REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS:
OBJETO E FONTE DE PESQUISA
Nubia de Cássia Silva Fonseca 1
Sara Jane Alves Durães 2
Neste artigo procuramos situar a Revista Brasileira de Estudos PedagógicosRBEP, como um objeto e fonte de pesquisa. Inicialmente, no primeiro tópico, buscamos
analisar o impresso como fonte de pesquisa na educação, refletindo sobre a sua
importância e como utilizar esta fonte na área educacional. No segundo tópico,
realizarmos uma analise detalhada sobre a RBEP e seu editorial, como a revista se
dividia, e quais eram os objetivos de cada seção apresentada na revista. Por ultimo
discutirmos o conteúdo da revista, buscando refletir sobre as suas influências no
contexto educacional nacional.
O IMPRESSO COMO FONTE DE PESQUISA EDUCACIONAL
A primeira imprensa criada no Brasil foi no ano de 1808, quando D. João VI
criou a Imprensa Régia pelo Decreto de 13 de maio de 1808. Em 10 de setembro desse
mesmo ano se inicia a imprensa periódica através da publicação do primeiro Jornal do
Rio de Janeiro- A Gazeta do Rio de Janeiro, e, em 1812, a primeira revista ou jornal de
literatura na Bahia que tinha por nome As variações ou Ensaios de Literatura. Todas
estas publicações estavam sobre tutela do Estado, sendo sujeitas a uma comissão de
censura (BASTOS, 2002).
O impresso educacional, Boletim do Pão dos Pobres de Santo Antônio, foi
elaborado por representantes do campo religioso como um canal pedagógico para
manifestarem suas realizações como também suas necessidades de ordem financeira e
socializarem os princípios básicos da formação que pertenciam junto a segmentos
1
Graduanda em Pedagogia pela Universidade Estadual de Montes Claros; Bolsista da PIC-UNI.
2
Doutora em Educação e professora da Universidade Estadual de Montes Claros sociais populares. Esse recurso faz com que se mantivessem vivos os interesses da
sociedade como um todo, no decorrer dos anos (DESAULNIERS, 2002). Sendo
reconhecido o impresso como meio de propagação de idéias entre os professores,
auxiliando em sua maneira de ensinar, enfatizando pensamento católico.
Ressaltando Silva (2006, p.3238),
O uso do impresso foi uma estratégia de difusão doutrinária adotada
pelos membros do movimento de Reação Católica, no intuito de
difundir o seu ideário, propagar o cristianismo junto aos diversos
segmentos católicos da sociedade, e conter a disseminação
desenfreada do escolanovismo entre o professorado.
Segundo Schueler (2005) um dos veículos de comunicação e de debates entre
professores, autoridades e famílias, significava um trabalho de reunião e agrupamento
de diferentes membros do magistério, consolidando um dos sprits de corps. Tal aspecto
acabava por condenar divergências, conflitos e embates internos de grupos e
associações de professores, o que provocava o aparecimento de diversas publicações
pedagógicas que polemizavam entre si, “disputando a hegemonia de rumos para
constituição da docência” (SCHUELER, 2005, p. 382)
Em relação à utilização do periódico como fonte, de acordo Le Goff (2003), foi
através da criação da revista Annales, por Lucien Febvre e Marc Bloch em 1992, que a
imprensa passou a ser utilizada como fonte inovadora de pesquisa no campo
educacional. Isso proporcionou uma visão ampliada das fontes permitindo “uma nova
forma de ver e escrever a história” e, ainda, “uma grande revolução documental”, já que
se passou a utilizar não apenas escritos, mas “de tudo que o homem diz ou escreve, tudo
que fabrica o que toca pode e deve informar sobre ele” (LE GOFF, 2003, p.107).
Integrada a outros materiais que dão suporte a pesquisas e reflexões de diversas
áreas, a imprensa tem sido tomada como fonte e objeto de estudos transformando-se
muitas das vezes no foco do trabalho. Sendo vista como autêntica narradora dos fatos e
da verdade (BARROS, MOREL, 2003, p.8).
Os impressos são considerados fontes históricas de pesquisa, pois, segundo Alves e
Guarnieri (2007), se entendem que tudo aquilo que foi produzido pela humanidade no
espaço, isto é, herança material e imaterial deixada pelos antepassados, serve de base
para a construção do conhecimento histórico.
Utilizado como fonte de pesquisa o impresso, podem conter características,
costumes e praticas de épocas diferentes expostas em suas páginas. Para Bastos (2002)
este vem sendo utilizado como fonte de pesquisa por vários pesquisadores na área
educacional, principalmente ao se pesquisar a historia da educação, pois no contexto
educacional, o mesmo pode se revelar rico em informações ao pesquisador, no regaste
dos discursos pedagógicos, praticas educacionais do cotidiano, da ideologia oficial e do
corpo docente, pois atua como um dispositivo de orientação do magistério, sendo um
guia educacional prático do dia a dia do professor. Nas palavras do autor, o impresso
possibilita em “um testemunho vivo dos métodos e concepções pedagógicas de uma
época e da ideologia moral, política e social de um grupo profissional, sendo um
excelente observatório” (BASTOS, 2002, p.49).
Le Goff (2003) esclarece como deve ser feita a coleta de informações de uma
determinada pesquisa, comparando o historiador com um químico ao dizer que:
não pode procurar na imaginação ou na lógica;procura-os e atinge-os
através de uma observação minuciosa dos textos, como um químico
encontra os seus, em experiências minuciosamente conduzidas(...) O
melhor historiador é o que se mantém mais perto dos textos, que os
interpreta com mais correção, que só escreve e pensa segundo eles
(LE GOFF, 2003, p.106 -107)
Ressalta ainda Vidal (2008) sobre o importante papel do pesquisador em utilizar de
um critica profunda e um rigor metodológico, não devendo ser ingênuo e procurar
constatar clareza, informações sobre os homens que as produziram. “O documento não é
neutro e sim intencional, por isto compete ao pesquisador levar em conta sua
subjetividade e intencionalidade” (VIDAL, 2008, p.4)
Nóvoa (2002) apresenta três razões para se utilizar a impressa como fonte
pesquisa. Segundo ele a primeira diz respeito ao fato que “a impressa é o melhor meio
para aprender a multiplicidade do campo educacional” (NOVOA, 2002, p. 12). De fato
a impressa não discute apenas uma faceta do processo educacional, mas sim todo o
processo, tanto no interior da escola como o cotidiano do aluno. Inserindo em sim uma
diversidade de informações ligada a todos os componentes do processo educacional.
A segunda razão seria que “a natureza da informação fornecida pela imprensa,
que lhe concede um caráter único e insubstituível” (NOVOA, 2002, p.13). Entendemos
que a imprensa educacional, tanto um jornal como uma revista, busca a todo o momento
uma interligação da teoria educacional com a pratica escolar.
A imprensa é, talvez, o melhor meio para compreender as dificuldades
de articulação entre a teoria e a pratica: o senso comum que perpassa
as páginas dos jornais e das revistas ilustra uma das qualidades
principais de um discurso educativo que se constrói a partir dos
diversos actores em presença (professores, alunos, pais, associações,
instituições, etc.) (NÓVOA, 2002, p.13).
A terceira razão, que para o autor é de grande significado, evidencia que a
imprensa é como um “lugar de afirmação em grupo e de uma permanente regulação
coletiva, na medida em que cada criador está sempre a ser julgado, seja pelo o publico,
seja por outras revistas, seja pelos próprios companheiros de geração” (NÓVOA, 2002,
p.13). Contendo sempre espaço onde o leitor manifesta a sua indignação ou satisfação
sobre determinado assunto, contendo um dialogo onde juntos buscam melhorias junto
ao poder publico.
Além destas três razões postas por Nóvoa (2002), Catani (1996) norteia duas
diretrizes para se desenvolver e trabalhar com e a partir da imprensa. Segundo a autora,
a primeira,
investigando e estabelecendo uma historia serial e repertoria analíticos
destinadas a informar sobre o conteúdo do periódico classificando-os,
registrando seu ciclo de vida, predominância ou recorrências temáticas
e informações sobre produtores, colaboradores e leitores, entre outros
dados. (CATANI, 1996, p.118)
Tomando como base esta diretriz, pode-se afirmar que a impressa funciona
como ponto de partida em uma investigação analítica sobre os conteúdos a serem
pesquisados, contendo parecer sobre diversas informações dos seus autores e também
dos seus leitores.
A segunda diretriz mostra que o pesquisador deverá
tomá-los como núcleo informativo, enquanto características
explicitam modos de construir e divulgar o discurso legitimo sobre a
questão de ensino e o conjunto de prescrições ou recomendações sobre
formas ideais de se realizar um trabalho docente (idem, ibidem).
Podermos dizer, desse modo, que através das informações contidas na imprensa,
constroem e expressam representações sobre fatos, dentro de um determinado contexto
e conflitos no caso educacional, permeado em torno dos sujeitos educacionais.
Outro ponto do importante a se destacar sobre a pesquisa de uma fonte como a
imprensa, é que o pesquisador deverá a buscar o que está contido, e não explicito, no
conjunto em todo da revista ou do jornal, entre os meios utilizados pela imprensa.
(GONÇALVES NETO, et al, 1999). Complementando esta ideia, Alves e Guarnieri
(2008) nos afirma que a utilização do impresso como fonte de pesquisa requer uma
análise detalhada do lugar de inserção, não se determinado apenas em um artigo ou
texto isolado, por mais importantes que sejam, sendo necessário uma descrição
detalhada da fonte que ajuda a conhecer e auxiliar o pesquisador no processo de análise.
Um instrumento de pesquisa que se apresenta de grande importância para a historia da
educação, como fonte, deve se submeter ao “crivo de uma adequada critica documental”
(BASTOS, 2002, p.49)
A análise do impresso se faz essencial, já que o mesmo está como uma pratica
social, funcionando em varias espaços temporais, pois capta, transforma e divulga
acontecimentos e opiniões e idéias da atualidade, e assim se faz legitimar enquanto
passado, se tornando memória, fazendo com que a leitura desses mesmos fatos no
presente, e no futuro como fonte de pesquisa Educacional (BASTOS, 2002).
Para Caspard e Caspard (2002) a impressa pedagógica é uma mídia muito mais
interativa que os tratados ou os manuais e dessa maneira se torna um dos melhores
observatórios do movimento social na obra da escola e da formação do professor.
Catani também valoriza a imprensa educacional como fonte de pesquisa
afirmando que,
De fato, as revistas especializadas em educação, no Brasil e em outros
países, de modo geral, constituem uma instância privilegiada para a
apreensão dos modos de funcionamento do campo educacional
enquanto fazem circular informações sobre o trabalho pedagógico e o
aperfeiçoamento das práticas docentes, o ensino especifico das
disciplinas, a organização dos sistemas, as reivindicações da categoria
do magistério e outros temas que emergem do espaço profissional [...]
(CATANI, 1996, p.117).
Contudo, a revista pedagógica se faz necessária como fonte de pesquisa, por se
aproximar de uma realidade contida em tempos passados. Silva (2006) enfatiza que essa
fonte é um meio de comunicação dinâmico e atualizado, que transmite informações, e
representações que circula no tempo mesmo dos acontecimentos, com eles dialogando e
neles interferindo, aproximando-nos de concepções historiográficas recentes que têm
valorizado as manifestações culturais e sua abordagem com base nesse tipo de fonte.
Contendo informações importantes da área educacional. Fazendo com que o passado se
faça presente buscando ser como um “dispositivo privilegiado para a reflexão sobre o
modo de produção do discurso sobre ser docente e como mecanismo de formação
continua” (BASTOS, 2002, p.73)
RBEP E SUA ORGANIZAÇÃO EDITORIAL
Em 1938, o governo brasileiro implanta o Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira 3 (INEP), órgão responsável por promover
pesquisas estudos, levantamentos e a divulgação de resultados de pesquisas e novas
concepções educacionais. Desde a sua criação, o INEP uma série de boletins dedicados
à organização administrativa do ensino em cada Estado. Atendendo a sugestão do
Ministro da Educação, Gustavo Capanema 4 , o Prof. Lourenço Filho elaborou o plano da
Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, sendo o primeiro número editado pela
Imprensa Nacional em julho de 1944, inspirado em sua apresentação gráfica no boletim
do Bureau Internacional do Trabalho. A revista dava-se ênfase aos problemas de
organização administrativa e pedagógico, sua democratização, seu planejamento,
espalhando-se na seqüencia dos fascículos as preocupações da educação brasileira e as
tentativas do esforço publico em encaminhar as soluções que o crescimento
demográfico e as responsabilidades nacionais (RBEP, 1965, nº100, v.44, p.7-8)
A periodicidade da RBEP na sua fundação seria mensal, ou seja, doze revistas
por ano, com a gestão de Murilo Braga (1946-1952), tornam-se trimestral, sendo
publicados quatro fascículos por ano, perdurando-se até na década de 1970 que passou a
ser quadrimestral. (ROTHER, 2005, p. 193).
Segundo Rother (2005, p. 206) o leitor da revista seria um leitor “imaginário”,
que seguindo suas analises nos editoriais da revista, chegou-se a conclusão que seriam
“os formuladores/”implantadores” de política educacionais, visando a compreensão da
história da educação e modelos educacionais”.
3
Anísio Spínola Teixeira (Caetité, 12 de julho de 1900 — Rio de Janeiro, 11 de março de 1971)
foi um jurista, intelectual, educador e escritor brasileiro. Personagem central na história da
educação no Brasil, nas décadas de 1920 e 1930, difundiu os pressupostos do movimento da
Escola Nova, que tinha como princípio a ênfase no desenvolvimento do intelecto e na
capacidade de julgamento, em preferência à memorização. Reformou o sistema educacional
da Bahia e do Rio de Janeiro, exercendo vários cargos executivos. Foi um dos mais
destacados signatários do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, em defesa do ensino
público, gratuito, laico e obrigatório, divulgado em 1932. Fundou a Universidade do Distrito
Federal, em 1935, depois transformada em Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade
do Brasil
4
Gustavo Capanema, Ministro da Educação de 1937 a 1945, foi responsável por uma série de
projetos importantes de reorganização do ensino no país, assim como pela organização do
Ministério da Educação em moldes semelhantes ao que ainda é hoje.
Os números da RBEP, dos anos de 1960 a 1965, sofreram alteração em sua
direção. Até número 94, publicado no ano de 1964 permaneceu Anísio Spínola Teixeira
como diretor, a partir do número 95 passou a ser Carlos Pasquale diretor do INEP,
mudando as divisões de assuntos tratados na revista, para um só departamento chamado
de conselheiros de redação, sendo redator chefe Jader de Medeiros Brito.
A Revista Brasileira de Estudos pedagógicos, em seu primeiro número, no ano
de 1944, se dividia por cinco seções primarias e quatro secundárias.
Quadro 1: seções da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos
Fonte: Rother (2004)
Conforme o quadro acima a revista se dividia em seções sendo estas: Editorial,
Idéias e debates, Documentação, Vida Educacional que tinha como subseções,
informação dos Estados, informação do estrangeiro, Bibliografia, Através de revistas e
de Jornais e por ultimo os Atos oficiais. Ao longo dos anos algumas seções sofrerão
alterações nos seus nomes.
A seção editorial tinha como intuito de expressar a opinião dos redatores da
revista sobre determinado tema que aflige a educação dentro do contexto presente da
revista que são discutidas ao longo de suas paginas. Em uma de suas seções editorial
intitulada como “A educação comum do homem moderno” o redator expressam
claramente a sua opinião e influência o leitor a pensar em uma educação melhor, onde
devermos ser seres pensantes ao afirmar que “O método experimental de pensar abria,
com efeito, uma era nova no pensamento humano.”.
Na parte da revista destinada a publicação de artigos, conferências, transcrições
de artigos do exterior e eventualmente discursos de autoridades brasileiras se nomeava
Idéias e Debates sofrendo alterações no seu nome, início dos anos 60, passando a se
chamar Estudos e Debates, normalmente publicados em cada número quatro a cinco
artigos sobre um assunto comum entre eles, e em sua maior parte comum também o
editorial.
Logo após vem a seção documentação que tinha como finalidade, publicar em
cada número quatro documentos importantes e significativos para a educação brasileira,
além de relatórios de pesquisas.
Uma parte da revista era dedicada à seção Notas Para a História da Educação,
antes com o nome de Vida Educacional, que tinha como objetivo divulgar
acontecimentos marcantes, de acordo com informações recebidas pela Inep, para
historia da educação. A existência desta seção foi justificada que “uma vez procuramos
oferecer aos leitores elementos para a compreensão objetiva das transformações
ocorridas em nosso pensamento educacional” (RBEP, 1960,nº79, p.108)
Na seção Notas para a Historia da Educação tinha como subseções Informações
do Estado que se passou a chamar de Informações do País e Informações do Estrangeiro
eram duas seções que se preocupavam em divulgar os acontecimentos ocorridos como
campanhas, reformas, novidades educacionais em torno da educação. Uma em os fatos
ocorridos em todos os estados brasileiros, e a outra em todo o mundo. E com estas duas
seções o governo brasileiro tentava mostrar os diferentes tipos de ensino, tanto dentro e
fora do país, tomando-se como um intercâmbio de informações educacionais.
Na subseção Bibliografia que se passa ser chamada de Livros, é apresentado
criticas e resenhas de alguns livros e na parte de Através de revistas e jornais era
destinada a transcrições de pequenos artigos publicados em revistas e jornais dedicados
a educação muitos deles de outros países.
Nos atos oficiais, a intenção eram reproduzir decretos, portarias e atos mais
importantes anteriormente publicados nos diários oficiais estaduais e federais do
governo em relação à educação e a cultura referente ao ano de publicação da revista.
Esta divisão por seções permaneceu no período aqui analisadas de 1959-1965,
segundo Rother (2004) somente a partir do v. 45, n. 101 (jan/mar 1966) que algumas
seções secundárias deixaram de serem publicadas regularmente.
A RBEP tem conseguido um lugar de unanimidade, entre os especialistas,
quanto ao seu lugar privilegiado e impar no campo de divulgação tanto legislativo-
normativo da área, quanto dos estudos e debates das grandes questões da educação
nacional. (SGUISSARDI, SILVA JR, 1998, p. 97)
A REVISTA COMO PROPAGAÇÃO DE UM PROJETO EDUCACIONAL
Os temas mais diversos sobre educação foram discutidos nas páginas dos fascículos
do período de 1959 a 1965 da RBEP. Esse impresso pedagógico “realizava discursos e
contribuía diretamente para o processo de subjetivação do leitor”(GONDINHO, 2009,
p.7) por trás de cada periódico encontravam-se nas entrelinhas as marcas de um fazer
pedagógico e de um disciplinamento metodológico das concepções de educação ali
descritas.
A RBEP, de acordo com Rothen (2004), exerceu grande influência de Anísio
Teixeira durante o período de 1952 a 1971. O autor em questão subdividiu esse período
em dois: de 1951 a 1961, que é marcado pelo debate da LDB/61; e o de 1962 a 1971,
que é marcado pela discussão da Reforma Universitária e do ensino de 1º e 2º graus. No
Mas além desses dois temas de grande influência, no período de 1960 a 1965, tomado
nesta pesquisa como objeto de análise, a revista trouxe em suas paginas debates
relacionados à Filosofia Educacional, Ensino Primário, Ensino Secundário e Médio,
Formação de Professor, Analfabetismo no Brasil, Desenvolvimento e a Educação no
Brasil e em outros Países.
A RBEP discutia ao longo de suas paginas assuntos de interesse educacional,
projetos de leis, leis, atos oficiais que de alguma forma modificavam o desenvolvimento
da educação nacional. Um projeto bastante discutido em suas paginas no inicio da
década de 60 foi a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, publicando artigos
que criticam as supostas mudanças que a lei pode trazer a sociedade. Em um artigo da
revista numero 79 com o titulo Liberdade de Ensino de Roque Spencer Maciel de
Barros podermos perceber a insatisfação do autor a LDB ao dizer:
Na ingrata tarefa de justificar o projeto de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional aprovado pelo Congresso, teimam os seus
defensores em insistir que êle institui no País a "liberdade de ensino" e
que seria, nesse sentido, uma espécie de carta magna do liberalismo,
em matéria pedagógica. (MACIEL, 1960, p. 16)
Podermos perceber criticas em vários artigos sobre esta suposta “liberdade” na qual os
defensores da LDB diziam ter. Em outro artigo, no mesmo numero, na seção de “Através da
Revistas” podermos perceber a postura dos editores da revista em relação a este projeto de Lei.
Por mais que queiram escamoteá-la com sofismas e mistificações, a
verdade, pois é que o Projeto de Diretrizes c Bases, aprovado pela
Câmara de Deputados, é, nas suas disposições, e será nas suas
consequências, a destruição do ensino público, trama com o mais
desabusado desrespeito aos princípios democráticos e a mais
completa ignorância, real ou dissimulada, de fatos que são de uma
evidência agressiva e correspondem a três aspectos, — histórico,
político e cultural, — da questão. (AZEVEDO, 1960, p.205)
Foi possível identificar nas páginas dos fascículos analisados da RBEP o
posicionamento dos editores em defender a escola publica, sendo totalmente contra
LDB que pregava a liberdade de criações de escolas particulares.
Os editores da RBEP se posicionam contrários à visão de que a Reforma
Universitária deveria ser realizada mediante á atos legislativos. Diante da promulgação das legislações referentes à Reforma
Universitária, os editores da Revista procuram conciliar posição
contrária à Reforma Educacional mediante legislação e com o fato de
que legislação que estava sendo elaborada tinha forte influência do
CFE (ROTHER, 2004, p. 158).
Grande parte dos artigos sobre a educação superior cobrava a necessidade de a
universidade responder as exigências postas pelas novas realidades sociais. Como cita
Paulo de Goés, em seu artigo publicado na RBEP intitulado “Aperfeiçoamento do
Sistema Universitário Brasileiro”
As nossas Universidades foram criadas artificialmente por atos legais,
reunindo institutos isolados, sem qualquer vínculo, nexo ou tradição
de intercooperação, resultando daí arquipélagos culturais, cada uma de
suas ilhas — as faculdades ou escolas — continuando a funcionar com
métodos próprios e independentes. É óbvio que o artificialismo dos
seus estatutos jamais poderia ter o mágico poder de superar aquele
vício primitivo de insulamento. (GOÉS, 1965, nº97, p.15)
Um dos motivos os quais que a RBEP se posicionava contra a reforma da
Universidade Brasileira seria que as Universidades não teriam condições de cumprir
com os critérios estabelecidos pela Reforma.
A Filosofia de Dewey 5 era uma filosofia educacional seguidas pelos editores da
RBEP. Em suas revistas através de artigos os redatores buscavam valorizar e transmitir
esta idéia educacional do filosofo americano. Em um artigo na seção “Ideias e Debates”
são notórios esta necessidade por parte da RBEP em transição deste pensamento
educacional ao que:
E porque o impacto revolucionário de suas idéias filosóficas,
pedagógicas e sociais sobre sua época não amortece ainda, falta-nos
precisamente esta distância no tempo, que é a condição necessária
para emitirmos um julgamento sereno e equilibrado sobre a
ignificação e alcance de uma obra verdadeiramente excepcional como
a sua. (SUCUPIRA, 1960, p.78)
O Ensino Primário era um tema amplamente discutido nas paginas da RBEP,
basicamente em cada numero dos anos de 1960 a 1965, eram publicado algo
relacionado a este ensino. A educação primaria no Brasil tinha como duração 4 anos e
tinha como objetivo ensinar, apenas, a escrever, ler e contar, um papel que lhe cabia em
uma sociedade em que a família e a religião complementavam a educação. Sendo uma
escola que não correspondia às exigências de uma sociedade. A RBEP publicava artigos
onde os autores em sua maioria criticavam a escola primária brasileira, no sentido que
as escolas deveriam formar para a vida em sociedade, ensinar as crianças de acordo com
a sua realidade. Em um artigo com o titulo “O ensino primário Paulista” de Renato
Jardim Moreira é possível perceber a alegria do autor com o investimento em
construção de mais edifícios educacionais e ao mesmo tempo uma decepção com o
governo de São Paulo ao dizer que:
É necessário que o Governo se proponha também um programa
para sanar as falhas de um ensino que se ajustou a condições
precárias — o ensino que pode ser ministrado em escolas de três
5
John Dewey (Burlington , Vermont , 20 de Outubro de 1859 — 1 de Junho de 1952 ) foi um filósofo ,
pedagogo e pedagogista norte-americano .É considerado o expoente máximo da escola progressiva
americana
horas diárias e menos não pode ser o mesmo de uma escola de
quatro horas. É preciso pensar em formar o professor, orientar o
trabalho escolar, reformular programas e currículos e preparar
material didático de acordo com as novas conquistas da
pedagogia e para atender às necessidades de uma sociedade cujo
desenvolvimento se acelera cada vez mais. (MOREIRA, 1960,
nº 80, v.34, p.231)
O ensino secundário no Brasil era um tema bastante discutido também como o
ensino primário brasileiro pelas Revistas Brasileiras de Estudos Pedagógicos, este
ensino segundo Jaime Abreu em um artigo publicado na revista com o titulo “Ensino
Médio em Geral e Ensino Secundário”, era uma preparação sem nenhuma finalidade
especifica a si mesmo para o ensino superior, passando então a ser dividido em quatro
tipos de níveis médios, o ensino industrial destinado a classes desfavorecidas, o ensino
comercial que correspondia a necessidades mais vividas e sentidas na estrutura
ocupacional brasileira, sendo uma escola secundária de segundo plano, o ensino
agrícola de nível médio não chegou a atingir 0,5% das matrículas por não encontrar
equilíbrio entre a estrutura e a finalidade e as necessidades sentidas no setor especifico
de atividade a quem deve servir e a ultima escola normal, o preparo para o nível
superior. Jaime Abreu faz uma reflexão sobre a escola secundária brasileira,
Reflita-se como a escola secundária brasileira, montada
historicamente como instituição propedêutica para uns poucos
candidatos aos estudos de nível superior, viu, impassível, o engrossar
progressivo de suas fileiras com o afluxo de camadas populares à sua
clientela, permanecendo surda e cega às novas e multiformes
exigências da maioria do seu discipulado, tão diferente do de outróra.
(ABREU, 1961, p. 15)
Podermos perceber uma critica quando a mudança ocorrida que para Jaime
deveria ter tido uma mudança completa, sendo que a sua clientela mudou, não
ocorrendo isto por parte do governo. Além desde artigo de Jaime sobre o ensino
secundário ao longo das RBEP existem documentos, artigos de jornais e revistas além
dos artigos na seção Idéias e Debates sobre este tema, no sentido de criticar, valorizar e
informar os acontecimentos e mudanças neste ensino.
A formação de professores para os ensinos primários e secundários era de suma
importância a Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, em cada artigo sobre ensinos
primários e secundários, os autores mostravam esta preocupação com a formação do
professor para a educação brasileira, além de ser um tema discutido dentro desses
assuntos, em suas paginas em seções de documentação a RBEP informava seus leitores
professores das mudanças ocorridas em sua formação.
Merece destaque a recomendação aprovada com relação ao na
treinamento de professores, em que se solicita especial atenção ao uso
do método científico análise de fatos e idéias, ao estudo de ciências
sociais para provê-los da compreensão necessária às mudanças sociais
e econômicas, ao conhecimento da dinâmica de grupo, ao treinamento
em técnicas de pesquisa educacional. ( ABREU, 1962,n 87, p.40)
Na RBEP de numero 100, percebe-se uma preocupação em relação ao
analfabetismo brasileiro, constatado que cerca de 39,5% da população pelo censo de
1960 eram analfabeta. A revista como meio de comunicação transmite estes dados aos
seus leitores e por meio de artigos e documentos informam sobre possibilidade desta
erradicação do analfabetismo no Brasil. Na comunidade rural brasileira é onde se
concentra maior parte desta taxa de analfabetismo. Seguido isto propõe a RBEP:
As áreas rurais atrasadas do Brasil o são em virtude do
subdesenvolvimento de várias de suas regiões. Desde que o processo
de desenvolvimento social, econômico e político do país se acelere,
isso terá reflexos naquelas áreas, possibilitando maior funcionalidade
social da escola e, conseqüentemente, não só a sua aceitação, mas
também a sua procura. (MOREIRA, 1965, p. 249)
Percebermos claramente neste trecho que o Brasil se desenvolve juntamente com
a educação, sendo ela um dos requisitos principais para o país deixar de ser
subdesenvolvido. Este assunto de Desenvolvimento brasileiro e Educação é um tema
decorrente de todos os números da RBEP analisados aqui neste estudo. É perceptível
em todos os números ter um artigo sobre o desenvolvimento e educação. Em um artigo
de Jaime Abreu, ele esclarece o que é desenvolvimento dizendo que:
Entendemos desenvolvimento como a resultante do funcionamento da
correlação estrutural, interdependente nos vários planos que o
formam, sejam eles o político, o econômico, o cultural, como
componentes integrados que são do processo social global. Vem êle a
se constituir assim numa crescente racionalização do processo
histórico-social de uma comunidade. (ABREU, 1963, p.10)
Sendo neste sentido, a educação como um alvo predominante de um
desenvolvimento de um país, tomando ela como eixo roteador que liga a cultura, a
política e o setor econômico.
O tema educação em outros países consistia em praticamente em todos estes
assuntos tidos anteriormente. A educação do Brasil sofria influência de muitos países
desenvolvidos, como a Rússia, Estados Unidos, França entre outros. Em seções da
revista como informação do estrangeiro, a RBEP tinha como objetivo mostrar a
educação no exterior, com o intuito de impulsionar o Brasil na educação. Muitos
projetos estabelecidos no país vieram de uma experiência positiva de outros países,
como a LDB que veio dos Estados Unidos. Em relação à educação primária sofre
influência da educação na Rússia:
É interessante salientar aqui a importância que vem sendo dada pela
educação atual da Rússia — cujos resultados estão aí à prova no seu
estupendo desenvolvimento tecnológico, — a uma disciplina séria de
estudos a que são levados seus educandos. Importância em que se quer
descobrir um acentuado gosto tradicionalista, por isso, condenável.
(FREIRE,1961, p. 30)
A educação na década de 60 sofre bastante influência da educação de outros
países, o que podermos perceber ao longo das paginas da RBEP.
Segundo Sguissardi e Silva Júnior (1998) Inep vem cumprindo o seu papel com
o estado: subsidiar a produção de políticas educacionais e, ao mesmo tempo,
influenciando o pensamento educacional brasileiro, através de diagnósticos, estudos e
publicações, entre as quais a RBEP ocupou sempre um lugar de destaque. Tornou se um
“espaço editorial de mediação entre o Estado e a sociedade
civil, ora aproximando-se mais de um, ora de outra, num
processo sempre complexo e contraditório, em razão da maior
ou menor força daquele e do maior ou menor grau de
organização desta, em especial dos movimentos políticoeducacionais.” (SGUISSARDI; SILVA JÚNIOR, 1998, p.96-97
)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Concluímos que a análise da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos revelou
a necessidade dos meios impressos como objeto histórico, contendo conteúdos que
marcaram a educação brasileira da década de 1960. Assim a necessidade da pesquisa
em impressos bem como objeto de estudo, se faz essencial, já que o mesmo consiste e,
concomitantemente, faz circular práticas sociais, funcionando em vários espaços e
tempos, pois, capta, transforma e divulga acontecimentos e opiniões. Ademais,
enquanto fonte de pesquisa, a revista consiste em materialização da memória, pois
corresponde a um tipo de registro histórico de um espaço-tempo e proporciona ao
pesquisador a leitura destes mesmos como fatos no presente.
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