REVISTA ÂMBITO JURÍDICO ®
Inelegibilidade decorrente de vida pregressa. Entre a presun? de inoc?ia e o princ?o da moralidade
Resumo: Este trabalho monográfico tem o intuito de analisar a possibilidade de serem indeferidos os pedidos de registros de candidaturas de
pessoas cuja análise da sua vida pregressa não credencie ao exercício de cargos ou funções públicas, em atendimento ao principio da moralidade,
que na hipótese de colidir com o princípio da presunção de inocência, deve aquele prevalecer em detrimento deste, que protege direitos individuais,
enquanto o da moralidade assegura à sociedade o direito fundamental ao governo honesto, formado por agentes igualmente honestos. O cerne do
trabalho, portanto, é buscar demonstrar que não há princípios absolutos e que eles devem ser sopesados para que se estabeleça naquela determina
circunstância qual deve prevalecer, sem que isso implique necessariamente na exclusão do outro.[1]
Palavras-chaves: Inelegibilidade; vida pregressa; princípios; moralidade; presunção de inocência; sopesamento; interesse público; interesse
individual.
Abstract: This monograph is intended to examine the possibility of being rejected requests for records of nominations of persons whose analysis of
his earlier life not been assigned to the exercise of public functions or public, in compliance with the principle of morality, which in the event of conflict
with the presumption of innocence must prevail over that of this, which protects individual rights, while the morality of society to ensure the
fundamental right to honest government, consists of agents also honest. The core of the work therefore is to seek to demonstrate that there are no
absolutes and that they need to be weighed to establish that fact that determining which should prevail, without necessarily implying the exclusion of
others.
Keywords: Ineligibility; previous life, principles, morality, presumption of innocence, weighing up, the public interest, individual interest.
Sumário: Introdução. I. Direitos Políticos na Constituição Brasileira de 1988. 1.1. O direito de votar e ser votado. 1.2. Condições de elegibilidade. 1.3.
Inelegibilidades previstas na Constituição Federal de 1988. 1.4. Inelegibilidades previstas na Lei Complementar nº 64/90. 1.5. Elegibilidade X
Inelegibilidade. 1.6. Registro de Candidatura. 1.7. O caso Eurico Miranda. II Constituição e supremacia constitucional. 2.1. O caráter vinculante e
imperativo das normas constitucionais. 2.2. As omissões legislativas e o papel do STF na efetividade da Constituição. 2.3. Histórico da vida
pregressa. 2.4. Vida pregressa como preceito fundamental. 2.5. O julgamento da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental. O
posicionamento da Associação dos Magistrados Brasileiros. 2.6. Os argumentos contrários à ADPF nº 144. 2.7. Os argumentos favoráveis à ADPF nº
144. III. O papel dos princípios no ordenamento jurídico brasileiro. 3.1. Moralidade X presunção de inocência. O que deve prevalecer em matéria
eleitoral? 3.2. O atual estado de leniência política: o quadro da impunidade no Brasil. 3.3. O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral. 3.4. O
projeto de iniciativa popular dos “fichas-sujas”. 3.5. Os juízes eleitorais e a defesa da moralidade na vida pública. 3.6. O “mensalão” e o “caso Arruda”.
3.7. Por uma nova realidade no país. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
O objetivo desse trabalho é analisar a possibilidade de serem indeferidos os pedidos de registros de candidaturas de pessoas cuja análise de sua
vida pregressa não o credencie ao exercício do cargo eletivo que pleiteie, por entender que para tal função representativa é condição essencial o
respeito ao princípio da moralidade, mesmo diante do conflito entre esse princípio e o princípio da presunção de inocência, que não deve prevalecer
de modo absoluto, como pretendem alguns, pois o interesse individual de alguém não pode sobrepor-se aos interesses de toda uma coletividade,
dentre esses, o de um governo honesto, formado por agentes igualmente honestos.
Para isso, defendo que os princípios não devem ser considerados de modo absoluto, como se pudessem aniquilar os demais que com eles colidam.
Os princípios podem e devem ser sopesados para que chegue a melhor decisão diante daquela situação específica, como é o caso que se apresenta
no julgamento dos pedidos de registros de candidaturas de políticos que apresentem “ficha-suja”. Nesse caso, o princípio da moralidade deve
prevalecer e o da presunção de inocência, afastado, para que, com isso, busque preservar o interesse da sociedade em ter candidatos probos, retos,
na condução dos negócios do Estado, da qual a grande maioria é dependente das suas decisões.
Inicialmente fazemos uma análise pelos direitos políticos, mostrando desde a origem da participação popular na vida pública, ao caso Eurico Miranda,
ocorrido no Rio de Janeiro e que fomentou toda essa discussão em torno da necessidade de se considerar a vida pregressa do candidato, para o
deferimento ou não de candidaturas. Também nesse capítulo fazemos uma abordagem sobre as condições de elegibilidade e quais as hipóteses de
inelegibilidade previstas na Constituição Federal e na Lei Complementar 64/90.
No segundo capítulo analisamos a Constituição Federal, o caráter vinculante de suas normas, as omissões legislativas e o papel do Supremo
Tribunal na efetividade da Constituição, isso feito para instrumentalizar o debate em torno da eficácia da Lei Maior, condição essa que renomada
parte da doutrina e jurisprudência não lhe confere, principalmente em relação ao §9º, do seu art. 14, que fez inserir no texto a necessidade da
consideração da vida pregressa do candidato com o propósito de proteger a probidade administrativa e a moralidade para o exercício dos mandatos.
Para esses, tal artigo carece de complementação, não podendo, pois, ser auto-aplicável por depender de vontade legislativa para tanto. Discordamos
dessa posição, e procuramos demonstrar isso no trabalho, por acreditar que a vontade dos legisladores não pode ser superior à vontade da
Constituição que deixou explicito em seu texto a sua ordem, que todos devemos obediência.
Também nesse capítulo trazemos informações a respeito dos conceitos e referências ao que se entende hoje por “vida pregressa”, considerada como
um dos preceitos fundamentais diante de sua relevância na concretização de outras prescrições constitucionais, a exemplo do princípio da
moralidade.
Mas é na análise dos argumentos favoráveis e contrários utilizados pelos ministros do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Argüição de
Descumprimento de Preceito Fundamental nº 144, ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros, que encontramos as mais significativas
dúvidas e respostas acerca do objeto investigado, principalmente depois do estudo detalhado sobre o voto do Ministro Celso de Mello, de 97 páginas,
que, confesso, mexeu com as minhas certezas quanto à prevalência do princípio da moralidade sobre o principio da presunção de inocência, situação
essa levada ao conhecimento do professor José Lima de Menezes, orientador do presente trabalho.
Talvez se acesso tivesse aos votos dos Ministros Carlos Ayres Britto e Joaquim Barbosa, os únicos a apoiar a ADPF 144, tais incertezas não teriam
ocorrido. Mas, passados 15 meses, os votos dos Ministros nesse julgamento ainda não foram disponibilizados na página do Supremo Tribunal
Federal, o que, por certo, limitou o alcance desse trabalho.
Finalmente o último capítulo, que é muito mais político do que jurídico. É com ele que encerro o trabalho, analisando inicialmente o papel dos
princípios no ordenamento jurídico brasileiro. Logo após essa abordagem, passo a mostrar a real situação vivida no Brasil, através de dois casos
específicos, o “mensalão” e o “caso Arruda”, o mais recente escândalo nacional.
Tudo isso feito a demonstrar que diante do flagelo da corrupção não é prudente continuar atribuindo um caráter absoluto à presunção de inocência,
em detrimento dos demais princípios, como o da moralidade, diante dos interesses e das conseqüências sociais em jogo.
Mas nem tudo está perdido. Defendemos no trabalho a necessidade de uma nova realidade no país, a partir de reinterpretações que possam
assegurar a vontade da Constituição, e da mobilização popular em torno do impedimento de candidaturas dos “ficha-sujas”, como fez o Movimento de
Combate à Corrupção Eleitoral.
I Direitos políticos na Constituição brasileira de 1988
O presente capítulo trata dos direitos políticos na Constituição Federal de 1988, uma passagem essencial para a compreensão do tema, que envolve
desde a eficácia do texto constitucional à necessidade de uma nova realidade para o Brasil, no tocante ao deferimento de candidaturas de políticos
que apresentem vida pregressa incompatível com o cargo ou função que se pretenda ocupar. Para isso utilizaremos a Constituição Federal, decisões
dos Tribunais Superiores e posições doutrinárias sobre o assunto, dando-se prioridade àquelas mais importantes, tanto favoráveis como contrárias à
possibilidade de afastar do processo eleitoral quem ainda não foi declarado culpado, com trânsito em julgado, mas cuja análise criteriosa da sua vida
pregressa transmita a certeza de se tratar de um transgressor de valores, costumes sociais e de todas as exigências da ordem jurídica,
principalmente aquelas voltadas à correção, probidade e retidão que todo homem público deve possuir.
1.1 O direito de votar e ser votado
O direito ao voto não é algo novo no Brasil, remontando suas origens ao período do seu descobrimento. Ele não foi outorgado ao povo, nem por este
conquistado à força, mas passou a fazer parte da vida política brasileira a partir da tradição dos colonizadores em promover a escolha dos
governantes locais pelos próprios moradores das vilas e cidades brasileiras fundadas.
Isso é o que se depreende do trabalho produzido pelo Tribunal Superior Eleitoral sobre a evolução do sistema eleitoral brasileiro.[2] Numa de suas
passagens, consta o registro das origens da participação direta do povo nas escolhas dos governos locais, à época chamados de “conselhos
municipais”, órgãos responsáveis pela administração das vilas e cidades, o que faz concluir que o direito ao voto surgiu no Brasil com os primeiros
núcleos de povoadores.
“[...] os bandeirantes paulistas, quando se embrenhavam nos sertões, iam imbuídos da prática do direito de votar e de ser votado. Quando, em 1719,
Pascoal Moreira Cabral chega, com sua bandeira,, às margens dos rios Cuiabá e Coxipó-mirim, e ali descobre ouro e resolve estabelecer-se, seu
primeiro ato é realizar a eleição de guarda-mor regente. E naquele dia, 8 de abril de 1719, reunidos numa clareira no meio da floresta, aqueles
homens realizam uma eleição. Imediatamente é lavrada a ata dos trabalhos: “(...) elegeu o povo em voz alta o capitão-mor Pascoal Moreira Cabral
por seu guarda-mor regente até a ordem do senhor general(...)”.Depois desse primeiro ato legal, eram fundadas as cidades já sob a égide da lei e da
ordem.”[3]
Noutro levantamento histórico[4] consta a revelação de que a primeira eleição formal teria ocorrido em 1532, na Vila de São Vicente, para a eleição
de membros do conselho municipal, uma instituição semelhante às Câmaras Municipais que hoje conhecemos.
Mas nem todos podiam votar, ficando restrito o direito àqueles considerados “homens bons”, expressão genérica e ambígua que designava não uma
qualidade moral, mas “a qualificação adquirida pelo sobrenome, pela renda, pelas propriedades e pela participação na burocracia civil e militar”.
Mas as exigências não se concentravam apenas nas qualidades do eleitor, atingindo também aqueles que pretendiam ser votados. “Para se ter uma
idéia, um candidato a deputado tinha que comprovar uma renda líquida anual de 400 mil réis, enquanto o ingresso na lista de senadores exigia uma
renda anual não inferior a 800 mil réis.”
De lá para cá, a evolução foi bastante significativa, com alguns retrocessos, é verdade, mas hoje encontra-se plenamente consolidada a possibilidade
de os cidadãos brasileiros escolherem os seus representantes por meio do voto, independentemente de qualquer limitação que envolva renda, raça,
sexo ou classe social, favorecendo sobremaneira a democracia, sistema que exige para a sua caracterização a participação de todos nos negócios
do Estado.
A idéia de participação universal nos negócios do Estado encontra-se expressamente prevista na Constituição Federal, em seu art. 14, que diz:
“Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos.”
A plenitude desse exercício democrático é demonstrada logo no primeiro artigo da Constituição Federal, em seu parágrafo único:
“Art. 1º. (...)
Parágrafo único - Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”
Essas são prescrições que deixam clara a opção do constituinte pela democracia, cuja efetividade depende o respeito ao pleno exercício do voto.
Sobre esse tema, ponderou BONAVIDES (2003, p. 118):
“Nenhuma técnica espelha melhor a veracidade democrática de um sistema do que o sufrágio, a forma como ele se concretiza, a extensão concedida
a essa franquia participativa e a lei afiançadora de seu exercício. O sufrágio universal foi a grande revolução que impossibilitou politicamente a
perpetuidade do Estado liberal. A bandeira da participação dos governados completou a vitória com o princípio da representação proporcional”.
Verdadeiramente, sem o respeito à plena liberdade de votar não há como se falar em democracia, tampouco em direitos políticos, essências do
exercício da soberania popular. Assim, surge como centro irradiador dos direitos políticos o direito de sufrágio, que se traduz no direito de votar e ser
votado.
Esses direitos, para serem plenamente exercidos, precisam passar pelo crivo de alguns pressupostos. A condição para ser eleitor, por exemplo, é
simples, pois basta ter inscrição eleitoral válida, como exige a Constituição Federal, em seu art.14, §§ 1º e 2º:
“Art.14. (...)
§ 1º. O alistamento eleitoral e o voto são:
I – obrigatórios para os maiores de dezoito anos;
II – facultativo para:
a) os analfabetos;
b) os maiores de setenta anos;
c) os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos.
§ 2º. Não podem alistar-se como eleitores os estrangeiros e, durante o período do serviço militar obrigatório, os conscritos.”
Já o direito de ser votado, - a capacidade eleitoral passiva-, que é a situação que permite a alguém disputar um cargo eletivo, é alcançada com o
preenchimento de certas condições previstas na Constituição Federal e nas leis infraconstitucionais.
1.2 Condições de elegibilidade:
Como visto, os direitos políticos autorizam os cidadãos a participarem ativamente do governo de seu país. Essa participação acontece quando
eleitores escolhem os seus representantes, opinam em plebiscitos ou referendos, e pela ocupação de cargos políticos. Compreendem, portanto, a
junção do direito de votar com o direito de ser votado.
As chamadas condições de elegibilidade constituem requisitos necessários ao direito de ser candidato. São exigências constitucionais ou legais para
a realização do registro. Na hipótese de o cidadão não preencher a uma delas não terá a sua disposição o direito de ser votado, pois não lhe será
deferido o registro da candidatura.
Vê-se, portanto, que apenas com o preenchimento dessas condições é que se adquire o direito subjetivo de concorrer às eleições. Na Constituição,
são as seguintes as condições de elegibilidade trazidas no §3º, do art. 14:
“Art. 14. (...)
§3º. São condições de elegibilidade, na forma da lei:
I – a nacionalidade brasileira;
II – o pleno exercício dos direitos políticos;
III – o alistamento eleitoral;
IV – o domicílio eleitoral na circunscrição;
V – a filiação partidária;
VI – a idade mínima de:
a) trinta e cinco anos para presidente e Vice-Presidente da República e Senador;
b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal;
c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e Juiz de Paz;
d) dezoito anos para Vereador.”
Então, nesse sentido, para que alguém possa ser candidato, é preciso que seja detentor da nacionalidade brasileira, que para LENZA (2009, p.769)
“[...] pode ser definida como o vínculo jurídico-positivo que liga um indivíduo a determinado Estado, fazendo com que esse indivíduo passe a integrar
o povo daquele Estado e, por consequência, desfrute de direitos e submeta-se a obrigações”
Para SILVA (2007, p.319) nacionalidade “é conceito mais amplo do que cidadania, e é pressuposto desta, uma vez que só o titular da nacionalidade
brasileira pode ser cidadão.” Ela vem regulada pelos arts. 12 a 14 da Constituição. Por eles são considerados natos: os nascidos na República
Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país; os nascidos no estrangeiro, de pai ou mãe
brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil; os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou de mãe
brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente, ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em
qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira.
Já os naturalizados são aqueles que: na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa
apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral; os estrangeiros de qualquer nacionalidade residentes na República Federativa do
Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira. Para os portugueses com
residência permanente no País, se houver reciprocidade em favor de brasileiros, serão atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro.
Entre esses direitos está o direito de ser votado (elegibilidade), que a Constituição Federal de 1988 atribuiu, também, aos naturalizados. Mas, essa
outorga sofre as limitações impostas pela própria Constituição, que em seu art. 12, § 3º, prescreve:
“§ 3º. São privativos de brasileiro nato os cargos:
I – de Presidente e Vice-Presidente da República;
II – de Presidente da Câmara dos Deputados;
III – de Presidente do Senado Federal;
IV – de Ministro do Supremo Tribunal Federal;
V – da carreira diplomática;
VI – de oficial das Forças Armadas;
VII – de Ministro de Estado da Defesa.”
Tais limitações acontecem devido a questões de segurança nacional, reservando-se a brasileiros natos a ocupação das posições mais relevantes da
República, a exemplo do que acontece com os cargos de Presidente e Vice-presidente, de Presidente da Câmara dos Deputados e Presidente do
Senado Federal e de Ministro do Supremo Tribunal Federal, o mesmo acontecendo com relação aos cargos da carreira diplomática, de oficial das
forças Armadas e de Ministro de Estado da Defesa.
Desse modo, mesmo sendo outorgado aos portugueses os direitos inerentes aos brasileiros, para esses cargos trazidos, somente os nacionais de
origem brasileira podem ocupá-los.
Mas essa condição de elegibilidade – a nacionalidade brasileira – não é absoluta, podendo ser perdida nas hipóteses trazidas pelo art. 12, § 4º, da
Constituição Federal de 1988, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional ou pela aquisição de outra nacionalidade.
“Art. 12.
§ 4º. Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que:
I – tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional;
II – adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos:
de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira;
de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em Estado estrangeiro, como condição para permanência em seu
território ou para o exercício de direitos civis.”
Outra condição de elegibilidade refere-se ao pleno exercício dos direitos políticos. Seja brasileiro nato ou naturalizado, em regra, são a todos
garantidos o direito de participação nos negócios do Estado. Tais direitos são essencialmente o de participar da escolha dos ocupantes dos cargos
eletivos, e também o de se candidatar a um desses cargos. Ao direito de votar chamamos de capacidade eleitoral ativa. Ao de ser votado, ou seja, de
ser candidato e receber votos numa eleição, chamamos de capacidade eleitoral passiva.
O art. 15 da Constituição Federal, com o propósito de proibir a cassação de direitos políticos, afirma que sua perda ou suspensão apenas acontecerá
nos casos de:
“Art. 15. (...)
I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado;
II - incapacidade civil absoluta;
III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;
IV – recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5º, VIII:
V – improbidade administrativa, nos termos do art. 37, §4º”.
Assim, para que alguém possa plenamente exercer os seus direitos políticos não poderá estar incurso em qualquer dessas hipóteses de perda[5] ou
de suspensão[6]. O cancelamento da naturalização é uma delas. Neste caso, o individuo voltará à condição de estrangeiro, não podendo mais se
alistar como eleitor, nem eleger-se, uma vez que deixa de ostentar a nacionalidade brasileira.
Também nos casos em que invocar a escusa de consciência para não cumprir obrigação legal a todos imposta, e recusar-se a cumprir a prestação
alternativa, fixada em lei, terá o indivíduo, como sanção, a declaração de perda dos seus direitos políticos. Por último, a perda da nacionalidade
brasileira, já abordada anteriormente, que é pressuposto para o exercício dos direitos políticos, visto que, para se participar dos negócios do Estado é
preciso que se faça parte deste Estado, o que se dá pela aquisição da nacionalidade.
Também pela suspensão pode ocorrer a limitação dos direitos políticos do individuo. Isso acontece em algumas situações: incapacidade civil
absoluta, condenação criminal transitada em julgado, improbidade administrativa, exercício assegurado pela cláusula da reciprocidade e condenação
por quebra do decoro parlamentar, a que estão sujeitos Deputados e Senadores.
O alistamento eleitoral é outra condição de elegibilidade. Para que alguém possa ser candidato, não basta que seja detentor da nacionalidade
brasileira, e esteja no pleno gozo dos seus direitos políticos. É necessário, também, que seja eleitor. O alistamento é o ato jurídico através do qual
nasce para o indivíduo o direito de participar ativamente da vida política do Estado a que pertença, ao lhe ser conferido o poder de escolher aqueles
que irão representar sua vontade nas mais diversas funções. Assim, somente poderá ser votado aquele que tiver o direito de votar.
O domicílio eleitoral na circunscrição é uma condição de elegibilidade cuja função é delimitar a área de abrangência do exercício da capacidade
eleitoral ativa e passiva do cidadão, fazendo-o inserido em determinado cenário político. No âmbito eleitoral, o conceito de domicílio difere dos
demais ramos do direito, pois para o direito eleitoral é “o lugar de residência ou moradia do requerente, e, verificado ter o alistando mais de uma,
considerar-se-á domicilio qualquer delas”[7]
Sem que a pessoa seja filiado a algum partido político, impossível será sua eleição para qualquer função eletiva, pois no sistema eleitoral brasileiro
não existe a figura da candidatura avulsa, feita pelo próprio cidadão, sem a sua inscrição partidária. Essa vinculação [cidadão/partido político] ficou
ainda mais reforçada a partir do julgamento feito pelo Supremo Tribunal Federal, dos Mandados de Segurança 22.602/DF, 22.603/DF e 22.604/DF,
impetrado pelos partidos da Social Democracia Brasileira – PSDB, Popular Socialista – PPS, e Democratas – DEM, onde ficou ratificado o caráter
eminentemente partidário do sistema proporcional.
Com essa decisão, criou-se, ao nosso entender, por via oblíqua, mais uma hipótese de perda de mandato parlamentar, agora por infidelidade
partidária, possibilidade que não estava prevista no art. 55 da Constituição Federal de 1988, que trata do tema. Vejamos o que disse a respeito o
Ministro EROS GRAU, do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Mandado de Segurança 22.602/DF:
“[...] o princípio da fidelidade partidária deixou de existir, foi suprimido da Constituição. A vigente Constituição do Brasil não o adotou. O Poder
Constituinte poderia tê-lo reinstalado em nossa ordem constitucional, para o que bastaria ter inserido essa hipótese entre as causas de perda de
mandato enunciadas no artigo 55. Mas não o fez. Entre nós, nos termos da Constituição vigente, a vinculação a um partido político é somente
condição de elegibilidade (artigo 14, § 3º); não é condição para que o deputado permaneça no exercício do seu mandato. Vou repetir: a vinculação a
um partido político não é condição para que o deputado permaneça no exercício do seu mandato. A Constituição estabelece que a vinculação a um
partido político é condição de elegibilidade (artigo 14, § 3º); nada mais. Apontem-me onde está nela afirmando o contrário.”
Mesmo assim ficou assentado pelos ministros da Suprema Corte que o Tribunal Superior Eleitoral havia interpretado corretamente a Constituição ao
responder à Consulta nº 1398/DF, feita pelo PFL, hoje Democratas, sobre a quem pertenceria os mandatos parlamentares no caso de cancelamento
de filiação ou de transferência do candidato eleito por um partido para outra legenda.
Seguindo o voto do relator, ministro ASFOR ROCHA, do Tribunal Superior Eleitoral, prevaleceu o entendimento de que:
“[...] Os partidos políticos e as coligações conservam o direito à vaga obtida pelo sistema eleitoral proporcional, quando houver pedido de
cancelamento de filiação ou de transferência do candidato eleitor por um partido para outra legenda.”
Por fim, nesse elenco de condições de elegibilidade está a idade mínima para o cargo que se pleiteia. Assim, de acordo com o art. 14, § 3º, inciso VI
da Constituição Federal, é condição para que o indivíduo possa ser eleito a idade mínima de: trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente
da República e Senador; trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal; vinte e um anos para Deputado Federal,
Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz.
Vencidas essas condições, para que uma pessoa possa receber a chancela autorizativa para concorrer a qualquer cargo eletivo, é preciso não
incorrer em qualquer das causas das causas de inelegibilidade, que, para COSTA (1998, p.145) “é o estado jurídico de ausência ou perda da
elegibilidade.
Também no dizer de TÁVORA NIESS (1994, p.5):
“[...] a inelegibilidade consiste no obstáculo posto pela Constituição Federal ou por lei complementar ao exercício da cidadania passiva, por certas
pessoas, em razão de sua condição ou em face de certas circunstâncias. É a negação do direito de ser representante do povo no Poder.”
Conclui-se, resumindo, que elegível será aquele que preencher os requisitos previstos pela Constituição e pela legislação infraconstitucional, e, ao
mesmo tempo, não ter em relação a si fato que a Constituição, ou a Lei Complementar, estabeleça como impeditivo à candidatura.
Para DECOMAIN (2004, p.11), segundo jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral
“[...] as condições de elegibilidade devem estar todas presentes no momento do registro da candidatura. Da mesma forma, é nesse momento que
devem estar ausentes todas e quaisquer causas de inelegibilidade. É irrelevante que a causa de inelegibilidade venha a desaparecer até a data das
eleições. De acordo com o posicionamento da mais elevada Corte Eleitoral, se a causa ainda estiver operando ao término do prazo para formulação
do pedido de registro das candidaturas, previsto em lei, o registro pleiteado há que ser indeferido”.
1.3 Inelegibilidades previstas na Constituição Federal de 1988
A Constituição estabelece em seu art. 14, §4º:
“Art. 14. (...)
§4. São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos.”
Inalistáveis, na lição de DECOMAIN (2004, p.53), são aqueles que não podem alistar-se eleitores, na forma do art. 42 do Código Eleitoral[8]. Mas é a
própria Constituição que define quem são os inalistáveis, no §2º, do art. 14, que assim diz:
“Art. 14. (...)
§2º. Não podem alistar-se como eleitores os estrangeiros e, durante o período do serviço militar obrigatório, os conscritos.”
Desse modo, os estrangeiros não podem alistar-se como eleitores por lhes faltar o pleno gozo dos direitos políticos, por ser privativo de brasileiro.
Como não são alistáveis, também são inelegíveis. O mesmo acontece os conscritos, aqueles que estão a prestar serviço militar obrigatório, e com os
menores de 16 anos, por ser proibido a estes o alistamento eleitoral. Também os analfabetos são considerados inelegíveis, como já demonstrado
pela leitura do § 4º, do art. 14, da Constituição Federal.
1.4 Inelegibilidades previstas na Lei Complementar nº 64/90
A Lei Complementar 64/90 atende, pelo menos em parte, ao que determina a Constituição, que atribui a essa espécie normativa estabelecer outros
casos de inelegibilidade.
“Art.14. (...)
§ 9º. Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a normalidade e legitimidade das
eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”.
Em 1994, com a Emenda Constitucional de Revisão nº 4, o texto original passou por significativa alteração, passando a atual redação:
“Art.14 (...)
§ 9º. Lei Complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger A PROBIDADE
ADMINISTRATIVA, A MORALIDADE PARA O EXERCÍCIO DO MANDATO, CONSIDERADA A VIDA PREGRESSA DO CANDIDATO, e a
normalidade e a legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na
administração direta e indireta.” (grifo nosso)
Como visto, essa Emenda Constitucional acrescentou o principio constitucional da vida pregressa do candidato, o que levou alguns juristas a
entender que isso também constituiria em mais hipóteses de inelegibilidades. É o que pensa SILVA (2007, p.388):
“[...] As inelegibilidades têm por objetivo proteger a probidade administrativa, a normalidade para o exercício do mandato, considerada a vida
pregressa do candidato, e a normalidade e a legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função,
cargo ou emprego na administração direta ou indireta (art.14, § 9º). Entenda-se que a cláusula “contra a influência do poder econômico ou o abuso
do exercício de função...” só se refere à normalidade e à legitimidade das eleições. Isso quer dizer que “a probidade administrativa” e “a moralidade
para o exercício do mandato” são valores autônomos em relação àquela cláusula; não são protegidos contra a influência do poder econômico ou
abuso de função etc., mas como valores em si mesmos dignos de proteção, porque a improbidade e imoralidade, aí, conspurcam só por si a lisura do
processo eleitoral”.
Igualmente, é o que também conclui o Ministro José Delgado, do Tribunal Superior Eleitoral, em julgamento do Recurso Ordinário nº 1133/RJ, cujos
trechos transcrevemos:
“[...] O art. 14, § 9º, da CF, deve ser interpretado como contendo eficácia de execução auto-aplicável com o propósito de que seja protegida a
probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerando-se a vida pregressa do candidato. [...] A autorização constitucional
para que Lei Complementar estabelecesse outros casos de inelegibilidade impõe uma condição de natureza absoluta: a de que fosse considerada a
vida pregressa do candidato. Isto posto, determinou, expressamente, que candidato que tenha sua vida pregressa maculada não pode concorrer às
eleições.”
Mesmo assim, o artigo 1º da Lei Complementar 64/90 ainda não traz essas hipóteses de inelegibilidade autorizadas pela Emenda Constitucional de
Revisão nº 4/94, circunscrevendo-se àquelas já previstas desde a sua elaboração.
A Lei adota uma técnica complexa e exaustiva, exigindo remissões que trazem dificuldades de leitura. Mas no seu primeiro artigo, verifica-se, de
inicio, a repetição de hipóteses já previstas na Constituição Federal, a exemplo dos inalistáveis, dos analfabetos, dos militares e de algumas pessoas
motivados por questões de parentesco.
Além dessas, outras hipóteses são trazidas no texto apontando para diversas situações, considerando inelegíveis, aqueles que tiverem perdidos seus
respectivos mandatos por infringência a mandamentos constitucionais e legais; os que tiverem representações julgada procedente pela justiça
eleitoral; os que forem condenados criminalmente; os que tiverem rejeitadas suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas e os
que tenham sido beneficiados ou beneficiados a terceiros quando detentores de cargos públicos.
O objetivo desses impedimentos é conferir um caráter mais igualitário entre os disputantes, retirando-se do jogo eleitoral aqueles que já tenham
incorrido em comportamentos incompatíveis com a representatividade pública.
E toda essa preocupação com a lisura do processo eleitoral encontra justificativa na necessidade de se coibir comportamentos que possam alterar a
igualdade da disputa, ou macular a sua idéia original, que é de proteger a normalidade e legitimidade das eleições. Para MELLO (2007, p.31), ao
citar pensamento de Montesquieu, na sua obra “O Espírito das Leis,
“[...] é uma experiência eterna a de que todo homem que tem poder tende a abusar dele; ele vai até onde encontra limites. Quem o diria! a própria
virtude tem necessidade de limites. Para que não se possa abusar do poder é preciso que, pela disposição das coisas, o poder detenha o poder”.
Apesar dos objetivos da Lei Complementar em se afastar do processo eleitoral pretensos candidatos cujas participações poderiam interferir na lisura
das eleições, ao mesmo tempo, mantém em seus dispositivos a observância do trânsito em julgado como pressuposto para a condição de
inelegibilidade, sendo este um forte ponto de dissenso doutrinário.
Mas, para o relator do Projeto que originou nessa Lei Complementar, a inclusão do respeito ao trânsito em julgado não se deu por garantia à
presunção de inocência, mas devido à preservação e manutenção de interesses pessoais e políticos. Disse o ex-deputado federal Ney Lopes.[9]
“Fui relator na Câmara dos Deputados da LC 64/90. Conheço os bastidores da negociação política, que resultou na aprovação do texto. As maiores
pressões ocorreram na caracterização daqueles que seriam inelegíveis .[...] O fundamento era de que o princípio constitucional da “moralidade” da
administração pública impunha o afastamento do pleito, daqueles que tivessem contra si pelo menos uma condenação judicial civil ou penal,
independente do trânsito em julgado. O indício, a presunção, o início da prova documental, com a chancela do julgamento judicial, justificariam por si
só a inelegibilidade, no resguardo da “coisa pública. [...] Depois de muita discussão, aproximou-se um acordo partidário para votação da LC 64. De
última hora, já com a matéria em processo de votação, surge a pressão de um grupo parlamentar influente (prefiro não citar nomes), exigindo a
inclusão no artigo 1°, letra e da exigência do “trânsito em julgado” e a limitação da “condenação criminal” (excluiu a civil). O objetivo era proteger
quem estivesse condenado, sem o trânsito em julgado, mesmo que já tivesse percorrido mais de uma instância. A saída política obtida durante o
processo de votação foi o acordo para a inclusão do parágrafo único do artigo 7°.
Ainda segundo ele, já que a inclusão da exigência do trânsito em julgado era fato consumado, negociou-se, em contrapartida, a inclusão de um
parágrafo único, ao artigo 7º do Projeto de Lei Complementar, em que se atribuía genericamente ao Juiz Eleitoral a livre apreciação da prova, para aí
tornar possível a avaliação da vida pregressa dos candidatos, em função do interesse público e da moralidade coletiva[10], o que, de fato, ainda não
acontece. Dizem os artigos citados:
“Art.1º São inelegíveis:
I – para qualquer cargo: [...]
e – os que forem condenados criminalmente, com sentença transitada em julgado, pela prática de crimes contra a economia popular, a fé pública,
a administração pública, o patrimônio público, o mercado financeiro, pelo tráfico de entorpecentes e por crimes eleitorais, pelo prazo de 3 (três) anos,
após o cumprimento da pena.(grifos propositais)
Art.7º. [...]
Parágrafo único – O Juiz, ou Tribunal, formará sua convicção pela livre apreciação da prova, atendendo aos fatos e às circunstâncias
constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes, mencionando, na decisão, os que motivaram seu convencimento”. (grifos propositais)
Também seguindo essa linha, o artigo 23 da Lei Complementar 64/90 deixa ainda mais evidente essa opção, ao estabelecer:
“Art.23. O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando
para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.”
1.5 Elegibilidade X Inelegibilidade
A elegibilidade pode ser definida como o direito subjetivo de alguém ser candidato a algum cargo eletivo. Para isso necessita estar autorizado a
praticar atos de campanha, angariando para si votos dirigidos pelos eleitores. Somente atingem essa condição aqueles que preencherem as
condições exigidas para tanto.
Para MORAES (2007, p.216) “elegibilidade é a capacidade eleitoral passiva consistente na possibilidade de o cidadão pleitear determinados
mandatos políticos, mediante eleição popular, desde que preenchidos antes os requisitos.”
É o que também diz o Código Eleitoral, em seu artigo 3º
“Art.3º. Qualquer cidadão pode pretender investidura em cargo eletivo, respeitadas as condições constitucionais e legais de elegibilidade e
incompatibilidade.”
Como visto, a regra é a elegibilidade, sendo exceção a inelegibilidade. Para ser elegível é necessário, além das condições previstas na Constituição
Federal[11], as exigências infraconstitucionais da indicação por convenção partidária, filiação no prazo necessário para concorrer, obediência ao
prazo de transferência de domicilio eleitoral, residência mínima, dentre outras.
Para COSTA (1998, p.152) a elegibilidade não é algo definitivo no tempo, ocupando um lugar individualizado, em determinado espaço, envolvendo
uma pessoa específica. Diz ele:
“[...] A elegibilidade é o direito de ser votado. Mas tal direito não é um estado jurídico constante no tempo, ininterrupto, como uma qualidade
personalista agregada à vida do nacional. De maneira alguma. O direito de ser votado é sempre o direito de se candidatar em determinada eleição,
após a obtenção do registro de sua candidatura. Obtido o registro, nasce o direito subjetivo de ser votado, exercido durante todo o processo eleitoral,
até a apuração. Encerrada a eleição, consumiu-se tal direito, deixando de existir. Para os vencedores, nascem outros direitos (à diplomação, à posse,
ao exercício do mandato, etc,), mas não há mais falar-se em elegibilidade, Mesmo o candidato vitorioso terá que, na eleição seguinte, preencher as
condições de elegibilidade, se registrar de novo, para nascer um novo direito de ser candidato, ao mesmo ou a outro cargo público.”
Já a inelegibilidade, que é a perda do direito de ser candidato a algum cargo eletivo, pode ocorrer tanto como conseqüência de uma sanção, como
também por prevenção, ao se afastar do pleito aqueles cuja participação pode interferir negativamente no equilíbrio da disputa, ou na lisura do
processo eleitoral.
Em verdade, o que a inelegibilidade procura alcançar é uma conotação ética à disputa eleitoral. Mas essa busca não é recente, estando presente em
quase todos os textos constitucionais, desde a Constituição de 1824, que no seu artigo 95 previa que todos aqueles que fossem eleitores podiam ser
nomeados deputados, excetuando-se os que não tivessem quatrocentos mil réis de renda líquida, os estrangeiros naturalizados e os que não
professassem a religião católica.[12]
Já na Constituição de 1891, para ser considerado elegível o candidato eleitor precisava estar na posse dos direitos de cidadão, ser eleitor e caso
desejasse disputar vaga na Câmara dos Deputados era necessário ter mais de quatro anos de cidadão brasileiro, e para o Senado, mais de seis
anos.[13]
Mas em 1934, no seu art. 3º, § 7º, da Constituição, nas Disposições Transitórias, todas as inelegibilidades previstas anteriormente e aqueles
requisitos especiais deixaram de prevalecer, ficando apenas exigida a qualidade de brasileiro nato e gozo dos direitos políticos.[14]
De modo diferente da anterior, a Constituição Federal de 1946, nos artigos 138 a 140, trouxe diversas hipóteses de inelegibilidade, envolvendo desde
os inalistáveis até os analfabetos, passando por aqueles que não soubessem exprimir-se na língua nacional e os que tivessem sido privados dos
seus direitos políticos. Foi essa Carta que primeiro fez referência aos impedimentos decorrentes do exercício de cargos públicos, ao tornar inelegíveis
o Presidente, o Vice-Presidente da República, Governadores, Ministros do Supremo Tribunal Federal, Procurador Geral da República, Secretários
Estaduais, Prefeitos, Magistrados, dentre outros, que tivessem exercidos o cargo, em períodos anteriores ao pleito, variando o prazo a depender do
cargo ocupado.[15]
Também por esta Carta foram considerados inelegíveis, pela primeira vez na ordem Constitucional, o cônjuge e os parentes, consangüíneos ou afins,
até o terceiro grau, do Presidente, do Vice-Presidente, do Governador e do Prefeito, fazendo surgir a inelegibilidade decorrente do parentesco.[16]
Na Constituição Federal de 1967, no seu artigo 151, ao invés de prescrições relativas ao tema, preferiu o legislador estabelecer hipóteses de perda
da condição de elegibilidade, a partir de referências genéricas ao abuso dos direitos políticos e individuais, a violações contra a ordem democrática e
pela prática de atos de corrupção, onde aquele que incorresse nessas situações ficaria afastado do processo eleitoral pelo prazo de dois a dez anos,
a ser declarada pelo Supremo Tribunal Federal, a partir de representação do Procurador-Geral da República.[17]
Finalmente, foi com a Constituição Federal de 1988 que a inelegibilidade tomou a forma como hoje a conhecemos, onde encontram-se previstas em
seu texto algumas das suas hipóteses, sendo complementadas por outras estabelecidas em Lei Complementar.
1.6. Registro de candidatura
“Registrar a candidatura significa habilitar-se o cidadão para ser votado por ocasião da escolha dos ocupantes de funções eletivas” (PINTO, 2008,
p.172). É através do registro que nasce a possibilidade de alguém receber votos numa eleição, habilitando-se a ocupar uma função pública
decorrente de um mandato eletivo.
Quando do seu pedido à Justiça Eleitoral, após ter sido escolhido em convenção partidária, o pretenso candidato deve preencher todas as condições
de elegibilidade para o cargo ao qual deseja concorrer, e não incorrer em qualquer das hipóteses de inelegibilidade, seja por sanção ou prevenção.
Assim, deve o pedido estar instruído de todos os documentos discriminados pela legislação: cópia da ata da convenção partidária, da autorização
expressa do candidato, da prova da filiação partidária, da sua declaração de bens, da cópia do título eleitoral, de certidão de quitação eleitoral, de
certidões criminais e de uma fotografia do candidato.[18]
Curiosamente, a prova da idade mínima exigida constitucionalmente[19] não necessita ser comprovada no ato do pedido de registro, devido ao que
estabelece o §2º, do inciso VIII, do art. 11, da Lei 9.504/97[20], em que somente na data da posse tal condição seria verificada.
“[...]
§2º. A idade mínima constitucionalmente estabelecida como condição de elegibilidade é verificada tendo por referência a data da posse.”
Tal concessão não poderia existir. Se a Constituição Federal estabeleceu a idade mínima como uma das condições de elegibilidade é porque assim o
quis, deixando clara essa pretensão. Assim, não poderia uma lei ordinária alterar o seu texto a ponto de afastar uma determinação expressamente
estabelecida.
Da simples leitura do §2º, do inciso VIII, do art. 11, da Lei 9.504/97 pode se perceber a incompatibilidade com o texto constitucional, quando afirma
que a idade mínima é uma condição de elegibilidade. Ora, se é condição, precisa ser aferida no momento em que se pede o registro de candidatura,
e não depois, na posse, pois aquele é o momento apropriado para se verificar o preenchimento de todas as exigências que poderão resultar no
deferimento ou não daquele pedido.
Quem não possui o registro de candidatura não pode sequer receber votos numa eleição, pois para isso acontecer é necessário preencher todas as
condições de elegibilidade e não incorrer em qualquer das hipóteses de inelegibilidade, e a idade mínima, ao lado das demais, é pressuposto que ao
ser atendido, permite a participação do candidato a candidato no pleito eleitoral.
Se a idade mínima fosse aferida apenas no momento da posse toda a lógica constitucional estaria sendo desprezada, já que estaria permitindo a
participação de pessoas em um processo eleitoral sem que tivessem preenchidas as condições de elegibilidade, o que é absurdo. Ainda mais quando
imaginamos os que não conseguirão ser eleitos, e, portanto, não terão a idade aferida no momento da posse, tendo eles participados de uma disputa
sem o atendimento de um requisito essencial para tanto.
E é preciso atender ao que a Constituição estabelece. Se em seu texto há expressa referência à idade mínima como pressuposto para a
elegibilidade, é porque o constituinte assim o quis, deixando estabelecida essa vontade. E quando isso acontece não pode uma lei infraconstitucional
mudar aquilo que já foi dito, nem tampouco fazer incluir determinação não prevista anteriormente, pois faz parte do consenso doutrinário não haver
palavras obsoletas ou desnecessárias em seu texto. Quando isso ocorre estamos diante de uma mutação constitucional inconstitucional.
Para COSTA “quem não possui o registro de candidatura é inelegível, sendo nulos os votos assim obtidos”[21].Tal posição merece repreenda. Na
verdade, quem não teve deferido o registro de candidatura deixou de preencher uma das condições de elegibilidade, que é diferente de
inelegibilidade, que é uma condição particular envolvendo determinadas situações.
Ainda nesse tema, CÂNDIDO (2004, p.97) afirma:
“[...]o registro dos candidatos se constitui em etapa jurisdicional dentro da fase preparatória do processo eleitoral. Registrados, os candidatos
assumem essa condição em caráter oficial, terminando aqui o que politicamente se convencionou chamar de “candidato a candidato”. Antes do
registro e após as convenções já se pode falar em candidato, de vez que o Partido já definiu com quem concorrer, mas a condição de candidato
oficial só se adquire com o deferimento do registro.”
Já para o eleitoralista baiano ISMERIM (2002. p.35) a candidatura surge no momento da convenção partidária. Vejamos:
“[...] a candidatura dos concorrentes a cargos eletivos nasce no instante em que se nome é escolhido em convenção, pelo partido ao qual é o mesmo
filiado, e somente os elegíveis possuem o direito de registrar a candidatura, exigindo-se condições legais para a efetivação do registro. Inocorrendo
qualquer uma das condições exigidas em lei inexiste o direito de registro, e, em assim sendo, não possui o direito de candidatar-se, pois ausentes os
requisitos de elegibilidade.”
Também não há como concordar com esse pensamento do eleitoralista baiano, visto que a simples escolha em convenção partidária não faz surgir o
vinculo jurídico necessário ao surgimento de qualquer candidatura, traduzindo em simples manifestação dos seus filiados em torno de uma pessoa. O
fato que realmente vai fazer surgir a candidatura é o deferimento do registro pela Justiça Eleitoral, momento em que todas as condições de
elegibilidade (menos a idade mínima) e as hipóteses de inelegibilidades são verificadas.
Somente a partir do deferimento do registro é que o candidato poderá efetivamente participar do processo eleitoral, pedir votos ao eleitorado, divulgar
e esclarecer suas idéias no horário eleitoral, receber doações, promover atos públicos, participar de debates promovidos com outros candidatos,
ingressar com ações eleitorais, dentre outras situações que não poderão ser realizadas por aquele que mesmo tendo sido escolhido em convenção
de seu partido, ainda não teve o seu registro concedido pela Justiça Eleitoral.
Se ocorresse de modo diferente, estar-se-ia concedendo às convenções partidárias um poder que a legislação eleitoral não a atribuiu, qual seja a de
deferir registros de candidaturas. E não é isso que deixa transparecer os textos legais. Em todas as passagens há a expressa referência à palavra
“escolha”[22] dos candidatos pela convenção, deixando a entender não se tratar de um ato jurídico autorizativo de uma candidatura, mas, tão
somente, de uma manifestação posição político-partidária favorável a uma determinada pessoa.
Entre escolher e registrar há uma inconteste separação. Enquanto aquela é resultado de uma posição política direcionada a uma pessoa, essa é
conseqüência jurídica de uma análise constitucional e legal voltada não ao interesse pessoal do pretenso candidato, mas da sociedade, que precisa
ter à sua disposição candidatos possuidores das condições jurídicas e morais, necessárias à representatividade dos interesses coletivos.
A partir desse raciocínio, de que o registro de candidatura é o momento apropriado à aferição das condições de elegibilidade e das hipóteses de
inelegibilidade, e diante da expressa determinação constitucional de se considerar a vida pregressa do candidato a fim de se proteger a probidade
administrativa e a moralidade pública, poderia um cidadão ter o seu pedido de registro negado pela Justiça Eleitoral por apresentar um histórico
incompatível com o cargo que deseja ocupar?
1.7 O caso Eurico Miranda
Questionamento semelhante a esse foi feito pelos membros do Tribunal Regional
Eleitoral do Rio de Janeiro, em 2006, diante do pedido de registro de Eurico Ângelo de Oliveira Miranda ao cargo de deputado federal pelo Partido
Progressista (PP), pelo fato de responder naquela época a oito ações penais (falsificação de documento público; evasão de divisas; ausência de
recolhimento de contribuição previdenciária; furto; injúria e difamação e lesão corporal), além de uma ação civil pública por improbidade
administrativa, o que resultou no indeferimento do pedido, por unanimidade, pela Corte Eleitoral Estadual, sob o argumento de que “o candidato
demonstra um perfil incompatível com o exercício do mandato.” [23]
Irresignado com a decisão que indeferiu o pedido de registro de sua candidatura, Eurico Miranda interpôs Recurso Ordinário[24] no Tribunal Superior
Eleitoral, ponderando que o Acórdão afrontaria o art.5º, XXXIX[25], LIV[26] e LVII[27], da Constituição Federal, por não ter havido sentença penal
condenatória com trânsito em julgado, não se podendo, pois, cogitar da incidência de inelegibilidade, devendo ser garantido a ele o princípio da
presunção de inocência.
O Ministro Carlos Ayres Brito, em seu voto contrário ao Recurso Ordinário 1069, do ex-deputado Eurico Miranda, assim se manifestou:
“[...] quanto ao mérito, permito-me lembrar que ele bem cabe na seguinte pergunta: pode um Tribunal Regional Eleitoral negar registro de candidatura
a cargo político-eletivo, sob o fundamento de estar o candidato a responder por um número tal de processos criminais que, de que parelha com
certos fatos públicos e notórios, caracteriza toda uma crônica de vida sinuosa, ao invés de retilínea? Todo um histórico de condutas profissionais,
políticas e sociais de permanente submissão a questionamentos morais e jurídicos? Um modo pessoal de ser e de agir aferrado à sempre
condenável idéia de que ‘os fins justificam os meios’?”
E foi mais adiante. Vejamos:
“[...] a decisão ensejadora do presente recurso ordinário podia inferir – como efetivamente inferiu – que o grande número de ações criminais a que
responde o recorrente faz parte de uma trajetória de vida que se marca por um deliberado dar às costas aos valores mais objetivamente prestigiados
pelo Direito e pela população brasileira em geral? Um se manter notoriamente à distância do que a sociedade tem, objetivamente, por ‘bons
costumes’? tudo a compor um quadro existencial ou vida pregressa não-rimada com a responsabilidade, autenticidade e moralidade que a mais
elementar razão exige para o exercício dos cargos de representação político-eletiva?”
A partir dessa indagação, o ministro Ayres Britto lança uma outra, que atinge o cerne da questão que envolveu o caso Eurico Miranda. Vamos a ela:
“[...] se afirmativa a resposta, isso já não significaria que o Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro estaria a assentar hipótese de inelegibilidade
nem prevista na Constituição nem na Lei Complementar nº 64/90? Ou, perguntando por outro viés: tal inferência não corresponderia a instituir
condição de elegibilidade não-cogitada pelo dispositivo constitucional especificamente versante do tema, que é, precisamente, o § 3º do art. 14[28]?
Nem pelo § 1º do art. 11 da Lei Federal nº 9.504/1997[29], também cognominada de ‘lei das eleições’?”
Para responder a essas indagações, Ayres Britto sugeriu a aplicação do método de interpretação “sistemático” ou “contextual.” Disse ele:
“[...] por esse método de compreensão das figuras de Direito o que importa para o intérprete é ler nas linhas e entrelinhas, não só desse ou daquele
dispositivo em particular, como também de toda a lei ou de todo o código de que faça parte o dispositivo interpretado. Logo, o que verdadeiramente
importa é fazer uma interpretação casada do texto-alvo ou do dispositivo-objeto e não apenas uma exegese solteira.”
Com base nessa recomendação, chamou a atenção para a necessidade de interpretar distintamente os direitos individuais e coletivos, dos sociais,
por pertencerem a estruturas jurídicas diferentes e a uma lógica particularizada. Vejamos o que disse:
“[...] está-se a lidar, portanto, com uma categoria de direitos subjetivos que se integram na lista dos direitos e garantias fundamentais. Porém –
ressalve-se -, gozando de perfil normativo próprio. Regime jurídico inconfundível com a silhueta normativa dos outros direitos e garantias também
rotulados como fundamentais, de que servem de amostra os direitos individuais e coletivos e os direitos sociais. O que já antecipa que o
particularizado regime jurídico de cada bloco ou categoria de direitos e garantias fundamentais obedece a uma lógica diferenciada. Tem a sua
peculiarizada ontologia e razão de ser.”
A meu ver, a idéia do Ministro Ayres Britto é defender a existência de princípios prevalecentes em determinados capítulos da Constituição Federal,
como o que acontece, por exemplo, no capitulo reservado aos direitos políticos. Neste, prevaleceriam os princípios da soberania popular e o da
democracia representativa, enquanto que no capítulo reservado aos direitos e deveres individuais e coletivos, teríamos como sobressalente o
principio da dignidade da pessoa humana.
Sobre os princípios da soberania popular e o da democracia representativa, asseverou:
“[...] dois geminados princípios que também deitam suas raízes no Estado liberal, porém com esta marcante diferença: não são as pessoas que se
servem imediatamente deles, princípios da soberania popular e da democracia representativa, mas eles é que são imediatamente servidos pelas
pessoas. Quero dizer: os titulares dos direitos políticos não exercem tais direitos para favorecer imediatamente a si mesmos, diferentemente, pois, do
que sucede com os titulares de direitos e garantias individuais e os titulares dos direitos sociais. Veja-se que, enquanto detentores dos direitos sociais
e dos direitos individuais e coletivos são imediatamente servidos com respectivo exercício, e só por defluência ou arrastamento é que resultam
servidos os princípios da valorização do trabalho e da dignidade da pessoa humana, o contrário se dá com o desfrute dos direitos políticos. Aqui, o
exercício de direitos não é para servir imediatamente a ninguém, mas para servir imediatamente a valores: os valores que consubstanciam,
justamente, nos proto-princípios da soberania popular e da democracia representativa.”
E justifica sua idéia, trazendo para a discussão trechos da Constituição Federal e da Lei nº 9.504/97:
“[...] Assim é que, ao arrolar as condições de elegibilidade (§ 3º do art. 14), a Constituição nem precisou dizer que a idoneidade moral era uma delas;
pois o fato é que a presença de tal requisito perpassa os poros todos dos numerosos dispositivos aqui citados. O que por certo inspirou o legislador
ordinário a embutir nas condições de registro de candidatura a cargo eletivo a juntada de "certidões criminais fornecidas pelos órgãos de distribuição
da Justiça Eleitoral" (inciso VI do art. 11 da Lei nº 9.504/97). Cabendo aos órgãos desse ramo do Poder Judiciário, também por certo, dizer se em
face da natureza e da quantidade de eventuais processos criminais contra o requerente, aliadamente a outros desabonadores fatos públicos e
notórios, fica suficientemente revelada uma ‘vida pregressa’ incompatível com a dignidade do cargo em disputa. Função integrativo-secundária
perfeitamente rimada com a índole da Justiça Eleitoral, de que serve como ilustração este dispositivo da Lei Complementar nº 64/90: ‘O Tribunal
formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para
circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público e a lisura eleitoral’” (art. 23, sem
os caracteres em negrito).
E ao final, conclui:
“Foi precisamente essa incomum folha corrida[30], associada a outros fatos públicos e notórios de objetiva reprovabilidade, que levou o egrégio
Tribunal Regional do Rio de Janeiro à negativa de registro da candidatura do recorrente. Parecendo-me que assim procedeu com razoabilidade,
considerada a âncora normativo-constitucional e também legal de que fez uso na decisão recorrida. Tudo de acordo com uma postura interpretativa
que busca efetivar a ineliminável função de que se dota o Direito para qualificar os costumes. Os eleitorais à frente. Julgo improcedente o recurso.”
Mas o Relator, Ministro Marcelo Ribeiro, em posição diametralmente oposta à do Ministro Ayres Britto, manifestou a sua opinião – que acabou
prevalecendo por apenas um voto de vantagem[31]. Entendeu ele que:
“[...] o acórdão recorrido contém um fundamento, com uma derivação, que é no sentido de que o art.14,§9º da CF/88 seria auto-aplicável. [...] Além
de haver Súmula deste Tribunal assentando não ser auto-aplicável este artigo (Súmula TSE nº13) o referido dispositivo expressamente começa
assentando que “Lei Complementar estabelecerá”. Não tenho a menor dúvida de que um artigo que diz “que a lei estabelecerá” não é auto-aplicável.
[...] a Lei Complementar que cuida das inelegibilidades, como sabemos, é a Lei Complementar nº 64/90 e não consta nesta lei dispositivo que permita
chegar à mesma conclusão da Corte Regional Eleitoral, a qual entendeu que a existência de ações penais em curso sem trânsito em julgado – e é
incontroverso que não há nenhum trânsito em julgado -, seria o suficiente a afastar a idoneidade moral do candidato, considerada a sua vida
pregressa. Essa tese é sustentada com base na autoplicabilidade do art. 14, § 9º da Constituição, que, evidentemente, não procede.”
E ao final, sentenciou:
“[...] assim, com esses fundamentos, dou provimento ao recurso ordinário para reformar o acórdão regional e deferir o registro de Eurico Ângelo de
Oliveira Miranda ao cargo de deputado federal.”
A partir dessa posição, o Tribunal Superior Eleitoral proveu o Recurso, que ficou estabelecido nos seguintes termos:
“ACÓRDÃO - RECURSO ORDINÁRIO 1.069 – CLASSE 27ª RIO DE JANEIRO[32]
Eleições 2006. Registro de candidatura. Deputado Federal. Inelegibilidade. Idoneidade moral. Art. 14, § 9º, da Constituição Federal. O art.14, §9º, da
Constituição não é auto-aplicável(súmula nº13 do Tribunal Superior Eleitoral). Na ausência de lei complementar estabelecendo os casos em que a
vida pregressa do candidato implicará inelegibilidade, não pode o julgado, sem se substituir ao legislador, defini-los. Recurso provido para deferir o
registro.”
Esse julgamento representou mais um capítulo de um tema que costuma rondar os Tribunais, principalmente em períodos eleitorais, e despertar em
setores da sociedade brasileira a discussão em torno da possibilidade de se negar o registro de pessoas que não tenham uma vida pautada na ética,
mesmo que ainda não tenham sido condenados pela justiça, em decisão irrecorrível.
Mesmo diante da decisão que deferiu o registro de candidatura ao ex-deputado Eurico Miranda pelo TSE, diversos Tribunais Regionais vinham
mantendo a posição de negar esses pedidos com base na consideração da vida pregressa do candidato.
Numa reportagem publicada no jornal O GLOBO[33], edição de 11 de maio de 2008, há a informação de que dos vinte e sete Tribunais Regionais
Eleitorais, dezessete tendiam a impugnar os pedidos de registro desses candidatos[34], o que demonstra a existência de importante controvérsia a
respeito do assunto, que é de índole eminentemente constitucional.
Diante da controvérsia existente entre o TSE e os Tribunais Regionais Eleitorais podemos afirmar que a Constituição Federal vem sendo interpretada
e aplicada eficazmente, de acordo com os objetivos que ela desejaria atingir?
A resposta não é fácil e certamente foi isso o que desejava obter a Associação dos Magistrados Brasileiros ao apresentar no Supremo Tribunal
Federal a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 144[35], que questionava o descumprimento da Constituição e exigências legais
incompatíveis com o seu texto.
II CONSTITUIÇÃO E SUPREMACIA CONSTITUCIONAL
Este capítulo visa a abordar a supremacia da Constituição, o caráter vinculante de suas normas e o papel do Supremo Tribunal Federal na busca
pela máxima eficácia dos seus dizeres, através da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental, principalmente naqueles casos onde
existam configuradas omissões legislativas ensejadoras de questionamentos quanto à aplicabilidade dos mandamentos constitucionais, como o que
vem acontecendo nas discussões envolvendo a análise da vida pregressa de candidatos como elemento de inelegibilidade.
2.1. O caráter vinculante e imperativo das normas constitucionais
Primeiro, é necessário recordar, a Constituição Federal ocupa lugar de destaque na estrutura jurídica de nosso país. Ela é a ordem suprema,
localizando-se no ápice da pirâmide imaginária de HANS KELSEN[36] e responsável por estabelecer a organização do Estado, os objetivos a
alcançar e os meios através dos quais os seus mandamentos deverão ser concretizados.
Com sua teoria do escalonamento da ordem jurídica[37], KELSEN imaginou o Direito dentro de um sistema de escalonamento hierarquizado de
normas jurídicas dispostas em planos diferentes, escalonadas em graus distintos, tendo a Constituição no seu ápice como fundamento supremo de
todas as demais normas jurídicas.
Mas não foi KELSEN quem estabeleceu essa distinção entre as normas, pois elas já existiam antes mesmo de sua teoria do escalonamento da
ordem jurídica. É o que esclarece a respeito, FERREIRA FILHO: “desde a Antiguidade já se constatava que, entre as leis, algumas há que organizam
o próprio Poder. São leis que fixam os seus órgãos, estabelecem as suas atribuições e seus limites, enfim, numa palavra, definem a sua
Constituição.”
No mesmo sentido, CUNHA JÚNIOR:
“[...] A noção de Constituição, pois, já existia entre os gregos e romanos, no domínio do pensamento filosófico e político. Aristóteles distinguia entre
uma categoria de normas que organizavam e fixavam os fundamentos do Estado (as normas de organização), e as normas comuns (as regras) que
eram elaboradas e interpretadas em consonância com as primeiras. Tal distinção, porém, somente veio a ser valorizada no século XVIII, a partir do
movimento denominado constitucionalismo, que surgiu, inicialmente, com o propósito de limitar o poder, afirmando a existência de leis que seriam a
ele anteriores e superiores. É daí em diante que a expressão Constituição passou a ser empregada para designar o corpo de normas que definem a
organização fundamental do Estado.”
Dessa idéia de supremacia da Constituição sobre as demais normas jurídicas resulta na constatação de que deva existir uma vinculação entre o que
foi estabelecido pela lei suprema e aquilo que será objeto de disciplina pelas leis infraconstitucionais, sob pena de ruptura e violação da ordem
constitucional.
Essa vinculação é necessária para que a idéia de supremacia constitucional continue a prevalecer na prática, sendo fundamento de todo o
ordenamento jurídico. Somente assim as suas prescrições poderão ser preservadas e os seus objetivos efetivamente alcançados.
Mas apesar da aparente clareza de sua superioridade normativa, a Constituição Federal não vem conseguindo impor totalmente a sua
imperatividade, devido principalmente interpretações equivocadas do seu texto e à falta de um velamento constitucional eficiente por parte do
Supremo Tribunal Federal, a quem cabe a sua guarda,[38]resultando na ineficácia de direitos e garantias essenciais ao cidadão e à sociedade.
Pensamento semelhante expressou o Ministro Celso de Mello, em seu voto, na ADI 293-MC:[39]
“[...] O poder absoluto exercido pelo Estado, sem quaisquer restrições e controles, inviabiliza, numa comunidade estatal concreta, a prática efetiva
das liberdades e o exercício dos direitos e garantias individuais ou coletivos. É preciso respeitar, de modo incondicional, os parâmetros de atuação
delineados no texto constitucional. Uma Constituição escrita não configura mera peça jurídica, nem é simples escritura de normatividade e nem pode
caracterizar um irrelevante acidente histórico na vida dos povos e das nações. Todos os atos estatais que repugnem a Constituição expõem-se à
censura jurídica dos Tribunais, especialmente porque são írritos, nulos e desvestidos de qualquer validade. A Constituição não pode submeter-se à
vontade dos poderes constituídos e nem ao império dos fatos e das circunstâncias. A supremacia de que ela se reveste – enquanto for respeitada –
constituirá a garantia mais efetiva de que os direitos e as liberdades não serão jamais ofendidos. Ao Supremo Tribunal Federal incumbe a tarefa,
magna e eminente, de velar por que essa realidade não seja desfigurada.”
A esse respeito, Ruy Barbosa, o maior de todos os baianos, ao comentar a Constituição Federal, na década de 30, já alertava para a questão da
imperatividade:
“[...] não há, numa Constituição, cláusulas a que se deva atribuir meramente o valor moral de conselhos, avisos ou lições. Todas têm força imperativa
de regras, ditadas pela soberania nacional ou popular aos seus órgãos.”[40]
E é por apresentar essa imperatividade que a Constituição Federal assume uma distinção frente às demais normas, como afirmou CUNHA JÚNIOR
(2006 ,págs.26,27):
“[...] na hipótese particular das normas constitucionais, a imperatividade assume uma feição peculiar, qual seja, a da sua supremacia em face às
demais normas do sistema jurídico. Assim, a Constituição, além de imperativa como toda norma jurídica, é particularmente suprema, ostentando
posição de proeminência em relação às demais normas, que a ela deverão se conformar, seja quanto ao modo de sua elaboração (conformação
formal), seja quanto à matéria de que tratam (conformação material)”
Infelizmente não é isso o que vem ocorrendo e por diversas vezes a imperatividade inerente à Constituição é afastada prevalecendo sobre ela teses
e justificativas doutrinárias que transformam a força normativa dos seus dizeres em simples prescrições, pedidos, conselhos ou sugestões
dependentes da vontade legislativa ordinária ou da sua aplicação pelos poderes de Estado.
Constituição não é isso. A idéia de que dentro de um ordenamento jurídico deva haver uma norma distinta das demais, as quais todas devem
fundamento para que sejam consideradas válidas, pressupõe a existência de uma imperatividade capaz de fazer sobrepor as suas vontades, às
vontades do legislador derivado, e não o contrário, pois assim restaria destruída toda a lógica de superioridade que deve haver num escalonamento
de normas, levando consigo o Estado Constitucional de Direito.
Diante dessa concepção não seria lógico imaginar um sistema onde a Constituição Federal para ser efetiva tivesse que depender da vontade de um
poder criado por ela – o poder derivado-, cujas competências estariam localizadas na capacidade de ajustar a Constituição, a partir de procedimentos
igualmente estabelecidos por ela. Seria o mesmo que imaginar um filho menor passando a gerir os próprios pais, estabelecendo condutas, proibindo
outras, fazendo prevalecer sua vontade em detrimento da dos seus genitores. Era a criatura sobrepondo-se ao seu criador.
Inaceitável isso. E o mesmo pode-se dizer com a Constituição em relação ao legislador ordinário. O poder, criado pela Constituição ao constituinte
derivado, para em seu nome agir na complementação dos seus dizeres, recebe, em contrapartida, uma limitação. Assim, diferentemente do que
acontece com o poder originário, que é ilimitado, o derivado sofre com a imposição de regras que limitam e condicionam a sua atuação à vontade
anteriormente expressa, para que assim possa ser preservado o fim a que se destina, principalmente com relação a princípios e cláusulas pétreas
constitucionais, verdadeiras balizas da sua concretização.
Sobre as cláusulas pétreas[41], aquelas protegidas pela condição de imutabilidade, que nem mesmo emenda constitucional pode lhe alterar o
objetivo, mantendo-se preservada a forma federativa de Estado, o voto direto, secreto, universal e periódico, a separação dos Poderes e os direitos e
garantias individuais, representam a superioridade da Constituição sobre a vontade do legislador ordinário demonstrando que há núcleo normativo a
ser protegido de modo a preservar o que foi constituído pelo poder originário.
Para BULOS (1999, pp.42-44), cláusulas pétreas “possuem supereficácia, ou seja, uma eficácia absoluta, pois contém uma força paralisante total de
toda a legislação que vier a contrariá-la, quer implícita, quer explicitamente. Daí serem insusceptíveis de reforma.”
Esse núcleo protegido não se limita apenas ao art. 60, III, §4º da Constituição Federal; ele se espraia por diversos outros igualmente importantes.
Mas quanto a isso não há grandes dissensos, pois a distinção entre o poder constituinte originário e o poder constituinte derivado leva a imaginar que
exista algum limite na atuação deste, que pode muito, mas não pode tudo.
Mas e na hipótese desse poder constituinte derivado não estiver sendo exercido em sua plenitude, a Constituição deixará de ser aplicada por falta de
norma regulamentadora? Entendo que não.
Para SILVA (1998, 101), referência nesse assunto, as normas constitucionais podem ser de três espécies: plena, contida e limitada.[42] Segundo o
próprio autor, as normas de eficácia plena
“[...] seriam aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituição, produzem, ou têm possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais,
relativamente aos interesses, comportamentos e situações, que o legislador constituinte, direta e normativamente, quis regular.”
Já as normas constitucionais de eficácia contida, por sua vez, seriam:
“[...] aquelas em que o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a determinada matéria, mas deixou margem à atuação
restritiva por parte da competência discricionária do poder público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais nelas
enunciados.”
Por fim, ainda seguindo sua classificação, as normas constitucionais de eficácia limitada seriam aquelas
“[...] através das quais o legislador constituinte traças esquemas gerais de estruturação e atribuições de órgãos, entidades ou institutos, para que o
legislador ordinário os estruture em definitivo, mediante lei.”
Dentro dessa classificação, alguns exemplos podem facilitar o seu entendimento. O §1º, do art.18, da Constituição Federal, seria um típico exemplo
de norma constitucional de eficácia plena, ao estabelecer que “Brasília é a capital federal”. A norma seria auto-suficiente, produzindo todos os seus
efeitos independentemente de qualquer regulamentação infraconstitucional.
Um exemplo de norma de eficácia contida seria a do art. 5º, inciso XIII, que estabelece ser “livre o exercício de qualquer trabalho, oficio ou profissão,
atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.” Isso, significa dizer, que somente após edição de lei é que será livre o seu exercício.
Ainda segundo a teoria de José Afonso da Silva, exemplo de norma de eficácia limitada poderia ser citada aquela que se refere à reserva para
pessoas portadoras de deficiência,[43]cujo texto remete à lei a reserva percentual nos cargos e empregos públicos.
Apesar de toda deferência doutrinária e jurisprudencial[44] á tese de José Afonso da Silva, não há como concordar com o que ela propõe,
principalmente no que se refere às normas ditas de eficácia limitada.
Tal discordância surge, primeiro, pelo fato de ter sido escrita em 1967, vinte e um anos antes da Constituição Federal de 1988, em um momento bem
distinto do atual, razão pela qual não se justifica a idolatria que é feita a ponto de sacralizar o seu conteúdo.
Segundo, por entender que as normas constitucionais desfrutam de uma eficácia natural pelo simples fato de serem constitucionais, não podendo ter
sua eficácia remetida à discricionariedade do legislador ordinário para que desfrutem de validade.
E na hipótese de não ser editada a lei, a norma constitucional estaria impossibilitada de ser aplicada? Novamente digo que não. Se assim fosse,
estaríamos afirmando que as normas constitucionais não se destinam à concretização de direitos e garantias essenciais a cidadãos, mas ao
legislador subalterno cujo poder ultrapassaria o próprio poder da Constituição, já que nas mãos dele estaria o poder de tornar a sua aplicação inviável
a partir de suas próprias omissões, ocasionais ou deliberadas.
É claro que tal entendimento não pode prevalecer sob pena de uma completa ruptura da organização constitucional inicialmente estabelecida,
subvertendo toda a lógica ao se permitir que a Magna Carta de um país estivesse mercê da vontade do legislador infraconstitucional.
Essa concepção precisa ser superada para que não se corra o risco de entregar a efetividade da norma constitucional aos devaneios dos
legisladores e governantes, sempre afeitos à defesa de seus próprios interesses, pouco ou quase nada se importando pelos interesses da grande
maioria dos brasileiros.
2.2 As omissões legislativas e o papel do STF na efetividade da Constituição
Felizmente novos ventos sopram em direção a uma maior efetividade da Constituição, que não pode ser vista como uma norma qualquer, mas sim
como a norma fundamental do ordenamento jurídico que todas as demais lhe devem total deferência, incluindo-se aí todos os poderes do Estado, por
meio de seus atos.
Essa busca por uma maior efetividade de suas normas é para que a partir da Constituição os direitos, garantias, permissões e proibições nela
inseridas possam de fato se tornar em prescrições concretas, dando-lhe vida, tornando efetivos os preceitos nela estabelecidos.
Nesse contexto, exerce papel preponderante o legislador ordinário a quem cabe a tarefa de suplementar a Constituição, e o Supremo Tribunal
Federal cuja função precípua é de guardá-la, isso entendido em seu sentido mais amplo, a fim de preservar os seus dizeres.
Para alcançar esse objetivo, pode se utilizar dos meios já existentes, como o que aconteceu em 1993 com questão envolvendo a aplicação do art.37,
VII, da Constituição Federal,[45]que trata do direito de greve dos servidores públicos. Enquanto o Superior Tribunal de Justiça manifestava-se pela
necessidade de se exercitar o direito de greve, mesmo diante da inexistência de lei ordinária regulamentando o direito, o Supremo Tribunal Federal
amarrava-se ao pensamento de que somente após a edição da lei é que seria possível o exercício do direito, mesmo sendo ele uma expressa
determinação constitucional.
No embate entre esses Tribunais destacou-se voto do Ministro Vicente Cernicchiaro, do Superior Tribunal de Justiça, que assim se pronunciou a
respeito:
“[...] A Constituição da República garante o direito de greve aos funcionários públicos, “nos limites definidos em lei complementar”(art.37,VII). Essa
legislação não poderá recusar a paralisação da atividade, essência da greve, universalmente reconhecida. Alem disso, são passados quatro anos de
vigência da Carta Política. O legislador mantém-se inerte. Esses dois dados conferem legalidade ao exercício do direito, observando-se,
analogicamente, princípios e leis existentes. Caso contrário, chegar-se-ia a um absurdo: a eficácia da Constituição depende de norma
hierarquicamente inferior.”[46]
Contrariamente ao Superior Tribunal de Justiça, em 1994, assim se manifestou o Ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal:
“[...] Direito de greve do servidor público civil. [...] prerrogativa jurídica assegurada pela Constituição (art. 37, VII) – impossibilidade de seu exercício
antes da edição de Lei Complementar.”[47]
Em 2007, a discussão foi novamente reiniciada chegando ao fim com o Mandado de Injunção impetrado pelo Sindicato dos Trabalhadores do Poder
Judiciário do Estado do Pará [48]com o objetivo de dar efetividade à norma inscrita no artigo 37, inciso VII, da Constituição Federal,[49]alegando que
a mora do Congresso Nacional em regulamentar o preceito constitucional relativo ao direito de greve no serviço público impede o seu exercício pela
categoria, após sucessivas declarações de ilegalidades por parte do Poder Judiciário, mesmo sendo essa uma expressa garantia constitucional.
Por conta disso, requereu ao Supremo Tribunal Federal o reconhecimento da omissão do Poder Legislativo e a conseqüente supressão da lacuna
existente, mediante a regulamentação do direito de greve no serviço público.
Em seu voto, o Ministro Eros Grau assentou que:
“[...] No MI n. 20 ficou assentado que a regra do inciso VII do art. 37 da Constituição do Brasil é provida de eficácia limitada. Vale dizer, sua
aplicabilidade depende da edição de ato legislativo, requisito indispensável à plena concreção do preceito constitucional. (...) Como observou o
Ministro Celso de Mello no MI n.20: “[...]essa situação de inércia do aparelho de Estado faz emergir, em favor do beneficiário do
comando constitucional, o direito de exigir uma atividade estatal devida pelo Poder Público, em ordem a evitar que a abstenção voluntária do Estado
frustre, a partir desse comportamento omissivo, a aplicabilidade e a efetividade do direito que lhe foi reconhecido pelo próprio texto da Lei
Fundamental. O Poder Legislativo, nesse contexto, está vinculado institucionalmente à concretização da atividade governamental que lhe foi imposta
pela Constituição, ainda que o efetivo desempenho dessa incumbência constitucional não esteja sujeito a prazos pré-fixados.”
E conclui, estabelecendo:
“Em face de tudo, conheço do presente mandado de injunção, para, reconhecendo a falta de norma regulamentadora do direito de greve no serviço
público, remover o obstáculo criado por essa omissão e, supletivamente, tornar viável o exercício do direito consagrado no artigo 37, VII da
Constituição do Brasil, nos termos do conjunto normativo enunciado neste voto.”
Com essa decisão, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que as omissões legislativas não devem triunfar, pois isso resultaria na ineficácia da
Constituição, devendo ser afastadas de pronto. O ministro Celso de Mello, nesse julgamento, manifestou-se afirmando
“[...] não mais se pode tolerar este estado de continuada e inaceitável inércia (do Congresso Nacional). A omissão, além de lesiva ao direito dos
servidores públicos civis, traduz um incompreensível sentimento de desapego pelo direito constitucional de greve.”
Em sentido complementar, o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, afirmou que
“[...] o Supremo agiu para suprir uma omissão do Legislativo, que deveria ter regulamentado o direito de greve no serviço público desde a
Constituição de 1988. Primeiro, o STF, mais uma vez, demonstra que a omissão do Congresso leva o Legislativo a se submeter ao crivo do
Judiciário. Aconteceu assim com a reforma política, acontece agora com o direito de greve. O segundo é que o Supremo tem o papel constitucional
de suprir as omissões legislativas quando elas encerram princípios fundamentais. E o direito de greve é um princípio fundamental.”
Nesse caso, o STF deu significativo passo para a preservação da Constituição, ao reconhecer que as omissões legislativas obstaculizam a eficácia
de direitos fundamentais, fazendo com que o direito não se realize em concreto.
Infelizmente, o mesmo não se viu no julgamento da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 144), proposta pela Associação
dos Magistrados Brasileiros – AMB, em que questionava a ausência de auto-aplicabilidade do artigo 14,§9º, da CF,[50]a exigência de trânsito em
julgado para o impedimento de candidaturas de cidadãos que respondem a processos judiciais e a incompatibilidade da alínea “g”[51] do inciso I, do
art. 1º da Lei Complementar 64/90, com o §9º do art. 14[52]
Tratava-se, portanto, da mesma omissão legislativa verificada no exercício do direito de greve anteriormente demonstrada. Mas o Supremo Tribunal
Federal, assumindo posição diferente da que já adotara, nos termos do voto-condutor do Ministro Celso de Mello, assim se posicionou:
“[...] ocorre, todavia, que não se pode, a pretexto de moralizar o processo eleitoral, desrespeitar a Lei Maior, sob pena de gerar grave insegurança
jurídica e o conseqüente retorno ao Estado autoritário. Com efeito, do exame do artigo 14, §9º, da CF, após alteração trazida pela ECR nº4/94,
verifica-se que tal dispositivo exige a presença de lei complementar para tratar de outros casos de inelegibilidades, além daqueles já existentes na
própria Constituição Federal. Cuida-se, portanto, de dispositivo constitucional que depende de regulamentação, não sendo auto-aplicável.
[...] desse modo, a pretensão do argüente torna-se descabida, haja vista que não pode o juiz substituir o legislador, editando uma resolução com
conteúdo diverso do disposto na lei complementar que cuida do mesmo assunto. Admitir-se essa possibiidade significaria o rompimento do principio
da separação dos poderes, consagrado no artigo 2º da CF/88.”
Assim, a partir dessa posição, vencidos os Ministros Carlos Ayres Britto e Joaquim Barbosa, foi julgada improcedente a Argüição de Descumprimento
de Preceito Fundamental 144, decisão essa dotada de efeito vinculante.
Sem antecipar a análise do mérito da questão trazida nessa ADPF,[53] perdeu o Supremo Tribunal Federal a oportunidade, provisória, é verdade, de
pacificar o tema envolvendo a vida pregressa de candidatos, que ainda é objeto de intensos debates, favoráveis e contrários ao estabelecimento de
regras específicas que tanto possam atender a necessidade de um maior rigor ético no deferimento de candidaturas, como também o de preservar
direitos e garantias constitucionais asseguradas, a exemplo do princípio da presunção de inocência.
E é com relação às omissões legislativas e o papel do Judiciário frente a essas omissões que se concentram as maiores discussões em encontros de
cortes constitucionais ao redor do mundo.[54]No Brasil, tem sido utilizado com freqüência o Mandado de Injunção[55]pelo Judiciário para resolver
problemas decorrentes da falta de norma regulamentadora, sendo também questionadas as omissões por meio de ações diretas de
inconstitucionalidade, declaratórias de constitucionalidade ou por meio da argüição de descumprimento de preceito fundamental.
Apesar de todo esse instrumental, há ações em que o Supremo Tribunal Federal declarou a omissão do Legislativo, mas que ainda continuam
pendentes de regulamentação. Foi o que aconteceu com o aviso prévio proporcional,[56]com a aposentadoria especial para servidores públicos
motivada por condições de insalubridade no trabalho e com a falta de lei complementar federal que disciplinaria a criação, incorporação, fusão e
desmembramento de municípios.[57]
A Carta Constitucional de 1988, nas competências atribuídas ao Supremo Tribunal Federal instituiu a competência para apreciar os casos de
omissão inconstitucional mediante instrumentos capazes de sanar o vácuo legislativo. Dentre esses instrumentos, destacamos a ação direta de
inconstitucionalidade por omissão e a ação de descumprimento de preceito fundamental – ADPF.
Em seu “Controle de Constitucionalidade – Teoria e Prática”, CUNHA JÚNIOR (2006, p.250), assim se manifesta a respeito da ADPF:
“[...] importa ressaltar que a argüição de descumprimento de preceito fundamental, para além de proteger a supremacia dos preceitos constitucionais
fundamentais em face da postura ativa lesiva do Estado, pode se tornar um potencial instrumento de controle das omissões do poder público, quando
a inércia dos órgãos públicos e administrativos do Estado infringirem algum preceito fundamental da Constituição”[58].
No caso específico da ADPF 144/DF, o objeto principal de discussão era a auto-aplicabilidade do §9º, do art. 14 da Constituição que fala sobre a vida
pregressa, um preceito fundamental, incluído expressamente no texto constitucional pela Emenda de Revisão nº 04/94 e que não é tornado efetivo
graças à omissão do legislativo que não atua de modo a atender as determinações da Carta Constitucional. E essa situação perdura há 15 anos!
Assim, numa situação de clara omissão legislativa, o Supremo Tribunal Federal, a quem cabe a guarda da Constituição e a defesa de sua eficácia,
poderia ter julgado a argüição de modo a determinar ao órgão político responsável suprir a omissão, e caso esse assim não agisse, ele mesmo [o
STF], poderia fazê-lo, utilizando-se os instrumentos de que já dispõe.
Não foi o que aconteceu e a questão da vida pregressa continua a rondar a cabeça da doutrina e dos tribunais brasileiros sem uma definição legal
que possa lhe dar a efetividade que os mandamentos constitucionais necessitam ter.
É uma situação que enfraquece completamente a ordem jurídica, inverte posições e submete a Constituição à condição de depender da vontade de
um legislador infraconstitucional, que é submisso a ela, para que suas normas sejam de fato eficazes.
Para esses casos de lacuna não basta a simples ciência ao Poder competente para adotar as providências necessárias [e esse é o limite da ação de
constitucionalidade por omissão], mas uma decisão cujo efeito principal seja resolver o vácuo existente de modo a sanar a lesão a preceito
fundamental.
É o que objetiva o art. 10 da Lei nº 9.882/99[59], caput:
“Art. 10. Julgada a ação, far-se-á comunicação às autoridades ou órgãos responsáveis pela prática dos atos questionados, fixando-se as condições e
o modo de interpretação e aplicação do preceito fundamental.”
Vê-se, a partir da leitura dessa Lei, que o Supremo Tribunal Federal detém os instrumentos necessários para tornar efetiva a Constituição a partir de
posições firmes em defesa de suas normas e dos seus preceitos. Sobre o assunto, o pensamento de CUNHA JÚNIOR (2006, p. 305, 306):
“[...] enfim, se as normas constitucionais em geral não mereceram a devida consideração e importância do Pretório Excelso, espera-se que os
preceitos constitucionais fundamentais valham uma mudança de tratamento e sensibilizem a Corte da magnitude e da necessidade de serem
efetivados. E se o maior óbice da acanhada posição do Supremo Tribunal Federal em relação à ação direta de inconstitucionalidade por omissão era
a literal disposição contida no §2º do art. 103, da Constituição Federal, relativamente à argüição de descumprimento por omissão esse empeço
deixou de existir. Daí se acreditar numa postura mais ativa do Supremo, na defesa dos valores mais fundamentais da ordem jurídica, sobre os quais
se assenta a própria identidade e concepção da Constituição.
[...] em suma, perante a argüição, terá o Supremo Tribunal Federal a oportunidade de ouro de explorar, à exaustão, todas as potencialidades do
novel instituto, para lhe conferir o status de meio realmente eficaz para deslindar, definitivamente, a gravíssima problemática das omissões do poder
público, que avilta a supremacia da Constituição, menospreza os direitos fundamentais e, de resto, atenta contra o Estado Constitucional Social
Democrático de Direito, retirando, dia a dia, o prestígio da Constituição brasileira e esvaecendo a crença, que ainda resta, de uma sociedade livre,
justa e solidária, onde o cidadão possa exercer a sua dignidade e viver com felicidade. É necessário, no entanto, que o Supremo proceda com
vontade de Constituição, despojando-se os preconceitos, libertando-se de arcaicos dogmas e enfrentando o novo com os olhos do moderno.”
2.3. Histórico da “vida pregressa”
Foi a Carta Federal de 1969[60] que estabeleceu a necessidade da análise da vida pregressa como pressuposto para a moralidade dos mandatos
eletivos.
“Art. 151. Lei complementar estabelecerá os casos de inelegibilidade e os prazos dentro dos quais cessará esta, visando a preservar: (...)
IV – a moralidade para o exercício do mandato, levada em consideração a vida pregressa do candidato”(grifo nosso)
Posteriormente, essa determinação sofreu alteração pela Emenda Constitucional nº 08/77, que deixou o referido artigo a seguinte redação:
“Art. 151. Lei complementar estabelecerá os casos de inelegibilidade e os prazos nos quais cessará esta, com vistas a preservar, considerada a vida
pregressa do candidato: (...)
II – a probidade administrativa; (...)
IV – a moralidade para o exercício do mandato.” (grifo nosso)
Atendendo ao que determinava o caput do art. 151 (“lei complementar estabelecerá) foi editada a Lei Complementar nº 05/70, que estabeleceu como
uma das hipóteses de inelegibilidade a instauração de processo judicial contra pretensos candidatos, em determinadas infrações penais. Vejamos:
“Art. 1º - São inelegíveis:
I – para qualquer cargo eletivo: (...)
n) os que tenham sido condenados ou respondam a processo judicial, instaurado por denúncia do Ministério Público recebida pela autoridade
judiciária competente, por crime contra a segurança nacional e a ordem política e social, a economia popular, a fé pública e a administração pública,
o patrimônio ou pelo delito previsto no art. 22 desta Lei Complementar, enquanto não absolvidos ou penalmente reabilitados.”
Bastava, então, o recebimento de uma denúncia pelo Ministério Público pelo cometimento de determinados ilícitos penais para que a inelegibilidade
se configurasse.
Essa situação provocou intensos debates no Tribunal Superior Eleitoral sobre a sua constitucionalidade, até que no julgamento do Respe 4.221/RS
[61] o Ministro Xavier de Albuquerque, em voto que prevaleceu, dissentiu da orientação jurisprudencial existente até então, resultando na declaração
de inconstitucionalidade do art. 1º, I, “n”, da Lei Complementar nº 05/70.[62] Sobre essa posição se manifestou o Relator:
“[...] por que admitir que o simples fato de pendência de um processo, com denúncia oferecida e recebida, pese indelevelmente sobre a moralidade
de alguém, a ponto de lhe acarretar o ônus brutal da inelegibilidade? Não posso admitir. E não posso admitir, porque estou lidando com princípios
eternos, universais, imanentes, que não precisam estar inscritos em Constituição nenhuma. Mas, por acaso, esse princípio, se não está expresso na
Constituição da República Federativa do Brasil, está inscrito, de modo o mais veemente e peremptório, na famosa ‘Declaração Universal dos Direitos
do Homem’, que é capítulo de uma inexistente, mas evidente Constituição de todos os povos. O Brasil contribuiu, com sua participação e voto, para
que a Terceira Assembléia Geral das Nações Unidas, há mais de 25 anos, aprovasse uma ‘Declaração Universal dos Direitos do Homem’, e essa
declaração insculpiu, no primeiro inciso do seu art. 11, esta regra de verdadeira Moral e do mais límpido Direito: ‘todo homem acusado de um ato
delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada, de acordo com a lei, em julgamento público, no
qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.”
Mas o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 86.297/SP reafirmou a validade constitucional do art. 1º, I, “n”, da Lei
Complementar nº 05/70, cujo voto-condutor do Ministro Thompson Flores colhemos os seus principais trechos.
Antes, porém, de adentrar no mérito da questão, cita o direito francês:
“[...] quero referir-me ao direito estrangeiro, especialmente ao francês. Na França, onde o art. 11 da citada Declaração dos Direitos do Homem foi
incorporado ao texto constitucional, no que pertine às causas de inelegibilidade, o rigor é maior. Assim, o falido não só não pode ser votado, mas até
perde o próprio direito político de votar.”
Em seguida, passa a analisar o mérito:
“[...] como acentuou o relatório, o Eg. Tribunal Superior Eleitoral, pelo voto de desempate de seu eminente Presidente, declarou a
inconstitucionalidade parcial do art. 1º, I, n, da Lei Complementar nº 05, de 29 de abril de 1970, invalidando as expressões: “ou respondam a
processo judicial, instaurado por denúncia do Ministério Público, recebida pela autoridade judiciária competente”, que estão na sua primeira parte, e
as palavras “absolvidos ou”, que estão na sua parte final.
[...] considero, assim, que, ao editar a Lei Complementar nº 05/70, e ao estatuir entre os casos de inelegibilidade, o do art. 1º, I, n, ora em debate, se
conteve o legislador na autorização constitucional. Não considerou ele qualquer infração penal, mas aquelas que, afetando a candidatos a cargos
eletivos, porque nelas envolvidos, pudessem comprometer o regime democrático (segurança nacional, ordem política e social, economia popular,
etc.), a probidade administrativa ou a moralidade para o exercício para o exercício do mandato (a fé pública, a administração pública e o patrimônio).
Demais, exigiu a instauração da ação penal: e foi além, por denúncia do Ministério Público; e, somente, após recebida.
[...] viu o aresto impugnado, no recebimento da denúncia, atentado à Constituição, porque anteciparia inculpação, sem sentença condenatória,
obstando o candidato de um dos direitos imanentes à cidadania, o de ser votado.”
Daí, marca sua posição a respeito do assunto:
“[...] seria, data vênia, confundir causa de inelegibilidade com presunção de culpabilidade, de conceituação jurídica diversa e com reflexos distintos.
Para o direito e o processo penal, onde vige o princípio in dúbio pro reo, certo não poderia valer qualquer presunção de culpabilidade antes da
sentença.
[...] Não se cuida aqui de dita presunção, mas de medida cautelar, preventiva, provisória, desrecomendando o sufrágio sobre aquele que está sendo
processado criminalmente por uma das infrações já referidas.
[...] Esperar pela sentença condenatória, se assim viesse a dispor a lei complementar, é possível que não estivesse prevenindo os princípios que a
Constituição, expressamente, no caput do art.151, determinou que o fizesse. É que os efeitos da condenação são outros e se projetam mais intensa
e profundamente sobre o réu, originando a perda ou a suspensão dos seus direitos políticos.
[...] aqui não se trata nem de perda, nem de suspensão dos direitos políticos, mas de um minus destes direitos, o de não ser elegível.
[...] assim, não teria por que exigir-se da Lei complementar, sob pena de inconstitucional, como quer o acórdão, sentença condenatória para o fim de
dar como inelegível o candidato.
[...] é na preservação desta ordem, que tem conteúdo político, que se justifica o sacrifício parcial do direito cívico...
[...] e é por isso mesmo que, em homenagem à preservação ou à preservação, se justifica, e sem afetar à Constituição, o sacrifício a direitos que ela
mesma procura assegurar.”
E sintetiza, afirmando que:
“[...] é possível que um rigor maior na seleção tenha importado no sacrifício de algum direito. Mas um bem maior, a Administração, a qual merece ser
preservada, o justifica. In casu, quis a Constituição que a lei complementar estabelecesse os casos de inelegibilidades. E a determinação visando
preservar os princípios da ordem jurídica. Dispondo como dispôs no preceito em discussão, não vejo que tenha transgredido da autorização ou, de
qualquer forma, se oposto à constituição.”
Finalizando seu voto, o ministro Thompson Flores sentencia:
“[...] o recorrido, prefeito que foi, está denunciado por crime de peculato cometido ao tempo que exercia tais funções. Suas contas não foram
aprovadas pelo Tribunal de Contas. O acórdão impugnado deferiu seu registro, admitiu potencialmente seu retorno à administração. Estaria
preservando um dos princípios impostos pela Constituição: a probidade administrativa? Ou sua vida pregressa ofereceria atributos de moralidade
para o exercício de novo mandato, como também impõe ela, quando no exercício anterior foi reconhecido o alcance com a venda de ações da
Petrobrás? Penso que não.
[...] com esta motivação, e, reportando-se, quanto ao mais, ao voto e parece transcritos, os quais examinaram a matéria à luz do direito estrangeiro,
especialmente italiano e francês, como já disse antes, concluo conhecendo do recurso e o provendo. É o meu voto.”
Trata-se, sem dúvida, de argumentos seguros esses manifestados pelo ministro Thompson Flores, que ao final sagrou-se vencedor no Supremo
Tribunal Federal, cumpre dizer, em 1976, numa época em que os problemas ainda se situavam dentro de um limite aceitável, situação bem diferente
da atual, onde a cada momento estouram novos e cada vez mais chocantes episódios de corrupção, fazendo-nos acreditar que a atividade política
tenha se transformado de vez numa trincheira para o cometimento de atos criminosos, sob o beneplácito de interpretações jurídicas cada vez mais
favoráveis à preservação de toda essa situação vivida.
Com o cotejamento dessas duas posições, do Ministro Xavier de Albuquerque, do TSE, e do Ministro Thompson Flores, do STF, pudemos perceber o
quanto o assunto é polêmico e como é capaz de proporcionar interpretações tão distintas mesmo diante dos mesmos dispositivos analisados.
Após o julgamento da questão pelo Supremo Tribunal Federal, em 1982 uma nova lei complementar, desta vez de número 42/82, mais uma vez
alteraria o art. 1º da Lei Complementar nº 05/70, passando a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 1º - São inelegíveis:
I – para qualquer cargo eletivo: (...)
n) os que tenham sido condenados por crime contra a segurança nacional e a ordem política e social, a economia popular, a fé pública, a
administração pública e o patrimônio, ou pelo delito previsto no art. 22 desta Lei Complementar, enquanto não penalmente reabilitados;”
Aplicando-se uma interpretação literal, chega-se inicialmente à conclusão que bastaria uma condenação judicial para que o candidato fosse
considerado inelegível, o que foi afastado ao se decidir o Recurso Extraordinário 99.069/BA, cujo relator, o Ministro Oscar Corrêa, entendeu que
mesmo a redação da alínea não prever expressamente a necessidade de trânsito em julgado, este deveria existir para a decretação da
inelegibilidade, não bastando, portanto, a mera prolação de uma sentença condenatória.[63]
Discordamos de tal posição, mas por dever ético e academicamente esperado devemos transcrever a fundamentação utilizada pelo douto Ministro
para justificar sua idéia a respeito do assunto:
“[...] há que preservar a moralidade, sem que, sob pretexto de defendê-la e resguardá-la, se firam os direitos do cidadão à ampla defesa, à prestação
jurisdicional, até a decisão definitiva, que o julgue, e condene, ou absolva. Não preserva a moralidade interpretação que considera condenado quem
não o foi, em decisão final irrecorrível. Pelo contrário: a ela se opõe, porque põe em risco a reputação de alguém, que se não pode dizer sujeito a
punição, pela prática de qualquer ilícito, senão depois de devida, regular e legalmente condenado por sentença de que não possa, legalmente,
recorrer.”
A situação é realmente complexa. Mas já há autores renomados discorrendo sobre esses temas, a exemplo de Djalma Pinto, que em obra recente
aborda a inclusão da consideração da vida pregressa no ordenamento jurídico brasileiro, como pressuposto à proteção da probidade e da moralidade
para o exercício de mandatos eletivos.
“[...] a vida pregressa compatível com a magnitude do mandato é um princípio expressamente consagrado no art. 14, § 9º, da Constituição. Exige o
texto constitucional especial proteção à probidade administrativa, à moralidade para o exercício do mandato, determinando sejam esses valores
resguardados pela sua relevância para o desempenho da representação popular. Recomendou de forma incisiva a Lei Maior fosse avaliada a vida
pregressa de todo e qualquer cidadão que se proponha exercer cargo eletivo”.[64]
Mas qual seria mesmo o significado da expressão “vida pregressa”? Novamente recorremos à obra de Djalma Pinto[65], que nos esclarece a
respeito:
“[...] o que se seria vida pregressa? É a vida analisada com base nas ações praticadas pelo indivíduo ao longo do seu existir. O exame da vida
pregressa consistiria na aferição de atos praticados, no presente e no passado, por determinada pessoa, tomando como parâmetro as condutas
anti-sociais e os tipos penais previstos na ordem jurídica a que subordinada. Não há, porém, nem deve haver definição legal de vida pregressa, da
mesma forma como não existe definição de ‘reputação ilibada’, ‘interesse público relevante’, ‘urgência’ para expedição de medida provisória etc.
Imagine-se a lei ou a Constituição se preocupando em definir reputação ilibada para fins de nomeação de Ministro do STF.
[...] há, nestes casos, conceitos fluidos, vagos, imprecisos que não podem ser relegados ou deixados sem aplicação sob o fundamento de que não
cuidou o legislador de sua definição. A ausência de definição tem por objetivo, justamente, não engessar o alcance da norma para facilitar a sua
aplicação. Constata-se, aqui, a chamada zona de certeza negativa que, conforme a melhor doutrina é tida como configurada quando não se sabe o
que seja algo, mas se tem absoluta certeza de que não seja.”
Permitam-me complementar a definição de Djalma Pinto sobre vida pregressa. Primeiro, há que se atentar para o fato de que o conceito empregado
à expressão é bem mais amplo do que costuma referir a doutrina brasileira, e a meu sentir, ela perpassa a simples análise da vida processual de um
candidato, atingindo todos os seus comportamentos passados e presentes, independentemente da existência ou não de ações judiciais.
Exemplificando: um notório traficante, que pretenda ser candidato a alguma cargo eletivo, mesmo não constando qualquer inquérito policial, nem
ações judiciais movidas contra ele, ainda assim, deveria ter o seu pedido indeferido, pois, sobre ele, recaem suspeições inconciliáveis com o
exercício de um mandato público representativo.
E não há que se falar em presunção de inocência, pois inocente ele não o é. Nessa situação hipotética, ele somente poderá ser considerado culpado
após o julgamento em que deverá ter assegurada a ampla defesa e o contraditório.
2.4 Vida pregressa como preceito fundamental
Tanto a Constituição como a Lei nº 9.882/99, que regulamentou o § 1º do art. 102 da CF/88[66], deixaram de conceituar o que vem a ser preceito
fundamental, cabendo à doutrina sua definição, e em última instância ao próprio Supremo Tribunal Federal, a quem compete o julgamento da
argüição de descumprimento de preceito fundamental.
A nível doutrinário colhemos a opinião de CUNHA JÚNIOR (2006, p.253), que conceitua preceito fundamental como
“[...] como toda norma constitucional – norma-princípio e norma-regra – que serve de fundamento básico de conformação e preservação da ordem
jurídica e política do Estado. São as normas que veiculam os valores supremos de uma sociedade, sem os quais a mesma tende a desagregar-se,
por lhe faltarem os pressupostos jurídicos e políticos essenciais. Enfim, é aquilo de mais relevante numa Constituição, aferível pela nota de sua
indispensabilidade. É o seu núcleo central, a sua alma, o seu espírito, um conjunto de elementos que lhe dão vida e identidade, sem o qual não há
falar em Constituição. É por essa razão que o constituinte deliberou por destinar aos preceitos fundamentais uma proteção especial, através de uma
ação também especial.”
Pois bem. A partir dessas explicações podemos incluir a vida pregressa no rol dos preceitos fundamentais? Entendo que sim. E essa posição decorre
da forma e dos objetivos que o legislador utilizou, ao fazer ingressar no texto constitucional a exigência da vida pregressa.
Esses objetivos são claramente absorvidos quando comparamos a redação anterior do §9º, do art. 14 da CF/88, com a atual, em que a vida
pregressa encontra-se presente. Vejamos o que dizia o texto original:
“§ 9º - Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a normalidade e legitimidade
das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.”
Após a Emenda Constitucional de Revisão nº 4, de 1994, passou o mesmo § 9º a contar com a seguinte redação:
“§ 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a
moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do
poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”. (grifo nosso)
Comparando os dois textos, vê-se, com clareza, a inclusão da consideração da vida pregressa do candidato como meio de se proteger a probidade
administrativa e a moralidade para o exercício dos mandatos eletivos.
Desse modo, há que se concordar com a idéia que a vida pregressa passou a fazer parte dos preceitos fundamentais, já que em última análise, sua
inclusão no texto constitucional constituiu-se num desdobramento dos princípios da probidade e da moralidade administrativa.
Portanto, se os preceitos fundamentais representam valores supremos de uma sociedade, sem os quais toda a estrutura normativa restaria
desagregada, é desnecessário afirmar a importância do cumprimento dos seus objetivos.
Apesar da clareza dessa necessidade, passados 15 anos da determinação constitucional, o legislador ordinário ainda não editou a lei que traria os
outros casos de inelegibilidade, tendo como meta a consideração da vida pregressa dos candidatos a cargos eletivos a fim de proteger os princípios
da moralidade e da probidade administrativa.
Com esse vácuo legislativo, o preceito constitucional da vida pregressa vem deixando de ser aplicado em sua inteireza, por se acreditar tratar-se de
uma norma de eficácia limitada, dependente de complementação. Assim, o máximo que ainda se consegue ver é a ocorrência de algumas decisões
esporádicas em alguns Tribunais Regionais Eleitorais pelo país afora, que mantém a posição de indeferir candidaturas de pessoas cuja vida
pregressa sejam incompatíveis com a função eletiva que se deseja concorrer.
Foi o que aconteceu no pedido de registro de candidatura de Eurico Ângelo de Oliveira Miranda ao cargo de deputado federal, pelo Estado do Rio de
Janeiro. Constatado na documentação apresentada uma extensa anotação de feitos criminais e cíveis, foi o pedido indeferido pela juíza Jacqueline
Lima Montenegro, do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, cujos argumentos principais utilizados para a negativa do pedido foram os
seguintes:
“[...] este dispositivo constitucional, que traz o valor superior da moralidade para o exercício do mandato, deve incidir imediatamente no cenário
jurídico e impõe-se seja integrado pelo intérprete, porquanto não há nenhum sentindo em que se espere a edição da lei complementar nele aludida,
relegando ao âmbito da imoralidade, em alguns casos, o deferimento do registro de candidatura, quando a norma constitucional é tão clara e efetiva
quanto aquilo que, desde 1994, pretende como diretriz para o nosso sistema eleitoral.
[...] a moralidade para o exercício do mandato lançando raízes na vida pregressa do candidato é finalidade constitucional trazida pelo legislador
constituinte a partir de 1994 e que deve revestir as condições daqueles que se pretendem fazer representantes da população e dos estados para
administrar, legislar, governar e, enfim, dirigir o futuro do país e o destino de seu povo.
[...] com base nisso, é importante frisar-se que a aferição dos fatos da vida pregressa para fins de juízo da moralidade para o exercício do mandato
não se confunde com o exame da culpa sobre as infrações penais contidas nas certidões do pretendente à candidatura.
[...]A vida pregressa a que alude a disposição constitucional, ditada para a esfera eleitoral, e que aqui se toma como fundamento necessário ao
deferimento do registro de candidatura, abarca a seu turno apenas a existência de anotações de infrações penais nas certidões do pretendente que,
a vista de sua natureza, plausibilidade e demais circunstâncias, acabam constituindo empecilhos ao juízo positivo de moralidade para o exercício do
mandato.
[...]Não podemos mais estar aqui, no que tange ao exame da vida pregressa para fins de registro de candidatura, a agir segundo as formas extremas:
ou tudo ao mar ou tudo a terra. Por vezes autorizando todo e qualquer registro de candidatura, ainda que presentes anotações criminais, com fulcro
no cômodo apanágio da inexistência de sentença condenatória com trânsito em julgado, e por outras se impedindo o registro unicamente com base
em qualquer anotação contrária ao pretendente.
[...]Não é possível mais aceitar que um pretendente a candidato apresente a este Tribunal e conseqüentemente a toda a população uma certidão
repleta de anotações criminais sem qualquer preocupação com esclarecimentos e documentos que possam enfraquecer ou infirmar cada uma delas
e nós, simplesmente, lançando mão impropriamente do princípio da não culpabilidade, que não se aplica ao caso, abrirmos as portas a essas
pessoas para que se apresentem assim ao eleitor como dignas de representá-los, com a chancela do TRE. Há que se mudar este estado de coisas.”
Inconformado com essa decisão[67], que foi referendada por unanimidade pelo TRE/RJ, Eurico Ângelo de Oliveira Miranda interpôs Recurso
Ordinário[68] junto ao Tribunal Superior Eleitoral, no qual alega ter havido afronta ao art. 5º, XXXIV[69], LIV[70] e LVII[71], da Constituição Federal e
o art. 1º, I, e, da Lei Complementar nº 64/90[72], posto não haver contra ele sentença penal condenatória com trânsito em julgado, desse modo
requerendo a aplicação da presunção da presunção de inocência (art.5º, LVII, da CF/88[73]).
O Relator, Ministro Marcelo Ribeiro, do Tribunal Superior Eleitoral, deu provimento ao recurso, justificando que o §9º do art. 14 da Constituição[74]
não é auto-aplicável e que a existência de ações penais em curso, sem o trânsito em julgado, não seria suficiente para afastar a idoneidade moral do
candidato. Vejamos:
“[...] O fundamento do acórdão recorrido é no sentido de que o art. 14, § 9º da Constituição, seria auto-aplicável, e diz o seguinte: Lei Complementar
estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade, para o exercício do
mandato, considerada a vida pregressa do candidato, a normalidade e legitimidade das eleições, contra a influência do abuso do poder econômico ou
abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração pública.
[...] Além de haver súmula deste Tribunal assentando a não-autoaplicabilidade deste artigo, ele começa dizendo que lei complementar estabelecerá.
E não tenho a menor dúvida de que um artigo que diz que a lei estabelecerá não é auto-aplicável, pois não é nos termos da lei que se faz uma
ressalva, e a lei complementar, todos sabemos, é a Lei Complementar nº 64/90, que não consta desta lei dispositivo que permita se chegar à mesma
conclusão que chegou o acórdão recorrido, que entende que a existência de ações penais incursas sem trânsito em julgado - e é tranqüilo que não
há nenhum trânsito em julgado -, que seria o suficiente a afastar a idoneidade moral do candidato, considerada a sua vida pregressa. E sustenta essa
tese com base na auto-aplicabilidade do art. 14, § 9º, da Constituição, que, evidentemente, não é auto-aplicável.”
Em sentido oposto, o Ministro Carlos Ayres Britto, julgando improcedente o recurso inicialmente indaga:
“[...] pode um Tribunal Regional Eleitoral negar registro de candidatura a cargo político-eletivo, sob o fundamento de estar o candidato a responder
por um número tal de processos criminais que, de parelha com certos fatos públicos e notórios, caracteriza toda uma crônica de vida sinuosa, ao
invés de retilínea? Todo um histórico de condutas profissionais, políticas e sociais de permanente submissão a questionamentos morais e jurídicos?
Um modo pessoal de ser e de agir aferrado à sempre condenável idéia de que "os fins justificam os meios"?
[...] Em diferentes palavras: a decisão ensejadora do presente recurso ordinário podia inferir - como efetivamente inferiu - que o grande número de
ações criminais a que responde o recorrente faz parte de uma trajetória de vida que se marca por um deliberado dar às costas aos valores mais
objetivamente prestigiados pelo Direito e pela população brasileira em geral? Um se manter notoriamente à distância do que a sociedade tem,
objetivamente, por "bons costumes"? Tudo a compor um quadro existencial ou vida pregressa não-rimada com a responsabilidade, autenticidade e
moralidade que a mais elementar razão exige para o exercício dos cargos de representação político-eletiva?
[...] Foi precisamente essa incomum folha corrida, associada a outros fatos públicos e notórios de objetiva reprovabilidade, que levou o egrégio
Tribunal Regional do Rio de Janeiro à negativa de registro da candidatura do recorrente. Parecendo-me que assim procedeu com razoabilidade,
considerada a âncora normativo-constitucional e também legal de que fez uso na decisão recorrida. Tudo de acordo com uma postura interpretativa
que busca efetivar a ineliminável função de que se dota o Direito para qualificar os costumes. Os eleitorais à frente. Julgo improcedente o recurso.”
No choque entre esses posicionamentos prevaleceu o voto do relator, Ministro Marcelo Ribeiro, que deferiu o registro de candidatura ao deputado
federal Eurico Ângelo de Oliveira Miranda, sendo vencidos os ministros Carlos Ayres Britto, Cesar Asfor Rocha e José Delgado. Em conseqüência do
julgamento desse Recurso Ordinário o Tribunal Superior Eleitoral editou a Súmula 13, que diz:
“RECURSO ORDINÁRIO Nº 1.069 – CLASSE 27ª RIO DE JANEIRO. Eleições 2006. Registro de candidatura. Deputado Federal. Inelegibilidade.
Idoneidade moral. Art. 14, § 9º, da Constituição Federal. O art.14, §9º, da Constituição não é auto-aplicável (súmula nº13 do Tribunal Superior
Eleitoral). Na ausência de lei complementar estabelecendo os casos em que a vida pregressa do candidato implicará inelegibilidade, não pode o
julgado, sem se substituir ao legislador, defini-los. Recurso provido para deferir o registro.
Mas o problema do indeferimento de candidaturas de pessoas que respondem a processos sem o trânsito em julgado continuava a ocorrer em
diversos pontos do país, até que o Supremo Tribunal Federal, ao analisar a questão na argüição de descumprimento de preceito fundamental nº 144
resolveu definitivamente a questão, afastando a possibilidade do indeferimento sem o devido atendimento ao princípio da presunção de inocência e
do respeito ao trânsito em julgado.
2.5O julgamento da ADPF nº 144 pelo Supremo Tribunal Federal e o posicionamento da Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB
A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) ajuizou Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental no Supremo Tribunal Federal com o
propósito de tornar auto-aplicável o §9º, do art. 14, da Constituição Federal, como também o de revogar a exigência do trânsito em julgado da Lei
Complementar 64/90[75], por contrariar os preceitos fundamentais contidos no §9º, do art. 14, da Constituição Federal (a probidade administrativa e a
moralidade para o exercício dos mandatos)
Em sua fundamentação demonstrou que após a edição da Súmula 13[76] pelo Tribunal Superior Eleitoral, em 1996, alguns Tribunais Regionais
Eleitorais[77] passaram a questionar o acerto da interpretação aplicada ao texto do §9º, do art. 14, da Constituição Federal, fazendo surgir relevante
controvérsia constitucional, até que o TSE, após consulta do TRE da Paraíba, decidiu manter a orientação da Corte no sentido de exigir o trânsito em
julgado das decisões condenatórias dos candidatos (seja em processo eleitoral, criminal ou de ação civil pública ou de improbidade) para considerar
a inelegibilidade.
Para a AMB[78] essa interpretação dada pelo Tribunal Superior Eleitoral configura o descumprimento dos preceitos fundamentais da probidade
administrativa e a moralidade para o exercício do mandato, o que, com o ajuizamento da ADPF 144, a situação de lesividade poderia ser
restabelecida.
2.6 Os argumentos contrários à ADPF 144
No Supremo Tribunal Federal, o relator da argüição foi o Ministro Celso de Mello. Em seu voto, marcado pela impecável fundamentação, demonstrou
que as argumentações levantadas pela Associação dos Magistrados Brasileiros não poderiam ser deferidas, naqueles termos pleiteados, apesar de
reconhecer a legitimidade do fim a que procurava atingir.
A primeira questão examinada foi saber se o direito fundamental à presunção de inocência restringir-se-ia, quanto a sua incidência, apenas ao
domínio processual penal, ou, ao contrário, se alcançaria e abrangeria qualquer esfera da atividade do poder público, impondo-lhe limites
inultrapassáveis.
Sobre essa questão, falou o Ministro Celso de Mello:
Diz o ministro:
“[...] como sabemos, a presunção de inocência – que se dirige ao Estado, para lhe impor limitações ao seu poder, qualificando-se, sob tal perspectiva,
como típica garantia de índole constitucional, e que também se destina ao indivíduo, como direito fundamental por este titularizado – representa uma
notável conquista histórica dos cidadãos, em sua permanente luta contra a opressão do poder.
[...] a presunção de inocência, legitimada pela idéia democrática, tem prevalecido, ao longo de seu virtuoso itinerário histórico, no contexto das
sociedades civilizadas, como valor fundamental e exigência básica de respeito à dignidade da pessoa humana.
[...]disso resulta, segundo entendo, que a consagração constitucional da presunção de inocência como direito fundamental de qualquer pessoa[...] a
prerrogativa de ser sempre considerada inocente, para todos e quaisquer efeitos, deve atuar, até o superveniente trânsito em julgado da condenação
judicial, como uma cláusula de insuperável bloqueio à imposição prematura de quaisquer medidas que afetem ou que restrinjam, seja no domínio
civil, seja no âmbito político, a esfera jurídica das pessoas em geral.
[...] cabe reafirmar, bem por isso, Senhor Presidente, uma observação concernente ao postulado da presunção de inocência: trata-se de garantia –
que possui eficácia irradiante, apta a projetá-la para esferas processuais não-criminais –cuja invocação, contra qualquer autoridade ou Poder do
Estado, mostra-se pertinente.”
Assim, como visto, entendeu Celso de Mello que o principio da presunção de inocência não é garantia exclusiva do direito penal, mas de todas as
esferas processuais, criminais ou não-criminais.
A segunda questão analisada foi sobre a exigência da coisa julgada a que se refere o art. 15, III, da Constituição Federal, e os incisos “d”, “e”, “g” e
“h”, do art. 1º, I, e o art. 15, caput, todos da Lei Complementar 64/90, que, respectivamente, dizem:
“Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:
III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;
Art. 1º São inelegíveis:
I - para qualquer cargo:
d) os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, transitada em julgado, em processo de apuração de
abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem 3 (três)
anos seguintes;
e) os que forem condenados criminalmente, com sentença transitada em julgado, pela prática de crime contra a economia popular, a fé pública, a
administração pública, o patrimônio público, o mercado financeiro, pelo tráfico de entorpecentes e por crimes eleitorais, pelo prazo de 3 (três) anos,
após o cumprimento da pena;
g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável e por decisão irrecorrível
do órgão competente, salvo se a questão houver sido ou estiver sendo submetida à apreciação do Poder Judiciário, para as eleições que se
realizarem nos 5 (cinco) anos seguintes, contados a partir da data da decisão;
h) os detentores de cargo na administração pública direta, indireta ou fundacional, que beneficiarem a si ou a terceiros, pelo abuso do poder
econômico ou político apurado em processo, com sentença transitada em julgado, para as eleições que se realizarem nos 3 (três) anos seguintes
ao término do seu mandato ou do período de sua permanência no cargo;
Art. 15. Transitada em julgado a decisão que declarar a inelegibilidade do candidato, ser-lhe-á negado registro, ou cancelado, se já tiver sido feito,
ou declarado nulo o diploma, se já expedido.”
A esse respeito, disse o Ministro, em seu Voto:
“[...] a exigência de coisa julgada – que representa, na constelação axiológica que se encerra em nosso sistema constitucional, valor de essencial
importância na preservação da segurança jurídica – não colide, por isso mesmo, com a cláusula de probidade administrativa nem com a que se
refere à moralidade para o exercício do mandato eletivo, pois a determinação de que se aguarde a definitiva formação da autoridade da “res judicata”,
além de refletir um claro juízo de prudência do legislador, quer os constituinte (CF, art.15, III), quer o comum (LC nº 64/90, art. 1º, I, “d”, “e”, “g” e “h”,
e art.15), encontra plena justificação na relevantíssima circunstância de que a imposição, ao cidadão, de gravíssimas restrições à sua capacidade
eleitoral, deve condicionar-se ao trânsito em julgado da sentença, seja a que julga procedente a ação penal, seja aquela que julga procedente a ação
civil por improbidade administrativa.
[...] inexiste, na realidade, qualquer situação de antinomia entre esses valores constitucionais, pois eles convivem harmoniosamente, em nosso
sistema normativo, na medida em que a observância do trânsito em julgado de sentenças, cujos efeitos afetam e restringem, gravemente, a esfera
jurídica de quem é condenado, apenas confere certeza e prestigia a segurança jurídica, que também se qualifica como valor constitucional a ser
preservado.”
Desse modo, não vislumbrou qualquer transgressão nem descumprimento aos preceitos fundamentais concernentes à probidade administrativa e à
moralidade para o exercício de mandato eletivo, a exigência do trânsito em julgado, não concordando, pois, que situações processuais ainda não
definitivas por sentenças transitadas em julgado possam provocar a inelegibilidade dos cidadãos ou impedir candidaturas para cargos eletivos.
Com relação à argüição da Associação dos Magistrados Brasileiros de que as sucessivas decisões do Tribunal Superior Eleitoral que resultaram na
Súmula 13[79] estariam descumprindo o preceito fundamental do §9º, do art.14[80], da Constituição Federal, ao não lhe atribuir auto-aplicabilidade.
Também nesse caso, o Ministro Celso de Mello não encontrou suporte. Para ele, o §9º, do art. 14 da CF/88 não é auto-aplicável, como deixou
consignado em seu voto:
“[...] isso significa, portanto, que o §9º do art. 14 da Constituição qualifica-se como típica regra provida de eficácia meramente limitada, cuja
aplicabilidade depende, em conseqüência, da edição de ato legislativo que atue como requisito indispensável ao pleno desenvolvimento da
normatividade do preceito constitucional em questão.”
Em última análise, a pretensão da Associação dos Magistrados Brasileiros para que o Supremo Tribunal Federal determinasse a todos os juízes
eleitorais, de qualquer instância, a auto-aplicabilidade do §9º, do art. 14 da CF/88, para fixar “como condição e como modo de interpretação dos
preceitos fundamentais, que caberá à Justiça Eleitoral sopesar a gravidade das condutas apontadas na lei complementar, mesmo sem trânsito em
julgado, para deliberar pela rejeição ou não do registro do candidato[81]”.
Sobre essa pretensão, assim se posicionou:
“[...] como venho de assinalar, o §9º do art. 14 da Constituição, por traduzir norma revestida de eficácia meramente limitada, não dispõe de
auto-aplicabilidade. [...] Esta Suprema Corte não pode, por isso mesmo, substituindo-se, inconstitucionalmente, ao legislador, estabelecer, com apoio
em critérios próprios, meios destinados a viabilizar a imediata incidência da regra constitucional mencionada, ainda mais se se considerar que
resultarão ,dessa proposta da AMB, restrições que comprometerão, sem causa legítima, a esfera jurídica de terceiros, a quem não se impõe sanção
condenatória com trânsito em julgado.
[...] não cabe, pois, ao Poder Judiciário, na matéria em questão, atuar na anômala condição de legislador positivo...
[...] é que, se tal fosse possível, o Poder Judiciário – que não dispõe de função legislativa – passaria a desempenhar atribuição que lhe é
institucionalmente estranha (a de legislador positivo), usurpando, desse modo, no contexto de um sistema de poderes essencialmente limitados,
competência que não lhe pertence, com evidente transgressão ao princípio constitucional da separação de poderes.
[...] em conseqüência de tais limitações constitucionais, o Judiciário não dispõe de qualquer poder para ferir, com a inelegibilidade, quem inelegível
não é, seja em face do texto constitucional, seja em face da legislação comum, de natureza complementar.”
Em conclusão, deixa assentado que somente após a edição da lei complementar exigida pela Constituição é que será possível a definição de casos
de inelegibilidade decorrente de vida pregressa e os prazos de sua cessação, não podendo, pois, na sua ótica, ser suprido o vácuo legislativo,
mediante interpretação judicial.
Mesmo assim, deixou reafirmada a necessidade de se considerar a vida pregressa dos candidatos a cargos eletivos, como um dos pressupostos
necessários à probidade e moralidade no exercício de funções públicas. Vejamos:
“[...] não se questiona a alta importância da vida pregressa dos candidatos, pois a probidade pessoal e a moralidade administrativa representam
valores que consagram a própria dimensão ética em que necessariamente se deve projetar a atividade pública.
[...] sabemos todos que o cidadão tem o direito de exigir que o Estado seja dirigido por administradores íntegros, por legisladores probos e por juízes
incorruptíveis, que desempenhem as suas funções com total respeito aos postulados ético-jurídicos que condicionam o exercício legítimo da atividade
pública. O direito ao governo honesto – nunca é demasiado reconhecê-lo – traduz uma prerrogativa insuprimível da cidadania.
[...] tenho reconhecido, por isso mesmo, que a probidade e a moralidade traduzem pautas interpretativas que devem reger o processo de formação e
composição dos órgãos do Estado, observando-se, no entanto, as cláusulas constitucionais cuja eficácia subordinante conforma e condiciona,
qualquer que seja a dimensão de sua atuação, o exercício dos poderes estatais.
[...] a defesa dos valores constitucionais da probidade administrativa e da moralidade para o exercício do mandato eletivo traduz medida da mais
elevada importância e significação para a vida política do país.
[...] a ilegitimidade dos fins, Senhor Presidente, não justifica a ilegalidade ou inconstitucionalidade dos meios cuja adoção se entenda necessária à
consecução dos objetivos visados, por mais elevados, dignos e inspirados que sejam.”
Essa foi a posição majoritária no Supremo Tribunal Federal, acompanhada pela maioria da Corte, a exemplo do ministro Menezes Direito, que ao se
manifestar destacou três aspectos considerados por ele como relevantes.
O primeiro deles foi considerar que o Supremo Tribunal Federal não pode restabelecer uma legislação que foi revogada pelo Congresso Nacional
com a edição de uma nova lei.[82] Outro aspecto apresentado pelo ministro foi o de delegar aos partidos políticos o papel de selecionar os seus
candidatos e se responsabilizar pelas escolhas feitas. Em síntese:
“[...] é através dos partidos políticos que se exerce a representação democrática na mais legítima forma de representação do povo”.
Por último, Menezes Direito destacou que “uma ordem justa é aquela em que os indivíduos se impuseram, a eles mesmos essa ordem”. Assim, para
ele, “se alguém viola um sistema normativo, do qual pertence, ele fere as suas próprias regras que são igualmente regras de todos”.
Superficial e incompreensível o que objetivava manifestar o douto Ministro. Bem mais clara foi a posição declarada pela Ministra Carmem Lúcia, para
quem a Emenda Constitucional nº 04/94[83] já estabelece limites às candidaturas e que já vem sendo cumprida.
Por conta disso, reafirmou a posição dominante no STF quanto à impossibilidade do Judiciário substituir-se ao legislador na elaboração de normas
complementares à Constituição Federal, mesmo que seja para melhorar o sistema eleitoral e a administração da coisa pública. Nesse sentido,
afirmou a Ministra:
“[...] somos escravos da Constituição (...) se se permitisse o veto a candidato processado sem sentença transitada em julgado, estaria transgredindo
o principio da segurança jurídica e, também, o da desigualdade jurídica, pois o critério defendido pela AMB poderia conduzir a decisões diversas em
casos semelhantes. Além disso, esta postura feriria o princípio da separação dos poderes, estabelecido na CF.”
2.7. Os argumentos favoráveis à ADPF 144
Os Ministros Carlos Ayres Britto e Joaquim Barbosa posicionaram-se favoravelmente à ADPF 144, votando pela procedência da ação, sendo votos
vencidos. Por sua importância no cotejamento das teorias levantadas na argüição, colhemos as suas principais fundamentações, afim de que se
possa estabelecer um comparativo entre as idéias defendidas.
Rememorando, a ação da AMB pedia a impugnação de parte do texto da Lei Complementar nº 64/90 – a Lei de Inelegibilidade -, e parte da
interpretação dada pelo Tribunal Superior Eleitoral ao § 9º, do art. 14 da Constituição Federal. A intenção da entidade era obter do Supremo tal
declaração para permitir que a Justiça Eleitoral promovesse a investigação da vida pregressa dos candidatos a cargos eletivos, para deferir ou
indeferir o registro daqueles onde fossem identificadas incompatibilidades entre o seu passado, seu presente, e a natureza da função pública
pretendida.
O Ministro Ayres Britto, desde logo, destacou a probidade administrativa, a moralidade e a vida pregressa como fatores condicionantes para o
exercício de cargos públicos. Para ele, “quem pretende ingressar nos quadros estatais como a face invisível do Estado há de corresponder a um
mínimo ético.”Assim, para assumir cargos públicos, de representação da coletividade, é preciso haver limites, restrições. Disse ele:
“[...] candidato é cândido, é puro, é depurado politicamente. Candidatura é candura. Como é que se pode ignorar isso? A Constituição não emprestou
significado diferente a essas palavras.”
Com relação ao § 9º, do art. 14 da Constituição Federal defendeu a sua auto-aplicabilidade, sem que isso venha necessariamente chocar-se com o
principio da presunção de inocência, que, na sua análise deveria ser tratado no processo eleitoral de um molde diverso daquele empregado no
âmbito penal, por apresentarem fundamentos e objetivos distintos.
No seu entender, havendo um choque aparente entre esses princípios deveria prevalecer o da precaução, por estar em jogo não apenas interesses
individuais, mas, sobretudo, interesses da própria coletividade, ao se afastar da disputa eleitoral candidaturas cuja análise da vida pregressa
demonstrasse profunda incompatibilidade entre os atos já cometidos e aqueles a serem cometidos na condição da representatividade política e
administrativa.
Questão interessante abordada pelo Ministro foi a diferenciação que estabeleceu entre a proibição de candidaturas e a perda de direitos políticos,
seara onde se costumam verificar sensíveis incorreções. Para ele a impugnação de uma candidatura não significa a perda de direitos políticos, e,
sendo assim, questiona:
“[...] quando o cidadão perde seus direitos políticos, isso gera uma seqüência de fatos impeditivos, e por isso se exige o trânsito em julgado. Mas
quando se fala da inelegibilidade, os direitos políticos permanecem. É somente um ato de cautela. [...] e por que há a necessidade do trânsito em
julgado?”
E ao final, Ayres Britto recomenda:
“[...] o momento histórico era o melhor possível para impedir que a Constituição se tornasse um elefante branco...”
E concluiu:
“[...] para mim, a matéria não padece de nenhum déficit de normatividade. Talvez nós é que padeçamos de um déficit de interpretatividade.”
Também o Ministro Joaquim Barbosa votou pela procedência da ADPF nº 144, mas, parcialmente. Eu seu voto manifestou a preocupação em se
estabelecer um padrão objetivo que pudesse tornar alguém inelegível, defendendo, para isso, a existência de sentença condenatória manifestada em
segunda instância.
Em posição semelhante à manifestada pelo Ministro Ayres Britto, o Ministro Joaquim Barbosa reafirmou a prevalência do principio da precaução
sobre o principio da presunção de inocência quando se tratar de questões envolvendo a representação da sociedade.
“[...] o poder judiciário não pode dar de ombros ao que está acontecendo no nosso País e jogar tudo nos ombros do legislador. Dependendo da forma
que for aplicada, a presunção de inocência torna letra morta o dispositivo constitucional”.
É sobre essa questão da presunção de inocência que repousam as principais discussões em torno da aplicabilidade da vida pregressa no
indeferimento de registros de candidaturas. A esse respeito já se manifestaram diversos juristas, como Adilson de Abreu Dallari, que condena a
decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADPF 144, segundo ele, motivada por interpretações equivocadas.
Para ele houve exageros por parte do STF na interpretação do principio da presunção de inocência, ao entender que somente após condenação
definitiva é que se poderia negar um pedido de registro de candidatura. Dallari disse entender que tal princípio, adotado como fundamento basilar da
decisão do STF, não seria absoluto, pois no direito não existe conceito com essa feição.
“[...] todos os conceitos jurídicos são finitos, têm uma determinada extensão. Tecnicamente, um conceito que não tenha extensão não é conceito,
pois não estaria definindo uma determinada idéia, com começo e fim. Desta forma, precisa-se estabelecer até onde alcança o princípio da presunção
de inocência. E é a lei que estabelece este parâmetro.”[84]
Posição semelhante é a que vem sendo defendida pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral[85], que em carta[86] assinada pelos juristas
Aristides Junqueira, Augusto Aras, Celso Antônio Bandeira de Mello, Edson de Resende Castro, Fábio Konder Comparato, José Jairo Gomes, Hélio
Bicudo, Mario Luiz Bonsaglia, Márlon Jacinto Reis e Ricardo Wagner de Souza Alcântara, manifestaram o entendimento de que o principio da
presunção de inocência não deveria ser aplicado no processo eleitoral com o mesmo fundamento em que é aplicado no processo penal, cujas
garantias idealizadas são distintas dos direitos políticos. Vejamos o que disseram:
“[...] diz-se que o princípio da presunção de inocência, também sediado na Constituição, estaria a impedir que condenações não transitadas em
julgados viessem a infirmar a elegibilidade de alguém. Essa alegação é destituída de fundamentação jurídica, pois se volta apenas a impedir a
aplicação imediata das sanções de natureza penal. E inelegibilidade não é pena, mas medida preventiva.
[...] a sociedade tem o direito de definir em norma o perfil esperado dos seus candidatos. Diz, por exemplo, que os cônjuges e parentes de
mandatários em algumas circunstâncias não podem disputar eleição. Isso se dá não porque sejam culpados de algo, mas porque se quer impedir que
se valham dessa condição para obter vantagens eleitorais ilícitas. Ninguém propôs quanto a isso que aí residisse qualquer afronta ao princípio da
não-culpabilidade.
[...] afirmar-se que o princípio da presunção de inocência se estende a todo o ordenamento jurídico constitui evidente impropriedade. Estender-se-ia
ao Direito do Trabalho, para impedir a demissão de um empregado ao qual se atribui crime de furto até que transite em julgado a sua condenação
criminal? Serviria ele para impedir que uma creche recuse emprego a alguém que já condenado por crimes sexuais contra crianças?”
A posição defendida por esses juristas no tocante à aplicabilidade do princípio da presunção de inocência [ou da não-culpabilidade, como alguns
preferem] ajuda a intensificar as discussões em torno do tema, que, basicamente, reside no entrechoque desse principio com o da moralidade,
restando prevalecente no Supremo Tribunal Federal a preponderância daquele em relação a este, no julgamento da argüição de descumprimento de
preceito fundamental nº 144, já explicitado anteriormente.
Por conta das discussões envolvendo diretamente aspectos e aplicabilidade desses dois princípios, faz-se necessário uma abordagem mais detida
do papel desempenhado por eles no ordenamento jurídico brasileiro e os meios pelos quais se utiliza o Direito para o equacionamento de conflitos
entre eles.
III O papel dos princípios no ordenamento jurídico brasileiro
A palavra princípio traduz a idéia de “começo, início”, e, nesta linha, “o primeiro momento da existência de algo ou de uma ação ou processo”[87]
Para o Direito, eles cumprem importante função na construção, interpretação e aplicação das regras jurídicas, modelando, desde a fase pré-jurídica à
propriamente jurídica, os fins que busca alcançar.[88]
Recorrendo a ÁVILA (2005, p....) poderíamos conceituar os princípios como:
“[...] normas imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com pretensão de complementaridade e de parcialidade, para cuja aplicação se
demanda uma avaliação da correlação entre o estado de coisas a ser promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessária à sua
promoção. Como se vê, os princípios são normas imediatamente finalísticas. Eles estabelecem um fim a ser atingido.”
A partir dessa definição podemos afirmar que os princípios deixaram de ter um caráter meramente secundário, passando a ter força jurídica os seus
enunciados. Daí porque MELLO (1980, p. 230) afirma que:
“[...] violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico
mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do
princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais.”
Essa evolução dos princípios, para BONAVIDES (1999, p.231), surge a partir da força normativa dos princípios gerais de Direito e a inserção
constitucional dos princípios, que fez perderem a indeterminação sempre alegada para retirar-lhes o sentido normativo de cláusulas operacionais,
ultrapassando a fase hermenêutica das chamadas normas programáticas.[89]
Esse também é o pensamento de FERRAZ e DALLARI (2007. p. 64), sobre a aplicabilidade e eficácia dos princípios.
“[...] em primeiro lugar, é preciso deixar ainda mais claro que os princípios não são meras declarações de sentimento ou de intenção, desprovidos de
qualquer positividade. Princípios também são “normas”, ou seja, são dotados de positividade, determinam condutas obrigatórias, ou, pelos menos,
impedem a adoção de comportamentos com eles incompatíveis. Além disso, os princípios são vetores interpretativos; servem para orientar a correta
interpretação das normas isoladas. É pacífico na doutrina que as normas jurídicas podem comportar uma pluralidade de interpretações; os princípios
servem exatamente para indicar, dentre as interpretações possíveis, diante do caso concreto, qual interpretação deve ser obrigatoriamente adotada
pelo aplicador da norma, em face dos valores consagrados pelo sistema jurídico. Diante de uma lacuna normativa, diante da falta de normação
expressa para determinada situação, diante de uma dúvida interpretativa, deve-se decidir o caso concreto à luz dos princípios, da maneira mais
condizente com o significado do princípio ou dos princípios aplicáveis à específica questão em exame.”
Para MOTTA (2003, p.139), em seu processo de evolução, a juridicidade dos princípios passa por três fases distintas: a jusnaturalista, a positivista e
a pós-positivista.
“[...] a primeira delas e mais tradicional, sem dúvida, é a fase jusnaturalista. Nessa fase, os princípios ainda se colocam inteiramente em abstrato e a
sua normatividade é praticamente nula. Essa fase dominou a dogmática dos princípios por um longo período até o advento da Escola Histórica do
Direito. Veio em seguida um positivismo extremamente forte e dominante.
[...] a segunda fase da teorização dos princípios é a juspositivista. Nela, os princípios ingressam nos Códigos como fonte normativa, subsidiária ou
como “válvula de segurança que garante o reinado absoluto da lei. O juspositivismo fez dos princípios na ordem constitucional meras pautas
programáticas supralegais. Estão sempre assinalando a sua carência de normatividade a sua irrelevância jurídica.
[...] a terceira fase, finalmente, é a do pós-positivismo. Aqui, os princípios começam a ser tratados como Direito. É a fase dos grandes momentos
constituintes. “As novas consituições promulgadas acentuam a hegemonia axiológica dos princípios, convertidos em pedestal normativo sobre o qual
assenta todo o edifício jurídico dos novos sistemas constitucionais.”
A partir dessa terceira fase, há um crescente reconhecimento no caráter normativo dos princípios entre os constitucionalistas, dentre eles, ALEXY
(1993, p. 87), cuja obra, “Teoria de los derechos fundamentales”, marcou essa fase o os períodos subseqüentes, principalmente por estabelecer a
diferenciação entre princípios e regras.
Para ele, a diferença entre regras e princípios fica muito clara nas colisões de princípios e nos conflitos de regras. É comum nas colisões de
princípios e nos conflitos de regras o fato de que duas normas, aplicadas independentemente, conduzem a resultados incompatíveis. Assim, há dois
juízos de dever-ser jurídico contraditórios. Diferenciam-se na forma como se soluciona o conflito.
MOTTA (2003, p.152) destaca a importância, a partir da posição de Alexy, da diferenciação dos conflitos entre princípios e entre normas. Nos
primeiros, defende o uso da terminologia “colisão”, e no segundo, a expressão “conflito”, isto para diferenciar as soluções apresentadas em cada
caso. Havendo contradição entre duas regras, uma deverá ser obrigatoriamente eliminada e não poderá ser absorvida por uma regra de exceção,
devendo uma delas ser declarada inválida. Algumas soluções já são por demais conhecidas, como é o caso da lei posterior que revoga a anterior ou
a especial que prevalece sobre a geral.
Mas, quando a colisão envolve princípios, as soluções são bem diferentes. Assim, para ele, quando um princípio orienta uma conduta no sentido de
permitir e o outro proibir, um dos dois deve ceder ao outro. Contudo, nenhum é declarado inválido nem se introduz nenhuma cláusula de exceção. O
que deve ocorrer é que um dos princípios, em determinada circunstância, precede ao outro e, assim, deve prevalecer. Se a mesma situação
ocorresse em outra circunstância, a solução poderia ser inversa. Dessa forma, os princípios adquirem diferentes pesos e, conforme a circunstância
ou caso concreto, deve prevalecer o de maior peso.
Nesses casos, é a técnica da ponderação de interesses que vai permitir a resolução dos conflitos existentes, que, para SARMENTO (2003, p.97),
caracteriza-se:
“[...] pela sua preocupação com a análise do caso concreto em que eclodiu o conflito, pois as variáveis fáticas presentes no problema enfrentado
afiguram-se determinantes para a atribuição do “peso” específico a cada princípio em confronto, sendo, por conseqüência, essenciais à definição do
resultado da ponderação.”
A esse respeito, ALEXY, que denomina essa técnica de mandado de ponderação, entende que sua aplicação deve envolver uma análise da relação
custo-benefício da norma avaliada, ou seja, que o ônus imposto pela norma deva ser inferior ao benefício por ela engendrado, sob pena de
inconstitucionalidade, numa clara defesa da aplicação do principio da proporcionalidade.
Por este princípio, o intérprete seria convidado a ponderar sobre qual princípio deveria prevalecer, colocando-se em um lado da balança os
interesses protegidos com a medida, e no outro, os bens jurídicos que serão restringidos ou sacrificados por ela. Se a balança pender para o lado dos
interesses tutelados, a norma será válida, mas, se ocorrer o contrário, patente será a sua inconstitucionalidade.
BARROSO (1996, p.213) lamenta a trajetória modesta da aplicação do princípio da proporcionalidade no Brasil, segundo ele, devido, em grande
parte, a uma visão muito rígida e esquemática da nossa jurisprudência a propósito da separação dos poderes, trazida por Montesquieu, que
pretendia uma moderação ao exercício do poder.
Mas, a partir da Constituição Federal de 1988, os órgãos judiciais, principalmente o Supremo Tribunal Federal, vêm reconhecendo com cada vez
mais freqüência o principio da proporcionalidade nos seus julgados.
Para GUERRA FILHO (1999, p.66) isso é muito positivo, pois
“[...] é ele [o princípio da proporcionalidade] que permite fazer o ‘sopesamento’ dos princípios e direitos fundamentais, bem como dos interesses e
bens jurídicos em que se expressam, quando se encontrem em estado de contradição, solucionando-a de forma que maximize o respeito de todos os
envolvidos no conflito.”
Portanto, havendo conflito entre princípios [e diante da constatação de que um não aniquila o outro] é preciso sopesar, buscar qual deles naquele
caso concreto deverá prevalecer, diante dos interesses em jogo e da norma [ou das normas] em destaque.
SARMENTO (2003, p.99) aponta a necessidade da aplicação de três tarefas para que a técnica do sopesamento possa realmente atender ao que
busca: a pacificação do conflito. Recomenda ele:
“[...] assim, a primeira tarefa que se impõe ao intérprete, diante de uma possível ponderação, é a de proceder à interpretação dos cânones
envolvidos, para verificar se eles efetivamente se confrontam na resolução do caso, ou se, ao contrário, é possível harmonizá-los. Nesta tarefa,
estará o exegeta dando cumprimento ao princípio da unidade da constituição, que lhe demanda o esforço de buscar a conciliação entre normas
constitucionais aparentemente conflitantes, evitando as antinomias e colisões. Isto porque a Constituição não representa um aglomerado de normas
isoladas, mas um sistema orgânico, no qual cada parte tem de ser compreendida à luz das demais.”
Ultrapassada essa primeira etapa, uma outra deverá ser empreendida: a ponderação de interesses.
“[...] vencida a etapa acima referida, defronta-se o intérprete com a constatação de que determinada hipótese é de fato tutelada por dois princípios
constitucionais, que apontam para soluções divergentes. Neste caso, ele deve, à luz das circunstâncias concretas, impor “compressões” recíprocas
sobre os interesses protegidos pelos princípios em disputa, objetivando lograr um ponto ótimo, onde a restrição a cada interesse seja a mínima
indispensável à sua convivência com o outro.
[...] assim, em primeiro lugar, o intérprete terá de comparar o peso genérico que a ordem constitucional confere, em tese, a cada um dos interesses
envolvidos. Para este mister, ele deve adotar como norte a ta
]boa de valores subjacente à Constituição. É verdade que as Constituições não costumam conter uma escala rígida de interesses ou valores, não
havendo, no sentido técnico, uma hierarquia entre as normas constitucionais. Isto, porém, não significa que a Lei Fundamental empresta a mesma
relevância a todos os interesses que se abrigam sob o seu pálio.”
Como última fase, recomenda o emprego do princípio da proporcionalidade em sua tríplice dimensão – adequação, necessidade e proporcionalidade
em sentido estrito:
“[...] em outras palavras, o julgador deve buscar um ponto de equilíbrio entre os interesses em jogo, que atenda aos seguintes imperativos: (a) a
restrição a cada um dos interesses deve ser idônea para garantir a sobrevivência do outro; (b) tal restrição deve ser a menor possível para a proteção
do interesse contraposto e (c) o benefício logrado com a restrição a um interesse tem de compensar o grau de sacrifício imposto ao interesse
antagônico. (...) finalmente, cabe ressaltar que, embora se esteja metaforicamente falando em pesos e em ponderação, é evidente que interesses e
valores não são grandezas quantitativamente mensuráveis. Assim, não estão em jogo cálculos aritméticos, razão pela qual a ponderação de
interesses não pode ser controlada exclusivamente mediante o uso de critérios de lógica formal, uma vez que o que impera neste domínio é a “lógica
do razoável”.[90]
Pois bem. É justamente no sopesamento de princípios que reside a mais fundamental discussão envolvendo a questão da aplicabilidade da vida
pregressa no deferimento ou não dos pedidos de registros de candidatura, já que aqueles que a defendem baseiam-se na necessidade de uma maior
valorização do principio da moralidade e da probidade na administração pública, e os que discordam, fundamentam sua posição no entendimento de
que o principio da presunção de inocência deva ser respeitado, sem relativizações, por se constituir numa garantia individual do cidadão frente ao
arbítrio do Estado.
3.2. Moralidade versus presunção de inocência. O que deve prevalecer em matéria eleitoral?
Questão interessante e que resolve toda a celeuma criada em torno da aplicação da consideração da vida pregressa daqueles que pretendem
exercer uma função pública, sob os seguintes comandos normativos:
a) Da Constituição Federal de 1988:
“Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residente no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade, nos termos seguintes:
LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;
Art.14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei,
mediante:
§ 9º. Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a
moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência
do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:”
b) Da Lei Complementar nº 64/90:
“Art. 1º. São inelegíveis:
I – para qualquer cargo:
d) os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, transitada em julgado, em processo de apuração de
abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem nos
3(três) anos seguintes:
e) os que forem condenados criminalmente, com sentença transitado em julgado, pela prática de crimes contra a economia popular, a fé pública, a
administração pública, o patrimônio público, o mercado financeiro, pelo tráfico de entorpecentes e por crimes eleitorais, pelo prazo de 3(três) anos,
após o cumprimento da pena;”
Como se vê, de um lado, o direito do povo ao governante honesto, do outro, a necessidade de considerar inocente alguém que ainda não teve sua
culpa devidamente comprovada. O que fazer, então? De que lado posicionar diante da colisão entre esses dois princípios e dos interesses individuais
e coletivos em jogo?
Primeiro, há que se afirmar que o direito ao governo honesto já é considerado por BONAVIDES (2002, p.525) como um dos direitos fundamentais de
quarta geração, aqueles que BOBBIO (1992, p.6) organizou como decorrentes dos efeitos da pesquisa biológica a ensejar a manipulação do
patrimônio genético de cada indivíduo.
PINTO (2008, p. 32) concorda com BONAVIDES em relação ao direito do povo ao governante honesto, em fazer parte dos direitos fundamentais de
quarta geração. Para ele
“[...] o direito ao governo honesto constitui um direito fundamental, objeto de tutela constitucional no Estado democrático. Governo honesto é o que
pauta suas ações sempre respeitando os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. O governo de assaltantes
nada tem a ver com a democracia. Trata-se apenas de um quadro doloroso em que marginais, travestidos de homens públicos, passam a ter acesso
ao poder, fazendo ruir um dos pilares do Estado democrático: a dignidade da pessoa humana, tida pela doutrina como núcleo essencial dos direitos
fundamentais.”
E continua:
“[...] ao assentar as bases do Estado brasileiro, na cidadania e na dignidade da pessoa humana, assegurou a Constituição a um só tempo o direito de
cada brasileiro participar ativamente na indicação dos escolhidos para o exercício do poder político e o direito de ter, na composição desse poder,
cidadãos reconhecidamente honestos, sem suspeição motivada por prática de ilicitudes no desempenho de função pública.”
Por causa dessa necessidade de não haver suspeitas sobre os homens públicos, defende o eleitoralista, a inversão do ônus da prova nos casos de
práticas de ilicitudes no desempenho de função pública.
“[...] a primeira providência exigida de um homem suspeito da autoria de um crime, que almeja o exercício do poder, em qualquer esfera de sua
atuação, é provar cristalinamente não haver cometido irregularidade desabonadora do seu conceito.”
A esse respeito concordamos integralmente. Diante do atual estado de morosidade nos crimes cometidos por agentes públicos, que resultam na
nossa tão reconhecida impunidade, seria de grande utilidade inverter o ônus da prova, nos crimes públicos, para que assim aquele que estivesse sob
suspeição de qualquer prática ilícita, fosse o responsável por provar a sua inocência, diante de um Tribunal específico [que poderia ser o Tribunal
Administrativo, nos moldes do que já acontece em Portugal], ao contrário do que ocorre hoje, em que é o Estado o responsável em provar a culpa do
acusado, onde quase sempre não consegue chegar à fase de sentença, devido principalmente às incontáveis procrastinações recursais promovidas
por advogados muito bem remunerados.
Esse é um dos grandes problemas enfrentados no Brasil. A morosidade no judiciário, que resulta na impunidade dos agentes públicos que cometem
crimes no exercício de suas funções, provoca na sociedade incontáveis prejuízos. Ela afeta desde o relacionamento normal dos poderes até a vida
individual do cidadão, que é quem mais sofre, pois os recursos públicos destinados a proporcionar-lhe uma melhor saúde, educação, segurança
pública, dentre outras necessidades, é acintosamente surrupiado, negociado e repartido entre esses agentes públicos como se a eles pertencessem.
É uma situação que surpreende pelo cinismo dos envolvidos, que há muito tempo não mais se incomodam com as conseqüências dos seus atos
criminosos, pois elas [as conseqüências] não existirão. Vejamos os mais recentes episódios de corrupção ocorrido no Brasil. O que aconteceu com
os envolvidos? Quantos foram punidos?
Nenhum. Matéria exibida na Revista VEJA, edição 2082, de 15 de outubro de 2008, sob o título “De volta para o futuro”, resume bem essa situação.
“[...] a turma fez bonito nas urnas. Representantes de praticamente todos os escândalos recentes acabaram eleitos. Em Pernambuco, o ex-presidente
da Câmara dos Deputados Severino Cavalcanti será o novo prefeito de João Alfredo, sua cidade natal. Enxotado de Brasília graças às evidências de
que embolsava um mensalinho, Severino chegou lá depois de receber apoio de Lula. O ex-presidente do Senado Jáder Barbalho colocou seu primo
José Priante no segundo turno das eleições em Belém. Priante teve papel destacado no escândalo da Sudam. Foi citado em grampos por
fraudadores e freqüentava, na companhia de Jader, o bunker da quadrilha. Um dos sucessores de Jáder no comando do Congresso, Renan
Calheiros, garantiu a reeleição de Renan Filho, o Renanzinho, em Murici (AL). Renanzinho foi laranja do pai e beneficiário final da compra de um
grupo de comunicação com dinheiro sem origem conhecida. O mensaleiro José Borba, ex-líder do PMDB que embolsou 2,1 milhões de reais do
mensalão, vai comandar Jandaia do Sul, no Paraná. O sanguessuga João Mendes, acusado de colocar no bolso propinas de desvios do Ministério da
Saúde, ocupará uma cadeira na Câmara do Rio.”
Esse recorde serve para demonstrar o atual estágio de leniência com o princípio da moralidade no exercício de funções públicas, potencializado pela
pouca importância que o eleitorado empresta a esse princípio, já que sucessivamente são eleitos para os mais variados cargos pessoas cuja vida
pregressa não credencia a mais ínfima das representatividades.
Novamente recorrendo a PINT0 (2008, p.33), em obra já citada, ele nos ensina que:
“[...] a dignidade da pessoa humana, erigida como base de sustentação da República, não está a significar somente que o homem não deve ser
ultrajado na sua liberdade, na sua honra etc. Está a representar muito mais que isso. Significa, igualmente, a exigência de honorabilidade para
habilitar-se o indivíduo ao desempenho de funções delegadas pelo povo. Dignidade, na esfera da cidadania, não se resume apenas na prerrogativa
de ter alguém sua opinião computada para escolha dos integrantes do comando político do Estado. Importa na exigência de honradez do ocupante
do poder para exigir a subordinação dos administrados. Traduz-se na impossibilidade de permanência ou de acesso à representação popular daquele
que teve sua honra maculada por ações que, comprovadamente, descredenciam-lhe ao exercício do mandato. Vale dizer, sem dignidade não pode
alguém atuar em nome do Estado.”
E arremata, afirmando sobre o direito ao governante honesto:
“[...] o direito ao governante honesto projeta o direito do cidadão de ser governado por pessoa honrada, cuja dignidade não se ache comprometida
por ações que atestem má-fé na condução da coisa pública, aferida, por exemplo, através de documentos produzidos pelos órgãos responsáveis pela
fiscalização de seus atos à frente da Administração, sob pena de instituir-se o “governo dos indignos”, assim considerado aquele cujos governantes
se notabilizaram pelos ilícitos que cometeram, provocando mal-estar nos cidadãos a cada aparição para falar em seu nome.”
MEIRELLES (2003, p. 87) considera a moralidade administrativa como pressuposto de validade de todo ato da administração pública. E ao referir-se
a Maurice Hauriou, o sistematizador do conceito da moral comum, chama a atenção para a necessidade de se valorizar o elemento ético nas
condutas dos agentes públicos.
Pensamento semelhante possui a Ministra Carmem Lúcia Antunes Rocha, do Supremo Tribunal Federal:
“[...] a moralidade administrativa não é uma questão que começa e termina na qualidade dos homens, mas na qualidade do sistema jurídico, político e
administrativo vigentes em determinada sociedade estatal. Afinal, sabe-se que o Estado não é uma organização de santos. E porque não o é,
cogita-se dos sistemas jurídico, político, econômico e administrativo para se aperfeiçoar as formas de convivência social. Fosse o Estado uma
sociedade de santos, não precisaria ele desses sistemas. No exercício da liberdade humana não se promovem milagres, menos ainda o da
transformação da essência do homem; produz-se apenas o Direito, suficiente para que, no exercício daquela liberdade, se concretize o ideal de
Justiça pensado e buscado em determinada sociedade de homens dotados do bem e do mal. Homens são os mesmos em todos os lugares: têm as
mesmas necessidades, as mesmas aspirações, o mesmo ideal de ser feliz. O que muda de um para outro é o sistema de normas de convivência por
eles concebido e praticado para o atingimento de seus objetivos.” [91]
Apesar desse louvável pensamento, que eleva e qualifica o principio da moralidade, a ministra Carmem Lúcia posicionou-se contrariamente à
Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 144, ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB – que previa justamente
o respeito ao principio da moralidade, ao intencionar a possibilidade dos juízes eleitorais em indeferir pedidos de candidaturas de réus cuja vida
pregressa fosse incompatível com a função pretendida, isso em atendimento ao §9º, do art. 14, da Constituição Federal que expressamente
determina a consideração da vida pregressa como pressuposto para o exercício de mandatos eletivos.
Em seu voto, a ministra acompanhou o voto do ministro-relator, Celso de Mello, pela improcedência da ADPF, por entender que a permissão de veto
a candidaturas de pessoas processadas sem sentença transitada em julgado seria a transgressão ao princípio da segurança jurídica e ao principio da
presunção de inocência. Ou seja, valorizou estes princípios e desprezou o da moralidade que ela mesma afirmou no texto acima citado, ser um dos
responsáveis pela modulação do ideal de justiça. O mesmo comportamento foi adotado pelos demais ministros do Supremo Tribunal Federal, à
exceção de Carlos Ayres Britto e Joaquim Barbosa, que votaram favoravelmente à ADPF 144, conforme já explicitado em páginas anteriores.
Na verdade, ao fazerem prevalecer o princípio da presunção de inocência, em detrimento do princípio da moralidade, permitiram a participação no
processo eleitoral de toda e qualquer pessoa ainda não culpada, mesmo diante do cometimento do mais hediondo dos crimes. Certamente essa não
é a vontade da Constituição, que deixou esposado em seu texto de forma categórica a Moral como fundamento da ordem jurídica.
Infelizmente a Moral exigida para o exercício dos mandatos eletivos, mesmo diante de expressa invocação constitucional, ainda não desfruta da
mesma força empregada na defesa do princípio da presunção de inocência, colocado em nosso meio como algo absoluto, inatingível, o que, de fato,
não é.
Se assim o fosse, estaríamos relegando a unidade constitucional que busca nos seus postulados a realização da Justiça através de governos
honestos, comandados por pessoas igualmente honestas, ao permitir o gerenciamento público por parte daqueles já condenados em instâncias
inferiores, sob o argumento da prevalência da inocência em razão da inexistência do trânsito em julgado, mesmo se tratando de notórios
dilapidadores do patrimônio público.
Não há como prosperar a idéia da prevalência do principio da inocência sobre o princípio da moralidade, especialmente em matéria eleitoral cujos
interesses, objetivos e conseqüências são bem distintas da seara penal, onde, aí sim, a presunção de inocência deve prevalecer pela relevância dos
valores em jogo, a exemplo da liberdade do indivíduo, que depois do direito à vida é o mais substancial dos direitos.
Mas em matéria eleitoral a invocação da presunção de inocência não pode sobrepor-se à exigência também constitucional de retidão compatível com
a natureza do cargo ou função pretendida pelo agente público, que nos casos de suspeição a respeito de sua conduta [vida pregressa] estará
faltando requisito essencial à representatividade: honestidade.
E como já ficou demonstrado anteriormente, o direito ao governo honesto é visto hoje como um dos direitos fundamentais do cidadão, motivo que o
faz não ser afastado na conjugação entre a presunção de inocência quando estiver em jogo o interesse de toda uma sociedade em não ter à sua
disposição a possibilidade de voto em candidatos cujas condutas sejam flagrantemente incompatíveis com a função pretendida.
Nessa colisão, o que se vê, é que o princípio da presunção de inocência costuma afastar a incidência de todos os demais princípios, como se regra
jurídica ele fosse, pois são estas as capazes de anular a ocorrência de uma outra regra nos casos de existência de conflitos entre elas. O mesmo não
deve ocorrer nas colisões entre princípios. Assim, na hipótese de um principio guiar uma conduta num determinado sentido e o outro numa direção
oposta, um dos dois deve ceder ao outro, sem quem haja a necessidade da declaração de invalidade de quaisquer deles.
Assim, um dos princípios colidentes prevalecerá sobre o outro e para que isso aconteça é necessário o sopesamento entre eles para se aferir,
conforme a circunstância, aquele que maior peso possui e cujas conseqüências sociais negativas sejam as menores possíveis, a partir da sua
preferência.
Não foi essa a preocupação dos que ponderaram a favor da prevalência do princípio da presunção de inocência sobre o princípio da moralidade, já
que os resultados advindos dessa “escolha” situam-se na possibilidade de serem eleitos candidatos envolvidos em toda espécie de crimes, muitos
dos quais cometidos na condução de funções públicas assumidas anteriormente.
Isso leva a um estado de calamidade na vida pública, sempre assolada por pessoas reconhecidamente desonestas. A conseqüência disso é
avassaladora: impunidade, corrupção, desvios, crise social, descrédito nas instituições, aumento da violência, direitos essenciais desrespeitados...
Certamente se a ponderação fosse dirigida ao princípio que melhor atendesse ao interesse público [no caso, o princípio da moralidade] a situação
poderia ser outra, completamente diferente dessa que é vivenciada hoje, já que muitas das figuras ímprobas que costumeiramente exercem
relevantes funções de poder restariam afastadas do processo eleitoral no seu nascedouro, ou seja, no indeferimento dos seus pedidos de registro de
candidaturas.
É isso o que se destina a fazer o direito eleitoral: proteger a lisura do processo eleitoral disciplinando a escolha dos ocupantes dos cargos eletivos,
que, na ótica de DJALMA PINTO (2008, p.37):
“[...] a interpretação, pois, das normas eleitorais deve ter sempre presente o interesse superior do grupo social em escolher os melhores cidadãos
para o comando de seu destino. Justamente por isso a probidade do postulante que almeja o mandato, a preservação da igualdade na disputa
eleitoral, enfim, a normalidade no processo de escolha, tudo isso deve ser priorizado neste ramo do Direito Público. Quem atropela suas normas para
atingir o poder mostra-se desqualificado para seu exercício. Essa a constatação elementar a ser feita por qualquer povo civilizado em relação aos
ilícitos praticados por um candidato para conquistar mandato eletivo. A escolha dos melhores para o comando do poder, na sociedade, não é, porém,
atribuição específica do Direito Eleitoral, mas dos eleitores. Ao Direito compete apenas garantir lisura na disputa, determinando a exclusão daqueles
que maculam o processo eletivo com ações configuradoras de abuso do poder econômico, político ou de fraude.”
Por estas definições, percebe-se o quanto é relevante o direito eleitoral na garantia do interesse público, pois é ele o responsável direto pela
condução do processo de alternância no poder, que deve acontecer sem maiores traumas, fraudes ou tudo o que possa levar a uma vontade viciada
do eleitorado na escolha dos seus representantes.
Na prática, os órgãos eleitorais têm uma responsabilidade muito grande com a lisura do processo eleitoral, principalmente no que diz respeito ao
deferimento de candidaturas de pessoas que participarão da disputa política, pois serão elas, na hipótese de serem eleitas, as responsáveis pela
condução das funções públicas, seja no poder executivo, seja no poder legislativo.
E como tudo que vivemos [e sofremos] é conseqüência direta das decisões políticas, é de bom alvitre que a análise para o ingresso de candidatos na
disputa eleitoral seja o mais rigoroso possível, evitando-se a participação de pessoas notoriamente desprovidas da moralidade que a magnitude do
mandato exige.
No Poder Judiciário e no Ministério Público essa análise sobre a moralidade dos seus membros é mais contundente que no Executivo e Legislativo.
Isso é facilmente constatado quando observamos nos editais dos concursos públicos promovidos para ingresso nas suas carreiras, a exigência da
investigação da vida pregressa, inclusive se constituindo numa das fases necessárias à aprovação nos certames.
O próprio Conselho Nacional de Justiça, órgão do Poder Judiciário,[92]por meio da Resolução nº 75, de 12 de maio de 2009, em que uniformiza o
procedimento e os critérios relacionados ao concurso de ingresso na carreira da magistratura, estabelece na Seção II, em seu art. 5º, a necessidade
de investigação sobre a vida pregressa do pretenso candidato:
“Seção II
Das etapas e do programa do concurso
Art. 5º. O concurso desenvolver-se-á sucessivamente de acordo com as seguintes etapas:
I – primeira etapa – uma prova objetiva seletiva, de caráter eliminatório e classificatório;
II – segunda etapa – duas provas escritas, de caráter eliminatório e classificatório;
III – terceira etapa – de caráter eliminatório, com as seguintes fases:
a) sindicância da vida pregressa e investigação social;
b) exame de sanidade física e mental;
c) exame psicotécnico;
IV – quarta etapa – uma prova oral, de caráter eliminatório e classificatório;
V – quinta etapa – avaliação de títulos, de caráter classificatório.
1º. A participação do candidato em cada etapa ocorrerá necessariamente após habilitação na etapa anterior.
2º. Os tribunais poderão realizar, como etapa do certame, curso de formação inicial, de caráter eliminatório ou não.” (grifo nosso)
Ora, se uma pessoa que tem a vida pregressa manchada não pode ser aprovada num concurso público para ingresso na magistratura, como pode
ela concorrer a um cargo eletivo, por exemplo, de presidente da república? A moral exigida para um juiz de direito não é a mesma exigida para o
ocupante da função mais relevante da nação? Tenho a mais absoluta certeza que não.
É por causa de contradições desse tipo que a presunção de inocência não deve ser empregada de forma tão absoluta, afastando todos os demais
princípios, igualmente protegidos pela Constituição Federal, que num dado momento se mostrarem contraditórios. É preciso aferir no caso concreto
qual princípio é o prevalecente sobre o outro, a depender dos interesses e das conseqüências jurídicas e sociais envolvidas. É o que nos ensina
ALEXY(2005, p.23):
“[...] os princípios jurídicos permitem exceções e podem ser mutuamente inconsistentes e até contraditórios; eles não reivindicam aplicação exclusiva;
seu significado real só se desenvolve através de um processo de ajustamento e limitação de duas mãos alternadas; e eles precisam para sua
realização, da concretização via princípios subordinados e julgamentos particulares de valor com conteúdo material independente. O sistema
axiológico-teleológico em si não permite decisão única sobre o peso e o equilíbrio dos princípios jurídicos em dado caso ou sobre a quais valores
particulares deve ser dada prioridade em qualquer situação particular”.
Por outro lado, não é muito prudente a aplicação de um único princípio – o da presunção de inocência – em favor daqueles já indiciados,
denunciados ou condenados por práticas ilícitas cometidas e que ainda pretendam continuar participando da vida pública, como se não existisse na
Constituição qualquer exigência à moralidade e à consideração da vida pregressa.
Respeitamos o princípio da presunção da inocência achando até que ele ultrapassa a seara exclusivamente penal, perpassando os seus efeitos a
todos os campos do direito. O que discordamos é a forma de aplicação absoluta que é emprestada a ele, como se fosse um princípio superior aos
demais, que nem mesmo poderia ser objeto de ponderações a seu respeito.
Apesar das garantias trazidas ao indivíduo por esse princípio, que são muito importantes para impedir injustiças, a interpretação feita de modo
absoluto, sem permitir ponderações, em nada beneficia a sociedade, principalmente nas situações onde o interesse público é prevalecente sobre o
direito individual do cidadão.
Sobre a presunção de inocência, MIRABETE (2004, p.45) nos ensina que
“[...] como conseqüência direta do princípio do devido processo legal, instalou-se na doutrina e nas legislações o denominado princípio da ‘presunção
de inocência’. De acordo com o art. 9º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, toda pessoa se pressupõe inocente até que
tenha sido declarada culpada, preceito reiterado no art. 26 da Declaração Americana de Direitos e Deveres, de 2 de maio de 1948, e no art. 11 da
Declaração Universal dos Direitos Humanos, da ONU. Nesses termos, haveria uma presunção de inocência do acusado da prática de uma infração
penal até que uma sentença condenatória irrecorrível o declarasse culpado. De tempos para cá, entretanto, passou-se a questionar tal princípio que,
levado às últimas conseqüências, não permitiria qualquer medida coativa contra o acusado, nem mesmoa prisão provisória ou o próprio processo.
Por que admitir-se um processo penal contra alguém presumidamente inocente? Além disso, se o principio trata de uma presunção absoluta (juris et
de jure) a sentença irrecorrível não a pode eliminar; se trata de uma presunção relativa (juris tantum), seria ela destruída pelas provas colhidas
durante a instrução criminal antes da própria decisão definitiva.”
Portanto, não há como atribuir ao principio da presunção de inocência um caráter absoluto, ainda mais quando se analisam os reais objetivos da
sociedade: assegurar o direito individual de um candidato condenado por práticas ilícitas de participar de uma disputa eleitoral, ou assegurar o direito
do povo a governantes honestos, sem que tenha que continuar convivendo com sucessivos escândalos envolvendo desvio de verbas públicas,
geralmente cometidos por pessoas já envolvidas em irregularidades anteriores, sem que tenham sofrido qualquer pena efetiva?
Nesse impasse é conveniente sobrepor o princípio da moralidade ao da presunção de inocência, para que assim possa ser atribuído aos juízes
eleitorais a condição de indeferir o pedido de registro de candidaturas dessas pessoas cujas vidas pregressas sejam notoriamente incompatíveis com
a função pública que desejariam ocupar.
Como já é do nosso conhecimento, o Supremo Tribunal Federal não decidiu da forma por nós defendida. Entenderam a maioria dos ministros [no
julgamento da ADPF 144], à exceção dos ministros Carlos Ayres Britto e Joaquim Barbosa, que o princípio da presunção de inocência deveria
prevalecer enquanto não houvesse sentença penal condenatória transitada em julgado, como demonstra esse trecho do voto do Relator, Ministro
Celso de Mello:
“[...] a mera existência de inquéritos policiais em curso ou de processos judiciais em andamento ou de sentença penal condenatória ainda não
transitada em julgado, além de não configurar, só por si, hipótese de inelegibilidade, também não impede o registro de candidatura de qualquer
cidadão.”
Mas para o Ministro Carlos Ayres Britto essa prevalência da presunção de inocência sobre a moralidade não deveria ter ocorrido por se tratar de
fundamento diverso daquele a ser verificado nas situações envolvendo os direitos políticos, onde a probidade é um valor substancial. Assim se
manifestou o Ministro:
“[...] Quero dizer: os titulares dos direitos políticos não exercem tais direitos para favorecer imediatamente a si mesmos, diferentemente, pois, do que
sucede com os titulares de direitos e garantias individuais e os titulares dos direitos sociais. Veja-se que, enquanto os detentores dos direitos sociais
e dos direitos individuais e coletivos são imediatamente servidos com o respectivo exercício, e só por defluência ou arrastamento é que resultam
servidos os princípios da valorização do trabalho e da dignidade da pessoa humana, o contrário se dá com o desfrute dos direitos políticos. Aqui, o
exercício de direitos não é para servir imediatamente a ninguém, mas para servir imediatamente a valores: os valores que se consubstanciam,
justamente, nos proto-princípios da soberania popular e da democracia representativa.”
Vencidas essas discussões, o certo é que a questão chegou ao seu fim, pelo menos por enquanto. Com isso, candidatos que desejarem participar do
processo eleitoral e que possuírem vida pregressa incompatível com a natureza do cargo, ainda assim deverão ter o seu registro deferido pelos
juízes eleitorais sob o argumento de que o principio da presunção de inocência deve ser atendido enquanto não houver sentença penal condenatória
com trânsito em julgado.
3.3. O atual estado de leniência política: o quadro da impunidade no Brasil
Em recente entrevista ao Jornal O GLOBO, edição de 03 de janeiro de 2010, o Ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal, deixou clara
sua descrença na política e atribuiu ao Poder Judiciário a responsabilidade pelo aumento das práticas de corrupção no Brasil.
“O GLOBO: O senhor é descrente da política?
JOAQUIM BARBOSA: Tal como é praticada no Brasil, sim. Porque a impunidade é hoje problema crucial do país. A impunidade no Brasil é
planejada, é deliberada. As instituições concebidas para combatê-las são organizadas de forma que elas sejam impotentes, incapazes na prática de
ter uma ação eficaz.
O GLOBO: A quais instituições o senhor se refere?
JOAQUIM BARBOSA: Falo especialmente dos órgãos cuja ação seria mais competente em termos de combate à corrupção, especialmente do
Judiciário. A Polícia e o Ministério Público, não obstante as suas manifestas deficiências e os seus erros e defeitos pontuais, cumprem razoavelmente
o seu papel. Porém, o Poder Judiciário tem uma parcela grande de responsabilidade pelo aumento das práticas de corrupção em nosso país. A
generalizada sensação de impunidade verificada hoje no Brasil decorre em grande parte de fatores estruturais, mas é também reforçada pela
atuação do Poder Judiciário, das suas práticas arcaicas, das suas interpretações lenientes e muitas vezes cúmplices para com os atos de corrupção
e, sobretudo, com a sua falta de transparência no processo de tomada de decisões. Para ser minimamente eficaz, o Poder Judiciário brasileiro
precisaria ser reinventado.”
Verdadeiro e chocante o testemunho, mas ele apenas confirma o que sentimos no cotidiano da sociedade. A diferença é que está sendo dito pelo juiz
da mais alta Corte do Judiciário brasileiro – o Supremo Tribunal Federal – a quem cabe a guarda da Constituição[93], que fez inserir em seu texto a
Moralidade como um dos seus princípios basilares.
Então como justificar a corrupção e a impunidade vivenciada no Brasil, se a Lei Máxima do país elegeu a moralidade como um dos fundamentos?
Talvez uma das respostas já tenha sido dada pelo próprio Ministro Joaquim Barbosa, quando faz referência que “a generalizada sensação de
impunidade verificada hoje no Brasil decorre em grande parte de fatores estruturais, mas é também reforçada pela atuação do Poder Judiciário, das
suas práticas arcaicas, das suas interpretações lenientes e muitas vezes cúmplices para com os atos de corrupção...” [94]
Com relação a essas “interpretações lenientes”, a que se referiu o Ministro, Djalma Pinto[95] traz um exemplo: a Súmula 1, do Tribunal Superior
Eleitoral, que assim estabelecia: “proposta a ação para desconstituir a decisão que rejeitou as contas, anteriormente à impugnação, fica suspensa a
inelegibilidade.” Ou seja, bastava uma simples petição do governante acusado para sua condição de elegibilidade ser restabelecida.
Felizmente isso mudou a partir de 2008, quando os Ministros do TSE derrubaram a regra que garantia o registro da candidatura com o simples ato de
contestar judicialmente a decisão administrativa dos tribunais de contas.[96] Desde então, para conseguir o registro de candidatura, o candidato terá
de obter a suspensão da decisão administrativa na Justiça Comum ou a Justiça Eleitoral terá de reconhecer a idoneidade da ação que contesta a
decisão do tribunal de contas.
Foi uma mudança salutar, pois “preserva valores democráticos e altamente protegidos, sem cujo atendimento o próprio modo de vida democrático se
tornará prejudicado ou mesmo inviável; esses valores são a probidade administrativa e a moralidade para o exercício do múnus representativo
político, apurados na análise da vida pregressa do postulante, bem como na normalidade e legitimidade de todo o processo eleitoral de modo a se
banir dele as perversões decorrentes da influência do poder econômico e dos abusos oriundos do chamado uso da máquina administrativa.[97]
Por outro lado, ainda é incipiente na consciência das pessoas a necessidade de pressupostos morais como condição natural para o exercício de
funções públicas, como comprovou o estudo realizado pelo Instituto DataUFF, da Universidade Federal Fluminense) e coordenado pelo cientista
social Alberto Carlos Almeida, cujos resultados resultaram na publicação do livro “A cabeça do brasileiro” (2007, p.45). Disse o pesquisador;
“[...] o jeitinho brasileiro é importante em nossa sociedade. Não apenas por ser muito difundido, mas principalmente pelo fato de nos permitir entender
por que o Brasil tem tanta dificuldade em combater a corrupção. Ele até já foi objeto de estudo da antropologia; faltava abordá-lo com dados
quantitativos. O que foi feito pela Pesquisa Social Brasileira. Desse modo, pela primeira vez o Brasil tem a chance de entender o Brasil. Os brasileiros
têm a chance de saber por que a ‘cultura da corrupção’ é tão enraizada entre nós. A PESB mostra que isso acontece porque a corrupção não é
simplesmente a obra perversa de nossos políticos e governantes. Sob a simpática expressão ‘jeitinho brasileiro’, ela é socialmente aceita, conta com
o apoio da população, que a encara como tolerável.”
Após uma série de avaliações envolvendo a utilização do jeitinho, de acordo com o nível de escolaridade e com a faixa de idade, e sobre os
conceitos populares sobre a corrupção, chegou-se à seguinte conclusão:
“[...] que o jeitinho brasileiro possibilita a quebra das relações hierárquicas que caracterizam a sociedade brasileira.Como todos conhecem e podem
recorrer a seus códigos e procedimentos, ele permite que pessoas dos mais diferente grupos sociais alcancem seus objetivos. Em situações
hierárquicas, apenas determinados indivíduos podem quebrar as regras gerais. O jeitinho democratiza de forma radical essa possibilidade.
[...] por isso, se os níveis de corrupção no Brasil provavelmente estão relacionados à aceitação social do jeitinho – que é grande e bastante enraizada
entre nós -, os resultados da pesquisa indicam que temos um longo caminho pela frente se o que desejamos é o efetivo combate à corrupção.”
Dados da Transparência Brasil[98] organizados no relatório “Como são os nossos parlamentares” [99] reafirmam a conclusão a que chegou o
cientista Alberto Carlos de Almeida, quando traz a público os dados relativos a 2007, sobre as ocorrências verificadas na Justiça e nos Tribunais de
Contas por parte dos nossos parlamentares.
Dos 513 deputados federais, 163 deles apresentam-se nessa situação, o que corresponde a 32% dos membros.Tocantins lidera o ranking, com 75%
de seus deputados federais citados, seguido por Paraíba, com 67%, e Santa Catarina, com 63%. Amapá, Rondônia e Mato Grosso têm 50% dos
parlamentares nessa situação.
No Senado, dos 81 senadores, 30 deles (ou seja, 37%) têm ocorrências na Justiça e/ou Tribunais de Contas. Onze deles estão na região Norte,
representando 42,9% dos eleitos nessa região. Em Rondônia, todos os três senadores são citados em algum processo. No Nordeste do país eles são
11 (40,7%) do total.
Já com relação aos deputados estaduais de todo o país, pelo menos um terço de 15 das 27 Casas Legislativa têm pendências com a Justiça ou com
Tribunais de Contas. Em Goiás eles chegam a 73% e em Rondônia são 62,5%. Em seis outras Casas Legislativas – Roraima, Paraíba, Rio de
Janeiro, Mato Grosso, Santa Catarina e Rio Grande do Sul – o número de deputados estaduais com esse tipo de problema é de ao menos 40%.
Outros indicadores da corrupção, mais conhecidos em nível mundial, o índice de percepção da corrupção, calculado pela Transparência Internacional
[100], e o indicador de controle da corrupção, mensurado pelo Banco Mundial, também apontam para a mesma direção anunciada pela
Transparência Brasil.
Divulgado em novembro de 2009, o ranking anual de corrupção divulgado pela Transparência Internacional, o Brasil recebeu nesse ano 3,7 pontos,
numa escala de 0 a 10, passando da 80ª colocação em 2008, para o 75º lugar entre 180 nações analisadas. A nota mais alta foi atribuída à Nova
Zelândia (9,4) e a mais baixa à Somália (1,1). Nas Américas, o Canadá foi o mais bem colocado, seguido pelos Estados Unidos, enquanto o Haiti
manteve-se na última colocação.[101]
Divulgado em 29 de junho de 2009, os dados relativos aos indicadores de controle da corrupção, elaborados pelo Banco Mundial demonstram que o
Brasil não teve avanços significativos nos últimos anos. Para se ter uma idéia, o Brasil estava, há dois anos, na posição 53,6 em um ranking de 0 a
100. Em 2008, o país subiu para 58,5. Mas o resultado ainda é pior do que há dez anos, quando ele estava na posição 58,7. O controle da corrupção
é definido pelo Banco Mundial como “a medida da extensão com que o poder público é exercido para ganhos privados, incluindo tanto pequenas
quanto grandes formas de corrupção.” [102]
E o pior de tudo isso é que os envolvidos em casos de corrupção na sua grande maioria não são punidos pelo Judiciário como deveriam, o que serve
pra fortalecer a afirmação do Ministro Joaquim Barbosa [na entrevista concedida ao Jornal O GLOBO], de que além da estrutura deficitária, as
interpretações lenientes desse Poder contribuem ainda mais para os atos de corrupção.
E faz sentido essa opinião. Para se ter uma idéia do que acontece, os acusados de participarem de um dos maiores escândalos de corrupção já
ocorridos no Brasil – o mensalão - que o procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza o definiu com resultado da ação de uma
“organização criminosa”, vai completar o seu quarto aniversário sem que haja uma única pessoa punida.
Essa absurda impunidade é também comprovada com a constatação de que das 172 ações penais contra autoridades públicas que ingressaram no
Supremo Tribunal Federal nos últimos seis anos, nenhuma condenação até agora aconteceu.[103]
Esse é o retrato do Poder Judiciário do Brasil. Um Poder que não consegue banir da vida pública políticos notoriamente corruptos, que sempre dão
um jeitinho de continuar no poder. Exemplo disso é o que acontece com quatro figurões da política: Orestes Quércia, Fernando Collor, Paulo Maluf e
Jáder Barbalho, apenas para ficar nestes.
Quércia responde pelo desvio de 2,8 milhões de dólares do Banespa e pela contratação de funcionários-fantasma. Em 2000, foi condenado em
segunda instância a devolver 140.000 reais, por desvio de verba pública. É presidente estadual, reeleito, do seu partido, o PMDB. De um total de 670
votos dos partidários, recebeu 597 votos; Collor de Mello, acusado de se beneficiar do esquema de corrupção montado pelo empresário Paulo César
Farias, renunciou ao mandato de presidente da República e teve os direitos políticos cassados por oito anos. Hoje é senador por Alagoas; Maluf
responde a processos na Justiça por envio ilegal de dinheiro ao exterior, formação de quadrilha e desvio de recursos de obras públicas durante sua
gestão como prefeito de São Paulo. É atualmente deputado federal, sendo o mais votado do seu estado; Jader Barbalho está sendo processado por
lavagem de dinheiro, evasão de divisas, crime contra a administração pública e desvio de recursos da Sudam e do Banco do Estado do Pará. É
atualmente deputado federal, sendo o mais votado do seu estado.[104]
Mas nem sempre foi assim.
“[...] O Congresso Nacional já foi uma instituição com muito mais peso no jogo entre os poderes. Em períodos do Império e da República, o
Legislativo dividiu com o Executivo a agenda política e protagonizou momentos memoráveis. No Segundo Reinado, por exemplo, a participação do
Parlamento foi fundamental na conquista da abolição. A figura de proa foi Joaquim Nabuco. Deputado por Pernambuco, Nabuco fez do fim da
escravidão uma causa que transpôs os muros da Câmara. Lembra o historiador Marco Antônio Villa: “Ele buscou apoios no exterior, viajou para a
Inglaterra e lançou o livro, O Abolicionismo, que se tornou um clássico. Hoje, a maior produção literária de nossos parlamentares são os livros de
poemas que eles editam na gráfica do Senado.” [105]
3.4. O movimento de combate à corrupção eleitoral - MCCE
O Comitê Nacional do Movimento de Combate à Corrupção é composto por cerca de 40 entidades[106] cuja atuação se estende por todo o País.
Com sede em Brasília, é ele quem acompanha de perto a atuação do Tribunal Superior Eleitoral e mantém contato com os responsáveis pela adoção
de medidas que favoreçam a lisura do processo eleitoral em todo o Brasil.[107] É essa organização não-governamental a responsável pela
“campanha ficha limpa” contra a candidatura de políticos em débito com a Justiça, que culminou com a entrega de um Projeto de Lei Complementar,
de iniciativa popular, sobre a vida pregressa dos candidatos, pretendendo tornar mais rígidos os critérios de inelegibilidades, tendo sido coletadas
1.516.479 assinaturas até o dia 09 de dezembro de 2009.
A iniciativa do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral em lançar essa Campanha surgiu de uma necessidade expressa na própria Constituição
Federal de 1988, que determina a consideração da vida pregressa do candidato, a fim de proteger a probidade administrativa e a moralidade para o
exercício do mandato.
3.5. O projeto de iniciativa popular dos “fichas-sujas”[108]
Esse Projeto de Lei pretende alterar a Lei Complementar nº 64/90[109], promovendo os seguintes aprimoramentos: a) aumenta o rol de situações
que podem impedir o registro de uma candidatura; b) estende os prazos para as inelegibilidades que passam a ter, em regra, duração de oito anos, e,
c) torna mais rápidos os processos judiciais que tratam das inelegibilidades.
Sobre essas novas hipóteses de inelegibilidades, o projeto prevê que se tornem inelegíveis pessoas que se encontrem nas seguintes situações: as
que forem condenadas ou tiverem denúncia recebida por um tribunal em virtude de fatos graves, tais como: racismo, estupro, tráfico de drogas e
desvio de verbas públicas. Assim, essas pessoas deverão ser preventivamente afastadas das eleições às quais pretendam concorrer, tendo seus
registros de candidatura indeferidos, até que sejam resolvidos seus problemas com a Justiça Criminal. Para o Movimento de Combate à Corrupção
Eleitoral, não se trata de considerar essas pessoas antecipadamente culpadas, mas de se prevenir a sociedade de possíveis danos advindos da
participação nociva de sujeitos reconhecidamente ímprobos e cuja vida pregressa não recomende a mais ínfima das representações.
O projeto também simplifica o processo da ação de investigação judicial, utilizada para reprimir o abuso de poder nas eleições. Assim, deixa de ser
necessário a irrecorribilidade para que a decisão possa ser executada. Uma outra modificação importante é que o juiz de primeira instância poderá
levar a ação até o julgamento final, o que, atualmente, é impedido por um dispositivo que ainda existe na lei.
Mas não será tarefa fácil convencer os congressistas a votar favoravelmente a um projeto que certamente irá prejudicar boa parte deles. Até o final
do ano 2009, 129 deputados federais e 21 senadores eram alvos de processos no Supremo Tribunal Federal, o que justifica o fato de pelo menos
vinte e uma propostas estejam engavetadas no Congresso até hoje. A mais antiga delas é de 1993 e está pronta pra ser votada em plenário desde
novembro de 2001.[110]
Talvez a mobilização popular envolvida na coleta de assinaturas nesse Projeto de Lei articulado pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral
[foram 1.516.479 assinaturas em todo país] sirva para pressionar os parlamentares a darem um destino diferente daquele dado às demais propostas
já apresentadas. É o que também pensa o senador Pedro Simon (PMDB-RS):
“[...] temos um Congresso pobre, sem preparo técnico, sem formação, que se beneficia de um modo de governo calcado em interesses de grupos de
influência. Também não percebo nenhuma ação concreta no combate à corrupção. Não há interesse. Hoje, o político com problemas judiciais
contrata um advogado para emperrar o andamento do processo até o crime prescrever. Se a população brasileira quer mudar a situação que aí está,
deve se mobilizar, deve protestar, como já vi fazerem na época dos caras-pintadas, por exemplo.”[111]
Uma das propostas já apresentadas no Congresso é justamente de autoria do senador Pedro Simon[112], que, a exemplo do que idealizado pelo
Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, altera a Lei Complementar nº 64/90, para “determinar a inelegibilidade dos que foram condenados pela
prática dos crimes que especifica, por improbidade administrativa e para determinar a preferência no julgamento dos processos respectivos.[113]
Na justificativa ao Projeto, o senador Pedro Simon afirma que ele “realiza os propósitos que vimos perseguindo faz anos, juntamente com amplos
segmentos da sociedade brasileira que lutam pela moralidade da administração pública. Seu objetivo é excluir do processo eleitoral aquelas pessoas
que, conforme o Judiciário brasileiro, não têm os bons antecedentes necessários para o exercício de qualquer cargo público eletivo.” Esse Projeto,
inclusive, encontra-se já pronto para apreciação pelo Plenário.
Mas para que os objetivos dessas propostas possam ser de fato concretizados, é preciso que o Judiciário brasileiro adote uma nova concepção sobre
o ideal de Justiça que proporcione aos seus magistrados a aplicabilidade eficiente e correta das leis vigentes.
3.5 Os juízes eleitorais e a defesa da moralidade na vida pública
No julgamento da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 144, ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB, o
Ministro do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, cunhou uma frase que justifica a necessidade de um ativismo judicial em favor da
moralidade e do interesse social. Disse ele: “O Poder Judiciário não pode dar de ombros e jogar a culpa no legislador”.
Naquele momento, estava em discussão a procedência ou não do pedido da AMB para permitir que juízes eleitorais pudessem vetar a candidatura de
políticos que respondem a processo judicial ou não tenham sido condenados em definitivo. Por nove a dois, o STF julgou improcedente o pedido, sob
o argumento de que impedir a candidatura de políticos que respondem a processo viola os princípios constitucionais da presunção de inocência e do
devido processo legal. Seguiram esse entendimento os ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Carmem Lúcia Antunes Rocha, Ricardo
Lewandowski, Eros Grau, Cezar Peluso, Ellen Gracie, Marco Aurélio e Gilmar Mendes. Para eles, o Judiciário não pode substituir o Legislativo e criar
regras de inelegibilidade não previstas na Constituição e na Lei Complementar 64/90.
O ministro Joaquim Barbosa, que votou favoravelmente ao pedido da AMB, defendeu que juízes eleitorais podem vetar a candidatura de políticos
com condenação em segunda instância. Essa afirmativa contribui para romper, pelo menos em parte, uma antiga concepção segunda a qual o
judiciário era um poder “nulo”, não sendo mais do que “a boca que pronuncia a vontade da lei”.[114]
Essa situação mudou a partir do movimento de constitucionalização ocorrido no século XX, alterando as relações dentro do Estado, com uma
contínua transferência de poder para os tribunais e outras instituições jurídicas.[115]
Mas o marco inicial da judicialização da política foi nos Estados Unidos, no caso Marbury v. Madison, de 1803[116]. No Brasil, a judicialização da
política teve um notável crescimento a partir de 1988, principalmente por conta da ampliação do controle concentrado de constitucionalidade,
associada a uma extensa declaração de direitos, e a um ativismo legislativo do Executivo, que passou a fazer uso indiscriminado de medidas
provisórias.[117]
Um exemplo comprova com fidelidade esse processo de judicialização da política, a partir de decisão do Supremo Tribunal Federal, como a que foi
vista no julgamento do Recurso Extraordinário 197917/SP, que tratou da limitação constitucional do número de vereadores, de 11 para 9, sob a
alegação de que a Lei Orgânica do município de Mira Estrela, em São Paulo, não obedeceu à proporção estabelecida no art. 29, IV, “a” da CF.[118]
O entendimento que reinava até então era o de que o número de vereadores das Casas Legislativas Municipais poderia ser fixado livremente, desde
que dentro das balizas previstas no dispositivo constitucional, já que este não oferece parâmetros aritméticos suficientes para calcular a
proporcionalidade.[119] Revisto esse posicionamento, fixou-se que há uma proporcionalidade inerente ao dispositivo constitucional, produzindo uma
escala do número de vereadores por município, baseada na população. Com isso, foram reduzidas em mais de 8.000 o número de representantes
das câmaras municipais de todo o País, agora restabelecidas, em parte, graças à aprovação da Emenda Constitucional 058/2009.[120]
É o novo constitucionalismo, que para ZAGREBELSKY (1992, p.152-3), surgiu no pós-guerra, para tornar concordante a antiga face do Direito – a
das regras jurídicas colocadas à disposição do legislador – com a outra face – a dos princípios contidos na Constituição. Mas, longe de atribuir um
caráter absoluto à Constituição, ele prega a coexistência de valores e princípios sobre os quais a Constituição deve se orientar para se manter
compatível com a base material pluralista que lhe dá fundamento.
Nesse sentido é que a Constituição precisa ser vista e interpretada de modo a satisfazer a unidade que busca. A intervenção judicial não só pode,
como deve, proteger os direitos fundamentais, nem que para isso tenha que revisar questões políticas, guardando-se as devidas precauções para
não se atribuir aos juízes o gerenciamento da máquina pública, nem tampouco aos administradores o poder de dizer o direito nos casos concretos.
Eros Roberto Grau, Ministro do Supremo Tribunal Federal, a esse respeito, afirma que o texto não se completa no sentido nele impresso pelo
legislador. A sua ‘completude’ somente é realizada quando o sentido por ele expressado é produzido, como nova forma de expressão, pelo intérprete.
Isto, contudo, não significa que o intérprete literalmente crie a norma; o intérprete a expressa, e o produto da interpretação é a norma expressada
como tal. Mas ela preexiste potencialmente no invólucro do texto, no invólucro do enunciado.[121]
E é justamente essa atuação do intérprete que favorece a adaptação da Constituição às novas realidades sociais e os seus conflitos, como esse ao
qual nos debruçamos nesse trabalho, que objetivou demonstrar qual princípio [se o da presunção de inocência ou o princípio da moralidade] deveria
prevalecer diante da impunidade verificada no Brasil e da necessidade de se estabelecer um novo padrão ético na nossa vida pública.
Não há dúvidas que diante de um interesse social relevante como o da moralidade, a balança imaginária da Deusa da Justiça certamente penderia
para os valores advindos da prevalência desse princípio, pois é ele que especificamente harmoniza a ideologia da Constituição, unindo todo o
sistema normativo.
Mas para que isso efetivamente aconteça é preciso defender um papel proativo dos juízes eleitorais quando na análise dos pedidos de registros de
candidatura, por se constituir num pressuposto de elegibilidade, permitindo-se aos magistrados o indeferimento daqueles cuja vida pregressa seja
notoriamente incompatível com a função eletiva pretendida.
Aliás, essa é uma atribuição conferida aos juízes pela própria Lei Complementar nº 64/90, a Lei das Inelegibilidades, quando diz no parágrafo único,
do art.7º:
“Parágrafo único. O juiz, ou Tribunal, formará sua convicção pela livre apreciação da prova, atendendo aos fatos e às circunstâncias constantes dos
autos, ainda que não alegados pelas partes, mencionando, na decisão, os que motivaram seu convencimento.”
E isso acontecia com certa freqüência, a exemplo do que ocorreu no Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, que indeferiu o pedido formulado
por Eurico Ângelo de Oliveira Miranda, político de notória participação em crimes de toda ordem, como demonstrou as extensas anotações criminais
apresentadas por ele.
Crimes contra a ordem econômica, evasão de divisas, falsidade ideológica, apropriação indébita, sonegação fiscal, apropriação indébita, furto,
difamação, desobediência, falsificação e/ou uso de documento público e ameaça, fizerem com que o TRE/RJ indeferisse o pedido, sob o argumento
de que “os fatos delituosos constantes nas certidões apontam para a prática de diversas condutas que atentam contra a Fazenda Pública, sem falar
nos delitos que menoscabam o bem jurídico administração pública, como, por exemplo, o desacato e desobediência a agente público, o que
demonstra um perfil incompatível com o exercício do mandato, não sendo crível que os eleitores possam receber como idônea, porque deferida por
este Tribunal, a candidatura de alguém com tal vida pregressa.[122]
Recordando, essa decisão foi tomada antes do julgamento da ADPF nº 144, feito pelo Supremo Tribunal Federal em que prevaleceu a tese do
Ministro-Relator Celso de Mello de que enquanto não houvesse sentença penal condenatória com trânsito em julgado, o princípio da presunção de
inocência deveria prevalecer sobre o da moralidade para o exercício de funções públicas.
Pois bem. A partir desse julgado, as decisões sobre os pedidos de candidatura formulados por políticos de reconhecida “ficha-suja”, passaram a
apresentar o seguinte teor:
“VIDA PREGRESSA
ACÓRDÃO Nº 34.972 – RECURSO ELEITORAL Nº 4984 - CLASSE RE, EM 14/08/2008.
RELATORA: DES. FEDERAL MARIA HELENA CISNE.
Ementa: RECURSO EM SEDE DE REGISTRO DE CANDIDATO A VEREADOR. ELEIÇÕES MUNICIPAIS DE 2008.
- Irrelevância da extensão da folha penal e da qualidade dos crimes para fins de candidatura se ausente o trânsito em julgado da
condenação criminal. Decisão vinculante do Supremo Tribunal Federal prolatada na ADPF nº 144. Recurso a que se dá provimento para
deferir o registro de candidatura, ressalvada a posição da relatora (grifo nosso)
Indexação
Reforma, indeferimento, registro de candidato, candidato, cargo, vereador, argumento, vida pregressa, inidoneidade, exercício, cargo, ofensa,
princípio da moralidade, necessidade, observância, entendimento, TSE, julgamento, STF, ação de descumprimento de preceito fundamental, efeito
vinculante.”
“VIDA PREGRESSA
ACÓRDÃO Nº 35.610 – RECURSO ELEITORAL Nº 5664 - CLASSE RE, EM 04/09/2008.
RELATORA: DES. FEDERAL MARIA HELENA CISNE.
Ementa: ELEIÇÕES 2008. RECURSO. REGISTRO. CANDIDATO. ANTECEDENTES CRIMINAIS. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIDA
PREGRESSA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO DE DEFERIMENTO DO REGISTRO.
- Por força do efeito vinculante da decisão do STF na ADPF nº 144, não pode ser indeferido registro de candidatura a réu cuja sentença não
tenha transitado em julgado. (grifo nosso)
Indexação
Registro de candidato, apreciação, vida pregressa, ofensa, princípio da moralidade, impossibilidade, exercício, mandato eletivo, necessidade,
observância, decisão, STF, efeito vinculante, regulamentação, norma, constituição federal, edição, lei complementar.”
Pelo confronto entre esses Acórdãos e o trecho do indeferimento feito pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro à pretensão de Eurico
Miranda, se faz pertinente uma indagação: a quem beneficiou a decisão do Supremo Tribunal Federal em afastar o princípio da moralidade em favor
da presunção de inocência de políticos “fichas-sujas”? A sociedade ou a eles próprios? Certamente que aos políticos.
Hamilton Octávio de Souza,[123]em artigo publicado na Revista Caros Amigos, traduz com propriedade essa situação.
“[...] É evidente que não interessa a quem se locupleta da corrupção a adoção de medidas duras que reduzam essas práticas no Brasil. É sempre
preferível, para as elites empresariais e políticas, que os casos (eventualmente) descobertos sejam abafados, colocados no banho-maria do
Judiciário e esquecidos nas gavetas dos tribunais. É o que tem acontecido sempre, para a delícia dos criminosos (impunes), e para a tristeza do povo
brasileiro. A impunidade estimula a prática criminosa. Os piores exemplos são dados pelos ocupantes dos mais altos cargos da República. O cume
da pirâmide está fedendo há muito tempo.”
Um outro exemplo, desta vez da realidade baiana, demonstra o absurdo da interpretação feita pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da
ADPF 144, que o Ministro Joaquim Barbosa chama de “interpretação leniente com a corrupção”. Na edição de 08 de janeiro de 2010, página B4, de
Política, o Jornal A TARDE denuncia o prefeito de Eunápolis, José Robério Oliveira (PRTB), de ter desviado R$ 249,7 mil do município, através de
um esquema de desvio de verba juntamente com a empresa “Chubasco”, de consultoria na área jurídica.
O que surpreende nessa matéria é o fato do prefeito José Robério Oliveira responder a 10 ações por improbidade administrativa pelo Ministério
Público Estadual, e uma ação movida pelo Ministério Público Federal, por superfaturamento nas obras de um mini-hospital, e, mesmo assim, ter
conseguido junto à Justiça Eleitoral o deferimento do seu pedido de candidatura em 2008, permitindo a ele ser reeleito para um novo mandato de
prefeito
A situação é semelhante em diversos outros locais. Para se ter uma idéia, dos 417 municípios baianos, apenas um – o de Feira de Santana – teve as
suas contas aprovadas sem ressalvas pelo Tribunal de Contas dos Municípios – TCM.[124]
E se depender da vontade dos deputados federais essa situação não muda. É o que aponta a Sondagem de Opinião Parlamentar[125] realizada pelo
Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar – DIAP, e pelo Instituto de Estudos Econômicos – INESC, entre abril a maio de 2009, sobre as
posições de deputados federais e senadores acerca dos temas centrais da proposta de Reforma Política em discussão no Congresso Nacional.
Perguntados a respeito da inelegibilidade decorrente de vida pregressa, 50,75 dos parlamentares manifestaram-se afirmando que a regra atual é
correta, porque só considera inelegível o candidato condenado em última instância pela Justiça ou com trânsito em julgado, sendo que apenas 11,3%
disseram ser favoráveis à consideração da inelegibilidade a partir de condenações judiciais em primeira instância, enquanto 32% concordaram com a
declaração de inelegibilidade, desde que advenha de condenação judicial numa segunda instância.
Quando os números são organizados por partidos políticos, a regra atual sobre inelegibilidade é correta para 100% dos deputados federais do Partido
da República (PR) e do Partido da Mobilização Nacional (PMN); para 77,8% do Partido Progressista (PP); para 80,0% do Partido Trabalhista
Brasileiro (PTB); para 72,7% do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) e para 66,7% do Partido Comunista do Brasil – PCdoB.[126]
Mas quando a pergunta é sobre a inelegibilidade decorrente de condenação em primeira instância, a discordância é quase total, à exceção do
Democratas (7,7%) e do Partido Verde (33,3%). Dos deputados federais do PP, PDT, PT, PTB, PMDB, PMN, PSC, PSB, PSDB, PSOL e PCdoB,
nenhum deles, ou seja, 0%, concorda com a inelegibilidade em primeira instância.
No Senado Federal, os números organizados por partidos políticos, apresentam a seguinte situação: quando perguntados se concordam com a atual
regra sobre inelegibilidade, partidos políticos como o Partido Progressista (PP), o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e o Partido da República (PR),
100% dos Senadores disseram sim, que a atual regra está correta e assim deve ficar.
Mas com relação à inelegibilidade proveniente de condenação em primeira instância, o Partido Progressista (PP), o Partido Trabalhista Brasileiro
(PTB) e o Partido da República (PR), dentre outros,[127] não apresentou um só Senador a se manifestar a favor dessa mudança. Somente o Partido
Democrático Brasileiro (PDT), com 50%; o Democratas (DEM), com 20% e o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), com 20%,
manifestaram-se favoravelmente à proposta.[128]
3.6. O “mensalão” e o caso “Arruda”
O Brasil é um país rico em escândalos de corrupção. Depois dos fatos envolvendo o ex-presidente Fernando Collor de Melo, que culminaram na sua
renúncia da Presidência da República, em maio de 2005 foi a vez do governo do Presidente Lula da Silva figurar no centro de um dos mais
impressionantes casos de corrupção já visto na história da república.
Iniciado a partir de uma denúncia contra Maurício Marinho, ex-diretor dos Correios, que foi gravado embolsando um pacote de dinheiro dado por um
corruptor[129], uma série de acusações abalaram profundamente um governo que dentre as bandeiras, a da ética, era a que mais sobressaía. A mais
grave dessas denúncias foi a que protagonizou o ex-deputado federal Roberto Jefferson, presidente do PTB – Partido Trabalhista Brasileiro, em
entrevista ao jornal Folha de S. Paulo.
Ele denunciou a existência do “mensalão”, uma mesada de 30.000 reais que seria distribuída a congressistas aliados, pelo tesoureiro do PT, à época,
Delúbio Soares. Com isso, um festival de renúncias, acareações, malas de dinheiro, dólares na cueca, empréstimos fajutos, expulsões, nomeações
espúrias, dossiês falsos, saques milionários, enriquecimento ilícito, desfiliações, caixa dois, chantagens, prisões, contratos superfaturados, CPI,
valeriodutos, propinas, dinheiro cubano, assassinatos, cassações, dentre tantos outros fatos que envergonharam uma grande parte da população.
Mas o que chama a atenção nesse caso, é que nenhuma das pessoas envolvidas sofreram qualquer tipo de punição do Poder Judiciário, nem
tampouco tiveram que devolver os recursos públicos desviados no esquema, mesmo já tendo passado mais de quatro anos da primeira denúncia
sobre o “mensalão”, cuja ação penal está sob a responsabilidade do Ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal.
Enquanto o processo não avança, muitas figuras envolvidas no escândalo vão paulatinamente retornando à cena política, novamente em cargos
antes ocupados, ou mesmo sendo eleitas para os parlamentos ou para funções executivas responsáveis, dentre outras coisas, pelo gerenciamento
dos recursos públicos.
Recentemente, um novo escândalo [mas bem parecido com o “mensalão”] surgiu no cenário brasileiro. Desta vez protagonizado pelo governador do
Distrito Federal José Roberto Arruda, o mesmo que em 2001 teve que renunciar ao mandato de Senador, por ter violado o painel eletrônico do
Senado em conluio com o então presidente da Casa, Antonio Carlos Magalhães, que também por isso renunciou.[130]
Mesmo tendo renunciado por quebra do decoro parlamentar, José Roberto Arruda voltou ao Congresso em 2002 como deputado federal, e em 2006
conseguiu eleger-se governador do Distrito Federal, com 50, 38% dos votos válidos.[131] “Com uma gestão aparentemente austera, marcada por
políticas de corte de gasto e ajuste das contas, ele atingiu uma popularidade recorde na capital do país. Arruda tornou-se a maior expressão política
do DEM, chegando a ponto de ser cotado como um dos principais candidatos a uma futura vice-presidência em uma chapa de oposição encabeçada
pelo PSDB nas eleições de 2010.”[132]
Tudo isso veio ao chão com a operação “Caixa de Pandora” da Polícia Federal e da divulgação de vídeos onde o governador aparece conversando
sobre o esquema e, ele próprio, recebendo maços rechonchudos de dinheiro, supostamente recolhido junto a empresários que prestam serviços ao
governo.
Esses flagrantes foram possíveis graças à participação de Durval Barbosa, Secretário de Assuntos Institucionais, que por meses filmou e gravou tudo
o que acontecia. Em um dos encontros com o governador Arruda, discute o destino de 400.000 reais para ser distribuído entre os parlamentares da
chamada “base aliada” – uma versão local do notório mensalão petista, semelhante até na forma de esconder o dinheiro em meias e cuecas, como
fez o presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal, Leonardo Prudente, do Democratas.[133]
Sem punição, mesmo diante de imagens irrefutáveis, segue José Roberto Arruda no cargo de Governador, reunindo-se com os seus secretários
[nove deles flagrados recebendo dinheiro], como se nada tivesse acontecendo ao seu redor. Numa solenidade de posse de novos diretores da rede
pública de ensino do Distrito Federal, Arruda disse em discurso que “perdoa” aqueles que o acusaram e pediu perdão pelos seus “pecados”. Disse
ele:
“[...] Talvez, ingenuamente, permiti que esses interesses contrariados ficassem tão próximos de nós. Devo também ter cometido erros, é claro. (...) Eu
quero dizer a vocês, de coração mesmo, que eu já perdoei todos os que me agrediram. Eu perdôo, a cada dia, aos que me insultam. Eu entendo as
suas indignações pelas forças das imagens. E sabem por que eu perdoei? Porque só assim eu posso também pedir perdão dos meus pecados.”[134]
É muito sarcasmo, deboche e certeza da impunidade. Talvez nada disso tivesse acontecido se após ter renunciado ao mandato de Senador por
quebra do decorro parlamentar, José Roberto Arruda não tivesse obtido o deferimento do pedido de candidatura, o que lhe possibilitou eleger-se
deputado federal em 2002 e governador do Distrito Federal em 2006.
3.7. Por uma nova realidade no país
O quadro é desolador, mas verdadeiro. A corrupção no Brasil, estimulada em grande parte pela impunidade, ultrapassou todas as barreiras do
suportável atingindo todas as instituições. Não há mais como conviver com um ambiente desses, onde milhões de reais são desviados da educação,
saúde e segurança pública, para engordar contas bancárias cada vez mais cheias de dinheiro vindo dos mais variados esquemas de corrupção.
Na esteira desse último escândalo[135], uma proposta apresentada pelo presidente da República que torna hediondo os crimes de corrupção. Pela
proposta passariam a ser classificados como hediondos (sem direito a fiança e indulto) os de concussão[136], peculato[137], corrupção ativa[138] e
corrupção passiva[139]. As penas para esses crimes passariam a ser de 4 a 12 anos de prisão para o servidor comum e para as altas autoridades
(presidente, governador, prefeito, entre outros) as penas variariam entre 8 e 16 anos. Hoje, a legislação prevê detenção de 2 a 12 anos
indiscriminadamente.
O secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Dimas Lara Barbosa, apoiou o projeto do presidente da República,
mas lamentou que um outro projeto, já apresentado na Câmara dos Deputados, tenha sido adiado para 2010 o início da sua discussão e apreciação.
[140]Trata-se do projeto de lei de iniciativa popular – denominado “ficha-suja” -, que foi apresentado por um conjunto de entidades da sociedade
brasileira, em torno do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, tendo conseguido mais de 1,5 milhão de assinaturas favoráveis ao
indeferimento de candidaturas cuja vida pregressa seja incompatível com a função que se deseja ocupar.
Para o secretário-geral da CNBB “prevenir é o melhor. Quanto mais cedo pudermos selecionar os nossos candidatos já no processo eleitoral, menos
teremos que nos preocupar com CPIs e cassações. O povo não agüenta mais a falta de ética.”
Sem dúvidas que essa é uma das maneiras de se evitar esse estado de caos vivido na vida pública. O indeferimento de candidaturas pelos juízes
eleitorais de políticos cuja vida pregressa não o credencie ao exercício de uma função pública já seria um grande passo em direção de uma nova
realidade. Aliado a isso o ressurgimento do Poder Judiciário, por meio de interpretações que atentam aos interesses da sociedade e que não
privilegiem poucos em detrimento de muitos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Assim, após tudo o que foi narrado neste trabalho, podemos concluir que:
Embora a Constituição afirme que Lei Complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade, não se pode deixar ao arbítrio do legislador a
responsabilidade pela efetiva consideração da vida pregressa como pressuposto para a probidade administrativa e para a moralidade para o
exercício dos mandatos, por todos os interesses envolvidos.
Quanto à inelegibilidade decorrente de vida pregressa, não há outro caminho a não ser esse, diante da expressa ordem Constitucional e do atual
estágio em que se encontra o Brasil, onde o Poder Judiciário não consegue impedir, pelos instrumentos que detém, a participação na vida pública de
quem não tem condições para tanto.
Com relação à prevalência do princípio da moralidade sobre o princípio da presunção de inocência, essa é uma decorrência da idéia de que não há
princípios absolutos, e que eles devem ser sopesados para que se chegue à melhor decisão possível, diante de uma situação especifica, sem que
isso implique na extinção do princípio preterido.
É por isso que nesse caso deve haver essa prevalência, diante dos interesses e das conseqüências que podem resultar de uma interpretação
superficial, equivocada.
As dúvidas do trabalho residem no estabelecimento de critérios objetivos ou não para o indeferimento de candidaturas. Entendo que a questão da
consideração da vida pregressa ultrapassa simples registros judiciais, pois isso, muitas vezes, não conseguirá dizer muita coisa a respeito da conduta
de alguém. Pode-se não ter um só registro, uma só condenação, mas mesmo assim não possuir as mínimas condições para o exercício de uma
função pública. Para isso é preciso defender um papel proativo dos juízes eleitorais. Mas, admito, que essas não são questões simples, de fácil
resolução.
Finalmente, a esperança que um dia ao reler esse trabalho possamos nos admirar de ter aparentemente discutido o óbvio – a moralidade para o
exercício de mandatos eletivos -, mas que na essência deixamos nossa contribuição positiva à sociedade.
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Malheiros Editores. 2007.
Notas:
[1] Monografia apresentada ao Curso de graduação em Direito, da Universidade Estadual de Feira de Santana, como requisito parcial para obtenção
do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. José Lima de Menezes [2] FERREIRA, Manuel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral
brasileiro. 2ed.,rev.e alt. Brasília: TSE/SDI, 2005 [3] FERREIRA, Manuel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. 2ed.,rev.e alt. Brasília:
TSE/SDI, 2005. p.19 [4] Ver a respeito no site: www.tse.gov.br/historiadaseleicoes [5] Ver Art.15, I e IV, e 12,§4º, II, da CF/88 [6] Ver Art.15, II, III e
V; art.17.3 do Decreto 3.927/01 e art.55, II, e § 1º, I, “b”, da LC 64/90 [7] Art. 42, do Código Eleitoral Brasileiro. [8] Art. 42, do Código Eleitoral: O
alistamento se faz mediante a qualificação e inscrição do eleitor. [9] Coluna “Brasília em Dia”, no site: www.neylopes.com.br , acesso em 28.11.09
[10] Art.7º, parágrafo único, da LC/90 [11] Ver art.14, § 3º da CF/88 [12] Art.95, da Constituição Federal de 1824 [13] Art.26, da Constituição
Federal de 1891 [14] Art.7º, §7º, da Constituição Federal de 1934 [15] Artigos 138 e 139, da Constituição Federal de 1946 [16] Art.140, da
Constituição Federal de 1946 [17] Art.150, da Constituição Federal de 1967 [18] Ver art.11, da Lei nº 9.504/97 [19] [19]Trinta e cinco anos para
Presidente, Vice-Presidente e Senador; trinta anos para Governador, Vice-Governador; vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual,
Prefeito e Vice-Prefeito e dezoito anos para vereador. [20] Lei das Eleições [21] COSTA, Adriano Soares da. Brevíssimas notas sobre o fato jurídico
do registro de candidatura . Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 39, fev. 2000. Disponível em: ttp://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1513>.
Acesso em: 13 nov. 2009 [22] Art. 7º, caput,da Lei 9.504/97 [23] Folhas 52, do Acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro [24]
Recurso Ordinário1069/2006 [25] Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal; [26] Ninguém será privado da
liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; [27] Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória; [28] Lei 9.504/97: Art. 11. Os partidos e coligações solicitarão à Justiça Eleitoral o registro de seus candidatos até as dezenove horas
do dia 5 de julho do ano em que se realizarem as eleições. § 1º O pedido de registro deve ser instruído com os seguintes documentos: I - cópia da
ata a que se refere o art. 8º;II - autorização do candidato, por escrito; III - prova de filiação partidária; IV - declaração de bens, assinada pelo
candidato; V - cópia do título eleitoral ou certidão, fornecida pelo cartório eleitoral, de que o candidato é eleitor na circunscrição ou requereu sua
inscrição ou transferência de domicílio no prazo previsto no art. 9º; VI - certidão de quitação eleitoral; VII - certidões criminais fornecidas pelos órgãos
de distribuição da Justiça Eleitoral, Federal e Estadual;VIII - fotografia do candidato, nas dimensões estabelecidas em instrução da Justiça Eleitoral,
para efeito do disposto no § 1º do art. 59.IX - propostas defendidas pelo candidato a Prefeito, a Governador de Estado e a Presidente da República.
(Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009) [29] Constituição Federal: § 3º - São condições de elegibilidade, na forma da lei:I - a nacionalidade brasileira; II
- o pleno exercício dos direitos políticos;III - o alistamento eleitoral;IV - o domicílio eleitoral na circunscrição;V - a filiação partidária;VI - a idade mínima
de:a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador;b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e
do Distrito Federal;c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz;d) dezoito anos
para Vereador. [30]
Lista de processos a que respondia o ex-deputado Eurico Miranda à época do julgamento do seu pedido de registro de
candidatura junto ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro1)Processo 96.0067579-1 - em tramitação perante a 5ª Vara Federal Criminal - pela
prática da conduta descrita no artigo 22 da Lei 7492/86, que defini os crimes contra a ordem econômica - no caso, promover evasão de divisas.
2)Processo n° 2003.51.01.505658-1 - em tramitação perante a 4ª Vara Federal Criminal - pela prática da conduta descrita nos artigos 299 do CP
(Falsidade Ideológica) - artigo 168 do CP (apropriação indébita) - arts. 1° e 2° de Lei 8137/90 (que define os Crimes contra a Ordem Tributária) Sonegação Fiscal - Art. 1° da Lei 4729/65 - Crime de Sonegação Fiscal - arts. 350 e 353 do Código Eleitoral. 3)Processo n° 2004.51.01.530475-3 em trâmite na 4ª Vara Federal Criminal - pela prática do crime de não recolhimento de contribuição previdenciária. 4)Processo n° 2006.001.055165-7
- em curso na 31ª Vara Criminal da Comarca da Capital - pela prática da conduta descrita no artigo 155, caput do CP. 5)Processo n°
1999.001.026858-4 - em curso na 38 ª Vara Criminal - pela prática das condutas descritas nos artigos 139 e 147 - constando arquivamento provisório
do mencionado feito. 6)Processo n° 2004.800.050044-5 - em curso no VIII JECRIM, tendo como último movimento a remessa à Turma Recursal, mas
sem que se esclareça a natureza da sentença proferida.7)Processo n° 2003.51.01.505442-0 - em curso na 8ª Vara Federal Criminal - pela prática dos
crimes de Desobediência e/ou Desacato e Falsificação e/ou Uso de Documento Público - com sentença condenatória ainda não transitada em
julgado. [31] Votaram contra o Recurso nº 1.069, do ex-deputado Eurico Miranda, mantendo a decisão do TRE/RJ que negou o pedido de registro de
candidatura, os Ministros Carlos Ayres Britto, Cesar Asfor Rocha e José Delgado. Votaram a favor do mesmo Recurso, os Ministro Marco Aurélio,
Marcelo Ribeiro, Gerardo Grossi e Cezar Peluso, Placar: 04 votos favoráveis e 03 votos contrários ao recurso. [32] Publicado na Sessão de 20 de
setembro de 2006. [33] Reportagem de Carolina Brígido e Isabel Braga. Publicada na edição de 11 de maio de 2008, cujo título era: “Cerco aos
candidatos fichados.” [34] Pernambuco, Distrito Federal, Goiás, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, Pará, Amapá, Maranhão, Ceará, Paraíba,
Alagoas, Acre, Rondônia, Mato Grosso do Sul, Paraná e Espírito Santo. [35] Julgada improcedente pelo Supremo Tribunal Federal. [36] Hans
Kelsen, utilizou a metáfora da pirâmide para demonstrar que as normas jurídicas se organizam tal como se fossem dispostas de forma escalonada,
no topo encontrando-se as normas de maior hierarquia e generalidade e cada escalão inferior formado por normas mais específicas e de menor grau
hierárquico. [37] Teoria defendida por Hans Kelsen em que o direito estaria organizado em um sistema hierarquizado de normas jurídicas, tendo a
Constituição no seu ápice. [38] Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: [39]
Julgamento realizado em 06 de junho de 1990. [40] Ruy Barbosa, Comentário à Constituição Federal brasileira, v.2, p.475 [41] Ver art. 60, III, §4º,
da Constituição Federal [42] José Afonso da Silva sistematizou o estudo da matéria, sendo a sua teoria a adotada pelo STF. [43] Art.37, VIII, da
CF/88 [44] O Supremo Tribunal Federal adota a teoria de José Afonso da Silva [45] Esse artigo, ao cuidar da administração pública, previu que o
direito de greve dos servidores civis seria exercido nos termos e nos limites definidos em lei complementar. [46] RMS 2.865-3-SC, relator Ministro
Vicente Cernicchiaro. [47] MI 20-4-DF, relator Ministro Celso de Mello [48] Tombado sob o nº 712/MI [49] “o direito de greve será exercido nos
termos e nos limites definidos em lei específica” [50] Art.14.[...] §9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de
sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a
normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na
administração direta ou indireta. [51] g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por
irregularidades isanáveis e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se a questão houver sido ou tiver sendo submetida à apreciação do
Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 5(cinco) anos seguintes, contados a partir da data da decisão; (grifos nossos) [52]
Art.14.[...] §9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade
administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra
a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. [53] Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental [54] Informação colhida na página do Supremo Tribunal Federal, no sítio “Notícias STF, publicado em 06
de janeiro de 2009. [55] Remédio jurídico constitucional destinado a tornar viável o exercício de direitos e liberdades constitucionais e das
prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. [56] Inciso XXI, do art. 7º da Constituição Federal, que prevê como direito dos
trabalhadores rurais e urbanos o aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, com mínimo de trinta dias e de acordo com os termos de uma lei
ordinária, que nunca foi feita. [57] O STF estabeleceu o prazo de 18 meses para que o Legislativo preenchesse o vácuo da lei, mais isso não
aconteceu. O Congresso Nacional então, aprovou a Emenda Constitucional 57 que convalida as criações, fusões, incorporações e
desmembramentos de municípios até 31 de dezembro de 2006, atendidos os requisitos estabelecidos na legislação do respectivo Estado à época de
sua criação. [58] Tal constatação torna-se ainda mais factível em razão do recente julgamento da ADPF nº 04, no qual o Supremo Tribunal Federal
admitiu a argüição de descumprimento como instrumento eficaz de controle de inconstitucionalidade por omissão. [59] Lei 9.882/99, dispõe sobre o
processo e julgamento da argüição de descumprimento de preceito fundamental, nos termos do §1º da Constituição Federal. [60] Constituição
outorgada por um triunvirato militar. [61] Recurso Especial Eleitoral 4.221/RS: é cabível quando o acórdão atentar contra expressa previsão legal ou
houver divergência na interpretação de lei entre tribunais eleitorais. [62] Trecho colhido do voto do Ministro Celso de Mello, no julgamento da ADPF
144, pelo STF. [63] Explicações extraídas do voto do Ministro Celso de Mello, no julgamento da ADPF 144/DF. p.16 [64] Elegibilidade no Direito
Brasileiro. São Paulo: Atlas, 2008, p. 115 e seguintes [65] Elegibilidade no Direito Brasileiro. São Paulo: Atlas, 2008, p. 115 e seguintes [66] § 1.º A
argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei.
[67] Exarada no Registro de Candidatura n° 2401, Classe 25, do TRE/RJ, requerido pelo Partido Progressista – PP. [68] É o recurso utilizado para
rever decisões dos tribunais regionais eleitorais nos casos de ofensa a letra expressa da lei, quando derem à mesma lei interpretação diversa da que
tiver sido adotada por outro Tribunal Eleitoral e quando versarem sobre expedição de diplomas nas eleições federais e estaduais. (Art. 35 do
Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral - Resolução 4.510, de 29 de setembro de 1952). [69] XXXVI - a lei não prejudicará o direito
adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada; [70] LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; [71]
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; [72] Art. 1º São inelegíveis: I - para qualquer
cargo: e) os que forem condenados criminalmente, com sentença transitada em julgado, pela prática de crime contra a economia popular, a fé
pública, a administração pública, o patrimônio público, o mercado financeiro, pelo tráfico de entorpecentes e por crimes eleitorais, pelo prazo de 3
(três) anos, após o cumprimento da pena; [73] LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;
[74] Aquele que fez inserir no texto constitucional a consideração da vida pregressa [75] Lei das Inelegibilidades [76] “O art.14, §9º, da
Constituição não é auto-aplicável” [77] Principalmente os Tribunais Regionais Eleitorais do Rio de Janeiro e Paraíba [78] Associação dos
Magistrados Brasileiros [79] Não é auto-aplicável o §9º do art. 14 da Constituição Federal [80] § 9º - Lei complementar estabelecerá outros casos de
inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o
abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. [81] Trecho extraído da ADPF 144, página 34. [82] O ministro
refere-se à Lei Complementar 05/70 que previa como causa de inelegibilidade a existência de ações judiciais movidas contra o pretenso candidato,
em determinadas infrações penais, desde quando a denúncia tivesse sido recebida pela justiça. [83] Emenda que alterou o § 9º, do art. 14, da
Constituição Federal, fazendo incluir a consideração da vida pregressa. [84] Artigo publicado na página do Movimento de Combate à Corrupção
Eleitoral – MCCE, sob o título “o princípio da inocência não é absoluto” [85] O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral – MCCE, está
organizado a partir de um comitê nacional sediado em Brasília, formado por 40 entidades – com representação estadual em todo o País – e de
centenas de comitês estaduais e locais por todo o Brasil, constituídos de forma voluntária por representantes da sociedade civil, pastorais, sindicatos,
associações e outros grupos organizados. [86] Carta publicada no site: www.mcce.org.br [87] HOUAISS, Antônio. “Dicionário Houaiss da Língua
Portuguesa”. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p.2299. [88] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho, 6.ed. São Paulo, LTR, 2007,
p.184 e seguintes [89] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 8ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p.231; [90] SARMENTO, Daniel. A
ponderação de interesses na Constituição Federal. Lumen Juris. Rio de Janeiro, 2003. p.104 [91] ANTUNES ROCHA, Carmem Lúcia, Princípios
Constitucionais da Administração Pública. Del Rey Editora. Belo Horizonte. 1994. p.185 [92] Ver art. 92, I-A, da Constituição Federal [93] Art. 102,
caput, da Constituição Federal: Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: [94] Opinião
manifestada em entrevista concedida ao Jornal O GLOBO, edição de 03 de janeiro de 2010. [95] PINTO, Djalma. Direito Eleitoral. Improbidade
Administrativa e Responsabilidade Fiscal. 4ªed.rev. atual. Atlas. 2008. p.354 [96] Ver a respeito matéria no site: http://www.conjur.com.br/ [97]
Trechos do voto do Relator, Ministro Cesar Asfor Rocha, do TSE, no Recurso Ordinário nº 912, Classe 27ª – Roraima(Boa Vista). [98] A
Transparência Brasil é uma organização independente e autônoma, fundada em abril de 2000 por um grupo de indivíduos e organizações
não-governamentais comprometidos com o combate à corrupção. [99] Ler mais sobre o relatório “Como são os nossos parlamentares”, no site da
Transparência Brasil (www.transparencia.org.br) [100] Transparência Internacional é uma organização internacional dedicada a combater a
corrupção política, tendo como ferramenta principal a divulgação de informações. Fundada em 1993 e tem sua sede em Berlim, Alemanha. Está
organizada em mais de 80 países e é uma organização sem fins lucrativos. [101] Ver mais a respeito em www.folha.uol.com.br [102] Ler maiores
informações a respeito no site do Banco Mundial: www.worldbank.org [103] Reportagem do Jornal O Estado de S. Paulo, edição de 03/01/2009,
p.A6 [104] Fonte: Revista VEJA, edição de 2021, de 15 de agosto de 2007. [105] Revista VEJA, Edição 1993, de 31 de dezembro de 2007 [106]
Abong •Abramppe •Ajufe •AMB •Ampasa •AJD •Conamp •APCF •ANPR •Cáritas Brasileira •CUT •CBJP CFC •Conam •CNTE •Contag •CNBB •Confea
•CFF •Coffito •Conic •CNS •Conter •Criscor •Fenafisco Fenaj •Ibase •Inesc •IFC •Instituto Ethos •MPD •OAB •Rits •Unafisco Sindical •Unasus •Voto
Consciente [107] Extraído da página do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral: www.mcce.org.br [108] Informações colhidas da versão
simplificada para debate em público, do site do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (www.mcce.org.br) [109] A Lei das Inelegibilidades
[110] Fonte: Jornal Gazeta do Povo Online. Reportagem exibida no site da Federação das Indústrias do Estado do Paraná - FIEP [111] Opinião
manifestada pelo Senador Pedro Simon, durante debate sobre corrupção realizado no dia 30 de novembro de 2009, na sede do GLOBO, no Rio de
Janeiro [112] Projeto de Lei do Senado, nº 249/2008 [113] Ementa do Projeto de Lei do Senado, nº 249/2008. [114] Montesquieu. O espírito das
leis, 2002, p.p 169 e 172, apud Alceu Maurício Jr, Judicialização da política e a crise do direito constitucional: a constituição entre ordem, marco e
ordem fundamental. RDE, Revista de Direito do Estado. Ano 3, nº 10:125-142. abr/jun 2008. [115] Conforme John Ferejohn. Judicializing politcs,
politicizing Law. Law and Contemporary Problems, apud Alceu Maurício Jr, Judicialização da política e a crise do direito constitucional: a constituição
entre ordem, marco e ordem fundamental. RDE, Revista de Direito do Estado. Ano 3, nº 10:125-142. abr/jun 2008. [116] Disponível em:
www.findlaw.com. [117] Luiz Werneck Vianna et tal. A judicialização da política e das relações sociais no Brasil. 1999. p.48-51 [118] Art. 29. O
Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da
Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes
preceitos: IV – número de vereadores proporcional à população do Município, observados os seguintes limites: a) mínimo de nove e máximo de vinte
e um nos Municípios de até um milhão de habitantes [119] Entendimento firmado no julgamento do Mandado de Segurança 1945, pelo Tribunal
Superior Eleitoral [120] Emenda que alterou a composição das Câmaras Municipais. [121] Apud Bráulio Cézar da Silva Galloni. Hermenêutica
Constitucional. Editora Pillares. São Paulo. 2005. p.77 [122] Juíza Jacqueline Lima Montenegro, do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro.
[123] Hamilton Octávio de Souza é jornalista, professor da PUC/SP e editor da revista Caros Amigos. [124] Informação extraída do site do Tribunal
de Contas dos Municípios – TCM (www.tcm.ba.br) [125] Sondagem realizada pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar – DIAP e
Instituto de Estudos Econômicos – INESC, entre abril a maio de 2009, sobre as posições dos parlamentares acerca dos temais centrais da proposta
de reforma política. [126] Apenas foram utilizados os números relativos aos partidos políticos que tivessem ultrapassado os 50%. [127] PT, PMDB,
PPS, PMN, PSB, PSC, PV E PSOL. [128] Ver pesquisa completa no site do DIAP – Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar [129]
Revista VEJA, edição 1905, de 18 de maio de 2005. [130] Ler mais a respeito no site do DIAP, Departamento Intersindical de Assessoria
Parlamentar: www.diap.org.br [131] Fonte: TRE/DF. www.tre-df.gov.br [132] Fonte: Revista VEJA, edição 2141, de 02 de dezembro de 2009. [133]
Fonte: www.g1.com.br [134] Matéria do jornal Correio Brasiliense, edição de 07 de janeiro de 2010. [135] O “caso Arruda” [136] Art.316, do Código
Penal: Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem
indevida. [137] Art. 312, do Código Penal: Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem imóvel, público ou particular,
de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio. [138] Art. 333, do Código Penal: Oferecer ou prometer vantagem
indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício. [139] Art. 317, do Código Penal: Solicitar ou receber, para
si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em função dela, vantagem indevida ou aceitar
promessa de tal vantagem. [140] Reportagem extraída da Folha Online, publicada em 11/12/09.
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