Braquistócrona e Catenária
- Uma introdução ao Cálculo das Variações -
Aluno: Ricardo Fernando Paes Tiecher
Professor: Ricardo Sá Earp
Rio de janeiro, 08 de julho de 2009
Análise Real
2009.1
Braquistótona e Catenária – Uma introdução ao Cálculo das Variações
1. Introdução
O cálculo das variações apresenta grande relação com outros ramos da matemática
como geometria e equações diferenciais, e com a física, em especial na mecânica
clássica.
Seu centro é a busca pelo extremo e, nesse sentido, guarda semelhanças com a
otimização. Entretanto, encontra extremos de funcionais (mapeamento de um conjunto
de funções aos números reais) e não para funções, demonstrando sua complexidade.
O estudo estudo do cálculo das variações é tão antigo quanto o próprio cálculo, e as
duas teorias tiveram desenvolvimento concomitante durante os séculos XVIII (irmãos
Bernoulli, Newton, Euler, Lagrange), XIX (Jacobi, Weierstrass) e o início do século XX
(Noether, Lebesgue).
A relação do cálculo das variações com a mecânica clássica transcende a esfera de
ferramenta matemática, alcançando a posição de “filosofia” geral. Mais ainda, essa teoria
é também aplicada em eletromagnetismo, em economia, no planejamento urbano e em
diversos outros setores.
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2. O problema da braquistócrona
A história do cálculo das variações se inicia com um problema proposto por Johann
Bernoulli em 1696. A questão proposta foi a de encontrar a forma de um “fio” ao longo
do qual uma partícula, inicialmente em repouso, desliza sob efeito único da gravidade
de uma extremidade a outra em tempo mínimo. As extremidades da curva são
especificadas e o movimento da partícula ocorre sem fricção.
A situação descrita é de extrema importância pelo fato do método desenvolvido por
Euler para resolvê-la ter servido como modelo para a solução de outors problemas
variacionais. A curva correspondente a forma do “fio” é chamada uma braquistócrona.
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2. O problema da braquistócrona
Após modelagem do problema, cocluímos que o tempo que a partícula leva para deslizar
sobre o “fio” é dado por:
T(y) = ∫ ds/v(s)
de 0 a L, onde s denota o comprimento de um arco, L o comprimento total do “fio” e v a
velocidade da partícula s unidades de comprimento abaixo da curva a partir do início.
Os próximos passos correspondem a encontrar uma formulação alternativa (pois não
sabemos o valor de L) em termos das coordenadas cartesianas e explicitar uma
expressão para a velocidade em função de y utilizando a lei da conservação da energia
em um ponto qualquer da curva. Sendo assim, a equação anterior torna-se:
T(y) = ∫ {√(1+y’²)/√(2C/m-2g.y(x))}dx
de x0 a x1, onde m é a massa da partícula, g a aceleração da gravidade e C uma
constante.
Buscamos então uma função y tal que o funcional T seja mínimo e y(x0) = y0, y(x1) = y1.
No intuito de minimizar T, podemos substituí-lo por:
J(y) = ∫ {√(1+w’²)/√w}dx
de x0 a x1, no qual as simplificações não influenciam a posição do extremo de J.
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3. O problema da catenária
Considere uma cabo flexível, pesado e fino suspenso por dois mastros de alturas y0 e y1
e separados por uma distância d. O problema consiste em determinar a forma do cabo
entre os dois mastros.
O cabo assumirá a forma que implica energia potencial mínima. Se m denota a massa
por unidade de comprimento do cabo e g o campo gravitacional, a energia potencial do
cabo entre os mastros é:
WP(y) = ∫ mg.y(s)ds
de 0 a L, onde s denota o comprimento de uma arco, L o comprimento total de cabo e
y(s) a altura do cabo acima do chão s unidades de comprimento ao longo do cabo a
partir do início.
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3. O problema da catenária
Assim como no problema da braquistócrona, não conhecemos L e derivaremos uma
expressão para WP em termos das coordenadas cartesianas. Segue então que:
WP(y) = ∫ {mg.y(x)√(1+y’²)}dx
de x0 a x1. A essência do problema é determinar a função y que minimiza o funcional
J(y) = ∫ {y√(1+y’²)}dx
e que satisfaz as condições de contorno y(x0) = y0, y(x1) = y1. A curva em si é chamada
uma catenária.
O mesmo funcional J aparece em um problema de geometria relacionado a superfície
mínima de revolução, i.e., uma superfície cuja revolução apresenta área de superfície
mínima. Supondo que o eixo das abiscissas corresponde ao eixo de rotação, a questão
consiste em encontrar a curva ɤ no plano xy que gera a superfície de revolução mínima.
A superfície em si é chamada um catenóide.
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4. A primeira variação em dimensão finita
Analisamos o caso de dimensão finita, começando com uma revisão das condições
necessárias para que funções apresentem extremos locais.

Funções de uma variável
Considere f uma função real definida no intervalo ɪCR. Diz-se que f:ɪR possui um
máximo local em xεɪ se existe Ɛ>0 tal que para todo x*ε (x-Ɛ, x+Ɛ) Cɪ, f(x*) ≤ f(x). Dizse que f possui um mínimo local em xεɪ se –f possui um máximo local em x.
A função f:ɪ→R possui um máximo global no ɪ em x se f(x*) ≤ f(x) para todo xεɪ. Diz-se
que f possui um mínimo global no ɪ em x se –f possui um máximo global em x.
Se f é diferenciável em ɪ então a presença de máximo ou mínimo local em ɪ é
caracterizada pela primeira derivada:
Teorema. Seja f uma função real diferenciável no intervalo aberto ɪ. Se f possui um
extremo local em xεɪ então f’(x) = 0.
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4. A primeira variação em dimensão finita

Funções de várias variáveis
Seja ΩCRn uma região do espaço e suponha que f:Ω→R. Para Ɛ>0 e x=(x1, x2, ..., xn) seja
B(x;Ɛ) = {x*εRn: |x1*-x1|²+|x2*-x2|²+...+|xn*-xn|² < Ɛ²}. A função f possui um máximo
local em xεΩ se existe Ɛ>0 tal que para todo x*εB(x;Ɛ)CΩ, f(x*) ≤ f(x).
A função f possui um máximo global em xεΩ se f(x*) ≤ f(x) para todo x*εΩ.
Teorema. Seja f:Ω→R uma função suave na região ΩCRn. Se f possui um extremo local
no ponto xεΩ então grad(f(x)) = 0.
Geometricamente, o teorema diz que o plano tangente ao gráfico de f é horizontal num
extremo local (R²).
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5. A equação de Euler-Lagrange
O extremo local para um funcional pode ser definido de maneira análoga a usada para
funções de n variáveis. A transição da dimensão finita para a infinita, entretanto, traz em
si algumas complicações.
Seja J:X→R um funcional definido no espaço de funções (X;||.||) e considere SCX. Diz-se
que o funcional J possui um máximo local em yεS se existe um Ɛ>0 tal que J(y*) ≤ J(y)
para todo y*εS tal que ||y*-y|| < Ɛ. Diz-se que o funcional J possui um mínimo local em
yεS se y for máximo local para –J.
Considere S um conjunto de funções satisfazendo certas condições de contorno.
Funções y*εS em uma vizinhança de yεS podem ser representadas como uma
“pertubação” de y, ou seja, se y*εS e ||y*-y|| < Ɛ, então existem ɳεX tais que y* = y+Ɛɳ.
Todas as funções numa vizinhança de y podem ser geradas por um conjunto admissível
de funções H. Certamente todo ɳ deve ser elemento de X, mas ɳ deve satisfazer também
y+ƐɳεS. O conjunto H é então definido por H = {ɳεX: y+ƐɳεS}.
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5. A equação de Euler-Lagrange
A partir de agora, trabalhamos com o espaço vetorial particular C²[x0, x1] que é formado
das funções de [x0, x1] cujas derivadas segundas são contínuas. Seja f:C²[x0, x1]→R um
funcional da forma J(y) = ∫ f(x, y, y’)dx, onde f é uma função que assumimos ter ao
menos derivadas parciais de segunda ordem contínuas com respeito a x, y e y’. Dados
dois valores y0, y1εR, o problema é determinar as funções yεC²[x0, x1] tais que y(x0) = y0,
y(x1) = y1 e J possui um extremo local em yεS. Nesse caso, S = {yεC²[x0, x1]: y(x0) = y0,
y(x1) = y1} e H = {ɳεC²[x0, x1]: ɳ (x0) = ɳ (x1) = 0}.
Após aplicação de conceitos associados a derivação e expansão de Taylor com posterior
análise da variação e simplificação, chegamos ao seguinte resultado: se J(y) é um
extremo local então δJ(ɳ, y) = ∫ {ɳ.∂f/dy-d/dx(∂f/∂y’)}dx = 0 (primeira variação de J).
Com efeito, considere os resultados técnicos descritos a seguir.
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5. A equação de Euler-Lagrange
Lema. Sejam A e B dois números reais tais que A < B. Então existe uma função UεC²(R)
com U(x) > 0 para todo xε(A, B) e U(x) = 0 para todo xεR-(A, B).
Lema. Suponha que ∫ ɳ(x).g(x)dx = 0 para todo ɳεH. Se g:[x0, x1] é função contínua
então g=0 no intervalo [x0, x1].
Formalmente, a composição dos resultados anteriores está resumida no seguinte
teorema:
Teorema. Seja J:C²[x0, x1] um funcional da forma J(y) = ∫ f(x, y, y’)dx, onde f posssui
derivadas parciais de segunda ordem contínuas com respeito a x, y e y’ e x 0 < x1.
Considere S = {yεC²[x0, x1]: y(x0) = y0 e y(x1) = y1}, onde y0 e y1 são números reais dados.
Se yεS é um extremo para J, então d/dx (∂f/ ∂y’)-∂f/∂y = 0 para todo xε[x0, x1].
A equação é uma equação diferencial ordinária de segunda ordem que todo extremo
(suave) y deve satisfazer. Essa equação é chamada a equação de Euler-Lagrange e os
valores de fronteira associados a ela são y(x0)=y0 e y(x1) = y1.
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6. Resolução dos problemas
A equação de Euler-Lagrange é usualmente difícil de simplificar, mais ainda de resolver.
Existem, entrentanto, certos casos onde essa equação diferencial pode ser reduzida. Um
deles é quando o integrando não contém a variável x explícita, caso dos problemas da
braquistócrona e da catenária.

Braquistócrona
O problema da braquistótona tem um funcional da forma J(y) = ∫ {√(1+y’²)/√y}dx
Utilizando a equação de Euler-Lagrange e aplicando uma parametrização, encontramos
como solução
y = C1(1+cos(2k)), x = C2-C1(2k+sin(2k))
Onde C1 e C2 são constantes. A solução é uma conhecida classe de cirvas planas
chamadas ciclóides.
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6. Resolução dos problemas
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Catenária
O problema da catenária tem um funcional da forma J(y) = ∫ {y√(1+y’²)}dx
Repetindo o mesmo procedimento a partir da equação de Euler-Langrange, encontramos
a solução
y = c1.cosh((x-c2)/c1).
onde c1 e c2 são constantes.
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7. Conclusão e Referência
Esta apresentação é uma introdução ao cálculo das variações para matemáticos e
cientistas. Encontramos resultados de grande interesse na geometria e nas equações
diferenciais. Foi possível entender os resultados principais e verificar as demosnstrações
construídas para maior entendimento.
A aplicação em mecânica clássica se mostrou digna de grande atenção e de imensa
relevância, visto que o cálculo das variações possibilita a comuta entre a matemática e
diversas outras ciências num sentido “filosófico”, e não somente metodológico.
Referência. Van Brut, B. The Calculus of Variations. Universitext, Springer, 2006.
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Braquistótona e Catenária - Departamento de Matemática - PUC-Rio