Jurisprudência Boletim ANO III – Nº 21 Mercado de Capitais Embora as ofertas públicas de ações tenham sido o centro das atenções do mercado nos últimos anos, as distribuições de cotas de fundo também lançaram questões relevantes para a Comissão de Valores Mobiliários. Confira dois casos envolvendo FIDCs e um relacionado a fundo imobiliário distribuído por investidor estrangeiro CVM quer projeto de regulação sobre oferta de cotas de FIDCs abertos Trata-se de recurso interposto por Oliveira Trust DTVM S.A., na qualidade de instituição administradora de fundos, contra entendimento da Superintendência de Registro de Valores Mobiliários (SRE) no âmbito da oferta pública de distribuição de cotas de emissão do Ourinvest FIDC Financeiros — Suppliecard. A CVM exigiu sucessivos registros de distribuição pública de cotas de FIDC a cada intervalo de 180 dias a partir do registro inicial. Por meio da SRE, e levando em conta o disposto no regulamento do fundo e seu enquadramento na hipótese prevista no inciso II do § 1° do art. 21 da Instrução 356/01 (possuir prazo para pagamento de resgate superior a 30 dias), a autarquia enviou ofício pelo qual informou seu entendimento de que as futuras ofertas públicas de distribuição de cotas de emissão do fundo devem ser antecedidas de pedido de registro tão logo se encerrasse o prazo de 180 dias para distribuição da primeira emissão de cotas do fundo. A recorrente entende que não se deveria aplicar ao caso a regra pela qual fundos abertos devem realizar distribuição pública nos termos da Instrução 400/03. Argumenta que, da mesma forma que não se aplica a íntegra dessa instrução às ofertas de cotas de fundos de investimento em direitos creditórios, sua aplicação aos fundos abertos (como é o caso deste fundo), da mesma maneira deve se limitar aos dispositivos que não alterem as características inerentes a tais fundos. A SRE, tendo em vista a literalidade da Instrução 400/03 (que não admite a distribuição de cotas por prazo superior a 180 dias) e da Instrução 356/01 (que obriga a realização de distribuição pública de cotas de fundos abertos que possuam prazos de carência ou pagamento de resgate superior a 30 dias), opinou pela manutenção de sua decisão, encaminhando ao Colegiado duas questões: o procedimento para cálculo do limite de emissão de novas cotas e a possibilidade de as cotas do fundo serem negociadas. O relator considerou que o caso provoca reflexões e revela a necessidade não só de esclarecimentos ao mercado, mas também de alterações na regulamentação, com vistas a conciliar os dispositivos relacionados aos FIDCs abertos, especificamente, e, talvez, a outras espécies de fundos abertos. Quanto aos questionamentos da SRE, ele entendeu que os dispositivos em vigor impõem, sem dúvida, o registro da distribuição do FIDC em tela, podendo, contudo, o Colegiado autorizar a extensão do prazo de distribuição com base nos mesmos fundamentos de precedentes já existentes. Apontou ainda que os dispositivos em vigor impedem a negociação secundária das cotas de fundos abertos, embora entenda que não deveria haver óbice para tal, pois o direito de dispor da coisa decorre do direito de propriedade (art. 1.228 do Código Civil). No que se refere ao prazo da distribuição de cotas do fundo, o relator apresentou voto para que o referido prazo seja estendido para dois anos (aplicando-se, analogamente, o período de distribuição admitido para Cepacs e debêntures padronizadas previsto na Instrução CVM nº 404/04), com o que o prazo de seis meses, previsto no art. 18 da Instrução CVM nº 400/03, não seria aplicável para o Ourinvest FIDC Financeiros – Suppliercard. Quanto ao limite de emissão de cotas, o relator votou pela autorização de novas emissões de cotas ao abrigo do registro concedido, desde que o saldo de cotas emitidas não ultrapasse o número de cotas registradas. Em outras palavras, após a colocação da quantidade de cotas registrada, novas emissões dependerão de ter havido resgate anterior da mesma quantidade de cotas a serem emitidas, com o que emissões acima da quantidade inicialmente registrada, considerados os resgates, dependerão de novo registro. Ainda, determinou que a Ourinvest FIDC mantenha atualizado o prospecto, conforme previsto na Instrução CVM 356/01, e que reporte, nos termos da Instrução CVM 400/03, a quantidade de cotas colocadas e resgatadas, com as demais informações do Anexo VII da última instrução. Por fim, o relator votou por (i) facultar à SRE a tratar de igual maneira casos similares de FIDC abertos enquadrados na categoria prevista nos §§ 1º e 2º do art. 21 da Instrução CVM 356/01, bem como (ii) determinar que a Superintendência de Desenvolvimento de Mercado apresente projeto de regulação que aborde os problemas tratados neste caso, com ênfase nos aspectos relacionados à vedação de negociação secundária de cotas de fundos abertos, que deverá ser contemplada com urgência. O Colegiado acompanhou o voto do relator. (Reunião de 27.11.07. Relator: Durval Soledade) CVM impede venda privada de cotas de fundo imobiliário por estrangeiro A Inverlatam NV, investidor não-residente no Brasil, solicitou à CVM autorização para alienar privadamente 2.500 cotas do Fundo de Investimento Imobiliário River Shopping. Diante da consulta, surgiu a dúvida, por parte da área técnica, sobre a legalidade da aquisição pela Inverlatam das cotas do Fundo River Shopping. Isso porque, segundo narra a Inverlatam, as cotas foram adquiridas por força da dissolução da Bilong Participações Ltda. Após a dissolução, os ativos da Bilong foram distribuídos entre os sócios, entre os quais a Inverlatam. Nesta distribuição, a Inverlatam tornou-se proprietária das cotas do Fundo River Shopping. O Colegiado e a área técnica da CVM tinham dúvidas a respeito da legalidade dessa transferência, pois ela implicava mudança de regime cambial, de investimento externo direto, regido pela Circular BC nº 2.997/00, para investimento externo no mercado de capitais, regido pela Resolução CMN nº 2.689/00. Embora tenha se negado a enviar cópia do processo à CVM, o Banco Central informou que a operação havia sido registrada e que, naquela ocasião, exigiu-se o cumprimento de todas as obrigações tributárias aplicáveis, conforme determina o art. 7º do Regulamento Anexo à Circular Bacen nº 2.997/00. Em consulta recente, a Receita Federal corroborou o entendimento do BC de que a conversão do registro é possível, desde que todas as obrigações tributárias sejam cumpridas no momento da conversão. Deste modo, o relator considerou não haver ilegalidade na aquisição das cotas do Fundo River Shopping pela Inverlatam. Entendeu o relator que a competência para tratar deste assunto escapa completamente à CVM, pois o registro de investimentos estrangeiros é de responsabilidade exclusiva do BC. Quanto ao pedido formulado pela Inverlatam de alienar cotas privadamente, o relator considerou que não podia ser atendido, pois a Resolução CMN nº 2.689/00 veda esse tipo de negociação, conforme art. 1º, que só autoriza investimentos “nos mercados financeiro e de capitais”. O art. 8º, II, da Resolução, também proíbe operações em mercado de balcão não-organizado. Esta vedação não faria nenhum sentido se os investidores pudessem realizar operações privadas. Entendeu, ainda, que a venda privada das cotas também não se enquadra em nenhuma das exceções previstas na Resolução CMN nº 2.689/00. Os demais membros do Colegiado acompanharam o entendimento exposto no voto do diretor Marcos Pinto, tendo sido negada a autorização solicitada pela Inverlatam para alienar privadamente 2.500 cotas do Fundo de Investimento Imobiliário River Shopping. (Reunião de 23.10.07. Relator: Marcos Pinto) Custodiante é isento de responsabilidade em FIDC com oferta restrita Trata-se de pedido de registro de funcionamento do FIDC Fornecedores I, administrado pelo UBS Pactual Serviços Financeiros S.A. DTVM, com dispensa dos seguintes requisitos: (i) elaboração e atualização de prospecto; e (ii) responsabilidade do custodiante pela verificação do lastro dos direitos creditórios. Em relação ao primeiro item, a área técnica informou ter concedido tal solicitação baseada na decisão do Colegiado de 3.4.07, quando da análise do pedido de funcionamento do Everest FIDC Aberto Multicrédito, que autorizou a SRE a conceder a dispensa em situações enquadradas nas exceções do art. 5º da Instrução 400/03. Quanto ao segundo pedido, o Colegiado concedeu a dispensa de isenção da responsabilidade do custodiante, tendo em vista os precedentes e o total entendimento dos investidores acerca dos riscos associados às suas aplicações no fundo, já que os créditos serão adquiridos por, no máximo, 20 investidores, todos integrantes do grupo econômico Pirelli Pneus S.A. Por fim, o Colegiado delegou competência à SRE para autorizar a dispensa de isenção da responsabilidade do custodiante pela verificação do lastro dos direitos creditórios, em situações específicas, tais como as encontradas no caso do FIDC Fornecedores I. (Reunião de 23.10.07) Jurisprudência Mercado de Capitais é um informativo bimestral produzido por Motta, Fernandes Rocha Advogados e veiculado com exclusividade pela Capital Aberto. Comentários sobre o informativo podem ser enviados para o e-mail [email protected].