Pró-Reitoria de Graduação
Curso de Psicologia
Trabalho de Conclusão de Curso
O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DO
PROFESSOR NO BRASIL: UM ESTUDO À LUZ DA TEORIA DA
IDENTIDADE SOCIAL DE TAJFEL
Autor: Elisete de Queiroz Oliveira
Orientador: MSc Alexandre Cavalcanti Galvão
Brasília - DF
2013
ELISETE DE QUEIROZ OLIVEIRA
O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DO PROFESSOR NO BRASIL:
UM ESTUDO À LUZ DA TEORIA DA IDENTIDADE SOCIAL DE TAJFEL
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao curso de graduação em Psicologia da
Universidade Católica de Brasília, como
requisito parcial para a obtenção do Título de
Psicólogo.
Orientador: MSc Alexandre Cavalcanti Galvão
Brasília
2013
Trabalho de Conclusão de Curso de autoria de Elisete de Queiroz Oliveira, intitulado
“O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DO PROFESSOR NO BRASIL: UM
ESTUDO À LUZ DA TEORIA DA IDENTIDADE SOCIAL DE TAJFEL” apresentado
como requisito parcial para obtenção do grau de Psicólogo da Universidade Católica de
Brasília, em junho de dois mil e treze, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo
assinada:
_________________________________________________
Prof. MSc Alexandre Cavalcanti Galvão
Orientador
Psicologia – UCB
_________________________________________________
Profa. Dra Silvia Renata Magalhães Lordello Borba Santos
Psicologia – UCB
BRASÍLIA
2013
Dedico este trabalho aos meus pais, que
sempre me presentearam com o seu respeito,
carinho, dedicação e, principalmente, por me
ensinarem a arte de amar.
Dedico, ainda, aos meus filhos, Cairo José e
Victor José, que se fazem presentes em minha
vida de forma especial, compreendendo,
aceitando e auxiliando-me em momentos
cruciais, quando me presenteiam com seus
olhares, sorrisos, carinho e amor.
Em especial, ao meu amado esposo, pela
cumplicidade, parcimônia, carinho e dedicação
ao longo deste percurso.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, por estar presente em todos os momentos de minha vida,
auxiliando-me, consolando-me e nutrindo-me de esperanças para continuar a caminhada.
Aos meus irmãos Alisson, Evandra, Lincon e Mouzartt, por estarem sempre presentes
em diversos momentos de minha vida.
Às minhas cunhadas Gláucia Cristina, Jaquelline e Marisa, e ao meu cunhado
Marcelo, pelo constante incentivo ao longo desse percurso.
À minha amiga e comadre Márcia Cristina, que ao longo de quase três décadas tem me
presenteado com sua amizade, carinho e compreensão.
À minha amiga Mônica, que com todo o seu carinho, afeto e dedicação, mostrou-me
que ainda existem pessoas genuínas e capazes de se doar a outrem.
Às amigas Francielle e Natália, companheiras de graduação, com quem muito aprendi
e que me fizeram perceber que é possível viver de forma intensa, porém com leveza.
A Josefa (in memoriam), amiga, com quem tive o prazer de compartilhar momentos
inesquecíveis.
Aos meus sobrinhos Bryan, Matheus, José Carlos, Guilherme, Júlia, Luís Eduardo e
Daniele, que me presenteiam a cada dia com seus sorrisos e olhares, como a me iluminar o
caminho.
A José Vaz e Iracema, pelo amor e carinho a mim dispensados.
A Tálita, com quem pude aprender a partilhar e a chorar, sem medo de ser julgada.
Aos pacientes do Centro de Formação de Psicologia Aplicada – CEFPA e do Centro
de Atenção Psicossocial – CAPS II, com quem pude aprender a arte de ver além do visível.
Ao meu mestre Alexandre, que com carinho, dedicação, parcimônia e sabedoria, soube
fazer brotar em mim a importância de olhar o outro de forma despretensiosa, mas cuidadosa e
afetuosa. Àquele, que em momentos de dúvida e incerteza, esteve presente estimulando-me,
apoiando-me e, acima de tudo, compartilhando o seu carinho e dedicação para com o outro.
À professora Doutora Silvia Lordello, sempre solícita e atenciosa, por compartilhar
seu precioso tempo, dispondo-se à leitura desta pesquisa e a integrar a banca examinadora que
irá avaliá-la.
À professora Doutora Claudia Fukuda, por permitir que eu integrasse o grupo de
colaboradores de sua pesquisa, condição esta que muito colaborou no meu processo de
formação profissional.
À professora Mestre Maristela Gusmão, por despertar em mim a importância da
pesquisa científica para a formação do profissional de Psicologia.
Natural
é
interpretar
a
realidade.
Extraordinário é formular métodos para
transformá-la. Natural é ter consciência
social. Extraordinário é desenvolver a
consciência política. Natural é cooperar em
todos os sentidos. Extraordinário é forjar e
desenvolver novos seres humanos. Natural é
fazer pressão. Extraordinário é criar
referências permanentes no tempo e no
espaço. Natural é a convivência social.
Extraordinário é desenvolver valores. Natural
é alfabetizar. Extraordinário é educar
transformando. Natural é tomar decisões.
Extraordinário é implementar princípios que
dão sustentação às decisões. Natural é criar
instâncias e fazer parte delas. Extraordinário
é exercer direção coletiva. Natural é formular
normas para manter a ordem. Extraordinário
é a disciplina consciente. Natural é apegar-se
a ídolos. Extraordinário é constituir símbolos
e desenvolver a mística.
Ademar Bogo
RESUMO
Referência: OLIVEIRA, Elisete de Queiroz. O processo de construção identitária do professor
no Brasil: um estudo à luz da Teoria da Identidade Social de Tajfel. 2013. 56 folhas.
Monografia do Curso de Psicologia da Universidade Católica de Brasília – UCB, Brasília,
2013.
O tema identidade social do professor assume considerável significação, pois está inserido em
uma discussão muito mais ampla, complexa e presente nos nossos dias, mas que está ainda
por merecer dos autos escalões do governo e da sociedade de modo geral a importância
devida. O papel do professor na edificação da sociedade é extremamente importante
considerando ser ele um agente dessa expectativa transformadora que se deseja para os
indivíduos. A presente pesquisa busca efetuar uma análise histórico-social do papel do
professor na sociedade brasileira e tecer algumas considerações que expliquem os inúmeros e
recentes relatos dando conta do desprestígio da categoria perante a comunidade, do
desrespeito com que seus integrantes são tratados por alunos e seus pais, e do risco imposto à
atividade nos dias atuais. Nesse sentido, foram efetuadas entrevistas semiestruturadas com
oito docentes de instituições de ensino público, do nível fundamental II, em duas Regiões
Administrativas do Distrito Federal. Os relatos foram estudados por análise de conteúdo
temática, apresentando quatro grandes temas: o exercício da docência, a violência escolar, as
relações do professor e o adoecimento profissional. Para compreender a identidade
profissional dos docentes, utilizou-se como subsídios os pressupostos da Teoria da Identidade
Social de Tajfel. O exercício da docência no Brasil sempre foi marcado por inúmeros
desafios. A perda de status social, a sobrecarga de trabalho e a violência são apenas alguns
desses desafios. Compreender a integralidade dos inúmeros fenômenos que rodeiam a escola e
que influem sobremaneira no exercício da profissão é imprescindível. A transformação social
– e pessoal - exige constante conhecimento, profunda reflexão e firmeza de propósito. Antigos
paradigmas talvez devam ser repensados e adaptados a uma sociedade em constante
transformação, que está a exigir novas metodologias, diferentes práticas e agentes cada vez
mais capacitados a enfrentar as inúmeras e diversificadas realidades.
Palavras-chave: Identidade social, Teoria da Identidade Social, docente, violência escolar.
ABSTRACT
Reference: OLIVEIRA, Elisete de Queiroz. The process of identity construction of the teacher
in Brazil: a study based on the Tajfel’s Social Identity Theory. In: 2013. 56 sheets.
Monograph Psychology Course at the Catholic University of Brasília – UCB, Brasília, 2013.
The teacher's social identity has relevant meaning as part of a bigger, actual and complex
discussion, but it's importance still needs to be recognized by the government and society in
general. The teacher's figure in building society is extremely important considering that a
teacher represent one of the agents of this transforming expectation wanted for individuals.
The purpose of this study is to make a historical-social analysis about teacher's figure in
Brazilian society and build some considerations that explains the big number and actual
narratives about the disqualification of the professional status in the community, the
disrespectful way that they are treated by students and their parents, and the risk that the
profession offers to them. This way, half-structured interviews were made with eight teachers
from public education institutions, from primary school II, in two Administrative Regions of
Distrito Federal. The narratives were analyzed based on thematic contents, presenting four big
themes: teaching, school violence, teacher's relationships and professional illness. The
comprehension of teacher's professional identity was sought based on the Tajfel's Social
Identity Theory. Being a teacher in Brazil has always been a challenge. Losing social status,
the overloading of work and violence are only some of these challenges. It is really necessary
to comprehend the big number of phenomena that are part o school and influence teaching
profession directly. The social and personal transformations require constant knowledge, deep
reflexion and steady purposes. Old paradigms maybe should be reconsidered and adapted for
a society that is in constant transformation, and needs new methods, different practical and
more capable agents ready to face lots and different realities.
Key-words: Social Identity, Social Identity Theory, teacher, school violence.
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 – Temas das Entrevistas .................................................................................... 35
TABELA 2 – O exercício da docência .................................................................................. 36
TABELA 3 – As relações do Professor ................................................................................. 39
TABELA 4 – A violência escolar ........................................................................................... 44
TABELA 5 – Adoecimento profissional ............................................................................... 46
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 11
2
OS PRIMÓRDIOS DA EDUCAÇÃO ........................................................................... 14
2.1 PORTUGAL E AS REFORMAS POMBALINAS........................................................... 15
3
O DOCENTE NO BRASIL ............................................................................................ 18
3.1 PERÍODOS E ASPECTOS DA FORMAÇÃO DO DOCENTE NO BRASIL ................ 18
3.1.1 Período: 1827 a 1890 ................................................................................................... 18
3.1.2 Período: 1890 a 1932 ................................................................................................... 19
3.1.3 Período: 1932 a 1939 ................................................................................................... 19
3.1.4 Período: 1939 a 1971 ................................................................................................... 20
3.1.5 Período: 1971 a 1996 ................................................................................................... 20
3.1.6 Período: 1996 a 2006 ................................................................................................... 21
3.2 ENQUADRAMENTO E CONTROLE POLÍTICO PELO ESTADO .............................. 21
4
IDENTIDADE SOCIAL DO PROFESSOR ................................................................. 24
4.1 TEORIA DA IDENTIDADE SOCIAL ............................................................................. 25
4.1.1 A Universidade de Bristol e a Teoria da Identidade Social de Tajfel .................... 26
5
VIOLÊNCIA NAS ESCOLAS ....................................................................................... 30
6
MÉTODO......................................................................................................................... 32
7
RESULTADOS E DISCUSSÃO .................................................................................... 35
8
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 48
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 52
APÊNDICES ........................................................................................................................... 54
APÊNDICE A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) ......................... 54
APÊNDICE B – Roteiro de entrevista semiestruturada ..................................................... 55
11
1
INTRODUÇÃO
Em “A Educação ou a utopia necessária”, prefácio à edição brasileira do Relatório
para a UNESCO da Comissão Internacional sobre a Educação para o Século XXI, Jacques
Delors, Presidente da aludida Comissão, afirma ser a educação o trunfo indispensável à
humanidade na construção de ideais da paz, da liberdade e da justiça social. Notadamente em
um mundo globalizado, e por isso não menos imprevisível, a educação deve promover o
desenvolvimento contínuo do ser humano e das sociedades, “[...] de modo a contribuir para a
diminuição da pobreza, da exclusão social, das incompreensões, das opressões, das guerras...”
(2010, p. 5).
Tal afirmação demonstra, com propriedade, a importância da educação no processo de
construção da sociedade humana e, mais ainda, o quanto o tema deveria integrar uma pauta
permanente nas agendas dos governos contemporâneos.
Como bem ilustrou Cardoso (2010, p. 56), “a história do ensino coincide com a
história da humanidade e permanece como um aspecto cada vez mais discutido do processo
de construção das sociedades humanas”.
A proposta desse trabalho guarda estreita ligação com a perspectiva educacional que
tem na cidadania a sua premissa maior e que objetiva interferir no processo de construção do
ser humano de forma a edificar uma sociedade justa, onde prevaleça a democracia, o respeito
aos direitos humanos e a convivência pacífica com as diferenças.
O docente está inserido neste dialético processo ao mesmo tempo como autor e objeto
dessa construção. Teve sua identidade social aperfeiçoada em face de uma histórica relação
mantida com os vários integrantes do governo, da sociedade civil e, mais presentemente, com
os vários atores do contexto educacional.
A presente pesquisa pretende identificar o processo de construção histórica da
identidade social do professor e está integrada à pesquisa “Desmascarando o preconceito: a
descrição comportamental e o estudo das vivências de estigmatização, discriminação e
preconceito em escolas do DF”, sob orientação da Professora Doutora Claudia Cristina
Fukuda.
Na mídia, os professores propagam que são desvalorizados e que perderam o status
social tanto quanto o respeito e reconhecimento dos seus alunos. Dessa forma procura-se
identificar em que momento essa mudança ocorreu e quais os contextos socioeconômicos e
culturais que influenciaram essa possível mudança na identidade social do docente.
12
A problemática a ser enfrentada consiste em avaliar qual a relação entre a identidade
social e o status desfrutado pelo professor ao longo da história.
A pesquisa tem por objetivo geral examinar o processo de construção da identidade
social do docente. E os objetivos específicos são:

identificar os elementos positivos e negativos dessa identidade social;

averiguar a qualidade das relações intergrupais com os demais atores do ambiente
escolar; e

examinar a influência da violência escolar na identidade social do docente.
A motivação para a realização deste trabalho adveio da constatação da recorrência de
relatos dando conta do caráter recente do desprestigio sócio-profissional usufruído pela
categoria, a comprovar o relativo desconhecimento da historicidade do evento e a inibir, em
face de uma compreensão apenas parcial do fenômeno, a elaboração de estratégias de
enfrentamento dos novos desafios oferecidos por um mundo em constante e aceleradas
transformações.
Investigar a identidade social de um grupo é dar-lhe objetividade e significância nas
relações intergrupais. Assim, pensar na identidade do professor é refletir sobre seus espaços
de convivência e suas comparações intergrupais.
Para concretizar o objetivo, foi o trabalho dividido em 4 capítulos: o primeiro, de
forma panorâmica, abordará a educação desde os seus primórdios, uma educação voltada
basicamente à sobrevivência grupal, o histórico do processo de monopolização e controle da
educação pela Igreja e posteriormente pelo Estado.
O capítulo segundo especificará a questão da historicidade da formação do
profissional docente no Brasil, além de aspectos como o enquadramento e o controle político
da categoria perpetrada pelo Estado Brasileiro.
No capítulo seguinte será dada ênfase ao processo de construção da identidade social
do professor. Para tanto serão buscados subsídios na teoria da identidade social de Tajfel.
O quarto e último capítulo comportará a análise dos dados coletados em entrevistas
realizadas com um total de oito professores da rede pública de ensino do Distrito Federal.
Por ter como objetivo a compreensão de um fenômeno social, foi utilizada a
metodologia qualitativa de pesquisa, considerando-se a conveniência e mesmo a necessidade
de envolvimento do entrevistador e a troca de experiências e percepções com os docentes.
As entrevistas foram realizadas por quatro estudantes do curso de Psicologia da
Universidade Católica de Brasília – UCB com oito docentes de duas instituições públicas de
ensino.
13
O tipo de exploração pretendida exigiu a utilização de um roteiro de entrevistas
semiestruturadas. As entrevistas foram gravadas em áudio e posteriormente transcritas. Os
dados extraídos foram analisados com subsídio no Método de Análise de Conteúdo Temática
de Bardin (2011), e as conclusões foram alcançadas com o auxílio da Teoria da Identidade
Social de Tajfel (1991).
14
2
OS PRIMÓRDIOS DA EDUCAÇÃO
Nas sociedades primitivas, cujo espaço de coexistência se caracterizava como grande
desafio à sobrevivência da espécie, a educação dos indivíduos era voltada especificamente
para a assimilação de experiências que melhor preparasse para o enfrentamento daquele
ambiente hostil. Sendo a sobrevivência uma questão grupal, a educação dos indivíduos
encontrava-se primordialmente centrada na família, todavia era merecedora da atenção de
todos os membros da tribo.
Segundo leciona o professor Aziz NacibAb`Sáber (2012):
Existe uma unanimidade entre os antropólogos sobre o caráter rotineiro da
transmissão dos conhecimentos para as crianças, desde tenra idade. Em uma
convivência prazerosa e brincalhona aprende-se um pouco de tudo, a partir dos mais
experientes. Valores tribais ancestrais, valores de uma tecnologia singela. Um
processo educacional feito na gruta ou na oca, mas preferencialmente na clareira do
terreno comunitário, na participação de eventos festivos, à beira do rio ou na ponta
de praias, durante o banho. Crianças sorridentes, treinando o lançamento de flechas,
esperando o seu dia de acompanhar os adultos nas trilhas pelas matas, territórios de
caça e coleta. Conseguindo-se assim um conhecimento global de valores e
princípios, destacados de imensa e inimitável originalidade, em uma longa época em
que somente existia a oralidade, sem os impactos da linguagem escrita,
conseqüência inusitada dos contatos entre grupos humanos para troca de alimentos,
mercadorias e utensílios típicos de cada comunidade pré-histórica – fato que
justificou a origem primeva de aldeias e pequenas cidades onde se realizava o
escambo tradicional de homens procedentes de habitats diferentes (Karl Marx).
A fixação do homem à terra, a formação das chamadas sociedades civilizadas e o
gradativo aumento da complexidade do seu modo de vida deflagraram consideráveis
transformações na forma de aprender e ensinar. O surgimento de classes sociais promoveu
uma “apropriação” do saber técnico e continuou excluindo da grande maioria da população
todo e qualquer conhecimento que não o experimentado e produzido no dia-a-dia daquelas
comunidades agrárias ou pastoreiras. O acesso ao saber técnico estava limitado aos
integrantes de ordens religiosas e aos detentores de poder político e econômico.
Na Europa Ocidental, a educação estava sob controle da Igreja Católica, que, por
séculos, exerceu o monopólio da tal atividade, transformando as unidades religiosas em
espécies de “cúpulas do saber”. Ao homem comum disponibilizou uma educação destinada
puramente à salvação religiosa. Segundo Foulquié (1957, apud BARBOSA, 2007), durante
uma quinzena de séculos a Igreja foi a única educadora do Ocidente, responsável pela
formação da juventude daquela parte do continente Europeu.
Conforme retrata Miguel (2005), as primeiras instituições responsáveis pela
transmissão de conhecimentos, entre os séculos VI e XIII, foram as escolas episcopais e
15
monacais. Congregavam desde os estudos elementares, como leitura, escrita e aritmética, até
os mais especializados, como Teologia, Medicina e Direito. Os cursos, gratuitos, eram
inicialmente destinados à formação de bispos e monges que pretendiam seguir na carreira
sacerdotal. Aos poucos, todavia, foram sendo estendidos a nobres e plebeus. A educação
passava a ser vista como meio de ascensão social.
O monopólio espiritual e educacional da Igreja Católica sobre a sociedade europeia
não foi exercido sem questionamentos. Exemplo disso foi o surgimento na Europa Central, no
início do século XV, de um movimento liderado pelo monge de origem alemã de nome
Martinho Lutero, em reação às doutrinas e práticas do catolicismo romano.
O grande abalo sofrido pela educação promovida nos moldes da Igreja Católica,
todavia, ocorreu com o evento que foi chamado mais tarde de Iluminismo1, movimento que
passou a exigir e, afirmam alguns estudiosos, inaugurou mesmo a popularização do ensino
técnico naquele continente.
2.1 PORTUGAL E AS REFORMAS POMBALINAS
Segundo Mendonça (2005), Portugal foi o precursor no que tange à educação pública e
gratuita. Para a nominada autora, tal pioneirismo em relação aos países ocidentais está
demonstrado por vários estudos de historiadores da educação.
Os marcos de tal pioneirismo foram as Reformas Pombalinas, de 1759 e de 1772,
assim como a Reforma da Universidade de Coimbra, também de 1772, que instituíram, no
reino português e em seus domínios ultramarinos, as bases para um sistema de ensino oficial,
laico, com aulas ministradas pelos intitulados professores régios, que substituíram os
Jesuítas2, expulsos de Portugal e de suas colônias em 1759.
Para Falcon (1982 apud MENDONÇA, 2005), o Estado absolutista português
promoveu intenso combate à Companhia de Jesus tendo por objetivo minar a sua influência
sobre a vida dos portugueses, assim como quebrar a hegemonia da Igreja Católica naquele
reino e eliminar todas as formas de oposição ao Poder Central. A modernização
administrativa, principalmente da educação, foi o alvo maior dessa reforma.
________________
1
Movimento surgido na França do século XVII que defendia a prevalência da razão sobre a visão teocêntrica,
que predominava na Europa desde a Idade Média. Os pensadores que defendiam estes ideais acreditavam que o
pensamento racional deveria ser levado adiante substituindo as crenças religiosas e o misticismo, que, segundo
eles, bloqueavam a evolução do homem. O homem deveria ser o centro e passar a buscar respostas para as
questões que, até então, eram justificadas somente pela fé.
2
Nome dado aos membros da Ordem da Companhia de Jesus, congregação religiosa fundada em 1534 por um
grupo de estudantes da Universidade de Paris, liderados por aquele que mais tarde seria conhecido como Inácio
de Loyola. A Congregação foi reconhecida por bula papal em 1540. A Congregação foi fundada no contexto da
Reforma Católica, mais conhecida como Contrareforma, reação da Igreja Católica ao movimento reformista
liderado por Martinho Lutero.
16
Tais reformas abrangeram todo o percurso acadêmico, desde o ensino das chamadas
primeiras letras até a universidade, além de instituir ramos específicos para a educação dos
nobres e para o ensino técnico e industrial, Nóvoa (1987 apud MENDONÇA, 2005). Ao
Estado coube garantir: a educação gratuita, o estabelecimento de diretrizes de ensino, a
escolha dos professores por concurso, bem como a fiscalização, o pagamento e a
subordinação dos docentes à política centralizadora do governo centralizado (CARDOSO,
2010). Por outro lado, estavam lançados os alicerces para uma progressiva profissionalização
dos professores, que, naquele momento, ainda não constituíam o que se poderia chamar de
uma categoria profissional.
Ainda segundo Falcon (1982 apud MENDONÇA, 2005), as reformas pombalinas,
certa expressão do Iluminismo em Portugal, contrastaram com os propósitos de manutenção
do Poder Absolutista, que passou a controlar inteiramente os passos da reforma, “[...] desde o
que devia ser lido, como se devia ensinar, proibindo qualquer iniciativa individual dos agentes
desse processo, a menos que fosse solicitado pelo próprio rei”.
O Alvará Régio de 28 de junho de 1759 criou as aulas régias de gramática latina,
retórica e grego, e a Lei de 6 de novembro de 1772 criou as aulas régias de leitura, escrita e
cálculo, além das cadeiras de filosofia (MENDONÇA, 2005). O concurso público, exigência
para professores régios e particulares, limitava o exercício da profissão aos autorizados pelo
Estado, como o era anteriormente pela elite religiosa.
O modelo jesuítico de organização das unidades de ensino foi substituído pelo modelo
das aulas avulsas, gerando o que se chamou de fragmentação dos estudos. Cardoso (2010)
afirma que os Estudos Menores contemplavam as aulas de humanidades: gramatica latina,
língua grega, língua hebraica, retórica e poética, cadeiras com o tempo acrescidas de outras; e
as aulas de Primeiras Letras ou Estudos Maiores, oferecidos pela Universidade de Coimbra, às
quais os estudantes apenas estavam habilitados após a conclusão dos Estudos Menores. Na
perspectiva de Rabelo (2012), a educação foi, durante longo período, uma função estritamente
masculina - exercida por religiosos e tutores (professores contratados por famílias abastadas) e ministrada igualmente apenas para indivíduos daquele sexo. Com o final da Revolução
Francesa (1789 - 1799) a mulher é chamada a assumir o seu “papel social” na educação dos
filhos, Freitas (2000 apud RABELO, p. 6168). Tal inclusão, todavia, não representou uma
quebra do paradigma cultural que conferia à mulher uma condição de subordinação social.
Pedagogos e estudiosos do ato pedagógico, no final do século XIX, autores de
manuais adotados como verdadeiras “bíblias” nas escolas de formação de professores,
enumeraram uma série de características indispensáveis a um bom professor: amor, caráter,
17
bondade, vida pura, vida social, paciência, pureza de costumes, piedade cristã, polidez,
prudência, vocação, afeição pelas crianças, firmeza, pontualidade e zelo, dentre outras
(TAMBARA, 2008).
Detentora de várias dessas qualidades, à mulher foi atribuída, prioritariamente, a
função de educadora de crianças. Dessa forma, conseguia-se aliar interesses políticos – como
o pagamento de baixos salários, sob o argumento de que a mulher não tinha por
responsabilidade o sustento da família – e interesses sociais, como o controle da sexualidade
feminina, impedindo-a da convivência com o sexo oposto. Além disso, o exercício do
magistério pela mulher impunha uma série de condições diferenciadas que atestassem ainda
mais a sua ética e bons costumes, conforme retrata Rabelo (2012, p. 6171):
[...] certidão de casamento, se casada; certidão de óbito do cônjuge, se viúva;
sentença de separação, para se avaliar o motivo que gerou a separação, no caso de
mulher separada; vestuário ‘decente’. A mulher só poderia exercer o magistério
público com 25 anos, salvo se ensinasse na casa dos pais e estes forem(sic)de
reconhecida moralidade. Ou seja, todos poderiam realizar o curso de formação a
partir dos 18 anos, mas havia uma diferenciação na hora de entrar no mercado de
trabalho.
Somente no final do século XIX, mais precisamente no fim da Revolução Francesa,
com o surgimento de maiores demandas acerca da instrução popular, é que uma resposta
institucional à questão da formação dos docentes virou realidade. Surgem aí as escolas
normais: Paris, em 1795; Pisa, em 1802, além de Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos.
[...] nesta época se passou a ter uma referência mais sólida dos mecanismos que
eram necessários para formatar um indivíduo no sentido de transformá-lo em
professor. E, sob certo prisma, fugir das decisões empiristas que enxergavam em
qualquer sujeito, com certa ou presumível ilustração, a capacitação para ensinar.
(TAMBARA, 2012, p.2)
18
3
O DOCENTE NO BRASIL
No Brasil, que reproduziu a concepção europeia das chamadas “escolas normais”, as
primeiras instituições de ensino voltadas para a formação docente datam de 1835, no Rio de
Janeiro (Niterói); 1836, na Bahia; 1842, no Mato Grosso; 1846, em São Paulo; 1864, no
Piauí; 1869, no Rio Grande do Sul; 1870, no Paraná e Sergipe; 1873, no Espírito Santo e Rio
Grande do Norte; 1879, na Paraíba; 1880, no Rio de Janeiro (DF) e Santa Catarina; 1884, no
Goiás; 1885, no Ceará; e 1890, no Maranhão.
3.1 PERÍODOS E ASPECTOS DA FORMAÇÃO DO DOCENTE NO BRASIL
O “processo de cientifização do ato pedagógico”, na expressão empregada por
Tambara (2012), não se deu sem idas e vindas.
Ao periodizar a trajetória histórica da formação de professores no Brasil, Saviani
(2009, p. 143/144) assim descreve:
3.1.1 Período: 1827 a 1890
Período cujo marco inicial se dá com a promulgação da Lei das Escolas de Primeiras
Letras, em 15 de outubro de 1827 e que Saviani chamou de “Ensaios intermitentes de
formação de professores”.
O ensino nas Escolas de primeiras letras deveria seguir o que foi chamado de “método
mútuo”, no qual os professores eram treinados às próprias expensas, nas capitais das
respectivas províncias.
Com o Ato Adicional de 1834 as províncias passaram a ser responsáveis pela
instrução primária, adotando então o modelo de formação de professores utilizado nos países
europeus: as escolas normais.
Nesse período, as escolas normais fundadas no Brasil tiveram um funcionamento
marcado por interrupções, notadamente por sua concepção pedagógico-didática, que as
fizeram inicialmente muito contestadas, e por conta dos intentos políticos dos mandatários das
províncias.
19
3.1.2 Período: 1890 a 1932
É o período no qual se sucedeu o estabelecimento e expansão do padrão das escolas
normais. A partir de 1890, com a reforma da instrução pública do Estado de São Paulo, mais
tarde seguido por outros Estados, impôs-se às escolas normais uma organização curricular e
um padrão de funcionamento, com a utilização, inclusive, de uma Escola-Modelo, anexa à
Escola Normal. O padrão proposto primava pelo enriquecimento dos conteúdos curriculares
anteriores, além de dar ênfase aos exercícios práticos de ensino, entendendo assim que
organização curricular e preparação pedagógico-didática eram imprescindíveis à formação de
professores.
3.1.3 Período: 1932 a 1939
Período que Saviani (2009) considerou como de organização dos institutos de
educação, idealizados e constituídos de maneira a incorporar os requisitos da Pedagogia - que
buscava reconhecimento científico – e visando a hegemonia do modelo pedagógico-didático
na formação dos docentes.
Inspirados na Escola Nova3, Anísio Teixeira4 e Fernando de Azevedo5 fundaram,
respectivamente, o Instituto de Educação do Distrito Federal, no Rio de Janeiro, em 1932, e o
Instituto de Educação de São Paulo, em 1933, espaços concebidos para o ensino e para a
pesquisa.
Imprimiu-se uma nova configuração à escola-normal, incorporada a tais institutos
como escola de professores, com conteúdo bastante diversificado que incluía matérias como
biologia educacional, sociologia educacional, psicologia educacional, história da educação e
introdução ao ensino (princípios e técnicas; matérias como cálculo, leitura e linguagem,
literatura infantil, estudos sociais e ciências naturais; e práticas de ensino, desenvolvida em
uma estrutura de apoio que contemplava o jardim de infância, escola primária e escola
secundária). Referidos institutos dispunham ainda de espaço para pesquisas educacionais,
biblioteca central de educação, biblioteca escolar, filmoteca, museu escolar e radiodifusão.
___________________
3
Um dos nomes dados a um movimento de renovação do ensino que foi especialmente forte na Europa, na
América e no Brasil, na primeira metade do século XX . "Escola Ativa" ou "Escola Progressiva" são termos mais
apropriados para descrever esse movimento.
4
Jurista, intelectual, educador e escritor brasileiro. Personagem central na história da educação no Brasil, nas
décadas de 1920 e 1930. Difundiu os pressupostos do movimento da Escola Nova, que tinha como princípio a
ênfase no desenvolvimento do intelecto e na capacidade de julgamento, em preferência à memorização.
5
Professor, educador, crítico, ensaísta e sociólogo brasileiro.
20
3.1.4 Período: 1939 a 1971
Período em que ocorreu a organização e implantação dos cursos de pedagogia e de
licenciatura, além da consolidação do padrão das Escolas Normais. Nesse período, a partir do
Decreto-lei nº 1.190, de 4 de abril de 1939, foram organizados os cursos de formação de
professores para as escolas secundárias para todo o país, o que culminou na organização
definitiva da Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil. Os cursos de
formação duravam quatro anos, sendo três deles para disciplinas específicas e um ano para
formação didática.
Em relação ao ensino normal, Saviani (2009) relata que, com o Decreto-lei nº 8.530,
de 2 de janeiro de 1946 (Lei Orgânica do Ensino Normal), o curso normal passou a ser
dividido em dois ciclos: o primeiro, com duração de quatro anos, correspondendo ao ciclo
ginasial do curso secundário, que visava formar os professores do ensino primário, e que
funcionava em escolas normais e nos institutos de educação; e o segundo, que abordava todos
os fundamentos da educação ocorridos com as reformas da década de 1930.
3.1.5 Período: 1971 a 1996
Período marcado pela substituição da Escola Normal pela habilitação específica do
Magistério. Com o Golpe Militar de 1964, ocorreram mudanças na legislação do ensino: a Lei
nº 5.692, de 1971, alterou a denominação dos ensinos primário e médio para Primeiro Grau e
Segundo Grau, respectivamente. Sendo assim, as Escolas Normais desapareceram. Nesse
período, em face do Parecer nº 349, de 1972, instituiu-se a habilitação específica do
magistério, sendo organizada em duas modalidades básicas: uma, com duração de três anos e
contando 2.200 horas, que habilitaria o educador a lecionar até a quarta série; e outra, com
duração de quatro anos e contando 2.900 horas, que habilitaria o professor a lecionar até a
sexta série do Primeiro Grau.
Em relação às quatro últimas séries do ensino do 1º grau e ao 2º grau a citada Lei
previa a formação de professores em nível superior, possibilitando cursos de licenciatura curta
(3 anos) ou plena (4 anos). No tocante ao curso de Pedagogia, conferiu-se a competência de
formar professores para habilitação específica de magistério (HEM) e de formar especialistas
em educação que compreendia os diretores da escola, orientadores educacionais, supervisores
escolares e inspetores de ensino.
21
Concomitantemente ao ordenamento legal, em relação à formação de professores
ocorreu um movimento “amplo” que reivindicava a reformulação dos cursos de pedagogia e
licenciatura, adotando o princípio da “docência como a base da identidade profissional de
todos os profissionais da educação” Silva (2003, p. 68 e 79, apud SAVIANI, 2009, p. 148).
Dessa forma, boa parte das instituições atribuía aos cursos de pedagogia a formação de
professores para a educação infantil e para as séries de 1º grau.
3.1.6 Período: 1996 a 2006
Período que compreendeu o advento dos institutos superiores de educação e das
escolas normais superiores. A nova LDB - Lei de Diretrizes de Base, promulgada em 20 de
dezembro de 1996, introduziu os institutos superiores de educação e as escolas normais
superiores como alternativa aos cursos de pedagogia e licenciatura. Nesse sentido, a LDB
propiciou uma política educacional que efetuava um nivelamento por baixo, no qual os
institutos superiores de educação surgem como institutos de nível superior de segunda
categoria, onde a formação oferecida tem como características menor custo e menor tempo,
oferecendo para isso cursos de curta duração.
3.2 ENQUADRAMENTO E CONTROLE POLÍTICO PELO ESTADO
Cardoso (2010) relata que o concurso para admissão ao cargo de professor – ao qual
também estava sujeito o professor particular, foi instituído já em 1759. A despeito da já
existência de inúmeras pessoas que se dedicavam ao ofício de ensinar, tais professores não
formavam ainda um corpo profissional, mas apenas, na expressão utilizada por Nóvoa (1991),
um “enquadramento estatal”.
Com o total domínio do processo educacional - desde a definição de diretrizes e
conteúdos, até a imposição de comportamentos e atitudes a serem adotados pelo corpo
docente e pelos alunos - pretendia o Estado obter o controle social e político da população.
No atinente aos educadores, intentava o Estado, e as forças políticas que o constituíam,
forjar uma força de trabalho sujeita aos seus desígnios, submissa às suas intenções de
permanência no poder, vassala e obediente, que não discutisse ou estimulasse a população ao
questionamento das estruturas de dominação política, social e econômica à qual estava
submetida.
22
A ideia era a de construir alguém relativamente imune ao contágio, pois apesar de
toda a formação recebida subentendia-se que o risco de cair em tentação era
relativamente grande. Em suma o professor deveria preocupar-se exclusivamente
com sua prática escolar e procurar afastar-se dos conflitos que eventualmente a
sociedade em que estava inserido apresentasse.
[...] é praticamente uma vida à parte da sociedade. É a vida de um indivíduo que,
embora esteja inserido na sociedade por sua atividade profissional, está dela alijado
em sua vida social. É uma vida de precaução, de auto-preservação, na verdade, de
alienação (TAMBARA, 2012. p. 7).
Cardoso (2010) conta que as condições a que estavam submetidos os professores eram
motivo de constantes tensões. Os baixos salários e mesmo as disparidades existentes entre
eles tornaram-se quase sempre a maior fonte de conflitos. Os pedidos de igualdade de
tratamento alcançavam também certos benefícios e privilégios usufruídos apenas por alguns,
como aposentadoria ativa e título de nobreza, que conferia distinção social e política, isentava
de impostos, de penas infames e de prisão, além de legitimar a ocupação de certos postos que
anteriormente apenas estavam disponíveis aos nobres.
Na relação das honras concedidas aos súditos, cabia à categoria dos letrados,
constituída por doutores, licenciados e bacharéis formados, o grau de nobreza
ordinária, que era o mais baixo. O decreto de 14 de julho de 1775 reforçou essa
distinção, ao estabelecer que os professores régios tinham direito ao Privilégio de
Homenagem, em razão da nobreza do seu emprego. (CARDOSO, 2002 apud
CARDOSO, 2010, p. 60).
Erigidos a categoria profissional por uma ação estatal e destituídos de uma consciência
de classe, muito mais presente naquelas categorias cujo reconhecimento adveio de um
histórico - e por vezes árduo - processo de conquistas, submeteram-se os professores às
“deliberações” e “favores” do Estado. Este, ao instituir uma estrutura hierarquizada, impôs
uma diferenciação remuneratória - muitas vezes injusta - que contribuiu para a fragmentação
da categoria.
O ingresso de contingente feminino como força de trabalho nas séries iniciais do
ensino à população contribuiu significativamente, se não para a redução, pelo menos para a
manutenção dos baixos salários dos professores. Pela própria condição de mãe e esposa, as
mulheres foram “apresentadas” como detentoras de atributos naturais imprescindíveis à
educação infantil. Segundo Tambara (2012), a inserção da mulher no mercado de trabalho
deveu-se muito primordialmente ao imaginário social que associou o perfil do educador à
figura feminina, chegando tal entendimento a ser defendido em vários congressos científicos
realizados em fins do século XIX e início do século XX.
Manifestamente defendia-se - não sem questionamentos, é claro - o que se poderia
chamar de espécie de “reserva de mercado” às mulheres. Não a todas, entretanto, visto que
23
“[...] a boa professora deveria provir dos segmentos mais ‘civilizados’ da sociedade”
(TAMBARA, 2012, p.2).
Assim, compartimentada em sua “identidade”, vivenciaram os professores o dilema
que acompanhou praticamente toda a trajetória da educação popular no Brasil e que ora
privilegiava a formação cultural-cognitiva do profissional, ora primava pelos conteúdos
pedagógico-didáticos, aspectos esses que, na visão de Saviani (2009) e de inúmeros
educadores, mesmo à época, não deveriam estar dissociados. Não detinham os professores,
entretanto, força política o bastante para interferir nas decisões impostas por burocratas e
políticos integrantes da cúpula estatal.
24
4
IDENTIDADE SOCIAL DO PROFESSOR
Ao traçar os parâmetros do perfil profissional desejado para o exercício da função de
educador, estendeu o Estado a sua autoridade sobre o processo de formação da identidade
social e pessoal daquele grupo de trabalhadores, restringindo, e talvez mesmo abortando,
qualquer possibilidade de transformação dessa identidade em mobilização política, como
acontecia em movimentos sociais nascidos na Europa.
Em meados do século XIX:
[...] fixa-se [...] uma imagem intermediária dos professores, que são vistos como
indivíduos entre várias situações: não são burgueses, mas também não são povo; não
devem ser intelectuais, mas têm de possuir um bom acervo de conhecimento; não
são notáveis locais, mas têm uma influência importante nas comunidades; devem
manter relações com todos os grupos sociais, mas sem privilegiar nenhum deles; não
podem ter uma vida miserável, mas devem evitar toda a ostentação; não exercem o
seu trabalho com independência, mas é útil que usufruam de alguma autonomia; etc.
Estas perplexidades acentuam-se com a feminização do professorado, fenômeno que
se torna bem visível na virada do século e que introduz um novo dilema entre as
imagens masculina e femininas da profissão. (NOVOA, 1991, p.15, grifos do autor)
Na análise efetuada por Deschamps e Moliner (2009, p.14) “[...] a identidade social
refere-se a um sentimento de semelhança com (alguns) outros, enquanto a identidade pessoal
se refere a um sentimento de diferença em relação a esses mesmos outros”.
Nóvoa (1992, p.14, apud CARDOSO, 2010, p.57), afirma que “identidade não é um
lugar adquirido”, mas antes, “um lugar de lutas e de conflitos, é um espaço de construção de
maneiras de ser e de estar na profissão”, caracterizando como extremamente dinâmico o
“processo identitário” de uma categoria profissional. Tal aspecto é tangível também junto ao
professorado, que mesmo submetido a condições precárias de trabalho e, por conseguinte, de
vida, continuavam a exercer e a se orgulhar da profissão.
De qualquer forma, no caso da atividade docente no século XIX, pode-se observar
que houve o início de uma construção mais delineada e determinada de um perfil
profissional que, direta ou indiretamente, pudesse identificar no mercado de trabalho
o sujeito não apenas com um múnus singular, mas também, ou principalmente,
detentor de características profissionais que tornassem o ato de ensinar inerente a
quem as detivesse.
Tais requisitos, a exemplo de outras profissões, dariam não somente visibilidade a
quem os detivesse, mas também constituiriam um estado de capacitação técnica e
profissional perante a sociedade. (TAMBARA, 2012, p.1).
25
4.1 TEORIA DA IDENTIDADE SOCIAL
A identidade social é, pois, uma construção histórico-social. Todo indivíduo é forjado
conforme a ocasião (caráter temporal), o ambiente (caráter espacial) e o grupo com o qual se
relaciona ou se permite relacionar (caráter sociocultural). Logicamente, portanto, as
identidades sociais serão distintas considerando-se os contextos de convivência e interação
dos indivíduos.
Hall (2004, apud GALINKIN; ZAULI, 2011, p.255-256) identifica diferentes
identidades sociais ao longo da história da humanidade, a partir do Iluminismo Europeu. Para
o citado autor seriam marcantes as diferenças encontradas naqueles que ousou chamar de
“sujeito do Iluminismo”, de “sujeito sociológico” e de “sujeito pós-moderno”.
O Iluminismo foi o período histórico marcado por uma gradativa substituição da fé
religiosa e da crença de uma efetiva e constante intervenção divina no mundo real pela ideia
de individualismo e de aptidão crítica do homem para construir sua própria história. O
“Sujeito do Iluminismo” seria, por tal, um indivíduo autônomo, livre, “...totalmente centrado,
unificado, dotado de capacidade de razão, de consciência e de ação” (HALL, 2004, p.11 apud
GALINKIN; ZAULI, 2011, p.256), independente e desvinculado dos grupamentos
característicos do período Medieval.
O “Sujeito Sociológico”, observável no chamado período moderno, seria o reflexo de
um período também marcado por profundas mudanças socioculturais, políticas e econômicas.
O homem que “emergiu” de tal época já era capaz de se perceber como alguém não tão
autônomo e autossuficiente como aquele do Iluminismo, um produto da complexidade do
meio e resultado das relações mantidas com outros indivíduos ou grupos.
O “Sujeito Pós-Moderno”, igualmente “espectro” de uma época, não seria detentor de
uma identidade única e permanente, mas de várias, em constante transformação, mutável em
função do processo interacional com diferentes contextos e admissível em face da
globalização. Tal processo de mundialização sujeitaria as consciências individuais a uma
constante volatização, fluidez e instabilidade, fazendo-as adaptáveis e mesmo caracterizadas
por certa alienação e pelo sentimento de isolacionismo e de não pertencimento àquela
determinada sociedade.
A contemporaneidade está a exigir a construção de uma nova concepção de sujeito.
Uma concepção que perceba o homem como um ser em permanente construção, que ao
interagir com diferentes ambientes impõe a si próprio a adoção de diferentes posturas, um
26
tanto padronizadas socialmente, todavia, distintas a ponto de distingui-los do restante de seus
pares.
4.1.1 A Universidade de Bristol e a Teoria da Identidade Social de Tajfel
Henri Tajfel, catedrático da Universidade de Bristol, no Reino Unido, foi o formulador
da Teoria da Identidade Social. Em sua teoria da categorização social Tajfel teve como
objetivo principal “[...] comprovar se os princípios cognitivos que levavam a destacar as
diferenças entre os objetos podiam ser utilizados também como fator explicativo dos
estereótipos” (ÁLVARO; GARRIDO, 2006, p.272).
Álvaro e Garrido (2006, p.272) definem “[...] o estereótipo como uma crença
compartilhada de que determinados traços são característicos de um grupo social”. Para
Deschamps e Moliner (2009, p.33) “os estereótipos são definidos como um conjunto de
crenças relativas às características de um grupo”. Estas características “se referem às
características pessoais, geralmente traços de personalidade, mas muitas vezes também,
comportamentos de um grupo de pessoas” (LEYENS; YZERBYT; SCHADRON, 1996, p. 24
apud DESCHAMPS; MOLINER, 2009, p.33).
Para Tajfel (1981, apud ÁLVARO; GARRIDO, 2006, p.275) são quatro os tipos de
funções às quais os estereótipos e preconceitos atendem:
1ª – Função Cognitiva: é aquela em que, entre as pessoas pertencentes ao mesmo
grupo, ocorre uma minimização das diferenças, e entre pessoas de grupos distintos há uma
maximização das mesmas. Dessa forma, a função cognitiva ordena e simplifica a informação
oriunda do meio social, o que faz com que se economizem esforços no seu processamento;
2ª – Função de Preservação do Sistema de Valores: nesse caso há dois tipos de erros
que podem ocorrer. Um em relação à identificação do grupo ao qual pertence a pessoa, e
outro quanto à exclusão de objeto que pertence à pessoa. Nesse sentido, se as categorias tem
conotação de valor, os erros acima citados têm consequências subjetivas relevantes.
3ª – Função Ideológica: permite que ocorra uma ideologização das ações coletivas
diante de um exogrupo.
4ª – Função de diferenciação com relação a outros grupos: nessa função os
estereótipos servem para justificar ações violentas, de cunho intencional ou não, contra
membros de um exogrupo.
Segundo Álvaro e Garrido (2006), o elo utilizado por Tajfel para analisar as relações
entre as mencionadas funções é a identidade social. Dessa forma, para se compreender a
27
Teoria da Identidade Social de Tajfel é necessário que seja observado três pressupostos
teóricos: a categorização social; a comparação social e o paradigma do grupo mínimo.
A categorização social é o processo que permite que as informações recebidas de fora
sejam ordenadas e organizadas. Assim, a função da categorização seria a de poupar os
esforços do sistema cognitivo, processando a informação dos estímulos externos e facilitando
a orientação da pessoa no mundo.
Para que ocorra a categorização é necessária a atuação de dois tipos de processos: o
indutivo, que permite que se identifique um objeto, mesmo tendo somente uma informação
incompleta; e o dedutivo, processo no qual atribui-se a um objeto ou a um fato as
propriedades da categoria à qual pertence (ÁLVARO; GARRIDO, 2006).
Este processo de categorização também atua quando vemos as demais pessoas, que
nós incluímos em determinados grupo ou categoria social. Com isso, atribuímos às
pessoas os traços característicos da categoria social à qual pertencem. Esta
percepção estereotipada, fruto da tendência cognitiva de simplificar a informação
processada, faz que exageremos as diferenças entre as pessoas que pertencem a
diferentes grupos e que minimizemos as diferenças existentes em cada grupo
(TAJFEL apud ÁLVARO; GARRIDO, 2006, p.273).
O segundo processo cognitivo é a Assimilação. “A forma como a pessoa percebe as
diferentes categorias sociais não é fruto de um processo universal e auto generativo, mas
produto da assimilação de valores e normas sociais da cultura da qual faz parte” (TAJFEL
apud ÁLVARO; GARRIDO, 2006, p.273).
O processo de assimilação começa durante a infância e é através dele que aprendemos
a realizar e transmitir avaliações positivas dos grupos sociais.
O terceiro processo cognitivo que intervém na manutenção e formação dos
estereótipos é a busca da coerência. Esse processo permite que o indivíduo, pertencente a
diversos grupos durante sua vida, possa realizar mudanças, construindo uma estrutura
cognitiva com o intuito de preservar sua integridade pessoal e simplificar as informações que
provém do ambiente externo. Nesse sentido, são geradas ideologias oriundas das mudanças
nas relações intergrupais, visando deslocar a responsabilidade pela mudança do indivíduo
para o endogrupo (grupo ao qual o indivíduo pertence), ou deste para o exogrupo (grupo ao
qual o indivíduo não pertence).
À medida que a pessoa se percebe como membro de um determinado grupo social, a
categorização social é um dos processos básicos mediante os quais se constrói a
identidade social. Segundo Tajfel (1978, p.376): ‘A identidade social de uma pessoa
se encontra relacionada com o conhecimento de sua filiação a certos grupos sociais e
com a significação emocional e valorativa que resulta dessa filiação’. (ÁLVARO;
GARRIDO, 2006, p.277)
28
A identidade social resulta essencialmente da comparação que o indivíduo realiza
entre os grupos aos quais pertence e aqueles nos quais não se considera inserido. Dessa forma,
a análise de Tajfel foi importante ao demonstrar que a identidade social é entendida não
somente como resultado da pertença a determinados grupos, mas também como mecanismo
causal que molda as relações entre os grupos (ÁLVARO; GARRIDO, 2006).
Tencionando provar não ser necessária a existência de conflitos entre grupos para a
ocorrência de favorecimentos em relação ao endogrupo e discriminações em relação ao
exogrupo, Tajfel e colaboradores deram início ao experimento que foi denominado
“paradigma do grupo mínimo”, que objetivava determinar quais seriam os requisitos mínimos
para que uma pessoa se sentisse membro de um endogrupo e se diferenciasse de um exogrupo
(ÁLVARO; GARRIDO, 2006).
Nos experimentos que se seguiram eliminaram o conflito de interesses entre os grupos,
as variáveis que culminam no favoritismo intergrupal e a discriminação dos membros de
exogrupos.
Segundo Tajfel, os resultados desses experimentos mostram que a diferenciação
intergrupal não é produto de um conflito de interesses, como sugerira Sherif, mas da
necessidade que a pessoa tem de dar significado à situação intergrupal, de forma que
a identidade social fique fortalecida. Por esse motivo, maximizam-se as diferenças
entre os grupos, ou criam-se diferenças que, de fato, não existem (ÁLVARO;
GARRIDO, 2006, p.281).
De acordo com a Teoria da Identidade Social de Tajfel as pessoas tendem a favorecer
sistematicamente os membros de seu grupo, mesmo não existindo conflitos com outros
grupos, visando reforçar sua identidade.
“O si mesmo,[...] é uma estrutura cognitiva em evolução, da mesma maneira que as
representações intergrupos também podem evoluir. [...] Em outros termos pode-se supor que o
indivíduo não é o único ator de sua própria construção identitária” (DESCHAMPS;
MOLINER, 2009, p.148).
As representações do si-mesmo e do nós remetem a conteúdos comuns que são
apropriados ao mesmo tempo dos modelos culturais e da biografia pessoal. O
individual e o coletivo seriam “como uma espécie de gestalt onde ora o si-mesmo é
figura e o alter o fundo, ora o contrário, mas ambos são associados e cimentados
através do que se poderia chamar de emoção identifical (DESCHAMPS;
MOLINER, 2009, p.27, grifos do autor)
Enquanto fizer uma avaliação positiva do pertencimento a determinado grupo o
indivíduo nele permanecerá. Quando não, tentará “se desfiliar”. O processo de desvinculação,
todavia, considerará a existência de fatores objetivos que o impeçam e, ainda, o eventual
conflito com valores que considera importante. Se a mudança se mostra difícil processará uma
29
tentativa de alteração da avaliação, justificando ou alterando suas características negativas ou
comprometendo-se a uma ação social com vistas à mudança desejada (TAJFEL, 1981 apud
ÁLVARO; GARRIDO, 2006). A necessidade de reforçar a identidade social é o mecanismo
causal que dá lugar a situações de mudança social objetiva.
Tais mudanças, para TAJFEL (1981/84, p. 314 apud ÁLVARO; GARRIDO, 2006,
p.282-283) podem porvir de três diferentes situações: a) o grupo se encontra em situação
ambígua ou marginal, o que provoca uma dificuldade de definição de um lugar no sistema
social; b) o grupo ocupa, por consenso, uma posição de superioridade, todavia, se imagina
ameaçado por alguma mudança ou por um conflito de valores intrínseco à sua condição de
superioridade; e c) o grupo foi definido, também por consenso, como inferior, entretanto
reconhece que tal situação não é legítima ou tem consciência de que é possível mudá-la.
“Nas situações descritas, os membros de uma categoria tenderão a estreitar seus
vínculos e reforçar sua identidade como grupo social” (ÁLVARO; GARRIDO, 2006, p.283).
Para Nóvoa (1991) a indefinição estatutária e o relativo isolamento social provocaram
um reforço da solidariedade interna ao corpo docente e, num certo sentido, fez emergir uma
identidade social, condição esta para a qual muito contribuiu a prevalência das escolas
normais. De suas fileiras surgiu um núcleo com maior conscientização profissional. Tendo à
frente professores e antigos alunos normalistas, as associações de professores surgidas a partir
de meados do século XIX centraram a pauta de reivindicações em torno de três eixos: “[...]
melhoria do estatuto, controlo da profissão e definição de uma carreira” (NOVOA, 1991,
p.16). Nesse sentido:
O prestígio dos professores no início do século XX é indissociável da acção levada a
cabo pelas suas associações, que acrescentam à unidade extrínseca do corpo
docente, imposta pelo Estado, uma unidade intrínseca, construída com base em
interesses comuns e na consolidação de um espírito de corpo (NÓVOA, 1991, p.16,
grifos do autor)
Ainda para o citado estudioso, no princípio do século XX, o fortalecimento deste
espírito de corpo estava profundamente ligado a uma crença generalizada nas potencialidades
da escola e na sua expansão ao conjunto da sociedade. Inserido neste cenário como peça
indispensável, agente mesmo de projetos individuais de ascensão social, passou o professor a
personalizar um poder simbólico bastante visível no período auge da profissão.
30
5
VIOLÊNCIA NAS ESCOLAS
A violência é fenômeno que sempre acompanhou a raça humana. Atualmente, não
obstante diferenças culturais e de desenvolvimento geral dos países, é vivenciada
corriqueiramente, em suas diferentes formas e gradações, pela totalidade das sociedades.
Fenômeno constantemente explorado e manipulado pelos meios de comunicação de
massa, a violência é diuturnamente difundida nos lares da sociedade brasileira. Desde muito
cedo é “oferecida” aos indivíduos, ora na forma de desenhos animados, onde, de modo
aparentemente inocente, gato e rato tentam se destruir, ora na forma de filmes de super-heróis,
cuja busca por “justiça” pretende justificar o emprego de todo e qualquer artifício, mesmo
aqueles que implicam no completo extermínio da vida alheia. Modernamente, esse processo
de alienação coletiva recebe significativa contribuição da tecnologia, que, dentre várias
alternativas, disponibiliza indiscriminadamente uma série de jogos interativos, por via dos
quais os jovens são induzidos a acreditar que a força física e a intimidação são meios
socialmente aceitáveis para a solução de conflitos.
Insistente e silenciosamente “socializada”, a violência passa a ser assim uma
“presença” constante e cada vez mais “natural” no seio das famílias e, por consequência, das
sociedades. Constante a ponto de tornar as pessoas identificadas com os atos de “heroísmo”
demonstrados em face do “inimigo” ou meros espectadores, incapazes de esboçar qualquer
sentimento de indignação ou a mais simples reação em face do sofrimento alheio.
A exposição a esse intrincado processo de banalização da violência leva grande
parcela da população a compartilhar uma percepção puramente reducionista do fenômeno.
Nos meios científicos predomina, todavia, a certeza de que a violência deve ser
desmistificada.
Para Cowie (2003) toda uma série de fatores ou circunstâncias influi para uma
percepção individual e social do que vem a ser uma violência.
A diversidade das definições de violência indica como é difícil chegar a um acordo
objetivo sobre a verdadeira natureza da situação, uma vez que o conceito possui
diferentes níveis de significado e de ênfase, dependente da cultura, do período
histórico, do gênero, da classe social, etc. As vítimas da violência podem ser
indivíduos, objetos ou organizações, e a natureza dos danos causados pode ser
psicológica, física ou material. (COWIE, 2003, p.112).
No âmbito das instituições de ensino para crianças e adolescentes a matéria foi objeto
de interesse de inúmeros estudiosos. Segundo Vettenburg (1999, apud ORTEGA, 2003, p.83),
“[...] a violência escolar é um fenômeno resultante da confluência de múltiplos fatores”, cujo
31
exame deve, a partir de uma vertente holística, abordar necessariamente questões relacionadas
ao contexto familiar; às relações interpessoais e de grupos de pares; à escolaridade; ao
contexto social comunitário; aos meios de comunicação de massa; ao desenvolvimento geral
dos países; e às políticas públicas.
Para uma mais íntegra compreensão do fenômeno há que se incluir no âmbito de sua
análise, dentre outras, questões como desamparo e privações de toda ordem verificadas no
seio familiar, instabilidade emocional e despreparo para o exercício de capacidades sociais,
ausência de políticas públicas que promovam a inclusão social e a democratização das
oportunidades e das redes de proteção social (ORTEGA, 2003).
Na escola, onde na maioria das vezes o multiculturalismo é presenciado de forma mais
intensa, a violência pode se revelar por meio da desorganização institucional, que termina por
privar os atores – aí incluídos todos os integrantes da comunidade escolar - do diálogo
democrático e preventivo, do respeito às diferenças e às suas múltiplas formas de
manifestação e, primordialmente, da descoberta de soluções conjuntas para questões
disciplinares e didáticas (ORTEGA, 2003).
Dificuldades são, sobretudo, sentidas e partilhadas pelo corpo docente de instituições
de ensino, em relação aos quais, segundo Royer (2003), é visível um déficit de formação e,
por conseguinte, um despreparo – extensivo aos outros profissionais da educação - para uma
correta avaliação e intervenção em situações de comportamento agressivo ou violento entre
jovens. Para Burnard e Yaxley (2000 apud ROYER, 2003, p.64-65) “[...] a formação básica
recebida pelos professores marginaliza os aspectos comportamentais e enfatiza aquilo que o
mestre ensina e a maneira como ele o ensina.” Ainda segundo Royer:
[...] a explicação dada aos problemas de um aluno ou e seu fracasso na escola
geralmente é associada às características do jovem (pobreza do ambiente familiar,
deficiência, dimensão cultural, funcionamento familiar). É raro que se ponha em
questão a qualidade dos serviços oferecidos pela escola e, menos ainda, a pertinência
da utilização de certos enfoques pedagógicos ou disciplinares à luz dos
conhecimentos originários de pesquisas recentes. [...] De fato, os jovens com
dificuldades graves de comportamento admitem ir à aula com maior frequência, se
comportar melhor, trabalhar melhor por causa de professores que eles apreciam,
admiram e respeitam. A qualidade do ensino, a competência dos professores de
educar bem os jovens que apresentam condutas agressivas, será que isso teria
relação com o bom aproveitamento escolar dos jovens e com sua adaptação social?
Fazer essa pergunta é o mesmo que respondê-la. (ROYER, 2003, p.69)
32
6
MÉTODO
A proposta desse trabalho foi a de efetuar o estudo das relações engendradas em
específicos espaços físicos de convivência humana, onde interagem docentes, alunos,
familiares e outros membros integrantes de uma comunidade caracteristicamente escolar.
Por ter como objeto a análise de um fenômeno social, optou-se pelo método
qualitativo de pesquisa, considerado o mais adequado em face do envolvimento e da
possibilidade de ampla troca de experiências e percepções do pesquisador com o seu públicoalvo, no caso, os docentes.
Segundo Rossman e Rallis (1998, apud CRESWELL, 2007, p. 186), “A pesquisa
qualitativa usa métodos múltiplos que são interativos e humanísticos. [...] Os pesquisadores
qualitativos buscam o envolvimento dos participantes na coleta de dados e tentam estabelecer
harmonia e credibilidade com as pessoas no estudo”.
Fundamentalmente interpretativa, a presente pesquisa exigiu fossem avaliadas certas
condições sociais, econômicas, políticas e culturais presentes na sociedade brasileira quando
da institucionalização da profissão até os dias atuais. O caráter holístico da pesquisa
qualitativa é imprescindível quando do estudo interpretativo do comportamento humano e dos
fatos daí originados.
Para Rossman e Rallis (1998 apud CRESWELL, 2007, p.187), “o pesquisador
qualitativo vê os fenômenos sociais holisticamente. Isso explica por que estudos de pesquisa
qualitativa aparecem como visões amplas em vez de microanálises”. Segundo Fraenkel e
Walen, 1990; Merriam, 1988 (apud Creswell, 2007. p.202), “a pesquisa qualitativa concentrase no processo que está ocorrendo e também no produto ou no resultado. Os pesquisadores
estão particularmente interessados em entender como as coisas ocorrem”.
Participantes
O presente estudo baseou-se em oito entrevistas realizadas, no ano de 2012, com
integrantes do corpo de educadores do ensino fundamental de duas escolas públicas
localizadas em duas regiões administrativas do Distrito Federal.
Os participantes das entrevistas, num total de cinco mulheres e três homens,
apresentaram média de idade de 44 anos, com intervalo entre 37 e 49 anos, e de exercício na
atividade docente de 20 anos, entre 12 e 30 anos. Dos três entrevistados do sexo masculino,
um declarou exercer outra atividade econômica além da docência e outro informou que divide
o seu ofício entre escola pública e privada. O terceiro entrevistado do sexo masculino, assim
33
como as do sexo feminino, declararam ter a docência como única atividade profissional e
apenas naquela unidade de ensino, em que pese alguns se encontrarem em processo de
readaptação.
Todos os entrevistados possuem pós-graduação e um deles, do sexo feminino, também
é graduado em Direito. Um representante do sexo masculino é solteiro, sem filhos, uma do
sexo feminino é divorciada e tem um filho. Os demais estão casados e têm de dois a quatro
filhos. A renda familiar do grupo girava em torno de 20 salários mínimos, sendo a menor de 6
salários e a maior de 37 salários, em valores da época.
Instrumentos e Materiais
A exploração pretendida exigiu a utilização de um roteiro de entrevistas
semiestruturadas (Apêndice B), permitindo assim uma maior liberdade ao entrevistador na
formulação de perguntas e ao entrevistado na elaboração de respostas que melhor
expressassem as interpretações pessoais acerca de suas vivências em ambiente escolar. As
entrevistas foram gravadas em áudio e posteriormente transcritas.
Procedimentos de Coleta
As entrevistas foram realizadas por quatro estudantes do curso de Psicologia da
Universidade Católica de Brasília – UCB com oito docentes de duas instituições de ensino.
Os critérios para escolha dos entrevistados ficou a cargo da direção das escolas. Foi solicitado
que incluíssem dois professores atuantes em sala de aula e dois coordenadores, sendo um de
disciplina. Dentre os coordenadores havia professor que se encontrava, à época, afastado das
atividades de sala de aula devido a condições médicas gerais.
Aos entrevistados, após os devidos esclarecimentos acerca do objeto da pesquisa, foi
apresentado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE, para assinatura
(Apêndice A).
Procedimento de Análise de dados
Os dados extraídos das entrevistas foram analisados com subsídio no Método de
Análise de Conteúdo Temática de Bardin (2011). Este método se constitui por um conjunto de
técnicas de análise sistematizadas, que envolve a leitura flutuante das entrevistas, o
34
levantamento de temas e subtemas comuns, com o levantamento de suas frequências em cada
entrevista. O principal objetivo da análise de conteúdo foi a codificação de mensagens
emitidas, evidenciando os indicadores que permitam inferir sobre uma outra realidade
diferente da mensagem expressa.
Os temas encontrados foram interpretados conforme a Teoria da Identidade Social de
Tajfel (1991).
35
7
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A análise temática passou pelo crivo e consenso de quatro pesquisadores, que ao
realizarem uma análise prévia, agruparam os subtemas encontrados em quatro categorias
temáticas, conforme a Tabela 1. Os Temas que apresentaram maior frequência nas entrevistas
foram O Exercício da Docência, num percentual final de 37,40%, e A Violência Escolar,
que totalizou percentual de 35,60%. As Relações do Professor foram citadas numa
constância de 22,60% e O Adoecimento Profissional em 4,40%.
Tabela 1 – Temas das Entrevistas
TEMAS
ESCOLA A
%
ESCOLA B
%
TOTAL
%
O Exercício da Docência
90
38,46
97
36,47
187
37,40
A Violência Escolar
72
30,77
106
39,85
178
35,60
As Relações do Professor
58
24,79
55
20,68
113
22,60
O Adoecimento Profissional
14
5,98
8
3,00
22
4,40
O tema O Exercício da Docência, foi dividido em nove subtemas, a demonstrarem o
histórico profissional, o significado da docência para os entrevistados, os desafios
profissionais aos quais são submetidos, a motivação para a continuidade do exercício da
profissão, se o local de trabalho foi uma escolha, qual a visão de escola ideal, a existência de
suporte por parte da instituição de ensino, os planos futuros e a percepção individual acerca de
autoridade e autoritarismo.
Os dados demonstram que a docência é profissão repleta de desafios e carente de
motivações. A propósito, o primeiro aspecto é o que mais aparece nas entrevistas e o resgate
de uma época - onde teoricamente a profissão era exercida sob melhores condições - soa
como aspiração e mesmo como requisito para a atuação do professor.
36
Tabela 2 – O Exercício da Docência
O EXERCÍCIO DA DOCÊNCIA
S
U
B
T
E
M
A
S
ESCOLA PÚBLICA A
(Entrevistados)
ESCOLA PÚBLICA B
(Entrevistados)
Total
(frequência)
A
Masc
B
Fem.
C
Fem.
D
Fem.
E
Fem.
F
Fem.
G
Masc
H
Masc
Desafios profissionais
6
8
9
3
2
4
16
10
58
Significado da docência
4
4
7
3
3
3
1
8
33
Suporte Institucional
2
3
7
1
2
2
4
5
26
Histórico profissional
2
4
1
1
2
1
2
3
16
Autoridade vs.
Autoritarismo
1
1
1
1
1
1
5
5
16
Motivação do docente
1
2
3
1
0
2
2
2
13
Onde trabalhar? Uma
escolha.
2
1
2
1
1
1
1
1
10
Visão da escola ideal
1
1
2
1
2
1
0
0
8
Planos Futuros
*
1
1
1
1
*
1
1
6
* Os entrevistados não foram questionados acerca do subtema Planos Futuros.
Cuida-se de dar destaque a certas características do corpo discente, como o
desinteresse, a indisciplina, o desrespeito e a violência, assim como são ressaltadas a
sobrecarga de trabalho e a precariedade de condições para o exercício da profissão.
Pra mim, a maior dificuldade que o professor encontra é a indisciplina dos alunos, a
falta de respeito. O professor, antigamente, era... digamos assim... um segundo pai
para os alunos, uma segunda mãe, que na maioria são professoras. Hoje em dia, o
desrespeito é muito grande. Se você não tiver um jogo de cintura muito grande, você
não consegue sequer dar aula (Entrevistado B).
A gente fica pensando no que é melhor para eles. Aí você acaba tendo esse
relacionamento, o que atualmente, na verdade, é muito difícil, porque eles não
querem mais nem aprender, nem ouvir, nem na questão do conhecimento. [...] Aí a
gente acaba ficando insatisfeita com isso. E também tem outra questão: o respeito.
Tem aquele caso em que o menino te xinga (Entrevistado C).
A recorrência de eventos de tal natureza é relevante a ponto de fazer os membros da
categoria profissional repensarem a própria condição do professor na sociedade, e, como
consectário de um sentimento geral de incapacidade de imprimir mudanças no ambiente de
vivência, nutrirem o desejo de fuga. É o que fica explicito quando da análise do subtema
“Planos futuros”, onde a quase totalidade dos entrevistados informa aguardar com ansiedade o
37
momento da aposentadoria ou estarem à procura de outra atividade profissional, alternativas
para a concretização de uma mudança de identidade social.
Se Deus quiser, o ano que vem eu estou estudando um outro curso, porque é uma
vontade antiga estudar Direito. [...] eu não vou me aposentar na educação.
Provavelmente não. Eu espero que não (Entrevistado D).
Eu estou na contagem regressiva, torcendo para esses cinco anos acabarem o mais
rápido possível. Porque, por mais que eu goste de dar aula, a visão que eu tenho não
é positiva. O que eu tenho observado nesses quase vinte anos é que, a cada ano que
passa, nossa clientela está oferecendo um grau de dificuldade maior para ser
resolvido, para ser sanado (Entrevistado B).
A “opção” pela desvinculação ao grupo de pertença, segundo Tajfel, ocorre quando,
em relação àquele, já não é possível realizar uma avaliação positiva, condição esta que
termina por fomentar o desejo de pertencimento a outro grupo, no caso, a outras categorias
profissionais. Quando tal intuito se mostra de difícil concretização, promove-se uma releitura
da situação com vistas a uma ressignificação dos valores partilhados pelo endogrupo, de
forma a justificar a permanência.
Para os entrevistados, as dificuldades e a desmotivação para o exercício da profissão,
além de sofrerem a ação de fatores como desinteresse, indisciplina, desrespeito e violência,
estão também diretamente relacionados à questão do suporte institucional, como no trecho
abaixo:
Essa questão do governo de inclusão nas escolas públicas foi mal feita. Até hoje não
está bem organizada. Não preparou os professores para atender esses alunos, não
tem assistente para esses alunos. [...] Eu dei aula para aluno que era deficiente visual
e eu só fiquei sabendo durante a aula, quando eu bati no quadro falando: vocês estão
vendo esse mapa? Todo mundo começou a rir. Era no ensino médio. Eu perguntei:
do que vocês estão rindo? O menino na minha frente era deficiente visual e eu não
sabia. Não tinha sido nem avisado (Entrevistado A).
Por outro lado, e destoando um pouco da análise efetuada pelos docentes, o exame do
subtema “Histórico profissional” confirma que o ingresso na carreira se dá, muitas vezes, sem
a convicção ou a vocação necessária ao exercício da atividade. Muitos fatores podem ter
contribuído para tal: o atrativo da amplitude do mercado de trabalho, históricos e influências
familiares, status profissional e estabilidade funcional, dentre outros.
Eu disse não, eu não quero dar aula, porque eu não quero ver igual eu via em casa,
como era com a minha mãe: cansada, estressada, aquela coisa toda. E olha que em
tempos atrás! [...]Mas, depois, tinha essa questão do mercado de trabalho. Eu saí do
banco, aí eu falei assim: Não, sou formada em artes - foi no que eu me formei
primeiro - eu vou procurar algo direcionado para o que eu sou formada. [...] Então,
foi por isso. Acabei e estou aqui, ainda nesse período de vinte anos. Não tão
satisfeita, mas... (Entrevistado C).
38
O segundo subtema mais citada foi o “Significado da docência”. Nota-se que há uma
clara percepção acerca do expressivo papel do professor como agente de transformação
cultural da sociedade e da educação como requisito para a ascensão socioeconômica dos
alunos. De modo geral, todavia, as dificuldades enfrentadas no dia a dia da profissão
provocam certa descrença na capacidade individual de continuar sendo um agente de
transformação social.
Olha, a docência pra mim já se incorporou ao meu modo de viver. Desde 17 anos eu
comecei a trabalhar com educação, com o ensino.[...]Eu gosto da área de educação,
estar em sala de aula, ajudar as crianças a entenderem um texto, aprenderem a
escrever, a produzir um texto, um relato histórico que eles estão aprendendo agora,
um mural. [...] Foi uma escolha consciente. Eu já sabia, muito nova ainda, no
começo da adolescência, quando eu tinha uns doze anos. Eu já sabia que eu queria
trabalhar com escola, com educação (Entrevistado E).
Nos primeiros cinco anos eu gostei muito de trabalhar em educação, me apaixonei,
trabalhei por várias cidades [...] depois fiquei muito cansada e já não queria mais...
Eu precisava daquele dinheiro, não tinha como voltar atrás. Porque nesses dez anos
de trabalho eu fiquei muito doente, estresse no trabalho (Entrevistado D).
Com um percentual de 35,60%, As Relações do Professor foi o terceiro tema mais
citado pelos docentes, que, em seus discursos, imprimiram grande significação à qualidade
das relações pessoais e profissionais. Foi dada ênfase à dificuldade de harmonizar a docência
às exigências cotidianas intrafamiliares e interpessoais, impossibilitando-se desde um
investimento pessoal (maior tempo para dedicação a si próprio, à família, aos amigos, aos
pares) como profissional (participação em cursos de capacitação e programas de formação
continuada).
Pra você ter uma ideia, eu comecei a fazer um mestrado e abandonei porque não dei
conta de conciliar. Não consegui liberação e eu tive que abandonar. E olha que o ano
em que eu consegui ficar, no final do ano eu entrei em depressão, não consegui! Eu
dava aula aqui, à noite, e de manhã em outra escola e à tarde ia pra UnB. [...] Você
tem que se virar. Vida pessoal, então... ou você tira abono, ou, quando você está no
limite, igual muita gente faz, atestado. Porque não tem outra solução (Entrevistado
B).
O tema foi subdividido assim em quatro subtemas, a retratar as Relações com os
alunos, com os familiares dos alunos, com a vida privada e com os pares.
39
Tabela 3 – As Relações do Professor
ESCOLA PÚBLICA A
(Entrevistados)
AS RELAÇÕES DO
PROFESSOR
S
U
B
T
E
M
A
S
ESCOLA PÚBLICA B
(Entrevistados)
Total
(frequência)
A
Masc
B
Fem.
C
Fem.
D
Fem.
E
Fem.
F
Fem.
G
Masc
H
Masc
Com os alunos
4
6
2
5
3
3
8
4
35
Com os familiares do
aluno
4
7
2
4
3
3
3
4
30
Com a vida privada
2
2
4
3
0
2
4
7
24
Com os pares
4
4
1
3
2
5
2
2
23
Menos citada, as “Relações com a vida privada” tiveram uma frequência de 12
ocorrências e retratou as percepções individuais e estratégias de enfrentamento dos obstáculos
com vistas ao alcance de objetivos e aspirações que melhor definissem o seu papel e atuação
como provedor financeiro e afetivo-emocional da família, como cidadão e como profissional.
É bem desgastante, porque eu acabo tendo, assim... então meu dia começa às 07h00,
08h00 da manhã e vai até meia noite ou, às vezes, até 01h00 da manhã. [...] meu
marido tem colocado que é bem desgastante, porque desgasta um pouco até o
relacionamento. Você fica estressada, você fica sem paciência. [...] Porque, às vezes,
você tenta controlar aquilo que você não pode fazer aqui com os meninos, e aí a
válvula de escape estoura em casa (Entrevistado C).
Numa escala descendente, os três subtemas mais citados foram: “Relações com os
alunos”, “com a família” e “com os pares”, citadas, respectivamente em 35, 30 e 23 ocasiões.
As “Relações com os alunos” foram descritas como causadoras de sentimentos de
tristeza e decepção, mas igualmente de orgulho e satisfação. De forma unânime, o desrespeito
para com os mestres foi tratado como um grande problema enfrentado em sala de aula,
condição esta que, somada à falta de objetivo e comprometimento da grande maioria do
alunado, contribui para o desestímulo e um sentimento de impotência frente às vicissitudes da
profissão.
[...] muitas vezes tem crianças até violentas, de chegar a nos enfrentar, xingar
mesmo. De chegar mesmo no professor e falar coisas assim que você não acredita.
[...] Tem alguns que são agressivos, outros não te respeitam, demoram a te ouvir ou
acatar aquilo que você colocou (Entrevistado C).
[...] Se o aluno vier com grosseria (isso aqui é muito comum, xingar professor!), se
você for se ofender com cada xingamento que você recebe, no outro dia você está
pedindo as contas (Entrevistado G).
40
[...] Eles são danados, te xingam de não sei o que e saem pela porta como se nada
tivesse acontecido. [...] Eles podem te xingar aqui, querer chutar sua perna,
entendeu... e querer causar maiores problemas, mas saiu da porta pra fora é “oi
professor”, como se nada tivesse acontecido (Entrevistado G).
Paralelamente, e por poucas que sejam, as demonstrações de gratidão pelo esforço,
paciência e obstinação dos professores sensibilizam a ponto de motivar alguns a permanecer
na vida docente em face da certeza de que, apesar das inúmeras dificuldades, o professor
ainda exerce importante papel na formação cidadã.
[...] Eles falam que quando eu explico a matéria é como se eu tivesse carimbado na
cabeça deles. Isso pra mim é um elogio quando eles falam isso. Eles falam que eu
sou brava, porque eu sou exigente. [...] Então, eu me dou bem com os alunos. Eu
falo pra eles que eu sou chata, mas eles não acham. Não sei se é por que... Eu me
acho chata porque eu cobro demais deles. Porque eu dou aula do jeito que eu queria
que dessem aula para as minhas filhas. [...] tanto que tem alunos que já estão no
ensino médio e falam assim: “Professora, eu me lembro de tudo que você me
ensinou!” Isso pra mim é o máximo. Eu adoro ouvir isso! (Entrevistado B).
Tem alguns que são agressivos, outros não te respeitam, demoram a te ouvir ou
acatar aquilo que você colocou. [...] Como eu já fiz 20 anos de profissão, alguns vêm
e falam que já são mães e pais de família, que já estão trabalhando, que já são
formados. Estudaram e já estão dando aula, ou trabalham em algum lugar e me
reconhecem e falam: “Você já foi minha professora!” Aí eu falo: já. Não lembram o
nome, mas sabem que é a professora de artes. Isso marcou bastante (Entrevistado C).
[...] Mas é uma relação assim... bem tradicional. Da professora que ensina, que
orienta, que ouve as perguntas, que responde, mas que exige o trabalho dele, a
disciplina dele, o respeito com os outros (Entrevistado E).
Alvo de reiteradas reclamações e apontada pelos docentes como um dos principais
motivos do fracasso escolar de grande maioria dos alunos, a família – aqui representada
hegemonicamente pelos pais – peca, no entender daqueles profissionais, pela falta de
comprometimento, pelo “abandono” dos filhos na escola e pela quase total ausência no
processo educativo. Paralelamente, segundo relatos, sobram por parte desses pais acaloradas
manifestações de cobrança em relação aos professores por conta de desempenhos finais pouco
satisfatórios de seus filhos.
[...] Os poucos que eu recebi no começo da semana, eles chegaram aqui muito
cheios da razão, querendo brigar e isso me causou um certo receio dos pais. Precisei
até falar para um pai que, se ele tinha a intenção de me agredir, eu iria pedir ajuda
pro guarda. Eu acho que eles passam muito a mão na cabeça. O filho está errado, o
filho agrediu, o filho já tem cinco, seis ou sete advertências por escrito, até chegar
naquela suspensão. E ele vem aqui falar que o filho está certo. E ainda brigar.
Querer brigar e tomar satisfação. Então eu acho que a minha relação com esses pais,
não tem que ser boa (Entrevistado D).
Eu acho que a família tem deixado muito de vir à escola. Nós temos procurado fazer
algumas... como é que fala... algumas apresentações de oficinas da escola integral
para que os pais participem mais, venham mais à escola, percebam a importância da
família, da escola. E a gente percebe que quando a família está envolvida, quando a
família se preocupa com seus filhos na escola, esses alunos sempre têm um
desempenho melhor. E aquelas que não têm tempo, que não podem ou dizem que
41
não têm tempo, os alunos são mais, é... A gente percebe que não tem o suporte
familiar firme. Eles são mais vulneráveis dentro de escola. Eles tiram notas menores,
eles não dão muita importância para os estudos, eles brincam mais, não têm tanta
responsabilidade (Entrevistado F).
Às vezes você tem apoio dos pais, a maioria das vezes não. A escola nesse ponto é
até interessante, porque a escola corre atrás dos pais e muitas vezes os pais,
justamente os pais dos mais problemáticos, não procuram, abandonam o filho na
escola. Então, pra muitos, isso aqui é depósito. Põem o menino na escola e
abandonam. E não é bem assim! A escola é uma parceria: família/escola. É o que eu
estava te falando, a escola está assumindo os dois papéis. É uma pena, mas é
verdade. Aí sobrecarrega (Entrevistado G).
Na percepção dos professores, o exogrupo família é categorizado pelos estereótipos de
descompromisso, omissão e geradora de violência. Dessa forma, acusam os pais de não
assimilarem os valores sociais de respeito e hierarquia, tão importantes na representação
antiga do sistema educacional, momento este que a identidade social do professor, apesar da
desvalorização histórica, era respeitada pela sua importância na construção de cidadãos.
Os docentes não se dão conta que naquele momento histórico havia uma violência
consentida pelo método de ensino e pelo sistema que centrava o poder na figura do professor,
dos pais, das autoridades. As violências eram justificadas como disciplinadoras, que
ajustavam os alunos para uma submissão ao regime vigente.
Segundo Tajfel (1982, p.155) “o processo de categorização é o molde que dá forma às
atitudes intergrupo, enquanto a assimilação dos valores e das normas sociais é o seu
conteúdo”. O terceiro processo cognitivo que intervém na formação e manutenção dos
estereótipos é a procura de coerência.
Este processo compreende como uma pessoa atribui causalidade de forma satisfatória
às mudanças sociais intra e intergrupos, nas situações cotidianas. Um indivíduo integra vários
grupos e as relações sociais o colocam em situação de mudança, gerando uma necessidade de
compreensão. Dessa forma, a pessoa faz atribuições de causalidade sobre os processos
responsáveis pela mudança, visando preservar a sua autoimagem e integridade.
Na procura de coerência, em situação de conflito e mudança social, a pessoa atribui
causalidade às características inerentes ao grupo. Desloca a responsabilidade da mudança do
indivíduo para o endogrupo, ou deste para o exogrupo, mantendo a coerência de si mesmo e
de suas relações. No caso dos nossos participantes, a responsabilidade pelo fracasso do
sistema escolar é deslocada para os exogrupos – família e alunos – que não assumem seus
papéis sociais predestinados pela historicidade do sistema educacional. Assim, os professores
preservam sua autoestima, já bastante abalada, e tentam resgatar uma autoimagem de
competentes e coerentes na sua postura profissional (GALVÃO, 2009).
42
Ao mesmo tempo, ao tomarem a si próprios como parâmetro comparativo, forjam os
professores, ainda que de forma implícita e não categórica, uma concepção que prima por
justificar pretensa superioridade do docente sobre os demais componentes da comunidade
escolar.
[...] se quer ver uma coisa que é velada, é professor! O servidor, muitas vezes, se
coloca numa situação de inferioridade, e muitas vezes você tem que intervir. Você
tem que se impor para impedir que um servidor seja menosprezado, colocado de
lado ou mesmo achincalhado. Já participei de alguns embates pesados, e agora com
as terceirizações então... [...] eu já vi muito isso acontecer, principalmente em função
da condição socioeconômica. Professor é colocado como superior e os outros,
inferiores (Entrevistado H).
No tocante à relação entre os pares, surgem, primordialmente, relatos que apontam
falta de coesão e de consciência grupal, o que contribui para a ocorrência de certo isolamento
e, por conseguinte, de exaustão do processo didático-pedagógico. Não há uma regular adesão
do corpo docente a atividades extracurriculares - que apenas ocorrem esporadicamente restringindo-se assim as oportunidades de se trabalhar o processo educativo de forma conjunta
e multidisciplinar.
A relação dos professores é bacana. Aqui no colégio o clima é bom. Existe uma
separação entre os professores da manhã e os professores da tarde. Culpa dos
professores? Não. Nem dos da manhã, nem nos da tarde. O problema é de
administração, de direção, entendeu? [...] pra você ter uma ideia, sábado agora teve
uma festa à fantasia para ajudar na formatura dos alunos da 8ª série, e lembrando
que a 8ª série estuda de manhã. E aí se dividiu a turma dos professores, para
trabalhar... Toda a galera que trabalha à tarde veio no horário certinho, cumpriu
certinho, e o pessoal que trabalha de manhã, eles não vieram. E depois não te dá
uma justificativa, não faz uma reunião para avaliar como foi a festa. [...] Mas aí, é
aquela história, os professores, não porque eu trabalho à tarde, mas o grupo da tarde
é bem mais tranquilo de trabalhar, bem mais fácil de aceitar as coisas. Participa mais
(Entrevistado A).
Eu prefiro lidar mil vezes com o aluno do que com o próprio colega. Porque com o
colega é sempre mais difícil de lidar. Ele não aceita opiniões. Uma coisa que eu acho
muito difícil de trabalhar em coordenação é isso: o professor tem uma falha e
quando você vai... leva tudo pelo lado pessoal. Você não consegue desenvolver um
trabalho para melhorar a qualidade de ensino, porque o colega te vê como um
crítico, não como um parceiro, pra ele melhorar o trabalho dele. E aí acaba... como
tem muito essa liberdade de o professor fazer o que ele quer em sala de aula, na
matéria dele, você fica limitada. O seu trabalho fica muito restrito. Não tem muito
como você colaborar com a melhoria pedagógica na escola hoje. Na rede pública eu
não vejo (Entrevistado B).
Os relatos destacam que as relações do professor são vivenciadas em um “cenário”
repleto de adversidades: divergências intergrupais; desvalorização profissional e falta de
apoio institucional; omissão das famílias e falta de comprometimento por parte dos alunos;
adversas condições socioeconômicas e culturais das comunidades, etc.
43
Sob tais efeitos, prevalecem o imobilismo e a atuação destituída da consciência de
grupo, que isola as atuações, inibe a troca de experiências e conhecimentos e compartimenta e
empobrece o processo educacional.
Não obstante tal constatação pelos próprios docentes, ainda é visível um sentimento
corporativista entre os integrantes da categoria. Relatos dão conta da existência de uma
prática diária – e quiçá inconsciente - voltada à proteção frente a questionamentos exogrupais.
Tal reação auto-protetiva, conforme sugere Tajfel (1991 apud ÁLVARO e GARRIDO, 2006,
p. 282), ocorre em três situações: a) quando o grupo se encontra em situação ambígua ou
marginal, e por isso tem dificuldade de definição de um lugar no sistema social; b) quando
ocupa, por consenso, uma posição de superioridade, mas se imagina ameaçado por alguma
mudança ou por um conflito de valores intrínseco à sua condição de superioridade; e c)
quando foi definido, também por consenso, como inferior, entretanto reconhece que tal
situação não é legítima ou tem consciência de que é possível mudá-la.
O fato de A Violência Escolar haver sido o segundo tema mais citado nas entrevistas,
numa frequência de 35,60%, demonstra sua importância na perspectiva do docente. Tido
como um dos grandes desmotivadores do exercício da profissão, a violência é tema
permanentemente explorado pelos meios de comunicação de massa.
Jorge Werthein, em apresentação elaborada para a obra “Desafios e Alternativas:
violências nas escolas”, assim instruiu:
Com efeito, a escola espelha as condições sociais em que está inserida. Localizada
muitas vezes em meio à violência, reflete as tensões e os conflitos dos grupos à sua
volta e dentro dela. Com isso, conhece a dilaceração dos seus processos sociais e se
torna objeto da mídia quando crimes e contravenções de repercussão ocorrem no seu
âmbito ou as suas consequências chegam ao seu interior. No entanto, embora os
meios de comunicação e massa se especializem, não raro, nos acontecimentos
retumbantes, que rendem audiência, uma visão mais serena da escola nos ensina que
a violência é mais difundida e menos espetaculosa do que se costuma pensar.
Pequenos grandes atos de violência simbólica e física, como a intimidação de alunos
e professores, o desrespeito à diversidade e a força de estereótipos e preconceitos
tornam insuportável a vida de muitos dos membros das escolas, cotidianamente,
num processo surdo, que não chega a ser captado pela comunicação de massa.
(WERTHEIN, 2003, p.7)
Objetivando compreender mais precisamente as vivências do professor em situação de
violência escolar, foram os entrevistados incentivados a oferecer opinião acerca dos papéis
(autor, vítima ou espectador) frequentemente assumidos por eles próprios, pelos pares, pela
instituição, pelos alunos e pelas famílias.
Também objetivando precisar as concepções compartilhadas sobre o real significado
de violência, foi o grupo submetido a questões que o levou necessariamente a mensurar
44
aspectos como a negação do papel de agente da violência; da possível ocorrência de
generalizada estigmatização e de outras violências praticadas por grupos no ambiente escolar;
da real definição e de eventual confusão conceitual entre violência e brincadeira. Foi
solicitado ainda a tipificação das violências vivenciadas e informações quanto aos locais em
que ocorriam com maior frequência.
Tabela 4 – A Violência Escolar
A VIOLÊNCIA
ESCOLAR
ESCOLA PÚBLICA A
(Entrevistados)
A
B
C
D
Masc Fem.
Fem.
Fem.
ESCOLA PÚBLICA B
(Entrevistados)
E
F
G
H
Fem.
Fem. Masc Masc
Total
(frequência)
O docente
6
2
3
2
5
3
11
11
43
Os alunos
2
1
3
3
3
4
4
2
22
A instituição
1
1
4
2
2
1
4
1
16
A família dos
alunos
2
1
2
2
2
1
2
1
13
Os pares
2
1
0
0
4
1
0
4
12
Definição
1
3
3
2
1
2
2
2
16
A
T
O
R
E
S
S
U
B
T
E
M
A
Grupos
2
1
0
1
0
1
4
5
14
A
S
S
P
Negação do papel
de agente de
violência
1
0
2
4
0
2
2
0
11
Estigmatização
1
1
2
0
0
1
2
4
11
1
2
0
1
1
1
0
1
7
O
Violência vs.
Brincadeira
S
Tipificação
0
0
0
1
1
1
1
2
6
Locais /
Momentos de
Ocorrência
0
0
0
1
1
1
2
0
5
E
C
T
De modo geral o professorado se percebe como destituído de conhecimento e
habilidades necessárias ao enfrentamento da violência escolar da qual, segundo os relatos,
sentem-se comumente vítimas ou meros espectadores.
45
Eu acho que sempre mais como espectador. Porque eu não vejo professor sendo
agente de discriminação. E como sendo também vítima? Não. Eu acho que é muito
mais como espectador e tentando fazer um trabalho em cima disso. Mostrando
sempre algo positivo. Sempre trabalhando... Não, como agente não (Entrevistado F).
No geral, ela (a família) acaba se tornando a vítima, mas, na verdade, o agente
causador foi ela. Essa violência toda... a desestruturação da família é que está
causando essa violência toda. Então, na verdade, ela inconscientemente está sendo
vítima, mas porque ela foi a causadora dessa situação (Entrevistado G).
A constatação merece a devida valoração. Enquanto fenômeno sócio-histórico e
cultural, a violência reveste-se, no senso comum, de uma falsa percepção de naturalização
(Cardoso, 2010). Nesse sentido, o mero reconhecimento da presença da violência em
ambiente escolar – ou mesmo a sua caracterização como algo natural e inerente a determinada
comunidade – sem uma necessária ação voltada para o seu combate, contribui para a
perpetuação dessa violência.
[...] é necessário, na formação básica, enfatizar a aquisição de instrumentos de
promoção de mudanças positivas, de avaliação de novas idéias e de novas práticas e
de desenvolvimento da confiança profissional do professor. Esses programas devem
prepará-los para colaborar com as famílias, com os administradores, com as
comunidades e com os profissionais de saúde mental. A formação inicial e
continuada deve abrir espaço à participação nos problemas reais, vividos nas escolas
e na comunidade (BLOOM; BACON, 1995, apud ROYER, 2003, p.72).
Não podemos esquecer que quem se omite pratica igualmente uma ação, uma ação de
cunho omitivo, que funcionará nesse sentido mais malevolamente que uma reação pontual e
imediata a uma agressão física ou verbal sofrida. A reação imediata, mesmo que de forma
também violenta, não obstante aparentar ser o acirramento de um ato particular de violência,
representa acima de tudo uma resposta, uma demonstração de desacordo.
Por outro lado, a omissão ecoa como temor, covardia, submissão, acatamento e
incapacidade de indignação, de repulsa a um ato que, aparentemente, é tido como justificável
por quem o pratica e aceitável por quem o aprecia ou simplesmente o observa sem oferecer
qualquer resistência. “É preciso mudar representações sociais para que se possam transformar
práticas e concepções pessoais. Entretanto, qualquer mudança social depende de mudanças
pessoais, evidenciando a dinâmica individual e social” (Cardoso, 2010, p. 40).
Ao não compreender o fenômeno da violência escolar em sua real magnitude e
complexidade, corre-se o risco de, um tanto primitivamente, querer enfrentá-la com ela
própria, na forma de ameaças, punições, expulsões, etc., eternizando-a e banalizando-a, como
vem sendo feito secularmente pelas sociedades. Para Cardoso (2010), em outras épocas, ações
violentas contra crianças e adolescentes eram práticas utilizadas como medida disciplinar,
garantidoras mesmo de obediência aos adultos e respeito à autoridade paterna. O surgimento
da Psicologia e da Pedagogia, o desenvolvimento da Medicina, assim como uma melhor
46
capacitação de legisladores contribuiu para uma nova e mais ampla compreensão do
problema.
A efetiva resposta, todavia, deve envolver necessariamente uma série de políticas
públicas, além de uma análise individual acerca de até onde nossos pensamentos e ações não
estão contribuindo para imprimir uma maior dinamicidade e perenidade ao fenômeno.
O tema Adoecimento Profissional versou sobre o adoecimento físico e psíquico do
docente. No tocante ao primeiro aspecto, foram citados a hipertensão e males nas cordas
vocais, na coluna vertebral, e nos pés e pernas. Quanto ao aspecto psíquico, foi percebido um
processo de negação da existência do adoecimento. As entrevistas “denunciaram” a presença
de fatores indicativos de desgaste/esgotamento profissional e confirmaram o adoecimento
psíquico em algum momento da carreira. O tema buscou investigar igualmente a obtenção ou
não de suporte institucional em caso de adoecimento.
Tabela 5 – O Adoecimento Profissional
O ADOECIMENTO
PROFISSIONAL
ESCOLA PÚBLICA A
(Entrevistados)
ESCOLA PÚBLICA B
(Entrevistados)
Total
(frequência)
A
Masc
B
Fem.
C
Fem.
D
Fem.
E
Fem.
F
Fem.
G
Masc
H
Masc
Adoecimento físico
1
1
2
0
0
0
0
2
6
Adoecimento psíquico
0
0
3
3
1
2
1
0
10
X
X
X
X
Existência de Suporte
Institucional
Sim
Não
X
X
X
X
Problemas de natureza física foram relatados por 50% dos entrevistados. Desse total,
75% (incluído aí as duas mulheres) disse ter sido acometido de hipertensão e/ou problemas
nas cordas vocais. O outro entrevistado, do sexo masculino, informou apresentar problemas
de ordem do aparelho locomotor (coluna vertebral, pés e pernas), os quais identificou como
advindos de condições ergonômicas desfavoráveis.
Os dados demonstraram uma considerável ocorrência de adoecimento psíquico dos
profissionais, maior mesmo que de adoecimento físico. A partir dos relatos foi possível
concluir pela permanente exposição a fatores que contribuem para o desgaste ou esgotamento
47
profissional em 62,5% dos entrevistados, condições estas que acarretaram o adoecimento
psíquico, em algum momento da carreira, em 37,5% da totalidade dos entrevistados. Os
37,5% de entrevistados que negaram estar submetidos a condições psíquicas adversas no
ambiente de trabalho, negaram igualmente haverem sido acometidos por quaisquer dos males
de âmbito psíquico.
Eu estou com problema vocal, isso porque eu fico mais tempo brigando em sala de
aula, chamando atenção. Aí eu acabo tento que falar mais alto do que realmente
dando aula. [...] Eu tive problema de pressão alta [...] Minha pressão era baixíssima,
até na gravidez não tive problema nenhum. Aí depois disso veio o lado emocional, e
eu não tenho nada no coração, mas tá mais emocional do que realmente uma coisa
física. Então você tá tranquila aqui e de repente acontece uma briga, xingando um ao
outro, muda aquele clima todinho e vem aquele desgaste.
No que tange ao suporte institucional os relatos explicitaram uma permanente
sensação de desamparo compartilhada pelos docentes. Apontaram também para a
desconfiança dos pares e demais membros do processo educativo quanto à credibilidade da
licença ou do afastamento solicitado pelo professor.
48
8
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Qual o papel da escola na sociedade contemporânea? Qual a significação dada ao
professor, considerando ser ele um dos atores do processo educacional? Não seria o processo
educativo caracteristicamente “disciplinador”, e por tal, limitador da espontaneidade e da
capacidade criativa dos indivíduos? Até onde, na modernidade, não continuamos a reproduzir
uma estrutura de dominação socioeconômica e cultural conveniente aos “donos do poder”? As
relações pais/filhos e professor/aluno deixam de reproduzir essa dinâmica de dominação?
Para cada resposta, outras inúmeras perguntas.
Na análise efetuada por Nóvoa (1991) os paradigmas que nortearam a profissão
encontram-se já em desuso. A evolução social e as mudanças sofridas pelos sistemas
educacionais transformaram os grandes ideais da época áurea da profissão em algo obsoleto,
condição esta que impõe ao professorado a busca por novos valores que imprimam maior
sentido e importância à atividade docente e que os habilite a uma ação mais efetiva perante a
realidade vivenciada.
Os professores encontram-se numa encruzilhada: os tempos são para refazer
identidades. A adesão a novos valores pode facilitar a redução das margens de
ambiguidade que afetam hoje a profissão docente. E contribuir para que os
professores voltem a sentir-se bem na sua pele... (NÓVOA, 1991, p. 27)
É preciso contrariar a lógica de uma “passagem pelo ensino”, à espera de encontrar
uma coisa melhor: “Se há falta deles; se até se ganha uns trocos (oh tempo! oh
chances!) enquanto não se arranja outra coisa mais... enfim...; se até o desemprego
diminui...” (Costa, 1989). Até porque esta espera, eterniza-se muitas vezes,
mantendo no ensino professores a contragosto, que buscam uma identidade (pessoal
e social) noutras atividades. (NÓVOA, 1991, p. 23)
O professorado é, assim, “chamado” a intervir nessa nova realidade profissional. É
necessário trabalhar uma redefinição de sua identidade social. A contemporaneidade da
profissão, todavia, está a apresentar diferentes perspectivas e renovados desafios a serem
vencidos, um dos maiores deles a violência, presença constante e muitas vezes silenciosa no
ambiente escolar.
O acirramento das condições adversas de trabalho, adicionado a um sentimento de
incapacidade de contribuir para a transformação da realidade vivenciada, tem imposto a
muitos docentes uma única opção: a fuga. Para quem persiste, e pretende a reversão de tais
condições e, por conseguinte, a valorização pessoal e profissional e o respeito da comunidade
escolar, a tarefa se mostra bem árdua.
Restará a estes a busca por uma formação continuada, que os permita efetuar uma
compreensão mais racional do mundo e do ambiente escolar de forma a trabalhar
49
efetivamente na adoção de um novo projeto pedagógico, mais democrático e adequado à
realidade vivenciada pelas famílias. Um projeto que prime pela práxis, que tenha por objetivo
a formação de cidadãos aptos a ações transformadoras. Esse, talvez seja o primeiro passo para
uma nova construção identitária.
Para Bloom e Bacon (1995 apud ROYER, 2003, P.72):
[...] é necessário, na formação básica, enfatizar a aquisição de instrumentos de
promoção de mudanças positivas, de avaliação de nova idéias e de novas práticas e
de desenvolvimento da confiança profissional do professor. Esses programas devem
prepará-los para colaborar com as famílias, com os administradores, com as
comunidades e com os profissionais de saúde mental. A formação inicial e
continuada deve abrir espaços à participação nos problemas reais, vividos nas
escolas e na comunidade.
A pesquisa evidenciou a forma como os docentes vivenciam suas relações em contexto
de violência escolar e as dificuldades experimentadas no dia a dia da profissão no sentido da
adoção de práticas voltadas à transformação dessa realidade.
O estudo acerca da historicidade da atividade docente no Brasil mostra claramente que
a perda de status não é um fenômeno recente, mas gradativo e inaugurado mesmo com a
instituição da atividade. Atualmente, as proporções desse desprestígio atingem níveis
insuportáveis para grande maioria dos profissionais entrevistados, notadamente em face das
novas modalidades de violência vivenciadas.
A falta de preparo para enfrentar essa realidade faz com que se sintam desestimulados
a continuar na profissão. Percebem-se cobrados a assumir papéis e responsabilidades outras,
incompatíveis com suas atividades e remuneração e cabíveis unicamente às correspondentes
famílias.
No que tange às famílias, prepondera entre os docentes um sentimento de menos valia,
de irresponsabilidade para com a formação humana e educacional de seus filhos, os quais são
deixados à própria sorte ou “abandonados” na escola. Assim, quando afrontados por essas
famílias, sentem-se impelidos a realizar uma comparação, considerando-se superiores, melhor
qualificados, isentos de responsabilidades e desobrigados de justificar ou dar explicações
sobre suas atividades.
No que diz respeito a outras categorias de trabalhadores, mesmo aquelas externas à
comunidade escolar, sentem-se injustiçados, desqualificados e, mais ainda, desvalorizados
profissionalmente, o que provoca na maioria a busca por uma mudança de identidade social.
Tal fato se justifica à luz da Teoria da Identidade Social de Tajfel, que ensina que os
indivíduos sentem-se compelidos a se desfiliar do grupo de pertença, em busca de melhores
perspectivas, quando já não fazem uma avaliação positiva daquele grupo.
50
Intimamente, todavia, o processo de desvinculação nem sempre é fácil ou possível,
considerando, como afirma Tajfel, a existência de fatores objetivos que o impeçam ou o
conflito com eventuais valores que a pessoa considera importante. Tanto assim que, apesar de
a insatisfação acompanhar os docentes desde longa data, muitos permanecem exercendo a
atividade, esperando a aposentadoria e prometendo a si próprios que depois de tal evento
conseguirão finalmente êxito em referido intento.
Historicamente, a violência sempre esteve presente nos ambientes de convivência
humana. Certamente tal violência também era perceptível em ambiente escolar, onde
imperava a educação pelo castigo ou por agressões físicas e morais. Seguindo a mesma
lógica, as famílias respaldavam tais práticas, a sociedade se imaginava pacificada e os
governos não eram questionados.
Na atualidade as formas de controle civil, inclusive aquela exercida pelas famílias,
mudaram sensivelmente por conta de uma maior complexidade das relações humanas e do
reconhecimento de direitos inerentes ao ser humano, indistintamente. Hoje já não mais
convence o tão decantado “respeito” de outros tempos, consequência direta de um
autoritarismo parental disseminado nas diversas camadas da sociedade. Segundo Paz (2003,
apud ABRAMOVAY, 2003, p.261):
Episódios recentes, ocorridos em várias escolas brasileiras e relacionados à questão
da violência, têm exigido, de nossa parte, uma compreensão que, se por um lado,
requer muita reflexão e estudo, por outro, demandam respostas imediatas. Alguns
desses casos, dos quais temos conhecimento pela imprensa, têm assumido uma
proporção tal que não podemos mais desconsiderar a urgência em tratá-los, pois
revelam a necessidade de se redefinir de forma explícita, os diversos papéis de cada
um dos envolvidos no trabalho escolar.
Os falsos dilemas que surgem quando enfrentamos, por exemplo, a discussão sobre
de quem são as responsabilidades pela educação dos jovens, se dos pais ou da
escola, também nos remetem a possíveis questionamentos sobre nossos verdadeiros
objetivos com a educação e, particularmente, com nosso projeto pedagógico.
Fazer uma releitura dos fenômenos sociais que rodeiam a atividade docente talvez seja
o primeiro passo para uma nova construção identitária do professor. É necessário que se
entenda a comunidade escolar como uma célula de relacionamento humano representativa de
uma sociedade muito mais complexa, repleta de contradições e onde imperam valores nem
sempre condizentes com anseios coletivos ou projetos individuais.
A retomada do tão desejado respeito profissional não poderá prescindir de uma
mudança de atitude e talvez mesmo de mentalidade da comunidade escolar. É imprescindível
que o processo educativo deixe de primar pela mera transmissão de conhecimento e que o
professor se torne um orientador. Para transmitir conhecimento a sociedade moderna já
51
disponibiliza uma série de meios e artefatos tecnológicos. A educação, todavia, não pode ser
“capitaneada” por máquinas. O processo de construção do indivíduo e, acima de tudo, de um
cidadão consciente, racional, crítico e capaz de uma práxis transformadora, que trabalhe para
a melhoria do seu ambiente de convivência, não pode prescindir da dialética da interação
humana, da troca e do questionamento direto acerca de experiências e saberes alheios.
A escola não é, assim, uma instituição neutra no processo de formação do indivíduo e
de construção de uma sociedade. Não pode se mostrar indiferente, se sentir impotente e muito
menos querer estar imune às “sequelas” de uma multifacetária e complexa realidade social. A
escola “molda” indivíduos e coletividade e, num processo de recíprocas influências, também é
conformada àquela determinada dinâmica social.
Nesse sentido, como poderia a escola se eximir de responsabilidades perante a
situação atualmente vivenciada em ambiente escolar? Até onde a educação oferecida às
crianças e adolescentes nos nossos dias reflete verdadeiramente suas aspirações ou contribui
para a formação de cidadãos íntegros, seguros de suas potencialidades e conscientes de suas
responsabilidades?
A discussão, por sua complexidade e importância, deve ser objeto de incessante
preocupação da comunidade científica e em especial dos profissionais da Psicologia.
Compreender os comportamentos humanos requer um prévio resgate da história de indivíduos
e de categorias ou grupos nos quais tais indivíduos se sentem inseridos. Nesse sentido, esperase, possa o presente trabalho contribuir para uma reflexão acerca da historicidade que envolve
e influencia as intricadas relações travadas entre alunos e pais, e destes com os profissionais
da educação.
Como estudioso do desenvolvimento emocional dos indivíduos, o psicólogo está
sendo chamado a oferecer uma contribuição cada vez maior. Sua atuação mais e mais
transpõe as paredes dos consultórios, suplanta as intervenções clínicas individualizadas e
alcança instituições públicas e privadas, onde os indivíduos já não respondem aos “estímulos”
do dia a dia com comportamentos padronizados.
52
REFERÊNCIAS
ABRAMOVAY, Miriam (Coord.). Escolas inovadoras: um retrato de alternativas. In:
DEBARBIEUX, Éric et al. Desafios e alternativas: violência nas escolas. Brasília: UNESCO
– UNDP, 2003. p. 258-276.
AB`SÁBER, Aziz Nacib. Primórdios da educação entre os homens: o papel dos
conhecimentos culturais primários na revitalização permanente do desenvolvimento humano.
Scientific American Brasil. Disponível em:
<http://www2.uol.com.br/sciam/artigos/primordios_da_educação_entre_os_homens.html>.
Acesso em 04 set. 2012.
ÁLVARO, José Luís; GARRIDO, Alicia. Psicologia social: perspectivas psicológicas e
sociológicas. São Paulo: McGraw-Hill, 2006.
BARBOSA, Luciane Muniz Ribeiro. As concepções educacionais de Martinho Lutero.
Educação e Pesquisa, São Paulo, v.33, n.1, jan./abr. 2007. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s1517-97022007000100011&script=sci_arttext>.
Acesso em: 10 mar. 2013.
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Brasil: Edições 70, 2011.
CARDOSO, Tereza Fachada Levy. Imagens sobre a profissão docente no mundo lusobrasileiro. Sisifo/Revista de Ciências da Educação, v.11, p. 55-64, jan./abr. 2010.
Disponível em: <http://sisifo. fpce.ul.pt>. Acesso em: 20 ago. 2012.
CARVALHO, Cláudia Maciel. Violência infanto-juvenil, uma triste herança. In: ALMEIDA,
Maria da Graça Blaya (Org.). A Violência na Sociedade Contemporânea. Porto Alegre:
EdipucRS, 2010 p. 40-41. Disponível em: <http://ebooks.pucrs.br/edipucrs/violencia.pdf>.
Acesso em: 10 ago. 2012.
CRESWELL, John W. Projeto de Pesquisa: Métodos qualitativo, quantitativo e misto. 2. ed.
Porto Alegre: Artmed, 2007.
DESCHAMPS, Jean-Claude. A identidade em psicologia social: dos processos identitários
às representações sociais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.
GALINKIN, Ana Lúcia; ZAULI, Amanda. In: TORRES, Cláudio Vaz; NEIVA, Elaine
Rabelo (Org.). Psicologia Social: principais temas e vertentes. Porto Alegre: Artmed, 2011. p.
253-261.
GALVÃO, Alexandre C. Os muros (in)visíveis do preconceito: um estudo das
representações sociais das pessoas que vivem com HIV/AIDS. Brasília, 2009. Dissertação
(Mestrado) – Universidade de Brasília.
HALL, Stuart; WOODWARD, Kathryn; SILVA, Tomaz Tadeu da (Org.). Identidade e
diferença: a perspectiva dos estudos culturais. 11. Ed. Petrópolis – RJ: Vozes, 2012.
53
MENDONÇA, Ana Waleska Pollo Campos. A Reforma Pombalina dos estudos secundários e
seu impacto no processo de profissionalização do professor. Revista Educação, v. 30, n. 02,
2005. Disponível em: <http://coralx.ufsm.br/revce/revce/2005/02/a2.htm>. Acesso em: 13
ago. 2012.
MIGUEL, Sylvia. Universidade, invenção ocidental. Revista Ensino Superior. 85. ed.
Disponível em:
<http://www.nacional.edu.br/grupodeestudos/docs/resumo_sobre_a_história_da_universidade
_no_mundo.pdf>. Acesso em: 03 out. 2012.
NÓVOA, Antônio (Org.) et al; Profissão professor. Porto Codex – Portugal: Porto Editora,
1991.
RABELO, Amanda Oliveira; MARTINS, António Maria. A mulher no magistério
brasileiro: um histórico sobre a feminização do magistério. Disponível em: <
http://www.faced.ufu.br/colubhe06/anais/arquivos/556AmandaO.Rabelo.pdf>. Acesso em 25
out. 2012.
SAVIANI, Dermeval. Formação de professores: aspectos históricos e teóricos do problema no
contexto brasileiro. Revista Brasileira de Educação, v.14, n. 40, p. 143-155, jan./abr. 2009.
TAMBARA, Elomar. Os Escritos Formadores da Profissional da Educação no Brasil..
Disponível em: <http://www.sbhe.org.br/novo/congressos/cbhe5/pdf/76.pdf>. Acesso em 12
ago. 2012.
54
APÊNDICES
APÊNDICE A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
O (A) Senhor (a) está sendo convidado (a) a participar como voluntário (a) da pesquisa
desenvolvida na Universidade Católica de Brasília, que discute as relações sociais no ambiente
escolar. O estudo tem por objetivo descrever as formas de expressão de interação social em escolas
públicas e privadas do Distrito Federal, tanto quanto seu impacto nas vivências dos diversos atores que
compõem o cenário escolar (diretores, professores e alunos). Abaixo, algumas informações
importantes para o seu conhecimento antes de aceitar este convite:
1.
Participam desta pesquisa os profissionais de instituição de ensino fundamental do Distrito
Federal, que serão convidados pessoalmente pelos próprios pesquisadores.
2.
Para conseguir os resultados desejados, a pesquisa será realizada por meio de entrevistas com
duração de 1 hora, aproximadamente, gravadas em áudio.
3.
A pesquisa é importante de ser realizada, pois deve trazer benefícios para ampliar a
compreensão dos aspectos sociais que medeiam a relação entre os atores sociais do ambiente escolar.
4.
Tem-se como benefício o desenvolvimento de ações pedagógicas e políticas educacionais que
favoreçam uma visão crítica da realidade social e colaborem para a construção de ações cidadãs.
5.
As informações obtidas neste estudo serão mantidas em sigilo, em posse dos pesquisadores,
que guardarão os materiais utilizados na pesquisa. No caso de divulgação em publicações científicas,
os dados pessoais dos participantes não serão mencionados.
6.
Os participantes têm liberdade de recusar a responder questões que lhes tragam
constrangimentos, de não participar ou de interromper a colaboração nesta pesquisa no momento em
que desejarem, sem necessidade de qualquer explicação. A desistência não lhes causará nenhum
prejuízo.
7.
Os participantes poderão, pessoalmente, tomar conhecimento dos resultados ao final desta
pesquisa com os pesquisadores.
DECLARO que me sinto convenientemente esclarecido (a) pelos pesquisadores, entendi o que
me foi explicado e consinto voluntariamente em participar desta pesquisa. Assino o presente
documento em duas vias de igual teor e forma, ficando uma em minha posse.
Brasília, _____ de _____________ de _______.
______________________________________________________________________
(Nome, idade, RG e assinatura do participante da pesquisa)
______________________________________________________________________
(assinatura do pesquisador)
Pesquisadores: Alyson Watanabe Girão (fone: 8120 0704); Elisete de Queiroz Oliveira
(fone: 9844 6123), Fabiana Soares Pereira (fone: 8465 3999); Mônica Bueno Ferreira da Silva Maia
(fone: 8494 6132). Orientador(a): Alexandre Cavalcanti Galvão CRP 6954/1, telefone: 9223 8708,
e-mail: [email protected].
55
APÊNDICE B – Roteiro de entrevista semiestruturada
Relação do professor consigo mesmo
1 - Conte-me um pouco da sua história como docente:
- tempo de trabalho
- significado da docência
- a escolha profissional
- conciliação da vida profissional com a pessoal
- planos para o futuro
- desafios no dia-a-dia
- como enfrenta esses desafios
- adoecimento profissional (estresse, depressão, baixa
autoestima)
- Teve apoio da instituição
3 – Em caso de preconceito e discriminação (violência
escolar), você se percebe como agente, vítima ou
expectador? Exemplos?
- Como você lida com isso?
Pessoas e grupos que estão envolvidos nesses episódios
Relação entre professores
Conceitos centrais
2 – O que você entende por preconceito e discriminação?
- Exemplos
- Quais as pessoas que sofrem mais preconceito e
discriminação?
- Acontece no ambiente escolar?
- Perguntar de grupos não citados (homossexuais, negros,
obesos, PNE, classe socioeconômica, diferenciação de
poder de consumo, de estética
Quando se fala em violência o que lhe vêm à mente?
- definição de violência
- caracterização na escola
- Quais os espaços físicos?
Quando se pode diferenciar uma violência, uma
discriminação de uma brincadeira?
- Exemplos
Relação do professor com o aluno
6 - Descreva a sua relação com os seus colegas.
8 - Descreva a sua relação com os alunos e
- Suporte mútuo
qualifique-a.
- Como os professores se referem a alunos problemáticos e - Percebe-se respeitado como professor?
bons conversando entre si.
- O que é autoridade para você?
- Percebe-se motivado com esta relação?
7 – Em caso de preconceito e discriminação (violência - Sente-se desafiado positiva ou negativamente?
escolar), você percebe os professores como agente, - Você trata pelo nome os seus alunos?
vítimas ou expectadores? Exemplos?
- Como eles lidam com isso?
9 – Em caso de preconceito e discriminação (violência
Pessoas e grupos que estão envolvidos nesses episódios
escolar), você percebe os alunos como agente, vítimas
ou expectadores? Exemplos?
- Como eles lidam com isso?
Pessoas e grupos que estão envolvidos nesses episódios
Relação do professor com a Instituição
4 - Como é dar aula nesta escola?
Como se deu essa escolha (por esta instituição)?
Como você percebe o suporte institucional ao professor?
- material e emocional
Como seria uma instituição ideal?
5 – Em caso de preconceito e discriminação (violência
escolar), você percebe a Instituição escolar como
agente, vítima ou expectadora? Exemplos?
- Como se lida com isso?
Pessoas e grupos que estão envolvidos nesses episódios
Relação do professor com a comunidade
10 - Descreva a sua relação com a comunidade/família.
- Como você os percebe no processo educacional?
- Quando em reunião de pais, sente-se pressionado quanto
aos seus métodos?
11 – Em caso de preconceito e discriminação (violência
escolar), você percebe a comunidade/família como
agente, vítimas ou expectadores? Exemplos?
- Como eles lidam com isso?
Pessoas e grupos que estão envolvidos nesses episódios
Dados sociodemográficos: idade; sexo; residência; estado civil; filhos; escolaridade; outros trabalhos; religião (praticante); renda familiar; tempo de serviço.
Download

Elisete de Queiroz Oliveira - Universidade Católica de Brasília