Magnetização Espontânea em Modelos de
Ising Uni-Dimensionais com Interação de
Longo Alcance
por
Leonardo Cavalcanti de Mélo
Orientador: Leandro Martins Cioletti
Brasília
2014
Leonardo Cavalcanti de Mélo
Magnetização Espontânea em
Modelos de Ising Uni-Dimensionais
com Interação de Longo Alcance
Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-Graduação
em Matemática da Universidade de Brasília como requisito parcial à obtenção do Título de Mestre em Matemática.
Orientador: Leandro Martins
Cioletti
Brasília
2014
Melo, Leonardo C.
Magnetização Espontânea em Modelos
de Ising Uni-Dimensionais com Interação de
Longo Alcance
89 páginas
Dissertação (Mestrado em Matemática).
Universidade de Brasília. Programa de PósGraduação em Matemática.
1. Modelo de Ising
2. Mecânica Estatística
I. Universidade de Brasília. Departamento de
Matemática.
Comissão Julgadora:
Leandro Martins Cioletti
UnB
Chang Chung Yu Dorea
UnB
Artur Oscar Lopes
UFRGS
Agradecimentos
Gostaria de agradecer a todos os colegas, alunos da matemática da
UnB, que alimentam um ambiente de discussão aberto e cooperativo na
instituição. O incentivo dos colegas foi muito importante para manter meu
ânimo durante o curso.
Agradeço a meus professores de álgebra, Elaine e Leandro. Minha
aprovação naquele curso se deve à ajuda deles. Agradeço também aos
“irmãos” de orientação Roberto, Jamer e Josimar por todas as discussões
matemáticas, mas também pelo miolo de pote.
Agradeço aos demais colegas de turma, com quem tive muitas oportunidades de conversar e aprender sobre matemática e outras coisas, especialmente às incentivadoras Lury e Chris. Também ao meu camarada
Valter, por vir à capital do cerrado e dar-me a oportunidade de conhecê-lo.
Ainda terei a chance de aprender um pouco de geometria com ele.
Agradeço ao professores que me guiaram neste curso e nos cursos prévios: Claus Akira, Gilberto Fernandes Vieira, Daniele Baratela, Pedro Roitman, Noraí Rocco, Ricardo Ruviaro, Cátia Gonçalves e Leandro Cioletti.
Agradeço aos envolvidos na administração da pós-graduação em matemática da UnB, especialmente à Bruna, que sempre esteve presente para
resolver todas as burocracias da forma mais simples possível. Também à
Profa. Liliane, coordenadora da pós-graduação durante boa parte do meu
curso, pela sua dedicação. Durante sua administração ela sempre procurou as melhores alternativas para permitir a mim e aos demais colegas
o máximo de tranquilidade com questões práticas para que pudéssemos
nos dedicar quase integralmente aos estudos. Devemos bastante a ela.
Agradeço a meus superiores no Ministério do Planejamento por admitirem a licença que me permitiu investir em minha formação. Foram responsáveis diretos por isso Márcio Oliveira e Luiz Guilherme Henriques.
Também aos colegas de trabalho por cobrarem a minha conclusão. Leila
Frossard foi a fiscal mais ativa e não me deixou atrasar mais um minuto.
Agradeço aos meus familiares, especialmente a Cássia, pela compreensão e apoio neste projeto. Envolvi-me neste curso a despeito da desaprovação de boa parte dos conhecidos. O valor que cultivamos pelos estudos
herdado de Bartolomeu e Beatriz me impulsiona a sempre procurar novidades. Simplesmente não tenho outra opção. Como está pichado no túnel
da 215 norte: “Opte por aquilo que faz seu coração vibrar” - Osho.
Agradeço ao meu orientador, Prof. Leandro Cioletti, pela sua paciên-
cia e solicitude. Desde que o conheci, vejo o Prof. Leandro trabalhar
incansavelmente, sempre animado com o próximo desafio. Obrigado por
admitir orientar-me, mesmo ciente das minhas restrições práticas. Obrigado também pelas inúmeras contribuições para melhorar este texto. Não
fosse seu suporte e incentivo, provavelmente eu não conseguiria concluir
este trabalho.
Resumo
Nesta dissertação de mestrado expomos alguns resultados clássicos
relativos ao modelo de Ising em uma dimensão. O tópico final é a existência de transição de fase nos sistemas com interações de longo alcance
(alcance infinito) cujo Hamiltoniano é formalmente dado por
H=−
X
i,j:i<j
1
σi σj
|i − j|α
com 1 < α < 2. A exposição desse tema é baseada na referência [5].
Com objetivo de manter o texto auto-contido, foram incluídos vários
capítulos introdutórios. Nesses capítulos iniciais são construídas algumas
ferramentas que permitirão a abordagem do tema principal no último capítulo. Todas essas construções são baseadas na literatura disponível e
não há inovações significativas. Dentre os tópicos preliminares apresentados estão a definição rigorosa do Modelo de Ising a volumes finitos, bem
como do modelo de Curie-Weiss e do modelo Hierárquico. Para o modelo
de Curie-Weiss a magnetização e a temperatura crítica são calculados explicitamente.
Também são apresentadas as demonstrações para: algumas desigualdades de correlação; a existência do limite termodinâmico da magnetização de modelos ferromagnéticos; e uma relação entre a magnetização
quadrática e a magnetização espontânea.
Palavras-chave: Modelo de Ising unidimensional, Modelo de Curie-Weiss,
Modelo Hierárquico, Sistemas ferromagnéticos, Desigualdades de correlação, Magnetização quadrática, Transição de fase.
Abstract
In this master thesis we present some classical results relative to the
one-dimensional Ising model. The main subject is the existence of phase
transition in systems with long range interactions (infinite range) and
Hamiltonian formally given by
H=−
X
i,j:i<j
1
σi σj ,
|i − j|α
where 1 < α < 2. The exposition of the main theme is completely based on
the reference [5].
Aiming to keep this text self-contained, we included some introductory
chapters. In these background chapters we build some tools needed to
handle the main theme on the last chapter. All of these constructions are
based on the available literature and no important innovation is added.
Among these preliminary topics are rigorous definitions of the Ising, CurieWeiss and Hierarchical models. The exact value of the magnetization
and the critical temperature are explicitly computed for the Curie-Weiss
model.
We also provided the proofs for: some correlation inequalities; existence of the thermodynamic limit for magnetization in ferromagnetic models; and the relation between mean-squared magnetization and spontaneous magnetization.
Keywords: One-dimensional Ising Model, Curie-Weiss model, Hierarchical model, Ferromagnetic systems, Correlation Inequalities, Mean-squared
magnetization, Phase Transition.
Apresentação
O texto está dividido em 4 capítulos. O Capítulo 1, de introdução, traz
um breve histórico referente ao modelo de Ising, define o modelo em uma
caixa finita Λ ∈ Z e cita alguns dos principais resultados referentes a esse
modelo.
O Capítulo 2 trata de alguns resultados básicos importantes, exibindo
demonstrações das três desigualdades de correlação de uso recorrente
neste texto, as Desigualdades de FKG, GKS-2 e GHS. As duas primeiras
citadas desigualdades, são utilizadas nas últimas seções desse capítulo
para demonstrar a existência do limite termodinâmico da magnetização.
Também é demonstrada uma relação entre a magnetização quadrática e
a magnetização específica, que será importante para o desenvolvimento
seguinte.
O Capítulo 3 trata dos modelos de Ising com interação translacionalmente invariante. Há um tratamento extensivo do modelo de Curie-Weiss
para o qual são calculadas analiticamente as seguintes funções termodinâmicas: pressão, energia livre e magnetização. Também é obtido rigorosamente a temperatura crítica e demonstrado que a magnetização nesse
modelo nunca é inferior à magnetização de um outro modelo de Ising arbiP
trário com M0 = i Jij constante, desde que a constante M0 seja a mesma
em ambos os modelos. Esse último resultado garante a existência de uma
região de temperaturas onde magnetização no modelo de Ising é nula para
todos os sistemas somáveis (M0 < ∞), em outras palavras, garante que a
temperatura crítica é finita.
Por último, são apresentados outros modelos com interação do tipo lei
de potência, Jij = J(|i − j|) = |i − j|α . São citados os resultados já conhecidos em 1969 sobre os modelos com esse tipo de interação, bem como
consequências desses resultados a um espectro maior de modelos.
O Capítulo 4 traz a demonstração primeiramente apresentada em [5]
da positividade da magnetização quadrática abaixo de uma temperatura
crítica positiva em modelos com interação de longo alcance da forma
Ji,j = |i − j|α , desde que 1 < α < 2. Aspectos do Modelo Hierárquico utilizados na demonstração serão vistos em detalhe. Nesse capítulo são usados os resultados do Capítulo 2 para demonstrar que a positividade da
magnetização quadrática a campo externo nulo implica na positividade
da magnetização espontânea. Juntando com as conclusões do Capítulo 3
a respeito do Modelo de Curie-Weiss, vamos concluir que qualquer modelo
com 1 < α < 2 tem temperatura crítica positiva e finita.
Sumário
1 Contextualização
1.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . .
1.2 Histórico . . . . . . . . . . . . . . . . .
1.3 Definição do Modelo a Volume Finito
1.4 Resultados Clássicos . . . . . . . . . .
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1
1
1
3
7
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11
11
12
28
29
34
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39
39
40
41
47
53
58
65
67
4 Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
4.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
4.2 O Modelo Hierárquico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
4.3 Comparando os Modelos Hierárquico e de Ising . . . . . . . .
4.4 Magnetização Quadrática e Magnetização Espontânea . . . .
4.5 Magnetização Quadrática Não-nula em Baixas Temperaturas
69
69
70
76
77
80
Referências Bibliográficas
87
2 Propriedades Gerais
2.1 Introdução . . . . . . . . . . . .
2.2 Desigualdades de Correlação .
2.3 Condições Exteriores . . . . . .
2.4 Magnetização a Volume Finito
2.5 Algumas Propriedades de SN /N
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3 Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
3.2 Modelo de Curie-Weiss . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
3.3 A Pressão do Modelo de Curie-Weiss . . . . . . . . . . . . .
3.4 Curie-Weiss e a Derivada da Pressão . . . . . . . . . . . . .
3.5 Magnetização Espontânea no Modelo de Curie-Weiss . . .
3.6 Comparação de um Modelo de Ising com Curie-Weiss . . .
3.7 Acoplamento Jij = |i − j|−α : Casos α ≤ 1 e α > 2 . . . . . . . .
3.8 Comparando Modelos com Interações do Tipo J(|i − j|) . .
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Capítulo 1
Contextualização
1.1
Introdução
Este capítulo trata dos aspectos históricos e das definições a serem usadas por toda a dissertação. A seção 1.2 traz uma breve apresentação do
meio histórico e dos problemas físicos que deram origem ao modelo de
Ising. A seção seguinte, 1.3, traz a definição formal do modelo em uma
caixa finita e define outras estruturas importantes para a apresentação
posterior, como a magnetização específica. A última seção do capítulo,
1.4, elenca alguns resultados importantes relativos ao modelo de Ising,
tanto em uma dimensão (tema deste texto), como em dimensões maiores.
1.2
Histórico
A partir do século XX a compreensão dos materiais magnéticos tem sido de
grande importância para o desenvolvimento tecnológico da humanidade.
Ímãs são parte essencial de discos rígidos, caixas de som, motores elétricos, etc. Boa parte do desenvolvimento técnico referente ao magnetismo
e suas aplicações deu-se a partir do fim do século XIX. No início do século
passado, na década de 1920, um grande problema para a comunidade
física era compreender, a partir de primeiros princípios, a existência de
materiais que, após submetidos a um campo magnético externo, apresentavam uma magnetização permanente mesmo após a extinção do campo
externo.
Em seus estudos sobre a propriedades magnéticas dos materiais, Pierre Curie observou em 1895 que uma classe de materiais perdia a magnetização quando aquecidos acima de uma certa temperatura crítica. Atu-
Capítulo 1. Contextualização
2
almente essa temperatura limite é conhecida como temperatura de Curie
ou ponto de Curie. Um metal com essa propriedade utilizado desde a
antiguidade é a magnetita (óxido de ferro). Como o ferro e a magnetita
são os materiais mais abundantes com a dita propriedade magnética, tais
materiais foram denominados materiais ferromagnéticos.
Na tentativa de explicar os fenômenos físicos característicos dos materiais ferromagnéticos, em especial a existência de duas regiões de temperatura com propriedades magnéticas distintas, foram criados modelos
microscópicos com uma interação entre seus constituintes capaz de reproduzir aqueles fenômenos macroscópicos conhecidos. Nesse sentido,
os constituintes elementares mais naturais para compor os materiais ferromagnéticos eram os dipolos magnéticos. Assim, os modelos procuravam
simular a interação de um grande número de dipolos magnéticos presos
a uma estrutura cristalina similar à dos metais. Por esse motivo, os modelos microscópicos para descrever as propriedades magnéticas dos metais
normalmente se dão sobre uma rede (grafo) periódica, que simula a estrutura cristalina, em cujos sítios são postos os dipolos magnéticos.
O modelo de Ising surgiu nesse ambiente histórico com o intuito de
descrever as citadas propriedades dos materiais ferromagnéticos a partir
de uma estrutura matemática simples. Ao invés de admitir dipolos magnéticos orientados em qualquer direção do espaço, cada sítio da rede é
preenchido apenas com um valor inteiro, como por exemplo apenas admitindo os valores -1 e +1. Isso é equivalente a estipular uma direção
preferencial. Os dipolos ficam restritos a estar paralelos ou antiparalelos
(apontando na mesma direção, mas com sentidos opostos) entre si. Essas
simplificações buscavam isolar as estruturas fundamentais realmente responsáveis pelos efeitos ferromagnéticos, sendo a mudança do comportamento macroscópico a partir de uma temperatura crítica a característica
mais peculiar que esses modelos teriam de prever.
Apesar de classicamente os dipolos magnéticos poderem estar orientados em qualquer direção, no âmbito da teoria quântica o modelo de Ising
se mostrou ainda mais adequado a descrever os sistemas para os quais
foi inicialmente elaborado, já que a interação entre os dipolos magnéticos (daqui em diante, spins) é realmente restrita a um conjunto finito de
valores. Para o caso da interação entre dois elétrons, a energia de interação é de fato proporcional a +1 ou -1, dependendo de os spins estarem
alinhados paralela ou antiparalelamente.
Embora feito sob medida para explicar as propriedades magnéticas de
Capítulo 1. Contextualização
3
certos materiais, o modelo de Ising se mostrou suficientemente versátil
para modelar diversos outros problemas em que interações entre constituintes fundamentais resulta em uma mudança do comportamento macroscópico do sistema. Já recorreu-se a essa construção para modelar
sistemas tão diversos como polímeros [3] e processos eleitorais [11].
1.3
Definição do Modelo a Volume Finito
Na tentativa de descrever os fenômenos magnéticos citados na seção anterior foi criado um modelo que atribui uma probabilidade a cada estado
possível do sistema. Contudo, teria de haver alguma forma de ponderar
nesse modelo a influência dos dois fatores concorrentes, a aleatoriedade
(ou desordem) e a minimização da energia do sistema como um todo. Para
dar conta do primeiro fator, a desordem, o modelo de Ising finito com N
spins permite a realização de estados que são sequências de N variáveis
assumindo os valores −1 ou +1.
Para considerar o efeito da minimização da energia, foi necessário estipular uma distribuição de probabilidade compatível com esse efeito. Isto
é, estipulou-se uma distribuição de probabilidade privilegiando os estados
com menor energia. Para finalizar a descrição do modelo, definiu-se uma
função de energia compatível com o comportamento microscópico esperado dos spins, ou melhor, uma função que atribui menor energia a spins
alinhados na mesma direção.
O modelo de Ising unidimensional no volume Λ = Z ∩ [−N, N ] pode ser
definido como sendo o processo estocástico {Xt }t∈T definido no espaço
de probabilidade (ΩΛ , FΛ , PΛ ), onde o conjunto de índices T = Λ, o espaço
amostral ΩΛ = {−1, 1}Λ , FΛ é a σ-álgebra das partes de ΩΛ e a medida de
probabilidade PΛ é dada adiante em (1.1).
Para cada t ∈ Λ a variável aleatória Xt : ΩΛ → {−1, 1} é definida no ponto
(σ−N , . . . , σN ) ≡ σ ∈ ΩΛ por Xt (σ) = σt . No contexto de Mecânica Estatística
as variáveis aleatórias Xt ’s são chamadas de spins. Neste texto vamos
adotar a notação consagrada da área e denotar a variável aleatória Xt por
σt . Uma observação sobre essa notação é que frequentemente os elementos de ΩΛ são chamados de σ ≡ (σ−N , . . . , σN ) e assim a variável aleatória
σt calculada neste ponto é dada por σt (σ) = σt . Claramente o lado direito
desta igualdade não é a variável aleatória σt , e sim seu valor no ponto σ.
É claro que para ω ∈ ΩΛ com ω = (ω−N , . . . , ωN ) temos σt (ω) = ωt e neste caso
não há nenhuma chance de confusão. Observamos porém que ficará claro
Capítulo 1. Contextualização
4
pelo contexto se σt denota uma variável aleatória ou o valor da t-ésima
coordenada do vetor σ = (σ−N , . . . , σN ).
O conjunto ΩΛ também é chamado de espaço de estados e um elemento
σ ≡ (σ−N , . . . , σN ) desse conjunto é interpretado como um estado do sistema
de partículas na rede Λ = [−N, N ] ∩ Z. A probabilidade do sistema ser
encontrado no estado σ é dado por:
PΛ (σ) =
exp[−βHΛ (σ)]
,
ZΛ
onde ZΛ =
X
exp[−βHΛ (ω)].
(1.1)
ω∈ΩΛ
A função HΛ é conhecida como hamiltoniano do sistema. HΛ (σ) é a energia do sistema no estado σ e no modelo de Ising defini-se como:
HΛ (σ) ≡ HΛ (σ−N , . . . , σN ) = −
X
−N ≤i<j≤N
Jij σi σj −
N
X
hi σi
(1.2)
i=−N
onde {Jij } e {hi } são constantes reais fixadas.
O modelo de Ising D-dimensional a volume finito é definido de maneira
análoga, a diferença é que o conjunto de índices T do processo {Xt }t∈T é
agora da forma T = Λ = ZD ∩ [−N, N ]D .
A medida de probabilidade PΛ definida em (1.1) segue a tradição da
termodinâmica. Para pesar as influências concorrentes da aleatoriedade
e da minimização de energia a probabilidade de um certo estado σ ser
observado diminui exponencialmente com sua energia HΛ (σ), o que dá
origem a expressão
Como podemos perceber, o parâmetro β entra em (1.1) como fator multiplicativo da energia, definindo precisamente como uma unidade de energia extra diminui a probabilidade de um determinado estado. Em outras
palavras, β define a escala da energia. β é uma constante dependente apenas de um parâmetro físico, a temperatura do sistema. Visto que β = kB1T ,
comumente β é denominado simplesmente inverso da temperatura, apesar de, a rigor, ser proporcional ao inverso da temperatura. A constante
de proporcionalidade kB é conhecida por constante de Boltzmann. Essa é
a constante fundamental que traduz a relação entre energia e temperatura. Ela define quanto a variação de uma unidade de temperatura influi
na minimização de energia, convertendo a unidade de medida de temperatura em unidades de energia. Em (1.1), a dependência de PΛ com respeito
as constantes β > 0, {hi }, {Jij } foram omitidas para não carregar a notação. Quando for necessário explicitar tal dependência, escreveremos, por
exemplo, PΛ,β,h quando hi = h ∈ R para todo i ∈ Λ.
Capítulo 1. Contextualização
5
Observe que ZΛ funciona como uma constante de normalização e é deP
finida para garantir σ∈ΩΛ P(σ) = 1. Assim, a presença de ZΛ no denominador em (1.1) garante que PΛ é uma medida de probabilidade. ZΛ define
como a probabilidade é particionada entre os estados σ ∈ ΩΛ . Pensando
nas constantes β, {hi }, etc como parâmetros, podemos olhar para ZΛ como
uma função desses parâmetros. Com essa interpretação, ZΛ é costumeiramente referida como função de partição e, como mencionado acima, é
dada pela expressão
X
ZΛ =
exp[−βHΛ (ω)].
(1.3)
ω∈ΩΛ
Veremos mais a diante que várias informações importantes do modelo
de Ising podem ser extraídas de ZΛ estudando, por exemplo, suas derivadas com respeito a β e h.
Para garantir ainda que a interação privilegie os estados σ ∈ ΩΛ com
dipolos alinhados, a energia total de um estado é construída através da
soma entre interações de pares de spins, sendo a interação entre um par
de spins dada por
Hi,j = −Jij σi σj ,
(1.4)
onde Jij é uma constante não negativa. O sinal de menos que a precede
acarreta menor energia se ambos os spins σi e σj tiverem o mesmo sinal.
Na energia do estado σ também consta um termo referente à interação
do spin no sítio i ∈ [−N, N ] ∩ Z com o campo magnético externo hi nesse
mesmo sítio. Somando tudo retomamos a energia do estado σ no modelo
de Ising finito:
HΛ (σ) =
X X 1
{
− Jij σi σj − hi σi },
2
i∈Λ j∈Λ
com Jkk = 0 ∀k ∈ Λ.
(1.5)
A multiplicação por 12 em (1.5) dá conta dessa duplicidade, assim, o somatório também pode ser equivalentemente escrito restringindo-se i < j e
omitindo o fator 12 , forma que utilizamos anteriormente. Os sistemas com
energia descrita como na equação acima, com um menos precedendo uma
constante de interação não-negativa, são chamados sistemas ferromagnéticos, pois privilegiam os estados com spins alinhados paralelamente.
Em diversas situações vamos tomar hi ≡ h, ∀i ∈ Λ e nesses casos, quando
conveniente, explicitaremos a dependência de HΛ com respeito a {hi } escrevendo HΛ,h . A constante h é chamada de campo externo ou campo magnético externo. As constantes Jij são denominadas constantes de acoplamento e vamos assumir que são simétricas no seguinte sentido: Jij = Jji .
Capítulo 1. Contextualização
6
A seção anterior nos mostrou que, ao menos em sua origem histórica,
o tópico de maior interesse na análise dos sistemas aqui descritos era o
comportamento da magnetização com a variação dos parâmetros externos
h e β. Para chegarmos ao que será chamado magnetização, vamos precisar
falar do valor esperado de uma variável aleatória com respeito à medida
de probabilidade PΛ . Dada uma função f : ΩΛ −→ R que atribui a cada
estado σ um valor real f (σ), denotaremos por hf iΛ,β,h o valor esperado de
f com relação à medida PΛ,β,h , isto é:
hf iΛ,β,h =
X
X
f (σ)PΛ,β,h =
σ∈ΩΛ
f (σ)
σ∈ΩΛ
exp[−βHΛ (σ)]
ZΛ
(1.6)
A magnetização é o valor esperado da soma de todos os spins do sistema. Assim o magnetização no modelo de Ising ao inverso da temperatura β > 0 sujeito a um campo externo h, notação MΛ,β,h , é dada por
MΛ,β,h = hSΛ iΛ,β,h =
*
X
+
(1.7)
σi
i∈Λ
Λ,β,h
E a magnetização específica, ou magnetização por spin, é definida como
sendo MΛ,β,h dividido pelo número de spins do sistema, ou seja:
mΛ,β,h =
MΛ,β,h
MΛ,β,h
=
.
|Λ|
2N + 1
(1.8)
Tanto MΛ,β,h como mΛ,β,h são definidas em termos de funções contínuas em
β e em h, logo MΛ,β,h e mΛ,β,h também são contínua em β e h.
Seja (−σ) o estado obtido a partir de σ multiplicando todas suas coordenadas por (−1), isto é, −σ ≡ (−σ−N , . . . , −σN ). Segue da Equação (1.5), com
hi constante igual a h, que HΛ,β,−h (σ) = HΛ,β,h (−σ). Notando que a aplicação
σ 7→ (−σ) define uma bijeção de ΩΛ em si mesmo, podemos verificar que
PΛ,β,−h (σ) = PΛ,β,h (−σ). Dessa observação, de (1.6) e de (1.7) chegamos à
seguinte relação:
MΛ,β,−h =
XX
σi PΛ,β,−h (σ) =
σ∈ΩΛ i∈Λ
=−
XX
σi PΛ,β,h (−σ)
σ∈ΩΛ i∈Λ
XX
X X
(−σi ) PΛ,β,h (−σ) = −
σi PΛ,β,h (σ)
σ∈ΩΛ i∈Λ
(1.9)
−σ∈ΩΛ i∈Λ
= −MΛ,β,h .
Como era de se esperar, a inversão do campo externo simplesmente
Capítulo 1. Contextualização
7
inverte a magnetização: MΛ,β,−h = −MΛ,β,h . Em outras palavras, a magnetização é uma função ímpar do campo externo h. Vimos que, além de
ímpar, é contínua, logo MΛ,β,0 = 0. Assim, quando cessa o campo externo a
magnetização também vai a zero suavemente. Dessa forma, o modelo de
Ising a volume finito não explica a magnetização espontânea de amostras ferromagnéticas, já que numa amostra física a baixas temperaturas é
observada magnetização não-nula mesmo quando o campo externo é removido do sistema, isto é, os spins se alinham, mesmo após a extinção do
campo externo.
Nos capítulos seguintes, veremos que, em alguns casos, é possível quebrar a continuidade da magnetização em h = 0 fazendo N −→ ∞. Isso restaura, ao menos para o caso de sistemas infinitos (Λ −→ Z), a possibilidade
de termos
lim+ lim mΛ,β,h > 0.
h→0
Λ↑Z
Isso motiva introdução do modelo de Ising a volume infinito, na tentativa
de explicar com esse modelo matemático o fenômeno da magnetização
espontânea de um ferromagneto.
1.4
Resultados Clássicos
O modelo de Ising é, sem dúvida, um dos modelos mais importantes em
Mecânica Estatística. Muitas variações do sistema definido neste capítulo
já foram estudadas em detalhe. Na seção anterior, definimos esse modelo
em subconjuntos finitos Λ ⊂ Z. No entanto, é possível dar uma definição do modelo de Ising diretamente em Z. O modelo assim construído se
comporta como limite (em certo sentido), quando Λ → Z, dos modelos a
volume finito que definimos na seção anterior. Neste trabalho, contudo,
não apresentaremos tal construção. O leitor interessado pode encontrar
uma discussão detalhada sobre esta definição em [2, 6, 12].
Como apresentamos no final da seção anterior, o tema de maior interesse neste texto é a existência de magnetização positiva quando h → 0+ .
Perceba que nesta seção adotaremos um campo externo constante, isto
é, hi = h para todo i ∈ Λ. Também vimos que, devido à magnetização ser
uma função ímpar do campo externo h, esses sistemas com magnetização
espontânea necessariamente apresentam uma descontinuidade da magnetização na origem h = 0.
Os modelos de Ising definidos em Z que citamos anteriormente têm
Capítulo 1. Contextualização
8
propriedades que podem ser extraídas da sequência de modelos finitos
em {ΛN }N , com ΛN → Z, que o aproxima. Diz-se que o modelo a volume
infinito apresenta transição de fase se
lim lim mΛ,β,h > 0.
h→0+ Λ↑Z
Esse limite é chamado magnetização a volume infinito ou simplesmente
magnetização. Para o modelo de Ising Ferromagnético (longo ou curto
alcance) isso é equivalente à existência de mais de uma medida de Gibbs
no sentido DLR ou à existência de mais de um Limite Termodinâmico. Para
maiores detalhes sobre essas equivalências veja [2, 6].
Do mesmo modo que esses sistemas a volume infinito podem ser definidos por sequências de caixas em Z, podem também ser definidos sistemas
em outros espaços nos quais seriam dispostos os spins. A escolha mais
natural é algum conjunto ZD , D ∈ N. Sendo Z3 o conjunto mais próximo
à disposição de spins eletrônicos no ambiente físico tridimensional, esse
caso desperta particular interesse. Estudar a variação das características
do sistema de acordo com a dimensão D é um tópico essencial para entender como as interações entre os entes individuais podem gerar ordem
em grande escala.
Outra questão a ser abordada ao se definir o sistema é a interação Jij
entre os pares de spins (i, j). É comum se adotar interações translacionalmente invariantes, isto é, dependentes apenas da distância entre os
spins, Jij = J(|i − j|). Essas interações podem ser tanto de alcance finito
como de alcance infinito. Diz-se uma interação ser de alcance finito A se
|i − j| > A ⇒ Jij = 0. Se não houver um limitante A, a interação é dita de
alcance infinito.
Quando as interações são restritas aos sítios mais próximos entre si, dizemos ser uma interação de primeiros vizinhos. Nesse caso, as constantes
de acoplamento são Jij = J se |i − j| = 1 e Jij = 0 se |i − j| =
6 1. Um modelo
definido com esse tipo de interação de curto alcance para a rede em Z foi
estudado na tese de Doutorado de Ernst Ising [15]. Ising mostrou que no
limite quando N → ∞ não existe magnetização espontânea em nenhuma
temperatura. Posteriormente, mediante o uso de uma abordagem por matriz de transferência, também deduziu-se a não existência de transição de
fase para qualquer modelo em D = 1 com interações translacionalmente
invariantes e de curto alcance, para detalhes veja [1] e referências contidas.
Capítulo 1. Contextualização
9
Já para dimensões maiores (D ≥ 2), uma técnica hoje conhecida como
Argumento de Peierls foi pela primeira vez aplicada em [19], mostrando
a existência em D = 2 de transição de fase abaixo de um certa temperatura, mesmo para a interação de primeiros vizinhos. Veremos nos capítulos seguintes que o aumento das interações entre os spins não diminui
a magnetização. Assim, a existência de transição de fase em um modelo
definido em D = 2 e com interação de primeiros vizinhos também garante
a existência de transição de fase para qualquer modelo em D = 2, desde
que a interação seja não-negativa e pelo menos as interações de primeiros
vizinhos sejam não-nulas.
A existência de transição de fase em D ≥ 3 também é garantida pelo Argumento de Peierls, já que um sistema em D = 3 pode ser visto como uma
infinidade de planos paralelos com sistemas em D = 2. Os planos paralelos
independentes equivalem a fixar em zero as constantes de acoplamento
entre quaisquer dois spins de planos diferentes. Mas, como os planos não
interagentes têm magnetização positiva por si só, não diminuímos essa
magnetização ao aumentar as constantes de acoplamento ligando spins
de planos diferentes. O mesmo argumento vale para D > 3, pois um sistema em D + 1 pode ser visto como uma série de sistemas em D acoplados
entre si.
O foco desta dissertação são os modelos de Ising definidos em D = 1,
mas com interações de longo alcance. Veremos na seção 3.7 que a compreensão de tais modelos com constantes de acoplamento da forma Jij =
1/|i − j|α implica na compreensão de uma vasta gama de modelos de Ising
com interações translacionalmente invariantes e de longo alcance. Assim, veremos aqui praticamente todos os casos unidimensionais com interações de dois corpos ferromagnéticas, invariantes por translação cujo
o decaimento segue uma lei de potência com expoente α 6= 2.
Os caso em que α ≤ 1 são de pouco interesse, pois a soma das energias
de interação de um spin com os demais diverge. Nessa situação todos os
spins se alinham e temos simplesmente
lim lim mΛ,β,h = +1
h→0+ Λ→Z
para qualquer valor do inverso da temperatura β > 0. Já o caso α > 2 é de
pouco interesse pelo motivo inverso. Nesse caso,
lim lim mΛ,β,h = 0
h→0+ Λ→Z
Capítulo 1. Contextualização
10
para qualquer β > 0. Não há, assim, transição de fase se α > 2. Abordaremos esses sistemas com mais detalhes na Seção 3.7.
Os outros modelos de Ising unidimensionais com interação translacionalmente invariante do tipo lei de potência, Jij = 1/|i − j|α , podem ser
divididos em outras duas classes. A primeira classe é formada pelos sistemas com 1 < α < 2. Esse é o tema do Capítulo 4 desta dissertação, no
qual é apresentada a demonstração da existência de transição de fase a
partir de um certo β, seguindo passo-a-passo a argumentação de Dyson
em [5]. A segunda classe é formada pelo modelo com α = 2. Neste caso
temos Jij = |i − j|−2 e o modelo de Ising com tais constantes de acoplamento tem magnetização espontânea para temperaturas suficientemente
baixas. A prova da existência de magnetização espontânea foi dada por
Frölich e Spencer, cerca de dez anos depois da prova de Dyson para os
casos 1 < α < 2. A exposição completa do argumento no caso limite requer técnicas distintas às que são abordadas nesta dissertação e o leitor
interessado pode ver a referência [10], para maiores detalhes.
Juntando todos esses casos, temos uma classificação completa para o
modelo de Ising unidimensional quanto à ausência ou não de transição de
fase quando as constantes de acoplamento são da forma Jij = 1/|i − j|α .
Capítulo 2
Propriedades Gerais
2.1
Introdução
Este capítulo trata de algumas propriedades gerais de modelos de Ising
com constantes de acoplamento Jij ferromagnéticas, mas sem qualquer
outra restrição. Em oposição, os capítulos seguintes tratarão de modelos
cujas constantes Jij têm certas propriedades adicionais, como a invariância translacional.
No início deste capítulo, na Seção 2.2, veremos três desigualdades de
correlação e algumas consequências imediatas que serão utilizadas em
várias passagens subsequentes. Em seguida, na Seção 2.3, definiremos os
modelos com condições exteriores(ou condições de contorno). Nas Seções
2.4 e 2.5 utilizaremos as desigualdades da Seção 2.2 para demonstrar
respectivamente a existência do limite da magnetização e uma condição
suficiente para sua positividade.
Neste capítulo, apesar de tratarmos de sistemas com um número finito |Λ| de sítios, quando calcularmos valores esperados e outras somas
ponderadas com respeito a medida de probabilidade PΛ , utilizaremos os
símbolos de integrais em ΩΛ para representar o somatório ponderado sobre o espaço das configurações ΩΛ . Para ser mais preciso, se κ : FΛ → R
denota a medida da contagem em ΩΛ , então temos para qualquer função
f : ΩΛ → R que
hf iΛ ≡
X
σ∈ΩΛ
Z
f (σ)PΛ (σ) =
f (σ)PΛ (σ) dκ(σ).
(2.1)
ΩΛ
A segunda igualdade segue imediatamente de ΩΛ ser finito, a aplicação
σ 7→ f (σ)PΛ (σ) ser uma função simples e da definição da integral de Lebes-
Capítulo 2. Propriedades Gerais
12
gue de uma função simples.
Poderíamos ter optado por adotar simplesmente os somatórios, mas
preferimos adequar a notação deste capítulo a outros textos onde são tomados modelos com infinitos estados (com sítios tomados em Z, ou spins
tomando valores em R, por exemplo).
2.2
Desigualdades de Correlação
Nesta seção demonstraremos duas desigualdades de correlação necessárias nos passos seguintes. Também apresentaremos uma consequência
imediata de cada uma delas. Essas consequências correspondem à monotonicidade da magnetização específica tanto com o aumento do campo
externo hi em qualquer spin i ∈ Λ, bem como com o aumento do acoplamento entre dois spins Jij . Veremos que para muitos sistemas, o aumento
de hi ou Jij não diminui a magnetização.
A primeira dessas desigualdades é denominada Desigualdade de FKG
em homenagem a Fortuin, Kasteleyn e Ginibre, veja [9]. Prosseguimos
com algumas definições prévias e o enunciado da desigualdade.
Definição 2.2.1 (Ordem Parcial em ΩΛ ). Dadas duas configurações ω, σ ∈
ΩΛ , diz-se que ω σ quando:
∀i ∈ Λ
temos que ωi ≤ σi .
Definição 2.2.2 (Função Não-Decrescente). Uma função f : ΩΛ → R é dita
não-decrescente se:
∀ω, σ ∈ Ω tal que ω σ
temos que f (ω) ≤ f (σ).
Observação 2.2.1. Funções não-decrescentes, no sentido introduzido acima, serão também as vezes chamadas de funções crescentes.
Exemplos:
• A função f (σ) = SΛ (σ) é crescente, já que a inversão de qualquer spin
de −1 para +1 aumenta o valor de f (σ).
• Também é crescente a função g(σ) = σα , que dá o spin no sítio α.
Perceba que a alteração de qualquer spin em sítio diferente de α não
altera o valor de g e a inversão do spin em α de −1 para +1 aumenta
g de −1 para +1.
Capítulo 2. Propriedades Gerais
13
• A função h(σ) = σa σb não é crescente. Observe que se o estado σ possui
σa = σb = −1, temos h(σ) = +1. Porém se σ
ea = +1 e, para todo sítio i 6= a,
tivermos σ
ei = σi , decorre que σ σ
e, mas +1 = h(σ) > h(e
σ ) = −1.
• Pelo mesmo motivo do item anterior, não é crescente a função SΛ2 (σ).
Utilizaremos as definições apresentadas até aqui para enunciar a citada desigualdade no teorema a seguir.
Teorema 2.2.2. (Desigualdade de FKG) Sejam f, g : ΩΛ → R duas funções
crescentes, no sentido da Definição 2.2.2. Sejam PΛ a medida de Gibbs do
modelo de Ising dada por (1.1) com Hamiltoniano (1.2) e h·iΛ a esperança
com respeito a medida PΛ . Se para todo i, j ∈ Λ temos que Jij ≥ 0 e hi ∈ R.
Então
hf giΛ − hf iΛ hgiΛ ≥ 0.
(2.2)
Demonstração. A demonstração será por indução no comprimento da caixa, |Λ|. A primeira tarefa será reorganizar o lado esquerdo da desigualdade (2.2). Usando a definição do valor esperado e (2.1) temos
Z
hf giΛ − hf iΛ hgiΛ =
Z
f (σ)g(σ)PΛ (σ)dκ(σ) −
ΩΛ
Z
f (σ)PΛ (σ)dκ(σ) ·
ΩΛ
g(e
σ )PΛ (e
σ )dκ(e
σ ).
ΩΛ
Como as integrais acima são simplesmente somas finitas e temos que
R
P (σ)dκ(σ) = 1, podemos reescrever o lado direito da expressão acima
ΩΛ Λ
como a seguinte integral dupla
Z
ΩΛ
Z
h
i
f (σ)g(σ) − f (σ)g(e
σ ) PΛ (σ)PΛ (e
σ ) dκ(σ)dκ(e
σ ).
ΩΛ
Já que σ e σ
e variam sobre o mesmo espaço ΩΛ , podemos trocar σ por
σ
e e vice-versa sem alterar a integral. Sendo assim, a integral anterior
equivale à seguinte.
Z
ΩΛ
Z
h
i
f (e
σ )g(e
σ ) − f (e
σ )g(σ) PΛ (σ)PΛ (e
σ ) dκ(σ)dκ(e
σ ).
ΩΛ
Somando as duas últimas expressões e multiplicando por 1/2, retomamos o que tínhamos inicialmente, pois ambas as expressões têm o mesmo
valor. Portanto a integral dupla acima pode ser reescrita como
1
2
Z
ΩΛ
Z
ΩΛ
h
i
f (σ)g(σ) − f (σ)g(e
σ ) + f (e
σ )g(e
σ ) − f (e
σ )g(σ) PΛ (σ)PΛ (e
σ ) dκ(σ)dκ(e
σ ).
Capítulo 2. Propriedades Gerais
14
Fatorando a expressão em parêntesis no integrando, ficamos com
1
2
Z
ΩΛ
Z
h
i
(f (σ) − f (e
σ ))(g(σ) − g(e
σ ))PΛ (σ)PΛ (e
σ ) dκ(σ)dκ(e
σ ).
ΩΛ
Podemos agora analisar a expressão acima nos restringindo ao caso
|Λ| = 1, isto é, f e g funções do spin de apenas um (e do mesmo) sítio. Sem
perda de generalidade, suponhamos que esse sítio cujo spin dependem as
funções f e g seja o de coordenada 0. Dados dois estados σ e σ
e tais que
σ0 ≤ σ
e0 , temos que f (σ) − f (e
σ ) ≤ 0 e g(σ) − g(e
σ ) ≤ 0, pois f e g são funções
crescentes e dependem apenas do spin de coordenada 0. Logo, nesse caso,
o integrando que aparece acima é não-negativo. Similarmente, se σ0 ≥ σ
e0 ,
temos f (σ) − f (e
σ ) ≥ 0 e f (σ) − g(e
σ ) ≥ 0. Novamente o integrando acima
é não-negativo e em ambos os casos concluímos que a integral acima é
sempre não-negativa.
Dessa observação, segue que a Desigualdade de FKG (2.2) é verdadeira
para o caso |Λ| = 1, independente da medida de probabilidade PΛ . Em
particular, a desigualdade é verdadeira para medidas de Gibbs de modelos
de Ising ferromagnético.
Vamos supor agora que o teorema é verdadeiro para um subconjunto
arbitrário Λ ⊂ Z de cardinalidade |Λ| ≤ n.
Considere agora Λ ⊂ Z tal que |Λ| = n + 1. Pela equação (2.1) e definição
de PΛ temos que
Z
hf giΛ =
f (σ)g(σ)
ΩΛ
exp(−βHΛ (σ))
dκ(σ).
ZΛ
(2.3)
Para utilizar a hipótese de indução, a ideia é fixar um dos spins, em algum
sítio α ∈ Λ. Feita uma escolha de α ∈ Λ defina Λ0 = Λ \ {α}. Note que
podemos reescrever o hamiltoniano HΛ isolando as interações com o spin
Capítulo 2. Propriedades Gerais
15
escolhido, da seguinte forma:
(
)
X X1
HΛ (σ) = −
Jij σi σj + hi σi
2
i∈Λ
j∈Λ
)
(
X
X X1
Jij σi σj + hi σi −
Jiα σα σi − hα σα
=−
2
i∈Λ0
i∈Λ0
j∈Λ0
(
)
X X1
=−
Jij σi σj + (hi + Jiα σα )σi − hα σα
2
0
0
i∈Λ
j∈Λ
)
(
X X1
=−
Jij σi σj + h0i (σα )σi − hα σα ,
2
i∈Λ0
j∈Λ0
onde h0i (σα ) ≡ hi + Jiα σα . É perceptível na equação acima que, se fixarmos
σα , podemos definir um novo modelo de Ising no volume Λ0 (que tem cardinalidade |Λ0 | = n) cujo Hamiltoniano é dado pelo lado direito da expressão
acima com h0i (σα ) = hi + Jiα σα .
A expressão acima na verdade nos fornece uma maneira de definir dois
modelos de Ising em Λ0 , um com σα = +1 e outro com σα = −1. Fixado o
valor de σα a medida de Gibbs desse novo sistema é definida pelo Hamiltoniano abaixo,
(
)
X X1
(2.4)
Jij σi σj + (hi + Jiα σα )σi − hα σα .
HΛ0 ,σα = −
2
0
0
i∈Λ
j∈Λ
Pela hipótese de indução para qualquer uma das duas escolha de σα temos
hf giΛ0 − hf iΛ0 hgiΛ0 ≥ 0.
Agora voltamos nossa atenção para (2.3), no intuito decompor esta integral em duas partes, uma dependendo apenas do spin α, a outra em Λ0 ,
onde será possível aplicar a hipótese de indução. Primeiro observamos
que
Z
hf giΛ =
f (σ)g(σ)
ΩΛ
"Z
Z
=
{−1,+1}
exp(−βHΛ (σ))
dκ(σ)
ZΛ
#
0
0 ,σ (σ , σα ))
exp(−βH
Λ
α
f (σ 0 , σα )g(σ 0 , σα )
dκ(σ 0 ) dκ(σα ),
Z
Λ
ΩΛ0
onde na segunda igualdade abusamos da notação já que a rigor κ é a
medida de contagem em ΩΛ e acima usamos κ para denotar tanto a medida
Capítulo 2. Propriedades Gerais
16
da contagem em ΩΛ0 quanto a medidada de contagem em Ω{α} = {−1, 1}.
Observando que ZΛ0 ,σα 6= 0, podemos multiplicar a dividir o integrando por
esse valor para reescrever o lado direito da igualdade acima como
"Z
Z
{−1,+1}
#
0
0
exp(−βH
(σ
,
σ
))
ZΛ0 ,σα
Λ ,σα
α
f (σ 0 , σα )g(σ 0 , σα )
dκ(σ 0 ) ·
dκ(σα ).
ZΛ0 ,σα
ZΛ
ΩΛ0
Note que a expressão em colchetes é por definição hf giΛ0 ,σα e portanto a
integral acima pode ser reescrita como
Z
hf giΛ0 ,σα ·
{−1,+1}
ZΛ0 ,σα
dκ(σα ).
ZΛ
Aplicando a hipótese de indução obtemos a seguinte desigualdade
Z
hf giΛ0 ,σα
{−1,+1}
ZΛ0 ,σα
·
dκ(σα ) ≤
ZΛ
Z
hf iΛ0 ,σα hgiΛ0 ,σα ·
{−1,+1}
ZΛ0 ,σα
dκ(σα ).
ZΛ
Se γ(σα ) = hf iΛ0 ,σα e η(σα ) = hgiΛ0 ,σα fossem funções não-decrescente, então poderíamos usar a desigualdade provada para o caso |Λ| = 1 (que era
independente da medida de probabilidade) para concluir que
Z
hf giΛ ≤
ZΛ0 ,σα
dκ(σα )
ZΛ
Z
ZΛ0 ,σα
ZΛ0 ,σα
·
ρ(dσα ) ·
hgiΛ0 ,σα ·
dκ(σα )
ZΛ
ZΛ
{−1,+1}
hf iΛ0 ,σα hgiΛ0 ,σα ·
{−1,+1}
Z
≤
hf iΛ0 ,σα
{−1,+1}
= hf iΛ hgiΛ ,
onde usamos que
Z
{−1,+1}
ZΛ0 ,σα
ZΛ0 ,+1 + ZΛ0 ,−1
dκ(σα ) = 1, ou equivalentemente
= 1.
ZΛ
ZΛ
Resta-nos, pois, provar que a função γ(σα ) é crescente, pois argumento
análogo também prova que η(σα ) é crescente. Isso equivale a mostrar que
γ(+1) ≥ γ(−1), pois γ é função de apenas 1 spin.
Denote por PΛ0 ,σα a medida de Gibbs em ΩΛ0 correspondente ao hamiltoniano HΛ0 ,σα . Próximo passo é mostrar as duas desigualdades abaixo,
concluindo por fim que γ é crescente e com isso, a demonstração da desi-
Capítulo 2. Propriedades Gerais
17
gualdade de FKG.
γ(+1) = hf iΛ0 ,+1
Z
=
f (σ 0 , +1)PΛ0 ,+1 (σ 0 ) dκ(σ 0 )
ΩΛ0
(∗)
Z
f (σ 0 , −1)PΛ0 ,+1 (σ 0 ) dκ(σ 0 )
≥
ΩΛ0
Z
(∗∗)
f (σ 0 , −1)PΛ0 ,−1 (σ 0 ) dκ(σ 0 )
≥
ΩΛ0
= hf iΛ0 ,−1
= γ(−1).
A primeira das desigualdades, marcada com (∗), é trivialmente verdadeira, pois f é uma função não decrescente, logo f (σ 0 , +1) ≥ f (σ 0 , −1). Para
obter a segunda desigualdade, marcada com (∗∗), será preciso uma análise um pouco mais elaborada.
Para cada σ 0 ∈ ΩΛ0 fixado, a aplicação σα 7→ PΛ0 ,σα (σ 0 ) tem como domínio o
conjunto {−1, +1}. De maneira natural podemos estender o domínio desta
aplicação para o intervalo fechado [−1, +1]. Bastando para isto estender o
Hamiltoniano da seguinte forma
(
HΛ0 ,t = −
X
i∈Λ0
X1
Jij σi σj + (hi + Jiα t)σi
2
0
j∈Λ
)
− hα t
(2.5)
e considerar a medida de Gibbs dada como em (1.1) de forma que a probabilidade de uma configuração σ 0 seja dada agora por
PΛ,t (σ 0 ) =
exp[−βHΛ0 ,t (σ 0 )]
,
ZΛ,t
onde ZΛ,t =
X
exp[−βHΛ,t (ω)].
(2.6)
ω∈ΩΛ0
Esta observação nos motiva a considerar a seguinte função
Z
F (t) =
f (σ 0 , −1)PΛ0 ,t (σ 0 ) dκ(σ 0 ).
ΩΛ0
Evidentemente, F (−1) = γ(−1) e F (+1) = γ(+1). Vamos mostrar que a derivada de F é positiva e disso seguirá a desigualdade (∗∗).
Lembrando que a integral que define F é na verdade uma soma finita
Capítulo 2. Propriedades Gerais
18
temos que
d
d
F (t) =
dt
dt
Z
[f (σ 0 , −1)PΛ0 ,t (σ 0 )] dκ(σ 0 )
ΩΛ0
(2.7)
d
0
0
=
f (σ , −1) PΛ0 ,t (σ ) dκ(σ 0 ).
dt
ΩΛ0
Z
Resta calcular
PΛ0 ,t (σ 0 ) temos:
d
P 0 (σ 0 )
dt Λ ,t
para cada σ 0 ∈ ΩΛ0 fixado. Usando definição de
d exp(−βHΛ0 ,t (σ 0 ))
d
PΛ0 ,t (σ 0 ) =
dt
dt
ZΛ0 ,t
=
ZΛ0 ,t
d
dt
exp(−βHΛ0 ,t (σ 0 )) − exp(−βHΛ0 ,t (σ 0 )) dtd ZΛ0 ,t
(ZΛ0 ,t )2
exp(−βHΛ0 ,t (σ 0 )) dtd HΛ0 ,t (σ 0 ) − exp(−βHΛ0 ,t (σ 0 ))h dtd HΛ0 ,t iΛ0 ,t
= −β
ZΛ0 ,t
"
#
exp(−βHΛ0 ,t (σ 0 )) d
d
= −β
HΛ0 ,t (σ 0 ) −
HΛ0 ,t
ZΛ0 ,t
dt
dt
Λ0 ,t
"
d
= −βPΛ0 ,t (σ 0 )
HΛ0 ,t (σ 0 ) −
dt
d
HΛ0 ,t
dt
#
.
Λ0 ,t
Usando esta igualdade em (2.7) ficamos com
d
d
F (t) =
dt
dt
Z
f (σ 0 , −1)PΛ0 ,t (σ 0 ) dκ(σ 0 )
ΩΛ0
"
!
#
Z
d
d
= −β
f (σ 0 , −1)
HΛ0 ,t (σ 0 ) −
HΛ0 ,t
PΛ0 ,t (σ 0 ) dκ(σ 0 )
dt
dt
ΩΛ0
Λ0 ,t
"
=β
(2.8)
#
d
d
− HΛ0 ,t f (· , −1)
− − HΛ0 ,t
hf (· , −1)iΛ0 ,t .
dt
dt
Λ0 ,t
Λ0 ,t
Observe que a expressão entre colchetes na última linha é exatamente um
dos lados da Desigualdade de FKG aplicada às funções − dtd HΛ0 ,t e f (· , −1).
Como f é crescente a função σ 0 7→ f (σ 0 , −1) também é crescente. Por (2.5)
temos que
X Jiα
d
− HΛ0 ,t (σ 0 ) =
σi + hα .
dt
2
i∈Λ0
Capítulo 2. Propriedades Gerais
19
Daí é fácil ver que a função − dtd HΛ0 ,t é crescente. Finalmente podemos
voltar a (2.8) e usar a hipótese de indução para deduzir que dtd F (t) ≥ 0.
Isso conclui a demonstração da desigualdade de FKG.
A desigualdade acima demonstrada pode ser usada para esclarecer a
relação entre o campo externo e a magnetização. É de se esperar que
a magnetização e também a magnetização específica não decresça com
qualquer aumento no campo externo. Assim, para um aumento no campo,
esperamos numa situação extrema, que magnetização ou a magnetização
específica fique constante e, nos outros casos, que elas aumentem. Para
mostrar que esse fato é verdadeiro vamos usar a Desigualdade de FKG
(2.2). Como os cálculos são absolutamente semelhantes vamos verificar
esse fato para o caso da magnetização específica. A ideia é calcular as
derivadas parciais da magnetização específica com respeito a cada coordenada do campo externo {hi }i∈Λ e mostrar que elas são não-negativas.
Para facilitar a notação, no segue vamos escrever simplesmente mΛ,β para
denotar mΛ,β,{hi }i∈Λ . Assim, fixado i ∈ [−N, N ] ∩ Z temos que
∂
∂
mΛ,β =
∂hi
∂hi
Z
ΩΛ
P
j∈Λ
σj
|Λ|
−1
Z
PΛ (σ)dκ(σ) = |Λ|
X
ΩΛ j∈Λ
σj
∂
PΛ (σ)dκ(σ).
∂hi
(2.9)
Antes de prosseguir, vamos calcular ∂PΛ (σ)/∂hi .
ZΛ ∂ exp(−βHΛ (σ)) − exp(−βHΛ (σ)) ∂ ZΛ
∂PΛ (σ)
∂ exp(−βHΛ (σ))
∂hi
∂hi
=
=
2
∂hi
∂hi
ZΛ
(ZΛ )
∂HΛ (σ)
+ β exp(−βHΛ (σ)) hσi iΛ
∂hi
=
ZΛ
β exp(−βHΛ (σ)) ∂HΛ (σ)
=
+ hσi iΛ
ZΛ
∂hi
β exp(−βHΛ (σ))
= βPΛ (σ) [σi − hσi iΛ ] .
Capítulo 2. Propriedades Gerais
20
Substituindo esta expressão em (2.9) ficamos com
∂
mΛ,β = |Λ|−1
∂hi
Z
−1
X
σj
ΩΛ j∈Λ
Z
= |Λ| β
X
∂
PΛ (σ)dκ(σ)
∂hi
σj PΛ (σ) [σi − hσi iΛ ] dκ(σ)
ΩΛ j∈Λ
−1
= |Λ| β
XZ
j∈Λ
−1
= |Λ| β
X Z
j∈Λ
= |Λ|−1 β
σj [σi − hσi iΛ ] PΛ (σ) dκ(σ)
X
(2.10)
ΩΛ
Z
σj σi PΛ (σ) dκ(σ) −
ΩΛ
σj hσi iΛ PΛ (σ) dκ(σ)
ΩΛ
[hσj σi iΛ − hσj iΛ hσi iΛ ]
j∈Λ
Aplicando na última igualdade acima, em cada parcela do somatório, a
Desigualdade de FKG com f (σ) = σi e g(σ) = σj temos finalmente que
∂mΛ,β /∂hi ≥ 0. Enunciamos logo abaixo esse fato como um corolário para
posterior referência.
Corolário 2.2.3. No modelo de Ising ferromagnético a volume finito Λ,
temos
1 X
∂
mΛ,β,{hi }i∈Λ =
β
hσj σi iΛ,β,{hi }i∈Λ − hσj iΛ,β,{hi }i∈Λ hσi iΛ,β,{hi }i∈Λ ≥ 0.
∂hi
|Λ| j∈Λ
Em particular, a magnetização específica não decresce com o aumento do
campo externo em qualquer dos sítios de Λ.
Outra desigualdade de fundamental importância neste texto é a Desigualdade GKS-2. Essa desigualdade foi provada primeiramente por Griffiths para a correlação de pares de spins em [13]. Sua forma mais geral
foi obtida por Kelly e Sherman em [16]. Devido às contribuições desses
autores, a desigualdade é assim denominada. A exposição adiante toma
como base a apresentação de [4] a respeito do tema.
Antes de enunciar a desigualdade com precisão, precisamos introduzir
algumas notações.
Definição 2.2.3. Dado um subconjunto finito e não vazio A ⊆ Λ, a função
σA : ΩΛ → {−1, +1} é definida por
σA (σ) =
Y
i∈A
σi .
(2.11)
Capítulo 2. Propriedades Gerais
21
Agora estamos prontos para enunciar precisamente a Desigualdade
GKS-2.
Teorema 2.2.4 (Desigualdade de GKS-2). Seja Λ ⊂ Z finito e considere o
modelo de Ising no volume Λ com Hamiltoniano
(
)
X X1
HΛ (ω) = −
Jij ωi ωj + hi ωi
2
i∈Λ
j∈Λ
Se Ji,j ≥ 0 e hi ≥ 0 para todo i, j ∈ Λ, então para quaisquer A e B subconjuntos não vazios de Λ temos
(2.12)
hσA σB iΛ − hσA iΛ hσB iΛ ≥ 0.
Demonstração. Para esta demonstração, precisaremos criar um novo sistema definido em ΩΛ × ΩΛ correspondendo a duas cópias independentes
do sistema original em ΩΛ . Para que esses sistemas sejam independentes
independentes, a energia de um estado (ω, ω
e ) ∈ ΩΛ × ΩΛ será definida como
a soma das energias dos estados, isto é,
H2 (ω, ω
e ) = HΛ (ω) + HΛ (e
ω ).
Analogamente, denotaremos por ωA , ω
eA as duas funções ωA , ω
eA : Ω2Λ = ΩΛ ×
ΩΛ → {−1, +1} tais que ωA (ω, ω
e ) = σA (ω) e ω
eA (ω, ω
e ) = σA (e
ω ). Também denotaremos por h·i2 a esperança com relação à distribuição de probabilidades
definida pelo hamiltoniano H2 . Podemos então reescrever o lado esquerdo
de (2.12) em termos de esperanças em Ω2Λ .
hσA σB iΛ − hσA iΛ hσB iΛ = hωA ωB i2 − hωA i2 he
ωB i2 = hωA ωB − ωA ω
e B i2 .
(2.13)
A primeira igualdade vem do fato que, pela definição de ωA , hωA i2 =
hσA iΛ . A segunda igualdade decorre da independência de ωA e ωB , assim
hωA ω
eB i2 = hωA i2 he
ωB i2 .
Definindo para cada i ∈ Λ as funções Xi , Yi : ΩΛ × ΩΛ → {−1, 0, 1} por
Xi (ω, ω
e) =
ωi − ω
e
√ i
2
e
Yi (ω, ω
e) =
ωi + ω
e
√ i,
2
retomando a definição de σA em (2.11), e usando a identidade (2.13) é
possível reescrever a expressão acima em termos dessas funções, como
Capítulo 2. Propriedades Gerais
22
segue
hσA σB iΛ − hσA iΛ hσB iΛ = hωA [ωB − ω
eB ]i2
*
"
#+
Y Xi + Yi Y Xi + Yi Y Xi − Yi
√
√
√
=
−
2
2
2
i∈A
i∈B
i∈B
2
Quando expandimos os produtórios entre colchetes, todo termo com
coeficiente negativo da expansão do produtório à direita terá um equivalente positivo no produtório à esquerda. Esses termos com coeficientes
negativos serão todos cancelados, restando apenas termos positivos de
produtórios de Xi e Yj , i e j variando sobre alguns subconjuntos de B.
A expansão do outro produtório, aquele fora do colchete, também trará
termos em Xi e Yj com coeficientes positivos (iguais a 1). Assim, ao expandir toda a expressão acima, teremos uma soma de termos da forma
*
Y
i∈C
+
Xi
Y
j∈D
Yj
,
2
onde C e D são subconjuntos de Λ.
Assim, basta provar que um termo com o formato acima é necessariamente não negativo para concluir a demonstração da desigualdade (2.12).
Para facilitar a notação de maneira análoga
XA =
Y
i∈A
Xi
e
YB =
Y
Yi .
i∈B
Ficamos por demonstrar que hXA YB i2 ≥ 0. Para tal, invocamos sua definição
X
exp[−βH2 (ω, ω
e )]
XA (ω, ω
e )YB (ω, ω
e)
hXA YB i2 =
Z2
ω,e
ω ∈ΩΛ
Não precisamos nos preocupar com a função de partição Z2 , já que
ela é positiva. Se os demais termos forem positivos, toda a expressão é
positiva. Lembrando da definição da energia H2 , podemos escrevê-la em
termos de somas em Xi e Yi , como abaixo:
Capítulo 2. Propriedades Gerais
23
(
)
X X1
X1
H2 (ω, ω
e ) = HΛ (ω) + HΛ (e
ω) = −
Jij ωi ωj + hi ωi +
Jij ω
ei ω
ej + hi ω
ei
2
2
i∈Λ
j∈Λ
j∈Λ
)
(
X X1
Jij [ωi ωj + ω
ei ω
ej ] + hi [ωi + ω
ei ]
=−
2
i∈Λ
j∈Λ
(
)
X X
√
=−
Jij [Xi (ω, ω
e )Xj (ω, ω
e ) + Yi (ω, ω
e )Yj (ω, ω
e )] + hi 2Yi (ω, ω
e)
i∈Λ
j∈Λ
Reescrevendo a identidade acima como uma igualdade de funções definidas em ΩΛ × ΩΛ obtemos uma expressão mais simples que é dada por
H2 = −
(
X X
i∈Λ
√
)
Jij [Xi Xj + Yi Yj ] + hi 2Yi
.
j∈Λ
O somatório acima pode ser substituído na expressão para hXA YB i2 onde
aparece exp[−βH2 (ω, ω
e )], cancelando ambos os sinais de menos. Expandindo essa exponencial em série de Taylor, hXA YB i2 se decompõe em um
somatório de termos da forma XA YB (H2 )n . Como o somatório inicial é tomado em ω, ω
e ∈ ΩΛ , podemos alterar a ordem desse somatório, deixando
em evidência os termos dependentes apenas de ωi , ω
ei . O que resta é o
produto de vários somatórios com a forma
X
Xim (ω, ω
e )Yin (e
ω ),
ωi ,e
ωi ∈{−1,+1}
sendo m e n dois números inteiros não-negativos. Assim, basta provar que
para quaisquer inteiros m, n ≥ 0 temos
X
Xim (ω, ω
e )Yin (ω, ω
e)
ωi ,e
ωi ∈{−1,+1}
X
=
ωi ,e
ωi ∈{−1,+1}
ωi − ω
e
√ i
2
m ωi + ω
e
√ i
2
n
≥ 0.
Se m e n forem pares, cada termo do somatório é não-negativo, logo a
desigualdade é verdadeira nesse caso.
Já se m for ímpar, os termos com ωi = ωei são nulos, restando apenas
+2
√
2
m 0
√
2
n
+
−2
√
2
m 0
√
2
n
=
2
√
2
m 0
√
2
n
−
2
√
2
m 0
√
2
n
= 0.
Aqui temos um somatório nulo mesmo que n = 0, logo a desigualdade
Capítulo 2. Propriedades Gerais
24
é verdadeira também para m ímpar. O caso n ímpar é totalmente análogo
ao m ímpar. Sendo assim, a desigualdade original é verdadeira para todos
os valores de m e n, estando provada a desigualdade de GKS-2.
Em analogia ao apresentado após a demonstração da desigualdade de
FKG, aqui apresentaremos uma consequência da desigualdade GKS-2 que
terá uso no último capítulo. O corolário é assim enunciado:
Corolário 2.2.5. Num modelo de Ising ferromagnético a volume finito
com campo externo hi ≥ 0 para todo sítio i ∈ Λ, a magnetização é uma
função não decrescente das constantes de acoplamento Jij .
Para demonstrar o corolário, calcularemos explicitamente ∂J∂ij mΛ , mostrando que como função de Jij esta derivada é não-negativa. Se o leitor
acompanhou a demonstração do Corolário 2.2.3, esta demostração é totalmente análoga, com a única diferença de se utilizar no último passo a
desigualdade de GKS-2 em lugar da de FKG.
Demonstração. A derivada de mΛ com respeito a Jij é dada por
∂
∂
mΛ =
∂Jij
∂Jij
Z
ΩΛ
P
k∈Λ
|Λ|
σk
−1
PΛ (σ) dκ(σ) = |Λ|
XZ
k∈Λ
σk
ΩΛ
∂
PΛ (σ) dκ(σ).
∂Jij
Desta forma podemos reduzimos o problema a mostrar que, para cada
R
k ∈ Λ, a integral ΩΛ σk ∂J∂ij PΛ (σ) dκ(σ). é não-negativa. Como fizemos anteriormente, para cada σ ∈ ΩΛ fixado, vamos calcular primeiro a derivada de
PΛ (σ) com respeito a Jij .
∂
exp(−βHΛ (σ))
∂PΛ (σ)
=
=
∂Jij
∂Jij
ZΛ
−βZΛ exp(−βHΛ (σ))
=
ZΛ
∂
∂
exp(−βHΛ (σ)) − exp(−βHΛ (σ))
ZΛ
∂Jij
∂Jij
(ZΛ )2
∂
∂
HΛ (σ) − exp(−βHΛ (σ))
ZΛ
∂Jij
∂Jij
(ZΛ )2
=
βZΛ exp(−βHΛ (σ))σi σj − β exp(−βHΛ (σ))hσi σj iΛ
(ZΛ )2
=
β exp(−βHΛ (σ)) σi σj − hσi σj iΛ
ZΛ
= βPΛ (σ) [σi σj − hσi σj iΛ ] .
Capítulo 2. Propriedades Gerais
25
Substituindo esta expressão na integral anterior ficamos com
Z
β
σk [σi σj − hσi σj iΛ ] PΛ (σ)dκ(σ) = β hσi σj σk iΛ − hσi σj iΛ hσk iΛ .
ΩΛ
Podemos usar a desigualdade de GKS-2 com A = {i, j} e B = {k} para
concluir que a integral acima é não-negativa. E como observado anteriormente isto implica que ∂mΛ /∂Jij ≥ 0 e assim, está terminada a demonstração da desigualdade desejada.
A próxima desigualdade de correlação que vamos estabelecer e a Desigualdade GHS, provada pela primeira vez em 1970 por Griffiths, Hurst
e Sherman em [14]. A prova apresentada aqui porém é baseada nos trabalhos [7] de Ellis e Monroe e [17] de Lebowitz. A técnica utilizada nestes
trabalhos para provar a desigualdade é muito parecida com aquela que
usamos para provar GKS-2, com a principal diferença sendo que ao invés
de duplicarmos variáveis, desta vez vamos quadruplicá-las.
Fixado Λ ⊂ Z finito, vamos introduzir um sistema de spins quadruplicado com espaço de configuração Ω4Λ ≡ ΩΛ × ΩΛ × ΩΛ × ΩΛ . Vamos representar um ponto deste espaço por um quadrupla ordenada (ω, σ, δ, η),
onde cada uma das “coordenadas” ω, σ, δ, η ∈ ΩΛ . Definimos o Hamiltoni(4)
ano HΛ : Ω4Λ → R por
(4)
HΛ (ω, σ, δ, η) = HΛ (ω) + HΛ (σ) + HΛ (δ) + HΛ (η),
(2.14)
onde HΛ é o Hamiltoniano do modelo de Ising dado por
)
(
X X1
Jij σi σj + hi σi .
HΛ (σ) = −
2
i∈Λ
j∈Λ
Analogamente a notação introduzida na prova de GKS-2 vamos denotar
por h·i4 a esperança com relação à distribuição de probabilidades definida
(4)
pelo Hamiltoniano HΛ .
Lema 2.2.6. Para cada i ∈ Λ defina as seguintes funções
Ai (ω, σ, δ, η) =
ωi + σi + δi + ηi
2
ωi − σi + δi − ηi
Ci (ω, σ, δ, η) =
2
Bi (ω, σ, δ, η) =
ωi + σi − δi − ηi
2
−ωi + σi + δi − ηi
Di (ω, σ, δ, η) =
2
(2.15)
Se no Hamiltoniano (2.14) cada hi ≥ 0, então para quaisquer subconjuntos
Capítulo 2. Propriedades Gerais
26
não-vazios ∆, Γ, Θ, Υ ⊂ Λ temos que
hA∆ BΓ CΘ DΥ i4 ≥ 0,
onde a v.a. A∆ =
Q
Ai , . . . , DΥ =
i∈∆
Q
i∈Υ
Di .
Demonstração. Para cada i ∈ Λ fixado, podemos representar (2.15) matricialmente como segue

 

1
1
1
1
Ai (ω, σ, δ, η)
ωi


 

 Bi (ω, σ, δ, η)  1  1
 
1 −1 −1

 σi 
= 
 C (ω, σ, δ, η)  2  1 −1 1 −1  δ 

 i
 i

−1 1
1 −1
Di (ω, σ, δ, η)
ηi

É imediato verificar que as linhas da matriz acima são mutuamente ortogonais e portanto a matriz acima induz uma aplicação linear ortogonal
em R4 , como tais aplicações preservam produto interno podemos verificar
que para quaisquer i, j ∈ Λ que
ωi ωj + σi σj + δi δj + ηi ηj =
1
Ai Aj + Bi Bj + Ci Cj + Di Dj ,
2
onde na igualdade acima deve ser entendido que as funções Ai , . . . , Di estão calculadas no ponto (ω, σ, δ, η). Portanto como igualdade de funções
podemos escrever
(4)
HΛ
)
(
i
1X X h
=−
Jij Ai Aj + Bi Bj + Ci Cj + Di Dj + hi Ai .
2 i∈Λ j∈Λ
A partir deste ponto seguimos as mesmas ideias empregadas na prova de
GKS-2: expandimos a exponencial que aparece em hA∆ BΓ CΘ DΥ i4 e usamos
o teorema de Fubini. Feito isto é fácil ver que a não negatividade deste
valor esperado segue se mostrarmos que a seguinte desigualdade é valida
para quaisquer número inteiros positivos k, l, m, n.
Z
Ω4Λ
Aki (x)Bil (x)Cim (x)Din (x) dκ(x) ≥ 0,
onde κ denota a medida de contagem em Ω4Λ . Para provar que esta desigualdade é verdadeira observamos primeiro que por simetria a integral
acima é zero a menos que k, l, m, n tenham a mesma paridade. Quando a
paridade é par o integrando é obviamente não negativo e a desigualdade
Capítulo 2. Propriedades Gerais
27
certamente é válida. Quando a paridade é ímpar usamos uma propriedade especial dos spins de Ising que é ωi2 = σi2 = δi2 = ηi2 = 1, da seguinte
maneira: fatoramos
Bil−1 Cim−1 Din−1 · Ai Bi Ci Di
Aki Bil Cim Din = Ak−1
i
e em seguida, notamos que para qualquer ponto (ω, σ, δ, η) vale a seguinte
igualdade
1
(Ai · Bi · Ci · Di )(ω, σ, δ, η) = (ωi σi − δi ηi )2 .
4
Desta forma temos que mesmo no caso de paridade ímpar a função no
integrando Aki Bil Cim Din é pontualmente não-negativa e o lema esta provado.
Teorema 2.2.7 (Desigualdade GHS). Considere o modelo de Ising no volume Λ com Hamiltoniano dado por
(
)
X X1
HΛ (σ) = −
Jij σi σj + hi σi .
2
i∈Λ
j∈Λ
Seja h·iΛ o valor esperado com respeito a medida de Gibbs a volume Λ
determinada por HΛ . Se Jij , hi ≥ 0 para todo i, j ∈ Λ, então para quaisquer
sítios i, j, k ∈ Λ temos a seguinte desigualdade
hσi σj σk iΛ − hσi iΛ hσj σk iΛ − hσj iΛ hσi σk iΛ − hσk iΛ hσi σj iΛ + 2hσi iΛ hσj iΛ hσk iΛ ≤ 0.
(4)
Demonstração. Defina as seguinte funções em ΩΛ
Ri (ω, σ, δ, η) =
ωi + σi
√
2
δi + η i
Ti (ω, σ, δ, η) = √
2
Si (ω, σ, δ, η) =
ωi − σi
√
2
δi − ηi
Ui (ω, σ, δ, η) = √
2
(2.16)
Como observado por Lebowitz [17]
hσi σj σk iΛ − hσi iΛ hσj σk iΛ − hσj iΛ hσi σk iΛ − hσk iΛ hσi σj iΛ + 2hσi iΛ hσj iΛ hσk iΛ
=
E(4)
√ D
− 2 Rk Ui Uj − Rk Si Sj
,
Λ
(4)
onde h·iΛ é o valor esperado com respeito a medida de Gibbs determinada
pelo Hamiltoniano quadruplicado (2.14). Para concluir a prova basta ob-
Capítulo 2. Propriedades Gerais
28
servar que a última esperança da igualdade acima pode ser escrita em
função das variáveis aleatórias Ai , Bi , Ci , Di , definidas em (2.15), como segue
√
− 2
Ak + Bk
√
2
(4)
Cj + Dj
Ci − Di
Cj − Dj
√
√
√
−
2
2
2
Λ
=
(4)
−h(Ak + Bk )(Ci Dj + Cj Di )iΛ .
Ci + Di
√
2
Já que este último valor esperado é não negativo, pelo Lema 2.2.6, a desigualdade GHS está demonstrada.
A principal aplicação da desigualdade GHS é mostrar que a magnetização específica a volume finito é uma função côncava, quando vista como
função apenas do parâmetro h (campo externo). Este cálculo é feito com
detalhes ao longo da prova do Teorema 3.4.3.
Além desta aplicação no modelos de Ising e Curie-Weiss é importante
mencionar que a desigualdade GHS pode ser também aplicada para determinar propriedades de concavidade de certas equações diferenciais a
derivadas parciais e certos processos de difusão. Condições necessárias
e suficientes para a validade desta desigualdade são apresentadas no importante trabalho [8] de Ellis e Newman de 1978, bem como algumas
aplicações desta desigualdade em EDP’s e processos de difusão.
2.3
Condições Exteriores
Na Seção 1.3 apresentamos o modelo a volume finito e a magnetização
nesse modelo. O modelo ali definido é denominado com mais precisão
por modelo de Ising a volume finito com condições de fronteira(ou exteriores) livres. O volume Λ era considerado ali como um subconjunto de
Z. Poderíamos, então, fixar os spins exteriores a Λ e definir a interação
entre esses spins fixados e os spins de Λ. Esse outro modelo, com condições exteriores definidas, é uma espécie de generalização do anterior.
Como no modelo inicialmente exposto não havia interação dos spins de Λ
com entes exteriores, diz-se que ele tem "condições exteriores livres". Assim, redefiniremos o modelo de forma a acrescentar as citadas condições
exteriores.
Precisaremos acrescentar no hamiltoniano os termos de interação com
os spins exteriores. Os sítios exteriores a Λ são os elementos de Λc ≡ Z \ Λ.
Capítulo 2. Propriedades Gerais
29
Logo, o estado fixado dos spins exteriores será um elemento do conjunto
c
ΩΛc = {−1, +1}Λ . Esse estado exterior será denominado σ
e. Podemos agora
escrever (formalmente pois, não lidamos ainda com as questões de convergência) o novo hamiltoniano de um modelo de Ising finito com condições
exteriores σ
e como segue
HΛσe (σ) =
X
X X 1
Jij σ
ej σi }
{
− Jij σi σj − hi σi −
2
i∈Λ j∈Λ
j∈Z\Λ
Oσ
e superescrito em HΛσe será usado para nos lembrar que é um hamiltoniano de um modelo com condição exterior σ
e. É natural que os coeficientes
Jij tenham sido estendidos para i, j ∈ Z com Jii = 0, ∀i ∈ Λ. Podemos perceber que a interação com os spins externos a Λ age de forma muito similar
a um campo externo, pois um sistema com condições externas livres e
campo externo
e
hi = hi +
X
Jij σ
ej
j∈Z\Λ
tem exatamente o mesmo hamiltoniano. Logo, tanto faz definir um sistema com condição exterior σ
e e campo externo hi ou um sistema com condição exterior livre e campo externo e
hi .
Quanto aos estados exteriores, aqueles de maior interesse têm todos
seus spins σi alinhados, ou seja, todos os spins valendo +1 ou −1. Esses
estados exteriores serão denotados estado +, quando para todo i ∈ Λc ,
σi = +1 e estado − no caso simétrico.
Na seção seguinte nos restringiremos a mostrar a existência dos limites da magnetização quando Λ → Z para essas duas condições exteriores
especiais + e −. Como as duas condições são totalmente simétricas, trabalharemos apenas com +.
2.4
Magnetização a Volume Finito
Usando o corolário da desigualdade de FKG (Corolário 2.2.3) podemos
demonstrar a convergência da magnetização quando Λ → Z para os casos
com interação dependente apenas da distância entre os spins, Jij = J(|i −
j|), campo externo constante hi = h e condições exteriores + ou −. Como a
demonstração para o caso − é totalmente análoga, exporemos aqui apenas
o caso +.
Capítulo 2. Propriedades Gerais
30
O artifício a ser utilizado é comum a várias outras questões sobre modelos de Ising. Trata-se de fazer o campo externo em alguns sítios escolhidos tender a +∞. Intuitivamente, isso obriga os spins naqueles sítios a se
“alinharem” com o campo externo, sendo positivos quase certamente. O
sistema alterado, então, se comporta como um sistema com spins positivos fixos nos sítios onde o campo foi aumentado. Assim, é possível utilizar
o Corolário 2.2.3 para mostrar a não-diminuição do valor esperado de uma
função crescente qualquer quando fixamos um dos spins da rede no sentido +1, já que fixar um spin i seria equivalente a fazer hi → ∞. Vamos
agora tornar essa ideia intuitiva algo mais precisa.
Deste ponto em diante, vamos assumir que Jij satisfaz
sup
i∈Z
X
|Jij | < ∞.
j∈Z
Essa hipótese é conveniente para que possamos argumentar que todas as
somas envolvendo Jij que aparecem no restante desta seção sejam absolutamente convergentes.
Observando como a alteração do campo externo hα influencia na energia de um estado σ podemos compreender melhor o que acontece quando
hα → ∞. A energia do estado σ com condições de contorno + é dada por
HΛ+ (σ) =
X
X X 1
Jij σi }
− Jij σi σj − hi σi −
{
2
i∈Λ j∈Λ
j∈Z\Λ
Elegemos-se, então, um sítio α fixado. Quando fazemos hα → ∞, o termo
hα σα do somatório acima faz a energia do estado σ tender a −∞ se σα = +1.
Por outro lado, se σ é tal que σα = −1 então a energia do estado σ quando
hα → +∞ tende a +∞. Já que a probabilidade do estado σ é dada por
+
P+
Λ (σ)
+
e−HΛ (σ)
e−HΛ (σ)
=
=
P
+
−HΛ
(ω)
ZΛ+
ω∈Ω e
Λ
Evidentemente, se σα = −1, o numerador da probabilidade do estado σ
tende a zero e como limhα →+∞ ZΛ+ = +∞ temos que P+
Λ (σ) → 0. Por outro
lado, se σα = +1, no numerador aparece um fator multiplicativo exp(hα ) que
fará exp (−HΛ+ (σ)) → +∞. Contudo, o somatório no denominador tem todos
os termos com ωα = −1 tendendo a zero e todos os termos com ωα = +1
com o mesmo fator multiplicativo exp(hα ) que pode ser cancelado com o
equivalente do numerador.
Capítulo 2. Propriedades Gerais
31
Desse modo, se denotamos por Λ0 = Λ \ {α} a caixa sem o sítio α, σ 0 a
restrição de σ à caixa Λ0 , HΛ+0 e PΛ+0 respectivamente a energia e a probabilidade para um sistema definido em Λ0 com condições exteriores + e spin
α fixo em +1, chegamos à seguinte conclusão
P+
Λ (σ) =
e
+
−HΛ
(σ)
ZΛ+

+
0
 exp [−H+Λ0 (σ )] = P+0 (σ 0 ), se σα = +1
Λ
Z
−−−−−→
Λ0
hα →+∞
se σα = −1
0,
Pode-se concluir com a expressão acima que quando hα → ∞ o sistema
definido em Λ com hamiltoniano HΛ+ é totalmente análogo a um sistema
definido em Λ0 e com Hamiltoniano HΛ+0 onde σα = +1 é fixado. De fato,
pelo Teorema da Convergência Dominada para toda função integrável f :
ΩΛ → R com respeito a PΛ temos que
lim hf i+
Λ
hα →+∞
Z
=
lim
hα →+∞
Z
=
f (σ)PΛ (σ) dκ(σ)
ΩΛ
1{σα =+1} f (σ)PΛ0 (σ 0 ) dκ(σ)
ΩΛ
= hf (·, +1)i+
Λ0 .
Em particular se f : ΩΛ → R não depende da variável σα então podemos
escrever (com um pequeno abuso de notação)
+
lim hf i+
Λ = hf iΛ0 .
hα →+∞
Com esse resultado, continuamos com a análise relativa ao limite da
magnetização com Λ → Z
A sequência cuja convergência gostaríamos e analisar é a sequência
das magnetizações específicas de sistemas finitos com condições exteriores + e caixas de tamanhos crescentes. O natural seria utilizar a sequência
de caixas da forma Z ∩ [−N, +N ], contudo, para facilitar a exposição, como
a magnetização específica não se altera ao transladarmos por um número
finito de sítios o sistema como um todo, utilizaremos a sequência de caixas
ΛN = Z ∩ [1, +N ]. Para não carregar a notação vamos denotar a magnetização específica do o sistema definido em ΛN e com condições exteriores
positiva, isto é, + (com β, h e Jij ≡ J(|i − j|) fixos) por
1
mN = hSN i+
ΛN =
N
*
1 X
σi
N i∈Λ
N
++
.
ΛN
Capítulo 2. Propriedades Gerais
32
O objetivo desta seção é mostrar a convergência da sequência de números reais mN . Para tanto precisaremos do Lema de Fekete, que garante
a convergência da média de sequências subaditivas, como posto abaixo.
Definição 2.4.1 (Sequência subaditiva). Uma sequência de números reais aN , N ∈ N∗ é dita subaditiva se, para todo M, N ∈ N∗ , aM +N ≤ aM + aN .
Lema 2.4.1 (Lema de Fekete). Dada uma sequência subaditiva {aN }N , a
sequência {aN /N }N converge e
aN
aN
= inf
.
N →∞ N
N
Uma vez provada a subaditividade da sequência {hSN iΛN }N , seria possível aplicar o Lema de Fekete, chegando a conclusão da convergência
da magnetização no limite infinito m = limN →∞ mN . Para provar a citada
subaditividade, tomemos o modelo definido na caixa ΛM +N com condições
exteriores +. Dividiremos esse sistema em duas caixas menores, a primeira, a ser identificada por ∆M , conterá os spins de índices 1 até M . A
outra, contendo os N demais spins, de M + 1 até M + N , será ∆N . Equivalentemente, a soma hSM +N iΛM +N será dividida em duas partes, já que
lim
++
*
X
hSM +N i+
ΛM +N =
σi
i∈ΛM +N
++
*
X
=
σi
i∈∆M
ΛM +N
++
*
+
ΛM +N
X
i∈∆N
.
σi
(2.17)
ΛM +N
Em seguida, se alteramos o sistema de modo a introduzir campo infinito
nos sítios de ∆N , ou seja, manter constantes todos os demais parâmetros,
mas alterar {hi } fazendo hi → +∞ para os sítios i ∈ ∆N , temos um sistema
resultante com spins em ∆N fixos em +1. A restrição a ∆M do sistema
resultante tem spins com interação J(i − j) dentro de ∆M , e que também
interagem com spins fixos em +1 fora de ∆M . Portanto, o sistema resultante é exatamente igual ao sistema definido em ΛM = ∆M e com condições
exteriores +. Como apenas aumentou-se o campo externo hi em alguns sítios, o Corolário 2.2.3 da Desigualdade de FKG nos garante que não há
P
diminuição da função crescente h i∈∆M σi i+
ΛM +N . Em outras palavras,
++
*
X
i∈∆M
≤
σi
ΛM +N
++
*
X
i∈ΛM
= hSM i+
ΛM .
σi
(2.18)
ΛM
Vamos analisar agora a segunda parcela no termo à extrema direita de
(2.17). A diferença da análise deste termo para a do caso anterior é que
Capítulo 2. Propriedades Gerais
33
∆N = Z ∩ [M + 1, M + N ], que a rigor é diferente ΛN = Z ∩ [1, N ]. Isso não gera
problema para comparação, pois estamos supondo que nossa interação
Jij ≡ J(|i − j|), isto é depende apenas da distância entre entre pares de
spins e o campo externo h é constante. Sendo assim, é possível transladar
todo o sistema de ∆N = Z ∩ [M + 1, M + N ] para ΛN = Z ∩ [1, N ] sem alterar
a soma dos spins na caixa sob análise. E, repetindo o argumento do caso
anterior obtemos a seguinte desigualdade
++
*
X
i∈∆N
++
*
≤
σi
ΛM +N
X
i∈ΛN
= hSN i+
ΛN .
σi
(2.19)
ΛN
Juntando a última expressão com as duas desigualdades anteriores,
podemos concluir que
+
+
hSM +N i+
ΛM +N ≤ hSM iΛM + hSN iΛN .
(2.20)
Assim a sequência de números reais {hSN i+
ΛN }N é, pois, subaditiva. Pelo
+
Lema de Fekete, com aN = hSN iΛN temos que existe o limite da magnetização específica
1
1
hSN i+
hSN i+
ΛN = inf ∗
ΛN .
N →∞ N
N ∈N N
m = lim mN = lim
N →∞
Esse resultado será enunciado mais a frente como um lema para posterior
referência.
Utilizando o mesmo raciocínio, é possível também provar a existência
do limite da magnetização específica para o caso de condições de contorno
livre, notação mfN,h , onde mfN,h = hSN /N ifΛN ,h com o superescrito f denotando
a condição de contorno livre ou “free”. Vamos provar a existência do limite
neste caso com campo externo h > 0. Para isto será usado o corolário
da Desigualdade GKS-2 (Corolário 2.2.5). Com ele vamos mostrar que a
sequência {hSN iΛN ,0 }N é superaditiva, isto é,
hSM +N ifΛM +N ,h ≥ hSM ifΛM ,h + hSN ifΛN ,h
Para tal, novamente separaremos a caixa ΛM +N em suas duas partes ∆M
e ∆N . Em seguida, constrói-se um novo sistema com Jij = 0 sempre que
i ∈ ∆M e j ∈ ∆N . Desta forma anulamos a interação dos spins entre dos
sítios ∆M e ∆N e portanto o que obtemos são dois sistemas independentes.
Assim, após se “desligadas” estas interações, as duas partes restantes
Capítulo 2. Propriedades Gerais
34
são totalmente equivalentes (a menos de uma translação) a dois sistemas
independentes definidos em ΛM e ΛN .
Como houve apenas a redução de algumas interações Jij , o corolário da
desigualdade de GKS-2 nos garante que não há aumento na magnetização
em nenhum dos subconjuntos ∆M e ∆N . Conclui-se, como desejado, que
hSM +N ifΛM +N ,h ≥ hSM ifΛM ,h + hSN ifΛN ,h . Usando agora o Lema de Fekete para
sequências superaditivas podemos garantir a convergência da sequência
{hSN ifΛN ,h /N }N .
Lema 2.4.2. Para um modelo de Ising finito definido em uma caixa simétrica ΛN = Z ∩ [−N, +N ], com constantes de acoplamento invariantes
por translação Jij = J(|i − j|), campo magnético constante hi = h e condições exteriores livres, positiva(+) e negativa(-), fixado qualquer valor
do inverso da temperatura β a sequência das magnetizações específicas
mN = hSN /N iΛN converge para m = limN →∞ mN .
2.5
Algumas Propriedades de SN /N
Seguindo o raciocínio da seção anterior, tomamos uma sequência de modelos de Ising a volume finito com condições exteriores livres definidos
em ΛN = Z ∩ [0, N ]. Principal diferença dos modelos considerados nesta e
na seção anterior, é que aqui vamos assumir que hi = h > 0, ou seja, campo
externo constante e positivo. Já mostramos na seção anterior a existência da magnetização m no limite N → ∞. Nesta seção vamos estudar o
comportamento de PΛN ,h no limite termodinâmico (N → ∞).
Com os resultados até aqui apresentados, é possível verificar que
mβ,0 = lim mΛN ,β,0 = lim 0 = 0,
N →∞
N →∞
pois vimos na Seção 1.3 que se h = 0 então mΛN ,β,0 = 0,
Como a desigualdade de FKG nos assegura que o aumento no campo
magnético não diminui a magnetização, temos que se h ≥ 0 então mΛN ,β,h ≥
0 para todo N e portanto o limite também é não-negativo, isto é, mβ,h ≥
0. Lembrando que mβ,h = limN →∞ hSN /N iΛN ,h , podemos afirmar que o valor
esperado da sequência de variáveis aleatórias SN /N converge um valor
não negativo.
Grosseiramente falando, a principal meta desta seção é mostrar que
além de ter média convergindo para um valor não-negativo, no “Limite
Capítulo 2. Propriedades Gerais
35
Termodinâmico” a variável aleatória SN /N nunca se alinha contra o campo
externo h. De maneira mais precisa, vamos mostrar que se h > 0 então
lim PΛN ,β,h
N →∞
SN
< −a
N
=0
para qualquer valor positivo a ∈ (0, 1].
Para facilitar a notação da prova do fato mencionado acima, vamos
omitir a dependência da medida de Gibbs com respeito ao parâmetro β e
escrever simplesmente, para todo evento A,
PΛN ,β,h (A) ≡ PΛN ,h (A).
Para demonstrar o resultado enunciado acima vamos começar obtendo
cotas superiores para
PΛN ,h
SN
≤ −a = PΛN ,h (SN ≤ −aN ).
N
Dado um estado σ pertencente ao evento EN,a = {σ ∈ ΩN |SN ≤ −aN },
existe um estado simétrico −σ, elemento do evento −EN,a = {σ ∈ ΩN |SN ≥
+aN }. Podemos calcular a diferença entre as energias dos estados σ e −σ
como mostrado abaixo:
X
1
σi
− Jij σi σj − h
2
i∈Λ
i,j∈Λ
X 1
X
+
Jij (−σi )(−σj ) + h
(−σi )
2
i,j∈Λ
i∈Λ
HΛ (σ) − HΛ (−σ) = −
X
= −2h
X
σi
i∈Λ
= −2hSN (σ).
Observe que ao passar de σ para −σ todos os spins são invertidos, a
energia de interação entre qualquer par (i, j), representada pelo termo
− 21 Jij σi σj , fica inalterada, pois σi σj = (−σi )(−σj ). Por outro lado, a energia
de interação com o campo externo h, que é hSN (σ) para o estado σ, passa
a ser −hSN (σ) para o estado −σ.
Portanto para todo σ ∈ EN,a , temos que
HΛ (σ) − HΛ (−σ) ≥ +2haN.
Capítulo 2. Propriedades Gerais
36
Assim, o estado σ, por ter a maioria dos spins alinhados contra o campo
externo, tem energia pelo menos 2haN > 0 maior que o estado −σ. Como
os estados com menor energia são mais prováveis, a comparação das probabilidades desses dois estados simétricos nos dá
exp [−βHΛN ,h (σ)]
PΛN ,h (σ)
=
= exp(2βhSN (σ)) ≤ exp(−2βhaN ).
PΛN ,h (−σ)
exp [−βHΛN ,h (−σ)]
Mas a desigualdade acima vale para todo estado σ ∈ EN,a , logo vale também quando comparamos os eventos EN,a e −EN,a . Já que a probabilidade
de qualquer evento está limitada por 1, temos que PΛN ,β,h (−EN,a ) ≤ 1, logo
podemos concluir que
PΛN ,h (EN,a ) ≤ exp(−2βhaN ) · PΛN ,h (−EN,a ) ≤ exp(−2βhaN ).
Tomando o lim sup em ambos os lado da desigualdade acima, ficamos com
lim sup PΛN ,h
N →∞
SN
≤ −a
N
≤ lim exp(−2βhaN ) = 0.
N →∞
Já que a medida de qualquer conjunto é não negativa e o limite superior
é zero, podemos afirmar que o seguinte limite existe
lim PΛN ,h
N →∞
SN
≤ −a
N
(2.21)
= 0.
Esse resultado nos será útil no último capítulo, pois lá mostraremos que,
para um certo sistema que atende às hipóteses tanto desta seção como da
anterior (2.4),
* +
2
SN
= m(2) > 0.
lim inf
N →∞
N
ΛN ,h
Uma vez obtida a desigualdade acima, é possível aplicar o resultado provado nesta seção para mostrar que
*
lim inf
N →∞
SN
N
2 +
(2)
=m
ΛN ,h
=⇒
m(β, h) = lim
N →∞
SN
N
≥ m(2) .
ΛN ,h
Para mostrar a implicação acima, vamos usar a definição do valor esperado h(SN /N )2 iΛN ,h e uma decomposição apropriada do espaço ΩΛ em três
subconjuntos, que serão definidos de acordo com o valor de SN /N como
Capítulo 2. Propriedades Gerais
37
segue
*
SN
N
2 +
2
SN (σ)
=
PΛN ,β,h (σ)dκ(σ)
N
ΩΛN
2
2
Z
Z
SN (σ)
SN (σ)
PΛN ,β,h (σ)dκ(σ) + PΛN ,β,h (σ)dκ(σ)
=
SN
SN N
N
<−a
≤a
N
N
2
Z
SN (σ)
+
PΛN ,β,h (σ)dκ(σ).
N
SN /N >+a
Z
ΛN ,h
Observe que o limite inferior da integral sobre {SN /N < −a} é zero. De
fato, basta observar que |SN /N | ≤ 1 e usar a igualdade (2.21)
Z
lim inf
N →∞
SN
N
<−a
SN (σ)
N
2
Z
PΛN ,β,h (σ)dκ(σ) ≤ lim inf
N →∞
SN
N
PΛN ,β,h (σ)dκ(σ)
<−a
= lim inf PΛN ,β,h
N →∞
SN
< −a
N
= 0.
Para a integral sobre {|SN /N | ≤ a} usamos que a medida PΛN ,h é limitada
por 1 e que o integrando é limitado por a2 , assim,
Z
SN N ≤a
SN (σ)
N
2
PΛN ,β,h (σ)dκ(σ) ≤ a2
Como estamos assumindo
m(2) = lim inf
N →∞
*
SN
N
2 +
,
ΛN ,h
temos que o limite inferior sobre toda a expressão de h(SN /N )2 iΛN ,h é cotado
superiormente por
(2)
m
*
= lim inf
N →∞
SN
N
2 +
ΛN ,h
2
SN (σ)
= lim inf PΛN ,β,h (σ)dσ
SN N →∞
N
N ≤a
2
Z
SN (σ)
+ lim inf
PΛN ,β,h (σ)dσ
SN
N →∞
N
>+a
N
Z
Z
2
≤ a + lim inf
N →∞
SN
N
>+a
SN (σ)
PΛN ,β,h (σ)dσ,
N
Capítulo 2. Propriedades Gerais
38
onde na última desigualdade usamos 0 ≤ SN /N ≤ 1, nos permitindo con2
cluir, neste caso, que SN
/N 2 ≤ SN /N .
Da desigualdade acima segue imediatamente
Z
lim inf
N →∞
SN
N
>+a
SN (σ)
PΛN ,β,h (σ)dσ ≥ m(2) − a2 .
N
Aplicando exatamente o mesmo raciocínio a lim inf N →∞ hSN /N iΛN ,h e a
desigualdade acima, concluímos que
lim
N →∞
SN
N
= lim inf
ΛN ,h
N →∞
SN
N
= lim inf
N →∞
N →∞
ΛN ,h
Z
+ lim inf
Z
SN N ≤a
SN (σ)
PΛN ,β,h (σ)dσ
N
Z
≥ −a + lim inf
N →∞
ΩΛ
SN (σ)
PΛN ,β,h (σ)dσ
N
SN
N
>+a
SN (σ)
PΛN ,β,h (σ)dσ
N
≥ −a + m(2) − a2 .
Contudo, como o resultado é válido para todo a ∈ (0, 1], segue
m(β, h) = lim
N →∞
SN
N
≥ m(2) .
ΛN ,h
Com uma pequena adaptação do argumento dado acima, temos na verdade provado o seguinte lema.
Lema 2.5.1. Dado um modelo de Ising finito definido em uma caixa simétrica ΛN = Z ∩ [−N, +N ], com constantes de acoplamento Jij ∈ R (não necessariamente ferromagnéticas), campo magnético hi tal que lim inf n→∞ hi ≥
h > 0 e condições exteriores livres, fixo qualquer valor do inverso da temperatura β, se existir o limite das magnetizações finitas
m(β, {hi }i∈Z ) = lim
N →∞
SN
|ΛN |
ΛN ,{hi }i∈ΛN
e lim inf N →∞ h(SN /|ΛN |)2 iΛN ,{hi }i∈ΛN ≥ m(2) (β, {hi }i∈Z ) > 0, então m(β, {hi }i∈Z ) ≥
m(2) (β, {hi }i∈Z ) > 0.
Capítulo 3
Modelos com Interações
Translacionalmente Invariante
3.1
Introdução
Nos capítulos anteriores definimos o modelo de Ising com interações ferromagnéticas Jij . Em alguns dos resultados expostos a única propriedade
importante das interações Jij era sua positividade. O tema deste capítulo
são os sistema com constantes de acoplamento Jij dependente apenas da
distância entre os sítio i e j, ou seja, Jij ≡ J(|i − j|).
Na Seção 3.2 apresentamos o modelo de Curie-Weiss (CW), modelo no
qual cada spin interage apenas com a magnetização total. Por estar entre
os mais simples modelos de Ising que apresentam transição de fase, é
possível realizar uma série de cálculos explicitos envolvendo esse modelo.
A Seção 3.3 traz os cálculos detalhados de uma função denomida pressão nesse modelo. Em seguida, na Seção 3.4 é apresentada a relação
entre a derivada da pressão e a magnetização. Continuando o raciocínio,
a Seção 3.5 utiliza os resultados anteriores para calcular explicitamente
a magnetização no modelo de CW, mostrando que há uma região de altas
temperaturas em que a magnetização é nula. Finalizando a análise do modelo de CW, a Seção 3.6 compara um Modelo de Ising arbitrário (somável)
com um modelo de CW, mostrando que este último apresenta magnetização que não supera a do primeiro. Essa linha de raciocínio demonstra
que qualquer Modelo de Ising somável apresenta uma temperatura crítica
finita acima da qual a magnetização é nula.
Em 3.7, tratamos dos modelos com interação do tipo lei de potência,
isto é, Jij = |i − j|−α . Nessa seção citamos vários resultados já conhecidos
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
40
em 1969 sobre esses modelos. Veremos que no limite quando N → ∞,
para o caso não somável α ≤ 1, quase todos os spins estarão alinhados
com probabilidade 1 e haverá magnetização não nula para todo β. Já para
o caso α > 2, a situação é inversa para todo β > 0 a magnetização limite
será zero. Os casos mais interessantes, que apresentam transição de fase,
serão tratados no próximo capítulo.
A última seção do capítulo, 3.8 mostra como ao se classificar os modelos do tipo lei de potência ganhamos também maior entendimento sobre
outros modelos com interações translacionalmente invariantes.
3.2
Modelo de Curie-Weiss
O modelo de Curie-Weiss a volume finito é um modelo de Ising como apresentado na Seção 1.3 em que as constantes de acoplamento J(|i − j|) são
dadas por Jij = J /|Λ|, sendo J uma constante real positiva. Há uma
importante diferença na sequência de modelos que tomamos ao calcular
funções no Limite Termodinâmico. No modelo de Ising dado um par de
spins (i, j) as constantes de acoplamento Jij são fixas, independentes do
tamanho da caixa |Λ|. Já no modelo de Curie-Weiss essas constantes de
acoplamento variam com o volume |Λ|, sendo constante apenas o parâmetro J , correspondente à soma das interações de um spin com os demais.
Neste texto, vamos nos concentrar exclusivamente no caso ferromagnético, isto é, J ≥ 0. O caso J = 0 é trivial, pois a medida de Gibbs é
na verdade a medida produto de medidas de Bernoulli. A energia de cada
CW
estado σ nesse modelo será denotada por HΛ,h
(σ) e dada por:
CW
HΛ,h
(σ) = −
X
X J
σi σj −
hσi .
2|Λ|
i∈Λ
i,j∈Λ
(3.1)
Se h = 0, por exemplo, então temos que
X J
X J
CW
HΛ,0
(σ) = −
σi σj = −
σi
2|Λ|
2
i,j∈Λ
i∈Λ
"
#
X σj
X J SΛ =−
σi
.
|Λ|
2
|Λ|
j∈Λ
i∈Λ
No modelo de Curie-Weiss é simples entender a relação entre o valor
esperado de um spin qualquer hσi iΛ e a magnetização específica mΛ,h =
hSΛ /|Λ|i. Para isso basta observar que devido à simetria do modelo, dados
dois sítios i e j quaisquer, temos hσi iΛ,h = hσj iΛ,h . Logo, segue da linearidade
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
41
do valor esperado, que
mΛ,h =
SΛ
|Λ|
P
=
Λ,h
σi
|Λ|
i
=
Λ,h
1 X
1
hσi iΛ,h =
|Λ|hσi iΛ,h = hσi iΛ,h ,
|Λ| i
|Λ|
(3.2)
ou seja, o valor esperado de um spin qualquer é exatamente a magnetização específica.
3.3
A Pressão do Modelo de Curie-Weiss
Nesta seção vamos definir e calcular a pressão do modelo de Curie-Weiss.
A função de partição ZΛ desse modelo pode ser calculada utilizando o hamiltoniano (3.1). Para cada natural N , temos Λ = [−N, N ] ∩ Z e
ZΛ =
X
σ∈ΩΛ
X
X βJ
σi
exp
σi σj + βh
2|Λ|
i∈Λ
i,j∈Λ

=
X
exp 
σ∈ΩΛ
βJ |Λ|
2
X σi
|Λ|
i∈Λ
!

!2
+ βh
X
σi  .
i∈Λ
Claramente o termo quadrático na expressão acima é o termo que cria
dificuldade na obtenção de uma fórmula mais explícita para ZΛ e consequentemente para a pressão, cuja definição será apresentada mais a
frente. Para superar essa dificuldade, a ideia é reescrever o termo quadrático como uma integral Gaussiana. O primeiro passo para isso é considerar a seguinte identidade:
a2
e
1
=√
2π
Z
e
√
−t2
+ 2at
2
dt,
R
que é válida para todo a ∈ R. Usando essa identidade na expressão da
função de partição com
r
a=
βJ |Λ| X σi
2
|Λ|
i∈Λ
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
42
temos que

ZΛ =
X
σ∈ΩΛ
=
X
σ∈ΩΛ
1
=√
2π
βJ |Λ|
exp 
2
X σi
|Λ|
i∈Λ
!2 
!
 exp βh
X
σi
.
i∈Λ
 r
!2 
!
X
X
βJ
|Λ|
σ
i
 exp βh
σi
exp 
2
|Λ|
i∈Λ
i∈Λ
XZ
σ∈ΩΛ
s
−t2
+t
2
exp
R
βJ X
σi
|Λ| i∈Λ
(3.3)
!
!
dt · exp βh
X
σi
i∈Λ
s
!#
2
Z Y"
1 X
βJ
−t
=√
σi + βhσi
exp
dt.
exp t
|Λ|
2
2π σ∈ΩΛ R i∈Λ
Para simplificar o termo que aparece mais à direita da igualdade acima
vamos precisar da seguinte observação: se G : R2 → R é uma função Borel
mensurável não-negativa, então
XZ Y
σ∈ΩΛ
X
G(t, σi ) dt =
R i∈Λ
...
σ−N ∈{−1,1}
Z Y
X
σN ∈{−1,1}
G(t, σi ) dt
R i∈Λ


Z
=
X

R
...
σ−N ∈{−1,1}
X
G(t, σ−N ) . . . G(t, σN ) dt
σN ∈{−1,1}


Z
=
X

R
Z
=
R
G(t, σN )
...
σ−N ∈{−1,1}

Y

X
G(t, σN ) dt
σN ∈{−1,1}

X
G(t, σi ) dt.
i∈Λ σi ∈{−1,1}
Em vista dessa observação e de (3.3) obtemos

s
!
2
Z Y
X
βJ
−t
1

exp t
σi + βhσi  exp
dt.
ZΛ = √
|Λ|
2
2π R i∈Λ σ ∈{−1,1}
i
A expressão dentro do produtório acima pode ser escrita como
s
X
σi ∈{−1,1}
exp t
βJ
σi + βhσi
|Λ|
!
s
= 2 cosh t
!
βJ
+ βh .
|Λ|
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
43
Substituindo essa expressão na última igualdade obtida para a função de
partição ficamos com
1
ZΛ = √
2π
Z Y"
s
βJ
+ βh
|Λ|
2 cosh t
R i∈Λ
!#
exp
−t2
2
dt
(3.4)
2|Λ|
=√
2π
s
Z "
cosh t
R
βJ
+ βh
|Λ|
!#|Λ|
exp
−t2
dt.
2
Com essa expressão alternativa da função de partição, é interessante
neste ponto definir a pressão.
Definição 3.3.1. Considere a sequência de volumes ΛN = [−N, N ] ∩ Z. A
pressão do modelo de Curie-Weiss é definida por
1
log ZΛN (β, h).
N →∞ |ΛN |
p(β, h) = lim
Observação 3.3.1. A prova de que p(β, h) está bem definida para todo
β > 0 e h ∈ R (existência do limite acima) será dada na sequência, usando
a representação integral que obtivemos em (3.4) para a função de partição
ZΛ . Além de mostrar a existência de tal limite, vamos também obter uma
fórmula explicita para a pressão, veja Teorema 3.3.3
Para provar a existência do limite acima vamos precisar do seguinte
lema auxiliar.
Lema 3.3.2. Seja (Ω, F, µ) um espaço de medida. Suponha que para todo
1 ≤ p ≤ ∞ temos f ∈ Lp (Ω, F, µ). Então kf kp → kf k∞ , quando p → ∞.
Demonstração. Seja Kδ = {ω ∈ Ω : (kf k∞ − δ) ≤ |f (ω)|}. Então temos que
1Kδ (kf k∞ − δ)p ≤ 1Kδ |f |p . Integrando ambos os lados dessa desigualdade
com respeito a µ temos que
p
Z
µ(Kδ )(kf k∞ − δ) ≤
1Kδ |f |p dµ ≤ kf kpp .
Ω
Tomando a raíz p-ésima nessa desigualdade e em seguida o lim inf quando
p → ∞ ficamos com
1
(kf k∞ − δ) = lim inf µ(Kδ ) p (kf k∞ − δ) ≤ lim inf kf kp .
p→∞
p→∞
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
44
Já que δ > 0 é arbitrário segue que
(3.5)
kf k∞ ≤ lim inf kf kp .
p→∞
Como |f (ω)| ≤ kf k∞ µ-quase certamente temos que para todo 1 ≤ q < p que
kf kpp
Z
p−q
|f (ω)|
=
q
|f (ω)| dµ(ω) ≤
kf kp−q
∞
Z
Ω
q
|f (ω)|q dµ(ω) = kf kp−q
∞ kf kq .
Ω
Tomando a raíz p-ésima em ambos lados da desigualdade acima e em seguida o lim sup quando p → ∞ ficamos com
p−q
q
p−q
q
p
p
p
p
lim sup kf kp ≤ lim sup kf k∞ kf kq = lim sup kf k∞
lim sup kf kq = kf k∞ .
p→∞
p→∞
p→∞
p→∞
A desigualdade acima juntamente com (3.5) nos fornece
lim sup kf kp ≤ kf k∞ ≤ lim inf kf kp
p→∞
p→∞
e, portanto,
kf k∞ = lim kf kp .
p→∞
Teorema 3.3.3. Sejam N ∈ N e ΛN = [−N, N ] ∩ Z. Se J , β > 0 e h ∈ R então
a pressão do modelo de Curie-Weiss é dada por
(x − βh)2
log ZΛN
= log(2) + sup log(cosh(x)) −
p(β, h) ≡ lim
.
N →∞ |ΛN |
2βJ
x∈R
Demonstração. Para facilitar a notação vamos omitir o subíndice N no
volume ΛN , escrevendo apenas Λ e também escreveremos ZΛ ao invés de
log ZΛN (β, h). Pelas propriedades básicas do logaritmo e por (3.4) temos
1
que (1/|Λ|) log ZΛ = log ZΛ|Λ| e também igual a


log 
= log
!
2
1
(2π) 2|Λ|

2
(2π)
1
2|Λ|
Z "
s
cosh t

R
βJ
+ βh
|Λ|
!#|Λ|
exp
1 
 |Λ|
−t2

dt 
2

1 
 |Λ|
s
!#|Λ|
2
Z "
βJ
−t


cosh t
+ log 
+ βh
exp
dt 
|Λ|
2
R
É fácil ver que a primeira parcela no lado direito da igualdade acima con-
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
45
verge para log(2) quando |Λ| → ∞. Precisamos mostrar que a segunda parcela também converge. Fazendo na integral acima a seguinte mudança
de variáveis
s
s
s
βJ
|Λ|
|Λ|
+ βh =⇒ t = (u − βh)
e dt =
du.
u=t
|Λ|
βJ
βJ
o segundo logaritmo acima pode ser reescrito como
log
|Λ|
βJ
1 Z
2|Λ|
|Λ|
[cosh(u)]
exp
R
−(u − βh)2 |Λ|
2βJ
1 !
|Λ|
du
.
Usando propriedades básicas do logaritmo e fazendo apenas uma simplificação algébrica no integrando, a expressão se torna
log
|Λ|
βJ
"
!
1
2|Λ|
Z cosh(u) · exp
+ log 
R
2
−(u − βh)
2βJ
|Λ|

1
# |Λ|
.
du
Já que para todo p ≥ 1 a função F dada
F (u) ≡ cosh(u) · exp
−(u − βh)2
2βJ
pertence a Lp (R, B(R), dx) podemos aplicar o Lema (3.3.2) para garantir
que o argumento do segundo logaritmo acima converge para kF k∞ > 0,
quando |Λ| → ∞. Já que
1
log ZΛ = log
|Λ|
!
2
(2π)
1
2|Λ|
+ log
|Λ|
βJ
!
1
2|Λ|
+ log kF k|Λ|
o lado direito é soma de três sequências convergentes e, portanto, converge. Além disso, o limite é dado por
1
log ZΛ = log(2) + log (kF k∞ )
|Λ|→∞ |Λ|
−(u − βh)2
= log(2) + log sup cosh(u) · exp
2βJ
x∈R
p(β, h) ≡ lim
(x − βh)2
.
= log(2) + sup log(cosh(x)) −
2βJ
x∈R
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
46
Estamos interessados na pressão do modelo de Curie-Weiss porque podemos mostrar que a magnetização específica desse modelo está relacionada com uma derivada parcial da pressão. De maneira mais precisa,
vamos mostrar na seção seguinte que a função f (β, h) = −β −1 p(β, h), (chamada de Energia Livre) para todo h 6= 0 e β > 0, tem derivada parcial com
relação a h, que a sequência mΛ,h → m(β, h) de fato converge para todo
β > 0 e h ∈ R, e, além disso,
−
∂f
(β, h) = m(β, h) ≡ lim mΛ,h .
Λ→Z
∂h
(3.6)
Como temos uma fórmula explícita para p e, consequentemente, para f ,
poderemos mostrar, usando a equação acima, que não há magnetização
espontânea para β ∈ (0, J −1 ]. Em outras palavras, vamos mostrar que se
β ∈ (0, J −1 ] então
lim+ m(β, h) ≡ lim+ lim mΛ,h = lim+ −
h→0
h→0
Λ→Z
h→0
∂f
(β, h) = 0.
∂h
Por outro lado, se β > J −1 então mostraremos que há magnetização espontânea, isto é,
∂f
lim+ m(β, h) = lim+ − (β, h) > 0.
h→0
h→0
∂h
Portanto, no modelo de Curie-Weiss sabemos exatamente qual é o inverso
da temperatura crítica de transição de fase, βc = J −1 !
No capítulo anterior mostramos que mΛ,h = −mΛ,−h . Usando essa identidade em (3.6) temos que
−
∂f
∂f
(β, h) =
(β, −h).
∂h
∂h
Dessa forma, no modelo de Curie-Weiss se β > J −1 (onde o modelo tem
magnetização espontânea) então
lim+ −
h→0
∂f
(β, h) = lim+ m(β, h) > 0
h→0
∂h
e
lim− −
h→0
∂f
(β, h) = − lim− m(β, −h) < 0.
h→0
∂h
Logo a Energia Livre (ou pressão) tem derivada parcial com respeito a h
descontínua nos pontos em que h = 0 e β > J −1 . Dito de outra forma, para
uma temperatura fixa no regime onde ocorre magnetização espontênea
(baixas temperaturas) a energia livre vista como função do campo externo
h é descontínua na origem h = 0.
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
3.4
47
Curie-Weiss e a Derivada da Pressão
Nesta seção vamos definir a pressão e a energia livre a volume finito do
modelo de Curie-Weiss e estudar suas relações com a magnetização específica a volume Λ.
A Pressão e a energia livre a volume Λ = [−N, N ] ∩ Z são definidas para
β > 0 e h ∈ R pelas seguintes expressões
pΛ (β, h) ≡
log ZΛN (β, h)
|ΛN |
1
fΛ (β, h) = − pΛ (β, h).
β
e
Teorema 3.4.1 (Convexidade de Pressão). Sejam N ∈ N e Λ = [−N, N ] ∩ Z.
Fixado β > 0, temos que a função h 7→ pΛ (β, h) é uma função convexa de R
em R.
Demonstração. Para mostrar que, para qualquer β fixado, h 7→ pΛ (β, h) é
uma função convexa é suficiente mostrar para todo 0 ≤ α ≤ 1 e h1 , h2 ∈ R
vale a seguinte desigualdade
ZΛ (β, αh1 + (1 − α)h2 ) ≤ ZΛ (β, h1 )α · ZΛ (β, h2 )1−α .
(3.7)
De fato, tomando o logaritmo em ambos os lados da dessa desigualdade e
em seguida dividindo por |Λ| obtemos
1
log ZΛ (β, αh1 + (1 − α)h2 )
|Λ|
α
1−α
≤
log ZΛ (β, h1 ) +
log ZΛ (β, h2 )
|Λ|
|Λ|
pΛ (β, αh1 + (1 − α)h2 ) ≡
= αpΛ (β, h1 ) + (1 − α)pΛ (β, h2 ).
Assim, tudo que temos que fazer é mostrar que a desigualdade (3.7) é
válida sob as hipóteses do teorema. Pela definição da função de partição
o lado esquerdo de (3.7) é dado por
X
σ∈ΩΛ
X βJ
X
σi σj + β[αh1 + (1 − α)h2 ]
σi
exp
2|Λ|
i,j∈Λ
i∈Λ
!
(3.8)
que por sua vez é igual a
X
σ∈ΩΛ
X βJ
σi σj
exp
2|Λ|
i,j∈Λ
!
!
· exp αβh1
X
i∈Λ
σi
!
exp (1 − α)βh2
X
i∈Λ
σi
.
(3.9)
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
48
Usando as propriedades básicas da função exponencial temos que a expressão acima é igual a
X
σ∈ΩΛ
X βJ
exp
σi σj
2|Λ|
i,j∈Λ
!#α "
! "
· exp βh1
X
σi
!#1−α
exp βh2
i∈Λ
X
(3.10)
σi
i∈Λ
Considerando a medida µ definida no conjunto das partes de ΩΛ por
Z
X βJ
µ(E) =
σi σj
1E (σ) exp
2|Λ|
ΩΛ
i,j∈Λ
!
dκ(σ),
onde κ é a medida da contagem em ΩΛ , podemos reescrever a expressão
(3.10), que é igual a ZΛ (β, αh1 + (1 − α)h2 ), como segue
!#α "
"
Z
ZΛ (β, αh1 + (1 − α)h2 ) =
exp βh1
ΩΛ
X
σi
!#1−α
exp βh2
i∈Λ
X
σi
dµ(σ).
i∈Λ
Aplicando a desigualdade de Hölder no lado direito da igualdade acima
com p = 1/α e q = 1/(1 − α) obtemos
!#α "
"
Z
ZΛ (β, αh1 + (1 − α)h2 ) =
exp βh1
ΩΛ
Z
≤
!#
exp βh1
ΩΛ
σi
!#1−α
exp βh2
i∈Λ
"
X
X
σi
i∈Λ
!α
X
σi
dµ(σ)
i∈Λ
Z
"
exp βh2
dµ(σ)
ΩΛ
!1−α
!#
X
σi
dµ(σ)
i∈Λ
≤ ZΛ (β, h1 )α ZΛ (β, h2 )1−α .
Provando (3.7) e, consequentemente, a convexidade de h 7→ pΛ (β, h).
Corolário 3.4.2. Sejam N ∈ N e Λ = [−N, N ] ∩ Z. Fixado β > 0 temos que a
função h 7→ fΛ (β, h) é uma função concava de R em R.
Demonstração. Já que fΛ (β, h) = −β −1 pΛ (β, h) e β > 0 é uma constante o
resultado segue diretamente da convexidade de h 7→ pΛ (β, h).
Teorema 3.4.3 (Concavidade da Magnetização). Sejam N ∈ N e Λ =
[−N, N ] ∩ Z. Fixados J e β > 0, temos que a função h 7→ mΛ (β, h) é uma
função côncava em [0, +∞).
Demonstração. Como para todo Λ e β > 0 fixados h 7→ mΛ (β, h) é uma função
d2
de classe C ∞ é suficiente provar que dh
2 mΛ (β, h) ≤ 0. Do Corolário 2.2.3
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
49
temos
∂
1 X
mΛ,β,{hi }i∈Λ =
β
hσj σi iΛ,β,{hi }i∈Λ − hσj iΛ,β,{hi }i∈Λ hσi iΛ,β,{hi }i∈Λ
∂hi
|Λ| j∈Λ
Considere a aplicação γ : R → R2N +1 dada por γ(h) = (h, . . . , h). Então temos
para todo h ∈ R que a magnetização específica do modelo de Curie-Weiss
com campo constante mΛ,β,h é dada por mΛ,β,{hi }i∈Λ , com hi = h, ∀i ∈ Λ. A
regra cadeia nos dá
d
mΛ,β,h = ∇mΛ,β,{hi }i∈Λ · γ 0 (h)
dh
{hi }i∈Λ =γ(h)
=
X ∂
mΛ,β,{hi }i∈Λ
∂h
i
i∈Λ
=
1 X
β
[hσj σi iΛ,β,h − hσj iΛ,β,h hσi iΛ,β,h ] .
|Λ| i,j∈Λ
Note que, nessa última igualdade, o valor esperado é calculado com campo externo constante igual a h. Um cálculo análogo ao feito na prova do
Corolário 2.2.3 mostra que
X
d
hσj σi iΛ,β,h = β
[hσi σj σk iΛ,β,h − hσi σj iΛ,β,h hσk iΛ,β,h ].
dh
k∈Λ
Uma vez que sabemos calcular
X
d
hσi iΛ,β,h = β
[hσi σk iΛ,β,h − hσi iΛ,β,h hσk iΛ,β,h ]
dh
k∈Λ
temos, pela regra do produto para derivadas, que
d2
β X d
d
d
mΛ,β,h =
hσj σi iΛ,β,h − hσj iΛ,β,h hσi iΛ,β,h − hσj iΛ,β,h hσi iΛ,β,h
dh2
|Λ| i,j∈Λ dh
dh
dh
=
β2 X h
hσi σj σk iΛ,β,h − hσi iΛ,β,h hσj σk iΛ,β,h − hσj iΛ,β,h hσi σk iΛ,β,h
|Λ| i,j,k∈Λ
i
− hσk iΛ,β,h hσi σj iΛ,β,h + 2hσi iΛ,β,h hσj iΛ,β,h hσk iΛ,β,h
≤ 0,
onde, na última desigualdade, usamos o Teorema 2.2.7 (Desigualdade
GHS) para cada termo entre os colchetes acima.
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
50
Antes de passarmos para o enunciado e prova do teorema mais importante desta seção, vamos lembrar o enunciado de um teorema clássico de
Análise Convexa que será usado várias vezes adiante.
Teorema 3.4.4. Para cada n ∈ N seja fn : R → R uma função convexa. Seja
D ⊂ R um subconjunto denso. Suponha que fn (x) → f (x), quando n → ∞,
para todo x ∈ D. Então as seguintes conclusões são válidas.
i) O limite f (x) = limn→∞ fn (x) existe para todo x ∈ R e define uma função
convexa em toda reta.
ii) A sequência de funções {fn } converge uniformemente nas partes compactas da reta.
Demonstração. Veja [20] página 90.
Teorema 3.4.5. Sejam N ∈ N, β > 0, h ∈ R e mΛN (β, h) a magnetização
específica do modelo de Curie-Weiss a volume ΛN com J ≥ 0. Fixado β > 0,
existe uma sequência de números naturais {Ni (β)} ≡ {Ni } e m(β, h) ∈ R, tais
que para todo h ∈ R temos
m(β, h) = lim mΛNi (β, h).
i→∞
A aplicação h 7→ m(β, h) é côncava em [0, +∞) e contínua no aberto (0, +∞).
Além do mais,
d
∀h ∈ (0, +∞).
− f (β, h) = m(β, h),
dh
Demonstração. Assumindo a existência do limite limi→∞ mΛNi (β, h) temos
que a função h 7→ m(β, h) é côncava pois, é limite pontual de funções côncavas. A continuidade no intervalo aberto (0, +∞) segue do fato que qualquer
função real côncava definida em um aberto é uma função contínua. Portanto resta provar a existência do limite limi→∞ mΛNi (β, h) sob as hipóteses
do corolário.
Fixados β > 0 e Λ temos que
d
d
− fΛ (β, h) =
dh
dh
1
log ZΛ,h
β|Λ|
1
1 d
ZΛ,h
β|Λ| ZΛ,h dh
*
+
1 X
=
σi
= mΛ (β, h).
|Λ| i∈Λ
=
Λ,h
Da igualdade acima e do Teorema Fundamental do Cálculo temos que
Z
fΛ (β, 0) − fΛ (β, h) = β
h
mΛ (β, x) dx.
0
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
51
Segue do Teorema 3.3.3 (existência da pressão) que o limite do lado esquerdo da igualdade acima existe para todo β > 0 e h ∈ [0, +∞). Vamos
denotar por f (β, h) tal limite. Lembrando que Λ ≡ [−N, N ] ∩ Z podemos
escrever
Z
f (β, 0) − f (β, h) = lim [fΛ (β, 0) − fΛ (β, h)] = lim
N →∞
N →∞
h
mΛ (β, x) dx.
(3.11)
0
É preciso um certo cuidado para lidar com o limite que aparece acima.
Seja {q1 , . . . , qn , . . .} uma enumeração arbitrária de Q. Como |mΛ (β, q1 )| ≤ 1
segue do Teorema de Bolzano-Weierstrass que existe uma sequência de
números naturais {Ni (q1 )}i∈N tal que a sequência mΛNi (q1 ) (β, q1 ) de números
reais converge para algum número real m(β, q1 ) ∈ [−1, 1]. Para facilitar
a notação vamos escrever apenas mNi (q1 ) (β, q1 ) para denotar mΛNi (q1 ) (β, q1 ).
Logo podemos escrever
lim mNi (q1 ) (β, q1 ) = m(β, q1 ).
i→∞
Pelo mesmo argumento apresentado acima, para o racional q2 podemos
encontrar uma sequência {Ni (q2 )}i∈N contida em {Ni (q1 )}i∈N e um número
real m(β, q2 ) ∈ [−1, 1] tais que
lim mNi (q2 ) (β, q2 ) = m(β, q2 ).
i→∞
Procedendo uma indução formal, podemos argumentar que existem sequências de números naturais {Ni (qj )}i∈N satisfazendo
{Ni (q1 )}i∈N ⊃ {Ni (q2 )}i∈N ⊃ . . . ⊃ {Ni (qj )}i∈N ⊃ . . .
e números reais m(β, qj ), para todo j ∈ N, tais que
lim mNi (q2 ) (β, q2 ) = m(β, q2 ).
i→∞
Pelas propriedades elementares de limites de sequências e pela construção acima podemos afirmar que, para qualquer j ∈ N fixado,
lim mNi (qi ) (β, qj ) = m(β, qj ).
i→∞
Isso mostra que a sequência de funções
h 7→ mΛNi (qi ) (β, h)
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
52
converge em Q. Como cada uma dessas funções é côncava e Q é denso em
R, podemos garantir pelo Teorema 3.4.4 que a convergência ocorre para
todo h ∈ R, isto é, para todo h ∈ R temos
quando i → ∞.
mΛNi (qi ) (β, h) → m(β, h),
Como existe o limite em (3.11) segue que
Z
lim
N →∞
h
h
Z
mΛN (β, x) dx = lim
i→∞
0
0
mΛNi (qi ) (β, x) dx.
Usando que |mΛNi (qi ) (β, x)| ≤ 1 para todo x ∈ R e o Teorema da Convergência
Dominada de Lebesgue, chegamos a
Z
lim
N →∞
h
Z
mΛN (β, x) dx = lim
i→∞
0
0
h
Z
mΛNi (qi ) (β, x) dx =
h
m(β, x) dx.
0
Usando a igualdade acima em (3.11) ficamos com
Z
f (β, 0) − f (β, h) =
h
m(β, x) dx.
0
Como temos garantia que x → m(β, x) é contínua no intervalo (0, +∞),
conclui-se da igualdade acima e do T.F.C. a diferenciabilidade de f (β, h)
em (0, +∞) e, além disso,
−
d
f (β, h) = m(β, h),
dh
∀h ∈ (0, +∞).
No teorema acima mostramos, para todo β > 0 e h ∈ R, que a sequência
{mΛN (β, h)} possui uma subsequência que converge para m(β, h) e também
mostramos que m(β, h) é dada pelo negativo da derivada da energia livre.
O método empregado na prova funciona para qualquer modelo para o qual
podemos garantir tanto a concavidade de x 7→ mΛ (β, x) como a existência
da energia livre. Sua principal desvantagem é nos fornecer uma definição
para m(β, h) dependente de uma subsequência a qual não temos a priori
como determinar. Apesar de não sabermos qual é a subsequência, isso não
causará nenhum inconveniente no restante deste texto. Mas, de qualquer
forma, é importante mencionar que no caso ferromagnético, isto é, J ≥
0, é possível mostrar que a sequência {mΛN (β, h)} de fato converge para
m(β, h), assim como no modelo de Ising.
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
53
Teorema 3.4.6. Sejam N ∈ N, β > 0, h ∈ R e mΛN (β, h) a magnetização
específica do modelo de Curie-Weiss a volume ΛN com J ≥ 0. Então
m(β, h) = lim mΛN (β, h),
N →∞
onde m(β, h) é a função obtida no teorema anterior.
Demonstração. Veja [6] Teorema IV.4.1, página 100.
3.5
Magnetização Espontânea no Modelo de
Curie-Weiss
Vamos recapitular alguns resultados obtidos nas seções anteriores que serão usados para mostrar que a magnetização específica m(β, h) do modelo
de Curie-Weiss com constante de acoplamento J ≥ 0 satisfaz:
i) se β é tal que βJ ≤ 1 então lim+ m(β, h) = 0.
h→0
ii) se β é tal que βJ > 1 então lim+ m(β, h) > 0.
h→0
Assim, o inverso da temperatura crítica no modelo de Curie-Weiss é dado
por βc = J −1 .
Pelo Teorema 3.4.5 temos, para todo β > 0 fixado, que
−
d
f (β, h) = m(β, h),
dh
∀h ∈ (0, +∞).
Lembrando que −f (β, h) = β −1 p(β, h), então podemos obter limh→0+ m(β, h)
calculando a derivada da pressão. Mas, como temos uma fórmula explicita
para a pressão p(β, h), nosso trabalho se reduz a calcular sua derivada e,
em seguida, avaliar o limite. A expressão obtida para pressão do modelo
de Curie-Weiss no Teorema 3.3.3 é a seguinte
(x − βh)2
p(β, h) = log(2) + sup log(cosh(x)) −
2βJ
x∈R
.
A presença do supremo na expressão acima deixa claro que para calcular
a derivada de p(β, h) com respeito a h é necessário uma análise bastante
cuidadosa. Vamos considerar a função auxiliar F : R × R → R dada por
F (x, h) = log(cosh(x)) −
(x − βh)2
.
2βJ
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
54
Observamos que para qualquer h ∈ R fixado, temos
lim F (x, h) = −∞.
x→±∞
Logo, a função x 7→ F (x, h) possui pelo menos um ponto de máximo global
em R. Vamos escolher um desses pontos de máximo global e denotá-lo
por x∗ (h). Como a aplicação x 7→ F (x, h) é diferenciável, a derivada dessa
função calculada no ponto de máximo x∗ (h) é necessariamente nula e, portanto,
(x∗ (h) − βh)
∂
F (x∗ (h), h) = tanh(x∗ (h)) −
.
(3.12)
0=
∂x
βJ
Tomando h = 0 na igualdade acima, ficamos com
tanh(x∗ (0)) =
x∗ (0)
.
βJ
(3.13)
A partir deste ponto precisamos dividir nossa análise em três casos.
Caso-I (βJ < 1) Neste caso a única solução x∗ (0) para (3.13) é x∗ (0) = 0. De
fato, a função tanh(x) − x/(βJ ) se anula em x = 0 e tem derivada negativa
em R \ {0}. Considere a função G : R × R → R dada por
G(x, h) = tanh(x) −
x − βh
.
βJ
Note que se G(x, h) = 0 então x é um ponto crítico de x 7→ F (x, h). Já que G
é de classe C ∞ e
∂G
1
1
(0, 0) = sech2 (0) −
=1−
6= 0
∂x
βJ
βJ
segue do Teorema da Função Implícita que existe um retângulo bidimensional R = (−ε, ε) × (−ε, ε) tal que para cada h ∈ (−ε, ε) existe um único
x∗ (h) ∈ (−ε, ε) tal que G(x∗ (h), h) = 0. A aplicação h 7→ x∗ (h) também é de
classe C ∞ . Observe que para todo |h| < ε então o ponto de máximo (x∗ (h), h)
de F satisfaz G(x∗ (h), h) = 0. Mas, pela unicidade fornecida pelo teorema
da função implícita temos que x∗ (h) = x∗ (h). Segue de uma observação
feita acima que h 7→ x∗ (h) define uma função de classe C ∞ .
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
55
Se |h| < ε (determinado acima) temos que
(x − βh)2
p(β, h) = log(2) + sup log(cosh(x)) −
2βJ
x∈R
= log(2) + log(cosh(x∗ (h))) −
(x∗ (h) − βh)2
2βJ
= log(2) + F (x∗ (h), h).
Como todas as funções que aparecem acima são diferenciáveis com respeito a h, colocando γ(h) = (x∗ (h), h) temos pela regra da cadeia que
d
d
p(β, h) =
F (γ(h))
dh
dh
= ∇F (γ(h)) · γ 0 (h)
∂F ∗
d
∂F ∗
=
(x (h), h) x∗ (h) +
(x (h), h)
∂x
dh
∂h
∂F ∗
=
(x (h), h),
∂h
onde na última igualdade foi usado (3.12). Usando a expressão de F chegamos à seguinte igualdade
∂F ∗
x∗ (h) − βh
d
p(β, h) =
(x (h), h) =
.
dh
∂h
J
Do Teorema 3.4.5 e da definição de f (β, h) temos a seguinte igualdade
m(β, h) = β −1 (d/dh)p(β, h). Usando a igualdade anterior concluímos que
m(β, h) =
x∗ (h) − βh
.
βJ
Mas como x∗ (0) = 0 e x∗ (h) é contínua próximo de zero segue
lim m(β, h) = 0.
h→0+
Caso-II (βJ = 1) Neste caso a única solução x∗ (0) para (3.13) é novamente x∗ (0) = 0. A prova desse fato é identica à do caso anterior. Agora
consideramos a função G : R × R → R dada por
G(x, h) = tanh(x) − x + βh.
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
56
Diferente do caso anterior, aqui não é possível aplicar imediatamente o Teorema da Função Implícita para o ponto (0, 0). A ideia será usar o teorema
em outro ponto. Para isso observamos que existe para todo h > 0 uma
única solução positiva x∗ (h) da equação G(x, h) = 0. De fato G(0, h) = βh > 0
e, para todo x > 0, temos (∂/∂x)G(x, h) < 0. Além disso limx→∞ G(x, h) = −∞.
Como (∂/∂x)G(x∗ (h), h) 6= 0, da unicidade garantida pelo Teorema da Função Implícita segue que x∗ (h) = x∗ (h) para h > 0 e que x∗ (h) é diferenciável
no intervalo (0, +∞). Nesse intervalo temos
d ∗
β
d
G(x∗ (h), h) = 0 =⇒
x (h) =
< 0.
2 ∗
dh
dh
sech (x (h)) − 1
Já que G(x∗ (h), h) = 0, temos pela definição de G que tanh(x∗ (h))−x∗ (h)+βh =
0. Usando que | tanh(x)| ≤ 1 segue igualdade acima |x∗ (h)| ≤ βh + 1. Como
x∗ (h) é também uma função decrescente de h no intervalo (0, +∞) existe
limh→0+ x∗ (h). Usando a continuidade de G temos que G(limh→0+ x∗ (h), 0) = 0 o
que implica em tanh limh→0+ x∗ (h) = limh→0+ x∗ (h) e, portanto, limh→0+ x∗ (h) =
0. Como sabemos que x∗ (0) = 0, temos que x∗ é contínua a direita em h = 0.
Note que a pressão, como no caso anterior, é dada por p(β, h) = log(2) +
F (x∗ (h), h). A partir deste ponto o restante da análise pode ser feito de
maneira análoga ao do caso anterior e ao final obtemos
x∗ (h) − βh
=⇒ lim+ m(β, h) = 0.
m(β, h) =
h→0
βJ
Caso-III (βJ > 1). Para não fazer confusão com os casos anteriores,
nossa escolha de um ponto de máximo global de
F (x, h) = log(cosh(x)) −
(x − βh)2
,
2βJ
(com h > 0 fixado) será denotada por y ∗ (0). Como F é diferenciável sabemos que y ∗ (0) deve necessariamente satisfazer a equação (3.13)
tanh(y ∗ (0)) =
y ∗ (0)
.
βJ
Como estamos supondo que βJ > 1, diferentemente do caso anterior, a
equação acima não determina unicamente o ponto y ∗ (0) pois, esta equação possui a solução nula e também possui uma (única) solução positiva.
De fato, se g denota a função dada por g(x) = x/(βJ ) − tanh(x) temos que
g(0) = 0 e g 0 (0) = 1/(βJ ) − 1 < 0. Como g tem derivada contínua, podemos
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
57
garantir em algum intervalo (0, δ), com δ > 0, que g 0 é negativa e consequentemente g é decrescente, logo negativa. Como | tanh(x)| < 1, temos
que limx→+∞ g(x) = +∞. Portanto existe algum ponto y0 ∈ (0, +∞) tal que
y0
tanh(y0 ) = βJ
. Já que g 00 (x) = 2 tanh(x) sech2 (x) > 0 para x > 0, a unicidade de
y0 segue da convexidade de g.
Para mostrar que y ∗ (0) 6= 0 é suficiente mostrar que existe alguma vizinhança pequena da origem, digamos (0, δ), tal que se y ∈ (0, δ), então
F (0, h) < F (y, h).
Daí segue que y ∗ (0), o ponto de máximo global de x 7→ F (x, h) é positivo.
Para isto basta observar que
F (0, h) = −
1
β 2 h2
β 2 h2
< F (y, h) = log(cosh(y)) −
(y(y − βhx)) −
,
2βJ
2βJ
2βJ
se y ∈ (0, βh).
Procedendo exatamente como no caso anterior obtemos do Teorema
da Função Implícita a existência de uma função diferenciável y ∗ (h) tal que
para h > 0 temos
p(β, h) = log(2) + F (y ∗ (h), h)
e
m(β, h) =
y ∗ (h) − βh
.
βJ
Agora tomando o limite, quando h → 0 pela direita, ficamos com
lim+ m(β, h) =
h→0
y ∗ (0)
> 0.
βJ
Equação Funcional da Magnetização. Em todos os três casos analisados acima, as funções x∗ (h) e y ∗ (h), foram determinadas como as maiores
soluções da equação
(x − βh)
tanh(x) =
.
βJ
Para unificar a análise vamos considerar


x∗ (h), se βJ ≤ 1;
∗
z (h) =
.

y ∗ (h), se βJ > 1.
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
58
Da afirmação feita acima temos, para todo h ≥ 0, que a seguinte equação
é satisfeita
(z ∗ (h) − βh)
tanh(z ∗ (h)) =
.
βJ
Usando esta equação temos que
(z ∗ (h) − βh)
+ βh
tanh (βJ m(β, h) + βh) = tanh βJ
βJ
= tanh (z ∗ (h))
=
(z ∗ (h) − βh)
βJ
= m(β, h).
Para posterior referência vamos enunciar na forma de um teorema os
resultados provados nesta seção. No enunciado do teorema abaixo vamos optamos por denotar a magnetização do modelo de Curie-Weiss por
mCW (β, h), para diferenciá-la da magnetização dos modelos de Ising e do
modelo Hierárquico, que será definido mais a frente.
Teorema 3.5.1. Seja mCW (β, h) a magnetização específica do modelo de
Curie-Weiss com constante de acoplamento J ≥ 0. Então o ponto crítico
desse modelo é dado por βc = J −1 e
i) se β ≤ βc , isto é, βJ ≤ 1 então
lim mCW (β, h) = 0;
h→0+
ii) se βc < β, isto é, βJ > 1 então
lim mCW (β, h) > 0;
h→0+
iii) para todo β > 0 e h ≥ 0 temos
tanh βJ mCW (β, h) + βh = mCW (β, h).
3.6
Comparação de um Modelo de Ising com
Curie-Weiss
Sejam N ∈ N, Λ = [−N, N ] ∩ Z, β > 0, h ≥ 0. Denote por mΛ (β, h) a magnetização específica no modelo de Ising no volume Λ, com condições de
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
59
contorno livre e constantes de acoplamento Jij = J(|i − j|). Ao longo desta
seção vamos assumir sempre que
kJk ≡
∞
X
Jij = J(0) + 2
∞
X
J(r) < +∞.
r=1
i=−∞
O objetivo desta seção é mostrar que a magnetização específica do modelo de Curie-Weiss, mCW (β, h) com J = kJk é tal que para todo Λ vale a
seguinte desigualdade
1
|Λ|
*
X
i∈Λ
+
≤ mCW (β, h).
σi
Λ,β,h
Lema 3.6.1. Seja h̃ ≥ 0 e considere o modelo de Ising com constantes de
acoplamento Jij ≡ 0 e hamiltoniano no volume Λ dado por
HΛ (σ) = −h̃
X
σi .
i∈Λ
Se PΛ,β denota a medida de Gibbs a ao inverso da temperatura β no volume Λ deste modelo então, as variáveis aleatórias {Xi , i ∈ Λ} definidas no
espaço de probabilidade (ΩΛ , FΛ , PΛ,β ) por Xi (σ) = σi são independentes.
Demonstração. Observe que a v.a. Xi toma valores no conjunto {−1, 1} que
é discreto. Portanto para provar que o coleção {Xi , i ∈ Λ} é independente
basta mostrar que para todo conjunto {i1 , . . . , ik } ⊂ Λ e ci1 , . . . , cik ∈ {−1, 1}
temos
k
Y
PΛ,β (Xi1 = c1 , . . . , Xik = ck ) =
PΛ,β (Xij = cj ).
(3.14)
j=1
Vamos calcular primeiro PΛ,β (Xij = cj ). Para isto vamos começar pelo cálculo da função de partição que será denota por ZΛ,β .
ZΛ,β =
X
X
exp(−βHΛ (σ)) =
σ∈ΩΛ
X
Y
X
...
σ−N ∈{−1,1}
=
Y
exp(β h̃σi )
σN ∈{−1,1} i∈Λ
σ−N ∈{−1,1}
=
X
...
X
Y
σN ∈{−1,1} i∈Λ
exp(β h̃σi )
i∈Λ σi ∈{−1,1}
= 2|Λ| [cosh(β h̃)]Λ .
exp(β h̃σi )
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
60
Pela definição da medida de Gibbs temos que
PΛ,β (Xij = cj ) =
X
1{Xij =cj }
1
exp(−βHΛ (σ))
ZΛ,β
1{Xij =cj }
1 Y
exp(β h̃σi )
ZΛ,β i∈Λ
σ∈ΩΛ
=
X
σ∈ΩΛ
X
=
...
X
σ−N ∈{−1,1}
σN ∈{−1,1}
X
X
1{Xij =cj }
1 Y
exp(β h̃σi )
ZΛ,β i∈Λ
(3.15)
=
...
σ−N ∈{−1,1}
σij ∈{−1,1}
1 Y
1{Xij =cj }
exp(β h̃σi )
ZΛ,β i∈Λ
=
1
eβ h̃cj · 2|Λ|−1 [cosh(β h̃)]|Λ|−1
2|Λ| [cosh(β h̃)]|Λ|
=
eβ h̃cj
.
2 cosh(β h̃)
Procedendo de maneira análoga vemos que
PΛ,β (Xij = c1 , . . . , Xik = ck ) =
eβ(c1 +...ck )
.
2k [cosh(β h̃)]k
Desta igualdade e da expressão obtida acima para PΛ,β (Xij = cj ) temos que
(3.14) é valido e portanto o lema está demonstrado.
Corolário 3.6.2. Sejam (ΩΛ , FΛ , PΛ,β ) e {Xi , i ∈ Λ} como no Lema (3.6.1).
Denote por EΛ,β a esperança com respeito a medida de probabilidade PΛ,β .
Para todo m ∈ R fixado e toda coleção de números inteiros não-negativos
{pi , i ∈ Λ} temos que
"
EΛ,β
#
Y
Y
EΛ,β [(m − Xi )pi ]
(m − Xi )pi =
i∈Λ
i∈Λ
Demonstração. Considere a coleção de v.a.’s {Yi ≡ (m − Xi )pi , i ∈ Λ}. Aplicando o Lema 3.6.1 podemos verificar que esta coleção é independente no
espaço de probabilidade (ΩΛ , FΛ , PΛ,β ) e a igualdade afirmada acima segue
das propriedades básicas de esperança de v.a.’s independentes.
Para o próximo fato que vamos provar precisamos lembrar que a medida de Gibbs PΛ,β depende também do parâmetro h̃ que aparece no Hamiltoniano HΛ . Vamos explorar abaixo esta dependência e e para indicá-la
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
61
vamos usar a notação EΛ,β,h̃
Lema 3.6.3. Seja kJk como definido no início desta seção e mCW (β, h) a
magnetização específica do modelo de Curie-Weiss com constante de acoplamento J = kJk. Afirmamos que para todo i ∈ Λ
mCW (β, h) = EΛ,β,h̃ [Xi ],
onde h̃ = kJkmCW (β, h) + h.
Demonstração. A prova deste fato segue da equação funcional obtida no
item iii) do Teorema 3.5.1. Para ver isto vamos calcular o valor esperado
acima com ajuda da fórmula obtida em (3.15)
EΛ,β,h̃ [Xi ] = PΛ,β,h̃ (Xi = 1) − PΛ,β,h̃ (Xi = −1)
=
e−β h̃
eβ h̃
−
2 cosh(β h̃) 2 cosh(β h̃)
= tanh(β h̃)
= tanh(βkJkmCW (β, h) + βh)
= mCW (β, h),
onde na última igualdade usamos a equação funcional de mCW (β, h).
Lema 3.6.4. Seja h̃ = kJkmCW (β, h) + h como no lema anterior. Para todo
i ∈ Λ e p inteiro não-negativo temos que
h
i
EΛ,β,h̃ (mCW (β, h) − Xi )p ≥ 0.
Demonstração. Se p é par não há nada a fazer. Portanto vamos assumir
que p é ímpar. Usando a definição do valor esperado temos que
h
i
EΛ,β,h̃ (mCW (β, h) − Xi )p
= (mCW (β, h) − 1)p PΛ,β,h̃ (Xi = 1) + (mCW (β, h) + 1)p PΛ,β,h̃ (Xi = −1)
=
(mCW (β, h) − 1)p eβ h̃ + (mCW (β, h) + 1)p e−β h̃
2 cosh(β h̃)
Aplicando o Lema 3.6.3 temos que o lado direito da igualdade acima é
dado por
(EΛ,β,h̃ [Xi ] − 1)p eβ h̃ + (EΛ,β,h̃ [Xi ] + 1)p e−β h̃
2 cosh(β h̃)
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
62
Usando novamente a definição de valor esperado e que p é ímpar temos
que
p
(EΛ,β,h̃ [Xi ] − 1) =
=
!p
eβ h̃ − e−β h̃
−1
eβ h̃ + e−β h̃
−2e−β h̃
eβ h̃ + e−β h̃
!p
=
−2p
e−pβ h̃
p
p
2 [cosh(β h̃)]
=
−e−pβ h̃
[cosh(β h̃)]p
De maneira análoga temos que
(EΛ,β,h̃ [Xi ] + 1)p =
eβ h̃ − e−β h̃
+1
eβ h̃ + e−β h̃
β h̃
=
eβ h̃
2e
+ e−β h̃
!p
!p
=
2p
epβ h̃
p
p
2 [cosh(β h̃)]
=
epβ h̃
.
[cosh(β h̃)]p
Usando estas duas identidades temos que
(EΛ,β,h̃ [Xi ] − 1)p eβ h̃ + (EΛ,β,h̃ [Xi ] + 1)p eβ h̃
2 cosh(β h̃)
=
−e−pβ h̃ eβ h̃ + epβ h̃ e−β h̃
.
2[cosh(β h̃)]p+1
Assim a prova do lema se reduz a mostrar que o numerador do lado direito
da igualdade acima é não negativo. Já que h̃ = kJkmCW (β, h) + h ≥ 0 a não
negatividade do termo acima é consequência imediata da desigualdade
ekp e−k ≥ e−kp ek
válida para todo p inteiro não negativo e k ∈ [0, +∞).
Na sequência provamos o principal teorema desta seção. Ele mostra
que a magnetização do modelo de Curie-Weiss ferromagnético com cons-
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
63
tante de acoplamento adequadamente escolhida, majora a magnetização
do modelo de Ising ferromagnetico com constantes de acoplamento invariantes por translação.
Teorema 3.6.5. Considere o modelo de Ising com Hamiltoniano a volume
Λ = [−N, N ] ∩ Z dado por
HΛ (σ) =
X X 1
{
− Jij σi σj − hσi }, com Jij = J(|i − j|), Jkk = 0 ∀k ∈ Λ.
2
i∈Λ j∈Λ
P
Sejam kJkΛ = i∈Λ Jij (está bem definido pois Jij = J(|i − j|)) e mΛ (β, h) a
magnetização específica do modelo de Ising no volume Λ. Se mCW (β, h)
denota a magnetização do modelo de Curie-Weiss com constante de acoplamento J = kJkΛ , então temos para todo β > 0 e h ≥ 0 que
mΛ (β, h) ≤ mCW (β, h).
Demonstração. Uma manipulação algébrica simples mostra que é válida
a seguinte igualdade:
1 X
Jij (mCW (β, h) − σi )(mCW (β, h) − σj )
2 i,j∈Λ
X
1X
=−
kJkΛ (mCW (β, h))2 +
kJkΛ mCW (β, h)σi
2 i∈Λ
i∈Λ
X
1
−
Jij σi σj .
2 i,j∈Λ
−
P
Subtraindo h i∈Λ σi de ambos os lados da igualdade, aparece a expressão para HΛ (σ) no último fator do lado direito. Após uma rearrumação dos
termos, chegamos à seguinte expressão:
HΛ (σ) = −
1 X
Jij (mCW (β, h) − σi )(mCW (β, h) − σj )
2 i,j∈Λ
X
1
− (kJkΛ mCW (β, h) + h)
σi + |Λ| kJkΛ (mCW (β, h))2 .
2
i∈Λ
Se agora escolhemos h̃ = (kJkΛ mCW (β, h) + h), é interessante definir
HΛ (σ) = −(kJkΛ mCW (β, h) + h)
X
i∈Λ
σi = h̃
X
i∈Λ
σi ,
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
64
para termos a seguinte igualdade
HΛ (σ) = −
1 X
Jij (mCW (β, h) − σi )(mCW (β, h) − σj )
2 i,j∈Λ
1
HΛ (σ) + |Λ| kJkΛ (mCW (β, h))2 .
2
Denote por h·iΛ,β,h a esperança em ΩΛ , com respeito a medida de Gibbs definida pelo Hamiltoniano HΛ ao inverso da temperatura β. E conservando
a notação dos lemas anteriores denote por EΛ,β,h̃ a esperança com respeito
a medida de Gibbs definida por HΛ ao inverso da temperatura β. Sejam
Xi : ΩΛ → {−1, 1} as variáveis aleatórias dadas por Xi (σ) = σi . Já que para
qualquer constante (independente de σ) temos que a medida de Gibbs definida pelos hamiltonianos H e H+const. são idênticas, podemos desprezar
o último termo no Hamiltoniano acima, para verificar mais facilmente que
hmCW (β, h) − Xi iΛ,β,h
"
1 X
Jij (mCW (β, h) − Xi )(mCW (β, h) − Xj )
2 i,j∈Λ
= EΛ,β,h (mCW (β, h) − Xi ) · exp
!#
.
Expandindo a exponencial que aparece acima em série de Taylor e usando
a independência das v.a.’s Xi estabelecida no Lema 3.6.1 e o Corolário
3.6.2 temos que a esperança acima uma soma com coeficientes positivos
de produtos da forma
"
EΛ,β
#
Y
Y
EΛ,β (mCW (β, h) − Xi )pi .
(mCW (β, h) − Xi )pi =
i∈Λ
i∈Λ
Aplicando agora o Lema 3.6.4 obtemos a seguinte desigualdade
hmCW (β, h) − Xi iΛ,β,h ≥ 0
Usando a linearidade da esperança segue imediatamente que
1
mΛ (β, h) ≡
|Λ|
*
X
i∈Λ
+
σi
Λ,β,h
1
≡
|Λ|
*
X
i∈Λ
+
≤ mCW (β, h).
Xi
Λ,β,h
Teorema 3.6.6. Sob as mesmas hipóteses do teorema anterior sejam
mΛ (β, h) e mCW (β, h, kJΛ k) respectivamente as magnetizações específicas do
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
65
modelo de Ising e Curie-Weiss (J = kJΛ k) a volume Λ, então
m(β, h) = lim mΛ (β, h) ≤ lim mCW (β, h, kJkΛ ) = mCW (β, h, kJk)
Λ→Z
onde kJk =
P∞
r=1
Λ→Z
J(r).
Demonstração. A primeira igualdade na conclusão deste teorema segue
do Lema 2.4.2 a primeira desigualdade vem do teorema anterior e a última
igualdade segue da seguinte igualdade
m
CW
z ∗ (h) − β
(β, h, kJkΛ ) =
βkJkΛ
obtida na prova do Teorema 3.5.1
3.7
Acoplamento Jij = |i − j|−α
Casos α ≤ 1 e α > 2
Considere um sistema de partículas em Λ ≡ [−N, N ] ∩ Z, cuja energia de
interação entre elas é dada por HΛ . Um estado fundamental deste sistema
na caixa finita Λ é um estado σ ∈ ΩΛ que assume o menor valor possível
de energia. Em outras palavras, σ é um estado fundamental em ΩΛ se, e
somente se, HΛ (σ) ≤ HΛ (ω) para todo ω em ΩΛ . Para o modelos de Ising
ferromagnético em que o campo externo h é constante, esses estados correspondem a todos os spins “alinhados” na direção do campo, isto é, se
h > 0, o estado fundamental é dado por σ0 = (1, 1, . . . , 1) ∈ ΩΛ , e caso h < 0
o estado fundamental é dado por σ̃0 = (−1, −1, . . . , −1) ∈ ΩΛ . No modelo de
Ising ferromagnético é fácil ver que a inversão de qualquer dos spins do
estado fundamental aumenta a energia tanto de interação com o campo
externo, como de acoplamento com os demais spins. No caso simétrico
h = 0, ambos os estados com todos os spins alinhados são estados fundamentais.
Uma interação é dita uma interação somável quando a constante M0 =
P
i J(i) é finita. Como a energia de interação de um spin j qualquer com
os demais se escreve
X
σj
J(i)σi ≤ M0
i∈Λ
A constante 2M0 limita a energia necessária para se inverter um spin do
estado fundamental se h = 0. Mais ainda, como essa inversão tira um spin
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
66
da menor energia de interação possível para a maior possível, 2M0 limita
a energia necessária para a inversão de qualquer spin.
P
Os sistemas com interação J(i) = i−α com α ≤ 1 têm M0 = i∈N∗ i−α = ∞,
logo são não-somáveis. Em [5] Dyson sugere que, nessa situação, para
qualquer β positivo fixado, a energia de interação entre os spins cresce
suficientemente rápido para garantir limN →∞ m2ΛN = m2 = 1. Isso equivale a
dizer que a fração de spins apontando contra a maioria vai a zero quando
N → ∞. Quase todos os spins se alinham na mesma direção. Por não
apresentarem grande riqueza para análise, esses casos são de pouco interesse.
No outro extremo estão os modelos com α > 2. Ruelle mostrou em [21]
P
que se M1 = i J(i)·i < ∞ não há magnetização espontânea a temperaturas
finitas. Particularmente, se J(i) = i−α com α > 2 não há transição de fase
no sentido que o limite, quando h → 0+ , da magnetização específica é nulo.
Griffiths mostrou em [13] que qualquer modelo com interações translacionalmente invariantes e somável com M0 fixado tem magnetização não
superior a um modelo de Curie-Weiss com I = M0 . Demostramos esse fato
neste texto quando provamos o Teorema 3.6.6. Outra prova do fato, mas
para uma classe mais ampla de modelos pode ser encontrada em [18].
Como os modelos com α > 1 são somáveis, essa comparação com o modelo de Curie-Weiss implica em magnetização nula em altas temperaturas,
isto é, magnetização nula sempre que β ≤ 1/M0 . Utilizando a estimativa
costumeira de se aproximar um somatório por uma integral, temos
M0 =
X
i∈Λ
−α
|i|
Z
≤1+
1
∞
x−α dx =
α
.
α−1
Assim, um sistema com expoente α > 1 apresenta inverso da temperatura
crítica βc ≥ 1 − 1/α.
Em resumo, os resultados citados nesta seção nos permitem separar
os sistemas com interação J(i) = i−α em três classes. Se α ≤ 1 o sistema
é não-somável e o módulo da magnetização é 1 em qualquer β. Se α > 2 a
magnetização é nula a qualquer β.
Nesta seção não abordamos a situação 1 < α ≤ 2. Como esses modelos
são somáveis, a comparação com Currie-Weiss implica em limh→0+ m(β, h) =
0 ao menos para β ≤ 1 − 1/α. Os resultados de [5] expostos no último capítulo deste texto, nos mostram que, para 1 < α < 2, também há um limite
inferior para β a partir do qual a magnetização espontânea é positiva, logo
a temperatura crítica é positiva e finita.
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
67
Como já citamos, somente em 1983 foi provado em uma famoso trabalho de Frölich e Spencer [10] que para o modelo com α = 2 existe βc < ∞,
ou seja, há magnetização positiva a temperaturas finitas para o modelo
com α = 2.
3.8
Comparando Modelos com Interações do
Tipo J(|i − j|)
Nossa intenção nesta seção é mostrar consequências de se identificar
quais modelos com interação do tipo Jij = |i − j|−α admitem transição de
fase. Veremos que essa análise nos ajuda a tirar conclusões a respeito de
uma classe mais ampla de modelos de Ising.
Na situação mais simples em que h = 0 e a interação original Jij = |i−j|−α
é apenas multiplicada por uma constante, temos Jeij = C|i−j|−α . Nesse caso
a energia do sistema é também multiplicada por uma constante e
e Λ (σ) = C · HΛ (σ).
H
O fator exponencial que aparece na medida pode ser reescrito como
e Λ (σ)),
e Λ (σ)) = exp(−βCHΛ (σ)) = exp(−βH
exp(−β H
e Λ (σ) pode
fazendo apenas βe = Cβ. Dessa forma, o modelo com energia H
ser reescrito como um modelo com energia HΛ (σ), mas ao inverso da temperatura βe = Cβ. Ambos os sistemas são equivalentes, a menos da multiplicação da temperatura pela constante C. Se o modelo com energia HΛ
apresentar transição de fase ao inverso da temperatura β, o sistema com
e Λ também terá uma transição de fase ao inverso da temperatura
energia H
β/C.
Considere um modelo de Ising com interação translacionalmente invariante que denotaremos por I(|i − j|) > 0. Suponha adicionalmente
que limi→∞ I(i) = 0. Podemos compará-lo com os modelos com interação
e − j|) = C|i − j|−α para descobrir se há transição de fase em alguma
J(|i
temperatura finita.
Se I(|i − j|) ≥ C|i − j|−α para algum C > 0 e α < 1, então, como a magnetização quadrática não decresce com o aumento das interações Jij , e
o limite da magnetização quadrática do modelo com interações mais fracas já é 1, necessariamente o sistema com interação I(|i − j|) apresentará
Capítulo 3. Modelos com Interações Translacionalmente Invariante
68
magnetização quadrática também igual a 1. Na última frase utilizamos
a Desigualdade de GKS-2 ao afirmar que a magnetização quadrática não
diminui com o aumento de Jij .
No outro extremo, se I(|i − j|) ≤ C|i − j|−2− (para algum 0 < < 1),
a magnetização espontânea nula para todas as temperaturas finitas no
modelo com acoplamento |i − j|−2− e a desigualdade GKS-2 garantem o
mesmo comportamento no modelo com interações I(|i − j|).
Por fim, podemos supor como verdadeiro o resultado do último capítulo
onde mostramos que há magnetização positiva para modelos com interação do tipo J(|i − j|) = C|i − j|−α com 1 < α < 2 e usar esses sistemas como
referência. Assim, os modelos com interação I(|i−j|) ≥ C|i−j|−2+ apresentam magnetização positiva a partir de uma temperatura finita. Se ainda
a interação I é somável, também há uma região de altas temperaturas
com magnetização nula. Esses sistemas têm comportamento similar ao
sistema de referência com acoplamento J(|i − j|) = |i − j|−2+ , é portanto
para tais modelos existe um único βc tal que para todo β < βc o modelo
não tem magnetização espontânea e por outro lado, se β > βc então existe
magnetização espontânea.
Fogem a essa análise os modelos somáveis que não podem ser limitados
da maneira adequada às nossas interações de referência. Também foge à
comparação o caso “limite” onde J(|i − j|) = |i − j|−2 . Esse último caso foi
tratado em [10].
Tabulamos abaixo os comparativos expostos nesta seção.
Interação I(i)
I(i) ≥ Ci−1
C1 i−2+ ≤ I(i) ≤ C2 i−1−
I(i) ≤ Ci−2−
Inverso da
Temperatura Crítica (βc )
Magnetização
Espontânea
0
1
0 < βc < ∞

m(β, 0+ ) = 0, se β < β
c
m(β, 0+ ) > 0, se β > β
c
∞
0
Capítulo 4
Transição de Fase com
Interações de Longo Alcance
4.1
Introdução
Em 1969 era bem conhecido, como vimos na seção 1.4, que os modelos
de Ising com spins interagentes tomando valores em {−1, +1} não apresentam transição de fase se essa interação tem alcance finito. A grande
novidade em modelos de Ising em uma dimensão apareceu no trabalho
de Freeman Dyson [5]. Este paper traz a primeira prova de que interações de longo alcance podem originar transição de fase mesmo em sistemas do tipo Ising em uma dimensão. Além da imensa colaboração para a
área com a prova da existência de transição de fase em tais modelos esse
trabalho de Dyson também introduz o chamado modelo Hierárquico. Primeiramente apresentado no citado artigo para estimar a magnetização do
modelo de Ising linear, o modelo Hierárquico rapidamente tornou-se um
modelo de grande interesse, pelo fato de permitir uma análise bastante
detalhada de suas propriedades. Várias generalizações do modelo Hierárquico de Dyson apareceram na literatura e esse modelo tem sido utilizado
até os dias de hoje para atacar outros tipos de problemas.
Vimos na seção 3.7 que os modelos com interação de longo alcance
com constante de acoplamento do tipo lei de potência (J(i) = 1/iα ) não
apresentam transição de fase se a potência α > 2. Também vimos que os
modelos com α ≤ 1 são não-somáveis e apresentam magnetização 1 a qualquer temperatura. Assim, a questão mais natural é se há magnetização
não-nula a temperaturas positivas no modelo de Ising quando 1 < α ≤ 2.
Como diminuindo qualquer das interações Jij não podemos aumentar
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
70
a magnetização quadrática (ver seção 2.2), a estratégia será mostrar a
existência de magnetização quadrática positiva em um sistema com interações mais fracas que o modelo de Ising original. A magnetização quadrática positiva nesse sistema com interações mais fracas implicará magnetização quadrática também positiva (maior ou igual) no sistema original
para o mesmo β. Em consequência disso e do Lema 2.5.1, teremos também magnetização espontânea positiva no sistema com interações mais
fortes, Na verdade este fato, magnetização quadrática positiva implica
magnetização positiva, foi o resultado principal da Seção2.5.
O modelo candidato, com interações mais fracas do que a lei de potência J(i) = 1/iα , será o modelo Hierárquico apresentado na seção seguinte.
A seção 4.3 comparara o modelo Hierárquico com certas constantes de
acoplamento e mostrara que ele realmente tem interações mais fracas
que o modelo de Ising correspondente. Em seguida, na seção 4.5 será demonstrada a existência de magnetização quadrática positiva no modelo
Hierárquico para um certos conjuntos de constantes de acoplamento correspondentes a um modelo de Ising com 1 < α < 2. Este capítulo segue
passo-a-passo o trabalho de Dyson em [5].
4.2
O Modelo Hierárquico
Nesta seção vamos definir o modelo Hierárquico construído em [5] e apresentar algumas de suas propriedades elementares. O modelo Hierárquico
é semelhante ao modelo de Ising com exceção das constantes de acoplamento que, como no modelo de Curie-Weiss, dependem do volume. Outra
diferença é que o modelo Hierárquico é definido para caixas de tamanhos
específicos, para ser mais preciso o modelo Hierárquico será definido apenas para caixas de tamanho 2N , onde N ∈ N.
Antes de apresentar o Hamiltoniano do modelo Hierárquico precisamos
introduzir algumas definições. Vamos denotar por Λ = {1, . . . 2N } uma caixa
de volume 2N . Essa caixa pode ser dividida em caixas de tamanho 2i , 1 ≤
i ≤ N . Fixada uma escala 2p , com 1 ≤ p ≤ N podemos dividir a caixa Λ em
2N −p caixas consecutivas de tamanho 2p , como segue
Λ = {1, . . . , 2p } ∪ {2p + 1, . . . , 2 · 2p } ∪ {2 · 2p + 1, . . . , 3 · 2p } ∪ . . .
. . . ∪ {(r − 1) · 2p + 1, . . . , r · 2p } ∪ . . . ∪ {(2N −P − 1) · 2p + 1, . . . , 2N −p · 2p }.
Dessa forma, na escala 2p , a r-ésima caixa de tamanho 2p é dada pelo se-
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
71
guinte conjunto de sítios Λ(p,r) = {(r − 1) · 2p + 1, . . . , r · 2p }.
Para cada σ ∈ {−1, 1}Λ ≡ ΩΛ denotamos por Sp,r (σ) a soma dos spins em
Λ(p,r) , isto é,
r·2p
X
X
Sp,r (σ) =
σi =
σi .
i=(r−1)·2p +1
i∈Λ(p,r)
Finalmente, para cada N ∈ N o Hamiltoniano do modelo Hierárquico no
volume Λ ≡ {1, . . . , 2N } é definido como sendo a função HN : ΩN → R dada
por
2N −p
N
X
bp X 2
(S ),
(4.1)
HN (σ) = −
22p r=1 p,r
p=1
onde b1 , . . . , bp são constantes não-negativas.
Expandindo Sp,r que aparece na expressão acima ficamos com a seguinte expressão para o Hamiltoniano


N −p
2X
N
X
X
bp

σi σj  .
HN (σ) = −
2p
2
r=1
p=1
i,j∈Λ
(p,r)
Assim, para determinar a contribuição do par de spins σi , σj para a energia do sistema precisamos primeiro encontrar as escalas 2p ’s para as quais
os sítios i e j pertençam a um mesmo bloco Λ(p,r) para algum r. Já que em
cada uma dessas escalas 2p , esses spins contribuem com energia bp 2−2p ,
temos que a contribuição total desse par de spins é obtida somando essas
energias sobre tais escalas.
Na figura abaixo consideramos uma caixa de tamanho 25 e uma configuração σ fixada de 25 spins e destacamos as escalas e o blocos que devem
ser considerados na determinação da energia do par de spins σ12 e σ14 .
p=1
p=2
p=3
p=4
p=5
S1,1 S1,2 S1,3 S1,4 S1,5 S1,6 S1,7 S1,8 S1,9 S1,10 S1,11 S1,12 S1,13 S1,14 S1,15 S1,16
S2,3
S2,2
S2,5
S2,7
S2,1
S2,6
S2,4
S2,8
S3,4
S3,2
S3,1
S3,3
S4,1
S4,2
S5,1
Figura 4.1: Na primeira linha, temos um exemplo de uma configuração de 25 = 32 spins, onde as setas verticais representam os
spins +1 e −1. As linhas seguintes representam as caixas nas escalas 2 até 25 . Estão destacados em cinza o par de spins escolhido
σ12 e σ14 , e os blocos pelos quais eles interagem.
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
72
No exemplo da figura acima a energia do par σ12 e σ14 é dada por
b3
b4
b5
+
+
22·3 22·4 22·5
σ12 σ14 .
A energia total no modelo Hierárquico é então dependente de somas
como essa e, para calcular a energia total de um estado, somamos sobre
todas as caixas de um certo tamanho e sobre todos os tamanhos de caixas
permitidos.
O modelo Hierárquico é também um Modelo de Ising, como mencionado anteriormente, mas com constantes de acoplamento que são dependentes do volume e não são translacionalmente invariantes. Para diferenciar ambos os modelos neste capítulo, vamos nos referir ao modelo de
Ising com constantes de acoplamento J(|i − j|) = 1/|i − j|α como modelo
linear.
Como foi dito acima, para calcular explicitamente a energia de interação entre dois spins específicos precisamos somar todos os termos nos
quais aparece σi σj , ou seja, precisamos somar por todas as caixas em que
os spins i e j estão juntos. Digamos que eles estão nas mesmas caixas Λ(p,r)
para p ≥ p(i, j), mas em caixas diferentes se p < p(i, j). Então a contribuição
desse par à energia total do sistema é dada por
−RN (p(i, j))σi σj = −
N
X
q=p(i,j)
bq
σi σj .
22q
Essa igualdade motiva definir uma função RN : {1, . . . , N } → R como
N
X
bq
RN (p) =
.
22q
q=p
RN (p(i, j)) é a constante de acoplamento entre dois spins no modelo Hierárquico, equivalente ao que seria J(i − j) no modelo linear. Contudo, no
modelo Hierárquico, o equivalente à “distância” entre dois spins é o parâmetro 2p(i,j) , que é o comprimento da menor caixa a que ambos pertencem.
Outra quantidade importante é a magnetização quadrática por spin
para caixas de tamanho 2p , definida por
fN (0) ≡ 1
e
fN (p) ≡
1
hS 2 i
22p p,r
Seja ΛN +1 = {1, . . . , 2N +1 }. Essa caixa de tamanho 2N +1 pode ser decom-
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
73
posta em duas caixas de tamanho 2N e, usando a notação acima, podemos
indicar essa decomposição da seguinte forma: ΛN +1 = Λ(N,1) ∪ Λ(N,2) . Pela
definição do modelo Hierárquico temos que HN +1 é dado por uma soma
de três parcelas, uma primeira sendo composta apenas pela energia de
interação entre os spins da caixa Λ(N,1) , a segunda parcela envolve apenas
interações de spins que estão na caixa Λ(N,2) e uma terceira envolvendo
spins que estão na primeira e na segunda caixa citadas acima. Essa observação é expressa pela seguinte igualdade
X
HN +1 (σ) = −
RN +1 (p(i, j))σi σj −
i,j∈Λ(N,1)
−
X
X
RN +1 (p(i, j))σi σj
i,j∈Λ(N,2)
RN +1 (p(i, j))σi σj .
i∈Λ(N,1)
j∈Λ(N,2)
Se i, j ∈ Λ(N,1) ou se i, j ∈ Λ(N,2) segue da expressão obtida acima para a
função RN que
RN +1 (p(i, j)) =
bp(i,j)
bN
bN +1
bN +1
+
.
.
.
+
+
=
R
(p(i,
j))
+
.
N
22p(i,j)
22N
22N +2
22N +2
(4.2)
Para i ∈ Λ(N,1) e j ∈ Λ(N,2) temos que p(i, j) = N + 1 e assim RN +1 (p(i, j)) =
b2N +1 /22N +2 .
Vamos olhar para as constantes b1 , . . . , bN +1 como parâmetros de HN +1 .
Suponha que Λ(p,r) ⊂ Λ(N,1) . Para deixar mais claro o argumento nas pró
2 b1 ,...,bN +1
ximas linhas vamos usar a notação Sp,r
para indicar o valor espeN +1
2
rado de Sp,r
com respeito a medida de Gibbs definida por HN +1 no volume
ΛN +1 com parâmetros b1 , . . . , bN +1 . Pela definição do Hamiltoniano HN +1 e
pela decomposição apresentada acima vemos que se bN +1 = 0 então HN +1 é
composto por duas somas, onde os spins de uma não aparecem na outra e
vice-versa. Assim é fácil ver que as v.a.’s σi com i ∈ Λ(N,1) são independen,...,bN ,0
tes das v.a.’s σj com j ∈ Λ(N,2) , com respeito a medida de Gibbs h·ibN1+1
e
daí segue que
2 b1 ,...,bN 2 b1 ,...,bN ,0
.
Sp,r N
= Sp,r N +1
Para provar essa igualdade, precisamos estabelecer alguns fatos. Se deN +1
notamos por ΩN +1 = {−1, 1}2
então ΩN +1 = ΩN × ΩN . Vamos denotar por
(σ, ω) um elemento arbitrário de ΩN × ΩN . Se bN +1 = 0 em HN +1 temos que a
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
74
função de partição da medida de Gibbs determinada por HN +1 é dada por
,...,bN ,0
ZNb1+1
Z
exp(HN +1 (σ, ω))dκ(σ, ω)
=
ΩN ×ΩN


Z
X
exp 
=
ΩN ×ΩN
RN +1 (p(i, j))σi σj +
i,j∈Λ(N,1)
=
exp 
ΩN
Z
ΩN

exp 
ΩN
exp 
RN +1 (p(i, j))σi σj  dκ(σ)
i,j∈Λ(N,1)
Z
=


X

X
RN +1 (p(i, j))σi σj  dκ(σ)
i,j∈Λ(N,1)


X
RN +1 (p(i, j))ωi ωj  dκ(σ, ω)
i,j∈Λ(N,1)

Z
X

Z
RN (p(i, j))σi σj  dκ(σ)
exp 
ΩN
i,j∈Λ(N,1)
X
RN (p(i, j))σi σj  dκ(σ)
i,j∈Λ(N,1)
= ZNb1 ,...,bN · ZNb1 ,...,bN ,
onde na penúltima igualdade usamos a equação (4.2) juntamente com
bN +1 = 0. Analogamente temos que
2 b1 ,...,bN ,0
Sp,r N +1
=
=
=
=
Z
1
,...,bN ,0
ZNb1+1
2
Sp,r
(σ, ω) exp (HN +1 (σ, ω)) dκ(σ, ω).
ΩN ×ΩN
Z
1
ZNb1 ,...,bN
·
ZNb1 ,...,bN
ZNb1 ,...,bN
ZNb1 ,...,bN
1
ZNb1 ,...,bN
2
Sp,r
(σ) exp (HN +1 (σ, ω)) dκ(σ, ω).
ΩN ×ΩN
Z
ZNb1 ,...,bN
·
Z
2
Sp,r
(σ) exp (HN (σ)) dκ(σ)
ΩN
2
Sp,r
(σ) exp (HN (σ)) dκ(σ)
ΩN
2 b1 ,...,bN
= Sp,r
.
N
O próximo passo é mostrar que se bN +1 ≥ 0 então temos
2 b1 ,...,bN ,0 2 b1 ,...,bN ,bN +1
.
Sp,r N +1
≤ Sp,r N +1
Para ver que isso é verdadeiro, basta lembrar que
2
Sp,r
=
X
i,j∈Λ(p,r)
σi σj
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
75
e que podemos aplicar GKS-2 para garantir
∂
∂bN +1
2 b1 ,...,bN ,bN +1
Sp,r N +1
≥ 0.
Voltando a omitir os parâmetros bi ’s da notação, o que acabamos de
2
2
provar é que hSp,r
iN ≤ hSp,r
iN +1 . Dividindo ambos os lados dessa desigual2p
dade por 2 , temos finalmente que fN (p) ≤ fN +1 (p). Como a sequência fN (p)
está contida no intervalo [−1, +1], podemos afirmar, para cada p ∈ N fixado,
que existe o limite
f (p) = lim fN (p).
N →∞
2
iN é independente
Por simetria do Hamiltoniano (4.1), a quantidade hSp,r
da caixa específica r e depende apenas da escala 2p . Podemos usar essa
simetria para desenvolver a expressão de fN (p + 1). Como uma caixa na
escala 2p+1 contém duas caixas na escala 2p , podemos escrever
Sp+1,r = Sp,2r−1 + Sp,2r .
(4.3)
Usando essa relação na expressão de fN (p+1) podemos obtemos a seguinte
igualdade
2
fN (p + 1) =2−2p−2 hSp+1,r
i
2
2
=2−2p−2 [hSp,2r−1
i + hSp,2r
i + 2hSp,2r−1 Sp,2r i]
2
=2−2p−2 [2hSp,1
i + 2hSp,2r−1 Sp,2r i].
Novamente por simetria, podemos substituir as caixas (p, 2r − 1) e (p, 2r)
2
por (p, 1) e (p, 2), respectivamente. Assumindo que hSp,1 Sp,2 i ≤ hSp,1
i poderíamos então concluir que fN (p + 1) ≤ fN (p). Apesar da função ser de
fato não-crescente em p e, consequentemente, existir o limite limp→∞ f (p),
a demonstração desse resultado é desnecessária para nossa análise e a
omitiremos.
Na Seção 4.5 serão feitas estimativas diretamente para a quantidade
2
fN (N ) = 2−2N hSN,1
i, que equivale exatamente à magnetização quadrática
por spin. Por isso, estaremos interessados em mostrar que
(2)
mH = lim inf
1
N →∞ 22N
é positivo.
2
hSN,1
i = lim inf fN (N )
N →∞
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
76
A monotonicidade de f (p) fornece um resultado adicional:
(2)
mH = lim inf fN (N ) ≤ lim f (p).
N →∞
p→∞
(2)
Logo, a positividade de mH acarreta em limp→∞ f (p) também não-nulo.
4.3
Comparando os Modelos Hierárquico e de
Ising
O objetivo desta seção é encontrar um modelo Hierárquico, determinado
pelas constantes bp , com interações mais fracas que um dado modelo de
Ising com interações Jij ≡ J(|i − j|) ≥ 0. Para a comparação se tornar mais
simples a ideia é definir um modelo de Ising na rede {1, . . . , 2N }, usando
as constantes de acoplamento Jij . Em seguida, escolhemos constantes
bp ’s e definimos um modelo Hierárquico na rede {1, . . . , 2N }, de forma que
este modelo Hierárquico tenha interação mais fraca que a interação do
modelo de Ising. Construído tal modelo Hierárquico, podemos concluir
da Desigualdade GKS-2 que a magnetização deste modelo é menor ou
igual a magnetização do modelo de Ising na rede {1, . . . , 2N } com constantes de acoplamento dadas por Jij . Estabelecida a desigualdade mencionada acima precisamos a rigor ainda cuidar de uma questão técnica. Se
ΓN = {1, . . . , 2N } e mΓ (β, h) denota a magnetização específica do modelo de
Ising mencionado acima, com constantes de acoplamento Jij precisamos
mostrar que
mΓ (β, h) → m(β, h),
onde m(β, h) é a magnetização específica do modelo de Ising que foi definida anteriormente como limN →∞ mΛN (β, h), onde ΛN = [−N, N ] ∩ Z.
Para provar a afirmação feita acima, sobre a igualdade dos limites termodinâmicos basta lembrar que provamos na Seção 2.4, que se as constantes de acoplamento dependem apenas da distância entre os sítios, isto
é, Jij = J(|i − j|) e são não-negativas, então existe o limite limN →∞ m∆N (β, h),
onde ∆N = {1, . . . , N }. Este limite é igual a m(β, h). Obviamente {mΓ (β, h)} é
uma subsequência de {m∆N (β, h)} e portanto também converge para m(β, h).
Também argumentamos na Seção 2.4 que limN →∞ mΛN (β, h) = m(β, h) e portanto a afirmação está provada.
Em [5] Dyson escolhe as seguintes constantes bp para compará-las, em
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
77
seguida, com J:
h
i
bp = min 2p+q−2 J(2q − 1) .
(4.4)
1≤q≤p
No modelo Hierárquico com essas constantes, a contribuição à energia total dada por dois spins σj e σk , com j, k ∈ {1, . . . , 2N } é exatamente
RN (p(j, k)). Pela definição de p(j, k) temos que a distância entre j e k na
rede pode ser estimada por |j − k| ≤ 2p(j,k) − 1, assim segue direto da definição de bp que
RN (p(j, k)) =
N
X
1−2q
2
N
X
bq =
q=p(j,k)
h
i
21−2q min 2q+r−2 J(2r − 1)
1≤r≤q
q=p(j,k)
N
X
≤
2p(j,k)−q−1 J(2p − 1)
(4.5)
q=p(j,k)
≤ J(|j − k|)
A Desigualdade (4.5) juntamente com o Corolário 2.2.5 nos mostra que,
dado um modelo de Ising com constantes de acoplamento J(|j − k|), se
há magnetização não-nula para β > β0 no modelo Hierárquico correspondente (com os bp ’s construído acima), também haverá magnetização positiva no modelo linear para todo β > β0 .
Observamos que o modelo Hierárquico com bp = 2(2−α)p tem interações
mais fracas que o modelo linear com J(i) = 1/iα . De fato, para todos os
sítios j e k da rede tais que |j − k| ≤ 2p − 1, onde p ≡ p(j, k) temos
RN (p) =
N
X
21−2q bq =
q=p
4.4
N
X
q=p
21−2q 2(2−α)q ≤
N
X
q=p
2
1
1
≤
2αp
|j − k|α
(4.6)
Magnetização Quadrática e Magnetização
Espontânea
Já havíamos mencionado que o objetivo deste capítulo é demonstrar a
existência de magnetização quadrática não-nula para uma classe de modelos Hierárquicos. Para permitir um aproveitamento ótimo das simetrias
desses modelos, eles foram definidos sem a presença de campo externo,
ou seja, hi = 0. Será necessário, então, conectar a presença de magnetização quadrática não-nula em um modelo Hierárquico com constantes
bp = 2(2−α)p com a magnetização espontânea num modelo linear com cons-
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
78
tantes de acoplamento J(i) = i−α .
Já sabemos da seção anterior que as constantes de acoplamento do
modelo linear com expoente α superam as do modelo Hierárquico com
constante de acoplamento correspondentes, dadas por bp = 2(2−α)p . Adiante nesta seção a Desigualdade GKS-2 nos garantirá que o aumento nas
constantes de acoplamento Jij não reduz a magnetização quadrática, assim teremos
(2)
(2)
(4.7)
mL,ΛN ,0 ≥ mH,ΛN ,0 .
(2)
Onde mL,ΛN ,0 representa a magnetização quadrática no modelo linear (índice L), na caixa ΛN e com campo externo h = 0.
Também veremos que o aumento no campo externo não diminui a magnetização quadrática, ou seja,
(2)
(2)
(4.8)
mL,ΛN ,h ≥ mL,ΛN ,0 .
Concatenando as duas últimas inequações e tomando seus limites inferiores, chegamos a
(2)
(2)
(2)
lim inf mL,ΛN ,h ≥ lim inf mH,ΛN ,0 = mH > 0.
N →∞
N →∞
Podemos, então, utilizar os Lemas 2.4.2 e 2.5.1 para concluir
(2)
(2)
(2)
lim inf mL,ΛN ,h ≥ mH > 0 ⇒ lim mL,ΛN ,h = mL,h ≥ mH > 0.
N →∞
N →∞
A desigualdade acima mostra que a magnetização no modelo linear para
(2)
todo campo externo h > 0 é uniformemente limitada pela constante mH ,
logo o limite de m(β, h) quando h → 0+ também é limitado por essa constante. Assim, a magnetização espontânea no modelo linear é maior ou
igual à magnetização quadrática no modelo Hierárquico (com campo externo h = 0). Na seção seguinte serão apresentadas condições suficientes
para termos
(2)
(2)
lim inf mH,ΛN ,0 = mH > 0
N →∞
e, consequentemente, magnetização espontânea positiva no modelo linear
correspondente.
Sigamos com a demonstração das desigualdades (4.7) e (4.8). Os métodos utilizados serão os mesmos da demonstração do 2.2.5. Vamos começar
(2)
provando (4.8). A ideia é calcular ∂mΛN /∂h e mostrar que essa derivada é
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
79
sempre não-negativa para quando h ≥ 0.
∂ (2)
∂
mΛ =
∂h
∂h
P
Z
i∈Λ
σi
2
PΛ (σ) dκ(σ)
|Λ|
Z X
∂
−2
= |Λ|
σi σj PΛ (σ) dκ(σ).
∂h
ΩΛ i,j∈Λ
ΩΛ
Trazendo o resultado de ∂PΛ (σ)/∂h calculada no ponto σ da Seção 2.2,
chegamos à expressão
∂ (2)
m = β|Λ|−2
∂h Λ
"
Z
X
σi σj
ΩΛ i,j∈Λ
X
= β|Λ|−2
#
X
k∈Λ
σk − h
X
σk iΛ PΛ (σ) dκ(σ)
k∈Λ
[hσi σj σk iΛ − hσi σj iΛ hσk iΛ ] ≥ 0.
i,j,k∈Λ
A última desigualdade acima segue da aplicação da Desigualdade GKS-2 a
cada parcela do somatório. Fica assim demonstrada a desigualdade (4.8).
Repetindo o mesmo procedimento, podemos confirmar a desigualdade
(2)
(4.7). Neste caso, derivaremos ∂mΛN /∂Jij .
∂
(2)
mΛ = |Λ|−2
∂Jij
Z
−2
X
σk σl
ΩΛ k,l∈Λ
Z
= β|Λ|
X
∂
PΛ (σ)πΛ (dσ).
Jij
σk σl [σi σj − hσi σj iΛ ] PΛ (σ)πΛ (dσ)
ΩΛ k,l∈Λ
= β|Λ|−2
X
[hσi σj σk σl iΛ − hσi σj iΛ hσk σl iΛ ] ≥ 0.
k,l∈Λ
A conclusão desta seção é que demonstrar a positividade da magnetização quadrática em um sistema Hierárquico (sem campo externo) implica na existência de magnetização espontânea positiva em qualquer outro sistema com acoplamento mais forte. Em particular, a existência de
magnetização quadrática positiva em um sistema Hierárquico com contantes bp = 2(2−α)p implica na magnetização espontânea positiva num modelo linear com constantes de acoplamento J(i) = i−α , estando ambos os
sistemas no mesmo inverso da temperatura β.
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
4.5
80
Magnetização Quadrática Não-nula em
Baixas Temperaturas
Nesta seção, nossa intenção é seguir a prova da magnetização quadrática
não-nula no modelo Hierárquico dado um certo conjunto de constantes bp
da forma bp = 2(2−α)p com 1 < α < 2.
Por magnetização quadrática, nos referimos a:
(2)
mΛ
= hs2Λ iΛ =
*
S
|Λ|
2 +
* P
i∈Λ σi
|Λ|
=
Λ
2 +
Λ
P
2
( i∈Λ σi iΛ
=
,
|Λ|2
onde os valor esperado acima é tomado com respeito a medida de Gibbs
definida pelo Hamiltoniano HN do modelo Hierárquico no volume Λ =
{1, . . . , 2N }.
Começamos com o seguinte lema que será usado durante a prova do
teorema principal.
Lema 4.5.1. Seja {x1 , x2 , ..., xn } um conjunto de números inteiros, tais que
∀i ∈ {1, 2, ..., n} temos 0 ≤ xi ≤ a. Seja f : R → R uma função real positiva e b
um número real, então:
XX
i
j
e−1 b
(xi − xj )2
f
(x
)f
(x
)
≥
exp −
i
j
b2
a+b
!2
X
f (xi )
i
Demonstração. Seja q número inteiro dado por q = da/be + 1, onde da/be é
o menor inteiro maior que a/b. Vamos dividir o intervalo [0, a] em q subintervalos da forma Ip = [p/q, (p + 1)/q], com p = 1, . . . , q.
A principal ideia para obter a estimativa que estamos interessados é
descartar parcelas da forma exp[−(xi − xj )2 /b], onde os pontos xi e xj estão
relativamente distantes com respeito a escala dada pelo comprimento do
intervalo Ik . Assim, vamos manter apenas as parcelas cujos pares {xi , xj }
estejam contidos no mesmo intervalo Ik .
Denote por Fk a seguinte soma
Fk =
X
xi ∈Ik
f (xi ).
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
81
Pela definição de Ik se xi , xj ∈ Ik temos que |xi − xj | ≤ a/q e portanto
XX
i
j
"
2 # X X
1 a
(xi − xj )2
f (xi )f (xj ) ≥ exp − 2
f (xi )f (xj )
exp −
b2
b
q
k xi ,xj ∈Ik
"
2 # X
1 a
= exp − 2
Fk2 .
b
q
k
Usando que a/b < q, obtemos a seguinte cota inferior para o lado direito
da desigualdade acima
"
exp
a 1
− ·
b q
2 # X
Fk2 > exp(−1)
X
k
Fk2 .
(4.9)
k
Visto que a média quadrática é maior que a média aritmética, podemos
deduzir que
v
u q
q
uX Fk2 X
Fk
t
≥
q
q
k=1
k=1
=⇒
v
u
q
X
u X
tq ·
Fk2 ≥
Fk
k=1
⇐⇒
k
q
X
1
Fk2 ≥
q
k=1
!2
X
Fk
.
k
Aplicando a última desigualdade acima em (4.9) obtemos
XX
i
j
X
(xi − xj )2
−1
exp −
f
(x
)f
(x
)
≥
e
Fk2
i
j
b2
k
!2
1
≥
e·q
X
1
≥
e·q
X
Fk
k
!2
f (xi )
i
Já que q ≤ a/b + 1 = (a + b)/b concluímos finalmente que
XX
i
j
(xi − xj )2
b · e−1
f
(x
)f
(x
)
≥
exp −
i
j
b2
a+b
!2
X
f (xi )
xi ∈Ik
o que prova o Lema.
Com esse lema em mãos podemos voltar ao tema principal, o teorema
mais importante desta seção, cujo o enunciado é o seguinte.
Teorema 4.5.2. Sejam {bp }p∈N as constantes usadas para definir o Hamiltoniano do modelo Hierárquico na Seção 4.2. Se convergir a seguinte
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
82
quantidade:
∞
X
1
L=
log(1 + p),
b
p=1 p
(4.10)
então haverá magnetização quadrática positiva ao inverso da temperatura
β desde que β > 8L.
Demonstração. Inicialmente, escrevemos a função de partição do modelo
Hierárquico como segue
X
ZN =
ZN (s),
s
onde ZN (s) é a soma de todas as parcelas da função de partição tal que
σ1 + . . . + σ2N = s. Podemos pensar nas ZN (s) como funções de partição
correspondente aos estados com magnetização total s.
Para cada N ∈ N seja ζN : R → R a função dada por
ζN (u) =
X
exp(us2 )ZN (s).
s
As funções ζN definidas dessa maneira gozam da seguinte propriedade
P
ζN (0) = s ZN (s) = ZN . Definimos também a seguinte função
LN (u) = log(ζN (u)).
Afirmamos que LN é uma função convexa com respeito à variável u. De
fato, basta calcular LN (λu1 + (1 − λ)u2 ) e mostrar, usando a Desigualdade
de Hölder que LN (λu1 + (1 − λ)u2 ) ≤ λLN (u1 ) + (1 − λ)L(u2 ).
Um cálculo direto mostra que a derivada de LN é dada por
X
L0N (u) = [log(ζN (u))]0 =
s2 exp(us2 )ZN (s)
ζN (u)0
s
= X
ζN (u)
exp(us2 )ZN (s)
s
e que essa igualdade cria uma conexão entre LN e a esperança da magnetização quadrática, uma vez que L0N (0) = hS22N iN = 22N fN (N ) .
Levando em conta a estrutura hierárquica das somas (4.3) podemos
decompor o espaço de configurações ΩΛ2N através dos valores das magnetizações totais em Λ(2N −1 ,1) e Λ(2N −1 ,2) , que denotaremos por x e y respectivamente. Assim, para cada configuração σ ∈ ΩΛ2N cujas as magnetizações
totais em Λ(2N −1 ,1) e Λ(2N −1 ,2) são dadas respectivamente por x e y temos que
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
83
a energia de interação entre essas duas caixas é dada por
Hout (x, y) = 2−2N bN (SN,1 )2 = 2−2N bN (SN −1,1 + SN −1,2 )2 = 2−2N bN (x + y)2
Já que todos os valores possíveis de magnetizações totais em Λ(2N −1 ,1) ou
Λ(2N −1 ,2) pertencem ao conjunto A = {−2N −1 , −2N −1 + 2, ..., 2N −1 − 2, 2N −1 }, podemos escrever a função de partição do sistema inteiro como segue
ZN =
XX
ZN −1 (x)ZN −1 (y)e−βHout (x,y) .
x∈A y∈A
Usando a igualdade acima, obtemos a seguinte representação de ζN
ζN (u) =
X
exp(us2 )ZN (s) =
s
XX
exp(u(x + y)2 )ZN −1 (x)ZN −1 (y)eβHout (x,y)
x∈A y∈A
=
XX
=
XX
=
XX
exp(u(x + y)2 )ZN −1 (x)ZN −1 (y) exp(β2−2N bN (x + y)2 )
x∈A y∈A
exp (u + β2−2N bN ) · (x + y)2 ZN −1 (x)ZN −1 (y)
x∈A y∈A
exp (u + v) · (x + y)2 ZN −1 (x)ZN −1 (y),
x∈A y∈A
onde v é definido como v = β2−2N bN .
Será necessário estimar ζN para alguns valores de u. Vamos considerar
primeiro u = −v:
#2
"
ζN (−v) =
XX
exp(0)ZN −1 (x)ZN −1 (y) =
x∈A y∈A
X
ZN −1 (x)
= [ζN −1 (0)]2 (4.11)
y∈A
Para u = 0, o Lema 4.5.1 pode ser usado com os seguintes parâmetros:
xi = x + 2N −1 , xj = 2N −1 − y
a = 2N , b = v −1/2 = 2N (βbN )−1/2
f (xi ) = exp(2vx2 )ZN −1 (x)
para provar a validade da seguinte desigualdade
#2
"
ζN (0) ≥ e−1 [1 + (βbN )−1/2 ]−1 ·
X
exp(2vs2 )ZN −1 (s)
(4.12)
s
−1
= e [1 + (βbN )
1/2 −1
]
· [ζN −1 (2v)]2
(4.13)
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
84
Para calcular LN tome os logaritmos de (4.12) e (4.11) e os subtraia, chegando a:
LN (0) − LN (−v) ≥ 2[LN −1 (2v) − LN −1 (0)] − 1 − log[1 + (βbN )1/2 ]
(4.14)
A convexidade de LN (u) em u implica em:
LN (0) − LN (−v) ≤ vL0N (0)
(4.15)
LN −1 (2v) − LN −1 (0) ≥ 2vL0N −1 (0)
(4.16)
Mas (4.16), (4.15) e (4.14) juntos nos dão uma desigualdade em L0N e L0N −1 :
vL0N (0) ≥ LN (0) − LN (−v) ≥ 2[LN −1 (2v) − LN −1 (0)] − 1 − log[1 + (βbN )1/2 ]
≥ 4vL0N −1 (0) − 1 − log[1 + (βbN )1/2 ]
Lembrando que fN (N ) = 2−2N L0N (0), segue da desigualdade acima que
o
1 n
1/2
1 + log 1 + (βbN )
fN (N ) ≥ fN −1 (N − 1) −
bN β
Iterando a desigualdade acima e lembrando que f0 (0) = 1 obtemos a seguinte estimativa
fN (N ) ≥ 1 −
N
X
n
o
(bp β)−1 1 + log 1 + (βbp )1/2
(4.17)
p=1
Para tornar nossa análise mais simples, vamos decompor o somatório
acima em duas partes, a depender no valor de bp β. Antes de apresentar a
decomposição observamos que a função
(bp β)−1 {1 + log[1 + (βbp )1/2 ]}
é decrescente em bp β, para qualquer valor de bp β natural. Usando esse
fato, vamos limitar os termos que satisfazem bp β ≥ 9p2 por
∞
X
p=1
(9p2 )−1 {1 + log(1 + 3p)} <
9
.
16
Como a função log(1+3p) é crescente em p, os demais termos, com bN β < 9p2 ,
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
85
são limitados por:
∞
X
(bp β)−1 {1 + log(1 + 3p)}.
p=1
Observando que para p ≥ 1 temos
1 + log[1 + 3p] <
7
log(1 + p),
2
podemos concluir que a desigualdade abaixo é verdadeira
∞
X
(bp β)−1 {1 + log(1 + 3p)} < β −1
∞
X
(bp )−1 ·
p=1
p=1
7
7
log(1 + p) = Lβ −1 .
2
2
Juntando as duas estimativas obtidas acima, para (4.17) ficamos com
9
7 −1
7
fN (N ) ≥ 1 −
+ Lβ
= [1 − 8Lβ −1 ].
16 2
16
Então, fN (N ) > 0 se β > 8L. Como a última desigualdade vale para todo
(2)
N e mH = lim inf N →∞ fN (N ), está provado o Teorema 4.5.2.
Agora voltamos a lembrar que um sistema Hierárquico com constantes bp = 2(2−α)p tem acoplamento mais forte que um sistema linear com
J(|i − j|) = 1/|i − j|α . Assim, calculando a constante L para esse sistema
Hierárquico, temos:
L=
∞
X
(bp )
−1
log(1 + p) =
p=1
∞
X
2(−2+α)p log(1 + p).
p=1
A quantidade acima evidentemente converge para α < 2, logo a magnetização quadrática é positiva nesses sistemas Hierárquicos. Por fim, essa
estimativa para L e os resultados da Seção 4.4 nos permitem concluir a
demonstração do teorema abaixo.
Teorema 4.5.3. No modelo de Ising com constantes de acoplamento ferromagnéticas Jij = 1/|i−j|α , com 1 < α < 2, existe magnetização espontânea
positiva se
∞
X
β>8
2(−2+α)p log(1 + p).
p=1
O resultado da Seção 3.6 a respeito da dominância da magnetização
Capítulo 4. Transição de Fase com Interações de Longo Alcance
86
de Currie-Weiss sobre sistemas somáveis nos permite concluir que esses
modelos com 1 < α < 2 também têm uma temperatura crítica finita, acima
da qual a magnetização é nula.
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