XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 2 PERCURSO ESCOLAR DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE POBREZA Natalia de Souza Duarte, Universidade de Brasília; Centro Universitário do DF – UDF Resumo: Este estudo analisa a relação entre a educação formal e a população em situação de pobreza destacando a incidência do fracasso escolar. Reflete sobre o Estado e sobre a educação formal como política social e direito socialmente construído. Apresenta os resultados do estudo multinível realizado sobre o impacto da população beneficiária do Programa Bolsa Família no IDEB da escola, dos sistemas municipais e nos sistemas estaduais, além das variáveis PIB per capita, porte do município, Custo Aluno e Região. Analisa os resultados, confirmando que o percurso escolar da classe popular ainda é eivado de percalços, instituído por um pacto federativo e uma política tributária que concentram pobrezas e riquezas e um custo aluno que não apresenta condições de enfrentar as desigualdades socioeconômicas no interior da escola. Conclui ressaltando as características de uma política pública social e a necessidade de se garantir à escola e à educação a distribuição democrática do sucesso escolar como complementação do acesso à escola. Palavras chaves: Pobreza. Fracasso Escolar. Estudo Multinível O sentido de estudar a pobreza está na sua superação. A compreensão desse fenômeno, assim como de suas múltiplas facetas, precisa ter a força da visibilização e mobilização para que essa situação de risco, vulnerabilidade e privação de direitos, presente em nossa história há muito tempo, seja revertida, assim como já o fizeram inúmeros países em situação econômica, política e social semelhantes a do Brasil. O Brasil não é um país pobre (é a sexta economia mundial), mas um país com muitos pobres - especialmente crianças. Carência, miséria, pobreza relativa, pobreza absoluta, desigualdade social e exclusão são exemplos de diferentes nomes para esse mesmo fenômeno social. A concepção de pobreza que tem força de transformação é a que a percebe como fruto de dinâmicas estruturais, da luta de classes e um problema de toda a sociedade. Marx e Engels (2005 e 2009) interpretam a pobreza como inexorável na sociedade capitalista, fruto da dinâmica de produção que opõe capital e trabalho. Na ilustração da lei geral da acumulação, Marx demonstra que o proletariado vai, a cada período, sendo cada vez mais explorado e menos remunerado por seu trabalho. Tal fato Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.005135 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 3 faz com que se prolifere, no seio da sociedade, camadas miseravelmente pagas que vivem em situação de pobreza e miséria (MARX, 2006). A partir de muitas lutas e movimentos populares o Estado moderno organizou a política social para enfrentar a pobreza. De conceito amplo e complexo a política social permeia a relação entre o Estado e a sociedade, a economia e a política. Esses pares funcionam como polos dialéticos, interligados por laços às vezes alinhados, às vezes antagônicos e o social deriva dessa relação. A política social resulta da atuação governamental deliberada que organiza meios, presta serviços e busca alcançar um mínimo de bem estar social. Historicamente, o Estado que assegurou as melhores condições de existência foi o Estado de Bem-Estar Social, ou Welfare State. Para Coutinho (1996), o Welfare State surgiu em um momento em que a classe trabalhadora, através de suas organizações (sindicais, políticas), obteve uma forte incidência na composição da correlação de forças entre o trabalho e o capital, conseguindo que fossem acolhidas muitas das demandas por melhores condições de vida. O “encontro da igualdade democrática com as desigualdades capitalistas engendra a formação do Estado-providência e de um sistema de proteções e de direitos sociais. Como as principais desigualdades são oriundas do trabalho, a sociedade salarial organiza a coesão e a integração sociais a partir do trabalho que, ao mesmo tempo, opõe e une os indivíduos” (DUBET, 2001, p. 7). Os serviços prestados pelo estado diferem-se e dependem da força e organização dos movimentos sociais e oscilam entre a perspectiva universal e a restritiva e focalizada. Desse modo, asseguram um conjunto de direitos econômicos, políticos e sociais, mais ou menos abrangentes e oscilam da manutenção e garantia do controle social à busca efetiva e plena do desenvolvimento humano de toda a sociedade. Para Titmuss (1976), a busca da igualdade implica escolhas entre objetivos e fins políticos em conflito, assim como a formulação de políticas e serviços sociais como meios para alcançá-la. A prestação de serviços deve ser vista como uma questão de direito, sendo o Estado o assegurador da cidadania por meio da prestação de serviços universais em contraposição ao Estado neoliberal que opta por políticas sociais minguadas e focalizadas com uma concepção de cidadania restrita. Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.005136 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 4 De um modo geral, as conquistas sociais caminham para universalização e implicam em gradativa ampliação dos gastos sociais, pelo menos esse foi o percurso dos países de Bem Estar Social. A ideia da política social como instrumento de inclusão social implica em programas e ações que visam proporcionar a redução da desigualdade social. No Brasil, para implementar a política educacional, foi necessário a conjunção da democracia formal com o fortalecimento do Estado e forte expansão e cobertura dos seus programas e ações para o alcance atual de sua universalização. Mesmo reconhecendo que o Brasil vem enfrentando a pobreza, que o número de pessoas que vivem abaixo da linha de pobreza foi reduzido à metade nos últimos dez anos, quando se analisa a população escolar do ensino fundamental público percebe-se outro contexto: são 44% de beneficiários do Programa Bolsa Família no Brasil, com 67% de beneficiários nas escolas públicas do Nordeste e 73% de pobres dentre os alunos do ensino fundamental no Estado de Alagoas (DUARTE, 2011). E não há nenhuma ação política ou projeto específico para esse público. Essa presença massiva de pobres na escola não tem passado despercebida e, em muitas pesquisas, vem sendo relacionada como elemento explicativo dos indicadores tão desiguais na educação. É certo que a conquista do acesso aos diversos níveis de ensino, mesmo que, mormente, no nível fundamental, significou uma grande conquista para as classes populares e inaugurou o ingresso dessa população em uma instituição que antes era elitista e limitada a uma minoria. Hoje, a escola pública brasileira atende ao universo da população em idade escolar e é realidade presente em todos os territórios nacionais. No entanto o sistema educacional brasileiro deixou de realizar a exclusão da escola para substituir essa interdição por um percurso escolar repleto de fracasso e evasão. Pobreza e a desigualdade vêm sendo apontadas como os fatores principais que contribuem para perpetuar o fracasso escolar que, por sua vez, tem explicado a reprodução social e a limitação da mobilidade. A realidade educacional corrobora ao estigma do Brasil como país da desigualdade social. Os indicadores educacionais desiguais demonstram, especialmente, o distanciamento de ricos e pobres. Verifica-se distorção idade/série, taxas elevadas de repetência, baixa abrangência do ensino médio e ainda mínima no ensino superior. Apesar disso, a educação é das poucas políticas sociais de acesso universalizado. Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.005137 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 5 Muito já foi alcançado. No começo da República tínhamos oferta educacional para menos de 10% da população. Adentramos ao século XX com mais de 65% da população adulta analfabeta (BRASIL, 2003), mas a partir da década de 1930 implementa-se um sistema educacional que, a custa da redução de jornadas para tempo parcial, improvisação e desvalorização salarial do professor alcançou cobertura, nos anos 50, de mais de 50% das crianças em idade escolar (7 a 11 anos na época). Entre idas e vindas, ingressamos no século XXI com uma cobertura quase universal, mas com outros problemas: baixo salário dos professores, formação inicial ainda inadequada, ausência de horário remunerado para planejamento e trabalho coletivo, turmas superlotadas, espaços precarizados, ausência de material didático diversificado e indicadores educacionais extremamente desiguais (MONLEVADE, 2008). O processo histórico relatado é visibilizados pelo sistema de avaliação educacional iniciado nos anos 90 que se consolida com o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB, criado para medir a qualidade da escola e das redes de ensino. Na divulgação do primeiro IDEB, em 2005, tínhamos sistemas de ensino com notas que variavam de 1,8 a 6,0 e com IDEB de escolas que variavam de 0,7 a 8,5 em uma escala de 0 a 10. O IDEB de 2009 dos Sistemas municipais variou de 0,5 a 8,2 e das escolas variou de 0,8 a 9,0 (MEC, 2007). Ou seja, a discrepância aumentou sendo que os baixos IDEBs no levam, justamente, aos territórios de maior risco e vulnerabilidade social. Pesquisa Considerando o caminho percorrido pela educação brasileira, essa pesquisa buscou investigar e estabelecer contornos conceituais mais precisos da relação entre educação formal e pobreza. Teve por questão orientadora: Como a educação se relaciona com a população em situação de pobreza? Questão desdobrada em: Qual o impacto da população em situação de pobreza no IDEB? Para calcular esse impacto, optou-se pelo estudo multinível, um tipo de regressão multivariada que considera os níveis em que as variáveis estão inseridas para não ocorrer o “rebaixamento artificial” de variáveis de níveis diferentes em um único plano. A regressão multinível considera a estrutura hierárquica dos dados (LAROS; MARCIANO, 2008). Tal opção deu-se em virtude de haver IDEB para escolas, sistemas Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.005138 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 6 municipais e estaduais, considerando-se importante reconhecer esses níveis. Essa metodologia permitiu considerar distintamente a escola e os sistemas de ensino municipal, estadual e federal a fim de ponderar, ao tempo de contrapor e convalidar os achados dos estudos estatísticos regressivos lineares. A hipótese formulada era de que a educação formal se relaciona com a população em situação de pobreza, consideravelmente, por meio do fracasso escolar e que, se fosse possível ponderar a população em situação de pobreza de cada uma das escolas e dos sistemas de ensino, verificar-se-ia estatisticamente o impacto negativo da pobreza no IDEB. Em virtude da abrangência do Estudo delineou-se estudo quantitativo o mais abrangente possível, investigativo de como a política educacional absorve a população em situação de pobreza. Buscou-se investigar objetivamente em que medida o fracasso escolar é instado na relação da educação formal com a população em situação de pobreza. Para tanto, se utilizou como recorte de pobreza ser beneficiário do Programa Bolsa Família com frequência escolar acompanhada pelo MEC. Assim estruturou-se banco de dados a partir de quatro sistemas nacionais de informações: Censo Escolar/INEP, IDEB/INEP, Projeto Presença - MEC/MDS e IBGE. Mais duas informações foram adicionados ao banco de dados em construção: PIB per capta do município e população. Essas duas informações tinham o objetivo de relacionar IDEB com riqueza (em compensação à pobreza) e ao porte do município (tendo em vista que há consenso de que quanto maior o município, mais disponíveis e melhores são os serviços prestados para a comunidade). Essas últimas informações foram retiradas da pesquisa Produto Interno Bruto dos Municípios 2004-2008 do Sistema de Contas Nacionais do IBGE. O Banco de dados definiu como dados da pesquisa às 198.398 escolas no Censo Escolar de 2009, 163.117 escolas com frequência de BPBF acompanhada pelo Projeto Presença e 48.506 escolas com IDEB calculado de 4.409 sistemas de ensino. Como havia interesse de convalidar os achados estudaram-se somente as escolas e sistemas de ensino que tinham IDEB em 2007 e 2009. O IDEB foi eleito variável dependente e as variáveis independentes constituíram-se em: percentual de matrícula de beneficiários do programa Bolsa Família na escola (%BPBF); Custo Aluno do FUNDEB; porte do Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.005139 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 7 município (população); Região; e PIB per capta. Esse último como referência para a riqueza disponível à política educacional por meio da arrecadação de impostos do município ou Estado. Por fim, foram consideradas todas as escolas e todos os sistemas de ensino que continham IDEB 2007 e 2009. Assim, estudou-se 93% das escolas existentes no país por meio de quatro bancos de dados: 1) Escolas, 2) Sistema de ensino municipal, 3) Sistema de ensino Estadual e 4) Sistema de ensino federal. Primeiros Achados O primeiro passo foi verificar a correlação entre pobreza e o IDEB. Em 2007, verificou-se correlação forte e negativa entre pobreza e IDEB (r=-0,51), uma correlação média positiva entre IDEB e PIB per capta (r=0,31) e uma correlação baixa entre IDEB e porte do município (r= 0,03). O IDEB baixo foi associado a grande presença da população em situação de pobreza, pois apresentou taxa de correlação muito forte para fenômeno social (HAIR ET AL., 2005). Repetiu-se os estudos de correlação com os dados de 2009 e os resultados mantiveram-se os mesmos. Já com o banco de dados dos sistemas municipais, encontrou-se uma correlação menor que a do nível da escola, porém ainda muito forte e negativa entre pobreza e IDEB (r=-0,47), uma correlação média positiva entre IDEB e PIB per capta (r= 0,32) e uma correlação praticamente inexistente entre IDEB e porte do município (r= 0,02). Para o sistema estadual observou-se novamente uma correlação muito forte e negativa entre pobreza e IDEB (r=-0,49). Porém, constatou-se achados muito diferentes na correlação com as outras variáveis: foi encontrada uma correlação positiva altíssima entre IDEB e PIB per capta (r= 0,65) e uma correlação média entre IDEB e porte do Estado (r= 0,29). Prosseguiu-se realizando as investigações, agora com estudos multinível entendendo-se o nível das variáveis independentes como: população em situação de pobreza - nível 1; população e PIB per capta - nível 2; e Custo Aluno e Região - nível 3. A variável PIB per capta foi retirada do modelo tendo em vista ter apresentado Razão t < 1,96. O IDEB da escola continuava como variável dependente. Os impactos Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.005140 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 8 calculados para as escolas sem efeito randômico ou de interação foram: %BPBF r=0,32; Custo Aluno r=0,16; População r= -0,15 e Região r= 0,85. Os achados com o banco de dados de 2009 foram praticamente os mesmos. Avançou-se com os estudos multinível agora realizados com o banco de dados dos sistemas municipais, entendendo o nível das variáveis independentes como: %BPBF do sistema – nível 1; população do município – nível 1; PIB per capta do município – nível 1; Custo Aluno e Região – nível 2. Já a variável dependente era o IDEB do município. A variável PIB per capta foi inserida no lugar do porte do município tendo em vista que, com esse banco de dados, foi a população que apresentou Razão t < 1,96. Os impactos calculados para os sistemas municipais, também sem efeito randômico ou de interação, foram: %BPBF r=-0,15; Custo Aluno r=0,20; e PIB per capta r= 0,05. Percebeu-se que o impacto positivo do Custo Aluno é maior que o impacto negativo da pobreza. Entretanto, a riqueza (PIB) quase não alcança o sistema municipal. Outra surpresa: quando se inseriu a variável Região e calculou-se a interação com a variável %BPBF, verificou-se para a pobreza um impacto residual de r=-0,02 e para Região o valor de r=-0,26. Complementarmente, optou-se então por calcular o impacto da pobreza no IDEB separando os municípios em duas grandes Regiões (Região 0 que agrupa as Regiões nacionais N e NE; e 1 para as Regiões CO, SE e S). Com essa separação, encontraram-se os seguintes achados de impacto da pobreza no IDEB do município: Região 0 r=-0,04 e Região 1 r=-0,22. Ou seja, a Região Sul, Sudeste apresenta impacto muito maior da população pobre no IDEB. Repetiram-se os procedimentos com o banco municipal de 2009 e os mesmos resultados foram encontrados. Prosseguiu-se com atitude investigativa para compreensão desse achado e realizou-se regressão linear com o banco de dados das escolas, agora separadas por Estado. Após a realização das 27 regressões lineares, verificaram-se comportamentos bem diferentes por Estado, com impactos da pobreza que variaram de r=-0,09 (em PE e PB) à r=-0,73 (RR). Considerações Finais Os resultados permitem comprovar a hipótese formulada. A relação da política social de educação com a população em situação de pobreza se manifesta, Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.005141 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 9 consideravelmente, por meio do fracasso escolar. O impacto negativo da pobreza no IDEB foi confirmado em todos os estudos estatísticos realizados - a exceção do estudo multinível realizado com o banco de dados dos sistemas municipais das Regiões Norte e Nordeste. E também visibilizou questões muito importantes a serem destacadas. Há um imenso quantitativo de pobres nas escolas públicas do Brasil que não são considerados nem pela escola nem pelas políticas educacionais o que nos leva a reprodutividade no sistema educacional público, pois a população em situação de pobreza impacta negativamente o IDEB da escola e dos sistemas municipais e estaduais de educação. Como o porte do município não influencia positivamente o IDEB, entendeu-se esse resultado como indício de ausência de intersetorialidade nas políticas sociais, pelo menos no que se refere ao funcionamento das escolas públicas - os maiores IDEBs são de escolas e sistemas municipais de pequeno porte. A triste constatação de que a riqueza não adentra a escola, alcança de maneira frágil o sistema municipal de educação e faz diferença apenas no nível estadual pode ser interpretada como fruto de um pacto federativo (SALVADOR, 2010). A política tributária não tem permitido que a riqueza gerada socialmente alcance a escola e beneficie mais democraticamente a população. Foi constatado que a Região continua informando sobremaneira as condições socioeconômicas de seus municípios e estado (SANTOS e SILVEIRA, 2011). Esse é um possível indício de que políticas públicas diferenciadas precisam ser realizadas para que se assegure às Regiões Norte e Nordeste o desenvolvimento humano paritário com as demais Regiões do País. Constatou-se a importância do Custo Aluno, sendo necessário defender o Custo Aluno Qualidade Inicial pela capacidade que o Custo Aluno apresentou em moderar e mediar a pobreza nas escolas. A defesa de Carreira e Pinto (2007) precisa ser considerada como agenda em tempos de aprovação do PNE 2011-2020. É necessário assegurar o CAQ no texto da Lei, com reivindicação de pelo menos 10% do PIB para financiamento da educação. Somente assim, pode-se efetivamente enfrentar a reprodutividade encontrada nas escolas e sistemas de ensino público. Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.005142 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 10 Por fim, esse estudo permitiu algumas indicações: nenhuma política pública nasce no Estado, nenhum direito é conquistado sem luta e nem tão pouco é mantido com passividade. As prioridades em políticas públicas emergem da sociedade e aqui destacam-se os movimentos sociais e as universidades. Só adentra a agenda do Estado o que se constitui em demanda visibilizada e vocalizada. Isto é, quando intelectuais, sindicatos, movimentos sociais e grupos da sociedade civil se organizam em torno de uma agenda. A própria escola tem possibilidades de mobilização impressionantes: um quarto da população brasileira vai à escola cotidianamente. Foram 55 milhões de estudantes em 2011. É necessário entender a magnitude desse número que, por si só, já legitima as demandas por mais recursos levantadas aqui. Apontar desafios e fragilidades deve seguir a linha de corroborar a existência de uma escola justa, que ainda não existe, mas que deve ter a força de um futuro cada vez mais próximo. É fundamental termos a igualdade como condição possível para transformar o presente. Também se faz necessário a visibilidade na pobreza juvenil e infantil, tanto para mobilizar políticas públicas que a reconheçam e a apoiem, como para que as escolas considerem essa situação na organização do seu trabalho pedagógico. É necessário eleger o território escolar como lócus privilegiado para o enfrentamento das vulnerabilidades sociais de grande parte das crianças e adolescentes que frequentam a escola; Também se faz necessário efetivar políticas intersetoriais à educação, que, articuladas na escola e em seu entorno, consigam atuar de forma a ampliar as atividades escolares no sentido de alcançar uma educação integral, inclusive, com ampliação de tempos e espaços educacionais. O aproveitamento conjunto de espaços, equipamentos e especialidades permite cofinanciamento e maior efetividade às políticas sociais afetas. Por fim, urge reconhecer e valorizar os profissionais da educação que, a despeito das condições do magistério – desprestígio social, baixos salários, formação inicial inadequada, formação continuada insipiente, materiais didáticos e tecnologias inexistentes no espaço escolar, ausência de artes, cultura, esportes – continuam na luta para o asseguramento de direitos e plenificação da cidadania. Que a alegria da docência não fraqueje frente os desafios tão complexos listados nesse trabalho. Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.005143 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 11 O sentido dessas indicações propostas aqui está no compromisso com a visibilização da pobreza, mas também nas implicações transformadoras dessa visibilização, pois não basta compreender o mundo, é necessário transformá-lo! (MARX, 1979). *A elaboração do presente trabalho contou com o apoio da CAPES, através do Programa Observatório da Educação (Edital 038/2010/CAPES-INEP). REFERÊNCIAS BRASIL. Mapa do Analfabetismo. Brasília: INEP/MEC, 2003. CARREIRA, D. e PINTO, J. M. R. Custo aluno qualidade inicial: rumo à educação pública de qualidade no Brasil. São Paulo: Global: Campanha Nacional pelo direito à Educação, 2007. COUTINHO, C. N.. Marxismo e política: a dualidade de poderes e outros ensaios. São Paulo: Cortez Editora, 1996. DUARTE, N.. 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