A ORIENTAÇÃO SEXUAL NO ENSINO FUNDAMENTAL Neura Assis Franco Maria de Fátima Pessoa de Assis Introdução Falar sobre sexo com as crianças pode ser bem mais simples do que parece! Para Freud (1986) em sua XXII conferência, as perguntas feitas pelas crianças devem ser respondidas na medida em que surgem, dizendo sempre a verdade esclarecendo somente o que for perguntado. Na sala de aula, as crianças que demonstrarem curiosidades com relação à sexualidade, ouvirão com mais atenção do que as outras que não manifestarem essas curiosidades. E as que não sentirem interesse pela atividade sexual não devem ser forçadas a ouvir. Este tema partiu de nosso trabalho de conclusão do curso de Pedagogia cujo objetivo geral é o de investigar as dificuldades que os professores encontram para trabalhar a educação sexual na sala de aula. Para que os objetivos propostos possam ser atingidos neste projeto será feita uma pesquisa descritiva com abordagem qualitativa para verificar quais são as dificuldades enfrentadas pelos educadores na implementação da orientação sexual na escola do ensino fundamental. Foram trabalham com realizadas crianças entrevistas de primeira com a cinco quinta professoras, série do que ensino fundamental, sendo que este material encontra-se na fase de análise. Os resultados das nossas entrevistas realizadas até o presente momento serão descritos a seguir. Foram realizadas pesquisas bibliográficas em livros didáticos, revistas especializadas, internet, bem como pesquisa de campo e documental, para aprofundamento. 2 Sabendo de todos os conflitos que envolvem a “orientação sexual” na escola, é que nos mobilizamos em desenvolver esse projeto de trabalho de conclusão de curso, acreditando que ele possa nos esclarecer quanto à sexualidade da criança e como algumas escolas trabalham a sexualidade dos indivíduos. E também buscamos adquirir novos conhecimentos durante o processo de construção deste campo de estudos. 1. A orientação sexual Conforme o PCN’s: As experiências quando bem sucedidas com a Orientação Sexual em escolas que realizam esse trabalho relatam alguns resultados importantes como o aumento do rendimento escolar, devido ao alívio das tensões e preocupações com questões da sexualidade e o aumento da solidariedade e o respeito entre os alunos. E quanto às crianças menores, os professores dizem que quando as informações são corretas ajudam a diminuir a angústia e a agitação na sala de aula (BRASIL, 1997, p. 122). Cabe à escola abordar os diversos pontos de vista, valores e crenças existentes na sociedade para auxiliar o aluno a encontrar um ponto de auto referência por meio da reflexão. Nesse sentido, o trabalho deverá ser realizado pela escola denominado de “orientação sexual” que não substitui nem concorrerá com a função da família, mas sim possui a função de complementar, constitui-se em um processo formal, sistematizado que acontece dentro da escola e que exige planejamento e propõe uma intervenção por parte dos educadores. Educação sexual não significa apenas passar informações sobre sexo. Significa também o contato de pessoa para pessoa, transmissão de valores, atitudes e comportamentos. 3 Será importante observar se os educadores são capazes, se então preparados psicologicamente para trabalhar e falar sobre sexo. O que se sabe é que só a minoria fez algum curso, os demais não fizeram nenhum tipo de curso. Os conhecimentos dos educadores são baseados em curiosidades de revistas e troca de informações com outros professores e colegas ou até mesmo com leituras de livros que só dizem respeito ao fator biológico sem levar em questão, o respeito, os sentimentos e as emoções das crianças. Levando em conta o compromisso do professor com a formação pessoal e social de seus alunos, a escola, deve preocupar em propor atividades que atendam a curiosidade natural dos alunos e, ainda ajudá-los no desenvolvimento de uma sexualidade sadia. É papel do professor ensinar tanto os meninos como as meninas, que eles devem cuidar de seu corpo, lavar os órgãos genitais somente com água e sabonete e que devem respeitar os corpos das outras crianças. Os professores devem evitar emitir seus próprios juízos de valor e opiniões como verdades absolutas, sendo os donos da verdade. “Sabemos que é quase impossível o professor ficar sem dar opiniões e nem devem”, mas é importante que as questões sejam lançadas, refletidas, discutidas, sem que apenas uma resposta fique como sendo a correta, impor limites também faz parte do papel do educador. Ele deve mencionar questões importantes como o que se pode fazer em locais públicos e privados para que a intimidade seja preservada. De acordo com Louro (1998), a educação sexual na escola Infantil e no Ensino Fundamental tem sido bastante polêmica. Para algumas pessoas, a escola e a sexualidade devem se constituir em duas ocasiões diferentes e totalmente separadas. Que compreenda totalmente a sexualidade como uma questão pessoal e particular e a escola sendo um espaço social voltado 4 para a vida da comunidade, cabendo exclusivamente à família ocupar-se da educação sexual das crianças e jovens. 2. A sexualidade na perspectiva da psicanálise A psicanálise, por meio de Freud (1905), com o livro “os três ensaios sobre a teoria da sexualidade” mostra-nos uma concepção contrária à perspectiva biológica. Este autor fez críticas não apenas a concepção biológica da sexualidade como também Patologização das manifestações da sexualidade na infância. Em seus estudos, Freud nos alerta para as falsas teorias sobre a sexualidade. Cada uma delas contém fragmentos ridículos no que se assemelham às concepções dos adultos, que são complexas para a compreensão das crianças. Já as partes dessas teorias que são consideradas corretas provêm do instinto sexual que já atua no organismo infantil. Ele não surge de impressões casuais, mas sim das necessidades da constituição psicológica sexual da criança. Podemos então falar das “teorias sexuais infantis”, nas quais encontramos as crenças das origens sobre a sexualidade. Os seres humanos são movidos por uma busca contínua da satisfação dos seus desejos. É essa busca pelo prazer e satisfação vai estar relacionada a uma parte do corpo, ou seja, a (zona erógena) e com a qualidade dos estímulos que lhe dará uma sensação prazerosa. É uma grande descoberta para a criança o seu corpo, e essa descoberta com certeza fará parte do seu desenvolvimento. Em seus estudos, Freud determinou as fases do desenvolvimento da sexualidade no ser humano como: fase oral, anal, fálica, latente e genital. Em cada uma dessas fases, determinada zona erógena assume a preponderância sobre as sensações prazerosa. Sendo assim, Freud foi 5 contrário a idéia de que a sexualidade teme o seu surgimento na puberdade. 3. A repressão sexual Para Chauí (1991) ”a repressão sexual pode ser considerada como um conjunto de interdições, permissões, normas valores, regras que são estabelecidos históricos e culturalmente, para o controle da sexualidade, pois o sexo é visto por diferentes sociedades, e principalmente pela nossa, como uma coisa impetuosa e cheia de perigos e pecados.” Podemos dizer que o fenômeno ou o fato da repressão sexual é tão antigo quanto à vida humana na sociedade, mas o conceito de repressão sexual é bem recente, ou seja, a reflexão sobre as origens, as formas e os sentidos desses fatos, e o seu estudo aconteceram no século XIX. A definição de repressão sexual é definida como ato de reprimir, pois registra o dicionário de psicologia como mecanismo ou defesa pelo qual os sentimentos, as lembranças dolorosas os impulsos ou os desacordes com o meio social estão fora do campo da consciência. “Este último sentido também aparece nos dicionários de psicanálise, onde se lê que repressão é a opressão psíquica tendente a fazer desaparecer da consciência um conteúdo desagradável ou inoportuno, conteúdo que pode ser uma idéia ou um afeto”. Sendo assim, o dicionário de Psicanálise, de Laplanche e Pontalis, diz que a sexualidade não se confunde com um instinto sexual, pois o instinto é um comportamento fixo e pré-formado característico de uma espécie animal, enquanto a sexualidade se caracteriza por grande invenção e relação com a história pessoal de cada ser humano. Sexualidade não se refere às atividades e ao prazer e 6 o funcionamento do aparelho genital, mas a toda uma série de excitação e atividades, que estão presentes desde a infância, que proporciona prazer e alguma necessidade psicológica fundamental como a respiração, fome, excreção e que estão presentes como forma normal do amor sexual. A sexualidade não se confunde com um instinto, ela é polimorfa, polivalente, ultrapassa a necessidade fisiológica e tem a ver com a simbolização do desejo (Chauí, 1991, p. 14). De acordo com Chauí (1991) a libido existe desde o nascimento e para algumas pessoas, antes do nascimento. E daí são organizados as relações entre dois princípios: o princípio do prazer (querer urgentemente algo que lhe dará satisfação e querer cada vez mais) e o principio da realidade compreender e aceitar que nem tudo o que desejamos nos é possível, e que se for possível nem sempre será de imediato e nem sempre poderá ser conservado e na maioria das vezes não poderá ser aumentado. É o principio da realidade que ensina a tolerar as nossas frustrações. Sabemos que a repressão sexual não é vista como algo único e isolado. Ela manifesta-se de várias formas na nossa sociedade, por meio dos contos de fadas, na psicanálise, na religião, na legislação, na propaganda pela mídia como também nas letras de músicas, ou seja, nos fatos mais corriqueiros ela está presente sem que se perceba ela aparece sutilmente. Toda cultura trata a sexualidade por meio de normas de condutas. Ela nunca é um dado biológico, pois é resultante de um complexo e de um processo que envolve a hereditariedade e as pressões que são exercidas pela cultura, que interagem, influenciam e selecionam o comportamento sexual. Cada sociedade atribui às práticas sexuais as proibições e permissões que se legitimaram devido a vários processos sociais, como a religião, e ciência, o direito e a moral, como também a educação. A 7 sociedade definia os critérios e as práticas sexuais, o que podia ser aceito e o que viria a ser condenado durante o período medieval considerando a finalidade do sexo e a que ele se destinava. No caso da sociedade ocidental houve um destaque muito grande atribuído a função da procriação da mulher, excluindo e condenando as práticas que não eram destinadas para essa função sexual como, por exemplo, a masturbação, que é o prazer solitário. A prostituição era exclusivamente para os prazeres da carne, ou seja, do corpo, que era aceita pela sociedade da época, para manter as moças de famílias virgens e satisfazer os homens casados insatisfeitos sexualmente, como também para iniciar os jovens que estavam começando suas atividades sexuais. À esposa não era permitido o adultério, pois fere a virilidade do esposo, sendo aceita a condenação da mulher que o praticasse. A mesma regra não era aplicada ao homem, pois eram garantidos certos direitos que permitiam a traição com as prostitutas revelando as desigualdades entre os dois sexos. A igreja católica tem um papel fundamental no que diz respeito à sexualidade, vinculando o sexo ao pecado fazendo com que a sexualidade tenha seus limites associados à função reprodutora. A sexualidade era estimulada como uma forma de manter o espírito mais elevado sendo a abstinência sexual buscada como forma de purificação. E assim o “pecado original” era esquecido pela virgindade, mas quando se perdia esta o casamento era aceito pela igreja. É no século XVIII que a igreja impõe regras e modelos de casamento que consistia no sexo sem prazer. Tendo um controle da vida e do ato sexual das pessoas a igreja também se preocupou com o desenvolvimento, controlando o corpo feminino. A mulher exercia o seu papel sexual, demonstrando na sociedade passividade, não podendo demonstrar seus desejos e vontades. 8 Uma das formas de controle sexual foi à exigência de que as mulheres burguesas fossem alfabetizadas para poderem educar seus filhos transmitindo para eles não as suas próprias idéias, mas as que eram impostas pelo universo masculino. Foi por meio do casamento e das confissões que a igreja católica exerceu um rigoroso controle sobre a sexualidade dos indivíduos, impondo uma violência simbólica contra o sexo tanto o pensado, falado, como o praticado. A sexualização dos pecados e do corpo significa simplesmente, a preocupação cristã com todas as formas do apetite sexual, visto ser esta a manifestação da fraqueza da carne e consequentemente, a preocupação esta voltada para a percepção, captura e controle de todo quanto desperte prazer. É pela via da caça ao prazer que a palavra passará a ser um pecado sexual (CHAUI, 1991, p. 106). A igreja não conseguiu ter o controle da repressão sexual, mas mesmo assim ela implantou um ideal de perfeição, impondo regras para corrigir hábitos e vícios no comportamento das pessoas, fazendoos virtuosos, conscientes de que agindo assim, protegiam a sociedade e os filhos contra os vícios e a perversidades sexuais. A família burguesa também teve uma grande influência na moral, pela ideologia considerada como “realidade sagrada” pela igreja e pelo Estado na moralização do sexo. Para Chauí (1991). A família organizada por relações de autoridade, de papéis distribuídos por sexo e idade, de deveres obrigações e direitos definidos tanto pelo sacramento do matrimônio quanto pelo casamento civil. É nesse contexto que a família realizará a repressão sexual, pelo vinculo entre sexualidade virtuosa e procriação e sexualidade viciosa e não-procriação (p. 134). No século XVIII é a família a instância social que definiu o papel dos indivíduos na sociedade ocidental, para que houvesse uma 9 harmonia perfeita com as regras que estabeleciam a igreja e o Estado. E o papel da mulher era o de ser submissa ao homem, uma leoa mãe dando a suas filhas a mesma educação de submissão que recebeu. O homem era o que tinha a autoridade e a responsabilidade sobre a esposa e a família. Quanto às crianças estas passaram a ser motivo de preocupação da família. Sabemos que a repressão sexual não é vista como algo único e isolado. Ela manifesta-se de várias formas na nossa sociedade, por meio dos contos de fadas, a psicanálise, da religião a legislação, na propaganda, pela mídia como também nas letras de músicas, ou seja, nos fatos mais corriqueiros ela está presente sem que se perceba ela aparece sutilmente. 4. Considerações Finais Após a realização deste projeto de trabalho constatamos que a sexualidade ainda hoje é um tema difícil de ser abordada pelas professoras no contexto das nossas escolas de primeira a quinta série do Ensino Fundamental. Pensar numa formação integral dá criança, objetivo do Ensino Fundamental, supõe que temos ainda um longo caminho a ser percorrido já que conforme temos constatado por meio de pesquisa, que as professoras demonstram uma grande insegurança quando se trata de falar sobre a “Orientação Sexual”, e muitas vezes apresentam dúvidas sobre qual seria a melhor forma de trabalhar com ela em sala de aula. Sendo assim, o que nos incomoda é que mesmo sabendo que a sexualidade está presente desde a infância, e sendo como algo natural e aceita pelas professoras, as perguntas e reações das crianças geralmente são negativas, na tentativa de impedir que as dúvidas, ansiedades com relação à sexualidade não sendo esclarecidas de forma clara a que elas têm direito. 1 0 Sendo assim, pensamos que é necessário construir propostas pedagógicas que levem em consideração todas as dimensões dos educandos, ressaltando que a sexualidade está presente e manifesta-se em cada universo infantil. É necessário o professor orientar a criança para que a sua sexualidade venha a acontecer de forma naturalmente e que suas ações possam reforçar a vida afetiva do ser humano. Vários estudos já foram feitos nesse sentido e fica evidente a necessidade de as escolas disponibilizarem um espaço para que a criança possa falar abertamente sobre a sexualidade, falar sobre o seu corpo, sobre suas curiosidades, suas angústias e seus sentimentos, sem constrangimento e inibições. Esses estudos mostram a necessidade de uma prática na qual o professor/educador exerça o seu papel de mediador e abra discussões sobre a dimensão sexual, trazendo os alunos para a fantasia, despertando a criança para as brincadeiras, músicas, poesias, filmes como recursos didáticos que auxiliam, estabeleçam diálogos de forma natural, não demonstrando seus preconceitos e suas próprias concepções a respeito da sexualidade humana. Foi no segundo dos “três ensaios da sexualidade” das obras completas que Freud mostrou-nos o processo de desenvolvimento psicossexual, no qual o indivíduo encontra o prazer no próprio corpo, pois é nos primeiros anos de vida, que a função sexual está intimamente ligada à sobrevivência. Toda cultura trata a sexualidade por meio de normas de condutas. Ela nunca é um dado biológico bruto, pois é resultante de um complexo e de um processo que envolve a hereditariedade e as pressões que são exercidas pela cultura, que interagem, influenciam e selecionando o comportamento sexual. E necessário que as Educadoras construam um sólido conhecimento em relação à sexualidade do individuo e isso exige repensar valores e atitudes repressivas que estão muito presentes no 1 1 cotidiano das escolas do Ensino Fundamental com relação à vivência da sexualidade. Essas mudanças dependem de um processo de formação profissional dos educadores que atuam nas escolas de uma nova postura frente à sexualidade infantil, não as reprimindo, mas de orientá-las respondendo suas dúvidas, curiosidades, criando espaço para que os educandos possam falar sobre seu corpo os seus sentimentos, suas vontades, fazendo com que a sexualidade possa ser vivida de forma sadia e prazerosa, sem constrangimentos contribuindo para o pleno desenvolvimento do aluno. Referências Bibliográficas BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais. Pluralidade Cultural e Orientação sexual temas Transversais / Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação – Brasília: MEC / SEF. 2000, 10 vols. CHAUI, Marilena. Repressão sexual, essa nossa desconhecida. 12. Ed. São Paulo: Brasiliense, 1991. FREUD, Sigmund. Três ensaios da teoria da sexualidade infantil. Obras psicológicas completas. Rio de Janeiro: Imago, 1980, diversos volumes. ________Meus pontos de vista sobre o papel desempenhado pela sexualidade na etiologia das neuroses. Obras psicológicas completas. Rio de Janeiro: Imago, 1986. Diversos volumes. GONSALVES, Elisa Pereira. Conversas sobre iniciação científica. 3. ed. Campinas. SP: Editora Alínea. 2003. à pesquisa SUPLICY. Marta. Conversando sobre sexo, 16. . Ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1990.