Alternativas para o Desenvolvimento da Pecuária de Corte no Município de Bagé/RS: uma Aplicação da Abordagem de Clusters Guilherme Cunha Malafaia Doutorando do PPG-Agronegócios/Centro de Estudos e Pesquisas em Agronegócios (CEPAN)/ Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Professor da Universidade de Caxias do Sul - UCS Av. João Pessoa, 31 – Porto Alegre – RS. e-mail:[email protected] Edson Talamini Doutorando do PPG-Agronegócios/Centro de Estudos e Pesquisas em Agronegócios (CEPAN)/ Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Professor da Faculdade de Economia da Universidade de Passo Fundo Rua Padres Capuchinhos, 1048 – Centro – Marau/RS – CEP: 99150-000 e-mail: [email protected] Roni Blume Doutorando do PPG-Agronegócios/Centro de Estudos e Pesquisas em Agronegócios (CEPAN)/ Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Av. João Pessoa, 31 – Porto Alegre – RS. E-mail: [email protected] 4. Sistemas Agroalimentares e Cadeias Agroindustriais Apresentação em Sessão sem Debatedor XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” Alternativas para o Desenvolvimento da Pecuária de Corte no Município de Bagé/RS: uma Aplicação da Abordagem de Clusters Resumo Com a globalização o acirramento das relações capitalistas tem imprimido nas organizações, transformações estruturais nos sistemas produtivos. Dentre os desafios a serem enfrentados pode-se ressaltar a dificuldade que algumas cadeias produtivas encontram para modificar a estrutura produtiva na busca de um arranjo que possibilite ganhar em competitividade. Diante a questão o presente trabalho tem por objetivo identificar a presença de elementos que possam configurar um cluster de bovinocultura de corte no município de Bagé, Região da Campanha do Estado do Rio Grande do Sul. Através de uma pesquisa exploratória baseada em entrevistas semi-estruturas, com representantes de diversos setores da cadeia da carne bovina da região, buscou-se identificar a presença de tais elementos e as dificuldades que inibem a efetiva formação de um cluster. Os resultados encontrados demonstram que os elementos necessários à formação do cluster existem. Entretanto, para colocar em prática a proposta é prioritário lidar com alguns entraves como a presença de oportunismo entre os agentes, sendo que este se coloca como um dos principais fatores inibidores e desagregantes da concretização do arranjo produtivo, incutindo perdas para toda a cadeia. Palavras-chave: cluster, carne bovina, competitividade, arranjos produtivos Alternativas para o Desenvolvimento da Pecuária de Corte no Município de Bagé/RS: uma Aplicação da Abordagem de Clusters Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 2 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” 1. INTRODUÇÃO As mudanças no cenário competitivo mundial têm dificultado a sobrevivência das empresas, obrigando as mesmas a estabelecerem relações cooperativas com vistas a obter os fatores de produção necessários à sua manutenção e sobrevivência nos mercados. Nesse contexto, percebe-se uma mudança de foco em termos de gestão, onde novas formas emergem em detrimento a outras. A visão isolada da unidade produtiva competitiva perde espaço para uma visão mais abrangente de grupos de empresas competitivas. Os novos arranjos produtivos podem ser analisados sobre diferentes denominações, tais como: Cadeias, Filiére, Clusters, Redes, Alianças, Corporações Virtuais, entre outros. As empresas organizadas nesses novos modelos produtivos buscam estabelecer relações mais próximas, sejam elas formais ou informais, com o objetivo de melhorar o desempenho mútuo. Em outras palavras, as empresas estão cada vez mais buscando criar parcerias na busca de vantagens competitivas, onde de uma forma individual dificilmente conseguiriam obter. Percebe-se, dessa forma, que os relacionamentos interorganizacionais abrem um enorme caminho para avançar em estudos sobre a abordagem sistêmica e interdisciplinar. No caso dos agronegócios existe um conjunto de especificidades que resultam na definição de um espaço sistêmico de análise, qual seja, a cadeia produtiva agroindustrial. O entendimento do conceito de cadeia produtiva, em todos os seus componentes e inter-relações é fundamental para o sucesso das diretrizes e políticas, estabelecidas pelos gestores empresariais e autoridades públicas. A falta de entendimento do conceito de cadeia produtiva dificulta sintonizar as organizações com o ambiente competitivo, como se percebe, por exemplo, na cadeia produtiva da carne bovina. Essa cadeia, no Rio Grande do Sul, vem enfrentando constantes dificuldades decorrentes da falta de subsídios para nortear o setor de forma sistêmica. As limitações do sistema produtivo, em termos de sustentabilidade, de eficiência de desempenho, da necessidade de se abordar o assunto sob o enfoque de cadeia produtiva e de agronegócios, determinam que ações devem ser tomadas de imediato para reverter à situação atual do setor bovino de corte, que vem ao longo dos anos perdendo mercado para outras cadeias agroalimentares concorrentes. Sendo assim, o conhecimento da realidade estrutural e dos fatores que condicionam a competitividade da cadeia produtiva da carne bovina assumem papel decisivo no encadeamento das ações específicas para exploração da bovinocultura de corte. Adicionalmente, também se poderiam melhorar as condições de sustentabilidade e competitividade, tanto ao nível interno, como ao nível de mercado internacional. Nesse sentido, o presente trabalho tem como objetivo identificar os elementos que possam configurar um cluster na bovinocultura de corte no município de Bagé, Região da Campanha do Estado do Rio Grande do Sul. Espera-se com isso, contribuir com a discussão teórica sobre a formação de clusters e a competitividade sistêmica, bem como mostrar alternativas que visem promover a competitividade da cadeia produtiva da carne bovina no Rio Grande do Sul, em especial na região da Campanha. Na verdade, o que se busca ressaltar é que o estudo, mesmo que embrionário, apresenta condições de subsidiar informações para a formulação de estratégias de desenvolvimento regional para a referida região do Estado do Rio Grande do Sul, a qual encontra-se em uma situação econômica desfavorável há muito tempo, e que possui na bovinocultura de corte uma de suas principais fontes de geração de renda. A seguir, será apresentada uma discussão teórica sobre análise de clusters, o que proporcionará um embasamento para que se possa atingir o objetivo proposto nesse trabalho. Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 3 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” Logo em seguida, será discorrido sobre o método utilizado para a execução da pesquisa e, após, a apresentação dos resultados e as considerações finais. 2. REVISÃO DA LITERATURA 2.1. Clusters: Aspectos Gerais A dinâmica da política e da econômica mundial altera constantemente a forma de organização das empresas na busca pela permanência no mercado. Desde a Revolução Industrial, no final do século XVIII, até os dias atuais a forma como as empresas atuam modificou-se consideravelmente, partindo de atuações isoladas – ou quase isoladas, onde cada empresa preocupava-se com seu negócio em particular – para outros arranjos produtivos nos quais a integração entre empresas é uma característica destacada. Nesse sentido, tornaram freqüentes na prática da organização empresarial – e na literatura – termos como: cadeias, redes, alianças, distritos industriais 1, dentre outros. Neste tópico será abordado um outro arranjo organizacional e produtivo: os “clusters”, os quais, seguindo a definição de Meyer-Stamer (2001), seriam os próprios distritos industriais (industrial district) tal como definidos por Alfred Marshall há mais de um século, como sendo uma aglomeração de empresas do mesmo ramo ou ramo similar, onde mão-deobra especializada, insumos e prestação de serviços estão facilmente disponíveis, e onde inovações se tornam rapidamente conhecidas. A questão é: porque esse conceito definido no século XIX só começou a ser redescoberto na década de 1980? Segundo Meyer-Stamer (2001), pelo menos dois modelos de gestão adotados pelas empresas e relacionados ao mundo globalizado fizeram com que os distritos industriais ou clusters influenciaram seu ressurgimento: primeiro, a adoção dos conceitos de logística just-in-time pelas empresas fez com que fornecedores de peças, de ramos bens definidos, estabelecessem suas fábricas geograficamente próximas das grandes empresas compradoras; e segundo, o modelo de gestão baseado nas competências centrais das empresas (core competence) e a terceirização fizeram com estas passassem a comprar certos produtos e serviços no mercado e não mais produzi-los internamente. A Itália é o país no qual os distritos industriais ou clusters encontram-se mais desenvolvidos. A experiência neste tipo de arranjo produtivo vem desde o início da década de 1980, há mais de vinte anos, portanto. No Brasil esse conceito e prática é mais recente, assim como em outros países – embora a experiência brasileira seja posterior à dos Estados Unidos, por exemplo. Isso se deve especialmente a abertura tardia da economia brasileira para um mercado globalizado, processo esse que só começou com a adoção das políticas prescritas pelo Consenso de Washington 2 no início da década de 1990 e se acentuou nos anos seguintes. 1 Segundo Meyer-Stamer (2001, p. 6) “um industrial district não é o distrito industrial conhecido no Brasil: um conjunto de lotes com empresas de vários ramos. O industrial district é uma aglomeração industrial com perfil restrito de especialização, como as centenas de empresas que produzem calçados femininos, por exemplo”. 2 O Consenso de Washington foi um conjunto composto por dez políticas de reforma prescritas para o desenvolvimento dos países da América Latina. Foi denominado de “Consenso de Washington” por duas razões: primeira, tratava-se das principais políticas sobre as quais o autor, John Williamson, julgava haver um certo grau de concordância entre os economistas de várias instituições financeiras e governamentais sediadas em Washington; e, justamente por estarem sediadas na capital dos Estados Unidos o termo absorveu o nome da capital daquele país. As dez políticas tiveram três pontos prioritários: disciplina macroeconômica, economia de Mercado e abertura comercial e financeira para o mundo globalizado. Para mais detalhes sobre o Consenso de Washington ver Williamson (1990). Muitas críticas surgiram a tais políticas e, no Brasil especialmente, os governos foram rotulados de “neoliberais” ou então de adotarem um “fundamentalismo de mercado”. Nos anos recentes as críticas se intensificaram e novas agendas de reforma estão sendo discutidas. Para maiores detalhes quanto às críticas e reformas ver, por exemplo, Stiglitz (2002). Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 4 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” A rápida abertura da economia brasileira trouxe sérios problemas às empresas brasileiras até então baseadas nas políticas dos programas de substituição de importações implementados nas décadas de 1960 e 1970, especialmente. A globalização, portanto, chegou mais tardiamente ao Brasil do que a outros países e por isso as empresas/indústrias locais sentiram a necessidade de ajustarem suas formas de gestão a esta nova realidade. Como conseqüência, arranjos produtivos bem sucedidos em outros países passaram a ser imitados por empresas brasileiras, ou ainda, foram introduzidos aqui por empresas multinacionais as quais, com a liberalização comercial e financeira, puderam investir no país. Entre os novos arranjos necessários e decorrentes das novas necessidades também esteve a formação de clusters por motivos já bem justificados por Meyer-Stamer (2001). Desde a definição que Marshall formulou para este tipo de arranjo industrial, ficou clara a importância que o aspecto geográfico representa para a formação de clusters. Azais et al. (1997) afirmam que nesse contexto é importante definir o território como sendo um lugar de produção e reprodução, de circulação e de acumulação de valores. Logo, o território passa a ser um conjunto sistêmico com articulações. É nesse conjunto sistêmico que as redes produtivas, tanto físicas quanto virtuais, acumulam potencialidades que se manifestam no modo de vida dos indivíduos pertencentes aquele espaço geográfico. A ocupação espacial do território por arranjos produtivos pode ser feita tanto por clusters quanto pelos os distritos industriais. Existe uma diferença sutil entre os dois arranjos. Tomando a definição de Marshall (1920) apud Schmitz e Nadvi (1999, p. 1504), um cluster 3 é uma “aglomeração de firmas engajadas em atividades similares ou relacionadas que gera um conjunto de economias externas localizadas que baixam os custos dos produtores organizados em forma de cluster”. Um distrito industrial por sua vez, pode ser definido conforme a descrição de Meyer-Stamer (2001, p. 6) – ver nota de rodapé – ou ainda conforme a definição proposta por Becattini (1994), para o qual um distrito industrial é uma entidade socioterritorial caracterizada pela presença ativa de uma comunidade de pessoas e de uma população de empresas, num determinado espaço geográfico e histórico. Neste, tende-se a criar uma osmose perfeita entre a comunidade local e as empresas. A diferença essencial entre clusters e distritos industrias – uma vez que ambos são definidos dentro de um determinado espaço geográfico ou território de atuação – parece estar na área de atuação das empresas que formam cada um dos arranjos produtivos. Enquanto num distrito industrial estão presentes empresas que atuam na produção de bens similares, num cluster os produtos e serviços são complementares. No entanto, existem outras características específicas dos clusters. Rabellotti (1997), por exemplo, cita pelo menos quatro características fundamentais presentes nesses arranjos produtivos com base na experiência italiana: 1. clusters de empresas principalmente pequenas e médias concentradas espacialmente e especializadas setorialmente – segundo Schmitz e Nadvi (1999) o estudo e a presença de clusters formados por pequenas e médias empresas é uma característica dos países em desenvolvimento; 2. relações interfirmas a montante e a jusante, baseados em intercâmbio de bens do mercado como fora dele, informações e pessoas – esta característica deixa clara a existência de complementaridade dos bens e serviços fornecidos entre as empresas localizadas em um mesmo cluster geográfico ao contrário da especialização em um determinado produto ou serviço que caracteriza os distritos industriais; 3. identidades sócio-culturais comuns que vinculam os agentes econômicos e criam um código de comportamento, as vezes explícito, porém freqüentemente implícito; 3 Tradução livre do texto em inglês: “agglomeration of firms engaged in similar or related activities generated a range of localized external economies that lowered costs for clustered producers” (SCHIMTZ e NADVI, 1999. p. 1504). Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 5 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” 4. uma rede de instituições públicas e privadas locais de apoio aos agentes econômicos atuando dentro dos clusters – uma discussão atual sobre a participação do poder público 4 (Estado) no incentivo ao desenvolvimento de arranjos industrias como os clusters, por exemplo, pode ser acompanhada em Stiglitz (2002) e Meyer-Stamer (2001). Logo, a análise de um cluster deve levar em conta quatro pontos fundamentais: (i) tamanho, distribuição espacial e especialização das mesmas; (ii) relações interempresas; (iii) questões sócio-culturais; e (iv) as instituições. Nesse sentido, Feger et al. (2002) ao estudarem a configuração de um cluster de vitivinicultura no Vale do Rio do Peixe/SC, levaram em consideração as seguintes características: 1. participação do Poder Público: como os governos (Estaduais e municipais) atuam no sentido de apoiar o desenvolvimento do referido cluster; 2. associação de empresas: identificando a existência de associações que façam a convergência das decisões do setor, bem como incentivando ações entre as diversas empresas associadas; 3. instituições de suporte: evidenciando a presença ou não de instituições que dêem suporte ao desenvolvimento do setor, especialmente na formação de mão-de-obra especializada; 4. instituições de pesquisa: buscando identificar a presença de centros de pesquisas localizados regionalmente e que possibilitem o desenvolvimento de novas tecnologias de produção que permitam ganhos de qualidade e produtividade; 5. informações mercadológicas: se existe na região alguma entidade que forneça constantemente informações mercadológicas – tais como: preços, produção, produtividade, competitividade, qualidade, etc... – sempre atualizadas e em nível nacional e internacional; 6. centros tecnológicos: especialmente voltados para o desenvolvimento de novos processos de produção, ou seja, para processos de produção do produto principal (vinho) especificamente; 7. recursos financeiros: presença de instituições que disponibilizem linhas de crédito às diferentes empresas do setor, desde os produtores rurais até as indústrias de transformação e comercialização; 8. consórcios de PME: identificando a presença desse tipo de associação visando (i) a obtenção de escala de produção para atender mercados maiores, e (ii) melhor a qualidade da produção e conseqüentemente do produto; 9. redes de grandes empresas (supply chain): verificando a presença de relações de empresas de maior porte com outros níveis da cadeia, especialmente com seus fornecedores; 10. alternativas de articulação: para o caso de não estar constituída e solidificada uma instituição capaz de articular todas as empresas envolvidas, que alternativas possíveis podem ser consideradas para viabilizar a formação do cluster. No entanto, segundo Meyer-Stamer (2001) nem todos os agrupamentos de empresas 4 Nos anos recentes se abriu um novo campo de discussões quanto a participação do Estado ou poder público na economia. Se não como um agente envolvido diretamente na produção, então atuando como um regulador da economia, minimizando os impactos negativos da coordenação pura e simples do mercado e desenvolvendo políticas de incentivo a novos arranjos industriais, tais como os clusters (Detalhes desta discussão podem ser acompanhados em Stiglitz, 2002). Meyer-Stamer (2001), além de fazer referência ao papel do Estado no desenvolvimento desses arranjos industriais, destaca que nos países em desenvolvimento é uma característica que os clusters sejam formados por pequenas e médias empresas, diferentemente da Itália – especificamente sobre a Terza Italia ver Galvão, 2000) – e de outros países onde grandes empresas atuam como promotoras da instalação dos clusters. Considerações acerca desta característica em países em desenvolvimento também podem ser vistas em Schmidt e Nadvi (1999). Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 6 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” podem ser analisados e incentivados de uma mesma maneira. O autor apresenta três tipos diferenciados de cluster que requerem interpretações e incentivos diferenciados entre si, quais sejam: o cluster de sobrevivência, o cluster fordista e o cluster transnacional. Seguindo as definições do autor, tem-se um cluster de sobrevivência como aquele que pertence “ao setor informal da economia, é constituído por microempresas de subsistência com determinadas características que se destacam: capital social modesto, grande desconfiança entre empresas, concorrência ruinosa e mínima capacidade de inovação” (pp. 9-10). Um cluster fordista é uma aglomeração de grandes empresas motivada por políticas governamentais de substituição de importações e que apresentam como característica principal a preocupação com a escala. Por não estarem perfeitamente adaptadas aos novos modelos de gestão as empresas ainda são pouco flexíveis (pp. 10-1). O cluster transnacional está “cada vez mais presente nos países em desenvolvimento. Esse tipo de cluster é resultado de estratégias alteradas de empresas transnacionais. Nas décadas passadas, geralmente com base nas exigências do governo do país hospedeiro, esses clusters contribuíram para o desenvolvimento de fornecedores, como forma de investimento nos países em fase de industrialização. Desde o final da Rodada do Uruguai, contudo, tais exigências (local content) já não são possíveis...com o passar do tempo as empresas passaram a reorganizar suas estruturas de fornecedores também em países industrializados ...restando os ‘fornecedores de sistemas’... a combinação desses dois fatores – local content e globally preferred suppliers – fez nascer, nos países em desenvolvimento, clusters formados por empresas transnacionais, que reúnem não apenas os fabricantes dos produtos finais, como também a maioria dos fornecedores” (pp. 11-2). Quanto às características específicas ao processo de produção de um cluster destacam-se a flexibilidade e a especialização: a) flexibilidade: deriva de relações especiais no mercado de trabalho, uso intensivo de trabalhadores domésticos, disponibilidade de trabalho em horasextras permitindo adaptações rápidas da força de trabalho, de modo a poder responder às oscilações de mercado; b) especialização: deriva da divisão do processo de produção em fases (empresas estágios), permitindo a exploração mais eficiente de diferentes economias de escala e maior capacidade de inovação do que as firmas integradas verticalmente. Galvão (2000) destaca que o método desenvolvido por Porter (1993), denominado de losango da “vantagem competitiva” ou “diamante de Porter”, como definido por outros, vem sendo bastante utilizado como instrumento para a formulação de critérios para a identificação de clusters e para propor políticas para o seu desenvolvimento. A Figura 1 mostra as variáveis a serem consideradas segundo a proposta de Porter. Saindo da análise das características dos clusters, outra questão que merece ser tratada se refere aos motivos que levam as empresas a se organizarem em arranjos como os clusters. Em parte isso pode ser respondido pelas afirmações de Meyer-Stamer (2001) ao se referir às mudanças nos modelos de gestão das empresas frente à globalização da economia. Estas seriam, portanto, as causas do surgimento dos clusters. Mas o surgimento desses arranjos não se deve única e exclusivamente a tais causas. Existem outras vantagens para empresas que as motivam a se organizarem de tal forma, mesmo que a globalização não seja uma causadora dessa mudança. As interações entre diversas empresas presentes em um cluster geram vantagens competitivas para as mesmas. Rabellotti (1997) identifica pelo menos quatro efeitos econômicos advindos das vantagens competitivas: a) economias externas estáticas: redução de custos para as firmas locais em comparação às isoladas – isso eleva os custos de transação para aquelas empresas situadas fora do cluster; Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 7 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” b) economias externas dinâmicas: processos educacionais e de treinamento, acúmulo de conhecimento e de know-how, presentes de forma natural e socializada; c) economias de proximidade: redução de custos de transação e os custos de usar o mercado, através da facilidade da circulação de informações e contatos dentro do distrito; d) sinergia: elementos que fortalecem a capacidade de inovação local através de processos de imitação, interações entre agentes locais, parcerias público-privadas envolvendo infra-estrutura e centros de serviços e agentes potencialmente receptores de inovações e cooperação fornecedor cliente. Figura 1 – O “losango da vantagem competitiva” ou “Diamante de Porter” Fonte: Meyer-Stamer (2001) Estas vantagens destacadas por Rabellotti (1997) estão alinhadas com aquelas encontradas em Schmitz e Nadvi (1999), para os quais entre as vantagens da organização em forma de clusters estão: concentração de trabalhadores especializados nos diversos processos para elaboração de um produto, o fácil acesso a fornecedores especializados de matériasprimas e serviços, e a rápida disseminação dos conhecimentos novos entre as diferentes empresas e por extensão aos indivíduos que trabalham no cluster. Já foram abordadas questões relacionadas ao conceito de cluster, suas características principais, forma de análise e as vantagens decorrer da produção seguindo este arranjo. Falta ainda revisar a literatura sobre formas de promoção dos clusters enquanto arranjos que levam ao desenvolvimento das economias regionais e nacionais. Neste contexto, Garofoli (1994) estabeleceu uma classificação tipológica das áreas de especialização produtiva com predominância de pequenas empresas. Esta classificação contempla três grupos: (i) – áreas de especialização produtiva: são caracterizadas pela supremacia de um setor de produção e sua dinâmica e transformação produtiva são assimiláveis por um modelo de desenvolvimento do tipo extensivo; (ii) – sistemas produtivos locais: possuem como característica principal o predomínio de pequenas empresas as quais pertencem a um mesmo setor, muitas delas produzem uma mesma mercadoria; (iii) – áreas-sistemas: caracteriza-se fundamentalmente pela presença de uma intensa Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 8 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” divisão do trabalho entre empresas, mas o sistema produtivo local apresenta uma progressiva diversificação com a indução a uma complexidade crescente. Logo, as relações entre as empresas são fortes, tanto intra-setorial quanto intersetorialmente. Esta área apresenta um processo de desenvolvimento inteiramente baseado na utilização de recursos locais. Ainda segundo o autor, uma área-sistema permite-se que sejam atingidos elevados níveis de especialização produtiva, de inovação técnica e de profissionalismo dos trabalhadores, proporcionando assim simultaneamente as vantagens de grande dimensão (economias de escala) e as da pequena empresa (flexibilidade produtiva). Os pontos fracos da área-sistema são: sistemas de pequenas empresas não são freqüentemente orientados para o mercado; terceirização fraca; política de crédito inadequada; baixo peso das pequenas empresas; e dificuldade de constituir uma visão global a médio e longo prazo. Características específicas de uma região podem favorecer o surgimento de um cluster, caracterizado como endógeno. Pode-se citar diversas aptidões naturais, educacionais, fluxo de informações, localização, etc.. No entanto, a participação do setor público (Estado) é importante para fomentar/incentivar os clusters. É importante ressaltar que a atuação do Estado, por si só, não cria um cluster, entretanto, pode incentivar o seu desenvolvimento, quando a iniciativa privada atingiu nível mínimo de concentração de atividade industrial e know-how. De acordo com Schimitz (1997), a promoção de clusters deve envolver políticas em nível local-regional. Os aspectos chaves são: colaboração entre instituições públicas e privadas e capacidade de financiamento, instituição de auto-ajuda. Para Botelho (1998) os principais elementos de política de promoção de clusters são: financiamentos às pequenas e médias empresas; bancos regionais; cooperativas de crédito; consórcios de financiamentos; marketing, assistência técnica, informação sobre mercados realizados por consórcios de firmas ou por instituições público-privadas; e, treinamento da mão-de-obra. Entretanto, as características específicas de um determinado cluster devem ser levadas em consideração na sua formação, uma vez que dificilmente serão reproduzidas. São determinadas por condições sociais, culturais e de políticas internas inerentes a cada país e mais especificamente da sua região geográfica na qual o cluster deve se inserir. Bianchi & Tommaso (1998) sustentam a idéia de fortalecer as relações entre firmas e instituições locais, sendo necessária uma visão não ortodoxa da dinâmica econômica, ou seja, levar em consideração que a interação entre firmas e instituições criará normas para a ação coletiva e induzirá o Estado a trabalhar em projetos específicos, onde o aprendizado será coletivo. Para os autores, há a necessidade de estimular o crescimento local através de um processo de agregação de forças. Uma estratégia industrial para impulsionar pequenas e médias empresas, mediante a criação de grupos industriais, é fundamental para o desenvolvimento econômico e social de um país. Na ótica de Haddad (1998), a grande vantagem da analise de cluster para estudar os problemas da competitividade dinâmica do agronegocio é de considerar alguns elementos conceituais de forma sistêmica. Esses elementos segundo o mesmo autor são: delimitação da área geográfica; indicadores de performance setorial; aglomerados ou complexos produtivos; serviços de suporte empresarial ao cluster; suporte fundamental; indicadores de desenvolvimento social da região onde opera o cluster; indicadores ambientais; desenvolvimento de cultura organizacional; demanda e necessidade de insumos de conhecimento e de ciência e tecnologia no cluster; formas de cooperação público-privado. 3. MÉTODO Tendo esse estudo uma função de caráter descritivo e exploratório de um fenômeno que não é suficientemente conhecido, no caso a forma de organização dos agentes dentro de Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 9 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” uma cadeia produtiva, em uma determinada localização territorial, a pesquisa caracteriza-se como exploratória. Segundo Tripodi et al.( 1975), o estudo exploratório tem por objetivo “fornecer um quadro de referência que possa facilitar o processo de dedução de questões pertinentes na investigação de um fenômeno”. A partir dessa exploração, é possível ao pesquisador a formulação de conceitos e hipóteses a serem aprofundadas em estudos posteriores (TRIPODI et al., 1975). A presente pesquisa utilizará o estudo de caso, procedimento justificável pelo caráter exploratório da pesquisa (TRIPODI et al., 1975). De acordo com Yin (1994), a opção de estudo de caso como estratégia de pesquisa se justifica quando o estudo focaliza o âmbito das decisões, isto é, tentam esclarecer o motivo pelo qual as decisões foram tomadas, como foram implementadas e quais os resultados encontrados. A literatura sobre estudos de Clusters mostra que diversos métodos de busca de informações e análise têm sido empregados. A diversidade de objetivos dos estudos e a multiplicidade de questões relacionadas aos mesmos, impedem uma recomendação universal de opção metodológica para a busca de informações. Neste contexto, buscou-se a construção de etapas de pesquisa para que os objetivos desse estudo possam ser alcançados, quais sejam: levantamento de dados secundários; identificação de agentes chaves; estruturação de roteiros de entrevistas; coleta de dados; análise dos dados. O levantamento de dados secundários foi realizado junto a Secretaria da Coordenação e Planejamento do Governo do RS; Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa Pecuária Sul); Prefeitura Municipal de Bagé; Ministério da Agricultura; Inspetoria Veterinária e Zootécnica de Bagé; Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER/RS); Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Fundação de Economia e Estatística (FEE). A identificação dos agentes chaves para aplicação das entrevistas semi-estruturadas foi baseada na revisão de literatura sobre clusters, cabendo ressaltar que todos os entrevistados escolhidos eram especialistas, nas suas respectivas áreas, em pecuária de corte. Sendo assim foram entrevistados: 01 pesquisador da Embrapa Pecuária Sul; 01 técnico da EMATER; 01 professor da Universidade da Região da Campanha (URCAMP); 01 Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); 01 funcionário de instituição financeira; 01 dirigente de frigorífico; 3 produtores rurais; 02 corretores de gado; 02 responsáveis técnicos de lojas especializadas em produtos veterinários. Depois de feita a identificação desses agentes, partiu-se, então, para a aplicação das entrevistas semi-estruturadas, onde foram realizadas na cidade de Bagé / RS, no período de dezembro de 2004 a janeiro de 2005. Essas entrevistas seguiram o roteiro metodológico proposto por HADDAD (1998) e aplicado por DIAS & PEDROZO (2002) em estudo sobre configuração de um cluster pecuário no Estado do Tocantins. Sendo assim, as questões abordadas nas entrevistas foram as seguintes: delimitação da área geográfica; indicadores de performance setorial; aglomerados ou complexos produtivos; serviços de suporte empresarial ao cluster; suporte fundamental; indicadores de desenvolvimento social da região onde opera o cluster; indicadores ambientais; desenvolvimento de cultura organizacional; demanda e necessidade de insumos de conhecimento e de ciência e tecnologia no cluster; formas de cooperação público-privado. Após a transcrição das entrevistas, os resultados foram descritos e analisados no seu conteúdo, considerando os elementos previamente definidos para a investigação. Todos os casos foram analisados de forma padronizada e individual. 4. RESULTADOS E DISCUSSÕES Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 10 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” Primeiramente, nesse tópico, serão abordados os aspectos socioeconômicos da Região da Campanha e do município de Bagé, e, logo após, serão feitas as discussões sobre a caracterização de um cluster da pecuária de corte no referido município. 4.1. O Contexto Socioeconômico da Região da Campanha A construção desse tópico foi baseada, principalmente, no relatório do II Seminário de Desenvolvimento Regional, realizado no ano de 2000, pelo Departamento de Desenvolvimento Regional e Urbano, órgão vinculado a Secretaria de Coordenação e Planejamento do Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Sendo assim, segundo esse estudo, o Estado do Rio Grande do Sul está dividido em Eixo Leste; Noroeste / Missões e Região da Campanha. O primeiro abrange a maior parte da Macroregião Nordeste do Estado e concentra 50% da população gaúcha e 61% do PIB. O eixo leste é a região que mais arrecada ICMS. Possui uma matriz produtiva diversificada, onde existe a concentração de Arranjos Locais de Produção existentes no Estado, caracterizando-se pela agregação de valor aos produtos, comparativamente às demais regiões do Estado. A região Noroeste / Missões é destacada por estabelecer vínculos com a economia internacional, através do potencial turístico, e também se caracteriza pela presença de importante núcleo industrial de maquinas agrícola. Estas duas regiões caracterizam-se por possuir uma tendência maior de desenvolvimento espacial face ao dinamismo de sua economia. A Região da Campanha, enquadrada na área geográfica denominada de Metade Sul do Estado, desde sua ocupação inicial pelas tribos de índios charruas e minuanos, teve na atividade pecuária sua principal fonte de renda. Nos primórdios, as sesmarias deram origem às estâncias destinadas à criação extensiva de gado, onde se produzia couro, charque e lã em grandes extensões de terra, exigindo poucos trabalhadores como fator de produção. Como resultado desse sistema colonizador, a região caracteriza-se até os dias atuais pela concentração de renda e terra, e também pela formação de um pequeno número de aglomerados humanos. A Estrutura fundiária da Região é composta por poucas grandes propriedades (acima de 500 ha) que ocupam 64,79% da área, representando apenas 6,29% do número total de estabelecimentos. Já as pequenas propriedades (até 50 ha) ocupam 5% da área da região, mas representa 56,58% dos números de estabelecimentos. Os municípios de Bagé, Dom Pedrito e Lavras do Sul são os que possuem um menor percentual de pequenos estabelecimentos. Entretanto, esses municípios possuem uma área total muito superior à grande parte dos municípios de Estado. A rede urbana da região apresenta hierarquia verticalizada, onde Bagé se destaca como cidade pólo, desempenhando funções regionais de apoio às demais cidades. A cidade de Bagé é a maior da Região, e seu município concentra 55, 49% da população regional. Nos municípios da referida região estão instaladas 16 representações estaduais, sendo que todas essas unidades organizacionais estão localizadas no município de Bagé, o que demonstra sua importância regional. No que se refere à infra-estrutura da região, essa é bem servida quanto aos sistemas de transportes entre os centros urbanos. Passam pela região algumas das principais rotas de ligação do Estado com os países do MERCOSUL e com as demais regiões do país. A região possui um aeroporto, administrado pela aeronáutica, mas que não possui vôos regulares. A malha ferroviária é utilizada para o transporte de carga, e liga os municípios de Bagé e Dom Pedrito ao porto de Rio Grande. Quanto á disponibilidade de energia elétrica, essa é considerada como boa, sendo que parte é gerada pela Usina de Candiota. A Região situa-se na área de influencia do gás natural que vem da Argentina, tendo a possibilidade de ser abastecida tanto pelo gasoduto Aldeia Brasileira - Uruguaiana, quanto pelo que passará pelo Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 11 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” Uruguai. No que se refere à comunicação, a região possui uma moderna rede de telecomunicações. Percebe-se que não existe na Região da Campanha nenhuma Unidade de Conservação Ambiental, tanto federal, quanto estadual. Entretanto, algumas atividades desenvolvidas na região causam impactos negativos, principalmente as agrícolas, que devem ser compensados com o adequado manejo e uso do solo. A qualidade ambiental dos municípios da região é altamente comprometida por impactos causados pela mineração. Quanto à formação de recursos humanos e a capacitação científico-tecnológica, a referida região é composta pela Universidade da Região da Campanha (URCAMP). Seu campus central é localizado em Bagé, sendo que existem mais sete campus da universidade na região. No ensino e na pesquisa, destacam-se as ações nas áreas de Agronomia e Medicina Veterinária. Além da URCAMP, existe uma unidade da EMBRAPA, especializada em realizar pesquisas em pecuária nos campos Sulbrasileiros, uma unidade da FEPAGRO, responsável por desenvolver pesquisas fitotécnicas, bem como uma Escola Estadual Agrotécnica. O dinamismo econômico da Região da Campanha é limitado, com forte dependência do setor agropecuário, principalmente do gado de corte e do arroz, praticados com estrutura agrária de médias e grandes propriedades. A produção animal participa de 43% do volume total da produção agropecuária da região e o arroz com 88% da produção total dos cultivos temporários. Essa estrutura produtiva fez com que a economia da Região da Campanha, apresentasse, ao longo das ultimas décadas, uma perda de participação na economia estadual. Outra explicação para a perda do dinamismo econômico é o fato de existir uma ociosidade da terra, a sub-utilização das pastagens naturais, a estrutura fundiária e a baixa produtividade. No que se refere aos preços agropecuários praticados na região, esses vem sofrendo um considerável declínio nas ultimas duas décadas, o que tem contribuído para o declínio da renda. Percebe-se uma baixa ocupação da mão-de-obra na região, sendo que a atividade pecuária emprega mais trabalhadores rurais do que a cultura do arroz. Uma explicação para esse fato encontra-se no maior nível tecnológico empregado na cultura do arroz. Quanto ao setor industrial, a região vem acumulando perdas na sua pequena participação no PIB estadual, possivelmente decorrente da pouca diversificação e dinamismo industrial, que apresenta pouca amplitude e fraca penetração regional. Destacam-se as industrias de alimentos; vestuários; calçados e artefatos de tecidos; minerais não metálicos e metalúrgica, além da existência da termoelétrica de Candiota, que representa um diferencial para a região. O setor de comercio na região, também vem apresentando uma tendência decrescente. O Índice Social Municipal Ampliado (1996) mostra que região é deficitária no que se refere a variável renda, saúde, educação e domicilio, deixando a região numa péssima posição quando comparada a outras regiões do Estado. A população da região se concentra em três municípios, quais sejam: Bagé, Dom Pedrito e Caçapava do Sul. O município de Bagé é o mais populoso com cerca de 116.000 habitantes, enquanto que Dom Pedrito possui a maior taxa de urbanização da região (88%). A seguir, será discutido o contexto socioeconômico de Bagé, o maior município da região. 4.2. O Contexto Socioeconômico do Município de Bagé A construção desse tópico foi baseada em dados disponíveis no site da Prefeitura Municipal de Bagé, e do relatório denominado PROJETO RS – 2010, desenvolvido pela Secretaria do Estado da Coordenação e Planejamento do RS, FEE, Fundação de Planejamento Metropolitano Regional (1997). O município de Bagé, fundado em 17 de julho de 1811, está localizado na fronteira do Rio Grande do Sul, a 60 km do Uruguai. O município conta com cerca de 116.000 habitantes e uma área de 3.649 km2, possui uma altitude de 218 m, e um clima subtropical. As Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 12 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” condições climáticas do município permitem a realização de cultivos tanto de inverno (trigo, centeio, aveia, cevada, forrageira de ciclo hibernal), como de verão (milho, arroz, soja, sorgo, forrageira de ciclo estival). No que se refere à educação, o município conta com trinta e quatro escolas municipais da zona urbana, onde se encontram devidamente matriculados 8.528 alunos; nas trinta escolas municipais da zona rural, têm-se 394 alunos, totalizando 8.922 discentes. O Município é sede da 13ª Delegacia de Educação, que gerencia o sistema estadual e supervisiona o sistema particular de ensino-aprendizagem de Bagé e região. Existe na região, também, a Escola Estadual Agrotécnica. Quanto ao ensino superior, a cidade é sede da URCAMP, detentora de um total de 6.800 alunos, com seis campi em pleno funcionamento na região, onde os cursos na área de ciências agrárias se destacam pela qualidade. Encontra-se no município um dos maiores Centros de Pesquisa Agropecuária - EMBRAPA -, onde estão sendo permanentemente aprimoradas e testadas raças e culturas que proporcionem maior produtividade para a região. Existe, também, na região, uma Unidade da FEPAGRO. As condições de acesso ao município são boas, e se dão, principalmente, através da BR 290, BR 153, BR 293. Existe no município um aeroporto de porte médio, instalado em uma área de 60ha, distante 8 km do centro da cidade, com duas pistas: uma de concreto (1.500 m comprimento X 30 m de largura) e outra de saibro (1.149 m de comprimento X 45 m de largura), entretanto sem vôos regulares. Possui, também, uma malha ferroviária que dá acesso a cargas ao porto de Rio Grande. As raízes do Tradicionalismo encontram-se profundas no município, que possui dez Centros de Tradições Gaúchas, acompanhados de quatorze Piquetes de Tradições Gaúchas. O “modus vivendi” e as danças típicas regionais são reconhecidos nacional e internacionalmente. Três Museus, todos subordinados à Universidade da Região da Campanha, detém a história do município. O Instituto Municipal de Belas Artes - IMBA -, a Casa de Cultura "Pedro Wayne", a Biblioteca Pública Municipal, a Biblioteca Pública Infantil, a moderna Biblioteca da Universidade da Região da Campanha - URCAMP -, contribuem para formação do conhecimento. Quanto aos meios de comunicação, o município possui dois jornais diários, três rádios AM e duas FM, uma rede de televisão com programação própria, de caráter regional. Também se fazem presentes, por retransmissão, mais cinco redes. Possui um sistema de televisão por assinatura que cobre cerca de 5.000 lares bageenses com a TV a cabo. Também se fazem presentes em Bagé: RECEITA FEDERAL, DELEGACIA DO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, SENAI, SESC, SESI, SENAC, três Clubes de LIONS, LÉO CLUBE, cinco Clubes de ROTARYS, CASA DA AMIZADE, INTERACT, ROTARACT, UBES (União Bageense dos Estudantes Secundários), quatro LOJAS MAÇÔNICAS, SOCIEDADE ITALIANA ANITA GARIBALDI, SOCIEDADE ESPANHOLA, SOCIEDADE LIBANESA, ASSOCIAÇÃO COMERCIAL E INDUSTRIAL DE BAGÉ, CLUBE DOS DIRIGENTES LOJISTAS, SINDICATO DO COMÉRCIO VAREJISTA DE BAGÉ, ASSOCIAÇÃO E SINDICATO RURAL DE BAGÉ, ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CRIADORES DE HEREFORD E BRAFORD, bem como vários SINDICATOS REPRESENTATIVOS de trabalhadores. O Município de Bagé conta, para atendimento ao público civil, com três unidades hospitalares e dezesseis Postos de Saúde, localizados nos mais diversos pontos da periferia da cidade, que dão guarida ao atendimento à saúde da população. No que se refere à geração de energia, a 50 km de Bagé, tem-se um dos maiores pólos energéticos do país: duas termelétricas em pleno funcionamento e outra em fase final de construção. Nessa mesma região, o subsolo é rico em argila especial para cerâmicas, setor praticamente inexplorado. Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 13 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” A cidade é eminentemente agropecuária, possuindo um PIB municipal de R$ 438.776.029,00. O setor primário ocupa 80% da população do município. O número de propriedades rurais é de 3.581 unidades, sendo a área média do módulo rural de 28 ha. Na produção agropecuária destacam-se a bovinocultura de corte, bovinocultura de leite, ovinocultura e a criação de eqüinos. Na produção agrícola destacam-se o arroz, o milho e o sorgo granífero. Esta sendo estimulada na região, através de programas estaduais e municipais, a pratica da fruticultura, vitivinicultura e do reflorestamento. A Exposição-Feira de Bagé, umas das mais importantes do Brasil, realizada a cada ano, no Parque de Exposições da Associação Rural, atraindo um grande contingente de pessoas, serve de vitral para a mostra do que melhor se produz na agropecuária local, regional e internacional, favorecendo a agropecuária local. Sendo assim, o próximo tópico irá abordar questões sobre o ambiente organizacional da cadeia da carne bovina em Bagé, bem como buscar identificar elementos que possam configurar, no município, um cluster da pecuária de corte. 4.3. A Identificação de Elementos para a Caracterização de um Cluster na Pecuária de Corte no Município de Bagé. Os elementos, aqui identificados, foram baseados no roteiro metodológico proposto por HADDAD (1998) para analise de clusters. 4.3.1. Delimitação da Área Geográfica Conforme mencionado anteriormente, o município de Bagé está localizado na Região da Campanha, a aproximadamente 54° W e 31° S, no Estado do Rio Grande do Sul. A agricultura e a pecuária são as principais atividades econômicas da região. A produção pecuária é responsável pelo suprimento das industrias de carnes do município. Essas industrias estão, assim classificadas, quanto a inspeção sanitária: 02 com inspeção federal; 02 com inspeção estadual; 01 com inspeção municipal. Cabe ressaltar que se situa no município de Bagé a única planta frigorífica apta, até o momento, a exportar carne no Estado, o que demonstra a importância do município no mercado de carne bovina. Essa planta abate em média 3.500 animais/semana. 4.3.2. Indicadores de Performance Setorial O Município de Bagé caracteriza-se por desenvolver criações bovinas de origem européias, privilegiadas em termos de precocidade e qualidade de carne. O município é reconhecido pelo grande potencial genético dos animais de raças européias (Hereford, Angus e Charolês), onde os reprodutores são muito procurados para a realização de cruzamentos industriais (europeu + zebuíno). Esses cruzamentos têm a finalidade de desenvolver um maior potencial de produção, oriundo de heterose, preocidade e boa adaptabilidade a condições ambientais nem sempre favoráveis (LEAL, 2003). Nesse contexto, segundo dados da Inspetoria Veterinária e Zootécnica de Bagé (2005), os animais oriundos de cruzamentos industriais representam um pouco menos da metade do efetivo bovino do município (40%), sendo a raça Hereford a de maior concentração (46%). Existe no município 1.561 produtores de gado de corte, e um efetivo bovino de 313.764 cabeças. A pecuária de corte ocupa, aproximadamente, 70% da área de exploração do município. A taxa de desfrute está em torno de 28%, e o índice de natalidade é de 57%. A produtividade gira em torno dos 114 kg de peso vivo/ha/ano, e o custo de produção são de R$ 175,29/ha/ano. No sistema produtivo atual, existe uma pequena margem de lucratividade na atividade, sendo que o preço pago ao produtor pelos animais de abate é, em muitas situações, inferior ao custo de produção. Os animais, geralmente, possuem a sua base alimentar em campo natural, o qual é composto, em sua maioria, por espécies subtropicais de ciclo estival. São desenvolvidas, também, pastagens cultivadas de azevém, aveia, cornichão e trevo. Esse sistema de Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 14 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” alimentação proporciona um grande diferencial para a carne bovina do município no mercado internacional, haja vista ser a mesma considerada uma carne “verde” pelos consumidores internacionais. 4.3.3. Aglomerados ou Complexos Produtivos A cadeia produtiva da carne bovina tem seu início com o setor de insumos, que representam as empresas de bens e serviços na área de nutrição, manejo, genética e sanidade. Após tem-se os setores produtivos, que reúne as unidades produtoras que fornecem matérias primas inicias para que outras empresas avancem no processo produtivo do bem final. Os frigoríficos são as empresas que são responsáveis pelo avanço do produto final em direção ao consumidor, transformando a matéria–prima em produto acabado e distribuindo para o segmento de varejo, que possui a missão de colocar o produto carne bovina à disposição do consumidor. Para que este sistema funcione perfeitamente, existem alguns elementos de apoio que são essenciais, pois são responsáveis pelo fluxo financeiro e de informações do sistema (Figura 2) (MALAFAIA et al., 2003). Industria de Defensivos Sistema Financeiro Políticas Governamentais Insumos Produção Animal Embalagens Genética Animal Subprodutos Comestíveis Aditivos Atividades de Apoio Alimentação Animal Frigoríficos Transportes Sistemas de Inspeção Sanitária Entrepostos Revendedores Atacadistas Subprodutos NãoComestíveis Políticas de Renda Varejo Supermercados Sistemas de P&D Consumidor Associações de Classes/Raças Políticas de Comércio Exterior Consumidor Institucional Final Mercado Interno e externo Mercado Interno Food Service Açougues Boutiques Figura 2: Estrutura da cadeia produtiva da carne bovina Fonte: Dados da Pesquisa. Adaptado de MALAFAIA et al. (2003). 4.3.4. Serviços de Suporte Empresarial ao cluster O município de Bagé é servido de vários escritórios de contabilidade rural, assessoria jurídica, consultoria veterinária, agronômica e administrativa. Existem cerca de 60 escritórios que fazem as intermediações na compra e venda do gado. A assistência técnica é dada, basicamente, pela EMATER, SENAR/RS e SEBRAE/RS. Existe um grande número de oficinas especializadas na manutenção técnica de máquinas e implementos. No que se refere à mão-de-obra, a existência da cooperativa de trabalhadores rurais presta um grande serviço para a atividade pecuária de corte. Cabe citar, também, a Associação Rural de Bagé; as Associações de Produtores de Raça; o Sindicato dos Produtores Rurais; o Sindicato dos Trabalhadores Rurais. , Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 15 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” 4.3.5. Suporte Fundamental A logística de transporte é boa, contando com 12 transportadoras de carga. O município situa-se entre duas rodovias federais, possui uma ampla estação rodoviária, um aeroporto e uma ferrovia que liga ao porto de Rio Grande. A qualidade dos serviços de telecomunicações é excelente, possuindo dois jornais diários, três rádios AM e duas FM, uma rede de televisão com programação própria, de caráter regional. Também se fazem presentes, por retransmissão, mais cinco redes. Possui um sistema de televisão por assinatura (TV a cabo). Quanto ao ensino, conta com uma Universidade, onde se destacam os cursos na área das ciências agrárias e varias escolas urbanas e rurais. O município possui 10 agencias bancarias, com inúmeros programas de financiamento para o setor agropecuário. A EMBRAPA Pecuária Sul, juntamente com a FEPAGRO e a URCAMP, prestam serviços de qualidade em pesquisa e desenvolvimento para a região. 4.3.6. Indicadores de Desenvolvimento Social da Região O Índice de Desenvolvimento Socioeconômico é medido pelas variáveis: educação; renda; saneamento e domicílios; saúde e Idese. Sendo assim, baseado no Idese, pode-se concluir que a região possui um desenvolvimento médio (0,73), sendo que a educação tem um índice de 0,827, a renda possui um índice de 0,671, saneamento e saúde possuem índices de 0,627 e 0,832, respectivamente. No que se refere à ocupação de mão-de-obra, o setor primário emprega 80% da população. 4.3.7. Indicadores Ambientais Algumas atividades desenvolvidas na região causam impactos negativos, principalmente as agrícolas, que devem ser compensados com o adequado manejo e uso do solo. A pecuária provoca o pisoteamento e a compactação do solo. O florestamento com espécies exóticas, de crescimento rápido e alto consumo de água, provocam o rebaixamento do lençol freático, além de inibir o desenvolvimento de populações vegetais e animais. A produção de arroz, além de perturbar o balanço hídrico, também espalha agrotóxicos e fertilizantes quando a água é liberada. A pratica de queimadas para limpar os campos degrada o ambiente, alterando drasticamente a flora e a fisionomia das matas. O município de Bagé apresenta situação crítica, de média gravidade, quanto aos resíduos urbanos e hospitalares, e baixa quanto ao controle de efluentes domésticos. Em relação ao controle de efluentes industriais, apresenta média criticidade. Não existe, em Bagé, nenhuma Unidade de Conservação Ambiental. 4.3.8. Desenvolvimento de Cultura Organizacional No que se refere ao nível de qualificação do empresariado, percebe-se uma assimetria em termos de eficiência das propriedades rurais, onde algumas propriedades são bemsucedidas, funcionando como uma verdadeira empresa, enquanto que outras, até geograficamente próximas, não conseguem acertar-se. A resposta para essa assimetria encontra-se, entre outras, na administração, na maneira de planejar e conduzir a atividade escolhida. Um bom gerenciamento da propriedade rural identifica os aspectos ineficientes da atividade ao mesmo tempo em que proporciona condições de corrigi-los. Muitos empresários foram capazes de ajustar-se mais rapidamente às recentes transformações, estabelecendo estratégias, implantando programas de qualidade, adaptando-se às exigências cada vez maiores do mercado. Reconhece-se que não é nada fácil um produtor preencher todos esses requisitos, e ainda por cima possuir um pensamento lógico e claro, aliado à capacidade de agir com rapidez quando essas situações aparecem: entretanto, são essas características que fazem a diferença e indicam o caminho dos produtores bem-sucedidos. Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 16 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” Outro ponto a ser destacado, é baixa integração existente entre os elos da cadeia da carne bovina no município. O histórico conflito entre produtores e frigoríficos, pode ser claramente verificado em Bagé. A falta de uma filosofia de cooperação vertical e horizontal entre os elos da cadeia da carne, traz inúmeros prejuízos para o setor. A visão imediatista, de curto prazo necessita ser mudada. Na realidade, o empresário rural necessita de alguma forma, fazer parte deste “novo conceito” de agronegócio, que reconhece e fortalece a importância da integração da cadeia produtiva. É nesse novo ambiente que a propriedade rural se profissionaliza, moderniza-se e começa a ser encarada como uma empresa de fato, buscando obter conhecimentos acerca dos mercados em que opera e aumentando o relacionamento com o segmento industrial. Entretanto, é necessário que o empresário rural acompanhe todas as transformações, pois o sucesso de sua empresa e da cadeia produtiva como um todo, passa primeiramente pela sua atuação gerencial. Nessa lógica, percebe-se uma tentativa de estabelecimento de alianças estratégicas entre os agentes da cadeia da carne no município, com o objetivo de “descomoditizar” a carne bovina produzida na região, e agregando com isso um maior valor ao produto. Para tanto, as Associações de Produtores Raça, as industrias frigoríficas e o varejo, estabelecem ações conjuntas no sentido de atingir esse objetivo. Cabe salienta, que o produto final oriundo dessas alianças não são comercializados, atualmente, no mercado local, e sim, nos grandes centros urbanos. No que se refere ao marketing da carne, existe um projeto piloto, desenvolvido pelo SEBRAE Nacional, de construção de um método para conquista da chancela de Indicações Geográficas (IG). O trabalho visa à conquista da IG da carne do pampa gaúcho, onde já está delimitada a região, e se esta construindo as normativas de produção, assim como o levantamento histórico cultural. 4.3.9. Demanda e Necessidade de Insumos de Conhecimento e de Ciência e Tecnologia no Cluster Quanto à formação de recursos humanos e a capacitação científico-tecnológica, o município de Bagé conta com a Universidade da Região da Campanha. A instituição oferece para a comunidade cerca de trinta cursos de graduação e habilitação, abrangendo as seguintes áreas: Saúde, Educação, Artes, Jurídica, Rural, Econômica, Tecnológica e Informática. Na pesquisa, as linhas desenvolvidas na Universidade estão contidas nas áreas de Agronomia, Medicina Veterinária e Administração Rural, por serem as atividades mais importantes da região. A instituição é gestora do “Pólo de Modernização Tecnológica da Campanha”, cuja área de abrangência é Carboquimica e Recursos Minerais; Tecnologia Agrícola e Pecuária, bem como Energia e Meio Ambiente. Além da URCAMP, o município conta com o Centro de Pesquisa de Pecuária dos Campos Sulbrasileiros (Embrapa Pecuária Sul), que é uma unidade de pesquisa descentralizada da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa. Desenvolve pesquisas na área de produção animal, especialmente com: Bovinos de Corte, Bovinos de Leite e Ovinos. Trabalha com: Manejo, Produção e Melhoramento, Nutrição e Parasitologia. Ao lado destas, as pesquisas com forrageiras (manejo, produção e melhoramento), recursos genéticos, (vegetais e animais) e recursos naturais são importantes bases para os esforços de desenvolvimento da produção animal. A Embrapa Pecuária Sul mantém cooperação técnica com todo sistema Embrapa, além de outras instituições ligadas à pesquisa e produção animal do País e também do exterior, especialmente nos Países do Cone Sul. Mantém integração na área de ensino, com Instituições de formação superior e escolas agrotécnicas; também com organizações e entidades diretamente ligadas a produtores rurais. Promove e participa de diversos intercâmbios e convênios para execução de atividades de pesquisa e de difusão. Sua área de abrangência ao nível regional, inclui os estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná em âmbito de atuação, delimitando-a no ecossistema Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 17 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” dos campos sulbrasileiros, existentes nestes estados. Ainda existe, a FEPAGRO, localizada no município de Hulha Negra, a 20 km de Bagé, que desenvolve pesquisas na área de fitotecnia. 4.3.10. Formas de Cooperação Público-Privado Dentre as formas de cooperação público-privado, pode-se citar os Programas Institucionais de Pesquisas, realizado pela EMBRAPA Pecuária Sul, como o 1° Workshop de Integração Embrapa Pecuária Sul, Embrapa Gado de Corte e Embrapa Pecuária Sudeste: "Programa Embrapa Carne de Qualidade"; Os Dias de Campo, sobre Bovinocultura e Ovinocultura, destinados a produtores rurais; além de diversos cursos de atualização que são oferecidos á comunidade. A Unidade interage de uma forma dinâmica na agropecuária da região, realizando parcerias com a Associação Rural de Bagé, Associação dos Produtores de Raça, EMATER, URCAMP, etc. A EMBRAPA Pecuária Sul está sempre presente na Exposição Feira de Bagé, considerada uma das maiores do Brasil, divulgando suas tecnologias e serviços para o agronegócio. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS A cadeia da carne bovina, especialmente no Rio Grande do Sul, vem encontrando dificuldades de se ajustar às novas formas organizacionais que possibilitam ganhos competitivos. Assim, as dificuldades da atuação isolada dos agentes econômicos que configuram o complexo carne bovina tem gerado perdas significativas para o setor como um todo. Visando contribuir para esse debate, o presente trabalho teve como objetivo identificar os elementos que possam configurar um cluster na bovinocultura de corte do município de Bagé, Região da Campanha do Estado do Rio Grande do Sul. Aplicando-se a metodologia proposta por Haddad (1998), foi analisado a presença de elementos que tornassem possível a organização produtiva em forma de um cluster. Com base nos dados e informações coletas e analisadas pode-se concluir que o município de Bagé possui condições favoráveis ao desenvolvimento de um cluster da pecuária de corte, haja vista ter em sua territorialidade uma série de elementos que o configuraria como tal. A alta genética dos rebanhos; as boas condições de clima e solo; a presença do único frigorífico exportador do Estado; a expressão das Associações de Produtores; a internacionalmente conhecida Exposição Feira de Bagé; o suporte científicotecnológico da EMBRAPA Pecuária Sul; a formação do conhecimento através da Universidade; a presença forte da EMATER/RS, são algumas das potencialidades verificadas no município de Bagé, no que se refere à competitividade da cadeia da carne bovina. Entretanto, percebe-se que atualmente o setor encontra-se em profunda dificuldade econômica. Por que então a situação de competitividade não se verifica? A resposta passa necessariamente pela cultura organizacional dos agentes da referida cadeia. A visão imediatista dos agentes dificulta que se tenha um comportamento de cooperação, como prega a abordagem de cluster, fazendo com que não se consiga uma situação de vantagem competitiva. No município de Bagé, a comercialização da cadeia é um sistema defasado e ineficiente, repleto de oportunismo, assimetria de informações e falta de estabilidade de preços. A concorrência desleal dos abates clandestinos contribui para a ineficiência deste sistema. Acredita-se que se houver uma mudança de foco dos agentes, passando da visão imediatista para uma visão de médio e longo prazo, aliado a criação de uma mentalidade de confiança entre os mesmos, pode-se ter uma alteração no desfavorável cenário atual. Algumas mudanças nesse sentido já se percebem, como a criação de uma marca regional para carne do pampa gaúcho; as Alianças Estratégicas feitas entre as Associações de Produtores de Raça - Frigoríficos - Varejo. Entretanto, ainda existe um grande caminho a ser percorrido para que se consiga mudar a cultura organizacional da região. Ribeirão Preto, 24 a 27 de Julho de 2005 Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural 18 XLIII CONGRESSO DA SOBER “Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial” Sendo assim, espera-se com esse estudo ter colaborado com as ações de desenvolvimento para a cadeia da carne bovina no município de Bagé, chamando a atenção para as fortalezas e as fraquezas da referida cadeia. Quanto à discussão teórica, espera-se ter contribuído para a consolidação das abordagens mesoanalíticas, fundamentais para as análises da competitividade sistêmica. Referencias Bibliográfica AZAIS, Cristian; CORSANI, Antonella; NICOLAS, Patrice. 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