Anais do 48º Congresso Brasileiro de Cerâmica
th
Proceedings of the 48 Annual Meeting of the Brazilian Ceramic Society
28 de junho a 1º de julho de 2004 – Curitiba-PR
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AVALIAÇÃO DAS TENSÕES E DEFORMAÇÕES EM FERRAMENTAS
CERÂMICAS DE NITRETO DE SILÍCIO
M. A. Lanna, A. A. L. Bello, J. V. C. Souza.
Centro Técnico Aeroespacial, Instituto Tecnológico de Aeronáutica, Praça Marechal
Eduardo Gomes, 50 - Vila das Acácias
CEP 12228-900- São José dos Campos - SP – Brasil.
[email protected]
RESUMO
Durante o processo de usinagem por torneamento, a ferramenta de corte é
submetida a altas forças em sua aresta de corte. Estas forças geram gradientes de
tensão ao longo de toda a ferramenta e conseqüentemente deformações que
influenciam na eficiência do processo. Sabemos também que os materiais cerâmicos
possuem baixa capacidade de se deformar plasticamente. O presente trabalho
apresenta um estudo através de elementos finitos, utilizando o software MSCNastran, do campo de tensões e deformações presentes em ferramentas de nitreto
de silício sinterizadas por sinterização normal em atmosfera de nitrogênio. As cargas
utilizadas foram obtidas em operação de torneamento de ferro fundido cinzento. As
variações geométricas da ferramenta foram avaliadas em função dos parâmetros de
usinagem e assim feita a avaliação influencia na integridade dimensional da peça.
Palavras-chave: nitreto de silício, ferramentas cerâmicas, sinterização, elementos
finitos.
INTRODUÇÃO.
É de suma importância o conhecimento dos esforços atuantes na aresta de
corte durante o processo de usinagem, pois afetam a potência de corte, a
capacidade de obtenção de tolerâncias apertadas, a temperatura de corte e o
desgaste da ferramenta. A força de usinagem pode ser a responsável direta pelo
colapso da ferramenta de corte por deformação plástica da aresta de corte, além de
influenciar no desenvolvimento de outros mecanismos de desgaste.
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A força total resultante que atua na cunha de corte durante a usinagem é
chamada de força de usinagem (Fu). Como nem a direção e nem o sentido da força
de usinagem são conhecidos, tornando impossível medi-la e conhecer melhor as
influências de diversos parâmetros no seu valor, trabalha-se com suas componentes
segundo direções conhecidas. Assim, a força de usinagem é decomposta em três
outras forças, força de corte (Fc), força de avanço (Ft) e força de profundidade (Fp).
A força de usinagem pode ser considerada dependente de dois fatores
principais:
• a área de contato cavaco-ferramenta;
• a resistência ao cisalhamento do material da peça no plano de cisalhamento
primário e secundário.
Assim, qualquer parâmetro pode ser analisado com base nos seus efeitos
sobre estes dois fatores principais. Muitos deles irão atuar nos dois fatores e o
resultado dependerá da predominância de um sobre o outro. Apesar desta análise
ser de grande utilidade, a predominância dos fatores deve ser comprovada
experimentalmente [Machado e Silva, 1996].
A força de corte pode ser expressa pela Equação A, sendo Fc a força de corte,
Ks a pressão específica de corte e A a área da seção de corte.
Fc= Ks.A
[A]
A pressão específica de corte diminui com o aumento da seção de corte. Essa
redução de Ks é causada principalmente pelo aumento do avanço ( f ). Durante o
processo de formação do cavaco, parte do volume do material deformado da peça
não se transforma em cavaco, mas sim escorrega entre a superfície de folga e da
ferramenta, gerando o chamado fluxo lateral do cavaco, [Diniz 2000].
O nitreto de silício (Si3N4) é um material cerâmico com boas propriedades de
resistência à corrosão, ao desgaste e elevada resistência mecânica a altas
temperaturas. As boas propriedades combinadas com baixas densidade e
estabilidade química e dimensional fazem com que esse material seja de interesse
de uma vasta gama de aplicações em temperaturas elevadas. O nitreto de silício é
um composto covalente, com excelentes propriedades a altas temperaturas. A
1000°C o nitreto de silício ainda mantém sua dureza. Com o uso de velocidades de
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corte elevadas, a temperatura local pode chegar a 1000°C e a essas temperaturas
os metais possuem sua resistência reduzida [Mostaghaci, 1996]. Dos materiais
cerâmicos que contém nitrogênio na sua composição, o nitreto de silício e o sialon
são os mais importantes. As cerâmicas à base de nitreto de silício mantém a mesma
resistência ao desgaste que as cerâmicas brancas (Al2O3), com uma tenacidade
superior. Isto faz com que a aplicação destes materiais chegue ao fresamento, o que
pouco tempo atrás era inadimissível para as cerâmicas.
MATERIAIS E MÉTODOS.
No presente trabalho objetiva-se avaliar a influência dos parâmetros de
usinagem (avanço e velocidade de corte) nas tensões e deformações geradas na
aresta de corte em ferramentas cerâmicas durante o processo de torneamento.
Os corpos de prova utilizados no processo de usinagem foram barras de ferro
fundido cinzento FC-250, cilíndricas de 105 mm de diâmetro por 300 mm de
comprimento. As características do ferro fundido cinzento FC-250 e suas
propriedades estão apresentadas na Tabela 1. Os ensaios de usinagem foram
realizados em um torno de comando numérico computadorizado com potência de
6,5 Kw e rotação máxima de 3500 rpm equipado com um dinamômetro para
aquisição das forças de corte através de suas três componentes.
Tabela 1: Características do ferro fundido cinzento.
Propriedades
Parâmetros de
Forma da
Teor de perlita
Dureza
fabricação
grafita
(%)
(HB)
Padrão FC-25, 8h
100 % lamelar
100
223
Classe
250
Composição química (%)
C
Si
Mn
P
S
Mg
Cu
3,4-3,6
2,3-2,5
0,50-0,60
0,065 (max)
0,5-0,15
--
0,7-0,9
A Figura 1 mostra a micrografia do material usinado, obtidas em microscópio
ótico com aumento de 100x.
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a
b
Figura 1: Micrografias do ferro fundido cinzento, sem ataque (a) e com ataque de
nital 2% (b). Aumento de 100x.
As tensões e as deformações durante a usinagem em operações de
torneamento foram simuladas através do programa MSC-NASTRAN. Para a
simulação computacional, foram utilizados dados experimentais de forças de
usinagem e as propriedades de uma ferramenta produzida por sinterização normal
em laboratório. As propriedades da ferramenta utilizada nos testes estão
apresentadas na Tabela 2. Os valores de dureza, tenacidade à fratura e massa
específica foram obtidos experimentalmente, os demais valores foram obtidos
através da literatura. Estes valores foram utilizados como dados de entrada do
aplicativo MSC-NASTRAN.
Tabela 2: Propriedades do nitreto de silício [Low and Li, 1996].
Propriedade
Unidade
Valor
Dureza *
GPa
20,05
Tenacidade à fratura *
MPam0,5
6,45
Massa específica *
Kg/m3
3210
Coeficiente de Poisson #
---
0,26
Resistência à tração #
GPa
0,40
Resistência à compressão #
GPa
2,50
GPa
340,00
Módulo de Young
#
# Dados tabelados
* Dados experimentais
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Nas simulações dos carregamentos na aresta de corte, foram utilizadas as
condições de corte já realizadas em torneamento de ferro fundido cinzento. Os
parâmetros de corte foram variados e assim avaliada a sua influência nas variações
das tensões e deformações na aresta de corte. Para uma melhor avaliação da
influência dos parâmetros de corte no comportamento das tensões e deformações
foram utilizados quatro velocidades de corte e quatro avanços diferentes. Os
parâmetros de corte utilizados nos ensaios de usinagem estão apresentados na
Tabela 3.
Tabela 3: Parâmetros de usinagem utilizados nos testes.
Teste
1
Vc
f
(m/min) (mm/rot)
180
ap (mm)
0,12
1,00
Teste
Vc
(m/min)
ap (mm)
5
f
(mm/rot)
0.12
6
0.23
300
1,00
2
240
3
300
7
0.33
4
360
8
0.40
Vc= velocidade de corte, f= avanço e ap= profundidade de corte.
RESULTADOS E DISCUSSÃO.
A Figura 3 mostra a influência da espessura de corte (h) e da velocidade de
corte na pressão específica de corte. Como visto na figura, a pressão específica de
corte sofre uma grande redução para pequenos valores de espessura de corte (h=
0,12 a 0,20 mm), porém para valores maiores (h= 0,3 a 0,4 mm), essa redução é
bem mais suave. À medida que a espessura de corte, o fluxo lateral do cavaco é
relativamente menor, pois quase todo o volume de material deformado se transforma
em cavaco, fazendo com que a pressão específica de corte diminua. Com o
crescimento do avanço, aumenta a velocidade de avanço e conseqüentemente, o
coeficiente de atrito diminui, pois o corte se torna mais dinâmico, reduzindo assim o
valor de Ks.
Os valores da pressão específica de corte são bem mais estáveis do que com
a variação do avanço, apresentando pequenas variações. Em velocidades de corte
mais usuais, os valores de Ks tendem a diminuir levemente, segundo [Diniz, 2000].
Isso se deve à redução da deformação e da dureza do cavaco e também dos
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coeficientes de atrito que o aumento da velocidade de corte (e conseqüentemente o
3500
3500
Pressão específica de corte
Ks (N/mm2)
Pressão específica de corte
Ks (N/mm2)
aumento de temperatura) provocam.
Vc=300
ap=1
3000
3000
2500
2500
2000
2000
1500
f=0,12
ap=1
1500
1000
0
0,1
0,2
0,3
0,4
1000
120
0,5
Espessura de corte h (mm)
180
240
300
360
Velocidade de corte Vc (m/min)
420
Figura 2: Variação da pressão específica de corte (Ks) com a espessura de corte (h)
e com a velocidade de corte (Vc).
A Figura 3 ilustra o modelo adotado no aplicativo MSC-Nastran para a previsão
das tensões e deformações na pastilha cerâmica. A Figura 3a apresenta o modelo
com a malha antes da avaliação e na Figura 3b está ilustrado o modelo após a
simulação, com destaque para a deformação da aresta de corte. A força aplicada é a
resultante das três forças de usinagem (força de corte, força de avanço e força
passiva). A escala apresenta os valores das tensões no material durante o processo
de usinagem (está apresentada apenas uma condição de corte, para efeito de
ilustração). No modelo utilizado, considerou-se a força aplicada em um único ponto
da aresta de corte para efeito de simplificação.
FORÇA DE
USINAGEM
ESCALA
a MODELO INDEFORMADO
b
MODELO DEFORMADO
Figura 3: Modelo utilizado na simulação por elementos finitos antes e depois da
aplicação da força de usinagem.
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A Figura 4 mostra a influência dos parâmetros de usinagem nas tensões
geradas na ferramenta. Na Figura 4a, observa-se que o avanço tem influência direta
nas tensões geradas na ferramenta, com comportamento quase linear. O aumento
do avanço influencia diretamente no aumento da seção de corte, influenciando
diretamente nos valores de tensão. A Figura 4b apresenta a influência da velocidade
de corte nas tensões da ferramenta. Percebe-se que a variação de tensão é muito
pequena com o aumento de velocidade, mantendo-se estável para valores abaixo de
300 m/min. Em velocidades acima de 300 m/min a tensão começa a ter uma ligeira
queda, causada pelo aumento da geração de calor na interface ferramenta-peça,
causando a redução da resistência do material e tornando o corte ma fácil. Se
compararmos as duas figuras percebemos claramente que o avanço tem uma
influência muito mais significativa nas tensões do que a velocidade de corte.
350
650
Vc=300
ap=1
450
Tensão (MPa)
Tens ão (MPa)
550
350
250
300
f=0,12
ap=1
250
200
150
50
0
a
0,1
0,2
0,3
Avanç o f (mm/rot)
0,4
0,5
150
120
b
180
240
300
360
420
Velocidade de corte Vc (m/min)
Figura 4: Evolução da tensão com os parâmetros de corte.
A influência dos parâmetros de corte na deformação da ferramenta é
apresentada na Figura 5. O comportamento das tensões assemelha-se ao
comportamento das deformações. O aumento do avanço causa um aumento direto
na deformação do inserto cerâmico. A deformação possui uma variação muito
pequena com a variação do avanço da velocidade de corte, mostrado na Figura 5b.
Para uma grande variação da velocidade de corte, as variações das deformações
são mínimas, mantendo-se entre 0,002 e 0,003. Semelhante ao comportamento das
tensões, as deformações possuem seu maior valor para Vc=300 m/min, com uma
leve redução em seguida.
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0,004
Vc=300
ap=1
0,005
0,004
Deformação (mm )
Deformação (mm )
0,006
0,003
0,002
0,1
a
0,2
0,3
0,4
Avanço f (mm/rot)
0,5
b
f=0,12
ap=1
0,002
0,001
120
0,001
0
0,003
180
240
300
360
420
Velocidade de corte Vc (m/min)
Figura 5: Evolução da deformação com os parâmetros de corte.
CONCLUSÕES.
Dentre os parâmetros de corte analisados, o avanço é o que possui maior
influência nas tensões e nas deformações da ferramenta de corte durante a
usinagem do ferro fundido cinzento.
O estudo mostra que é viável (do ponto de vista da análise das tensões e das
deformações) trabalhar com velocidades de corte mais altas, para alcançar um
melhor rendimento do processo.
O método de elementos finitos é uma ferramenta de grande importância par um
melhor entendimento da natureza dos fenômenos que envolvem a cunha de corte,
permitindo assim prever com antecedência falhas da ferramenta, tornando processo
mais confiável.
Em nenhum dos ensaios realizados foi evidenciado falha catastrófica da
ferramenta, pois os valores das tensões obtidas estão muito abaixo da resistência à
compressão do material, o que permite trabalhar com seções de corte maiores.
AGRADECIMENTOS.
À CAPES pelo apoio financeiro.
Ao Centro Técnico Aeroespacial pela disponibilização dos laboratórios de
sinterização.
REFERÊNCIAS.
1. A. R. Machado e M. B. Solva, Usinagem dos Metais, Universidade Federal de
Uberlândia, 1996.
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2. H. Mostaghaci, Advanced Ceramic Materials, Key Engineering Materials, vols.
122-124, Copyright, 1996.
3. I. M. Low and X. S. LI, Advanced Ceramic Tools for Machinning Application-II, Key
Engineering Materials, vol. 14, Copyright 1996, ISBN 0-87849-703-X.
4. A. E. Diniz, F. C. Marcondes,e N. L. Coppini, Tecnologia da Usinagem dos Metais,
segunda edição, Artliber, 2000.
STRESS AND DEFORMATION ANALYSIS IN SILICON NITRIDE CERAMIC TOOLS
ABSTRACT.
During the turning process the cutting tool is subjected to high force on its
cutting edge. This force produces stress gradients on the tool and consequently
strains which influence the efficiency of the process. It is know that ceramic materials
have a low capacity of being plastically strained. This work presets a study based on
the finite elements method of the stress field and the strain presented in silicon nitride
tools performing normal sintering in the nitrogen atmosphere, using the software
MSC-Nastran. The load used was obtained in turning of gray cast iron. The
geometrical variations of the tool were evaluated with the cutting parameters and this
influence in the dimension of the work piece was evaluated.
KEY-WORDS: silicon nitride, ceramic tools, sintering, finite elements.
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