LETRAMENTO EM MATEMÁTICA NO PISA
Maria Isabel Ramalho Ortigão
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil
[email protected]
Glauco da Silva Aguiar
Professor do Colégio Militar do Rio de Janeiro, Brasil
[email protected]
RESUMO
Este trabalho é resultado de uma investigação que buscou conhecer as
concepções de letramento em Matemática que servem de base para a
Avaliação Internacional de Estudantes – PISA, conduzida pela OCDE. O
estudo analisou documentos do PISA e relatórios de pesquisa com base
nesta avaliação, discutindo-os à luz da literatura específica. Além disso,
processos estatísticos de análise descritiva foram aplicados aos dados da
avaliação do PISA 2003 com o intuito de descrever o desempenho médio
dos estudantes brasileiros. Os autores observaram que a noção de letramento
matemático no âmbito do PISA assemelha-se às noções de competências e
habilidades matemáticas presentes nos documentos curriculares brasileiros.
No entanto, os resultados evidenciam que os alunos, mesmo tendo
frequentado a escola por muitos anos, não estão alcançando as competências
em matemática esperadas. Isto ocorre inclusive com aqueles que nunca
passaram pela experiência de reprovação em alguma das séries em que
estudou.
Palavras-chave: PISA 2003, Letramento matemático; Competências e
habilidades; Escala de proficiência em Matemática.
ABSTRACT
This study is the result of an investigation that sought to know the
conceptions of literacy in mathematics that serve as a basis for international
student assessment, PISA – led by OECD. The study looked at PISA
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documents and research reports on the basis of this assessment, discussing
them in the light of the specific literature. In addition, statistical processes
were applied in descriptive analysis findings of the evaluation of PISA
2003, which had as its main focus the Mathematics to describe the average
performance of Brazilian students compared to other countries, and discuss
the notion of mathematical literacy adopted within the framework of the
PISA.
Keywords: PISA 2003, mathematical literacy, skills and abilities; Scale
proficiency in mathematics
1
Introdução
Este trabalho apresenta os resultados de uma investigação que buscou discutir as
concepções de letramento matemático do Programa Internacional de Avaliação de
Estudantes – PISA, conduzido pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico – OCDE. Para o PISA, o letramento matemático reflete uma perspectiva
relacionada a uma visão mais ampla das práticas sociais que utilizam a matemática e
que, portanto, reforçam o papel social da educação matemática cuja responsabilidade é
estabelecer o elo entre os conteúdos escolares e o cotidiano do aluno. Em 2012 o foco
da avaliação do PISA voltar-se-á, novamente, à área da matemática, o que por si só,
justifica a atualidade desse estudo. Esperamos contribuir para uma melhor compreensão
do significado de letramento em matemática, utilizando as definições consideradas no
relatório da OCDE/PISA que referenciam a elaboração dos itens da prova de
Matemática.
A divulgação dos resultados das avaliações em larga escala conduzidas pelo INEP
– Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira –, tais como,
PISA, SAEB - Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica, Prova Brasil ou
mesmo o ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio, tem insistido em revelar níveis
insuficientes de aprendizagem pelas crianças e jovens nas escolas brasileiras. Tais
resultados vêm sendo acompanhados de uma crescente cobrança por medidas que
precisa dar lugar ao efetivo direito a uma educação de qualidade, com escolas que
ensinam e alunos que aprendem.
A literatura educacional tem ressaltado a importância e o papel desempenhado
pela avaliação nos avanços metodológicos e institucionais e no acompanhamento de
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políticas educacionais de promoção de equidade (FRANCO et al, 2007; SOARES,
2005). É através das informações colhidas mediante os processos de avaliação que
gestores e demais agentes inseridos no processo educativo identificam prioridades e
alternativas a fim de alcançar a eficácia das ações e a otimização dos investimentos no
setor. Da mesma forma, indicam o que se deve esperar que os alunos aprendessem em
sua trajetória escolar à luz dos currículos propostos e identificam quais são os fatores
escolares ou extraescolares que favorecem ou limitam a aquisição das competências
esperadas (AGUIAR, 2008).
De modo geral, esses estudos, embora com características diferentes em virtude
do formato, periodicidade ou população avaliada, englobam dois objetivos
fundamentais: (a) construção de indicadores da área educacional e (b) explicação e
interpretação dos resultados alcançados. Neste sentido, o Brasil vem ampliando seus
interesses na área de avaliação educacional e com o intuito de comparar os resultados
brasileiros com os de outros países, voluntariamente, passou a participar, desde 2000, do
PISA.
O PISA avalia as competências e habilidades ao fim da escolarização básica e
examina o grau de preparação dos jovens para a vida adulta e, até certo ponto, a
efetividade dos sistemas educacionais de diferentes países. Esta efetividade refere-se às
realizações dos objetivos subjacentes dos sistemas educacionais, como definidos pela
sociedade. Ou seja,
uma visão do Ensino Médio de caráter amplo, de forma que os aspectos e
conteúdos tecnológicos associados ao aprendizado científico e matemático
sejam parte essencial da formação cidadã de um sentido universal e não
somente de sentido profissionalizante. (BRASIL, 1998, p.10)
A matriz conceitual de avaliação do PISA, que tem como referência principal a
articulação entre o conceito de educação básica e o de cidadania, está em perfeita
sintonia com os objetivos educacionais do Ensino Médio, propostos pelo Ministério da
Educação – MEC, como observado por Ubriaco e Muri em suas pesquisas de Mestrado
(UBRIACO, 2009; MURI, 2012). Ela está presente também no ENEM, cujos preceitos
demonstram seu caráter transdisciplinar e o entendimento do perfil terminativo desse
nível de ensino, complementando o aprendizado iniciado no Ensino Fundamental
(MURI, 2012). Esta estrutura de avaliação é desenhada a partir de um modelo dinâmico
de aprendizagem, em que, tal como definido tanto no texto constitucional como na Lei
de Diretrizes e Bases - LDB de 1996, os conhecimentos e habilidades devem ser
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continuamente adquiridos, a fim de viabilizarem uma adaptação bem-sucedida, em um
mundo em constante transformação.
O conhecimento, as habilidades e competências, definidos pelo organismo
internacional que administra o PISA (OCDE), e foco da avaliação, medidos nos testes
cognitivos, têm mais a ver com as virtudes pessoais, competências diversas, atitudes e
disposições sociomotivacionais do que com a aprendizagem escolar sistemática,
assimilada de forma automática e sem conexão com o mundo real. Esta concepção
remete ao significado de letramento em matemática e para o conjunto de significados e
implicações que ele suscita. Por isso, não obstante à falta de consenso em torno do que
seja letramento matemático e das diferentes formas de avaliá-lo, entendemos que
discutir o significado do termo letramento matemático e suas implicações não pode ser
um exercício de retórica, nem para os gestores de políticas públicas, nem para a
comunidade de educadores matemáticos, tendo em vista que cada vez mais as
habilidades matemáticas são consideradas como parte de um indicador de alfabetismo
funcional.
2
O PISA e a avaliação em Matemática
O PISA é um programa internacional de avaliação comparada, desenvolvido pela
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que tem por
objetivos avaliar o desempenho de alunos, na faixa dos 15 anos de idade, e produzir
indicadores sobre a efetividade dos sistemas educacionais dos diversos países
participantes. As avaliações ocorrem a cada três anos, com ênfases distintas nas áreas do
conhecimento de Leitura, Matemática e Ciências. Em cada edição, o foco de análises e
interpretações mais detalhadas recai sobre uma dessas áreas. O primeiro ciclo de
avaliação ocorreu em 2000 e teve como principal domínio de avaliação a Leitura. Em
2003 o foco foi a Matemática e em 2006, terceiro ciclo de avaliação, a ênfase foi em
Ciências. Em 2009 o foco voltou a ser em Leitura e, este ano, 2012, a área principal a
ser avaliada será novamente a Matemática.
O objetivo principal do PISA é o de produzir indicadores que contribuam para a
discussão da qualidade da educação ministrada nos países participantes, de modo a
subsidiar políticas públicas de melhoria da educação. A avaliação procura verificar até
que ponto as escolas de cada país participante estão preparando seus jovens para
exercerem o papel de cidadãos na sociedade contemporânea. Além de avaliar as
competências dos estudantes, o PISA coleta informações básicas para a elaboração de
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indicadores contextuais, os quais possibilitam relacionar o desempenho dos alunos às
suas características sociodemográficas. Os resultados desses estudos podem ser
utilizados pelos gestores dos vários países envolvidos, como instrumento para a
definição e/ou refinamento de políticas educacionais.
Particularmente, no ciclo de 2003, cuja ênfase foi dada ao Letramento em
Matemática, o estudo envolveu 41 países, incluindo a totalidade dos 30 membros da
OCDE e 11 países convidados, com a participação total de aproximadamente, 280 mil
alunos de 15 anos de idade. No Brasil, participaram cerca de 4500 alunos que, por
ocasião da realização dos testes, teriam idades compreendidas entre os 15 anos e três
meses e os 16 anos e dois meses, desde que cursassem a 7ª ou 8ª séries (atuais 8º e 9º
anos) do Ensino Fundamental ou o Ensino Médio (1ª, 2ª ou 3ª séries). Foram sorteadas
228 escolas, entre urbanas e rurais, públicas e privadas, de 179 municípios das cinco
regiões brasileiras. Estima-se que a avaliação do PISA 2012 seja aplicada em
aproximadamente 902 escolas, com a participação de aproximadamente 26 mil
estudantes.
Os testes realizados foram testes de “lápis e papel”, que deveriam ser respondidos
pelos estudantes, num período total de duas horas. As questões apresentadas incluíam
itens de múltipla escolha, cerca de um terço, e itens que requeriam dos alunos a
elaboração de respostas, umas mais curtas, outras mais elaboradas. A partir do estudo
piloto, foi selecionado um total de 167 itens, sendo 85 de Matemática, 28 de Leitura, 35
de Ciências e 19 de Resolução de Problemas.
Os procedimentos do PISA preveem que cada aluno responda, além do teste, um
questionário sobre si próprio, sobre seus hábitos de estudo e as suas percepções do
contexto de aprendizagem, sobre seu envolvimento na escola e suas motivações. Além
disso, os diretores das escolas selecionadas na amostra também preenchem um
questionário, contendo informações sobre as condições de funcionamento e
infraestrutura da escola.
Na sequencia, apresentamos nossas questões de pesquisa e a abordagem
metodológica. Em seguida, trazemos as concepções de letramento constantes na
literatura específica e as noções de letramento matemático do PISA e por fim,
discutimos os resultados de nossa investigação.
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Questões de pesquisa e abordagem metodológica
O foco norteador do estudo que desenvolvemos teve como base os itens de
Matemática do PISA 2003. Este estudo objetiva a comparação de resultados dos alunos
brasileiros com os de outros países, no que tange a concepção do ensino da Matemática
em nossas escolas e à capacidade de mobilização, por parte dos alunos, de
conhecimentos matemáticos para a realização de tarefas ou para a resolução de
situações-problemas com as quais se deparam no dia a dia. Em última análise, buscamos
dimensionar a defasagem entre as reais competências de nossos alunos e as exigidas
pelos países mais avançados para o exercício pleno da cidadania.
Nosso objetivo desdobra-se nas seguintes questões de pesquisa:
 Qual a definição de letramento matemático que norteia o programa de avaliação
internacional PISA?
 Como se encontram os alunos brasileiros em termos de letramento matemático?
 Quais as articulações possíveis desses resultados com a Educação Matemática
em nossas escolas?
A fim de respondê-las, analisamos todos os 84 itens da base do PISA 2003. Cabe
ressaltar que muitos desses itens são sigilosos e apenas os itens públicos,
disponibilizados pelo INEP, podem ser apresentados. A investigação acerca da
concepção de letramento em matemática adotado pelo PISA demandou uma observação
detalhada nas principais características dos itens, tais como: conteúdo, processo,
contexto e tipo de resposta exigida. Para uma comparação entre os desempenhos
conseguidos pelos alunos brasileiros e a média da OCDE e visando dimensionar as
diferenças de rendimento encontradas no letramento em matemática foram geradas as
frequências relativas aos acertos praticados por nossos alunos em cada item. Embora
cientes da importância e da riqueza de informações que se obtém ao considerar os
diferentes tipos de respostas dadas pelos alunos a um determinado item, ou ainda, o
percentual de alunos que deixou o item “em branco”, essa não foi a análise feita aqui.
Para descrever o desempenho de nossos alunos frente ao item em pauta consideraremos
apenas as porcentagens de ocorrência das respostas corretas.
A título de ilustração, apresentamos a seguir alguns itens públicos do PISA 2003.
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3.1
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Item da Subárea Espaço e Forma
Apresentamos a seguir um exemplo de item submetido aos estudantes na subárea
Espaço e Forma. A apresentação da imagem do item é feita tal como aparece nos
cadernos de teste, a exceção do tamanho original, que aqui se encontra reduzido.
CARPINTEIRO
Questão 1: CARPINTEIRO
M266Q01
Um carpinteiro tem 32 metros de tábua para cercar um canteiro em uma horta. Ele está
pensando em utilizar um dos seguintes modelos para o canteiro.
A
B
6m
6m
10 m
10 m
C
D
6m
6m
10 m
10 m
Na tabela abaixo, faça um círculo em “Sim” ou “Não” para cada modelo, indicando se ele
pode ou não ser feito com 32 metros de tábuas.
Modelo de canteiro
Usando este modelo, o canteiro pode ser construído
com 32 metros de tábua?
Modelo A
Sim / Não
Modelo B
Sim / Não
Modelo C
Sim / Não
Modelo D
Sim / Não
Figura 1: Exemplo de item do PISA 2003
Esse item avalia a competência conexões apresentando um contexto do tipo
educacional/ocupacional. De acordo com o relatório do PISA 2003, o percentual de
acerto desse item é de apenas 4,8%, o que evidencia que o mesmo foi extremamente
difícil para os alunos brasileiros. O conteúdo matemático subjacente requerido é o
conceito de perímetro. No entanto, o problema é proposto de uma forma não muito
usual e raramente encontrado nos livros didáticos. De qualquer forma, responde a um
dos objetivos gerais que é o de comparar figuras geométricas.
3.2
Item da Subárea Mudança e Relações
O item a seguir serve para ilustrar uma peculiaridade muito comum nos itens do
PISA, em que uma situação-problema se desdobra em duas ou mais questões ou tarefas.
O item a seguir, da subárea “Mudança e Relação”, refere-se a três situações problemas.
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TAXA DE CÂMBIO
Mei-Ling, de Singapura, estava preparando-se para uma viagem de 3 meses à África
do Sul como aluna de intercâmbio. Ela precisava trocar alguns dólares de Singapura
(SGD) por rands sul-africanos (ZAR).
________________________________________________________________________
Questão 1: TAXA DE CÂMBIO
M413Q01 – 019
Mei-Ling descobriu que a taxa de câmbio entre o dólar de Singapura e o rand sulafricano era:
1 SGD = 4,2 ZAR
Mei-Ling trocou 3000 dólares de Singapura por rands sul-africanos a esta taxa de
câmbio.
Quantos rands sul-africanos Mei-Ling recebeu?
Resposta: ...............................................
________________________________________________________________________
Questão 2: TAXA DE CÂMBIO
M413Q02 – 019
Ao retornar a Singapura após 3 meses, Mei-Ling ainda tinha 3 900 ZAR. Ela trocou
novamente por dólares de Singapura, observando que a taxa de câmbio tinha
mudado para:
1 SGD = 4,0 ZAR
Quantos dólares de Singapura Mei-Ling recebeu?
Resposta:.............................................................
________________________________________________________________________
Questão 3: TAXA DE CÂMBIO
M413Q03 - 01 02 11 99
Durante estes 3 meses, a taxa de câmbio mudou de 4,2 para 4,0 ZAR por SGD.
Foi vantajoso para Mei-Ling que a taxa de câmbio atual fosse de 4,0 ZAR em vez de
4,2 ZAR, quando ela trocou seus rands sul-africanos por dólares de Singapura? Dê
uma explicação que justifique a sua resposta.
Figura 2: Exemplo de item do PISA 2003
As duas primeiras questões propostas avaliam competências de reprodução e a
terceira de reflexão. As três inserem-se ao contexto público. Estas três situaçõesproblema que tratam de “Taxa de Câmbio” envolvem basicamente o raciocínio
proporcional. A proporcionalidade envolvida é direta e os cálculos requerem a
multiplicação ou divisão por números na forma decimal. Cabe destacar que a terceira
questão (M413Q03), não exige nenhum cálculo para a resposta correta. É necessária
apenas a compreensão do conceito matemático envolvido e uma argumentação coerente,
relacionada à interpretação e comparação de duas taxas de câmbio. O percentual de
acerto dos alunos brasileiros em cada uma delas foi de 36,5%, 24,8% e 15%,
respectivamente. A dificuldade maior de nossos alunos pode estar na forma de
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apresentar a resposta, visto que a última questão apresenta o menor percentual de acerto
entre as três situações-problema (15%).
3.3
Item da Subárea Quantidade
Quantidade foi a área da Matemática em que nossos alunos obtiveram resultados
mais favoráveis, embora ainda bastante sofríveis se comparados com a média dos
demais países da OCDE.
Os itens dessa subárea da Matemática, de um modo geral, buscam avaliar se o
trabalho com números e operações está cumprindo a finalidade de proporcionar ao
aluno, neste nível de escolaridade, a capacidade de resolver problemas do cotidiano,
bem como operar com números inteiros e decimais finitos; operar com frações e, em
especial, com porcentagens. Além disso, se está sendo estimulado o desenvolvimento do
cálculo mental e a estimação da ordem de grandezas de números.
A seguir apresentamos um item utilizado na avaliação dos conteúdos e
competências relacionados com a “Quantidade”. Nessa subárea, basicamente as tarefas
solicitadas foram referentes à resolução de problemas com números e a resolução de
problemas envolvendo processos organizados de contagem.
ESTANTES
Questão 1: ESTANTES
M484Q01
Para construir uma estante completa, um marceneiro precisa do seguinte material:
4 pranchas grandes de madeira,
6 pranchas pequenas de madeira,
12 braçadeiras pequenas,
2 braçadeiras grandes e
14 parafusos.
O marceneiro possui em estoque 26 pranchas grandes de madeiras, 33 pranchas
pequenas de madeira, 200 braçadeiras pequenas, 20 braçadeiras grandes e 510
parafusos.
Quantas estantes completas o marceneiro poderá fazer?
Resposta: ......................................................
Figura 3: Exemplo de item do PISA 2003
Esse item se insere no contexto educacional/ocupacional e avalia a capacidade do
aluno realizar conexões. O percentual de acerto dos alunos brasileiros foi de 29,3%.
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Para responder corretamente este item o aluno deve realizar a operação de divisão por
números inteiros. O tipo de resposta curta e direta parece não ser um complicador para
nossos alunos.
Cabe ressaltar que os comentários sobre os itens foram feitos, separadamente,
pelos quatro blocos de conteúdos da Matemática adotados pelo PISA, aos quais os itens
estão relacionados, a fim de tornar possível uma análise mais sistemática. Isso não
significa que muitas das observações não possam ser generalizadas ou articuladas com
os demais itens, das outras subáreas, da mesma forma que acreditamos que os conteúdos
desses blocos devam ser trabalhados em sala de aula.
4
Letramento Matemático
O conceito de letramento é recente no cenário educacional brasileiro. Baseado nos
estudos de Brian Street (1984) passou a integrar o discurso de especialistas das áreas de
educação e linguística a partir das discussões iniciadas por Kleiman (1995) e Soares
(1998). Tomava impulso o debate acerca das novas formas de compreender a leitura e a
escrita como processos dinâmicos em contextos significativos da atividade social,
contextualizados, realizados em diferentes situações de uso e com finalidades diversas.
Segundo Soares (1999), a palavra letramento
(...) é a versão para o português da palavra da língua inglesa litteracy. (...),
que corresponde ao estado ou condição que assume aquele que aprende a ler
e escrever. Implícita nesse conceito está a ideia de que a escrita traz
conseqüências sociais, culturais, políticas, econômicas, cognitivas,
lingüísticas, quer para o grupo social em que seja introduzida, quer para o
indivíduo que aprenda a usá-la. Em outras palavras: do ponto de vista
individual, o aprender a ler e escrever - alfabetizar-se, deixar de ser
analfabeto, tornar-se alfabetizado, adquirir a ‘tecnologia’ do ler e escrever e
envolver-se nas práticas sociais de leitura e de escrita - tem conseqüências
sobre o indivíduo, e altera seu estado ou condição em aspectos sociais,
psíquicos, culturais, políticos, cognitivos, lingüísticos e até mesmo
econômicos; do ponto de vista social, a introdução da escrita em um grupo
até então ágrafo tem sobre esse grupo efeitos de natureza social, cultural,
política, econômica, lingüística. O ‘estado’ ou a ‘condição’ que o indivíduo
ou grupo social passam a ter, sob o impacto dessas mudanças, é que é
designado por litteracy. (SOARES, 1999, p 17-18)
As discussões em torno dos processos de escolarização da leitura e da escrita, em
especial a partir dos estudos de Magda Soares, passam a considerar mais fortemente
esse seu aspecto sociocultural. Alguns autores, contudo, ao priorizar uma das dimensões
do letramento (individual ou social), explicitam definições de letramento que se
diferenciam, o que tem se constituído uma dificuldade a mais para os estudos que
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abordam o tema. Há especialistas que chegam a sugerir a existência de letramentos, no
plural. Para eles,
seria, provavelmente, mais apropriado referirmo-nos a “letramentos” do que a
um único letramento, e devemos falar de letramentos, e não de letramento,
tanto no sentido de diversas linguagens e escritas, quanto no sentido de
múltiplos níveis de habilidades, conhecimentos e crenças, no campo de cada
língua e/ou escrita. (STREET, 1984, p.47)
Soares (2002), no entanto, deixa claro que há imprecisão na conceituação do
termo letramento. Ao opor, em sua concepção, letramento e analfabetismo, entende a
alfabetização (aquisição do código da leitura e da escrita pelo sujeito) como prérequisito para o letramento (apropriação e uso social da leitura e da escrita pelo sujeito).
É nesse sentido que, para a autora, o fato de estarmos vivendo hoje, a introdução na
sociedade, de novas e incipientes modalidades de práticas sociais de leitura e de escrita,
favorecidas pelas recentes tecnologias de comunicação eletrônica [acrescentaríamos
também a armazenagem de dados] – o computador, a rede (web), a internet – é propício
a tornar o conceito de letramento mais claro e preciso.
Kleiman (1995) define letramento “como um conjunto de práticas sociais que
usam a escrita, enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia, em contextos
específicos, para objetivos específicos”. Assim, considera que a leitura e a escrita se
constituem em atividades sociais tais como ler um manual ou pagar contas e, portanto,
devem ser encaradas como atividades que servem a um propósito e não como atividades
fim.
Gradativamente, os estudos sobre letramento, antes restritos apenas à área de
linguística, começam a se expandir para as diversas áreas do conhecimento. O termo
letramento matemático se torna mais evidente no Brasil com a publicação, em 2004, do
livro Letramento no Brasil: habilidades matemáticas (FONSECA, 2004). Nesta
publicação, a concepção de Matemática como uma prática sociocultural, ou ainda, a
matemática escolar que consegue fazer uma conexão direta entre os conteúdos escolares
e formais e as diversas situações de vida dos alunos, é reportada com a utilização de
diferentes termos: alfabetismo, alfabetismo funcional, letramento, literacia, materacia,
numeracia, numeramento, literacia estatística, graficacia, alfabetismo matemático
(FONSECA, 2004, p.27). Apesar dessa multiplicidade, a ideia central de todos eles
refere-se
à
capacidade de
desempenhar
tarefas
funcionais
que
conhecimentos e estratégias desenvolvidos em situações de uso sociocultural.
demandam
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4.1
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Letramento em Matemática no PISA
O PISA é desenhado a partir da ideia de aprendizagem como um processo
dinâmico, em que novos conhecimentos e habilidades devem ser continuamente
adquiridos, para uma adaptação bem sucedida em um mundo em constante
transformação. Para refletir a amplitude dos conhecimentos, habilidades e competências
que estão sendo avaliados, usa-se o conceito de letramento, que remete para
a capacidade de um indivíduo identificar e compreender o papel que a
Matemática desempenha no mundo real, de fazer julgamentos bem
fundamentados e de usar e se envolver na resolução matemática das
necessidades de sua vida, enquanto cidadão consciente, construtivo e
reflexivo. (OCDE, 2000, p.21)
A noção de letramento adotada pelo PISA relaciona-se com o uso mais abrangente
e funcional da Matemática, o que exige do estudante a capacidade de reconhecer e
formular problemas matemáticos em variadas situações de sua vida.
Diferentemente de avaliações internacionais anteriores (IEA, TIMMS, OREALC,
dentre outras), o PISA não se concentra somente nos conteúdos curriculares, mas
enfatiza as competências necessárias à vida moderna. Busca, portanto, verificar a
operacionalização de esquemas cognitivos nas diferentes áreas de conhecimento. Em
Matemática, o letramento é avaliado em termos de três dimensões:
O conteúdo de Matemática, definido primeiramente em termos de conceitos
matemáticos mais amplos (como estimativa, mudança e crescimento, espaço e forma,
raciocínio lógico, incerteza e dependências e relações), e secundariamente em relação a
ramos do currículo (como relações numéricas, álgebra, geometria e tratamento da
informação);
O processo da Matemática, definido pelas competências matemáticas gerais. Essas
incluem o uso da linguagem matemática, escolha de modelos e procedimentos e
habilidades de resolução de problemas. No entanto, a ideia não é separar essas
habilidades em diferentes itens de teste, já que se pressupõe que uma série de
competências será necessária para desempenhar qualquer tarefa matemática. Essas
competências são organizadas em três classes: a primeira consiste na realização de
operações simples; a segunda exige o estabelecimento de conexões para resolver
problemas; a terceira consiste de raciocínio matemático, generalização e descobertas, e
exige que os alunos façam análises, identifiquem elementos matemáticos de uma dada
situação e proponham problemas;
Os contextos, compreendidos como as situações nas quais a Matemática é usada,
variando de contextos particulares àqueles relacionados com questões científicas e
públicas mais amplas.
Para cada dimensão avaliada, existe uma escala contínua, em que os níveis de
desempenho dos alunos e o posicionamento destes ao longo da escala estão
representados pelo número de pontos alcançados. Particularmente em Matemática, as
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competências são avaliadas em itens que abrangem desde a realização de operações
básicas até as habilidades de alta ordem, envolvendo raciocínio e descobertas
matemáticas.
Especificamente, estas habilidades são sintetizadas em três grupos: reprodução,
conexão e reflexão. O primeiro compreende os processos cognitivos que são requeridos
para que o aluno demonstre as habilidades matemáticas que estão ligadas de maneira
muito próxima ao que é usualmente entendido como conteúdo. Na maioria das vezes, a
solução do item da prova está apoiada em dados e fatos memorizados e na execução de
ações repetidas. O segundo parte do anterior, mas envolve os processos cognitivos
exigidos para que o aluno possa demonstrar habilidades relacionadas ao saber fazer,
mesmo que de maneira incipiente. A resolução das tarefas demanda a reunião de ideias
para solucionar problemas matemáticos diretos, com maior interpretação da situação. O
terceiro desenvolve-se a partir do grupo de conexão, mas abrange habilidades
necessárias para a resolução de tarefas que precisam de um pensamento matemático
mais amplo, exigindo insight, reflexão e até mesmo criatividade para a resolução do
problema. O quadro a seguir apresenta de modo sintético o desenvolvimento das três
dimensões citadas acima.
Quadro 2 : Resumo das dimensões avaliadas pelo PISA em Matemática
DIMENSÕES AVALIADAS EM MATEMÁTICA
Conteúdo
Núcleo de áreas e conceitos
matemáticos relevantes:
Quantidade
Espaço e forma
Mudanças e relações
Incerteza
Processo
Contexto
As
“constelações
de
competências” que definem as
capacidades necessárias para a
Matemática:
Reprodução
–
operações
matemáticas simples;
Conexão – ligar ideias para
resolver problemas de resolução
direta;
Reflexão
–
pensamento
matemático mais abrangente.
As situações variam de acordo
com a “distância” das mesmas,
em relação ao dia-a-dia dos
indivíduos:
Pessoal;
Ocupacional/educacional;
Público/social;
Científico.
No PISA os conteúdos matemáticos são organizados em quatro áreas
estruturantes, a saber: Quantidade, Espaço e forma, Mudanças e relações, Incerteza.
Para os organizadores da avaliação, as três primeiras constituem a essência de qualquer
currículo de Matemática da educação básica. A quarta (Incerteza) atende ao caráter mais
abrangente da Competência Matemática e se conecta com as necessidades da vida diária
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do cidadão. Observa-se uma grande proximidade dessa organização com a que é
proposta no PCN (BRASIL, 1998), que embora apresente nomes ligeiramente
diferentes, usa as mesmas categorias.
Apresentamos até aqui uma breve discussão acerca das concepções de letramento
presentes na literatura específica e os sentidos de letramento matemático e como este
conceito está presente na avaliação do PISA. Na continuidade, discutimos os resultados
do PISA 2003, que focou especificamente, a avaliação das habilidades matemáticas
(letramento matemático) dos jovens brasileiros matriculados nas séries finais do ensino
fundamental e no ensino médio.
5
Escala de Proficiência em Matemática: concepções de letramento
De modo geral, dada a complexa tarefa de se definir letramento (BONAMINO et
al, 2002), os sistemas de avaliação partem de um nível de letramento que se espera que
os alunos de uma determinada faixa de idade e/ou escolar dominem, e elaboram itens de
prova que procuram verificar em uma escala de proficiência que habilidades esses
alunos desenvolveram. Cada avaliação revela e prioriza uma concepção de letramento.
O conceito de letramento utilizado no PISA é mais amplo do que a noção histórica
da capacidade de ler e escrever e é medido num continuum, não podendo ser reduzido à
dicotomia de ser ou não ser letrado. O letramento é definido como “a capacidade de um
indivíduo identificar e compreender o papel que a matemática desempenha no mundo,
de fazer julgamentos bem fundamentados e de usar e se envolver na resolução
matemática das necessidades da sua vida, enquanto cidadão construtivo, preocupado e
reflexivo” (OCDE, 2000, p.21). O PISA descreve os conhecimentos associados a
habilidades desenvolvidas pela escola em uma escala de proficiência. A escala de
proficiência em Matemática apresenta-se subdivida em quatro subescalas. Lembramos
que as escalas em que os resultados são apresentados foram construídas de forma que,
no conjunto dos países da OCDE, a média fosse de 500 pontos, e cerca de dois terços
dos alunos tivessem entre 400 e 600 pontos. As pontuações nas escalas de letramento
em matemática foram agrupadas em seis níveis de proficiência que representam
conjuntos de tarefas de dificuldade crescente, em que o nível 1 é o mais baixo, e o nível
6 o mais elevado. Os alunos que tiveram menos de 358 pontos na escala foram
classificados como estando “abaixo do nível 1” e representam 11% do total dos
estudantes dos países da OCDE. Estes alunos não foram capazes de utilizar as
capacidades matemáticas requeridas pelas tarefas mais simples do PISA. A proficiência
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em cada um destes níveis pode ser compreendida através da descrição das competências
matemáticas requeridas para atingi-los. O quadro 3, a seguir, apresenta um sumário
dessas descrições.
Quadro 3: Níveis de Proficiência em Matemática – PISA 2003 – Escala geral
Nível /
Faixa de
proficiência
Proficiência em Matemática
Abaixo nível 1
Menor que
358
Não atingiu as habilidades básicas que o PISA objetivava mensurar.
No nível 1, os estudantes são capazes de responder a questões que envolvem contextos
familiares, em que toda a informação relevante está presente e as questões são
Nível 1
claramente definidas. São capazes de identificar a informação e de executar
De 358 a 420 procedimentos de rotina, de acordo com instruções diretas, em situações explícitas.
Conseguem executar ações que são óbvias e cujo desenvolvimento parte diretamente
dos estímulos dados.
No nível 2, os estudantes são capazes de interpretar e reconhecer situações em
contextos que não requerem mais do que inferência direta. São capazes de extrair
Nível 2
informação relevante de uma única fonte e fazer uso de um único modelo de
De 420 a 482 representação. Os estudantes conseguem empregar algoritmos, fórmulas,
procedimentos ou convenções a um nível básico. São capazes de efetuar raciocínios
diretos e de fazer interpretações literais de resultados.
No nível 3, os estudantes são capazes de executar, procedimentos descritos com
clareza, incluindo os que requerem decisões sequenciais. Conseguem selecionar e
Nível 3
aplicar estratégias simples de resolução de problemas. Neste nível, os estudantes são
De 482 a 545 capazes de interpretar e usar representações, com base em diferentes fontes de
informação, e de raciocinar diretamente a partir delas. Conseguem desenvolver
comunicações curtas, que relatam os seus resultados, interpretações e raciocínios.
No nível 4, os estudantes são capazes de trabalhar eficazmente com modelos explícitos
para situações concretas complexas, as quais podem envolver constrangimentos ou
exigir a formulação de hipóteses. Conseguem selecionar e integrar representações
Nível 4
diferentes, inclusivamente simbólicas, ligando-as diretamente a aspectos de situações
De 545 a 607 da vida real. Neste nível, os estudantes são capazes de utilizar capacidades bem
desenvolvidas e de raciocinar de modo flexível, com alguma perspicácia (insight),
nestes contextos. São capazes de construir e de comunicar explicações e argumentos,
com base nos seus argumentos, interpretações, e ações.
No nível 5, os estudantes conseguem desenvolver e trabalhar com modelos de situações
complexas, identificando constrangimentos e especificando hipóteses. São capazes de
selecionar, comparar e avaliar estratégias adequadas de resolução de problemas, para
lidarem com problemas complexos relacionados com estes modelos. Neste nível, os
Nível 5
estudantes são capazes de trabalhar estrategicamente, usando capacidades mentais e de
De 607 a 669
raciocínio amplas e bem desenvolvidas, representações adequadamente ligadas,
caracterizações simbólicas e formais e a perspicácia (insight) apropriada a estas
situações. Conseguem refletir sobre as suas ações e formular e comunicar as suas
interpretações e raciocínios.
No nível 6, os estudantes são capazes de generalizar e utilizar informação, com base
nas suas investigações e na modelação de situações problemáticas complexas.
Conseguem estabelecer a ligação entre diferentes fontes de informação e diferentes
representações e fazer transferências entre elas, com flexibilidade. Neste nível, os
estudantes dispõem de pensamento e raciocínio matemáticos avançados. Estes
Nível 6
estudantes são capazes de aplicar a perspicácia (insight) e a compreensão, a par do
Acima de 669
domínio de operações e relações matemáticas simbólicas e formais, no
desenvolvimento de novas abordagens e estratégias em face de situações novas. São
capazes de formular e comunicar com exatidão as suas ações e reflexões no que diz
respeito às suas descobertas, interpretações, argumentos, bem como a adequação dos
mesmos às situações originais.
Fonte: OCDE. PISA 2003.
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A criação dos níveis de desempenho na escala contínua possibilita que um grande
número de valores de proficiências seja agrupado dentro de uma determinada faixa de
valores. Em cada nível são descritas as habilidades e competências que um aluno
possui, ou é esperado que o possuísse, quando situado em diferentes pontos da escala.
Assim, em cada nível são descritas as tarefas que ele é capaz de realizar, de acordo com
o conceito de letramento em matemática adotado na avaliação.
6
Apresentação dos Resultados
Com relação especificamente ao letramento matemático, de modo geral percebe-
se que as avaliações buscam compreender a capacidade de mobilização de
conhecimentos associados à quantificação, à ordenação, à orientação e às suas relações,
operações e representações, na realização de tarefas ou na resolução de situaçõesproblema, tendo sempre como referencia as tarefas e situações com as quais os sujeitos
se deparam cotidianamente.
Mas, essa noção de letramento e as formas de avaliá-lo variam entre os países e
podem variar também entre escolas de uma mesma rede de ensino. Na avaliação, de
acordo com Magda Soares,
os critérios segundo os quais os testes são construídos é que definem o que é
letramento em contextos escolares: um conceito restrito e fortemente
controlado, nem sempre condizente com as habilidades de leitura e escrita e
as práticas sociais fora das paredes da escola. (SOARES 1999, p.86)
Nesse sentido, a análise dos itens evidenciou a preocupação do PISA com a
dimensão social da Matemática (lidar com questões familiares e cotidianas, interpretar,
argumentar e comunicar explicações, com base em seus argumentos e interpretações).
Ou seja, o PISA avalia os conhecimentos e habilidades de Matemática necessários às
mais diversas situações da vida real.
A descrição do desempenho dos alunos no letramento matemático requer uma
interpretação educacional dos níveis das escalas de proficiência da avaliação
educacional. Esta análise permite uma aproximação das habilidades dominadas pelos
estudantes e do currículo por eles aprendido. Assim, para que se possa tirar proveito das
potencialidades da interpretação educacional da escala é fundamental que se considere
não apenas a média, mas também a distribuição percentual dos alunos nos diversos
níveis da escala. As tabelas a seguir apresentam, respectivamente, o desempenho médio
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dos alunos brasileiros na escala global e nas subescalas e o percentual de alunos em
cada nível da escala de proficiência em Matemática.
Tabela 1: Desempenho médio em Matemática - escala global e subescalas – PISA 2003
Escala global
de Matemática
Desempenho médio
Desvio padrão
356
0,06
Subescalas de Matemática
Mudança e
Quantidade
Relação
Espaço e
Forma
350
0,06
333
0,08
360
0,07
Incerteza
377
0,06
Fonte: INEP 2004; Base de dados do PISA 2003
Tabela 2: Distribuição percentual de alunos em cada nível da escala de Matemática –
PISA 2003
Abaixo nível 1
Menor que 358
54,4
Níveis de proficiência da escala de Matemática (Em %)
Nível 1
Nível 2
Nível 3
Nível 4
Nível 5
De 358 a 420 De 420 a 482 De 482 a 545 De 545 a 607 De 607 a 669
21,7
13,9
6,5
2,5
0,8
Nível 6
Acima de 669
0,2
Fonte: INEP 2004; Base de dados do PISA 2003
A análise das tabelas acima revela que a situação média dos alunos brasileiros na
avaliação internacional é no mínimo preocupante. As médias em todas as escalas
situam-se abaixo da média do PISA, que é de 500 pontos. Ao mesmo tempo, a tabela 2
evidencia que mais da metade (54,4%) dos alunos brasileiros não desenvolveram as
habilidades básicas que o PISA almejava avaliar. Se considerarmos apenas os níveis
mais baixos da escala, percebemos que 76,1% dos alunos brasileiros de 15 anos
encontram-se no níve1 1 da escala do PISA, ou abaixo dele, e, portanto, são capazes de
responder apenas a questões que envolvem contextos familiares, em que toda a
informação relevante está presente e as questões são claramente definidas. Além disso,
identificam a informação de executar procedimentos de rotina, de acordo com
instruções diretas, em situações explícitas, conseguindo executar ações que são óbvias e
cujo desenvolvimento parte diretamente dos estímulos dados. Esses alunos não são
capazes de interpretar e usar representações, com base em diferentes fontes de
informação ou de raciocinar diretamente a partir delas. Tampouco, comunicam
explicações e argumentos, com base nos seus argumentos, interpretações, e ações. A
análise dos resultados evidencia que esses alunos desenvolveram um nível de
letramento matemático bastante inferior quando comparados com “seus colegas” de
outros países.
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De acordo com um estudo realizado por Aguiar (2008), a partir dos dados do
PISA 2003, com a finalidade de comparar os resultados do desempenho médio entre
estudantes brasileiros e portugueses, o autor conclui que
(...) Embora o Brasil tenha apresentado melhora desde o primeiro ciclo da
avaliação, em 2000, quando o percentual de alunos abaixo do nível 1 era de
62,6%, a situação ainda é muito grave, pois mais da metade de nossos alunos
não foi capaz de utilizar as habilidades matemáticas requeridas pelas tarefas
mais simples da avaliação. Portugal apresenta apenas 11% de seus alunos
neste patamar. Por outro lado, ao compararmos o percentual de alunos nos
níveis mais altos, vemos que enquanto Portugal tem 19% de seus estudantes
nos níveis mais altos da escala (4, 5 e 6), o Brasil tem apenas 3,5% de seus
alunos nesses níveis. (AGUIAR, 2008, p. 85)
Pesquisadores e avaliadores há muito desenvolvem modelos explicativos de
rendimento escolar e pode-se dizer que existe um consenso em relação a algumas
variáveis tradicionais que, já testadas, mostraram-se significativas para interpretar e
explicar resultados alcançados. São variáveis que podem ser intrínsecas ao sistema e,
portanto, suscetíveis a ações a partir de um ponto de vista educacional e escolar. Ou
podem ser do tipo em que a atuação sobre elas já não seja tão simples, como é o caso do
nível socioeconômico e cultural dos alunos. Mas, em ambos os casos, devem ser
consideradas sempre que o objetivo for explicar os rendimentos alcançados pelos alunos
avaliados. O fio condutor desse nosso estudo tem origem no primeiro tipo de variáveis.
Com relação às articulações desses resultados com a Educação Matemática,
considerando o fato de que o letramento em Matemática, definido pelo PISA, é
entendido como “capacidade de um indivíduo identificar e compreender o papel que a
Matemática desempenha no mundo, de fazer julgamentos bem fundamentados e de usar
e se envolver na resolução matemática das necessidades da sua vida, enquanto cidadão
consciente, construtivo e reflexivo” (OCDE,2003), muitas vezes a categorização dos
itens e os diagnósticos para o desempenho alcançado se mostraram bastante difíceis.
Parte dessa dificuldade se deve ao fato de que a grande maioria dos itens do PISA não
se destina a avaliar especificamente um determinado conteúdo, mas sim determinadas
competências matemáticas, o que muitas vezes envolve várias ideias ou conceitos
matemáticos. De qualquer forma não é difícil perceber que, para os padrões do PISA, o
resultado obtido pelos alunos brasileiros está muito aquém do esperado para este nível
de escolaridade. Fica claro também que a melhoria desses resultados passa pelo
rompimento definitivo da visão tradicional, em nossas escolas, que trata a Matemática
como uma ciência neutra e acabada. É preciso valorizar mais o desenvolvimento das
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competências básicas necessárias para o exercício da cidadania em oposição ao ensino
propedêutico e toda a situação de ensino e aprendizagem deve agregar o
desenvolvimento de habilidades que caracterizam o “pensar matematicamente”. Nesse
sentido é preciso dar prioridade à qualidade do processo e não a quantidade de
conteúdos a serem trabalhados.
Além disso, repensar os conteúdos a serem ensinados, com destaques para a
resolução de problemas e a inclusão de novas áreas de conteúdo que propiciem ao aluno
um “fazer matemático” por meio de um processo investigativo que auxilie na
apropriação de conhecimento.
7
Considerações finais
Letramento matemático compreende tanto as habilidades matemáticas que o
sujeito adquiriu ao longo de sua vida quanto a forma como ele coloca em prática essas
habilidades quando lida com situações cotidianas nas quais a matemática se faz presente
e é imprescindível. Assim, no âmbito do PISA, o letramento é definido como a
capacidade de um indivíduo identificar e compreender o papel que a matemática
desempenha no mundo, de fazer julgamentos bem fundamentados e de usar e se
envolver na resolução matemática das necessidades da sua vida, enquanto cidadão
construtivo, preocupado e reflexivo.
No PISA 2003, verificou-se existir uma porcentagem significativa de estudantes
brasileiros de 15 anos com nível de letramento matemático inferior ao nível 1 da escala,
o que configura uma situação grave para cerca de metade dos nossos estudantes. A
comparação de resultados obtidos em Matemática no PISA 2000 com os resultados
obtidos em 2003 indica que, neste domínio, houve uma ligeira melhora. Temos, no
entanto, que considerar que, do primeiro para o segundo estudo, existiu uma alteração
na população alvo: se em 2000 foram selecionados alunos de 15 anos entre os 5º e 11º
anos de escolaridade, em 2003 o intervalo diminuiu, correspondendo agora aos
estudantes entre os 7º e 11º anos de escolaridade.
Os resultados do PISA evidenciam que os alunos, mesmo depois de frequentarem
a escola por muitos anos, não estão alcançando as competências em matemática
esperadas. De modo geral, há evidências de que os alunos brasileiros não desenvolvem
as suas capacidades de lidar com a matemática em situações que exigem raciocínio,
criatividade e argumentação. Esses resultados exigem uma reação do sistema
educacional brasileiro, para que nossas escolas cumpram o papel de preparar os
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estudantes para as sociedades modernas, cada vez mais permeadas pela Ciência e pela
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LETRAMENTO EM MATEMÁTICA NO PISA