Soja
Rafael Moreira Soares – Embrapa Soja
Com força total
Com suas particularidades, a ferrugem asiática da soja vem apresentando focos
da doença nas diferentes regiões do país. Plantios de inverno sob pivô, que
formam a “ponte verde” para a safra de verão, são as áreas que apresentam
novamente a maior severidade da doença
C
om a maioria dos cultivos de
soja no país atingindo os estádios reprodutivos, alguns inclusive em fase de colheita, a ferrugem asiática,
como já era esperado, tem demandado atenção especial de técnicos e produtores para que
não cause prejuízos. Este ano, como nos anteriores, tem se caracterizado por situações particularizadas em regiões, estados e até em
municípios, não permitindo uma generalização sobre a atuação da doença.
O primeiro fato que chama a atenção, em
algumas regiões, foi o aparecimento antecipado da ferrugem entre 15 e 20 dias, em relação
30
à última safra. O principal fator que colaborou para isso foram as semeaduras antecipadas, visando o maior aproveitamento das áreas com safrinhas posteriores de culturas como
milho, algodão e a própria soja, dependendo
da região. Esses cultivos de soja, sob condições climáticas favoráveis, proporcionaram o
aparecimento precoce da doença.
O Sistema de Alerta do site da Embrapa
Soja (www.cnpso.embrapa.br/alerta) tem recebido diariamente dezenas de ocorrências
confirmadas pelos laboratórios participantes
do Consórcio Anti-Ferrugem, força tarefa coordenada pelo Ministério da Agricultura Pe-
cuária e Abastecimento. Até o dia 26 de janeiro, 588 ocorrências haviam sido registradas
no site, distribuídas em diversos estados, como
mostra a Tabela 1.
No Rio Grande do Sul, apesar da quantidade de chuvas abaixo do ideal e das altas
temperaturas, os produtores estão um pouco
mais aliviados por não estarem sofrendo com
estiagens severas como das duas últimas safras. Com isso, a ferrugem voltou a aparecer
com maior freqüência no estado, mas com baixa intensidade e predominantemente em unidades de alerta (parcelas semeadas mais cedo,
para detectar a doença). Isso leva a crer que
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apenas os cultivos mais tardios estarão sob risco
de sofrerem perdas pela ferrugem, caso o clima seja favorável. Considerando que cerca de
70% das lavouras ainda não chegaram ao estádio reprodutivo, é importante o monitoramento intenso das áreas.
Já em Santa Catarina, com a estiagem que
vem ocorrendo desde o final do ano passado e
colocou 95 municípios em situação de emergência, ainda não se têm relatos de ferrugem
nesta safra. Mas as chuvas das últimas semanas de janeiro, que melhoraram um pouco a
situação das lavouras, podem proporcionar o
aparecimento de focos.
No Paraná, novamente a doença apareceu em todas as regiões produtoras, caracterizando-se por uma alta incidência, mas baixa
severidade; esta última, em decorrência, principalmente, da estiagem que começou no final do ano passado. Alguns municípios ficaram até 30 dias sem chuva, e já se estimam
perdas de até 30% de produtividade em regiões do Oeste paranaense. Mesmo assim, existe a presença do fungo no ar, e as chuvas generalizadas na segunda quinzena de janeiro
podem aumentar consideravelmente a severidade da ferrugem. Dados da Emater-PR estimam que entre 50% e 80% das áreas, dependendo da região, já receberam pelo menos
uma aplicação de fungicida visando o contro-
le de ferrugem, oídio e/ou doenças Tabela 1- Estados com ocorrências de ferrugem registrados no Sisde final de ciclo.
tema de Alerta. Embrapa Soja, Londrina, 26 de janeiro de 2006
Em São Paulo, assim como no
Paraná, a ferrugem se mostra amEstados
Lavoura
Unidade
Irrigada
Soja
Total
plamente disseminada nos cultivos
Comercial
de alerta
voluntária
desta safra, tendo sido favorecida
MT
6
12
18
por chuvas ocorridas em dezemMS
186
28
214
bro e janeiro, e em muitos locais
MG
7
10
3
20
chegou mais cedo que na safra pasPR
108
34
7
149
sada. O aparecimento da ferrugem
GO
31
35
66
nos estádios vegetativos aumentou,
SP
56
11
7
74
conforme registrado no Sistema de
RO
32
32
Alerta. As temperaturas elevadas
TO
2
2
desde o início do ano, embora posMA
1
1
sam retardar o desenvolvimento do
RS
1
9
10
fungo, não têm sido suficientes
BA
2
2
para conter o avanço da doença.
Brasil
430
139
10
9
588
Na maioria dos casos foram realizadas duas pulverizações de funfocos da ferrugem asiática. Segundo profesgicidas, e provavelmente apenas nos locais de sores da Universidade de Rio Verde (Fesurv),
maior pressão de inóculo será necessária uma a semeadura, nesta safra, estendeu-se por um
terceira pulverização.
período maior que o habitual, sendo que as
Na região do Triângulo Mineiro em Mi- primeiras áreas semeadas já estão sendo conas Gerais, a ferrugem também está dissemi- lhidas. Para as cultivares precoces, na maioria
nada de forma generalizada, com relatos de das áreas, a produtividade superou as expecconstatação da doença aos 28 dias de cultivo. tativas com apenas uma aplicação de fungiciMesmo assim o controle está sendo feito de da. Como as condições climáticas foram exforma satisfatória.
tremamente favoráveis no mês de dezembro
Em Goiás, praticamente em todos os e início de janeiro, as cultivares plantadas mais
municípios produtores já foram detectados tardiamente receberam maior pressão de inó-
culo, e a ferrugem passou a ser detectada desde a fase vegetativa. Acredita-se que o número médio de pulverizações nas áreas semeadas
mais tardiamente chegue próximo a 3,5. Tudo
depende do clima nas próximas semanas.
O Mato Grosso do Sul até agora foi o estado com maior número de ocorrências regis-
tradas no Sistema de Alerta. Apesar de algumas regiões estarem sofrendo com estiagem,
em outras as condições climáticas têm sido
bastante favoráveis para a ferrugem. As altas
temperaturas do início do ano é que parecem
estar impedindo que ocorra uma epidemia
mais severa, e o desenvolvimento da doença
Fotos Rafael Moreira Soares – Embrapa Soja
A identificação da doença no início da
ocorrência continua sendo problema para
os agricultores nesta safra
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ainda está lento.
No Mato Grosso, assim como na safra
passada, é onde se têm os relatos da doença com maior severidade, mas de ocorrência localizada em alguns municípios. O
maior problema continua sendo os cultivos irrigados de inverno; embora tenha sido
feito um bom controle da doença em 2005,
a presença do fungo no final do ciclo acaba sendo inevitável, formando a “ponte verde” deste para a safra de verão. Houve casos de lavoura de verão, semeada mais cedo
visando fazer safrinha de algodão, em que
as plantas já estavam germinadas, enquanto ao redor ainda estava sendo colhida a
safra de inverno. Conseqüentemente, alguns produtores chegaram a fazer seis pulverizações de fungicidas, e mesmo assim o
controle não foi adequado. Espera-se que
com a instrução normativa aprovada pelo
governo do Mato Grosso em dezembro de
2005, proibindo o cultivo de soja durante
90 dias entre os meses de junho e setembro, esses casos não se repitam.
Num futuro próximo, essa medida pode
ser necessária em outros estados, já que, nessa safra, em São Paulo e Minas Gerais (região
do Triângulo Mineiro) as ocorrências da ferrugem em estádios iniciais da cultura estavam
relacionadas à área com cultivo de soja no inverno, sob pivô ou em áreas próximas a estas.
Outro problema sério é a descapitalização de muitos produtores, que não pos-
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suem recursos sequer para uma aplicação
e poderão perder sua produção. Embora o
Governo Federal tenha disponibilizado, em
janeiro, uma linha emergencial de crédito
no valor de R$ 200 milhões para custeio
do controle da ferrugem nos estados do
Centro-oeste, acredita-se que cerca de 80%
dos produtores não terão acesso a esse dinheiro por já terem atingido o limite de
crédito no Branco do Brasil.
Na Bahia, a falta de chuva tem retardado o desenvolvimento da ferrugem, e,
nos poucos focos identificados, a severidade da doença é baixa. Situação semelhante verifica-se no Tocantins e Maranhão.
De maneira geral, a situação da ferrugem no Brasil até o momento é semelhante ao que ocorreu na última safra: o aparecimento da doença de forma generalizada,
mas com grande dependência das condições climáticas para se desenvolver severamente; e a forte atuação de técnicos e
produtores no monitoramento e na aplicação de fungicidas, conseguindo um controle satisfatório da doença.
A principal dificuldade dos agricultores nesta safra, além da falta de dinheiro,
ainda é a identificação da doença no início
da sua ocorrência. Mas outro problema que
tem ocorrido é a avaliação incorreta feita
pelos produtores da eficiência dos fungicidas. O efeito dos produtos pode ser perce-
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bido sete a oito dias após a aplicação, e,
para verificar isso, é preciso coletar folhas
dos três terços da planta (inferior, médio e
superior). Essa coleta tem sido feita, em
muitas situações, apenas nas folhas do terço inferior, onde o produto não chega, ou
chega em menor quantidade, e as pústulas
permanecem viáveis, levando muitos produtores a acharem que o produto não foi
eficiente.
Para evitar esse e outros problemas
que podem levar a falhas no controle e
à perda de produtividade, o produtor
deve estar sempre em contato com a assistência técnica e se manter bem informado sobre a ocorrência da doença e
as condições climáticas da sua região e
C
do seu estado.
Rafael Moreira Soares e
Claudine Dinali Santos Seixas,
Embrapa Soja
Rafael e Claudine são fitopatologistas
que fazem parte da equipe do Sistema
Alerta da Embrapa
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