FÁBIO COLAGROSSI PAES BARBOSA
Análise dos resultados da anastomose biliar colédococolédoco término-terminal espatulada sem drenagem em
transplante de fígado
Tese apresentada ao Curso de Pós
Graduação da Faculdade de Ciências
Médicas da Santa Casa de São Paulo
para obtenção do Titulo de Doutor em
Pesquisa em Cirurgia.
SÃO PAULO
2013
FÁBIO COLAGROSSI PAES BARBOSA
Análise dos resultados da anastomose biliar colédococolédoco término-terminal espatulada sem drenagem em
transplante de fígado
Tese apresentada ao Curso de Pós
Graduação da Faculdade de Ciências
Médicas da Santa Casa de São Paulo
para obtenção do Titulo de Doutor em
Pesquisa em Cirurgia.
Área de Concentração: Anormalidades
da Proliferação e Morte Celular.
Orientador: Prof. Dr. Luiz Arnaldo
Szutan.
Coorientador: Prof. Dr. Paulo Celso
Bosco Massarollo.
SÃO PAULO
2013
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador Prof. Dr. Luiz Arnaldo Szutan, pela oportunidade,
disponibilidade, confiança, ensinamentos, pelo prazer de sua convivência e
amizade.
Ao meu coorientador Prof. Dr. Paulo Celso Bosco Massarollo, pela
amizade, pelo exemplo pessoal e profissional, pela oportunidade de divulgar
uma inovação técnica de sucesso e por compartilhar seu conhecimento.
Aos professores e amigos que compuseram a banca de qualificação
(Dr. Rodrigo Altenfelder Silva, Dr. André Ibrahim David, Dr. Fábio Gonçalves
Ferreira, Dr. Fabrício Ferreira Coelho), por terem colaborado com correções e
sugestões que muito enriqueceram a tese.
Aos amigos do Grupo de Cirurgia do Fígado e Hipertensão Portal, pela
amizade, por terem prestigiado os momentos de sucesso e por terem sido
companheiros.
Aos colegas do Grupo de Transplante de Fígado, pelo apoio,
compreensão, ensinamentos e agradável convivência.
Às enfermeiras do Grupo de Transplante de Fígado Fabiana e Jicele,
que muito colaboraram para a reunião dos dados que compuseram esta tese e
que tornaram possível a realização do doutorado.
Ao Departamento de Cirurgia da Santa Casa de São Paulo
representado pelo Prof. Dr. Antônio José Gonçalves, pelo apoio.
À Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo por ter
me acolhido e me dado a oportunidade de realizar a pós-graduação.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
(CAPES), pela bolsa concedida durante a realização desta tese.
À Biblioteca da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São
Paulo, pela disponibilidade e agilidade na aquisição dos artigos solicitados.
Aos funcionários da Pós-Graduação da FCMSCSP, por terem sido tão
solícitos, gentis e por terem colaborado para o sucesso da pesquisa.
E a todos que de alguma maneira colaboraram para a realização desta
pesquisa.
DEDICATÓRIA
À minha esposa Mariana, amor da minha vida e minha eterna
companheira e ao meu filho Miguel, minha maior alegria e motivação para ser
uma pessoa melhor.
Aos meus pais (Silas e Regina) e irmãos (Isabela, Renata e Eduardo)
pelo apoio, incentivo, carinho e compreensão.
Aos meus avós pelo exemplo de vida, apoio e privilégio de sua
convivência.
ABREVIATURAS E SÍMBOLOS
ARA
Aumento do Risco Absoluto
BRD
Bilirrubinas diretas
BRT
Bilirrubinas totais
CCLL
Coledococoledocostomia látero-lateral
CCLLcD
Coledococoledocostomia látero-lateral com drenagem
CCLLsD
Coledococoledocostomia látero-lateral sem drenagem
CCLT
Coledococoledocostomia látero-terminal
CCTL
Coledococoledocostomia término-lateral
CCTT
Coledococoledocostomia término-terminal
CCTTcD
Coledococoledocostomia término-terminal com drenagem
CCTTes
Coledococoledocostomia término-terminal espatulada
CCTTesD
Coledococoledocostomia término-terminal espatulada com
drenagem
CCTTesSD Coledococoledocostomia término-terminal espatulada sem
drenagem
CCTTsD
Coledococoledocostomia término-terminal sem drenagem
CDD
Coledocoduodenostomia
CVB
Conduto da vesícula biliar
dl
Decilitro
EECCwD
End-to-end choledococholedocostomy without drainage
EC
Ensaio Clínico
ECR
Ensaio Clínico Randomizado
et al.
e outros
FA
Fosfatase alcalina
FCPB
Fábio Colagrossi Paes Barbosa
Fig.
Figura
GGT
Gama glutamil-transpeptidase
HJYR
Hepaticojejunostomia em “Y de Roux”
HJYRcD
Hepaticojejunostomia em “Y de Roux” com drenagem
HJYRsD
Hepaticojejunostomia em “Y de Roux” sem drenagem
I2
Teste quantitativo de heterogeneidade
IC
Intervalo de confiança
ITBL
Isquemic type biliary lesion, Lesão biliar tipo isquêmica
l
Litro
mg
Miligramas
n
Número de pacientes
NNH
Number needed to harm, Número necessário para causar dano
NNT
Number needed to treat, Número necessário para tratar
p
p Valor
Q
Teste qualitativo de heterogeneidade
RA
Risco absoluto
RAC
Risco absoluto do controle
RAI
Risco absoluto da intervenção
RRA
Redução do risco absoluto
SEECCwD
Spatulated end-to-end choledococholedocostomy without
drainage
Tab.
Tabela
U
Unidades
UW
Universidade de Wisconsin
WMB
Wanderley Marques Bernardo
%
Percentual
®
Marca registrada
±
Mais ou menos
LISTA DE TABELAS E FIGURAS
Figura 1.
Preparação das bocas anastomóticas. Hemostasia dos 14
vasos pericoledocianos.
Figura 2.
Incisão longitudinal posterior na via biliar do receptor.
15
Figura 3.
Aspecto da boca distal após secção da parede posterior.
16
Figura 4.
Aplicação do primeiro de dois pontos de reparo da parede 17
posterior.
Figura 5.
Incisão longitudinal anterior da via biliar do doador.
Figura 6.
Aspecto da anastomose com pontos da parede posterior e 18
após incisão da parede anterior.
Figura 7.
Término da sutura contínua posterior.
Figura 8.
Aspecto final da anastomose com pontos separados 20
anteriormente.
Figura 9.
Artigos selecionados para revisão sistemática.
23
Figura 10.
Curva de sobrevida atuarial de Kaplan-Meier.
28
Figura 11.
Colangiorressonância magnética
anastomótica (caso 1).
Figura 12.
Colangiografia
endoscópica
anastomótica (caso 1).
Figura 13.
Colangiorressonância magnética
anastomótica (caso 2).
mostrando
estenose 31
Figura 14.
Colangiorressonância magnética
anastomótica (caso 3).
mostrando
estenose 32
Figura 15.
Colangiografia
endoscópica
anastomótica (caso 3).
Figura 16.
CCTTesD descrita por Belli et al., 1991.
33
Figura 17.
CCTTesD descrita por Buczkowski et al., 2007.
34
Figura 18.
Técnicas de reconstrução biliar encontradas na revisão 35
sistemática.
Figura 19.
Gráfico de Metanálise (CCTTsD x CCTTcD) nos ensaios 37
clínicos. Desfecho: fístula não-anastomótica.
mostrando
mostrando
mostrando
18
19
estenose 29
estenose 30
estenose 32
Figura 20.
Gráfico de Metanálise (CCTTsD x CCTTcD) nos estudos 39
coorte. Desfecho: fístula não-anastomótica.
Figura 21.
Gráfico de Metanálise (CCTTsD x CCTTcD) nos estudos 39
coorte. Desfecho: complicações biliares.
Figura 22.
Comparação entre a casuística do estudo e os melhores 41
resultados encontrados na literatura.
Figura 23.
Comparação entre a casuística do estudo (CCTTesSD) e 42
os resultados encontrados na literatura para CCTTesD.
Figura 24.
Comparação entre a casuística do estudo (CCTTesSD) e 43
os resultados encontrados na literatura para metanálise
(CCTTsD) dos ensaios clínicos e estudos coorte.
Tabela 1.
Complicações Biliares com a CCTTesSD Santa Casa – 28
SP 2012.
Tabela 2.
Complicações Biliares com a CCTTesD Belli et al. 1991.
Tabela 3.
Complicações Biliares com a CCTTesD Buczkowski et al. 34
2007.
Tabela 4.
Comparação entre CCTTsD e CCTTcD quanto ao risco de 36
complicações biliares para cálculo de metanálise nos
ensaios clínicos.
Tabela 5.
Comparação entre CCTTsD e CCTTcD quanto ao risco de 38
complicações biliares para cálculo de metanálise nos
estudos coorte.
Tabela 6.
Comparação entre a casuística do estudo e os melhores 40
resultados encontrados na literatura.
33
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO......................................................................................
1
1.1 Técnicas de reconstrução biliar....................................................
1
1.2 Drenagem da via biliar..................................................................
5
1.3 Complicações biliares...................................................................
7
1.4 Justificativa...................................................................................
10
2. OBJETIVOS..........................................................................................
11
3. CASUÍSTICA E MÉTODO..................................................................... 12
3.1 Planejamento do estudo................................................................ 12
3.2 Pacientes....................................................................................... 12
3.3 Critérios de inclusão......................................................................
13
3.4 Critérios de exclusão..................................................................... 13
3.5 Descrição da técnica de reconstrução biliar.................................. 13
3.6 Método de comparação................................................................. 20
4. RESULTADOS......................................................................................
26
4.1 Análise dos pacientes transplantados........................................... 26
4.2 Análise dos dados.........................................................................
28
5. DISCUSSÃO.........................................................................................
44
5.1 Do método.....................................................................................
44
5.2 Fatores que influenciam a anastomose biliar................................ 48
5.3 Técnica espatulada.......................................................................
50
5.4 Do resultado..................................................................................
51
6. CONCLUSÕES.....................................................................................
54
7. ANEXOS................................................................................................
55
8. REFERÊNCIAS.....................................................................................
58
FONTES CONSULTADAS........................................................................ 72
RESUMO...................................................................................................
73
ABSTRACT...............................................................................................
74
APÊNDICE................................................................................................
75
1. INTRODUÇÃO
O transplante hepático representa um dos maiores avanços da ciência
médica moderna. Foi realizado pela primeira vez em humanos, com doador cadáver,
pelo professor Thomas Starzl em 1963 em Denver(1,2). Apesar dos resultados iniciais
serem desanimadores, os avanços nas áreas de imunossupressão, cuidados de
terapia intensiva, anestesiologia e técnica operatória tornaram esse procedimento
seguro e com altas taxas de sobrevivência atualmente(3).
Entretanto, as complicações biliares permanecem uma importante causa de
morbidade e mortalidade pós-transplante. Esse fato fez com que a reconstrução
biliar fosse descrita por Calne em 1976 como o “calcanhar de Aquiles” do transplante
de fígado(4,5). A prevalência de complicações biliares varia na literatura de 6% a
35%, com a maioria dos centros reportando aproximadamente 20% de complicações
com uma queda nos últimos anos(6,7).
1.1 Técnicas de reconstrução biliar
O tipo de anastomose biliar é um dos maiores determinantes no risco de
desenvolvimento de complicações biliares. Essa escolha é determinada pela doença
de base que levou ao transplante, o tamanho das vias biliares do doador e receptor,
retransplantes ou cirurgias prévias sobre a via biliar e a preferência do cirurgião. Não
há consenso sobre a melhor forma de reconstrução biliar(8).
2
A anastomose biliar ocorre após a reperfusão do órgão. Frequentemente
ocorre sangramento dos vasos localizados as três e nove horas nas vias biliares do
doador e receptor. A ausência desse sangramento traduz pior prognóstico, podendo
a via biliar ser seccionada em busca de um local melhor vascularizado para
anastomose segura. A ligadura desses vasos sangrantes as três e nove horas com
fio delicado pode ser realizada(9). A anastomose deve ser realizada com fio
absorvível, com os nós para fora da luz da via biliar para evitar precipitação de sais
biliares com a formação de cálculos e reação de corpo estranho persistente (10).
Como a via biliar possui vascularização predominantemente arterial, a
trombose ou estenose da artéria hepática ou ainda lesão do plexo sanguíneo
peribiliar, são fatores de risco para a falha na reconstrução biliar. Desse modo, a
anastomose biliar é sensível à isquemia local(11).
O dano tecidual devido à sutura pode causar isquemia local e estenose
futura. O defeito na mucosa pela lesão perfurante da agulha de sutura, permitindo o
contato da bile com o material de colágeno da parede da via biliar, pode estimular a
fibrogênese, especialmente em áreas de isquemia. O contato circunferencial total da
mucosa é uma das condições para o sucesso a longo prazo da anastomose, assim
como a eversão de suas margens(12).
Várias formas de reconstrução da via biliar são descritas: o conduto da
vesícula biliar (CVB), coledocoduodenostomia (CDD), coledococoledocostomia
término-terminal
(CCTT),
coledococoledocostomia
látero-lateral
(CCLL)
e
a
hepaticojejunostomia em “Y de Roux” (HJYR), associadas ao uso ou não de prótese
e do tubo T (dreno de Kehr)(13). Duas formas de reconstrução são as mais utilizadas,
a anastomose colédoco-colédoco (término-terminal ou látero-lateral) que é rápida,
3
simples e fisiológica e a hepaticojejunostomia, utilizada quando a anterior não é
possível por motivos anatômicos ou por doenças da via biliar(14).
Colecistoduodenostomia, colecistojejunostomia e o conduto da vesícula biliar
foram técnicas de reconstrução biliar utilizadas no início do desenvolvimento do
transplante de fígado(15). A técnica que utiliza a vesícula biliar como um ducto entre
as vias biliares do doador e do receptor foi abandonada devido à estase biliar
associada à formação de cálculo e episódios frequentes de colangite, levando a
piores resultados. Muitas vesículas desfuncionalizadas foram removidas por
obstrução do ducto cístico(5).
A reconstrução biliar término-terminal é a mais utilizada em pacientes com
via biliar saudável e calibres simétricos, podendo ser realizada com um dreno em T,
prótese ou sem a utilização de drenagem. A vantagem dessa reconstrução é a
preservação do mecanismo de esfíncter natural funcionando como uma barreira
contra secreção intestinal e bactérias e a possibilidade de terapia endoscópica caso
necessário(6,16). A CCTT pode ser realizada com pontos separados ou contínuos. A
sutura contínua é mais rápida e econômica, entretanto, devido a um suposto risco
de estenose, alguns grupos continuam utilizando a sutura em pontos separados.
Castaldo et al., em 2007, não encontraram diferença entre o tipo de sutura, contínua
ou separada, no transplante de fígado (13).
Ocasionalmente, a HJYR pode ser utilizada. Indica-se este procedimento em
casos de doença específica da via biliar como a colangite esclerosante primária e a
atresia de vias biliares, dificuldades técnicas devido à diferença de diâmetro dos
ductos,
via
biliar
curta
e
insuficiente
para
anastomose
sem
tensão
e
retransplantes(17). A HJYR tem algumas desvantagens como o potencial de
contaminação pela abertura da alça jejunal, demora no retorno da função
4
gastrointestinal, maior tempo operatório, perda da proteção exercida pelo esfíncter
de Oddi contra o refluxo entérico e infecção ascendente(18). Esse procedimento não é
isento de complicações, podendo ocorrer sangramento gastrointestinal, colangite e
biliomas infectados(19).
Complicações biliares de HJYR são relacionadas à maior mortalidade
quando comparadas a colédoco-colédoco anastomoses(20). O principal argumento
contra a HJYR permanece a dificuldade de diagnóstico e tratamento endoscópico
em caso de complicações, necessitando de um procedimento mais invasivo
(percutâneo ou cirúrgico)(6).
No transplante de fígado pediátrico, seja doador cadáver ou doador vivo, a
anastomose da via biliar mais utilizada é a HJYR devido à alta prevalência de atresia
biliar como causa desses transplantes. Em casos de hepatite fulminante ou doenças
metabólicas, a via biliar é saudável e pode ser utilizada para realização de
anastomoses término-terminais(21).
O uso da CCLL com tubo T tem apresentado baixas taxas de complicações
biliares. Sua vantagem seria realizar uma anastomose em vias biliares muito finas,
com menor risco de estenoses e também preservando-se o esfíncter de Oddi.
Traumas mecânicos por tração na linha de sutura com necrose e fístula são mais
comuns nas CCTT que nas CCLL(22,23).
A anastomose da via biliar diretamente no duodeno (CDD) é uma técnica
utilizada para reparo de lesões biliares há mais de um século. A experiência com a
CDD para este fim mostra que a técnica fornece longo período de patência da via
biliar com poucas complicações. Esse tipo de anastomose pode ser benéfico para
doentes de transplante de fígado, garantindo uma via de acesso endoscópico no
pós-operatório. Foi utilizada em transplantes de fígado inicialmente, mas,
5
abandonada devido a relatos de deiscência da anastomose e sepse em alguns
pacientes(19). Entretanto, há pouca informação para avaliar-se a gravidade das
complicações relacionadas à técnica no transplante de fígado devido à experiência
limitada.
Uma vantagem da CDD é a possibilidade de tratamento endoscópico em
caso de complicações. Além disso, evita-se o edema na alça de jejuno que pode
estar presente após a ligadura da veia porta, que dificultam a anastomose e
possibilitam complicações na HJYR(24).
Em 1991, Belli et al. propuseram uma modificação na CCTT, “espatulando” a
via biliar com excelentes resultados. Utilizam tubo T para drenagem da via biliar
rotineiramente(25). Buczkowski et al., em 2007, mostraram uma redução da
incidência de complicações biliares utilizando a mesma coledococoledocostomia
término-terminal espatulada com drenagem por tubo T (CCTTesD). Realizam uma
incisão longitudinal anterior na via biliar do doador e uma incisão longitudinal
posterior
na
via
biliar
do
receptor,
ambas
entre
os
vasos
sanguíneos
pericoledocianos. As vantagens deste método seriam uma linha de sutura mais
ampla e uma técnica de anastomose contínua. Esses aspectos ampliam as bocas,
facilitando a confecção da anastomose e permitindo melhor coaptação entre vias
biliares de diferentes calibres(16).
1.2 Drenagem da via biliar
Não há consenso sobre a necessidade de drenagem da via biliar no
transplante de fígado(26). A forma de drenagem mais utilizada é através do tubo T.
Inserido no colédoco do receptor, cerca de 1 cm distal à anastomose, o tubo T teria
6
a vantagem de monitorar a quantidade e qualidade de bile e consequentemente a
função do enxerto, ter um fácil acesso à colangiografia, sustentar a anastomose
diminuindo a chance de estenoses ou fístulas e descomprimir o colédoco, cuja
pressão é aumentada após o transplante(6).
Entretanto, o uso do tubo T tem sido questionado. Argumenta-se que a
presença do tubo T aumenta o tempo operatório, causa desconforto ao paciente,
mantém o risco de fístula no orifício de entrada do dreno, possibilidade de colangite
após colangiografia, deslocamento do tubo T com obstrução biliar e peritonite após a
sua remoção. A imunossupressão é responsável pelo atraso na formação de um
trajeto fibroso que permita sua remoção segura (27). Para evitar esse problema, foi
proposto o uso de tubos de borracha ao invés dos tubos de silicone ou retirar o
dreno mais tardiamente (quatro a seis meses)(22). O argumento de acesso
diagnóstico rápido para uso do tubo T não é mais justificável, para alguns autores,
após o advento da colangiorressonância magnética (23,28).
Outras alternativas de drenagem da via biliar têm sido descritas além do
tubo T. Haberal et al. (2006) apresentam nova técnica de drenagem anastomótica no
transplante de fígado, com inserção de dreno biliar transhepático, com baixas taxas
de complicações(18). Recentemente, o uso de prótese na via biliar, moldando a
anastomose, foi investigado. As vantagens teóricas seriam manter os benefícios da
drenagem sem as suas complicações como a fístula pós retirada e infecção (29).
A utilização de próteses de material sintético pode trazer problemas como o
acúmulo de biofilme e infecção, além da obstrução com icterícia recorrente e
colangite, necessitando de troca da prótese. Uma alternativa seria o uso de prótese
biodegradável, que pode fornecer um suporte temporário à via biliar e ser absorvido
posteriormente, não apresentando esses inconvenientes(30).
7
Existem publicações divergentes na literatura sobre qual a melhor técnica de
reconstrução biliar e sobre a necessidade de drenagem(31,32). Porém, revisões
sistemáticas com metanálises recentes apontam a CCTT sem drenagem como a que
apresenta menor taxa de complicações biliares, ainda que esses índices
permaneçam entre 15 e 20%(7,33,34).
1.3 Complicações biliares
As complicações biliares podem ser divididas em dois grandes grupos:
fístulas e estenoses, sendo as fístulas mais comuns no pós-operatório recente e as
estenoses no pós-operatório tardio(6,35).
As fístulas biliares geralmente aparecem no primeiro mês após o transplante
e frequentemente possuem uma causa técnica(36). A isquemia e tensão na linha de
sutura são as causas mais comuns. Na presença de trombose da artéria hepática,
pode ocorrer necrose extensa da via biliar e deiscência da anastomose(37). As
fístulas podem ocorrer no local da anastomose, no ponto de inserção do tubo T, no
ducto cístico remanescente do doador ou do receptor (38). Raramente ocorrem após
biópsia hepática ou dano iatrogênico à via biliar(17). Em casos de divisão do fígado
para dois receptores “split” ou fígado reduzido, a fístula pode ocorrer na superfície
cruenta do órgão. Cerca de 80% dos casos de fístula ocorrem ao nível da
anastomose ou na inserção do tubo T (38).
A fístula biliar relacionada ao tubo T pode ser precoce ou no momento de
sua retirada. A qualquer momento pode haver um deslocamento acidental. Um
trajeto fistuloso insuficiente é a causa da necessidade de intervenção nas fístulas
8
após retirada de tubo T. Provavelmente devido às drogas imunossupressoras, o
trajeto fistuloso não é formado(6,35). A pressão aumentada na via biliar por
denervação ou disfunção do esfíncter de Oddi, com dificuldade no escoamento da
bile, pode contribuir para formação das fístulas biliares (39).
As fístulas resolvem-se em sua maioria após esfincterotomia e colocação de
prótese endoscópica ou por via percutânea ou drenagem nasobiliar, porém, é um
fator de risco para o desenvolvimento de estenoses futuras(40). Nova abordagem
cirúrgica deve ser realizada na presença de peritonite ou falha do tratamento
endoscópico. A presença de coleções pode ser tratada com punção guiada por
ultrassonografia(41). Grandes fístulas associadas a hepaticojejunostomia em “Y de
Roux” (HJYR) são menos passíveis de tratamento não operatório, podendo ser
submetidas a revisão cirúrgica precocemente(42).
Estenoses anastomóticas precoces são mais relacionadas a erros técnicos e
as tardias relacionam-se à isquemia e fibrose cicatricial, muitas vezes as estenoses
são consequências de fístulas prévias(17).
As estenoses não anastomóticas são multifatoriais, sendo consideradas as
complicações biliares mais problemáticas. Estão envolvidas causas isquêmicas
(tempo de isquemia prolongado, lesão da microvascularização biliar, soluções de
preservação altamente viscosas), imunológicas (incompatibilidade ABO, hepatite
autoimune, rejeição crônica e colangite esclerosante primária) ou lesão induzida por
sais biliares(43).
Esse tipo de estenose foi inicialmente associado à trombose da artéria
hepática, quando a árvore biliar se torna isquêmica e por vezes necrótica, resultando
em estenoses e dilatações. Contudo, pode ocorrer em pacientes sem trombose de
artéria hepática, assim, surgiu o termo Isquemic Type Biliary Lesion (ITBL), ou lesão
9
biliar induzida por isquemia, estando presente de 5% a 15% dos transplantes
ortotópicos de fígado(44,45). A maioria dos pacientes com ITBL apresenta a síndrome
nos primeiros seis meses do transplante, podendo referir dor abdominal, febre ou
apenas aumento das enzimas hepáticas. O diagnóstico é colangiográfico com
imagens de estreitamentos e dilatações dentro e fora do fígado(46).
A colangiorressonância magnética é a modalidade de escolha não invasiva
para diagnóstico de estenoses biliares, com sensibilidade e especificidade acima de
90%(47). É recomendável o tratamento na presença de dor, colangite ou alteração
bioquímica. A maioria das séries mostra boa resposta à terapia endoscópica em
cerca de 75% dos pacientes(6). Na presença de estenose em HJYR ou na
impossibilidade de cateterização por via endoscópica, prefere-se a terapêutica por
colangiografia transparieto-hepática (CTPH) com resultados similares ou pouco
piores(48). Um programa de dilatação com balão com uso de próteses apresenta os
melhores resultados(48). A falta de resposta ao tratamento endoscópico ou
percutâneo é indicação de tratamento cirúrgico com confecção ou revisão de
HJYR(49).
As fístulas e estenoses são as complicações biliares mais comuns, porém,
também se observam a disfunção do esfíncter de Oddi, hemobilia, obstrução biliar
por mucocele do ducto cístico, cálculos, lama biliar e rolhas (6,50,51,52).
10
1.4 Justificativa
Apesar da grande evolução técnica no transplante de fígado, as
complicações biliares ainda persistem como causa importante de morbidade e
mortalidade. Inúmeras técnicas de reconstrução biliar são citadas na literatura e
mesmo as melhores séries apresentadas ainda trazem um número de complicações
significativo.
Desse modo, julga-se interessante a descrição de uma técnica de
reconstrução biliar, inédita na literatura mundial, por coledococoledocostomia
término-terminal espatulada sem a drenagem da via biliar com tubo T (CCTTesSD),
utilizada com sucesso pelo grupo de transplante hepático da Santa Casa de São
Paulo desde dezembro de 2004, e avaliação dos seus resultados.
11
2. OBJETIVOS
O objetivo do presente estudo é avaliar os resultados da anastomose biliar
colédoco-colédoco término-terminal espatulada sem uso de dreno em T, em doentes
submetidos a transplante de fígado, em relação às complicações biliares e comparar
com os melhores resultados apresentados na literatura até o momento.
12
3. CASUÍSTICA E MÉTODO
3.1 Planejamento do estudo
Foram
analisados
retrospectivamente
os
prontuários
de
todos
os
transplantes de fígado realizados na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo de 1º
de dezembro de 2004 a 31 de agosto de 2012.
Os dados coletados dos prontuários foram analisados quanto ao sexo,
idade, pontuação MELD(53) (model for end-stage liver disease), diagnóstico dos
pacientes transplantados, tempo de isquemia total e tempo de isquemia quente,
forma de revascularização arterial e portal, tipo de enxerto, solução de preservação,
método de reconstrução biliar, pesquisa de complicações biliares (fístulas e
estenoses) e mortalidade.
3.2 Pacientes
Os pacientes foram classificados conforme a técnica de reconstrução biliar.
A incidência de complicações biliares foi analisada nos pacientes submetidos a
CCTTesSD. Esse resultado foi comparado com os únicos artigos(16,25) da literatura
que utilizaram essa anastomose (porém ambos com tubo T). O resultado também foi
comparado com a melhor técnica de anastomose biliar descrita em revisão
sistemática e metanálise recentes (33), realizada previamente para este fim, a
13
coledococoledocostomia término-terminal sem drenagem por tubo T (CCTTsD),
segundo o melhor nível de evidência da literatura atual.
3.3 Critérios de inclusão
Foram incluídos os pacientes submetidos à transplante ortotópico do fígado
na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo de 1º de dezembro de 2004 a 31 de
agosto de 2012 que realizaram anastomose biliar por CCTTesSD.
3.4 Critérios de exclusão
Foram excluídos os pacientes transplantados que apresentaram trombose
da artéria hepática, os pacientes que morreram nas primeiras 48 horas de pósoperatório, embora nenhum deles tivesse complicações biliares, e os pacientes que
tiveram outra forma de reconstrução biliar diferente da CCTTesSD.
3.5 Descrição da técnica de reconstrução biliar
A coledococoledocostomia término-terminal espatulada sem tubo T consiste
em uma variação técnica para adaptação de calibres de vias biliares diferentes, com
ampliação da linha de anastomose, sem a necessidade de drenagem.
A preocupação com a via biliar começa desde a captação, quando realiza-se
a secção do colédoco o mais próximo possível do pâncreas e lava-se a via biliar com
14
soro fisiológico através de uma abertura na vesícula biliar. Além disso, procura-se
não dissecar as estruturas do hilo hepático a fim de evitar a desvascularização da
via biliar.
A via biliar do receptor é canulada e lavada com soro fisiológico para
remoção de eventuais cálculos ou bile espessa. Essa cânula é introduzida até o
duodeno, confirmando-se a perviedade da papila duodenal.
A reconstrução biliar é realizada após anastomose da veia cava, artéria
hepática e veia porta, com o fígado já revascularizado e o doente estabilizado. É
realizada inicialmente a hemostasia dos vasos sangrantes peribiliares com fio de
polipropileno 7.0 nas vias biliares do doador e do receptor (Fig. 1). Avalia-se também
se a vascularização é adequada para realização de anastomose término-terminal.
FIGURA 1. Preparação das bocas anastomóticas. Hemostasia dos vasos pericoledocianos.
15
Os diâmetros das vias biliares são rotineiramente comparados, avaliando-se
possíveis discrepâncias. Posteriormente, realiza-se uma incisão longitudinal
posterior na via biliar do receptor, entre os vasos sanguíneos pericoledocianos (Fig.
2 e 3).
FIGURA 2. Incisão longitudinal posterior na via biliar do receptor.
16
FIGURA 3. Aspecto da boca distal após secção da parede posterior.
Confeccionam-se dois pontos de polidioxanona 6.0 entre o ápice da incisão
posterior da via biliar do receptor e o meio da parede posterior da via biliar do doador
com os nós para fora (Fig. 4).
17
FIGURA 4. Aplicação do primeiro de dois pontos de reparo da parede posterior.
Posteriormente, realiza-se uma incisão longitudinal anterior na via biliar do
doador também entre os vasos sanguíneos pericoledocianos (Fig. 5 e 6). O tamanho
dessas incisões varia de acordo com as diferenças entre os diâmetros das vias
biliares, podendo-se adequar o tamanho da incisão conforme os calibres dos
colédocos do doador e receptor, aumentando-se a linha de anastomose.
18
FIGURA 5. Incisão longitudinal anterior da via biliar do doador.
FIGURA 6. Aspecto da anastomose com pontos da parede posterior e após incisão da parede anterior.
19
Prossegue-se a sutura da parede posterior, de forma contínua, do centro
para as laterais de ambos os lados em direção ângulos (Fig. 7).
FIGURA 7. Término da sutura contínua posterior.
A parede anterior da via biliar é então suturada em pontos separados, com o
mesmo fio e com os nós para fora (Fig. 8). Uma sonda de pequeno calibre é
constantemente introduzida nas vias biliares do doador e do receptor para certificarse de que as luzes permanecem pérvias.
Não se utiliza tubo T para drenagem da via biliar.
20
FIGURA 8. Aspecto final da anastomose com pontos separados anteriormente.
3.6 Método de comparação
Os resultados encontrados foram comparados com os melhores resultados
encontrados na literatura até o momento.
Inicialmente realizou-se uma comparação com os resultados individuais de
duas publicações com técnica de reconstrução semelhante e baixos índices de
complicações biliares(16,26). Os dados também foram comparados com os melhores
resultados da literatura encontrados em revisão sistemática e metanálise realizadas
previamente sobre as melhores técnicas de reconstrução biliar no transplante de
fígado em relação às complicações biliares(33).
Nas comparações dos resultados com as melhores técnicas de reconstrução
biliar, foi utilizado o teste qui-quadrado para análise estatística(54). Foi utilizado o
21
programa GraphPad Prism versão 5.01 para realização dos cálculos e considerado
p<0,05 como estatisticamente significante.
A revisão sistemática realizada previamente acessou todas as publicações
em inglês, espanhol, francês, alemão, italiano e português, nos bancos de dados
Medline-PubMed, EMBASE, Scielo-LILACS e Cochrane Database.
A primeira fase consistiu em uma busca ampla na base de dados MedlinePubMed, utilizando-se os descritores “Liver Transplantation” e “Biliary Tract”. Os
artigos recuperados com esta busca foram analisados para a obtenção de
descritores (através do item “citation” de cada artigo) apropriados para elaboração
de uma busca mais completa.
Para que a dúvida pudesse ser organizada e convertida em uma estratégia
de busca efetiva, estruturou-se a segunda fase da busca através da definição dos
seguintes componentes: P (paciente ou população), I (indicador ou intervenção), C
(comparação ou controle) e O (outcome - desfecho), cujas iniciais formam o
acrônimo PICO(55). Os componentes “P” e “I” foram os descritores resultantes da 1ª
fase e determinaram os artigos recuperados da literatura. Os componentes “C” e “O”
foram escolhidos posteriormente, após a leitura dos artigos selecionados e
identificação dos termos mais utilizados pelas publicações, para evitar perda de
artigos. Também foram selecionados descritores compatíveis com os critérios de
exclusão, denominados “Descritores de Exclusão”.
Os descritores foram combinados através das palavras (operadores
Booleanos) “OR” (refere-se a presença de um ou mais termos associados ou
isolados identificando um mesmo artigo), “AND” (refere-se a associação obrigatória
dos termos em um mesmo artigo), e “NOT” (exclui artigos que contenham
determinado termo), conferindo à busca sensibilidade e especificidade(56).
22
O resultado da busca dos descritores que formaram o “P” foi combinado com
o resultado da busca dos descritores que formam o “I” com o termo “AND” e
posteriormente com os “Descritores de Exclusão” com o termo “NOT”.
Foram selecionados estudos clínicos com população alvo formada por
pacientes adultos e pediátricos submetidos a transplante ortotópico de fígado, que
tiveram a reconstrução da via biliar finalizada, independente da doença que levou à
sua indicação.
Foram excluídos os artigos que utilizaram modelos animais e estudos
clínicos sobre transplantes com doador vivo, que compararam grupos de pacientes
transplantados com uma doença específica, que se referiam a detalhes técnicos
como tipo de fio utilizado e formas de retirada de drenos e estudos com dados
incompletos.
Quanto à metodologia dos trabalhos, foram incluídos ensaios comparando
diferentes técnicas de reconstrução biliar no transplante de fígado, desde que duplocegos, randomizados e controlados, com resultados primários claramente definidos.
Na ausência de artigos com esse desenho, foram incluídos ensaios clínicos não
randomizados e estudos tipo coorte na busca da melhor evidência disponível sobre
o assunto até o momento.
Foram excluídas as séries de casos (estudos observacionais descritivos),
revisões, cartas ao editor e os comentários.
Cada estudo foi classificado em ensaio clínico (EC), ensaio clínico
randomizado (ECR) e estudo tipo coorte segundo os critérios de classificação de
Oxford(57), para avaliar a força da evidência a partir do desenho do estudo utilizado.
A figura 9 traz um resumo da busca dos artigos na literatura.
23
FIGURA 9. Artigos selecionados para revisão sistemática
(33)
.
Quando artigos com o mesmo desenho de estudo realizaram as mesmas
comparações, seus dados foram agrupados e realizou-se o cálculo de metanálise
para cada desfecho avaliado e para o total de complicações (desfechos
combinados), dentro dos três níveis de evidências: ECR, EC e Coorte.
Os desfechos foram agrupados em cinco grupos para posterior comparação:
fístula anastomótica, estenose anastomótica, fístula não anastomótica, estenose não
anastomótica
e
outras
complicações.
Foram
consideradas
fístulas
não
anastomóticas aquelas relacionadas com a forma de drenagem da via biliar, pelo
parênquima cruento, em casos de fígados reduzidos, ou pelo ducto cístico.
24
Consideraram-se estenoses não anastomóticas aquelas intra ou extra-hepáticas fora
da linha de anastomose, relacionadas a lesões isquêmicas ou estreitamentos da via
biliar ocasionados pelo próprio sistema de drenagem. As colangites, mucoceles,
cálculos e lama biliar, disfunção do esfíncter de Oddi e compressões extrínsecas,
foram classificadas como outras complicações.
Foi considerado como drenagem da via biliar qualquer forma de
descompressão da mesma como um tubo T, drenagem transcística, transhepática
ou presença de prótese na anastomose biliar.
As medidas de efeito(58) utilizadas na expressão do resultado metanalítico
(combinado) foram:
1. Risco absoluto (RA): proporção de eventos nos grupos das diferentes
formas de reconstrução biliar. Foi calculado o risco absoluto da
intervenção (RAI) e o risco absoluto do controle (RAC).
2. Redução do risco absoluto (RRA): quantifica o quanto foi reduzido o risco
de acontecer determinado desfecho ao se utilizar uma determinada
intervenção em relação a um controle (RAC - RAI).
3. Aumento do risco absoluto (ARA): quantifica o quanto aumenta o risco de
acontecer determinado desfecho ao se utilizar uma determinada
intervenção em relação a um controle (RAI - RAC).
4. (Number needed to treat) ou número necessário para tratar (NNT):
representa o número de doentes que é preciso tratar com determinada
intervenção para se evitar um desfecho negativo em estudo em relação a
um controle (1/RRA).
25
5. (Number needed to harm) ou número necessário para causar danos
(NNH): representa o número de doentes que é preciso tratar com
determinada intervenção para que um desfecho negativo em estudo
ocorra em relação a um controle (1/ARA).
6. Intervalo de confiança de 95% (IC95%).
As
análises
estatísticas
foram
realizadas
através
do
programa
“Comprehensive Meta-Analysis v.2.2.050 (10/11/2009)”. Os estudos agregados
foram ponderados pela variância (tamanho da amostra e precisão), bem como foi
aplicado teste quantitativo (I2) e qualitativo (Q Cochran’s) de heterogeneidade (nível
de significância: p<0,05).
26
4. RESULTADOS
4.1 Análise dos pacientes transplantados
Foram realizados 114 transplantes ortotópicos de fígado na Santa Casa de
São Paulo entre dezembro de 2004 e agosto de 2012.
A CCTTesSD foi utilizada em 93 casos, a CCTTsD em 3 casos, a HJYR em
17 casos e a anastomose colédoco-duodenal em 1 caso. Foram excluídos da
análise 9 transplantes por óbito em até 48 horas do pós-operatório (8 com
CCTTesSD e 1 com HJYR) e 3 transplantes por trombose da artéria hepática (todos
com CCTTesSD), restando 82 casos de CCTTesSD para análise dos resultados.
Entre os 82 transplantes incluídos, 40 eram do sexo feminino (48,8%) e 42
masculino (51,2%). A idade variou de 1 a 73 anos com média de 39,7, sendo 13
pacientes de até 12 anos e 69 pacientes acima de 12 anos.
O MELD médio foi de 38 incluindo-se os 13 transplantes pediátricos com
PELD ajustado. Quando utilizam-se os valores do PELD puro para o cálculo, obtémse uma média de 28 na pontuação de gravidade utilizada para os transplantados.
Entre os diagnósticos que levaram os pacientes ao transplante de fígado,
houve 19 doentes com cirrose por hepatites C, sendo 8 portadores de carcinoma
hepatocelular (CHC), 13 com cirrose por ingesta de álcool (2 com CHC), 11 com
cirrose criptogênica (4 com CHC), 11 doentes com hepatite fulminante, 9 casos de
hepatite autoimune, 5 com esteatohepatite não alcoólica, 3 com doença de Wilson, 2
com cirrose biliar primária, 2 com doença de Niemann-Pick, 1 com cirrose por
27
hepatite B, 1 com hemangioendotelioma, 1 com disfunção primária do enxerto, 1
com síndrome de Allagile, 1 com hepatoblastoma, 1 com síndrome de Budd-Chiari e
1 com tumor neuroendócrino.
A revascularização do enxerto foi simultânea em todos os transplantes
analisados, realizando-se inicialmente a anastomose da veia cava do enxerto com
as veias hepáticas do receptor, posteriormente a anastomose da artéria hepática e
em seguida a anastomose da veia porta. Somente após as três anastomoses o
enxerto era revascularizado, conforme relatado por Massarollo et al. (1998) (59).
Para preservação do órgão, foi utilizada solução Histidine-TryptophanKetoglutarate (HTK) em 35 casos, Celsior® em 26 e solução da Universidade de
Wisconsin (UW) em 21 transplantes. A opção da solução de preservação deveu-se à
disponibilidade do serviço no momento dos transplantes.
Quanto ao órgão doado, 68 pacientes receberam fígados inteiros, 2 crianças
receberam fígado reduzido, 7 pacientes receberam produtos de splits e 5 pacientes
receberam órgãos provenientes de doadores com Polineuropatia Amiloidótica
Familiar (PAF).
O tempo de isquemia total foi de 12 horas e 2 minutos e o tempo de
isquemia quente foi de 68 minutos em média. Dezessete pacientes morreram no
período de acompanhamento com sobrevida atuarial de 80,5 meses em 1 ano e 79
meses em 3 e 5 anos com um tempo de seguimento médio de 74,8 meses (Fig. 10).
28
Figura 10. Curva de sobrevida atuarial de Kaplan-Meier.
4.2 Análise dos dados
Dos 82 transplantes incluídos na pesquisa em que realizaram-se a
anastomose CCTTesSD houve 3 casos de complicações biliares, todos com
estenose anastomótica (Tab. 1). Entre os 3 casos excluídos por trombose da artéria
hepática houve um caso de fístula e um caso de estenose anastomótica.
TABELA 1. Complicações Biliares com a CCTTesSD
Santa Casa – SP 2012.
Desfecho
(complicações
biliares)
Santa Casa
SP 2012
Total
Estenose
anastomótica
Intervenção
CCTTesSD
(n:82)
3
3/82 (3,66%)
CCTTesSD: Coledococoledocostomia término-terminal espatulada sem drenagem.
29
O primeiro caso de complicação foi transplantado em janeiro de 2011 por
cirrose por hepatite C associada a carcinoma hepatocelular. O paciente apresentou
icterícia com bilirrubinas totais (BRT) de 21,5 mg/dl, bilirrubinas diretas (BRD) de
13,7 mg/dl, fosfatase alcalina (FA) de 1075 U/l e gama glutamil-transpeptidase
(GGT) de 1107 U/l dois meses após o transplante. Realizou-se colangiorressonância
magnética (Fig. 11) que confirmou estenose anastomótica, sendo realizado
colangiografia endoscópica (Fig. 12) para dilatação e colocação de prótese com
melhora do quadro. Já realizou troca de prótese com nova dilatação, posterior
retirada da prótese e permanece assintomático em seguimento ambulatorial.
FIGURA 11. Colangiorressonância magnética mostrando estenose anastomótica (caso 1).
30
FIGURA 12. Colangiografia endoscópica mostrando estenose anastomótica (caso 1).
O segundo caso de complicação foi transplantado em junho de 2012 por
cirrose alcoólica. O paciente apresentou icterícia leve com BRT de 4,6 mg/dl, BRD
de 2,7 mg/dl, FA de 3256 U/l e GGT de 2517 U/l dois meses após o transplante.
Realizou colangiorressonância magnética (Fig. 13) que confirmou estenose
anastomótica. Houve melhora da icterícia com diminuição das enzimas canaliculares
posteriormente. O paciente permanece assintomático, em acompanhamento
ambulatorial com possibilidade de colangiografia endoscópica para passagem de
prótese caso apresente sintomas.
31
FIGURA 13. Colangiorressonância magnética mostrando estenose anastomótica (caso 2).
O terceiro caso de complicação foi transplantado em agosto de 2012 por
hepatite fulminante. O paciente apresentou discreta icterícia com BRT de 3,0 mg/dl,
BRD de 2,1 mg/dl, FA de 617 U/l e GGT de 345 U/l no 10° dia de pós-operatório do
transplante. Realizou colangiorressonância magnética (Fig. 14) que confirmou
estenose anastomótica. Houve tentativa de dilatação por CPRE (Fig. 15) e
passagem de prótese biliar sem sucesso, sendo necessária nova cirurgia com
conversão da CCTTesSD para HJYR. O paciente encontra-se assintomático no pósoperatório, sem sinais de complicações biliares.
32
FIGURA 14. Colangiorressonância magnética mostrando estenose anastomótica (caso 3).
FIGURA 15. Colangiografia endoscópica mostrando estenose anastomótica (caso 3).
33
Em revisão sistemática realizada previamente(33), foram encontradas duas
publicações que utilizaram a reconstrução biliar por coledococoledocostomia
término-terminal espatulada no transplante de fígado. Inicialmente descrita por Belli
et al. (1991)(25) e posteriormente relatada por Buczkowski et al. (2007)(16), ambas
utilizaram drenagem da via biliar por tubo T (CCTTesD).
Belli et al. (1991)(25) publicaram uma série de casos com 100 transplantes de
fígado utilizando a CCTTesD (Fig. 16) com 4% de complicações, sendo um caso de
colangite com abscesso e três casos de complicações relacionadas ao tubo T, um
deslocamento do dreno com fístula, uma obstrução da via biliar pelo ramo longo do
dreno e uma fístula após retirada do dreno (Tab. 2).
TABELA 2. Complicações Biliares com a CCTTesD
Belli et al. 1991(25).
Desfecho
(complicações
biliares)
Belli et al.
199140
Total
Fístula não
anastomótica
Outras
complicações
Intervenção
CCTTesD
(n:100)
2
2
4/100 (4%)
CCTTesD: Coledococoledocostomia término-terminal espatulada com drenagem.
25
FIGURA 16. CCTTesD descrita por Belli et al., 1991 .
34
Buczkowski et al. (2007)(16) publicaram um ensaio clínico comparando a
CCTTesD com a CCTTcD, mostrando superioridade da CCTTesD em relação ao
índice de complicações biliares (Fig. 17). A CCTTesD foi utilizada em 38
transplantes com um caso de estenose anastomótica, representando 2,63% de
complicações biliares (Tab. 3).
TABELA 3. Complicações Biliares com a CCTTesD
Buczkowski et al. 200716.
Desfecho
(complicações
biliares)
Buczkowski
et al. 200733
Total
Estenose
anastomótica
Intervenção
CCTTesD
(n:38)
1
1/38
(2,63%)
CCTTesD: Coledococoledocostomia término-terminal espatulada com drenagem.
16
FIGURA 17. CCTTesD descrita por Buczkowski et al., 2007 .
A revisão sistemática com metanálise(33) realizada previamente ao estudo
sobre as técnicas de reconstrução biliar no transplante de fígado, selecionou 57
35
estudos comparativos para análise dos dados, sendo 3 ensaios clínicos
randomizados (ECR)(14,60,61), 6 ensaios clínicos (EC)(16,62-66) e 48 estudos tipo
coorte(4,67,10,19,20,27,68-109) (Fig. 9).
Foram encontradas 11 técnicas de reconstrução biliar diferentes (Fig. 18). As
técnicas de reconstrução biliar mais utilizadas foram a CCTT, HJYR e a CCLL com e
sem drenagem. As demais técnicas foram citadas por alguns autores, algumas com
caráter histórico como o conduto da vesícula biliar, outras foram utilizadas em
número reduzido de casos, não correspondendo à realidade da maioria dos grupos
transplantadores.
Técnicas de reconstrução biliar
Coledococoledocostomia término-terminal sem drenagem
Coledococoledocostomia término-terminal com drenagem
Coledococoledocostomia
término-terminal
espatulada
drenagem
Coledococoledocostomia látero-lateral sem drenagem
Coledococoledocostomia látero-lateral com drenagem
Hepaticojejunostomia em “Y de Roux” sem drenagem
Hepaticojejunostomia em “Y de Roux” com drenagem
Coledocoduodenostomia
Coledococoledocostomia término-lateral
Coledococoledocostomia latero-terminal
Conduto da vesícula biliar
Sigla
CCTTsD
CCTTcD
com CCTTesD
CCLLsD
CCLLcD
HJYRsD
HJYRcD
CDD
CCTL
CCLT
CVB
45
FIGURA 18. Técnicas de reconstrução biliar encontradas na revisão sistemática .
Foi possível realizar cálculo de metanálise apenas para a comparação
CCTTsD x CCTTcD, entre os ensaios clínico(62-66) (Anexo 1) e entre os estudos
coorte(4,27,68-71,73,75,76,78,80,81-86,89-91,93,94,99,104)
(Anexo
2),
que
realizaram
essa
comparação originalmente.
Entre os ensaios clínicos, na análise por desfecho, observou-se que a
CCTTcD obteve melhores resultados que a CCTTsD no que se refere a estenose
36
anastomótica e piores resultados quando analisou-se o desfecho fístula não
anastomótica. Ao analisar-se o conjunto de complicações biliares, encontrou-se
diferença significante, 16,9% de complicações para CCTTsD e
28% de
complicações para CCTTcD. No geral, evitou-se uma complicação biliar para cada
nove pacientes que recebem a CCTTsD em relação à CCTTcD segundo os ensaios
clínicos analisados (Tab. 4).
TABELA 4. Comparação entre CCTTsD e CCTTcD quanto ao risco de complicações
biliares para cálculo de metanálise nos ensaios clínicos.
Desfecho
Intervenção
Controle
CCTTsD
CCTTcD
Fístula
anastomótica
12/213
19/236
Estenose
anastomótica
20/213
Fístula não
anastomótica
0/194
Estenose não
anastomótica
1/49
Outras
3/165
RAI
RAC
ARA/RRA
NNH/NNT
IC95%
5,6%
8,1%
2,5%
NS
(-0,022 a 0,072)
6/236
9,4%
2,5%
-6,9%
-14
(-0,113 a -0,025)
26/218
0
11,9%
11,9%
8
(0,076 a 0,162)
5/48
2,0%
10,4%
8,4%
NS
(-0,011 a 0,179)
10/186
1,8%
5,4%
3,6%
NS
(-0,002 a 0,074)
Total de
Complicações
Biliares
36/213
66/236
16,9%
28,0%
11,1%
9
(0,035 a 0,187)
CCTTsD: Coledococoledocostomia término-terminal sem drenagem; CCTTcD: Coledococoledocostomia término-terminal
com drenagem; RAI: risco absoluto da intervenção; RAC: risco absoluto do controle; ARA: aumento do risco absoluto
(números negativos); RRA: redução do risco absoluto (números positivos); IC: intervalo de confiança; NNT: “number
needed to treat” (números positivos); NNH: “number needed to harm” (números negativos); NS: não significante.
37
Porém, quando realizou-se a ponderação pelo tamanho dos estudos
incluídos e calculou-se a heterogeneidade da amostra para obter-se a metanálise,
apenas o desfecho fístula não anastomótica (relacionado à drenagem da via biliar)
permaneceu com diferença significante, com uma redução do risco de ocorrência de
12,3% (IC95% -0,235 a -0,011) quando realiza-se a CCTTsD em relação à CCTTcD
(Fig. 19). Esse desfecho pode ser analisado em 4 ensaios clínicos(62,64,65,66).
Desfecho: Fístula Não Anastomótica
Study name
Statistics for each study
Risk
Low er
difference limit
Upper
limit
Risk difference and 95% CI
Relativ e
w eight
Z-Value p-Value
Amador 2005
-0,500
-0,688
-0,312
-5,200
0,000
16,51
Nuno 1997
-0,020
-0,074
0,034
-0,723
0,470
28,83
Ferraz-Neto 1996
-0,091
-0,147
-0,034
-3,150
0,002
28,66
Vougas 1996
-0,033
-0,121
0,054
-0,746
0,456
26,01
-0,123
-0,235
-0,011
-2,150
0,032
-1,00
-0,50
0,00
Intervenção (CCTTsD)
0,50
1,00
Controle (CCTTcD)
Meta Analysis
FIGURA 19. Gráfico de Metanálise (CCTTsD x CCTTcD) nos ensaios clínicos.
Modelo de efeito randômico -0,123 [IC95% -0,235 a -0,011] p=0,032
Quantificação da heterogeneidade: I^2 = 87,71% Teste de heterogeneidade: p<0,001
CCTTsD: coledococoledocostomia término-terminal sem drenagem; CCTTcD: coledococoledocostomia término-terminal com drenagem.
Entre os estudos tipo Coorte, observou-se melhor resultado para CCTTcD
apenas para o desfecho fístula anastomótica. Não houve diferença quanto às
estenoses e a CCTTsD foi melhor para fístulas não anastomóticas e outras
complicações. Quanto ao total de complicações biliares, a diferença foi significante,
com 18,8% para CCTTsD e de 23,4% para CCTTcD. Evitou-se uma complicação
biliar para cada 22 pacientes que receberam CCTTsD em relação a CCTTcD (Tab.
5).
38
TABELA 5. Comparação entre CCTTsD e CCTTcD quanto ao risco de complicações
biliares para cálculo de metanálise nos estudos coorte.
Desfecho
Intervenção
Controle
CCTTsD
CCTTcD
Fístula
anastomótica
63/1237
36/1082
Estenose
anastomótica
117/1237
Fístula não
anastomótica
10/1237
Estenose não
anastomótica
5/1237
Outras
8/1237
RAI
RAC
ARA/RRA
NNH/NNT
IC95%
5,1%
3,3%
-1,8%
-56
(-0,034 a -0,002)
90/1082
9,5%
8,3%
-1,2%
NS
(-0,035 a 0,011)
127/1082
0,8%
11,7%
10,9%
9
(0,089 a 0,129)
6/1082
0,4%
0,6%
0,2%
NS
(-0,004 a 0,008)
18/1082
0,6%
1,7%
1,1%
91
(0,002 a 0,020)
Total de
Complicações
Biliares
340/1811
380/1627
18,8%
23,4%
4,6%
22
(0,019 a 0,073)
CCTTsD: Coledococoledocostomia término-terminal sem drenagem; CCTTcD: Coledococoledocostomia término-terminal
com drenagem; RAI: risco absoluto da intervenção; RAC: risco absoluto do controle; ARA: aumento do risco absoluto
(números negativos); RRA: redução do risco absoluto (números positivos); IC: intervalo de confiança; NNT: “number
needed to treat” (números positivos); NNH: “number needed to harm” (números negativos); NS: não significante.
Ao realizar-se a ponderação dos estudos e teste de heterogeneidade,
manteve-se a diferença estatística entre as intervenções com uma redução do risco
de complicações biliares de 7,9% com uso da CCTTsD em relação à CCTTcD.
Porém, entre os desfechos isolados, apenas a fístula não anastomótica(4,27,6870,73,75,78,81,82,84-86,90,91,93,94,104)
(Fig. 20 e 21).
manteve-se com diferença estatisticamente significativa
39
Desfecho: Fístula Não-Anastomótica
Study name
Statistics for each study
Risk
Low er
difference limit
Tang Li 2009
Wojcicki 2009
Lin 2007
Wojcicki 2006
Kusano 2005
Thomsom 2004
Leonardi 2002
Shimoda 2001
Pekolj 2001
Leonardi 2000
Jef frey 1999
Hernandez 1999
Rabkin 1998
Kizilisik 1997
Verran 1997
Koivusalo 1996
Randall 1996
Rouch 1990
-0,091
-0,151
0,000
0,038
-0,095
-0,107
-0,227
-0,184
-0,019
-0,250
-0,176
-0,072
-0,266
-0,400
-0,071
-0,160
-0,017
-0,200
-0,109
-0,196
-0,282
-0,037
-0,167
-0,174
-0,190
-0,454
-0,274
-0,055
-0,461
-0,391
-0,119
-0,350
-0,620
-0,108
-0,307
-0,065
-0,361
-0,149
Upper
limit
0,015
-0,020
0,037
0,244
-0,017
-0,024
0,000
-0,095
0,017
-0,039
0,038
-0,025
-0,183
-0,180
-0,034
-0,013
0,031
-0,039
-0,070
Risk difference and 95% CI
Relativ e
w eight
Z-Value p-Value
-1,688
-2,260
0,000
0,367
-2,379
-2,540
-1,957
-4,038
-1,047
-2,317
-1,609
-2,974
-6,249
-3,566
-3,746
-2,130
-0,698
-2,436
-5,411
0,091
0,024
1,000
0,714
0,017
0,011
0,050
0,000
0,295
0,020
0,108
0,003
0,000
0,000
0,000
0,033
0,485
0,015
0,000
5,65
4,64
8,74
2,66
6,89
6,69
2,30
6,38
8,78
2,55
2,49
8,33
6,65
2,41
8,73
4,09
8,32
3,69
-1,00
-0,50
0,00
Intervenção (CCTTsD)
0,50
1,00
Controle (CCTTcD)
Meta Analysis
FIGURA 20. Gráfico de Metanálise (CCTTsD x CCTTcD) nos estudos coorte.
Modelo de efeito randômico -0,109 [-0,149; -0,070] p <0,001
Quantificação da heterogeneidade: I^2 = 77,34% Teste de heterogeneidade: p<0,001
CCTTsD: coledococoledocostomia término-terminal sem drenagem; CCTTcD: coledococoledocostomia término-terminal com drenagem.
Desfecho: Complicações Biliares
Studyname
Statistics for each study
Risk
difference
Tang Li 2009
Wojcicki 2009
Lin 2007
Wojcicki 2006
Abdullah 2005
Kusano 2005
Thomsom2004
Barkun 2003
Leonardi 2002
Shimoda 2001
Nemec 2001
Pekolj 2001
Freitas 2000
Leonardi 2000
Jeffrey 1999
Hernandez 1999
Rabkin 1998
Kizilisik 1997
Dunham1997
Verran 1997
Koivusalo 1996
Randall 1996
Rasmussen 1994
Rouch 1990
-0,185
0,007
0,072
0,231
-0,059
-0,169
-0,344
0,275
-0,093
-0,148
-0,365
-0,100
0,001
-0,118
0,075
-0,045
-0,097
-0,350
-0,200
-0,002
-0,121
-0,083
-0,037
-0,176
-0,079
Lower
limit
-0,365
-0,105
-0,058
-0,002
-0,179
-0,333
-0,480
0,168
-0,346
-0,281
-0,555
-0,192
-0,139
-0,393
-0,303
-0,136
-0,250
-0,585
-0,459
-0,088
-0,308
-0,225
-0,142
-0,401
-0,139
Upper
limit
-0,005
0,119
0,202
0,464
0,061
-0,006
-0,207
0,383
0,159
-0,014
-0,175
-0,009
0,142
0,158
0,453
0,047
0,056
-0,115
0,060
0,083
0,065
0,059
0,067
0,049
-0,018
Risk difference and 95% CI
Z-Value
p-Value
-2,018
0,116
1,083
1,943
-0,961
-2,032
-4,937
5,008
-0,724
-2,173
-3,772
-2,149
0,018
-0,836
0,388
-0,956
-1,240
-2,919
-1,509
-0,051
-1,274
-1,148
-0,696
-1,532
-2,553
0,044
0,907
0,279
0,052
0,336
0,042
0,000
0,000
0,469
0,030
0,000
0,032
0,986
0,403
0,698
0,339
0,215
0,004
0,131
0,959
0,203
0,251
0,486
0,126
0,011
Relative
weight
3,96
5,05
4,76
3,21
4,92
4,22
4,66
5,12
2,96
4,71
3,81
5,36
4,60
2,70
1,81
5,36
4,39
3,18
2,88
5,44
3,86
4,57
5,16
3,31
-1,00
-0,50
0,00
Intervenção (CCTTsD)
0,50
1,00
Controle (CCTTcD)
Meta Analysis
FIGURA 21. Gráfico de Metanálise (CCTTsD x CCTTcD) nos estudos coorte.
Modelo de efeito randômico -0,079 [IC95% -0,139; -0,018] p=0.011
Quantificação da heterogeneidade: I^2 = 75.30% Teste de heterogeneidade: p<0,001
CCTTsD: coledococoledocostomia término-terminal sem drenagem; CCTTcD: coledococoledocostomia término-terminal com drenagem.
40
A tabela 6 mostra a comparação entre o número de complicações biliares
com a CCTTesSD relatada no estudo e a melhor evidência apresentada na
literatura.
TABELA 6. Comparação entre a casuística do estudo e os melhores resultados
encontrados na literatura.
Autor do estudo
Santa Casa SP
2012
Belli 199140
Buczkowski 200733
Paes-Barbosa
201145 (Metanálise
Ensaios Clínicos)
Paes-Barbosa
201145 (Metanálise
estudos Coorte)
Técnica cirúrgica
efetuada
Número de
pacientes (n)
Incidência de
complicações biliares
(%)
CCTTesSD
82
3/82 (3,66%)
CCTTesD
CCTTesD
CCTTsD
100
38
213
4/100 (4%)
1/38 (2,63%)
36/213 (16,9%)
CCTTsD
1811
340/1811 (18,77%)
CCTTesSD: Coledococoledocostomia término-terminal espatulada sem drenagem; CCTTesD: Coledococoledocostomia
término-terminal espatulada com drenagem; CCTTsD: Coledococoledocostomia término-terminal sem drenagem.
Os estudos foram comparados conjuntamente e os resultados foram
submetidos ao teste qui-quadrado, que acusou diferença estatística significante
entre os estudos (p<0,0001) (Fig.22).
41
FIGURA 22. Comparação entre a casuística do estudo e os melhores resultados encontrados
na literatura.
A fim de diferenciar os resultados entre as técnicas de reconstrução biliar,
foram efetuadas comparações adicionais. O resultado da CCTTesSD foi comparado
com os resultados dos artigos que apresentam a CCTTesD(16,25) (Fig. 23).
42
FIGURA 23. Comparação entre a casuística do estudo (CCTTesSD) e os resultados encontrados na
literatura para CCTTesD.
A análise estatística (teste qui-quadrado) comparando o estudo realizado
com a CCTTesSD e os resultados encontrados na literatura para técnica cirúrgica
semelhante com a CCTTesD, revelou não haver diferenças significantes entre os
grupos (p=0,9290).
Adicionalmente, os resultados da CCTTesSD do presente estudo foram
comparados com os melhores resultados encontrados na literatura (CCTTsD) em
metanálise de ensaios clínicos e estudos coorte(33) (Fig.24).
43
FIGURA 24. Comparação entre a casuística do estudo (CCTTesSD) e os resultados encontrados na
literatura para metanálise (CCTTsD) dos ensaios clínicos e estudos coorte.
A análise estatística (teste qui-quadrado) comparando o estudo realizado e
os resultados encontrados na literatura para os ensaios clínicos e estudos de coorte,
revelou diferenças significantes entre os grupos (p=0,0021), com grande
superioridade a favor da CCTTesSD.
44
5. DISCUSSÃO
5.1 Do método
Foram excluídos os transplantes em que houve óbito em até 48 horas, pois o
curto seguimento impede uma conclusão sobre o desenvolvimento de complicações
biliares. Também foram excluídos os casos com trombose de artéria hepática no
pós-operatório por se tratar de um fator de risco independente para complicações
biliares devido à vascularização predominantemente arterial da via biliar.
Houve dificuldade em se formar um grupo controle para comparação entre
diferentes técnicas de reconstrução biliar. Primeiramente, devido aos bons
resultados com a CCTTesSD, julgou-se antiético propor a criação de um grupo
controle para estudo dentro do serviço. Quanto à comparação com um grupo
controle de outro serviço, há muitas diferenças entre os grupos transplantadores em
relação a técnica cirúrgica, tipos diferentes de reperfusão do órgão, soluções de
preservação, tempo de isquemia, cuidados pós-operatórios e muitos cirurgiões
diferentes executando o procedimento, tornando os grupos muito heterogêneos,
interferindo na correta interpretação dos resultados.
Diante da impossibilidade em se formar um grupo controle para comparação
dos dados, optou-se por realizar uma comparação com os resultados individuais das
duas publicações com técnica de reconstrução espatulada(16,25) presentes na
literatura, porém, com drenagem da via biliar. Posteriormente, os dados foram
comparados com os melhores resultados da literatura encontrados em revisão
45
sistemática e metanálise realizadas previamente sobre as melhores técnicas de
reconstrução biliar no transplante de fígado em relação às complicações biliares(33).
Uma metodologia sistemática deve ser utilizada na realização da revisão da
literatura para evitar viés e possibilitar uma análise mais objetiva dos resultados,
facilitando uma síntese conclusiva sobre determinada intervenção. Nesse sentido,
revisões sistemáticas e metanálises são os métodos mais adequados e atuais para
resumir e sintetizar evidências sobre os efeitos de intervenções(110).
Idealmente, busca-se realizar uma revisão sistemática de ensaios clínicos
randomizados para obter-se o maior nível de evidência possível. No caso específico
das complicações biliares no transplante de fígado, a produção de ensaios clínicos
randomizados possui alguns obstáculos. Primeiramente, as causas de complicações
biliares podem ser multifatoriais, sendo a técnica de reconstrução uma das causas
envolvidas.
Além disso, os cirurgiões, quando se habituam a desenvolver determinada
técnica cirúrgica com resultados aceitáveis, dificilmente tendem a testar novos
métodos, principalmente em uma cirurgia de alta complexidade como o transplante
de fígado em que qualquer complicação em uma das etapas da cirurgia pode ser a
causa de um mal resultado.
Outra característica dos cirurgiões é a tendência em manter os mesmos
passos técnicos cirúrgicos da forma como aprenderam em sua formação, muitas
vezes não sendo baseado na melhor evidência disponível no momento,
provavelmente pela segurança transmitida por um grupo ou escola mais experiente
durante a aprendizagem.
46
Alguns grupos especializados na elaboração de revisões sistemáticas e
metanálises consideram a existência de ECR como condição para existência da
própria revisão(111). É consenso que o ECR é o desenho de estudo que traz
resultados mais confiáveis, e por consequência, uma revisão sistemática da
literatura que inclua somente ECR também possui um maior nível de evidência.
Entretanto, determinados temas possuem dificuldades intrínsecas para
produção de ECR, como nas técnicas de reconstrução biliar no transplante de
fígado. Além disso, são inúmeras as técnicas passíveis de emprego e existe uma
dificuldade na randomização de muitos grupos diferentes. Desse modo, a ausência
de ECR sobre um determinado tema não pode ser o motivo da não existência de
uma revisão sistemática sobre o tema.
Para resolver esta questão, podemos realizar revisões sistemáticas e até
mesmo metanálises com ensaios clínicos não randomizados ou estudos tipo coorte,
desde que estas sejam as melhores evidências disponíveis na literatura. Essa
prática informa os profissionais que lidam com a dúvida clínica sobre qual a melhor
evidência disponível (mesmo que não seja a melhor evidência possível) e pode
inclusive incentivar a realização de ensaios clínicos randomizados sobre esses
assuntos.
Diversas entidades orientam caminhos diferentes na elaboração da
revisão(111,112). As formas apresentadas não são discordantes, mas enfatizam pontos
de vista complementares. Desse modo, inicia-se uma revisão com a formulação de
uma pergunta. Posteriormente, identificam-se os artigos existentes e os revisores
selecionam os estudos que serão incluídos. Os dados são coletados, analisados e
interpretados, levando ou não à produção de metanálises.
47
Rotineiramente, profissionais de biblioteca realizam a localização e seleção
dos estudos. Porém, o conhecimento sobre a situação clínica que originou a dúvida
permite ao revisor identificar criticamente variações nas populações estudadas, bem
como nas intervenções consideradas e nos desfechos, diferindo de revisores “de
bancada”(113). Estes profissionais dominam metodologias de pesquisa, porém, não
têm discernimento clínico para analisar um artigo sobre um tema por vezes
complexo e estabelecer, por exemplo, qual desfecho possui maior importância
clínica na prática. Para evitar este problema, na presente pesquisa, todas as etapas
foram realizadas pelo revisor principal (FCPB), sendo auxiliado por um segundo
revisor (WMB) na seleção e avaliação dos estudos.
Nesse caso, a comparação da casuística apresentada com os resultados de
uma revisão sistemática realizada previamente para este fim foi uma alternativa
encontrada para a impossibilidade de realização de um grupo controle. A grande
casuística possibilitada pela revisão sistemática aumenta o poder estatístico da
amostra, trazendo mais um benefício em relação a um grupo controle limitado.
Nas revisões sistemáticas, considera-se que os artigos são suficientemente
semelhantes em suas metodologias para que suas casuísticas possam ser
agrupadas na confecção da metanálise. Desse modo, entende-se a própria
metanálise (com as casuísticas agrupadas) como um estudo individual, que pode ser
comparado com os resultados de outro estudo individual.
Métodos de comparação entre casuísticas individuais e revisões da literatura
já foram realizados recentemente(114). Entretanto, entende-se como necessário a
abordagem de uma revisão sistemática para garantir a semelhança metodológica e
para que não haja perda de artigos publicados, podendo alterar as conclusões
estabelecidas.
48
5.2 Fatores que influenciam a anastomose biliar
Apesar de elevados, os índices de complicações biliares são subestimados
devido ao curto seguimento da maioria das publicações e porque incluem todos os
pacientes transplantados, inclusive óbitos precoces que não tiveram tempo de
desenvolver complicações como as estenoses (10). Alguns autores acreditam que
90% dos pacientes que desenvolverão complicações biliares necessitam de um
seguimento de 7 a 10 anos para avaliação satisfatória(12).
As complicações biliares no transplante de fígado possuem origem
multifatorial. Fatores isquêmicos, imunes e técnicos podem estar envolvidos. Neste
estudo, foi avaliada a técnica de reconstrução biliar, um importante fator na gênese
da complicação, entretanto, não é o único.
O uso de doadores após parada cardíaca e o aumento do tempo de
isquemia podem aumentar o número de complicações biliares (115), já que o epitélio
biliar é mais sensível à isquemia que o parênquima hepático (6).
Soluções de preservação mais viscosas (como a UW) podem não perfundir
pequenos vasos que irrigam a via biliar. Uma preservação inadequada pode
colaborar com maior número de complicações biliares(13,116).
O desnudamento da via biliar durante a captação ou durante a hepatectomia
do receptor com lesão de seu plexo vascular pode acarretar lesão biliar por má
perfusão local(9).
Outro fator que contribui para ocorrência de complicações biliares é a forma
de revascularização do enxerto. No grupo de cirurgia do fígado da Universidade de
49
São Paulo, as complicações biliares foram de 34,6% na revascularização portal
inicial e de 2% na revascularização simultânea(59).
Os
defensores
da
revascularização
portal
inicial,
alegam
que
a
revascularização simultânea aumenta o tempo de isquemia quente do enxerto.
Pirenne et al. encontraram baixa taxa de estenose biliar com revascularização portal
inicial(116). Entretanto, um ensaio clínico randomizado recente mostrou vantagens
com a revascularização simultânea, com redução na incidência de estenoses biliares
intra-hepáticas(117).
Apesar de um menor tempo de isquemia quente com a revascularização
portal inicial, o enxerto é perfundido, mas somente é “arterializado” após a confecção
da anastomose da artéria hepática, que pode durar até mais tempo devido ao
sangramento e intercorrências que podem ocorrer após a revascularização. Como a
via biliar possui uma irrigação predominantemente arterial, ela continua isquêmica,
apesar do fígado estar reperfundido, podendo acarretar aumento das complicações
biliares(116).
Outros fatores podem aumentar o número de complicações biliares como
trombose da artéria hepática, rejeição, recorrência da doença de base,
incompatibilidade ABO e infecção por citomegalovírus(13,118).
O risco específico de complicação também é dependente da técnica de
reconstrução biliar, uso de drenagem e o tipo de transplante. O transplante reduzido,
split e o uso de doadores vivos, têm mostrado uma maior chance de complicações
biliares com uma incidência de 10% a 60%(119). Broelsch et al. (2003) obtiveram
menores taxas de complicações biliares em transplantes ortotópicos do fígado de
doadores cadáveres (15%) que em transplantes de doadores vivos (30% a 60%) (120).
Pode ser resultado da desvascularização da via biliar ao se dissecar o hilo hepático,
50
falha em reconhecer anomalias biliares e reconstruções desafiadoras pelo pequeno
calibre ou multiplicidade dos ductos, além da possibilidade de fístula na área cruenta
do fígado(52).
As razões técnicas de complicações biliares podem incluir imperfeições na
confecção da anastomose, excesso de tensão na linha de sutura, não
reconhecimento de uma via biliar pouco vascularizada ou complicações relacionadas
ao tubo T. Esses fatores podem comprometer o aporte sanguíneo e resultar em
isquemia ou injúria mecânica à via biliar(14). Sotiropoulus et al. (2009), realizaram
uma revisão sistemática com metanálise sobre uso ou não de tubo T em CCTT em
transplante de fígado e concluíram que o uso do tubo T deve ser abandonado (34).
Deve-se ter cautela ao analisar resultados de alguns estudos que pesquisam
apenas uma variável. A revisão sistemática(33) realizada previamente compara as
técnicas de reconstrução biliar no transplante de fígado, buscando identificar qual a
melhor técnica de reconstrução biliar, entretanto, outras variáveis devem ser levadas
em consideração na etiologia dessas complicações, como exposto acima.
5.3 Técnica espatulada
O desenvolvimento de uma técnica de reconstrução biliar com melhores
resultados que os encontrados na literatura merece destaque e divulgação. Desse
modo, outros grupos de transplante podem ter uma opção técnica, caso julguem
necessário, que pode contribuir com a melhora nos resultados do procedimento.
Apesar de técnica similar ser citada por Belli et al. (1991)(25) e Buczkowski et
al. (2007)(16), a forma de anastomose descrita nesse trabalho desenvolveu-se de
51
forma independente, após anos de observações e analogias com as anastomoses
ureterais e coronarianas.
Inicialmente, foi usada em casos com discrepância entre os calibres das vias
biliares do doador e receptor, como alternativa para uma melhor coaptação das
bordas da anastomose. Posteriormente, verificou-se a eficácia da técnica e foi
sistematicamente empregada em todos os casos em que uma anastomose términoterminal fosse possível.
Esta forma de anastomose, espatulando-se a via biliar, pode ser adaptada
de acordo com o seu calibre, realizando-se incisões maiores em vias biliares menos
calibrosas e pequenas incisões em vias biliares mais calibrosas.
O uso da anastomose espatulada tem as vantagem da anastomose láterolateral, sem o risco de ocorrerem “fundos cegos” como descrito por Neuhaus et
al.(121) que poderiam ser causa de complicações, além de ser tecnicamente mais
fácil de ser realizada(16).
Além da técnica de espatular a via biliar, deve-se ter em mente a grande
importância em não lesar os vasos pericoledocianos, pois a irrigação da via biliar
extra-hepática é sensível a isquemia e não tolera manipulação e dissecção
excessivas.
5.4 Do resultado
Sempre que possível, preferiu-se realizar a CCTTesSD, sendo utilizada
HJYR apenas quando a via biliar principal não pode ser utilizada por problemas
técnicos ou doença primária da via biliar como indicação do transplante.
52
As complicações biliares com a anastomose término-terminal espatulada
sem drenagem, descritas nesse estudo, foram inferiores às encontradas na literatura
com a anastomose término-terminal não-espatulada e semelhantes à anastomose
espatulada com drenagem.
Os baixos índices de complicações biliares descritos na literatura com a
CCTTesD foram repetidos utilizando-se a mesma anastomose, porém, sem
drenagem por tubo T. Belli et al. (1991)(25) obtiveram 4% de complicações, sendo um
caso de colangite com abscesso e três casos de complicações relacionadas ao tubo
T, um deslocamento do dreno com fístula, uma obstrução da via biliar pelo ramo
longo do dreno e uma fístula após retirada do dreno.
Buczkowski et al. (2007)(16) apresentaram apenas um caso de estenose na
anastomose biliar, correspondendo a 2,63% de complicações com a CCTTesD. Na
casuística apresentada da CCTTesSD, foram encontrados 3,66% de complicações,
representando 3 casos de estenose anastomótica com tratamentos definidos por
dilatação endoscópica e colocação de prótese na via biliar ou confecção de HJYR.
Essa análise mostra equivalência entre as técnicas, sendo que não houve diferença
estatística entre elas.
Na avaliação da metanálise dos ensaios clínicos (33) que compararam a
CCTTsD x CCTTcD, inicialmente observamos maior risco de complicações biliares
com o uso da anastomose com drenagem. Porém, ao se ponderar a amostra, dando
maior peso aos maiores estudos e aplicar o teste de heterogeneidade, observamos
que apenas o desfecho fístula não anastomótica foi significativo. Esse desfecho
reflete as complicações relacionadas ao ponto de inserção do tubo T.
53
Na avaliação da metanálise dos estudos coorte(33) entre os artigos que
traziam a comparação entre CCTTsD e CCTTcD, também houve mudanças nos
resultados após a ponderação do mesmo modo que nos ensaios clínicos. O cálculo
inicial mostrava melhor resultado para CCTTcD com diferença estatística para o
desfecho fístula anastomótica e melhores resultados para CCTTsD para os
desfechos fístula não-anastomótica e outras complicações. Com a ponderação,
apenas o desfecho fístula não anastomótica continuou significativo, com benefício
para CCTTsD. Quanto ao total de complicações biliares, manteve-se a diferença
estatística com a ponderação, com a CCTTsD apresentando melhores resultados.
Esse resultado coincide com a metanálise dos ensaios clínicos(33),
mostrando que a ausência de drenagem diminui o número de complicações biliares
nas CCTT por não existirem as complicações relacionadas à própria drenagem,
tornando essa diferença significativa.
Quando comparamos a CCTTesSD da casuística apresentada com a
CCTTsD (melhor técnica das metanálises(33)) mantém-se a superioridade da técnica
espatulada, com índices de complicações biliares muito menores que os
apresentados na literatura com diferença estatística significativa.
Os resultados apresentados mostram que a anastomose CCTTsD é a que
possui
menor taxa de complicações biliares após revisão sistemática e
metanálise(33). Entretanto, a CCTTesD apresentada em dois estudos individuais (16,25)
demonstrou melhores resultados que a própria CCTTsD (melhor técnica da
metanálise). Além disso, conseguimos resultados semelhantes (sem diferença
estatística) sem a utilização de drenagem por tubo T, diminuindo o tempo cirúrgico,
proporcionando mais conforto ao paciente e evitando as complicações relacionadas
à
drenagem,
conforme
apresentado
neste
trabalho
com
a
CCTTesSD.
54
6. CONCLUSÃO
A técnica descrita de reconstrução biliar por coledococoledocostomia
término-terminal espatulada sem uso de dreno em T no transplante ortotópico de
fígado é factível e apresenta menor número de complicações biliares quando
comparada às melhores técnicas de reconstrução biliar publicadas na literatura até o
momento.
Não houve diferença estatística em relação ao uso de dreno na anastomose
espatulada.
55
7. ANEXOS
Anexo 1. Dados dos ensaios clínicos utilizados no cálculo da metanálise
(CCTTsD x CCTTcD) em relação às complicações biliares.
Artigos
I/C
FA
(d/n*)
EA
FnA
EnA
Outras
Total de
complicações
Amador 2005(55)
sD
1/27
2/27
0/27
-
0/27
3/27
cD
6/28
0/28
14/28
-
1/28
21/28
sD
0/19
0/19
-
0/19
1/19
1/19
cD
2/18
1/18
-
4/18
2/18
9/18
sD
8/48
8/48
0/48
-
-
16/48
cD
3/50
1/50
1/50
-
-
5/50
sD
3/89
5/89
0/89
-
2/89
10/89
cD
8/110
3/110
10/110
-
5/110
26/110
sD
0/30
5/30
0/30
1/30
0/30
6/30
cD
0/30
1/30
1/30
1/30
2/30
5/30
sD
12/213
(5,63%)
20/213
(9,39%)
0/194
(0%)
1/49
(2,04%)
3/165
(1,82%)
36/213
(16,90%)
cD
19/236 6/236
26/218
5/48
10/186 66/236
(8,05%) (2,54%) (11,93%) (10,42%) (5,58%) (27,97%)
Bawa 1998(56)
Nuno 1997(57)
Ferraz-Neto
1996(58)
Vougas 1996(59)
Total
CCTTsD: Coledococoledocostomia término-terminal sem drenagem; CCTTcD: Coledococoledocostomia término-terminal com
drenagem; I/C: intervenção/controle; sD: sem drenagem; cD: com drenagem; FA: fístula anastomótica; EA: estenose
anastomótica; FnA: fístula não anastomótica; EnA: estenose não anastomótica. (d/n*) = incidência de desfecho/total.
56
Anexo 2. Dados dos estudos coorte utilizados no cálculo da metanálise
(CCTTsD x CCTTcD) em relação às complicações biliares.
Artigos
Wojcicki 2009
(4)
(61)
Li 2007
Lin 2007
(62)
Wojcicki 2006
Abdullah 2005
Kusano 2005
Thethy 2004
(63)
(64)
(66)
(68)
Barkun 2003
(69)
Leonardi 2002
Nemec 2001
Pekolj 2001
(71)
(73)
(74)
Shimoda 2001
Freitas 2000
(75)
(76)
I/C
FA (d/n*)
EA
FnA
EnA
Outras
Total
sD
1/49
2/49
1/49
0/49
2/49
6/49
cD
0/35
3/35
6/35
0/35
2/35
11/35
sD
1/51
3/51
0/51
1/51
1/51
6/51
cD
1/33
5/33
3/33
0/33
1/33
10/33
sD
2/53
5/53
0/53
2/53
0/53
9/53
cD
0/51
2/51
0/51
2/51
1/51
5/51
sD
2/26
3/26
5/26
0/26
0/26
10/26
cD
0/26
0/26
4/26
0/26
0/26
4/26
sD
-
-
-
-
-
18/115
cD
-
-
-
-
-
14/65
sD
4/52
7/52
0/52
0/52
0/52
11/52
cD
2/63
16/63
6/63
0/63
0/63
24/63
sD
12/265
18/265
0/265
1/265
1/265
32/265
cD
4/56
9/56
6/56
1/56
6/56
26/56
sD
-
-
-
-
-
82/254
cD
-
-
-
-
-
1/21
sD
6/100
14/100
4/100
0/100
0/100
24/100
cD
0/15
1/15
4/15
0/15
0/15
5/15
sD
-
-
-
-
-
11/67
cD
-
-
-
-
-
18/34
sD
1/65
2/65
0/65
0/65
1/65
4/65
cD
4/105
10/105
2/105
0/105
1/105
17/105
sD
5/71
6/71
0/71
0/71
0/71
11/71
cD
4/76
5/76
14/76
0/76
0/76
23/76
sD
-
-
-
-
-
10/51
cD
-
-
-
-
-
15/77
57
Leonardi 2000
(77)
Hernandez 1999
Jeffrey 1999
(79)
Rabkin 1998
(41)
Dunham 1997
Kizilisik 1997
Verran 1997
(78)
(82)
(83)
(84)
Koivusalo 1996
Randall 1996
(86)
(87)
Rasmussen 1994
Rouch 1990
Total
(97)
(92)
sD
6/50
8/50
0/50
0/50
2/50
16/50
cD
1/16
1/16
4/16
0/16
1/16
7/16
sD
11/122
6/122
0/122
0/122
0/122
17/122
cD
9/125
3/125
9/125
2/125
0/125
23/125
sD
2/11
3/11
0/11
1/11
0/11
6/11
cD
2/17
2/17
3/17
1/17
0/17
8/17
sD
1/44
10/44
0/44
0/44
0/44
11/44
cD
3/124
7/124
33/124
0/124
0/124
43/124
sD
-
-
-
-
-
12/49
cD
-
-
-
-
-
8/18
sD
1/20
0/20
0/20
0/20
0/20
1/20
cD
0/20
0/20
8/20
0/20
0/20
8/20
sD
5/110
12/110
0/110
0/110
1/110
18/110
cD
1/211
15/211
15/211
0/211
4/211
35/211
sD
2/59
5/59
0/59
0/59
0/59
7/59
cD
1/25
1/25
4/25
0/25
0/25
6/25
sD
0/51
7/51
0/51
0/51
0/51
7/51
cD
4/59
8/59
1/59
0/59
0/59
13/59
sD
-
-
-
-
-
4/38
cD
-
-
-
-
-
47/330
sD
1/38
6/38
0/38
0/38
0/25
7/38
cD
0/25
2/25
5/25
0/25
2/25
9/25
sD
63/1237
(5,09%)
117/1237
(9,46%)
10/1237
(0,81%)
5/1237
(0,40%)
8/1237
(0,65%)
340/1811
(18,77%)
cD
36/1082
(3,33%)
90/1082
(8,32%)
127/1082
(11,74%)
6/1082
(0,56%)
18/1082
(1,66%)
380/1627
(23,36%)
CCTTsD: Coledococoledocostomia término-terminal sem drenagem; CCTTcD: Coledococoledocostomia término-terminal com
drenagem; I/C: intervenção/controle; sD: sem drenagem; cD: com drenagem; FA: fístula anastomótica; EA: estenose anastomótica;
FnA: fístula não anastomótica; EnA: estenose não anastomótica. (d/n*) = incidência de desfecho/total.
58
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73
RESUMO
Paes Barbosa, Fábio Colagrossi. Análise dos resultados da anastomose biliar
colédoco-colédoco término-terminal espatulada em transplante de fígado. Tese
(Doutorado); 2012.
As complicações biliares permanecem uma importante causa de morbidade
e mortalidade no transplante de fígado. A reconstrução biliar término-terminal é a
mais utilizada na literatura, com taxas de complicações de cerca de 20% nas
melhores casuísticas. Uma modificação técnica, “espatulando” a via biliar foi relatada
com melhores resultados, porém, utilizando-se um tubo T para drenagem
rotineiramente. O objetivo do estudo é avaliar os resultados da anastomose
CCTTesSD (inédita na literatura), em relação às complicações biliares e comparar
com os melhores resultados publicados. Foram analisados os dados dos pacientes
transplantados na Santa Casa de São Paulo de 1º de dezembro de 2004 a 31 de
agosto de 2012. A incidência de complicações biliares foi analisada nos pacientes
submetidos a CCTTesSD. Esse resultado foi comparado com os únicos artigos da
literatura que utilizaram a anastomose espatulada (porém ambos com tubo T). O
resultado também foi comparado com a melhor técnica de anastomose biliar descrita
em metanálise realizada previamente para este fim, a CCTTsD. Foram incluídos 82
casos de CCTTesSD. A taxa de complicações biliares foi de 3,66%, não havendo
diferença estatística com a técnica espatulada com drenagem (p=0,9290). Ao
comparar-se os resultados com a melhor técnica de reconstrução biliar da
metanálise (CCTTsD), houve diferença significativa, com melhores resultados para
CCTTesSD (p=0,0021). A técnica descrita de CCTTesSD no transplante de fígado é
factível e apresenta menor número de complicações biliares quando comparada com
as melhores técnicas de reconstrução biliar publicadas na literatura até o momento,
não havendo diferença estatística em relação ao uso de dreno na anastomose
espatulada.
Palavras-chave: transplante de fígado; anastomose cirúrgica; procedimento
cirúrgico do sistema biliar; complicações pós-operatórias.
74
ABSTRACT
Paes
Barbosa,
Fábio
Colagrossi.
Analysis
of
spatulated
end-to-end
choledococholedocostomy without drainage in liver transplantation. Thesis
(Ph.D.), 2012.
Biliary complications remain an important cause of morbidity and mortality in
liver transplantation. End-to-end biliary reconstruction is the most used technique
according to the literature, with almost 20% complication in best rates described. A
technical modification, “espatulated” biliary duct, was described with better results,
using T tube for drainage routinely. The aim of the study was to evaluate the results
of spatulated end-to-end choledococholedocostomy without drainage (SEECCwD)
related to biliary complications, and to compare with the best published results. Data
of the patients submitted to liver transplantation at Santa Casa de São Paulo from
December 1st 2004 to August 31st 2012 were analyzed. The incidence of biliary
complications was analyzed in patients submitted to the SEECCwD. The results were
compared with two articles in the literature that used the spatulated anastomosis
(both with T tube). The results were also compared to the best biliary anastomosis
technique described in a meta-analysis previously performed for this purpose, the
end-to-end choledococholedocostomy without drainage (EECCwD). Eighty two cases
of SEECCwD were included. The complication rate was 3.66% and there was no
statistical difference with the spatulated drainage technique (p=0.9290). Comparing
the results with the best biliary reconstruction technique of the meta-analysis
(EECCwD), there was a significant difference with better results to SEECCwD
(p=0.0021). The described SEECCwD technique for liver transplantation is feasible
and presents fewer biliary complications when compared to the best techniques for
biliary reconstruction published in the literature until the present time, with no
statistical difference compared to the use of the drainage in spatulated anastomosis.
Keywords: liver
transplantation; anastomosis,
procedures; postoperative complications.
surgical;
biliary
tract
surgical
75
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Análise dos resultados da anastomose biliar colédoco