76 Considerações acerca da contribuição de Foucault para a teoria do Poder Constituinte José Mauro Garboza Junior Graduando em Direito pela Universidade Estadual do Norte do Paraná - UENP Palavras-chave: Relações de poder. Michel Foucault. Poder constituinte. Há 25 anos, foi promulgada a nova Constituição da República Federativa do Brasil, a “Constituição Cidadã”, que ficou conhecida pela valorização dos direitos fundamentais e estruturada por uma principiologia irradiante penetrando em todos os ramos do Ordenamento Jurídico. Mas será a Carta Magna o conjunto de normas que tem por finalidade o bem comum do Estado Democrático de Direito? A intenção primordial do presente trabalho é tentar, de alguma maneira, absorver os conhecimentos de Michel Foucault (1926-1984) para o mundo jurídico no que diz respeito à teoria do poder constituinte; além de servir como pequeno fomento a discussões posteriores acerca da contribuição de conteúdo que poderá ser adicionado ao grande campo Constitucional. Para isso, é necessário deixar claro alguns conceitos básicos como, por exemplo, caracterizar esse poder, explanar sua função e finalidade, bem como seus atributos e sua natureza (formação e legitimidade), além de suas limitações. Foucault foi um filósofo e psicanalista francês que ficou conhecido nas décadas de 70 e 80 lecionando no Collège de France com a cátedra de História dos Sistemas de Pensamento pela sua extensa linha de pesquisa: o modo como o ser humano (termo muito utilizado em sua obra como corpo humano) consegue e está apto para ser disciplinado e se acostumar com isso, ou seja, como funciona o Poder dentro das relações humanas e quais as suas consequências nesse contexto. Foucault costuma trabalhar com um método chamado genealogia, ou seja, ele traça, a partir de materiais históricos, a origem, os fundamentos e as estruturas de causa e efeito de uma instituição social dentro de um determinado contexto, é em razão disso que, embora o autor nunca tenha tratado estritamente da questão da Ciência Jurídica, muito pode ser discutido já que o assunto da dinâmica do poder foi estudado por muitas facetas incluindo, 77 por meio de analogias, elementos jurídicos e até a problemática do Poder Constituinte. Ele nasce de uma necessidade de se legitimar, ou seja, surge como poder invencível, insubordinado e ilimitado. Não existe norma superior alguma para exercer uma força hierárquica. Dentro dessa grande acepção, o caráter idealista denota um sentido transcendental a maneira de Kant cujo princípio poderia ser descrito: todo homem é capaz de raciocinar e, portanto, todos os homens têm algo em comum em todas as partes do mundo, isso faz que haja uma espécie de homem transcendental. Transpondo esse entendimento para a norma, todo e qualquer poder que não esteja ligado a outro extrapola os limites do campo real (transcendental) e ideal. A posição predominante é essa. Sendo assim, o resultado das forças “invisíveis” de normalização incutido em cada elemento humano inserido no grupo de uma Constituinte qualquer e a carga de domesticação aplicada neles faz que toda a sua luta de interesses esteja voltada para essas tais forças. Em outras palavras, pode ser tratado como um espaço onde as micro-relações exercem um papel fundamental, quer dizer, um lugar de tensão constante entre interesses simultaneamente individuais e coletivos; Individuais, pois cada membro pertencente da Assembleia Constituinte (no caso do Brasil que adotou a teoria do Congresso Constituinte) tem interesses próprios e vão se utilizar de artifícios para impor os poderes e marcar de certa força a Constituição vindoura, portanto, o Político Constituinte se comporta como uma pessoa qualquer, sem a carga de responsabilidade de representatividade. Já que o Poder Constituinte Originário não pressupõe (em termos) nenhum outro poder anterior e criador que se deva ser seguido, as únicas relações entre o indivíduo e as novas propostas da Constituinte são as forças normalizadoras dele próprio, defendendo, assim, os interesses das forças que o estruturaram e o tornou um “ser humano”. Por outro lado, no viés coletivo, ele se pauta em princípios e condutas respeitando um interesse mais alienado, ou seja, representa uma parcela da sociedade e com essa parcela consegue se justificar perante as próprias propostas na formação de uma Constituição. Cada Político Constituinte foi eleito e, em tese, deveria representar uma parcela dos seus votos uma vez que a democracia se faz, nesse instrumento de poder, indiretamente. Dentro do debate proposto pela integração da teoria de Foucault dentro do Poder Constituinte, podemos observar, com base no que foi exposto acima, uma aproximação entre o Direito com as demais disciplinas das ciências humanas. Há algum certo tempo, era inimaginável pensar numa abertura para a discussão científica visando adicionar 78 conhecimento para ambas as disciplinas interlocutórias; atualmente, os juristas buscam muito mais resolver problemas ante uma posição conservadora impotente. REFERÊNCIAS: FOUCAULT, Michel, A verdade e as formas jurídicas. Tradução Roberto Cabral de Melo Machado e Eduardo Jardim Morais, supervisão final do texto Léa Porto de Abreu Novaes... et al. Rio de Janeiro: NAU Editora, 2002. FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Organização e tradução de Roberto Machado. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979. NIETZSCHE, Friedrich Wilheim. Nascimento da Tragédia. (tradução de J. Guinsburg); São Paulo: Companhia das Letras, 1992. NIETZSCHE, Friedrich Wilheim. Genealogia da Moral. (tradução de Paulo César de Souza). São Paulo: Companhia das Letras, 1999. RAMOS TAVARES, André. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. BONAVIDES, Paulo. Direito constitucional. 3ª ed. Rio deJaneiro: Forense, 1988. SALDANHA, Nelson. Poder constituinte. São Paulo:Revista dos Tribunais, 1986. SIEYÈS, Emmanuel. Qu’est-ce que leTiersEtat?. Quadrige/Press Universitaires de France, 1982. BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constituição Brasileira. 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