Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro
2º CICLO EM ENSINO DE EDUCAÇÃO FÍSICA
NOS ENSINOS BÁSICO E SECUNDÁRIO
A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO FÍSICA
PARA ALUNOS COM NECESSIDADES
EDUCATIVAS ESPECIAIS
Mestranda: Sandra Manuela Coelho Picoto
Orientador: Prof. Doutor Nuno Domingos Garrido
Vila Real, 2013
Dedicatória
Aos meus pais,
A quem devo TUDO o que sou!
À minha filha,
Razão da minha existência!
III
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Doutor Nuno Garrido pelo aconselhamento, acompanhamento,
auxílio e disponibilidade neste meu percurso.
Aos meus pais, por todos os ensinamentos que me proporcionaram na vida,
que me permitiram ser quem sou e pelo infindável apoio prestado e amor
revelado.
À minha princesinha, Joana, pelo amor, carinho, compreensão, alegria, por
me ajudar a viver e a aprender cada dia algo novo.
A alguém muito especial, por fazer parte de “nós”, por me ter apoiado e
incentivado a nunca desistir. “Tentar é mais do que conseguir… Se não
tentares nunca saberás… Tenta e poderás alcançar… Aquilo que queres
conseguir!”
A todos os amigos, em especial à Paula, pela amizade e presença em todos
os momentos deste meu percurso.
A todos, muito obrigada!
IV
ÍNDICE GERAL
AGRADECIMENTOS ..................................................................................... IV
ÍNDICE GERAL ............................................................................................... V
RESUMO ....................................................................................................... VI
ABSTRACT ................................................................................................... VII
1.
INTRODUÇÃO ......................................................................................... 2
2.
REVISÃO DA LITERATURA ................................................................... 5
2.1. Educação Especial ............................................................................ 5
2.1.1. Evolução do conceito ..................................................................... 5
2.1.2. Educação Especial em Portugal..................................................... 6
2.1.3. Conceito de Necessidades Educativas Especiais .......................... 8
2.2. Educação Física ................................................................................ 9
2.2.1. Educação Física na Escola ............................................................ 9
2.2.2. Benefícios da Educação Física .................................................... 10
2.2.3. Educação Física e os alunos com Necessidades Educativas
Especiais ................................................................................................ 10
3.
ENQUADRAMENTO DA PRÁTICA PROFISSIONAL ........................... 14
3.1. Abordagem prática – acompanhamento de uma aluna com
Necessidades Educativas Especiais (síndrome de Joubert) .................... 16
3.1.1. Síndrome de Joubert .................................................................... 17
3.1.2. Intervenção na Ação Educativa .................................................... 18
3.1.3. Participação na atividade “Gala de S. Gonçalo”........................... 21
4.
CONCLUSÕES ...................................................................................... 25
5.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................... 27
V
RESUMO
O presente trabalho tem como finalidade ilustrar o desenrolar do meu
processo profissional, enquanto professora de Educação Física, mas,
sobretudo, enquanto professora de alguns alunos muito especiais, com
quem ao longo destes anos tive e tenho o prazer de ensinar e aprender,
partilhando vivências e experiências.
A estes alunos, com Necessidades Educativas Especiais, deve ser
dada a mesma oportunidade de usufruir de uma educação adequada, tendo
sempre presente que precisam de atividade física tanto ou mais do que os
outros.
A Educação Física tem um papel preponderante a desempenhar, uma
vez
que,
contrariamente
às
outras
disciplinas,
pode
dotá-los
de
competências concretas e imediatamente aplicáveis na relação de vida
diária destes.
Os efeitos e benefícios das competências desenvolvidas/adquiridas
nesta disciplina não se reportam única e exclusivamente a um período de
tempo, mantendo-se para o resto da vida.
Pretendo, com todo este trabalho, analisar, refletir, demonstrar a
importância da Educação física para alunos com Necessidades Educativas
Especiais, recorrendo a uma revisão da literatura, abordando conteúdos
pertinentes: a Educação Física na escola, benefícios da Educação Física,
Educação Especial, Educação Especial em Portugal e Necessidades
Educativas Especiais.
Trata-se de uma reflexão fundamental, uma vez que me permite rever
inúmeras situações, dificuldades sentidas e fundamentar as decisões das
práticas pedagógicas.
VI
ABSTRACT
This report aims to illustrate the course of my career as a Physical
Education teacher, but above all, as a teacher of some very special students,
who over the years I had the pleasure of sharing experiences, teaching and
learning.
To these students with special educational necessities should be
given the same opportunity to enjoy a proper education, bearing in mind that
they need physical activity as much, or even more than the others.
Physical Education has a role to play, since, unlike other disciplines,
can provide them with practical skills that are immediately applicable in
respect of daily living.
The effects and benefits of the developed/acquired skills in this
discipline do not relate exclusively to a period of time, they are keept for the
rest of their lives.
My objective is to analyze, reflect and demonstrate the importance of
physical education for students with Special Educational Needs, through a
literature review, covering relevant content: Physical Education in school,
benefits of Physical Education, Special Education, Special Education in
Portugal and Special Educational Needs.
This is a fundamental reflection, since it allows me to revisit many
situations, difficulties and justify decisions of pedagogical practice.
VII
A Importância da Educação Física para
Alunos com Necessidades Educativas Especiais
INTRODUÇÃO
1
Introdução
1. INTRODUÇÃO
A educação da criança é influenciada, desde o início, pela sociedade:
a família, o meio social, os interesses, os costumes e a linguagem.
A sociedade deve valorizar todas as pessoas, permitindo o seu
desenvolvimento e facultando, a cada aluno, em situação considerada de
dificuldade na aprendizagem, uma educação inclusiva que promova a sua
autonomia emocional e cognitiva.
A escola, enquanto ponto de encontro de massas e meio de
sociabilização, não pode ser apenas um espaço privilegiado de transmissão
de saberes, mas também um lugar para partilhar vivências e experiências,
de forma a favorecer o desenvolvimento de todos os alunos. Neste sentido,
a instituição educativa deve estar preparada para dar oportunidade de
sucesso a todos, respeitando e aproveitando as suas diferenças como
valores. Por conseguinte, tem por obrigação satisfazer as necessidades dos
alunos, adaptando-se aos diversos estilos e ritmos de aprendizagem, de
forma a proporcionar um desenvolvimento harmonioso de todos, através de
currículos adequados, de uma flexibilização de organização escolar, bem
como a utilização de recursos e de uma cooperação articulada com a
comunidade. Nesta perspetiva, importa ter em conta a diferenciação na
própria sala de aula.
Para tal, é fundamental que os professores tenham uma postura de
aceitação quanto à diversidade, que conheçam verdadeiramente e que se
interessem por todos os alunos com quem trabalham, sendo que alguns são
denominados “diferentes”.
É necessário que as práticas pedagógicas desenvolvidas, ou a
desenvolver, tenham em conta, que, “os alunos são diferentes pela sua
origem, aquisições anteriores, características, projetos, interesses e
qualidades pessoais mutáveis e por isso se diz que cada aluno possui um
ritmo próprio de aprendizagem” (Engberg & Orvalho, 1995:105).
Isto leva a que haja uma grande diversidade dentro da sala de aula.
Este facto bem real, conduz os professores a procurarem “estratégias e
procedimentos que proporcionem a todos os alunos as melhores condições
e oportunidades de aprenderem e interagirem, solidária e cooperativamente,
2
Introdução
desenvolvendo ao máximo as suas competências académicas e sociais.”
(Leitão, 2010:20).
Assim, compete ao professor desenvolver estratégias e metodologias
apropriadas que se tornem facilitadores, tendo em conta cada educando,
pois, “cada aluno aprende determinado conhecimento de acordo com as
suas próprias características que provêm do seu próprio saber, dos seus
hábitos de pensar e de agir” (Ana Cadima, 1996:46).
A evolução do processo educativo do aluno vai depender também do
tipo de diferenciação que o professor utiliza na gestão das atividades e na
aprendizagem.
O professor de Educação Física tem um papel preponderante porque
o seu espaço de intervenção é mais abrangente e interativo. A sua relação
com os alunos faz-se numa base dinâmica, rodeada por matérias que
obrigam a desenvolver o espírito de entreajuda, cooperação, a autonomia, o
respeito, a compreensão.
A Educação Física poderá proporcionar a libertação de alguns
preconceitos, o conhecimento real das capacidades e até indicar novas
formas de ultrapassar certos obstáculos.
É muito importante que os professores que vão iniciar um trabalho
com os referidos alunos, tenham uma perceção positiva sobre o que são as
Necessidades Educativas Especiais, tenham conhecimento mínimo de todo
o trabalho necessário realizar ao longo do tempo e que apresentem uma
atitude de flexibilização, aceitação e responsabilidade.
3
A Importância da Educação Física para
Alunos com Necessidades Educativas Especiais
REVISÃO DA LITERATURA
2
Revisão da Literatura
2. REVISÃO DA LITERATURA
2.1.
Educação Especial
2.1.1. Evolução do conceito
A forma como a sociedade encara a presença das pessoas portadoras
de alguma deficiência está estreitamente ligado a fatores sociais,
económicos e culturais, subjacentes a cada época.
Foram inúmeras as atitudes assumidas pela sociedade para com estas
pessoas ao longo da história. Desde serem abandonadas nas montanhas,
condenadas à morte, a serem consideradas criaturas demoníacas e tratadas
como loucas (que deviam ser afastadas de todos os outros), várias foram as
soluções encontradas pela sociedade para dar resposta à situação destas
pessoas que sempre foram colocadas à margem.
Este tipo de atitude foi frequente até ao século XIX, quando começam a
surgir instituições especializadas para manter os deficientes longe das
pessoas “normais”, surgindo também a preocupação de criar condições para
que tivessem uma vida digna. É durante o século XX que começam a surgir
escolas para estas crianças, com Necessidades Educativas Especiais. Urgia
a criação de um sistema que desse resposta educativa eficaz àquele que é
diferente, mas que tem o direito de participar, agir e transformar a sociedade,
em suma, colocar a criança especial com os colegas ditos normais.
Em 1994, com a Declaração de Salamanca, assistiu-se a uma mudança
do sistema educativo em vigor até então; a escola passou a acolher
qualquer criança, independentemente das suas características físicas e/ou
intelectuais, proporcionando-lhes meios para o seu desenvolvimento, tanto
escolar como social.
Assim, a Educação Especial deixou de ser somente a educação de
determinado tipo de alunos, passando a ser o conjunto de estratégias e
recursos que cada escola possui para responder à diversidade de
características que cada um possui.
5
Revisão da Literatura
2.1.2. Educação Especial em Portugal
A deficiência e lidar com ela acarretou atitudes e comportamentos de
desprezo por parte das pessoas ditas normais, em todo o mundo, e Portugal
não foi exceção.
Vários decretos e despachos da educação especial foram surgindo ao
longo dos tempos, mas é com o decreto-lei 319/81 de 23 de Agosto que se
dá a abertura da escola regular a alunos com necessidades educativas
especiais, definindo medidas do regime educativo especial, garantindo que
todas as crianças e jovens com necessidades educativas especiais possam
realizar, sempre que possível, a escolaridade nas escolas de ensino regular,
que por sua vez, deve adaptar-se às condições físicas e intelectuais do
público que a frequenta.
Surge depois o despacho nº 173/91 de 23 de Outubro que vem reforçar o
decreto-lei 319/81, sustentando que “as medidas constantes do regime
educativo especial aplicam-se a todos os alunos com necessidades
educativas especiais, optando-se pelas medidas mais integradoras e menos
restritivas, de forma que as condições de frequência se aproximem das
exigências do regime comum”.
Atualmente está em vigor o decreto-lei 3/2008 de 7 de Janeiro que visa
“promover a igualdade de oportunidades, valorizar a educação e promover a
melhoria da qualidade do ensino. Um aspeto determinante dessa qualidade
é a promoção de uma escola democrática e inclusiva, orientada para o
sucesso educativo de todas as crianças e jovens. Nessa medida importa
planear um sistema de educação flexível, pautado por uma política global
integrada, que permita responder à diversidade de características e
necessidades de todos os alunos que implicam a inclusão das crianças e
jovens com necessidades educativas especiais no quadro de uma política de
qualidade orientada para o sucesso educativo de todos os alunos”.
Após a Declaração de Salamanca, afirmou-se a noção de escola
inclusiva, capaz de acolher e reter, no seu meio, grupos de crianças e jovens
tradicionalmente
excluídos.
Esta
noção,
6
dada
a
sua
dimensão
Revisão da Literatura
eminentemente social, tem merecido o apoio generalizado de profissionais,
da comunidade científica e de pais.
A educação inclusiva visa a equidade educativa, sendo que por esta se
entende a garantia de igualdade, quer no acesso quer nos resultados.
No quadro da equidade educativa, o sistema e as práticas educativas
devem assegurar a gestão da diversidade da qual decorrem diferentes tipos
de estratégias que permitam responder às necessidades educativas dos
alunos. Deste modo, a escola inclusiva pressupõe individualização e
personalização
das
estratégias
educativas,
enquanto
método
de
prossecução do objetivo de promover competências universais que
permitam a autonomia e o acesso à condução plena de cidadania por parte
de todos.
Todos os alunos têm necessidades educativas, trabalhadas no quadro da
gestão da diversidade acima referida. Existem casos, porém, em que as
necessidades se revestem de contornos muito específicos, exigindo a
ativação de apoios especializados.
Os apoios especializados visam responder às necessidades educativas
especiais dos alunos com limitações significativas ao nível da atividade e da
participação, num ou vários domínios de vida, decorrentes de alterações
funcionais e estruturais, de carácter permanente, resultando em dificuldades
continuadas ao nível da comunicação, da aprendizagem, da mobilidade, da
autonomia, do relacionamento interpessoal e da participação social e dando
lugar à mobilização de serviços especializados para promover o potencial de
funcionamento.
Os apoios especializados podem implicar a adaptação de estratégias,
recursos, conteúdos, processos, procedimentos e instrumentos, bem como a
utilização de tecnologias de apoio. Portanto, não se trata só de medidas para
os alunos, mas também de medidas de mudanças no contexto escolar.
O referido decreto define ainda os apoios especializados a prestar nas
escolas, com vista à criação de condições para a adequação do processo
educativo às necessidades educativas especiais dos alunos com limitações
significativas, ao nível da atividade e da participação nos vários domínios da
vida. Define também “claramente o grupo alvo da educação especial, bem
como as medidas organizativas, de funcionamento, de avaliação e de apoio
7
Revisão da Literatura
que garantem a estes alunos o acesso e o sucesso educativo elevando os
seus níveis de participação e as taxas de conclusão do ensino secundário e
de acesso ao ensino superior”. (Pereira, 2008:17)
2.1.3. Conceito de Necessidades Educativas Especiais
Um aluno com necessidades educativas especiais “apresenta algum
problema de aprendizagem ao longo da sua escolarização que exige uma
atenção mais específica e maiores recursos educacionais do que os
necessários para os colegas da sua idade”. (Marchesi & Martin in Serra,
2008:24)
Segundo a Declaração de Salamanca (1994:6), necessidades educativas
especiais dirigem-se a “todas as crianças e jovens cujas carências se
relacionam com deficiência ou dificuldades escolares, consequentemente,
têm necessidades educativas especiais em determinado momento da sua
escolaridade”.
A escola deve ser uma escola para todos. É necessário estar sempre
presente o reconhecimento do princípio da igualdade na educação: a
educação de crianças e jovens com necessidades educativas especiais tem
de ser alvo de atenção especial. Assim, tem a escola a obrigação e o
compromisso de satisfazer as necessidades dos alunos, adaptando-se aos
diversos estilos e ritmos de aprendizagem, de forma a proporcionar um
desenvolvimento harmonioso de todos os seus alunos, através de currículos
adequados, de uma flexibilização de organização escolar, bem como a
utilização de recursos e de uma cooperação articulada com a comunidade.
Um ensino eficaz e eficiente implica a adaptação às necessidades
individuais do aluno, de forma que a sua participação seja bem-sucedida.
(Auxter et al, 1993).
Cabe, então, à escola, a criação das condições necessárias à integração
destas crianças e também, envolvendo todos os agentes educativos, a
transmissão de valores como a diversidade, o respeito, a solidariedade, a
justiça, para que todos os membros da comunidade escolar possam conviver
em harmonia.
8
Revisão da Literatura
Cabe-nos
a
nós,
professores,
enquanto
agentes
educativos,
o
desenvolvimento de estratégias e metodologias que se tornem facilitadoras
do processo de ensino-aprendizagem, tendo em conta cada educando, pois
cada um aprende de acordo com as suas características, vivências e
motivações.
2.2.
Educação Física
2.2.1. Educação Física na Escola
De acordo com a UNESCO (1978), todo o ser humano tem direito à
prática da Educação Física e do Desporto, os quais são essenciais ao
desenvolvimento
integral
da
sua
personalidade.
A
liberdade
de
desenvolvimento físico, intelectual e moral através da Educação Física e do
Desporto deve ser garantida no sistema educacional e em outros aspetos da
vida social.
Segundo Matos e Graça (1991), à disciplina de Educação Física é
reconhecido um papel privilegiado e insubstituível na promoção e criação de
hábitos de vida saudáveis, pela criação dos pressupostos para a aquisição
de um estilo de vida ativo, impondo-se esta promoção como meta de
qualquer sistema educativo, já que muitas crianças não terão, na sua vida,
outra oportunidade de praticar atividade física organizada e regular a não ser
as experiências proporcionadas nas aulas de Educação Física.
A Educação Física é fundamental para estimular o desenvolvimento das
crianças em diversos aspetos, nomeadamente cognitivo, socio-afetivo, moral
e motor. Tem como objetivo auxiliar o desenvolvimento harmonioso do corpo
e da mente, contribuindo para a formação das crianças, de uma forma geral,
sobretudo ao nível da saúde, promovendo iguais competências úteis na vida
em sociedade.
Um dos desafios da Educação Física é educar os alunos para que
venham a ser adultos com hábitos de prática de atividade física regular, sem
nunca esquecer de proporcionar a alegria e o prazer através do movimento.
9
Revisão da Literatura
2.2.2. Benefícios da Educação Física
A atividade física e, consequentemente, a Educação Física, produzem
nas crianças, jovens e adultos diversos benefícios: cognitivos, fisiológicos,
físicos.
A Educação Física ajuda os alunos, com Necessidades Educativas
Especiais e não só, a elevar o nível funcional das suas capacidades
coordenativas e condicionais, como a resistência, a flexibilidade, a
velocidade, o equilíbrio, o controlo da postura, o ritmo, a agilidade ou o
controlo da orientação espacial.
Por sua vez, a prática adequada de atividade física auxilia a desenvolver
tecidos músculo-esqueléticos saudáveis, um sistema cardiovascular salutar
e a manter um peso saudável. Está também associada a benefícios
psicológicos, melhorando o controlo sobre sintomas de ansiedade e
depressão. Ajuda a desenvolver a autonomia, o respeito, a cordialidade, a
cooperação, a compreensão, facilitando a adoção de comportamentos
saudáveis, tendo um papel fundamental em, por exemplo, evitar o consumo
de álcool, tabaco e drogas.
Em suma, a Educação Física desenvolve o psíquico e o físico do aluno,
através de vivências e práticas como jogos, danças e lutas. A participação
dos alunos com Necessidades Educativas Especiais nessas atividades
proporciona-lhes diferentes oportunidades de movimento importantes para o
seu desenvolvimento. Manter os alunos fisicamente ativos, trará benefícios
que durarão uma vida inteira.
2.2.3. Educação Física e os alunos com Necessidades
Educativas Especiais
Segundo Riera (2000) a Educação Física é vista, de um modo global,
como uma das áreas que mais promove o desenvolvimento integral do
indivíduo, assim como a maturidade do aluno, uma vez que o seu trabalho
também compreende tarefas de caráter coletivo, as quais permitem um
10
Revisão da Literatura
melhor autoconhecimento, mais participação, combinando convívio e
capacidade de resolução de problemas.
A Educação Física para indivíduos portadores de deficiência tem como
objetivo integrar e aplicar fundamentos teórico-práticos das várias áreas da
motricidade humana, bem como outras áreas da saúde e da educação, em
diferentes programas educacionais e de reabilitação, para indivíduos de
todas as faixas etárias. Envolve um programa diversificado de atividades,
jogos, atividades rítmicas expressivas cuja organização se baseia em
interesses e no desenvolvimento das capacidades e limitações de indivíduos
com deficiência. (Sherrill, 1998).
Para Vatavuk (1996), a Educação Física poderá ajudar o indivíduo com
deficiência a melhorar a motivação, a autoestima, a confiança e a
independência. O fator divertimento, para além disso, deverá ser sempre
equacionado, uma vez que o indivíduo deverá ter prazer na atividade que
realiza.
Deste modo, a Educação Física para alunos especiais visa proporcionar
uma melhoria da capacidade física, por meio da exploração do meio físico e
orientação espacial. Ao aluno com deficiência o trabalho motor proporciona
uma maior independência e uma melhor interação com o seu “eu” e as
pessoas que o rodeiam. (Cidade & Freitas, 2002).
Todo o programa de Educação Física deve conter desafios, permitindo a
participação destes indivíduos. Não obstante, respeitando as suas
limitações, deve promover a autonomia e enfatizar o potencial no domínio
motor. (Pedrinelli, 1994). Assim, todas as atividades devem ter em conta as
potencialidades e limitações dos alunos e ser realizadas de forma constante,
progressiva e regular. A sua realização deve ter um caráter lúdico e
favorecer situações onde a criança aprenda a lidar com o seu insucesso e
com o seu êxito. A variedade de atividade surge como um auxílio no
aprimoramento da personalidade do indivíduo com deficiência. (Bueno &
Resa, 1995).
11
Revisão da Literatura
Devem ser tidos em conta alguns aspetos, na escolha de uma atividade
física:
•
deve ser de carácter lúdico e recreativo, de forma a motivar o
aluno;
•
o esforço na atividade deve ser contínuo e de baixa intensidade;
•
devem variar-se os locais e as condições da prática das
atividades físicas;
•
as atividades devem envolver exercícios de perícia e de
manipulação de objetos, de deslocamentos e equilíbrios, jogos,
de modo a elevar o nível funcional das capacidades condicionais
e coordenativas.
•
devem ainda realizar-se atividades individuais e de grupo, de
forma a privilegiar o convívio com os colegas e a socialização.
Ainda assim, muitas são as escolas que não se encontram
preparadas para acolher convenientemente estes alunos. Na Educação
Física, a falta de preparação dos docentes, a escassez de materiais e
espaços têm sido fatores impeditivos para a participação ativa destes
alunos. Independentemente das razões, muitos destes alunos não usufruem
plenamente das aulas de Educação Física, não chegando, muitas das
vezes, a participar ativamente nelas. Para que os alunos sejam
verdadeiramente incluídos nas aulas de Educação física, não basta estar no
mesmo espaço físico ou participar em algumas atividades; ao invés, devem
fazer parte da turma e participar em todas as atividades durante a aula,
ainda que necessitando do auxílio e apoio do professor e dos colegas.
12
A Importância da Educação Física para
Alunos com Necessidades Educativas Especiais
ENQUADRAMENTO DA PRÁTICA PROFISSIONAL
3
Metodologia
3. ENQUADRAMENTO DA PRÁTICA PROFISSIONAL
Os alunos com Necessidades Educativas Especiais configuram uma
realidade cada vez mais presente na escola, o que deverá levá-la a
preparar-se, a preocupar-se e a informar-se. A escola terá que se adaptar a
todas as crianças. Não podemos cair na tentação de subestimar este grupo
de crianças. Ao invés, devemos apoiar, discutir, criar formas ou vias que
proporcionem um leque suficientemente vasto de opções válidas suscetíveis
de desenvolverem aptidões que todos temos e os alunos com Necessidades
Educativas Especiais não devem ser exceção.
A Educação Física deve promover o desenvolvimento global destes
alunos, de forma a favorecer a adaptação e o equilíbrio que as suas
limitações requerem. Deve ainda facilitar a sua independência e autonomia,
bem como promover o processo de inclusão e aceitação no seu grupo
social.
Ao longo de 13 anos do meu percurso profissional, como professora de
Educação Física (do 2º ciclo do Ensino Básico) de alguns destes alunos tão
especiais, e com uma função extremamente importante, na procura de
melhores estratégias para aligeirar as suas dificuldades, tive que me
preparar para poder prestar todos os apoios necessários e adequados,
fornecendo-lhes oportunidades de aprendizagem.
Foi necessário desenvolver competências que me permitiram responder
às necessidades educativas dos alunos, assim como atitudes positivas em
relação à sua integração, pois não foi (nem é) fácil atuar com estes alunos,
sobretudo quando as suas características implicam limitações de caráter
motor permanente (exemplo: paralisia cerebral; espinha bífida; distrofia
muscular).
Foi necessário inovar. Inovar conhecimentos, criar e recriar, planear,
reformular, descobrir, experimentar, provar e ensinar. Não apenas seguir
receitas, mas modifica-las e adapta-las de acordo com a realidade, mudar a
prática tantas quantas vezes foram necessárias, sempre acreditando no
potencial dos alunos.
No início constatei que pouco percebia do assunto, uma vez que a minha
formação base não foi de todo suficiente; eu não possuía formação na área
14
Metodologia
da Educação Especial, muito menos especialização na área da Atividade
Física
Adaptada.
Da
mesma
forma,
a
escola
ainda
não
estava
suficientemente preparada para estes alunos, razão pela qual eram
facilmente “esquecidos” ou “postos de parte”, tanto pelo professor, como
pelos colegas.
Foi necessário adquirir conhecimentos que permitissem ensinar, na
mesma turma, alunos com capacidades diferentes e níveis diferentes,
procurar as melhores estratégias e adequá-las, utilizando uma pedagogia
diferenciada, para minimizar as suas dificuldades.
Procurei sempre trabalhar em equipa, tanto com colegas de Educação
Física como com os colegas da Educação Especial, colocando dúvidas,
questões, solicitando sugestões. Procurei formação e informação na área da
Educação Física, Educação Física Adaptada, Educação Especial e
Necessidades Educativas Especiais. Contudo, não é fácil conseguir
formação específica, não só pelas imensas particularidades inerentes à sua
problemática, mas pela inexistência de uma formação que corresponde às
especificidades com que cada professor lida no momento, e sobretudo pela
limitada acessibilidade a ações de formação promovidas pelo Ministério da
Educação, que no meu caso, como professora contratada, são praticamente
nulas.
Por este motivo, sinto que necessito de receber muito mais (in)formação
específica para perceber a problemática dos alunos, a forma como atuar no
sentido de elaborar estratégias para estar preparada no sentido de lhes
prestar o apoio necessário e adequado, proporcionando-lhes oportunidades
de aprendizagem.
Caberá assim, aos órgãos de gestão investir mais na formação dos seus
intervenientes, em prol de crianças tão especiais. Seria fulcral o apoio de um
docente permanente, especializado em Atividade Física Adaptada nas aulas
de Educação Física, de forma a poder ajudar o professor de Educação
Física a desenvolver estratégias, métodos e técnicas mais eficazes para as
aprendizagens dos alunos. Este apoio especializado é inexistente nas
escolas, assim como os recursos/materiais específicos às necessidades
educativas especiais dos alunos, o que dificulta de uma forma gravosa o
15
Metodologia
desenvolvimento das aprendizagens, assim como a própria inclusão nas
aulas de Educação Física.
Na procura constante de informação, recorri e recorro, quase
diariamente, a um utensílio que considero indispensável, a Internet, que
muito me auxiliou, auxilia e ensina, para poder trabalhar com os alunos, na
tentativa de resolução dos seus problemas.
Foi meu intuito, através de atividades lúdicas, de jogos adaptados às
condições específicas de cada aluno, durante a realização das atividades,
“explorar as possibilidades que estas apresentam, trabalhar as suas
potencialidades, trabalhar na sua auto valorização e autoestima e
reconhecer as suas limitações.” (Silva, 1998)
Trabalhei no sentido de proporcionar vivências, através de atividades
lúdicas e “brincadeiras” e, posteriormente, fui modificando as atividades até
chegar a jogos adaptados, consoante as necessidades dos alunos. Assim,
os alunos tiveram a oportunidade de se organizarem em grupo,
estabeleceram
regras
de
convivência,
vínculos
sociais
e
afetivos,
proporcionando o contacto físico e possibilitando o manuseamento de
diferentes materiais e o desenvolvimento de habilidade (motoras, de
perceção, de atenção e musicalidade).
Foi necessário deixar de me preocupar em demasia em ensinar e
transmitir conhecimentos; antes instalou-se a preocupação de criar
condições e desenvolver estratégias que fossem ao encontro das
aprendizagens, tendo sempre em conta a diferenciação.
3.1.
Abordagem prática – acompanhamento de uma aluna com
Necessidades Educativas Especiais (síndrome de Joubert)
Tal como referi, foi necessário inovar conhecimentos, no sentido de lidar
com as diferenças dos alunos. O caso concreto que decidi apresentar é o
mais recente, na minha prática letiva. No corrente ano letivo, encontrandome a lecionar numa escola básica de Torres Vedras, numa turma de 6º ano,
necessitei de reciclar tudo o que sei, para poder proporcionar a uma aluna,
com Necessidades Educativas Especiais, aprendizagens que considero as
mais positivas.
16
Metodologia
A Tatiana é portadora da síndrome de Joubert. De acordo com os
relatórios médicos apresenta ainda distrofia retiniana de tipo misto e
potenciais
evocados
visuais,
traduzindo
resposta
cortical
evocada
bilateralmente perturbada. O estudo da refração revelou hipermetropia e
astigmatismo hipermetrópico e nistagmo horizontal.
3.1.1. Síndrome de Joubert
Trata-se de uma alteração genética rara (1/100.000), também conhecida
como Síndrome de Joubert-Boltshauser. Foi descrito pela primeira vez por
Marie Joubert em 1969 e por Eugene Boltshauser em 1977, tendo sido
descritos pouco mais de 200 casos na literatura médica.
Pertence ao grupo das ataxias hereditárias, que são distúrbios de
coordenação dos movimentos provocados por danos na estrutura ou no
metabolismo do cerebelo, levando a manifestações clínicas evidentes de
ataxia, perda do tónus muscular, perda da coordenação motora, nistagmo
(movimentos oculares anormais), alteração de marcha e de postura,
refletindo a interrupção dos circuitos corticais e nucleares cerebelares.
(Campistol, 2002)
Principais características:
• O subdesenvolvimento (hipoplasia) ou total falta (aplasia) dos
vermis cerebelares;
• Atraso
no
desenvolvimento/défice
mental
de
gravidade
variável;
• Dificuldade de coordenação dos movimentos musculares
voluntários (movimentos descoordenados – ataxia);
• Diminuição do tónus muscular (hipotonia);
• Características
faciais
anormais
(testa
sobrancelhas arqueadas; boca aberta);
• Apraxia oculomotora;
•
Distrofia retiniana;
• Hiperpneia (padrões respiratórios anormais);
• Apneia do sono.
17
proeminente;
Metodologia
3.1.2. Intervenção na Ação Educativa
Diagnóstico: Após avaliação feita pela equipa da Educação Especial,
verifica-se que, em termos de desenvolvimento, a aluna revela défice
cognitivo ligeiro, com maior investimento na motricidade fina, linguagem e
cognição verbal, no entanto com valores abaixo da média para a sua faixa
etária. As áreas onde revela maiores dificuldades são a motricidade
grosseira, cognição verbal e autonomia.
Medidas Educativas: A aluna enquadra-se na definição de
Necessidades Educativas Especiais de caráter permanente no domínio da
cognição, pois tem limitações significativas ao nível das funções do corpo,
nomeadamente, motricidade grosseira, cognição não-verbal, mobilidade e
autonomia, que se reflectem de forma grave e continuada em áreas da
actividade e participação no âmbito das aprendizagens. Beneficia de um
Currículo Específico Individual, artigo 21º do Decreto-Lei 3/2008 de 7 de
Janeiro e Redução de Turma, ao abrigo do despacho nº 5106-A/2012 de 12
de Abril, de forma a promover o seu sucesso no âmbito de aprendizagens
adaptadas às suas necessidades específicas.
Competências: Promover a inclusão educativa e social; o acesso e
sucesso educativo; a autonomia e a estabilidade emocional; a igualdade de
oportunidades e a preparação para o prosseguimento de estudos ou para
uma adequada preparação para a vida profissional.
Competências Transversais: cumprir regras de funcionamento da
aula e do espaço escolar; empenhar-se na realização das tarefas propostas
de forma mais autónoma possível; aumentar a sua capacidade de
concentração e de realização; relacionar-se adequadamente com colegas e
adultos; cooperar com os colegas em atividades de grupo.
Estratégias:
privilegiar
atividades
concretas
e
funcionais,
aproveitando momentos da vida diária e escolar; respeitar o ritmo de
resposta, de compreensão e de aquisição de conhecimentos; necessidade
de treino e repetição para solidificar aquisições; ter em conta os gostos
pessoais e aquilo a que atribui significado; ter em conta a aplicabilidade
prática das aprendizagens e sua utilidade na vida futura; valorizar os
sucessos e incentivar a aluna reforçando a autoestima.
18
Metodologia
Recursos Humanos: Docente de Educação Especial em apoio
direto; Auxiliar de Ação Educativa (supervisão e acompanhamento para
tarefas de orientação e autonomia fora das aulas); acompanhamento
psicológico e terapia da fala; parceria de um segundo docente nas aulas de
Educação Física, Educação Musical, Educação Visual e Educação
Tecnológica; Encarregada de Educação (informação do contexto familiar,
das características, dificuldades, comportamento da aluna, bem como
informações médicas relativas à sua problemática).
Avaliação: continua e formativa, tendo em conta o perfil da aluna.
No âmbito da disciplina de Educação Física, após contacto com a aluna e
segundo o Relatório de Avaliação Diagnóstica Inicial, elaborado por mim e
pela docente da parceria (docente que lhe presta um apoio personalizado),
concluiu-se que as suas principais dificuldades são:
•
Coordenação geral.
•
Compreensão dos exercícios e tarefas a desenvolver.
•
Organização espacial, assim como o cumprimento de um trajeto prédefinido.
•
Concentração na tarefa solicitada.
•
Concluir uma tarefa de forma autónoma.
•
Organização e estruturação rítmica.
•
Sentido de lateralidade, noção e imagem corporal.
•
Equilíbrio estático e dinâmico, com algumas dificuldades.
•
Dificuldade na preensão e manuseamento de bolas, assim como na
maioria dos materiais portáteis, tais como raquetes, cordas, arcos etc.
•
Dificuldade em realizar exercícios específicos de conjugação de
várias habilidades, tais como, correr, chutar uma bola em movimento,
saltar à corda, saltar com apoio de um só pé ou em simultâneo,
transpor objetos.
•
Coordenação óculo-manual.
19
Metodologia
•
Coordenação óculo-pedal.
Competências e estratégias desenvolvidas:
• Desenvolvimento da Coordenação geral;
• Desenvolvimento da orientação, organização espacial e sentido
rítmico;
• Desenvolvimento da concentração e execução assertiva na tarefa;
• Desenvolvimento da lateralidade, noção e imagem corporal;
• Desenvolvimento do equilíbrio estático e dinâmico;
• Desenvolvimento da motricidade fina através da preensão e
manuseamento correto de todos os materiais (raquetes, arcos,
bolas, etc.);
• Desenvolvimento de exercícios específicos de conjugação de várias
habilidades, tais como, correr, chutar uma bola em movimento, saltar
à corda, saltar com apoio de um só pé ou em simultâneo, transpor
objetos;
• Desenvolvimento da coordenação óculo-manual;
• Desenvolvimento da coordenação óculo-pedal;
• Promover a relação aluno-professor;
• Promover a relação entre os alunos;
• Promover o trabalho em equipa;
• Utilização de feedbacks positivos;
• Promover a autoestima;
• Promover a autonomia
20
Metodologia
3.1.3. Participação na atividade “Gala de S. Gonçalo”
Durante
o
1º
período,
foi
realizada
uma
atividade
de
comemoração/festejo do padroeiro da escola, a Gala de S. Gonçalo, na qual
participaram todos os alunos dos 6ºanos. A aluna, ao tomar conhecimento
da comemoração, manifestou o seu desejo de participar na atividade. A
turma em questão participaria numa coreografia, o que supunha trabalho de
coordenação individual e coletiva. A minha reação inicial, perante esta
vontade expressa, embora não o tivesse demonstrado, foi pensar em
dissuadi-la, no sentido de evitar a sua exposição pública, a exposição das
suas dificuldades perante a comunidade escolar. Tendo reconsiderado,
resolvi integrar a aluna nas minhas aulas, no período de tempo necessário à
exercitação da coreografia (pois a aluna tem apoio personalizado com um
professor de Educação Física), no sentido de que esta percebesse os
movimentos a trabalhar, a coordenação com o par, entre outros.
Trabalhar a coordenação de uma menina que não tem o mesmo sentido
de coordenação dos outros, da execução correta dos movimentos, não foi
fácil. Na maior parte das vezes, quando ela incorporava um movimento a
executar, já os seus colegas estavam a executar o movimento seguinte, o
que conduziu a alguns contratempos. Foi um exercício de paciência, para
ela e para os colegas; contudo, ninguém baixou os braços. Fizemos vários
ensaios, várias repetições da coreografia, ajustando o ritmo à capacidade da
aluna; fizemos treino individualizado, tanto comigo, como com os colegas
(que não demonstravam dificuldades) para a ajudar a executar e corrigir os
exercícios
e
foram
sempre
valorizados
os
pequenos
progressos,
incentivando sempre a aluna a melhorar. O resultado foi a participação
efetiva e ativa da aluna na gala, cuja coreografia, embora não tivesse saído
perfeita, não o foi pela participação da aluna, mas porque 100 meninos não
conseguem concretizar na perfeição uma coreografia exercitada em apenas
três semanas. No entanto, foi excelente testemunhar a alegria com que ela
participou, perceber a satisfação da sua mãe por verificar os progressos
feitos,
em
termos
físicos,
e,
sobretudo,
em
termos
humanos,
o
enriquecimento de que todos fomos alvo, com a sua presença. A aluna
21
Metodologia
ultrapassou a barreira imposta pela síndrome de que é portadora, os colegas
ultrapassaram o “síndrome da indiferença”, quando lidam com meninos que
não são iguais a si, tornando-se seres humanos mais atentos às
necessidades dos outros, mais sensíveis aos problemas dos seus
semelhantes, em suma, mais ricos. E eu ultrapassei a perceção que assalta
todos os professores: o protecionismo que assumimos, relativamente a estes
meninos que, por vezes nos impede de tentar, alcançando uma escola mais
inclusiva e avançando para uma sociedade mais justa.
Por conseguinte, penso ser justo avaliar a minha intervenção (que ainda
não terminou) como positiva, na medida em que procuro ir ao encontro do
que está previsto no Projeto Educativo Individual da aluna. Com efeito,
apesar das reticências iniciais, promovi a sua inclusão, integrando-a numa
atividade de grupo que também lhe dá instrumentos para o sucesso nas
relações sociais; em qualquer relação social, o resultado positivo conseguido
em quaisquer tarefas, depende, em boa medida, do nível de entendimento e
de esforço que cada ser humano empreende, de como “afina agulhas para
que a música seja o mais melodiosa possível”. Creio que a aluna percebeu o
quanto é importante sermos tolerantes (como o foram os seus colegas) e
persistentes (como ela é) e de que forma o entusiasmo e o esforço nos torna
fortes. Só uma atitude de esforço conduz ao sucesso. Por outro lado e,
apesar do esforço coletivo, nada seria possível se não desenvolvesse a sua
autonomia; é esta competência que lhe garante adequação social. E é essa
característica (que lhe é inerente, porque se trata de uma menina que
procura conseguir fazer as coisas sozinha) que a escola está a ampliar,
dotando-a de meios com vista à sua concretização/realização pessoal. Por
esta razão, sinto-me satisfeita com o trabalho que me encontro a
desenvolver. Sou parte integrante de um processo importantíssimo.
Para concluir, espero estar a conseguir “intervir no processo de
construção do ser humano, na aquisição de hábitos e costumes por parte
dos alunos, na formação do seu caráter. Educar, além de incidir sobre o
saber, o saber fazer e o saber ser, deve preparar, inclusive, para o saber
viver com”. (Batista, 2003)
“Eles não sabem nem sonham
22
Metodologia
Que o sonho comanda a vida
E que sempre que o homem sonha
O mundo pula e avança
Como bola colorida
Entre as mãos de uma criança” (Manuel Freire, “Pedra Filosofal”)
23
A Importância da Educação Física para
Alunos com Necessidades Educativas Especiais
CONCLUSÕES
4
Conclusões
4. CONCLUSÕES
Com o passar dos anos, a Educação Física evoluiu e deixou de ser
entendida apenas como um momento de lazer na escola, passando a ser um
processo de aprendizagem, no qual os professores têm responsabilidades
pedagógicas a cumprir e as atividades recreativas e rítmicas tornaram-se
meios essenciais para o desenvolvimento de valores morais e éticos,
culturais e educacionais.
O professor de Educação Física deve desenvolver as potencialidades
dos seus alunos, portadores de Necessidades Educativas Especiais, e não
exclui-los das aulas. Não deve apenas acolhê-los no espaço físico, mas
adaptar métodos “… que contemplem todos os alunos, que permitam a
participação efetiva de todos dentro das suas possibilidades, que promova a
sua autonomia e que enfatize o seu potencial…” (Pedrinelli, 1994). “… Com
criatividade podem usar o corpo, o movimento, o jogo, a expressão e o
desporto como oportunidades para enaltecer a diferença e proporcionar aos
alunos experiências que realcem a cooperação e a solidariedade”.
(Rodrigues, 2003)
Estes alunos são um exemplo de força de vontade: a garra com que
tentam realizar as atividades propostas, aliada à motivação dos professores,
são aspetos que determinam o sucesso das atividades, não só para os
próprios alunos, mas também como exemplo para todos os outros.
Posso concluir que os benefícios são inúmeros, não obstante as
limitações que estes alunos apresentam, em consequência da sua patologia,
e apesar das condições de atendimento, no que diz respeito a espaço físico
(inadequado)
e
aos
poucos
profissionais
especializados
para
os
acompanhar. O caso prático apresentado foi apenas um pequeno exemplo
de como a Educação Física é realmente importante para os alunos com
Necessidades Educativas Especiais.
Em suma, é “… um espaço privilegiado que promove as relações
interpessoais, a autoestima e a confiança, valorizando-se aquilo que cada
indivíduo é capaz de fazer em função das suas possibilidades e limitações
pessoais…”. (Marco, 1995:77)
25
A Importância da Educação Física para
Alunos com Necessidades Educativas Especiais
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
5
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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a importância da educação física para alunos com necessidades