da qualidade” GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 25 A regulação por incentivos Stephen Littlechild: “... the principal method we have developed to regulate UK utilities has been an improvement over the traditional method of regulating US utilities (...) As is now well known, we have focused on prices rather than profit. The RPI – X price cap allows prices to increase (or requires prices to reduce) at X per cent below the Retail Price Index (..) for a specified number of years. This gives assurance to investors, managers and customers. It also gives greater efficiency incentives to companies in the short term. Customers benefit from the prospect of the resulting increased efficiency being passed to them over time, when the price cap reset. Where necessary, prescribed minimum standards can ensure that cost and price reductions are not in the expense of quality” GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 26 A regulação por incentivos NARUC – National Association of Regulatory Utility Comissioners (USA), 2000 “O termo ‘regulação baseada no desempenho‘ (performance based regulation) é o mais recente em uma longa lista do vocabulário utilizado para descrever abordagens regulatórias que se apoiam em incentivos ou desestímulos para induzir o comportamento desejado de uma firma regulada. Os comportamentos desejados, ou resultados, são geralmente 1) redução de custos 2) melhoria do serviço e 3) alocação mais racional dos riscos e recompensas. GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 27 A regulação por incentivos NARUC – National Association of Regulatory Utility Comissioners (USA) 2000 O interesse renovado na Regulação Baseada no Desempenho reflete em grande medida a insatisfação com a regulação pelo custo do serviço ou taxa de retorno, especialmente devido à percepção de que o “custo do serviço” enfraquece a inovação nas empresas e leva os administradores a responder mais aos reguladores que aos consumidores. RBD também pode ser buscada por empresas que querem maiores lucros, mais flexibilidade ou menos risco” GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 28 A regulação por incentivos Kenneth E. Train, sobre a regulação econômica “price cap” : “ O regulador estabelece a tarifa máxima (price cap) ... e, observado o limite máximo de tarifa, todo o ganho obtido pertence à firma regulada. O regulador pode especificar a correção periódica do ‘price-cap’ com um índice exógeno à firma, p. exemplo, um índice de preços Em intervalos mais longos, o teto de tarifa (‘price-cap’) é revisto pelo regulador e pode ser alterado; essa revisão deve considerar o custo, demanda e rentabilidade da firma regulada Se a tarifa é fixa, ou muda de maneira exógena à firma regulada, a firma produzirá com o ‘mix’ de insumos de menor custo, investirá em inovações redutoras de custo, e se ajustará da melhor maneira (‘ótimo’) às mudanças de custo, pois poderá reter como lucro toda redução de custo que obter; portanto, escolherá ser eficiente ... GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 29 A regulação por incentivos Kenneth E. Train (cont.) “Ao longo do tempo, o regulador faz a revisão da tarifa (‘price cap’) e a ajusta para cima ou para baixo, baseado nos lucros obtidos pela firma regulada com o limite existente” “A revisão periódica é o coração da questão referente ao ‘price cap’. Através dela, o consumidor também se beneficia: o regulador pode reduzir a tarifa máxima (‘price cap’), para exigir que pelo menos uma parte da redução de custos seja transferida para os consumidores" GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 30 A regulação por incentivos Kenneth E. Train (cont.) “Entretanto, pode ocorrer um comportamento ‘estratégico’ da firma; dependendo do que ela espera que o regulador faça na revisão, ela pode ser induzida a incorrer em custos maiores, para convencer o regulador a permitir um limite (‘cap’) maior “ OBS. Para evitar esse ‘comportamento estratégico’, alguns países utilizam uma ‘Empresa de Referência’, cujos custos são estabelecidos a partir de parâmetros do regulador, para fixar os custos reconhecidos para a empresa regulada. Nesses casos, o uso de ‘benchmarks’ adequados é claramente necessário, sob pena de penalizar, ou beneficiar, indevidamente, a firma regulada. (José Bonifácio) GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 31 A regulação por incentivos Regulação price-cap `(’teto de preços’) Reajuste periódico (ex. : anual) não considera os custos reais da empresa regulada; utiliza para reajuste uma fórmula RPI – X RPI = variação % de um índice de preços escolhido, X = ganho % de eficiência ou produtividade, fixado pelo regulador, que reduzirá o índice de reajuste A fórmula pode prever um percentual adicional de reajuste (fator Y) com repasse (‘pass through’) de aumentos dos custos não-controláveis (ex. energia elétrica comprada de terceiros, ou combustível para geração) ou ainda para se remunerar investimentos adicionais não-previstos de início GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 32 A regulação por incentivos Revisão Tarifária - em períodos mais longos, são examinados os custos reais e a taxa de retorno obtida pela empresa regulada, e o regulador pode estabelecer novos níveis tarifários (‘re-set’) Problemas : fixar adequadas “tarifas de partida” ; assegurar a qualidade (impedir degradação para reduzir custos) e o estímulo à eficiência do consumidor no uso de energia; assegurar investimento (entre revisões não há retorno garantido); “calibrar” as metas de eficiência (“x”), prazo entre revisões e evolução do ambiente econômico Na Revisão Tarifária pode ocorrer a assimetria de informação e ‘gaming’ - tal como na regulação tradicional GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 33 Regulação no Brasil Década 1880: primeiros empreendimentos, de caráter local; iluminação (Diamantina, Campos, Rio Claro) Séc. XIX-XX, capitais britânicos criam, no Canadá, o grupo “Brazilian Traction, Light and Power” para atuar no eixo São Paulo-Rio de Janeiro Década de 1920 o grupo norte-americano AMFORP inicia atividades no Brasil - interior de São Paulo e diversas outras regiões do Brasil (RS, RJ, PE, etc.) Concessões municipais, múltiplos contratos, garantias GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 34 Regulação no Brasil 1907 - fracassa a primeira tentativa de regulação federal 1934 - “Código de Águas” é aprovado (gov. Getúlio Vargas); estabelece a competência federal nas concessões de eletricidade; a regulação federal do serviço ; exploração temporária por capitais privados (tarifa inclui “Reserva de Reversão” um adicional para constituir um fundo para a futura Reversão da propriedade privada ao Estado); capital é registrado ao ‘custo histórico’ (sem correção) Código de Águas: regulação pelo “Custo do Serviço” GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 35 Regulação no Brasil 1938 : fim da “cláusula-ouro” nas tarifas de eletricidade das concessões pré-existentes Décadas de 40 e 50 - criação de empresas estatais federais (CHESF, 1945 e Furnas, 1957) e estaduais (CEMIG, CEEE) para construir usinas e ampliar a oferta de eletricidade 1952: criação BNDE e do Fundo Federal de Eletrificação (financiamento do setor elétrico – IUEE, EC, Tesouro) 1954: projeto de criação da Eletrobrás, para construir usinas e L. Transmissão de alta tensão (“divisão de funções”) 1957- regulamentado o Código de Águas (Dec. nº 41.019); custos operacionais mais remuneração de 10% a.a. GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 36 Regulação no Brasil 1962 - criada Eletrobrás – futura ‘holding’ das empresas federais, coordenadora técnica setorial (GCPS, GCOI), e gestora de recursos (“banco setorial”) DNAEE (sucessor da CNAEE), órgão regulador setorial 1964 - Eletrobrás compra controle das empresas da AMFORP, que deixa o País 1964 – governo militar e política de“realismo tarifário”: fortes reajustes corrigem os desequilíbrios existentes e aumentam geração própria e capacidade de financiamento GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 37 Regulação no Brasil •1972: Reserva de Reversão vira RGR - Reserva Global de Reversão e é centralizada na Eletrobrás; taxa de remuneração setorial alterada para 10 a 12% ao ano (garantida taxa mínima de retorno de 10%) •1974: tarifas de eletricidade são eqüalizadas em nível nacional, para reduzir as desigualdades regionais; criação da RGG - Reserva Global de Garantia, para transferência de recursos entre concessionárias •1973-74 : fim do ‘milagre’ , 1º choque do petróleo GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 38 Regulação no Brasil A partir de 1974, contenção tarifária para combate à inflação II PND : grandes obras iniciadas (Itaipu, Tucuruí, etc.) Empréstimos externos e geração de divisas para balanço 1979 - segundo choque do petróleo; maxidesvalorização cambial (30%), para conter o déficit do balanço de pagamentos, afeta endividamento externo do setor elétrico 1979 - Eletrobrás adquire controle da Light (cuja cisão dá origem em 1981 à estatal estadual Eletropaulo-SP); assim, no início dos anos 1980, o setor elétrico brasileiro se torna, praticamente, estatal . GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 39 Regulação no Brasil Contenção de tarifas frustra “remuneração garantida”(10% a.a.) e a insuficiência de remuneração provoca crescimento do saldo da Conta de Resultados a Compensar (CRC) 1981- Dec.Lei nº 1849 (RGG) transferência de recursos entre as concessionárias com base na taxa média de remuneração setorial, sem respeitar a taxa de retorno mínima de 10% Recessão 1981-83 e maxidesvalorização cambial (30%) criam mais dificuldades financeiras para o setor elétrico 1981-85: baixa geração de recursos próprios, drenagem de recursos ‘via’ RGG; concentração de aplicações da RGR; empresas estaduais deixam de recolher encargos setoriais GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 40 Regulação no Brasil 1985 - PRS (Plano de Recuperação Setorial) prevê aumentos tarifários para ampliar geração de recursos próprios 1986 - explosão inflacionária e Programa de Estabilização (“Plano Cruzado”): interrompe recuperação tarifária e a implementação do PRS 1987 - recuperação tarifária é retomada a partir de maio, mas afetada pela elevação dos custos, aumento da inflação e turbulência econômica 1988 - Projeto REVISE – Revisão Institucional do Setor de Energia Elétrica discute propostas para re-equilíbrio do setor, inclusive por meio da atração de capitais privados GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 41 Reforma SEB Reformas econômicas e programas de ajustamento na América Latina : ‘Washington Consensus’ 1990 –Programa Nacional de Desestatização inclui grupo Eletrobrás (governo Collor, Lei nº 8031) Dificuldades financeiras setoriais se agravam devido à insuficiência tarifária (‘congelamento’) e elevado grau de endividamento das estatais Inadimplência cresce e se generaliza até 1993 : intra-setorial (encargos setoriais, suprimento) extra-setorial (dívida externa com aval da União) GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 42 Reforma SEB 1993 - saldo da CRC atinge cerca de US$ 25 bilhões Lei nº 8631/93 inicia mudanças no setor elétrico : - Compensação de débitos intra e extra-setorial e Tesouro Nacional - Fim da “taxa de remuneração garantida” e da CRC - Conta de Resultados a Compensar - Fim da equalização tarifária nacional - Reajustes tarifários por meio de “fórmulas paramétricas” (tarifa pelo preço, e não mais pelo ‘custo do serviço’) - Lei prevê nova regulação econômica de tarifas: ”revisão dos níveis tarifários obedecerá legislação específica” GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 43 Reforma SEB Após 1993, várias leis dão andamento à reforma setorial : A Lei 8987/95 (“Lei Geral de Concessões”) dispõe sobre as normas para concessão de serviços públicos; a concessão se rege “..pelas normas legais pertinentes e pelas cláusulas dos indispensáveis contratos” ; conceitua ’serviço adequado’ e descreve os ‘direitos e obrigações dos usuários’; prescreve licitação prévia à concessão e o seu critério de julgamento; trata das cláusulas essenciais dos contratos de concessão, dentre as quais as relativas ao “preço do serviço, e aos critérios e procedimentos para reajuste e revisão ” GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 44 Reforma SEB A Lei 9074 / 95 (específica sobre o setor elétrico) dispõe sobre a obrigatoriedade da concessão; cria possibilidade de prorrogar concessões já existentes de geração e distribuição; define o ‘produtor independente de energia elétrica’ e os ‘consumidores livres’ ; define instalações de transmissão e da “Rede Básica”; obriga indicação em lei dos recursos para subsídios tarifários; prevê a ‘reestruturação dos serviços públicos concedidos’ com privatização e outorga simultânea da concessão, ou com renovação de concessão existente, extensiva a empresas sob controle dos Estados, Distrito Federal ou municípios; estabelece obrigação de publicar, no edital de venda, as cláusulas essenciais do contrato e o prazo de concessão’ GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 45 Reforma SEB - Lei 9427/ 96 cria a ANEEL, órgão regulador independente, para “regular e fiscalizar produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica”; - Exposição de Motivos: estimular o concessionário eficiente por meio da “regulação por incentivos” ; - Trata do “regime econômico e financeiro da concessão do serviço público de energia elétrica”, - “Prevê “tarifas baseadas no serviço pelo preço”, definidas como “tarifas máximas fixadas por contratos e novos valores decorrentes de reajuste e revisão, nas condições do Contrato ” (regime price-cap) GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 46 Reforma SEB 1995 - início da privatização das empresas estatais, com a distribuidora federal Escelsa, a estadual CERJ (Ampla), e a federal Light (1996); Privatizações se intensificam a partir de 1997 até 2000 Prioridade na privatização das distribuidoras - não se queria privatizar geradoras com as distribuidoras estatais, pois o risco de nova inadimplência afastaria investidores em G 1996 - contratada a consultoria Coopers & Lybrand pelo MME, para discutir e propor novo modelo setorial: Projeto RE-SEB – Reestruturação do Setor Elétrico Brasileiro GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 47 Reforma SEB Planejamento indicativo substituiu planejamento determinativo Em 1998 são criados o Operador Nacional do Sistema Elétrico – ONS e o Mercado Atacadista de Energia – MAE; crise no MAE impede seu funcionamento até 2002 Em 2001-2002, crise de abastecimento leva à queda de 20% no consumo de eletricidade, devido ao racionamento Tentativa de ‘revitalização’ e aperfeiçoamento do modelo GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 48 Reforma SEB 2003 - novo governo (Lula) reabre a discussão sobre os fundamentos do modelo do setor elétrico brasileiro 2004 - aprovada a Lei 10.848 com uma nova proposta de modelo setorial, com os seguintes objetivos: • Segurança de suprimento (planejamento EPE, CMSE) • Modicidade tarifária (leilões) • Inclusão social (Programa Luz para Todos) GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 49 Reforma SEB Principais alterações introduzidas pelo novo modelo • dois ambientes de mercado – ambiente regulado (distribuidoras) e ambiente livre (grandes consumidores) • compra de energia pelas distribuidoras por meio de leilões “energia nova”- usinas a construir (hidro A-5, termo A-3) “energia existente”- usinas já construídas • fim do ‘self-dealing’ - proibida a aquisição de energia de empresas vinculadas ao mesmo grupo de controle • retomada do planejamento determinativo - criação da EPE Empresa de Pesquisa Energética, apresentação de projetos hidráulicos, para serem submetidos a leilões GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 50 Reforma SEB Principais alterações introduzidas pelo novo modelo (cont.) • Lastro físico obrigatório dos vendedores de energia • Contratação integral (100% das necessidades) pelos agentes de consumo (D e CL), verificação ex-post; • Distribuidoras contratam com 5 anos de antecipação, para sinalizar a necessidade de expansão • Criação do CMSE - Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico para zelar pela segurança de suprimento • Novas regras de governança do ONS • Transformação do MAE em CCEE GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico – IE/UFRJ 51 Instituições do setor elétrico brasileiro CNPE Conselho Nacional de Política Energética CMSE - Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico Monitorar condições de atendimento; ações preventivas para garantir segurança do suprimento ELETROBRÁS Centrais Elétricas Brasileiras S/A Holding de empresas G-T-D federais e Itaipu Binacional; Gestão de recursos setoriais e do PROINFA, Luz para Todos e PROCEL; Parcerias estratégicas Recursos setoriais ONS Operador Nacional do Sistema Elétrico Homologação da política energética, em articulação com as demais políticas públicas. MME - Ministério de Minas e Energia Formular e implementar políticas para o setor energético, de acordo com diretrizes do CNPE. EPE - Empresa de Pesquisa Energética ANEEL - Agência Nacional de Energia Elétrica Estudos para a definição da Matriz Energética e planejamento da expansão do setor elétrico (geração e transmissão) Regulação do setor elétrico, fiscalização dos serviços, agentes e instituições, fixação de tarifas, leilões de energia, universalização atendimento,. Coordenação e controle da operação de geração e transmissão no sistema elétrico interligado. Administração de contratos, liquidação do mercado de curto prazo, leilões de energia por delegação. CCEE - Câmara de Comercialização de Energia Elétrica Agentes do setor elétrico Geração – Transmissão – Distribuição – Comercialização Consumidores do Ambiente de Livre Contratação Consumidores do Ambiente Regulado Prof. José Bonifácio S. Amaral Filho Instituto de Economia – UNICAMP Pesquisador associado do GESEL [email protected] GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ 53