DOÇARIA DE PERNAMBUCO O próprio conde João Maurício de Nassau, ao regressar à Holanda em 22 de maio de 1644, levou em sua bagagem, além dos quadros produzidos pelos pintores Frans Post e Albert Eckhout e de um mobiliário talhado em marfim, curiosidades outras como quatro barris contendo conchas e mariscos do Cabo de Santo Agostinho, sete botijas de farinha de mandioca e 103 barriletes de frutas confeitadas. A Civilização do Açúcar se fez sempre acompanhar do negro, que sempre adocicou a vida das casas-grandes, povoadas de "grossos senhores-de-engenho", dengosas sinhás e sestrosas mulatas, bem como de expressões culturais diversas tão bem documentadas por Gilberto Freyre na sua obra. Nas cozinhas das casas-grandes, o milho e a mandioca cultivados pelo índio uniram-se ao açúcar recémchegado e transformaram-se, pela tradição da cozinha portuguesa enriquecida por mãos e sabores africanos, em doces e bolos que vivem a despertar a gula de adultos e crianças. Os holandeses, ao tempo da dominação, foram grandes apreciadores dos doces pernambucanos, particularmente das frutas cristalizadas, como se depreende da relação publicada por Hermann Watjen, no seu hoje clássico O domínio colonial holandês no Brasil. Informa o autor que, por conta da Companhia, foram exportados para a Holanda 109 barriletes, em 1631, e 1261 libras, em 1637, de frutas cristalizadas, relacionando outros embarques do produto até o ano de 1647. Sobrea doçaria pernambucana, informa José Antônio Gonsalves de Mello que "grandes elogios mereceram também as frutas confeitadas e os doces de Pernambuco". O Reverendo Soler diz que, aqui, com ñaçúcar se fazem lindos doces de várias qualidades, tanto secos como em caldaá. Durante a dominação holandesa houve um verdadeiro comércio entre o Brasil e a Holanda de doces de Pernambuco. A exportação desses doces era objeto de atenção e tanto a própria Companhia das Índias Ocidentais quanto os comerciantes livres enviaram deles grande quantidade para Europa e para a África. Em cartas particulares, do Recife, encontramse muitas vezes referências a presentes de caixas de doces, para amigos, para os diretores, para as esposas distantes. E tinham esses presentes, algumas vezes, intenções políticas. Certa vez, por ordem do Conselho dos XIX, serviram para adoçar, em favor dos holandeses, a disposição dos capitães de portos da Inglaterra. 2 O excesso de açúcar, observado por Gilberto Freyre em sua obra, chega a tornar a baba-de-moça, a goiabada, o doce de jaca e os quindins em excessivamente adocicados para alguns estrangeiros e até para neobrasileiros oriundos de imigrações não portuguesas. Os doces da culinária pernambucana, que tanto despertaram a gula do Conde de Nassau, era visto como remédio pelo beneditino dom Domingos do Loreto Couto (c. 1696 c. 1762), na sua notável obra Desagravos do Brasil Glórias de Pernambuco,4 que o recomenda para o combate das tosses rebeldes, males do peito e cólicas, chamando a atenção que o seu excesso pode tornar as pessoas preguiçosas, enfatizando: "as pessoas muito amigas de doces são fleumáticas". Coube ao pioneirismo de Gilberto Freyre chamar a atenção para a importância da culinária na formação da nacionalidade brasileira quando, no Manifesto Regionalista (1926), afirmava da necessidade de um estudo dos valores culinários existentes na região Nordeste do Brasil, particularmente os mais ligados às classes populares dos vencedores de tabuleiros, nas ruas e pátios das igrejas. Em 1933, quando da primeira edição de Casa-Grande & Senzala, Gilberto Freyre desperta o leitor para a presença africana em nossa culinária: "o escravo africano dominou a cozinha colonial enriquecendo de novos sabores". Em 1939, quandodo aparecimento de Assucar Algumas receitas de bolos e doces do Nordeste do Brasil (sic), Gilberto Freyre escandalizou alguns conservadores ao escrever, de forma pioneira, um livro com receitas culinárias seculares recolhidas junto a famílias e engenhos da região. A sua antecipação provocou críticas diversas, como a de certo líder católico que, ao falar na "Sessão dos Moços", por ocasião do III Congresso Eucarístico Nacional, realizado no Recife em © 2008 Marina Residence S.A. Todos os direitos reservados | www.culthotel.com.br Designed by Emerson Filho & Junior Spano A doçaria pernambucana Ao contrário do sabor natural do caju, os nossos doces chegam a ser enjoativos para o paladar do europeu. O caju, fruto originário do Nordeste do Brasil, foi descrito e pela primeira vez documentado na Índia pelo cristãonovo português Cristóvão da Costa, médico e cirurgião, autor de livro publicado na Espanha em 1578, no qual chama a atenção para seu sabor como "sobre o doce e aperta um pouquito na garganta".3 DOÇARIAS DE PERNAMBUCO (Continuação) setembro de 1939, chama-o de "sociólogo de alfenim, de alféloa e outros quitutes de Açúcar" (sic). Era a coragem que sempre caracterizou o homem Gilberto, o destemor de pensar independente sem dar satisfações a ninguém, o ônus de publicar um livro pioneiro dentro de uma sociedade patriarcal com temas de receitas antes reservados para os cadernos femininos. Sobremesas: queijo de coalho assado com mel de engenho, cartola (banana frita com queijo manteiga), Romeu e Julieta (doce de goiaba em corte com queijo), filhós, baba-de-moça, pudim de pão, cocada, rapadura, nego-bom, puxa-puxa, fios de ovos, quindins. E mais sorvetes, doces e compotas de frutas regionais: coco, manga, sapoti, abacate, caju, banana, pinha, goiaba, cajá, umbu, pitanga, umbucajá, araçá, abacaxi, mangaba, jaca, laranja, graviola, acerola, jabuticaba, tamarindo, jambo. Doce de Banana Banana cortada em rodelas, cozidas em calda feita com açúcar, cravo, erva-doce ou canela em pau. Doce de Caju Cajus inteiros ou cortados e cozidos em calda feita com açúcar, cravo e erva-doce. Doce de Jerimum Doce de consistência cremosa feito com jerimum (abóbora), açúcar, cravo ou erva-doce. Doce de Leite Doce de consistência cremosa feito com leite de vaca e açúcar. O sabor pernambucano também se revela nas ceias e cafés: cuscuz de milho ou de mandioca, inhame e macaxeira com carne de sol ou charque, tapiocas quentinhas ou ao molho de coco, queijo de coalho ou manteiga, batata doce, banana comprida, munguzá, fruta – pão, arroz doce, xerém, manuê, angu, coalhada, broa, canjica, pamonha. Bolos: Souza Leão, de bacia, pé-de-moleque, de macaxeira, de rolo, de milho, de mandioca e engorda marido. Fatias Paridas Fatias paridas, também conhecida como fatias douradas, são preparadas com fatias finas de pão embebidos em leite, passadas em ovos batidos, fritas em óleo quente e povilhadas com açúcar e canela. SOBREMESAS BOLOS Cocada Coco ralado cozido em calda de açúcar ou rapadura e cravo até o ponto de cocada. Denomina-se de cocada branca a que é feita com açúcar e de cocada preta a feita com rapadura. Bolo de Macaxeira Bolo preparado com macaxeira ralada, leite de coco, ovos, manteiga e açúcar. Assa-se no forno. Bolo de Mandioca Bolo preparado com massa de mandioca, leite de coco, ovos, manteiga, e açúcar. É assado no forno e servido com café. Em alguma cidade do interior recebe a denominação de "bolo fubá". Bolo de Rolo Bolo preparado com uma massa de espessura finíssima de pão-de-ló, recheado com goiabada derretida e enrolada em forma de rocambole, polvilhado com açúcar. Bolo Pé de Moleque Bolo típico do ciclo junino pernambucano. É preparado com massa de mandioca, açúcar, leite de coco, ovos, manteiga, castanhas de caju moídas, erva-doce e cravo. É decorado com castanhas inteiras e assado no forno. Bolo Souza Leão É um dos mais tradicionais bolos da culinária pernambucana. A sua receita foi passada pela família Souza Leão, daí a sua denominação. De consistência © 2008 Marina Residence S.A. Todos os direitos reservados | www.culthotel.com.br Designed by Emerson Filho & Junior Spano Cartola É uma das mais tradicionais sobremesas da gastronomia pernambucana. Seu preparo consiste em banana frita coberta com queijo coalho assado e povilhada com açúcar e canela. DOÇARIAS DE PERNAMBUCO (Continuação) cremosa, esse bolo é preparado com massa de mandioca, calda quente de açúcar, ovos e manteiga. É facilmente encontrado em doçarias, lanchonetes, e restaurantes. feiras, principais ruas e pontos turísticos das cidades pernambucanas. É servida quente como lanche, petisco, no café da manhã ou ceias regionais. Existe também a tapioca molhada, umedecida com leite de coco misturado com açúcar. CEIAS E CAFÉS Canjica É um dos pratos típicos do ciclo junino. De consistência cremosa, a canjica é preparada com milho verde ralado, açúcar e leite de coco. É servida polvilhada com canela. É conhecida no Sul do País como curau. Cuscuz É um dos mais típicos pratos da gastronomia regional. Consiste em farinha de milho ou fubá, umedecida em água, temperada com sal e cozida no vapor em cuscuzeira (panela própria para fazer o prato). É servido quente, com leite de vaca ou de coco, manteiga, queijo ou ovo. Pode ainda, ser servido doce, ensopado com leite de coco e temperado com açúcar. O cuscuz, pode também ser preparado com a massa de mandioca (fubá). Munguzá Típico do ciclo junino, o munguzá é preparado com o milho próprio de munguzá, cozido com água e temperado com leite de coco, açúcar, cravo e ervadoce. É servido quente polvilhado com canela. Tapioca Espécie de beiju feito com goma de mandioca umedecida e temperada com sal. É assada, sem gordura, em pequenas frigideiras redondas de ferro ou alumínio, com recheio de coco ralado, queijo coalho ou simplesmente manteiga. As tapioqueiras, com seus fogareiros, são facilmente encontradas em mercados, © 2008 Marina Residence S.A. Todos os direitos reservados | www.culthotel.com.br Designed by Emerson Filho & Junior Spano Pamonha A pamonha é comida típica do ciclo junino. É preparada com milho verde ralado, temperado com açúcar, leite de coco, e colocadas em saquinhos feitos com a palha do milho verde e cozinhada em água fervendo. No sertão, a pamonha, é também, servida salgada acompanhando galinha de capoeira guizada ou à cabidela.